CALDAS, M. J. de , et al.
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OBSERVAÇÃO DE UM JOVEM NA ESCOLHA DE UMA PROFISSÃO (1835)
(BETRACHTUNG EINES JÜNGLINGS BEI DER WAHL EINES BERUFS)
Karl Marx.
Introdução, comentário e tradução de
Marcos José de Araújo Caldas,
Prof. Dr. História Antiga e Teoria da História/UFRRJ-IM.
RESUMO: CALDAS, M. J. de. Observação de um jovem na escolha de uma profissão (1835), (Betrachtung
Eines Jünglings Bei Der Wahl Eines Berufs). Revista Universidade Rural: Série Ciências Humanas, Seropédica,
RJ: EDUR, v. 29, n 2, p. 103-117, jul.-dez., 2007. Este pequeno ensaio é uma tentativa de analisar o mais representativo
texto do jovem Karl Marx - escrito durante os seus estudos secundários (1832-1835), ou seja, antes de sua fase ‘ideológicafilosófica’ propriamente dita - a fim de que se possa compreender seu contexto histórico e, simultaneamente, situar seu
pensamento no quadro geral de acontecimentos de sua época.
Palavras-chave: O Jovem Marx, Carreira, Humanismo, Biografia, Juvenilia e Bonn
RÉSUMÉ: CALDAS, M. J. de. Observação de um jovem na escolha de uma profissão (1835), (Betrachtung
Eines Jünglings Bei Der Wahl Eines Berufs). Revista Universidade Rural: Série Ciências Humanas, Seropédica,
RJ: EDUR, v. 29, n 2, p. 103-117, jul.-dez., 2007. Ce petit essai est une tentative d’analyser le plus representativ texte
du jeune Karl Marx - lequel il a écrit pendant ses études secondaires (1832-1835), c’est a dire avant de sa phase
‘ideologique-philosophique’ proprement dit - afin qu’on puisse saisir son contexte historique et, simultanément,
situer sa pensée dans le cadre général des événements.
Key Words: Le jeune Marx, Carrière, Humanisme, Biographie, Juvenilia et Bonn.
INTRODUÇÃO
Na visão de E. Hobsbawm
(Hobsbawm, 1971. pp.202-203), três ondas
revolucionárias tiveram impacto na Europa,
na primeira metade do século XIX: a primeira
delas ocorreu entre os anos de 1820 e 1824, e
tinha como cenário principal as colônias
americanas da Europa (Colômbia, Venezuela,
Equador, Argentina, Chile, Peru, Uruguai e
Brasil) (ibidem, pg. 203). Estes movimentos
coloniais no continente americano foram
marcados por um forte sentimento de liberdade
e autonomia, com verniz popular, sendo que
na Europa, como aquele da Espanha em 1820
e o de Nápoles no mesmo ano, não
reverberaram da mesma forma e, à exceção
da Grécia (1821), foram, no continente
europeu, logo sufocados (idem. pg. 203); a
segunda ola atingiu toda a Europa oriental,
parte da Europa ocidental e também a América
do Norte, entre os anos de 1829 e 1834 (idem.
pg.203). Os movimentos sociais que a
compunham tinham como inimigo comum as
frentes conservadoras que visavam à
Restauração das monarquias e das
aristocracias européias. Contudo, a diferença
mais flagrante desta para a primeira onda foi
o surgimento de uma “classe trabalhadora
como força política independente”(idem. pg.
205)1, atuando na Inglaterra e na França, no
passo largo da expansão industrial, como
elemento catalisador dos que desejavam
mudanças profundas nos regimes políticos. O
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p.103-117, 2007.
Observação de um jovem na escolha de uma profissão...
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clima de sublevação política contra as forças
reacionárias, somado às péssimas condições
de vida do crescente mercado de reserva de
mão-obra, excluía mais e mais do horizonte
uma solução política reformista. Não
obstante a envergadura que adquiriram,
hasteando a bandeira proletária em vários
cantos da Europa, o medo da anarquia, as
guerras civis e a repressão violenta a alguns
destes movimentos provocaram um
retraimento do impulso revolucionário. A
terceira e derradeira onda, iniciou-se entre
anos de 1834 e 1835, arrebentando no ano
de 1848 e, ao contrário dos dois últimos
vagalhões, o mar encrespado de 1835
anunciava que os ventos de protestos
deixavam aos poucos de ser meramente antiaristocráticos e anti-burgueses para se
tornarem anticapitalistas (idem. pp. 206,
209-238). Estupefato, Victor Hugo escreve
à propos daquele ano 1848 a atmosfera das
ruas de Paris:
“A barricada de Santo
Antônio era monstruosa, tinha
a altura de três andares de
casas e setecentos pés de
largura. Fechava, de um a
outro ângulo, a vasta
embocadura do arrabalde, isto
é, três ruas; cheia de
barrancos, de lixos, com uma
abertura longa e estreita como
um grande rasgão, sustentada
e resguardada por grandes
amontoações que eram por si
mesmas outros bastiões,
formando cabos num e noutro
ponto, fortemente apoiada aos
dois grandes promontórios de
casas do arrabalde, surgia como
um dique extraordinário no
fundo do temível local que
presenciou o 14 de julho (...).
