O que a sociedade espera do Promotor de Justiça Criminal ? Valdir Vieira Rezende, 13º Promotor de Justiça das Execuções Criminais “Os interesses da sociedade são absolutamente superiores aos interesses individuais, e entre uns e outros deve estabelecer-se uma relação justa e harmônica.” 1 O Ministério Público, como se sabe, é órgão do Estado responsável pela defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis; é, portanto, legítimo representante dos interesses sociais e indisponíveis da sociedade. Depois de passar por difícil e concorrido concurso público, a sociedade – por meio de seus representantes: Comissão de Concurso e Procurador Geral – outorgam ao Promotor sua representação para todos atos processuais na esfera penal. E, como agente do Estado e representante da sociedade, não se pode esquecer que o Promotor de Justiça deve posicionar-se e agir sempre segundo o interesse maior daquela a quem representa. O Promotor de Justiça, enquanto agente do Estado, passa a atuar no processo penal representando os interesses da sociedade, da qual ele próprio faz parte. Sempre deverá agir com irrestrita observância aos princípios constitucionais e legais, mas nunca esquecendo que atua como representante da sociedade. Na área criminal, a atuação exercida de forma exclusiva e privativa pelo Ministério Público, ressalvada a exceção da ação penal privada, deve sempre pautar-se de forma a prestigiar os interesses daqueles que nomearam o Promotor para exercer sua representação. O Promotor de Justiça para agir de forma adequada, em especial atuando na área criminal, deve conhecer os anseios da sociedade. 1 Engels, Friedrich. A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. Editora Centauro, 2002, São Paulo, pág. 182/183 1 O conhecimento das aflições e angústias da sociedade é obtido por meio da interação, daí ser obrigação do Promotor de Justiça residir na comarca em que exerce suas atribuições (artigo 43, inciso X, da Lei Orgânica Federal, e artigo 169, inciso XVII, da Lei Orgânica Estadual). Ainda, o contato com o público também permite perceber as preocupações da coletividade. Contudo, se estes meios não permitem assimilar o anseio da sociedade, basta acompanhar veículos de comunicação para ter uma noção das preocupações que inquietam nossos semelhantes e representados. Conhecendo o que os preocupa saberemos qual deve ser o norte de nossa atuação. Qual é o clamor da sociedade de São Paulo e também do país na área criminal ? Há, sem dúvida, um clamor social no tocante à sensação de insegurança que acomete a todos. Qual Promotor de Justiça atuando na área criminal responderia afirmativamente a todas indagações a seguir: a) é possível andar de forma despreocupada e tranqüila durante a noite em qualquer lugar da capital de São Paulo? b) as mães permitem que seus filhos (crianças e adolescentes) caminhem sozinhos até a escola em que estudam? c) amigos e conhecidos podem sacar dinheiro em caixas eletrônicos sem qualquer preocupação com a segurança pessoal? d) as pessoas podem transitar com veículos, usando joias e relógios, parando em semáforos durante a madrugada sem preocupação com a segurança pessoal nas capitais do país? e) todas pessoas de seu relacionamento pessoal nunca foram vítimas de crime patrimonial? É provável que as respostas a estas perguntas tenham sido todas negativas. E, por esta razão, é forçoso reconhecer que a segurança ou sensação de segurança da sociedade não é adequada. Por esta razão, o Promotor de Justiça, como agente do Estado para representar os interesses da sociedade, deve pautar sua atuação sempre prestigiando a legalidade, mas ao interpretar a lei deve ter sempre em mente os anseios da sociedade. Vejamos algumas notícias veiculadas recentemente em dois jornais de São Paulo: 2 1) Coreano é morto ao proteger filho durante assalto na Zona Leste-SP – (Folha de São Paulo – 03/08/2011). 2) Decreto de prisão de Mizael e Evandro completa 1 ano. Acusados pela morte de Mércia Nakashima continuam foragidos. Os dois devem ir à júri popular. Alckmin garante que o Estado "trabalha duro" para capturar foragidos. (Estadão – 03/08/2011). 3) Polícia de SP quer criar delegacia específica para latrocínios (Folha – 04/08/2011). 4) Droga leva só 12% das crianças à cracolândia (Estadão – 04/08/2011). Nos casos acima referidos, estamos diante de crimes hediondos: latrocínio, homicídio qualificado e tráfico de entorpecentes; além de se noticiar a necessidade de criar uma Delegacia especializada em latrocínios!! Fácil, em face destas notícias, constatar que a sociedade clama – desesperadamente – por proteção e respostas aos seus anseios na área de segurança. É importante lembrar o objetivo da sociedade: reunião de pessoas unidas com o propósito de autoproteção, desenvolvimento conjunto e harmônico. Daí a citação no início deste manifesto, pois, como mencionou Engels: os interesses da sociedade devem sempre prevalecer em detrimento dos interesses dos indivíduos que a integram. Mais ainda, acrescenta-se, deve ser respeitado, prestigiado e enaltecido o interesse da maioria quando qualquer de seus integrantes atue contra seus semelhantes. Nesta última situação, qual seja: integrante da sociedade agindo contra o direito ou interesse da maioria, este (o infrator às regras de convivência social) deve sofrer a adequada punição. Para viabilizar a punição do infrator deve ser observado o procedimento legal; por isto, diante das alterações provocadas pela recente Lei nº 12.403/2011, alguns estudiosos já fizeram análises preliminares, inclusive por meio de artigos. Alguns apreciam e estimulam o posicionamento a ser adotado pelo Promotor de Justiça em face das inovações, sustentando a necessidade de um posicionamento firme para prestigiar os interesses da sociedade. 3 Entretanto, outros estudiosos afirmam que as inovações beneficiam os acusados de crimes e devem ser prestigiadas. Assim, para estes, deve prevalecer o interesse individual ao coletivo – direito da sociedade. Com todo o respeito que merecem aqueles que pensam de forma semelhante ao segundo posicionamento, mas ele é totalmente contrário aos anseios da sociedade. E porque alguns compartilham de posicionamento desta natureza, Mizael continua foragido e a sociedade sem resposta ao seu clamor; além disto, os índices de violência envolvendo egressos do sistema penitenciário é elevado, sem mencionar crimes envolvendo pessoas mantidas no sistema prisional. Como o Promotor de Justiça age em nome da sociedade, respeitando a lei, deve posicionar-se atendendo aos interesses de quem lhe outorgou sua representação: a sociedade. Portanto, postas estas premissas, pode-se concluir que a mais coerente interpretação das alterações promovidas pela Lei nº 12.403/2011, observando-se o encargo dado pela sociedade ao Promotor de Justiça que atua na área criminal e também aos que, por meio indireto, podem interferir na sensação de segurança, é aquela que enaltece o interesse da sociedade. Sem este compromisso do Promotor de Justiça, lamentavelmente, os índices de violência e sensação de segurança serão contrários aos interesses da sociedade, na qual estamos todos inseridos. 4