UM ESTUDO EM 2TIMÓTEO Estudo preparado pelo Pr. Isaltino Gomes Coelho Filho para os pastores batistas em Cabo Frio, RJ, agosto de 2004 INTRODUÇÃO Como disse no estudo sobre 1Timóteo: “As cartas a Timóteo e a Tito são chamadas de “pastorais”. Todas as cartas de Paulo foram pastorais. Estas foram dirigidas a pastores: Timóteo e Tito. Servemnos por isto. O sentido da palavra “pastoral” aqui ficou quase como sendo sinônimo de “clerical”, uma carta para pastores. Somos pastores. Paulo, o grande pastor, missionário, teólogo tem algo a nos dizer aqui. Vejamos”. Agora, nosso tema é a 2Timóteo. Vejamos, também. 1. QUAL O PROPÓSITO DA CARTA? Podemos compreender seu propósito lendo 1Timóteo 1.3-4. Timóteo está em Éfeso, encaminhado por Paulo, para resolver problemas daquela igreja. Geralmente pensamos nas igrejas do Novo Testamento como igrejas boas, saudáveis, até perfeitas. Até se ouve, vez por outra, a frase: “Precisamos voltar a ser como a igreja do Novo Testamento”. Elas tinham problemas como as nossas. A de Corinto tinha problemas piores que os nossos. Aqueles pastores lutavam com problemas como nós lutamos. Não eram obreiros perfeitos. Eram tão humanos como nós, e às voltas com problemas e limitações como nós. Por isso, esta carta nos serve. Gente como nós, à frente de igrejas como as nossas, com ovelhas como as nossas. Serviu para Timóteo, servirá para nós. 2. OS PROBLEMAS DA IGREJA (1) Excesso de palavras, muito discurso oco, negando até a ressurreição: 2.16-18. Himeneu era “barra pesada”: 1Tm 1.19-20. Há muito Himeneu em nossas igrejas. (2) Ainda havia Alexandre, que causara males a Paulo: 4.14-15. Cullmann acha que Alexandre era um líder judaizante que acusara Paulo. Ele presume ser este Alexandre o judeu de Atos 19.3334. Ele se voltara contra Paulo desde aquela época. (3) Havia também a falsa espiritualidade: 3.1-5. São pessoas que resistem à verdade. Gente que confunde doutrina com fábulas, com crendices e superstições. Falsa espiritualidade talvez seja um dos problemas mais comuns em nossas igrejas. Achamos que nossas igrejas têm problemas e que nosso peso é duro? Os pastores do Novo Testamento enfrentaram o mesmo problema. Qual é a lição? Que pastorear o rebanho de Deus é enfrentar rebeldes, sofrer maldade de ovelhas (ou bodes?) e administrar caos doutrinário. Uma pergunta; vale a pena passar por tudo isto? Creio que a melhor resposta, por enquanto, vem de 1Pedro 5.1-4. 3. DOIS TEMAS CAPITAIS NA CARTA Exatamente por abordar as dificuldades do ministério, Paulo focaliza dois temas de fundamental importância nesta carta. Os comentaristas os chamam de “retrato do mártir cristão” e “o retrato do pastor”. O “retrato do pastor” tem três aspectos, segundo Bortolini (eu chamaria de dimensões). Como disse Bortolini: “O primeiro é pessoal, o segundo envolve o líder com sua comunidade; o terceiro o mostra num quadro mais amplo, o da sociedade em geral”. Vamos ver estes dois temas mostrados pelo apóstolo. 4. O RETRATO DO MÁRTIR CRISTÃO É apresentado em quatro ângulos: (1) Não se envergonhar da fé: 1.11-18. Paulo não se envergonhava (v. 12) e Onesíforo não envergonhou (v. 16). O sentido é de não se encabular, não se retrair, não ter medo nem querer desistir. (2) O conflito com a sociedade civil: 3.13-18. Não devemos esperar aplausos do mundo. Quem quiser viver em piedade será perseguido. Cabem aqui as palavras de João 15.18-21. (3) Manter-se firme no combate cristão: 4.6-8. Um mártir nunca desiste e entrega sua vida como ato de culto a Deus. (4) Mesmo traído, abandonado, exercer o perdão: 4.16-18. Deus livra aqui e leva para o reino. Mártir não é, necessariamente, o que morre numa fogueira. É o que se mantém fiel, mesmo em meio aos problemas e sofrimentos. Cada pastor, neste sentido, deve ser um mártir. 