De que era feita esta barricada?
Dos despojos de três mansões
de seis andares demolidas
propositadamente, diziam uns.
Do prodígio de todas as cóleras,
diziam outros. Ela tinha o
aspecto lamentável de todas as
construções do ódio: a ruína.
Poder-se-ia dizer: quem a
construiu? Poder-se-ia também
dizer: quem a destruiu? (...) Se
o oceano fizesse diques devia
construí-los assim. A fúria da
vaga estava impressa sobre este
escombro disforme. Qual vaga?
A Multidão.” (Les Miserables,
Volume V, Jean Valjean
Chapter 3.V.1.1)2
Se em relação à época precedente, ao
menos até 1815, quando guerras entre os
diferentes Estados europeus marcavam a pauta
da política internacional, ocorreu a diminuição
do enfrentamento interestatal das potências
européias, foi também inaugurada, a partir de
Waterloo (1815), uma nova fase nos conflitos
no que diz respeito aos movimentos
revolucionários: de um lado, a quase ausência
de guerras neste período entre os Estados
europeus resultou numa intensificação das
ações de conquista militar destas potências no
ultra-mar, o que insuflou ainda mais as citadas
1
Ibidem. op.cit. pg. 205.
La barricade Saint-Antoine était monstrueuse; elle était haute de trois étages et large de sept cents pieds. Elle barrait
d’un angle à l’autre la vaste embouchure du faubourg, c’est-à-dire trois rues; ravinée, déchiquetée, dentelée, hachée,
crénelée d’une immense déchirure, contre-butée de monceaux qui étaient eux-mêmes des bastions, poussant des caps
çà et là, puissamment adossée aux deux grands promontoires de maisons du faubourg, elle surgissait comme une levée
cyclopéenne au fond de la redoutable place qui a vu le 14 juillet (...)De quoi était faite cette barricade? De l’écroulement
de trois maisons à six étages, démolies exprès, disaient les uns. Du prodige de toutes les colères, disaient les autres.
Elle avait l’aspect lamentable de toutes les constructions de la haine: la ruine. On pouvait dire: qui a bâti cela? On
pouvait dire aussi: qui a détruit cela? (...) Si l’océan faisait des digues, c’est ainsi qu’il les bâtirait. La furie du flot
était empreinte sur cet encombrement difforme. Quel flot? la foule.
3
Fato que se nota pelo nome das grandes usinas metalúrgicas (Königshütte, Königshuld e Königsgrube). Cf. Landes,
1994. pg. 187.
2
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p. 103-117, 2007.
CALDAS, M. J. de , et al.
campanhas de independência das colônias
européias (Kennedy; 1989. pg. 144); de outro,
fez com que boa parte da massa operária
européia, envolvidas vez por outra em
conflitos entre os Estados-Nações, se voltasse
para os problemas internos de cada Estado,
caracterizando esta fase do movimento
revolucionário de nacionalista (Hobsbawm,
1971. pp. 209-220, 239-261) . A embrionária
consciência anticapitalista dos movimentos
populares atraía para si não apenas milhares
de deserdados dos regimes políticos vigentes,
mas também desempregados de toda sorte,
desprivilegiados que viam na revolução o
único meio de câmbio social. Não se tratava
mais de uma luta anti-estamental, como aquela
vivida nos anos da Revolução Francesa, e sim,
agora, de uma luta de classes, travada nos
intestinos das diferentes potências européias.
Ao tempo da primeira onda, a
Alemanha não passava de um conglomerado
de 39 Estados, com grão-ducados, ducados,
principados e cidades livres, a maior parte sob
a autoridade do rei da Prússia, Frederico
Guilherme III (1797-1840) (Atlas, 1990. –324325). Em 1818, inicia-se um movimento com
105
vistas a superar os 38 diferentes sistemas
tarifários no interior da Alemanha, o qual se
consuma com a União Alfandegária ou
Zollverein em 1834 (Landes, 1994. pp.173200). Na Renânia, província sob forte
influência francesa, reincorporada à Prússia
em 1815 após a derrota de Napoleão, e onde
ficava o grosso da indústria siderúrgica alemã,
a liberalização econômica se dava sob grande
controle do Estado régio (Landes, 1994. pg.
187)3 e não conduziu a uma abertura política
de mesma proporção, como visto nas eleições
às assembléias parlamentares 1834, cujo
caráter consultivo e timocrático diminuía
sobremaneira o poder de representação dos
eleitos (Attali, 2007. pg. 28). Protestos
rebentaram em toda Alemanha, neste e no ano
seguinte (1835), sucedidos de uma intensa
repressão e censura aos órgãos de imprensa
(Cornu, 1955. pg. 19). Em dezembro de 1835,
ano divisório para a Alemanha pela sua nova
tensão política, alguns escritores como Mund,
Gutzkow, Laube e entre outros, pertencentes
ao grupo da “Jovem Alemanha”, de cunho antiromântico e contra-reacionário, serão
perseguidos, e outros, como Heine e Borne,
que já se encontravam em exílio, terão seus
escritos proibidos (Cornu, 1955. pp. 18-19).
