6 - Ano II – Dezembro 2002
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Itinerando
Rua Luiz de Freitas, 113 São Jorge
69033- Manaus – AM. BRASIL
Fone/Fax: (92) 625-2899. E-mail: [email protected]
Juntos tecendo uma Amazônia
mais fraterna e plural,
mais justa e solidária.
NATAL 2002 - ANO NOVO 2003
Desde o nosso barraco:
O Natal de cada dia
Como posso falar o que é certo ou o que é errado em
um local onde impera a lei do tráfico, da prostituição, da
corrupção policial... Onde o chefe do tráfico é o protetor
de quase todos ao redor, e não deixa as crianças ir
dormir com fome... !
Como evitar as lágrimas ao ver as pontes e ruas de
madeira sobre a água suja, precárias, estreitas e
perigosas, se transformarem em locais de encontro,
brincadeira, festa, jogo e lazer!
Como não se emocionar ao ouvir as crianças e jovens relatarem aos risos quantas e quantas vezes já
salvaram a vida uns dos outros, de morrerem afogados na água preta e lamacenta dos esgotos, porque se
distraíram e não perceberam que o chão das casas havia terminado...!
Como não se indignar ao ver um menino de dois anos olhando encantado, através de uma porta de
grades improvisada, os urubus que se aglomeram no lixo jogado no igarapé, como que adivinhando que em
alguns anos ele pode estar atrás de uma grade de verdade se tudo continuar assim...!
Como não refletir sobre a prática da vida quando uma adolescente dá a luz uma criança, fruto de um
sexo pago ou forçado... !
Como não se revoltar quando a policia, encapuzada como um bandido e de surpresa como um ladrão,
chega de madrugada chutando as portas, espancando pessoas, ofendendo e desafiando a todos... E como
não se sentir solidário nesses momentos de tensão, em que os olhares se encontram como uma súplica
silenciosa, criando uma cumplicidade mútua, um grito mudo e uma força resistente frente ao desafio da
morte ameaçando a vida... !
Como não dar glórias a Deus pela leveza e humor com que todas as situações são descritas e
comentadas pelos protagonistas da história: os pobres... !
Como não sentir piedade ao ver uma mãe idosa andar, nas altas horas da noite, atrás do filho doente
mental que fugiu mais uma vez, com um comprimido na mão para ele tomar porque assim pode um dia ficar
bom... !
Como não sofrer e se alegrar ao mesmo tempo e com a mesma intensidade, quando o coração é
marcado a ferro cada dia, com as lágrimas, com o riso solto, com os gestos, com as palavras, com as ações
e, principalmente, com o amor gratuito de cada pessoa que faz parte deste céu disfarçado de inferno... !
ClÁudia
Este é um pedacinho do pão nosso de cada dia que nós, da Equipe Itinerante, queremos partilhar com você neste tempo de Natal, na
esperança de um Ano 2003 realmente Novo... com Lula no poder como serviço aos mais pobres! É aqui, nesta realidade ambígua, que
o Deus-frágil quer nascer mais uma vez. É aqui que o Deus-menino se oferece e quer ser acolhido por cada um de nós, para que não
deixemos as sementes da vida morrerem!.
Equipe Itinerante
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Notícias da Equipe e Comunidade Itinerante
 Cláudia, leiga missionária, membro da nossa Equipe, está sendo enviada pela sua diocese Novo Hamburgo
(RS) para outra missão. Ela caminhou junto a nós durante 3 anos, desde o início da comunidade itinerante.
Foi a sustentadora da sub-equipe junto aos Marginalizados Urbanos, acolhendo outros companheiros e
companheiras que ficaram conosco durante alguns meses. Foi também a nossa secretária... Enfim, ela é
nossa companheira e amiga querida que nos deixa com um monte de saudades. Colocamos seu último
escrito como felicitação de Natal e Ano Novo da nossa Equipe para você. Obrigado de coração bemquerida Cláudia!!!
 Entre os dias 5 a 13 de dezembro de 2002, as 6 pessoas que fazemos parte da equipe-comunidade estivemos
reunidas para o Encontro de Avaliação e Calendarização em vistas ao ano 2003. Foi muito bom e
proveitoso, pois é a primeira vez que avaliamos a partir de um planejamento bem realizado, com objetivos
bem definidos, que fizemos no início do ano, ajudados pela mesma assessora Ivani Farias, professora do
departamento de geografia da Universidade Federal do Amazonas. A partilha destas avaliações nos ajudou
mutuamente a encontrar propostas de solução para as dificuldades que muitas foram comuns nas 3
subequipes (Marginalizados Urbanos, Ribeirinhos, Indígenas). Padre Bruno, superior dos jesuítas na
Amazônia, também nos ajudou muito com sua presença e colaboração.