5. O RETRATO DO PASTOR Este é mais amplo e é mostrado em sete ângulos, que abarcam os três aspectos ou dimensões já mencionados no ponto 3: (1) Reavivar, não se envergonhar e participar do sofrimento pelo evangelho: 1.6-8. Admiro e “invejo” os pastores que só têm triunfos, autênticos “tratores espirituais”, que passam por cima de tudo. Já tomei tanta bordoada que até pensei em desistir. Um colega orou comigo pedindo que Deus me fizesse digno de sofrer participando das aflições de Cristo. Ele citou 1Pedro 4.13. Foi-me uma grande lição. (2) Fortificar-se, comunicar a graça, solidarizar-se com o sofrimento dos colegas: 2.1-7. Há quem exulte com os problemas dos colegas. Não somos rivais. Somos colegas. Para se subir não se precisa dos escombros do ministério alheio. (3) Lutar contra as falsas lideranças religiosas, lembrando, testemunhando, não tendo do que se envergonhar: 2.14-18. O versículo 15 mostra que deve ser um homem conhecedor do evangelho (“maneja bem”), mas não apenas cognitivamente e também existencialmente (“não tem do que se envergonhar”). O maior antídoto contra as heresias é um antivírus bíblico e um caráter autêntico. (4) Fugir e permanecer (2.22-26). Fugir das paixões sensuais e seguir na firmeza da vocação, com integridade. Provérbios 22.3 cabe bem aqui. Eis uma boa citação de Hansen: “Terei pouco controle sobre meu ministério se tiver pouco controle sobre meus pensamentos e sentimentos” (O poder de amar sua igreja, p. 119). Cuidado com pensamentos e sentimentos que nãose consegue controlar. (5) O conflito com a sociedade civil: 3.13-18. É uma parte do retrato do mártir (a segunda). O mundo não pode tolerar pessoas santas que o reprovem. Reprovar com palavras traz bate-boca, mas quando é com a vida, leva o mundo ao ódio. (6) Firmeza: 3.14-17. A base desta firmeza é a Palavra de Deus (v. 16), não um idealismo utópico ou uma decisão baseada na necessidade de afirmação. A fonte de firmeza para o obreiro é a Palavra de Deus, que o alimenta. (7) Proclamar a Palavra: 4.1-5. Porque está firme nela pode proclamá-la. A pior coisa para um pastor é ler a Bíblia profissionalmente, em busca de mensagem se não lê com fome e com profundo respeito, suas mensagens serão discursos. O que dá autoridade moral à pregação não é a retórica, mas o amor à Bíblia. O pastor se firma na Bíblia, mesmo quando ela o corrige. O falso profeta engendra argumentos, fábulas, para manter suas posições. “Prega a Palavra” é o mote que todo pastor deveria ter ecoando em seus ouvidos. CONCLUSÃO Parece que ser pastor é ser um saco de pancadas ou ser uma pessoa passiva, que aceita sofrer e até morrer, como se esta fosse a única opção. A opção é a fidelidade, traga ela o que trouxer. Mas não é ser saco de pancadas nem passivo. É uma profunda e inabalável convicção de que tudo está nas mãos de Deus. Ele livra e leva seguro ao céu (4.17-18). O compromisso é com Cristo, para honrá-lo e servi-lo. Esta é a maior glória que podemos ter: fazer algo para Cristo.