(Casa
onde Marx nasceu em 5 de maio de 1818 em Trier, Brückengasse 664, onde hoje funciona um museu e uma
fundação à memória de Karl Marx. Fonte: Marx: Betrachtungen eines Jünglings bei der Wahl seines Berufes, S. 2.
Digitale Bibliothek Band 11: Marx/Engels, Berlim: Directmedia, pg. 13643, 1998).
4
5
Chronica marxiana (MEGA)
Althusser (1965/66) em Pour Marx sequer cita estes escritos.
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p.103-117, 2007.
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Observação de um jovem na escolha de uma profissão...
Em geral, os biógrafos (Easton,
Guddat, 1967. pp 1-4, 35; Wheen, 2001. pg.
17; Fedossiev, 1983. pp 14-15; Mclellan,
1990. pp. 22-24; Konder, 1968. pp. 33-34;
Cornu, 1955, pg. 64) dão pouca atenção aos
escritos de Marx que precedem sua ida a Bonn,
em parte com razão, em face de sua imensa e
significativa obra da maturidade. Quando o
fazem apontam Betrachtung como o mais
significativo dentre o espólio juvenil. 1 Em
geral estes biógrafos inclinam-se a encarar a
Betrachtung em relação ao desenvolvimento
de seu pensamento posterior, situando-o
primeiramente como um jovem idealista
hegeliano à gauche, e mais a frente como um
materialista dialético (Easton, Guddat pg. 1)2
Não obstante, nota-se que o rapazola de 17
anos possui uma grandiloqüência original e
representa uma testemunha privilegiada da
atmosfera intelectual da pequena Trier
daqueles anos, pertencendo este escritos, ao
todo 7, portanto, a uma fase pré-hegeliana, e
até mesmo, digamos, ‘pré-marxista’. O
presente ensaio – Betrachtung eines Jünglings
bei der Wahl eines Berufs – pertence ao
período em que Marx prestara os exames finais
(Abiturientenarbeiten) no antigo Ginásio de
Trier e é, pois, um testemunho daqueles
últimos meses que antecedem sua ida a Bonn
em finais de setembro. Segundo nos informa
o aparato crítico, organizado pelo Institut für
Marxismus-Leninismus sob a direção do
comitê central do Partido Comunista da União
Soviética em cooperação com Institut für
Marxismus-Leninismus, com a supervisão do
comitê central do Partido Unitário Socialista
da Alemanha, o manuscrito original é
composto de seis páginas sem pauta, os quais
foram preenchidos por Marx em colunas que
posteriormente receberam uma numeração.
Sua primeira publicação veio a lume sob os
cuidados de Carl Grünberg, em um trabalho
intitulado “Marx als Abiturient”, atualmente
no Archiv für Geschichte des Sozialismus und
der Arbeiterbewegung. Jg. 11. Leipzig 1925,
página 4333.
(Foto do Ginásio Jesuíta Frederico Guillherme em Trier. Fonte: [Marx: Betrachtungen eines Jünglings bei der Wahl
seines Berufes, S. 2. Digitale Bibliothek Band 11: Marx/Engels, S. 13643 (vgl. MEW Bd. 40, S. 591)]
6
Introd. Pg. 01. Termo que foi provavelmente cunhado pela primeira vez apenas em 1891, por G. V. Plekhanov . Roy
Edgley Dialectical Materialism. Pp. 120-121.
7
Até onde pude verificar a Betrachtung jamais foi traduzida em língua portuguesa na íntegra. Pequenos trechos
aparecem em nossa língua em algumas obras, fornecendo uma idéia inexata do texto.
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CALDAS, M. J. de , et al.
O primeiro dos exames feitos pelo jovem
Marx, em 10 de agosto de 1835, foi um ensaio sobre Religião, com o título Die
Vereinigung der Gläubigen mit Christo nach
Johanes 15,1-14, in ihrem Grund und Wesen,
in ihrer unbedingten Notwendigkeit und in
ihren Wirkungen dargestellt (União dos Crentes com Cristo, segundo João 15, 1-14, representada em seu fundamento e essência, em sua
necessidade incondicional e em seus efeitos)
(doravante Vereinigung), seguido de uma tradução do grego dos versos 140-176 da peça
de Sófocles, As Traquínias, um excerto sobre
Djanira, esposa do mitológico herói Hércules.
Em 12 de agosto, segundo dia de avaliação,
Marx redige uma pequena redação em vernáculo com o título Betrachtung eines Jünglings
bei der Wahl eines Berufs (doravante
Betrachtung), tema do atual estudo. No terceiro dia de exames, Marx é testado sobre seus
conhecimentos em francês e escreve um pequeno texto com o curioso e atual título,
“Exemples, qui servent à prouver, que
l’homme peut motiver les influences du climat,
qu’il habite” (Exemplos que servem para provar que o homem pode ter influências sobre
clima, que ele habita) (doravante Exemples).