 Com a saída da companheira Cláudia, na subequipe da cidade ficou apenas o Paco. Na subequipe ribeirinha
continuam Odila e Paulo Sérgio, sendo que este assumiu também a coordenação do “apostolado social” dos
jesuítas ao nível de Brasil. Estas duas subequipes, então, ficariam muito fracas. Decidimos pois que o Paco
volte para reforçar a subequipe ribeirinha (onde já trabalhou anos anteriores) e a subequipe junto aos
Marginalizados Urbanos fique entre parêntese, esperando que nossa Equipe Itinerante aumente com novos
membros. Você se anima? Escreva-nos!!!
Ribeirinhos: “Encanto e esperança”
Tefé é uma Região que há quase 05 anos temos tido desejo de visitar de forma mais pedagógica. Agora chegou
o tempo. Por mais que a gente deseje, “escutar mais que falar” ou “aprender mais que ensinar”, parece-me que
nestes quase 05 anos de itinerância, nesta vasta Amazônia, esta viagem tem sido, mais que outras, marcada pela
escuta e o aprendizado. Isto tem sido para nós um verdadeiro curso de reciclagem e atualização. Afinal, a
caminhada de luta e organização de base nesta região, já está se aproximando da fase adulta. São mais de 30
anos!
As comunidades, as lideranças, os movimentos sociais, têm hoje uma história de experiências acumulada, que
respondeu, com determinação e, na maneira do possível, ao longo da caminhada, a missão que lhe fora
confiada, frente ao grande desafio de construir uma vida com mais justiça e mais dignidade.
O fato de encontrarmos comunidades, pessoas e movimentos sociais organizados ou em fase de organização,
acreditando que “outro mundo é possível”, é sinal de que o caminho percorrido confirma no caminho que está
por caminhar.
A recente vitória política e democrática do povo brasileiro, elegendo Presidente da República, nosso
companheiro Lula, é garantia que os nossos sonhos de uma “Terra Sem Males” começará agora ser bem mais
que um simples sonho, mas um Novo Tempo em que e República proclamada se consolidará e será para todo o
povo brasileiro aquilo que ela deveria ter sido sempre: Uma “Res-Pública”, isto é: de todos e não uma “ResPrivada” da elite dominante de sempre. Temos evidências de que nosso Encanto e Esperança faz sentido, sim!
Paulo Sérgio e Odila – Tefé, Am Dia da Proclamação da República 2002.
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Indígenas:
“Conta pra mim Solimões,
o que te fez furioso assim...”
Assim canta o Grupo Raízes Cabocla sobre o misterioso Rio
Solimões, rio de água barrenta e cheio de toras de madeiras,
troncos e pedaços de árvores que o tornam furioso, diante de
tanta violência. Ele, em dia de tempestade... exige respeito.
Foi através dele que nós, depois de termos contribuído com
os bons resultados das eleições do novo governo, deixamos
Manaus e chegamos até os povos indígenas da região: Ticuna, Kokama, Marubo, Matis, Mayuruna, dentre
outros. Com os Ticuna, desenvolvemos a oficina ”A Marcha continua por uma Terra sem males”. Foi uma
experiência gratificante para nós (ao mesmo tempo recíproca, segundo eles e elas), ao conhecermos, ouvirmos e
compartilharmos a vida. Foi forte demais escutar os depoimentos de pessoas que vivenciaram o conhecido
“massacre do Capacete”:
“Eu era apenas uma criança, 10 anos. Vi matarem meu irmão e outros parentes índios. Minha mãe corria
desesperada com meus irmãozinhos. Muita gente corria, se escondendo dos brancos que queriam acabar com os
índios”. Sra. Cristina Ticuna, esposa do tuxaua (comunidade São Luís).
Esse massacre aconteceu no dia 28 de março de 1988. 14 pessoas foram assassinadas, dentre elas crianças.
O povo Ticuna ilustra a situação real que vivem os povos indígenas. Encontram-se diante de grandes interesses
por parte dos não indígenas: madeireiras, militares, comerciantes e outros, representados pelos jacarés. O que
podemos fazer para que a ternura e o compromisso do Deus que se fez pequeno, seja mais forte e presente
diante das ameaças contra a vida?
Neste final de ano agradecemos aos povos indígenas pelo muito que nos ensinam. Por nos ajudarem a acreditar
na revelação de TUPANA encarnados nas diferentes culturas. Agradecemos, também, as pessoas que
possibilitaram fazermos estas experiências de vida e missão.
Com carinho, Hugo, Arizete e Fernando.
A FOME DE JUSTIÇA, COM TERNURA FRATERNAL
É O ALIMENTO ADEQUADO PARA ERRADICAR TODA FOME
A PARTIR DESTE NATAL.
QUE ESTE NATAL E ESTE ANO QUE VEM VINDO, SEJA UM TEMPO DE FELICIDADE E PAZ!
Ir. Arizete CSA, Pe. Paco SJ, Hugo SJ, Ir. Odila FSCJ, Pe. Fernando SJ, Pe. Paulo Sérgio SJ
Equipe Itenerante da Amazônia, Manaus, Advento 2002
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Ribeirinhos: “Encanto e esperança”