No dia 14, Marx se submete às avaliações em
Matemática (geometria, trigonometria e álgebra). No dia seguinte foi a vez dos conhecimentos em Latim, por meio dos quais redigiu
um erudito texto sobre a Época de Augusto
com o nome de An principatus Augusti merito
inter feliciores reipublicae Romanae aetates
numeretur? (Conta-se merecidamente o principado de Augusto entre as mais felizes épocas da República Romana?) (doravante An
principatus). No dia 17 de agosto, por fim,
Marx consagra um ensaio ao ‘círculo de
Hemsterhusius’ com o título De Hemsterhusii
moribus (Sobre o caráter de Hemsterhusius)
(doravante De Hemsterhusii) . Em 24 de setembro daquele mesmo ano, Marx recebe o
seu certificado de concludente. Conforme o
regulamento da prova (MEGA, 1975. pg.1197)
“a redação deve manifestar o conhecimento
geral do examinando, preferencialmente a formação de seu entendimento e de sua imaginação, como também o grau de amadurecimen-
107
to de seu estilo em relação à precisão e à
concatenação do pensamento, bem como a
apresentação e a disposição planejada de todo
o texto, sem erros, naturalmente em um modo
de escrever compatível com o assunto”. Pelo
visto, na avaliação geral (Gesamteinschätzung)
de seu professor, logo abaixo do texto, seu
desempenho foi bastante bom (ziemlich gut),
mas com ressalvas. Consoante seu avaliador,
o diretor Wyttenbach, “recomenda-se o trabalho por sua riqueza de pensamentos e por uma
boa disposição metódica. Aliás, por isso mesmo, o autor recai também aqui em seus habituais erros, em uma busca exagerada por expressões metafóricas e difusas; por isso, falta
à composição, nas muitas passagens marcadas,
a necessária clareza e precisão, e
freqüentemente exatidão (ao escrever), como
em algumas sentenças isoladas, por exemplo,
em períodos compostos” (vide infra).
(Fac-símile
da primeira
do certificado
de certificado
conclusão ginasial,
(Fac-símile
dapágina
primeira
página do
de expedido em 24 de setembro de
1835. Fonte: MEGA)
conclusão ginasial, expedido em 24 de setembro de
1835. Fonte: MEGA)
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Observação de um jovem na escolha de uma profissão...
Em quase todos eles dois temas em
comum: o primeiro deles é a sua preocupação
com o outro, com o próximo, enlaçando o
Homem em uma situação de mútua
responsabilidade, de compromisso recíproco,
em altruísmo que pode chegar ao autosacrifício. Marx manifesta plenamente esta
preocupação no texto da Vereinigung: “Aber
diese Liebe zu Christus ist nicht fruchtlos, sie
erfüllt uns nicht nur mit der reinsten Verehrung
und Hochachtung gegen ihn, sondern sie
bewirkt auch, dass wir seine Gebote halten,
indem wir uns für einander aufopfern (...)”
(Mas este amor a Cristo não é infrutífero, ele
nos preenche não apenas com a mais pura
admiração e estima para com Ele, mas antes
ele atua também de modo que nós guardemos
seus mandamentos ao nos sacrificarmos uns
pelos outros)” (pg. 451, l. 41 e pg. 452 l. 12). Destarte também escreve Karl em tom
edificante em sua redação De Hemsterhusii o
exemplo do historiador grego Xenofonte (440/
426-355 a.C.), que, ao receber a notícia, em
meio a uma cerimônia religiosa, de que seu
amado filho Gryllo falecera em terras
distantes, manteve-se firme, não permitindo
que sua tristeza também se abatesse sobre seus
convidados, até que os ritos finais fossem
cumpridos (Tali firmitate germanus ille
socraticae scholae discipulus, Xenophon, in
sacrificando morte filii Grylli ei nuntiata,
usque dum solemnem perfecerat
sacrificationem, distulit tristitiam). “Com tal
firmeza, aquele verdadeiro discípulo da escola
socrática, Xenofonte, quando foi anunciada
para ele a morte, por sacrifício, do seu filho
Gryllo, protelou a tristeza, até que fosse
consumado o sacrifício solene”; em segundo
lugar, sua atenção está voltada à relação do
Homem com seu Meio, mas não do Homem
individualmente pensado, antes do Homem em
sociedade, o qual cria modos de vida
específicos, ou seja, do Homem em sua
cultura, e da relação deste com a realidade
que o cerca. Assim o é na passagem dos
Exemples, quando Karl analisa a causa da
modificação climática na Pensilvânia (EUA),
que, embora situada no mesmo paralelo da
Alemanha, sofria com o aumento da
temperatura, a qual parecia ser provocada,
entre outras coisas, por uma mudança nas
correntes eólicas: “La face d’un pays peut être
metarmophosée (sic) entièrement par culture,
et on sera convaincu, en recherchant la cause
des vents, que leur cour puisse prendre de
même une novelle direction” (a face de um
país pode ser inteiramente modificada pela
cultura, e a gente estará convencido,
investigando a origem dos ventos, que seu
curso pode tomar, da mesma maneira, uma
nova direção) (pg. 458, l. 13-15). Ambos os
temas são desenvolvidos de modo articulado
na Betrachtung. Nela, Marx disserta sobre a
importância da escolha acertada de uma
profissão, a qual determinará o percurso
individual de toda uma vida. Como então
tomar a decisão certa, com base apenas em
impressões gerais? De que maneira julgar
nossa melhor aptidão para preencher nossas
ambições? De um lado, responde Marx,
devemos perscrutar no mais íntimo de nosso
coração as suas razões; de outro, julguemos
nossas opções pela sua finalidade última, a
qual deve ser necessariamente o Bem Comum.
É fácil distinguir aqui as lições – meio toscas
- retiradas da Ética a Nicômacos e da Política
de Aristóteles, para quem a finalidade suprema
do Homem é a busca da felicidade da polis, i.
é, a comunidade de cidadãos gregos. Para este
fim, conforme Marx, a Natureza/Divindade/
Criação (Natur/Gottheit/Schöpfung)– termos
intercambiáveis em toda a redação - colabora
com o Homem decisivamente, determinando
seu fim último, isto é, enobrecer a própria
Humanidade. No entanto, a divindade deixou
ao Homem os meios para alcançar este fim,
não apenas individualmente, mas também em
sociedade. Como notou um de seus biógrafos
(Mclellan, 1990. pg. 240), sua concepção
deísta de divindade é não-transcendente, de
modo que sua visão de ação social se ajuste à
imanência do processo histórico. Os
8
Weber – Ética.
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CALDAS, M. J. de , et al.
obstáculos que se nos impõem na escolha de
uma profissão, sejam eles frutos de nossas
ambições fantasiosas ou de nossas limitações
físicas e sociais, servem para aperfeiçoar nosso
senso de adequação moral e social à profissão
escolhida. Marx, como bem disse outro
biógrafos, “reconhece a existência de um
conflito entre as determinações “ideais” e
determinações “materiais” da vida humana”
(Attali, 2007, pg 30). Mas a quem recorrer
quando nossa razão nos falha? É nítido aqui o
entendimento que Marx possui da descoberta
da vocação (Beruf) individual. Sua educação
protestante apelará à voz interior da divindade.
Com ela Marx entende que atende não apenas
o chamado da divindade, mas também a um
‘convocação’ social. No entanto,
diferentemente do protestantismo luterano, ao
menos na sua versão weberiana, que apregoa
uma acomodação da vocação à posição social
já existente, pois a considera uma tarefa
confiada por Deus1, Marx entende que convém
ao próprio Homem examinar, primeiro junto
aos pais, seus ancestrais imediatos, depois na
sociedade o lugar que melhor lhe cabe pois:
109
“Nossas relações em sociedade já de certo
modo se iniciaram antes mesmo que nós
estivéssemos em condição de determiná-las”.
Há aqui, em termos simples, a compreensão
de Marx, na linha dos empiristas inglesas
Locke e Hume, de que conhecimento humano
não é formado em uma tabula rasa, isto é,
em um papel em branco, onde são escritas
nossas fantasias, nossas experiências e todo
nosso conhecimento, mas antes, depende da
experiência, não apenas daquela experiência
imediata externa, mas também do
entendimento de um mundo que nos precede,
do hábito diria Hume. Mas aqui há um salto:
para o jovem Karl este entendimento do
mundo depende de sua esfera social. Ela é
sua condição determi nante e sua
determinação advém da relação dos Homens
em sociedade. Para Karl, será esta experiência
determinante que levará o jovem a escolha
acertada de sua vocação. Entre as vocações,
Marx divisa a possibilidade de ser tornar
poeta (pg. 457, l. 23) e é em tom poético que
encerrará sua redação.
(gravura feita em 1836 de Karl Marx em seus tempos de estudante em Bonn. Fonte: Marx: Betrachtungen eines
Jünglings bei der Wahl seines Berufes, S. 2. Digitale Bibliothek Band 11: Marx/Engels, Berlim: Directmedia, pg.
13643, 1998. ).
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Observação de um jovem na escolha de uma profissão...
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Betrachtung eines Jünglings
bei der Wahl eines Berufs.1
Dem Thiere hat die Natur selber den
Wirkungskreis bestimmt, in welchem
es sich bewegen soll und ruhig
vollendet es denselben, ohne über ihn
hinauszustreben, ohne auch nur einen
anderen zu ahnen. Auch dem Menschen
gab die Gottheit ein allgemeines Ziel,
die Menschheit und sich zu veredlen,
aber sie überließ es ihm selber, die
Mittel aufzusuchen, durch welche er es
erringen kann; sie überließ es ihm, den
Standpunkt in der Gesellschaft zu
wählen, der ihm am angemessensten ist,
von welchem aus er sich und die
Gesellschaft am besten erheben kann.
Diese Wahl ist ein großes Vorrecht vor
den übrigen Wesen der Schöpfung, aber
zugleich eine That, die sein ganzes
Leben zu vernichten, alle seine Pläne
zu vereiteln, ihn unglücklich zu machen
vermag. Diese Wahl ernst zu erwägen,
ist also gewiß die erste Pflicht des
Jünglings, der seine Laufbahn beginnt,
der nicht dem Zufall seine wichtigsten
Angelegenheiten überlassen will.
Jeder hat ein Ziel, ein Ziel, das ihm
wenigstens groß scheint, vor Augen,
das auch groß ist, wenn die tiefste
Ueberzeugung, die innerste Stimme des
Herzens es so nennt, denn die Gottheit
läßt den Irdischen nie ganz ohne
Führer; sie spricht leise aber sicher.
Leicht aber wird diese Stimme
übertäubt und, was wir für Begeistrung
gehalten, kann der Augenblick erzeugt
haben, wird der Augenblick vielleicht
auch wieder vernichten. Unsere
Phantasie ist vielleicht entflammt, unser
Gefühl erregt. Scheinbilder gaukeln um
unser Auge und begierig stürzen wir zu
dem Ziele, von dem wir wähnen, die
Gottheit selbst habe es uns gezeigt;
aber, was wir glühend an unseren Busen
gedrückt, stößt uns bald zurück und
unsre ganze Existenz sehn wir
vernichtet.
Wir müssen daher ernst prüfen, ob wir
wirklich für einen Beruf begeistert sind,
ob eine Stimme von Innen ihn billigt,
oder ob die Begeisterung Täuschung,
das, was wir für einen Ruf der Gottheit
gehalten, Selbstbetrug gewesen ist. Wie
aber vermögen wir dieses zu erkennen,
als wenn wir der Quelle der
Begeistrung selbst nachspüren?
Das Große glänzt, der Glanz erregt
Ehrgeitz und der Ehrgeitz kann leicht
die Begeisterung, oder, was wir dafür
gehalten, hervorgerufen haben; aber,
wen die Furie der Ehrsucht lockt, den
vermag die Vernunft nicht mehr zu
zügeln, und er stürzt dahin, wohin ihn
der ungestümme Trieb ruft: er wählt
sich nicht mehr seinen Stand, sondern
Zufall und Schein bestimmen ihn.
Und nicht zu dem Stande sind wir
berufen, in welchem wir am meisten zu
glänzen vermögen; er ist nicht
derjenige, der in der langen Reihe von
Jahren, in welchen wir ihn vielleicht
verwalten, uns nie ermatten, unsern
Eifer nie unter sinken, unsere
Begeistrung nie erkalten läßt, sondern
bald werden wir unsere Wünsche nicht
gestillt, unsere Ideen nicht befriedigt
9
O texto foi transcrito tal qual se encontra nas páginas da MEGA, 454-457, mantendo a grafia anterior à reforma
ortográfica de 1901.
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p. 103-117, 2007.
CALDAS, M. J. de , et al.
sehn, der Gottheit grollen, der
Menschheit fluchen.
Aber nicht nur der Ehrgeitz kann
eine plötzliche Begeisterung für einen
Stand erregen, sondern vielleicht haben
wir denselben durch unsere Phantasien
ausgeschmückt und die hat ihn zu dem
Höchsten, was das Leben zu bieten
vermag, ausgeschmückt. Wir haben ihn
nicht zergliedert, nicht die ganze Last
betrachtet,
die
große
Verantwortlichkeit, die er auf uns wälzt;
wir haben ihn nur von der Ferne gesehn
und die Ferne täuscht.
Hierinn kann unsre eigne Vernunft nicht
die Rathgeberinn sein; denn weder
Erfahrung, noch tiefere Beobachtung
unterstützen sie, während sie von dem
Gefühle getäuscht, von der Phantasie
geblendet wird. Zu wem sollen wir aber
die Blicke wenden, wer soll uns da
unterstützen, wo unsere Vernunft uns
verläßt?
Die Eltern, die schon die Bahn des
Lebens durchwandelt, die schon die
Strenge des Schicksals erprobt haben,
ruft unser Herz.
Und wenn dann noch unsere
Begeisterung fortwährt, wenn wir dann
noch den Stand lieben und für ihn
berufen zu sein glauben, nachdem wir
ihn kalt geprüft, nachdem wir seine
Lasten erblickt, seine Beschwerden
kennen gelernt haben, dann dürfen wir
ihn ergreifen, dann täuscht uns weder
Begeisterung, noch reißt uns
Uebereilung dahin.
Aber wir können nicht immer den
Stand ergreifen, zu dem wir uns berufen
glauben; unsere Verhältnisse in der
Gesellschaft haben einigermaßen schon
begonnen, ehe wir sie zu bestimmen im
Stande sind.
111
Schon unsere physische Natur stellt
sich oft drohend entgegen und ihre
Rechte wage keiner zu verspotten.
Wir vermögen zwar, uns über
dieselbe zu erheben; aber dann sinken
wir desto schneller unter, dann wagen
wir ein Gebäude auf morsche Trümmer
zu erbauen, dann ist unser ganzes
Leben ein unglücklicher Kampf
zwischen dem geistigen und
körperlichen Prinzip. Wer aber nicht in
sich selbst die kämpfenden Elemente
zu stillen vermag, wie soll sich der dem
wilden Drange des Lebens
entgegenstellen können, wie soll er
ruhig handlen und aus der Ruhe allein
können große und schöne Thaten
emportauchen; sie ist der Boden, in
dem allein gereifte Früchte gedeihn.
Obgleich wir mit einer physischen
Natur, die unserem Stande nicht
angemessen ist, nicht lange und selten
freudig wirken können, so erhebt doch
stets der Gedanke, unser Wohl der
Pflicht aufzuopfern, schwach dennoch
kräftig zu handlen; allein, wenn wir
einen Stand gewählt, zu dem wir nicht
die Talente besitzen, so vermögen wir
ihn nie würdig auszufüllen, so werden
wir bald beschämt unsere eigene
Unfähigkeit erkennen und uns sagen,
daß wir ein nutzloses Wesen in der
Schöpfung, ein Glied in der
Gesellschaft sind, das seinen Beruf
nicht erfüllen kann. Die natürlichste
Folge ist dann Selbstverachtung und
welches Gefühl ist schmerzlicher,
welches vermag weniger durch alles,
was die Außenwelt bietet, ersezt zu
werden? Selbstverachtung ist eine
Schlange, die ewigwühlend die Brust
zernagt, das Lebensblut aus dem
Herzen saugt und es mit dem Gifte des
Menschenhasses und der Verzweiflung
vermischt.
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p.103-117, 2007.
Observação de um jovem na escolha de uma profissão...
112
Eine Täuschung über unsere Anlagen
für einen Stand, den wir näher
betrachtet, ist ein Vergehn, das rächend
auf uns selbst zurückfällt, das, wenn es
auch nicht von der Außenwelt getadelt
wird, in unserer Brust eine
schrecklichere Pein erregt, als jene
hervorzurufen vermag.
Haben wir dieses alles erwägt und
gestatten unsere Lebensverhältnisse,
einen beliebigen Stand zu wählen, so
mögen wir den ergreifen, der uns die
größte Würde gewährt, der auf Ideen
gegründet ist, von deren Wahrheit wir
durchaus überzeugt sind, der das größte
Feld darbietet, um für die Menschheit
zu wirken und uns selbst dem
allgemeinen Ziele zu nähern, für
welches jeder Stand nur ein Mittel ist,
der Vollkommenheit.
Die Würde ist dasjenige, was den
Mann am meisten erhebt, was seinem
Handlen, allen seinen Bestrebungen
einen höheren Adel leiht, was ihn
unangetastet, von der Menge
bewundert und über sie erhaben
dastehn läßt.
Würde kann aber nur der Stand
gewähren, in welchem wir nicht als
knechtische Werkzeuge erscheinen,
sondern wo wir in unserem Kreise
selbständig schaffen; kann nur der
Stand gewähren, der keine
verwerfliche, selbst dem Anscheine
nach nicht verwerfliche Thaten
erheischt, den der Beste mit edlem
Stolze ergreifen kann. Der Stand, der
dieses am meisten gewährt, ist nicht
immer der höchste, aber stets der
vorzüglichste.
Wie aber ein Stand ohne Würde uns
erniedrigt, so erliegen wir sicher unter
der Last eines solchen, der auf Ideen
gegründet ist, die wir später als falsch
erkennen.
Da sehn wir keine Hülfe mehr, als
in der Selbsttäuschung und welche
verzweifelte Rettung, die Selbstbetrug
gewährt!
Jene Stände, die nicht sowohl in das
Leben eingreifen, als mit abstrakten
Wahrheiten sich beschäftigen, sind die
gefährlichsten für den Jüngling, dessen
Grundsätze noch nicht gediegen,
dessen Ueberzeugung noch nicht fest
und unerschütterlich ist, obwohl sie
zugleich als die erhabensten
erscheinen, wenn sie tief in der Brust
Wurzeln geschlagen haben, wenn wir
für die Ideen, die in ihnen herrschen,
das Leben und alle Bestrebungen zu
opfern vermögen.
Sie können den beglücken, der für
sie berufen ist, allein sie vernichten den,
der sie übereilt, unbesonnen, dem
Augenblicke gehorchend, ergreift.
Die hohe Meinung hingegen, die wir
von den Ideen haben, auf die unser
Stand gegründet ist, leiht uns einen
höheren Standpunkt in der
Gesellschaft, vergrößert unsre eigne
Würde, macht unsere Handlungen
unerschütterlich.
Wer einen Stand erwählt, den er
hoch schäzt, der wird davor
zurückbeben sich seiner unwürdig zu
machen, der wird schon deßwegen edel
handlen, weil seine Stellung in der
Gesellschaft edel ist.
Die Hauptlenkerinn aber, die uns bei
der Standeswahl leiten muß, ist das
Wohl der Menschheit, unsere eigne
Vollendung. Man wähne nicht diese
beiden Intressen könnten sich feindlich
bekämpfen, das eine müsse das andre
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p. 103-117, 2007.
CALDAS, M. J. de , et al.
vernichten, sondern die Natur des
Menschen ist so eingerichtet, daß er
seine Vervollkommnung nur erreichen
kann, wenn er für die Vollendung, für
das Wohl seiner Mitwelt wirkt. Wenn
er nur für sich schafft, kann er wohl ein
berühmter Gelehrter, ein großer Weiser,
ein ausgezeichneter Dichter, aber nie
ein vollendeter, wahrhaft großer
Mensch sein.
Die Geschichte nennt diejenigen als
die größten Männer, die, indem sie für
das Allgemeine wirkten, sich selbst
veredelten; die Erfahrung preißt den als
den Glücklichsten, der die meisten
glücklich gemacht; die Religion selber
lehrt uns, daß das Ideal, dem alle
nachstreben, sich für die Menschheit
geopfert habe und wer wagte solche
Aussprüche zu vernichten?
Wenn wir den Stand gewählt, in dem
wir am meisten für die Menschheit
Observação de um jovem na escolha de
uma profissão1 (Footnotes)
A Natureza, ela própria,
determinou para o animal o campo de ação,
no qual este deve se mover, e ele próprio o
completa naturalmente, sem que ela tenha
maiores expectativas em relação a ele, sem que
sequer um suspeite do outro. Também a
divindade ofereceu ao Homem uma finalidade
geral, a saber, enobrecer o próprio Homem e
a Humanidade. No entanto, ela deixou aos
cuidados do mesmo Homem procurar os meios
pelos quais ele possa alcançar isto. Ela deixou
ao seu critério escolher sua posição na
sociedade, que para ele é a mais adequada, a
partir da qual ele pode se elevar, ele, e a
sociedade.
10
113
Esta escolha é um grande
privilégio perante os outros seres da Criação,
mas também um ato que pode destruir toda a
sua vida, frustrar todos os seus planos, pode
fazê-lo infeliz. Portanto, ponderar esta escolha
seriamente é a primeira obrigação de um jovem
que começa sua carreira, que não deseja deixar
seus mais importantes assuntos ao acaso. Cada
um tem um objetivo, um objetivo que para ele
ao menos parece grande, se a mais profunda
convicção, se a mais íntima voz assim o
considera, pois a divindade jamais deixa o
mortal sem guia, ela fala suave, mas com
segurança.
Porém esta voz é facilmente
sufocada, e o que nós tomávamos por
inspiração produzida pelo momento é talvez
em um instante outra vez aniquilada. Nossa
fantasia é numa outra ocasião inflamada, nosso
sentimento é excitado. Espectros voltejam ao
redor de nossos olhos e nos precipitamos
ávidos para o (nosso) objetivo o qual julgamos
que a própria divindade nos tenha mostrado.
Entretanto, o que nos cinge ao nosso peito,
repele-nos logo de volta e vemos toda nossa
existência aniquilada.
Nós precisamos por isso verificar
seriamente se nós realmente estamos
entusiasmados por uma profissão, se uma voz
do íntimo a aprova, ou se o entusiasmo foi uma
ilusão sobre si próprio, que pensávamos um
chamado da divindade. Como podemos,
todavia,
reconhecê-la,
como
se
investigássemos a fonte do entusiasmo
mesmo?
A grandeza brilha, o brilho provoca
a ambição e a ambição pode facilmente ter
causado o entusiasmo, ou aquilo que nós
tomamos por. Entretanto, quem é atraído à
ambição pelas Fúrias, e que a razão não pode
mais refrear, cai até lá, onde instinto impetuoso
o chama.
E não mais evocaremos uma
profissão na qual nós podemos brilhar ao
MEGA I/1
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p.103-117, 2007.
114
Observação de um jovem na escolha de uma profissão...
máximo; ela não é aquela que em uma longa
série de anos, na qual nós jamais esmorecemos
nosso fervor jamais diminui, nosso entusiasmo
jamais esfria, antes logo nossos desejos não
serão saciados, nossas idéias satisfeitas, a
divindade ressente, a humanidade amaldiçoa.
Mas não é apenas a ambição que
pode despertar um repentino entusiasmo por
uma posição (profissão), antes talvez nós
tenhamos a enfeitado por intermédio de nossas
fantasias, e de tal modo a adornado que [faz
parecer] o mais alto (valor) que a vida pode
oferecer. Nós não dissecamos, nem
consideramos
todo
fardo,
toda
responsabilidade que esta profissão se nos
impõe; nós a vimos somente à distância e a
distância ilude.
Aqui nossa razão não pode ser
nossa conselheira, pois nem a experiência, nem
a observação mais penetrante auxiliam-na
enquanto ela for iludida pelo sentimento/
emoção, for cega pela fantasia. A quem então
devemos nos voltar? Quem deve nos auxiliar,
onde nossa razão nos desampara?
Pelos (nossos) pais que já
percorreram o trajeto da vida, que já
experimentaram a dureza do destino conclama nosso coração! E então se nosso
entusiasmo ainda perseverar, se nós amarmos
ainda a profissão, e acreditarmos sermos para
ela chamados após termos provado sua
indiferença, após termos visto seus encargos,
após termos conhecido suas dificuldades,
então devemos agarrá-la, então nem o
entusiasmo nos ilude, nem a precipitação se
apodera de nós aí.
Mas nós nem sempre alcançamos
a posição que nós acreditamos a que fomos
chamados. Nossas relações em sociedade já
de certo modo se iniciaram antes mesmo que
nós estivéssemos em condição de determinálas. Nossa constituição física já
frequentemente se nos opõe de modo iminente
e ninguém arrisca zombar de seus direitos
Nós podemos nos elevar acima
disso, é verdade, mas então caímos mais
rápido, ao ousarmos então construir um
edifício por sobre ruínas podres, e em seguida
toda nossa vida será um luta inglória entre o
princípio espiritual e o princípio físico. Porém
quem não consegue apaziguar em si próprio
os elementos em disputa, como ele pode
proceder serenamente? Apenas da serenidade
podem grandes e belos feitos assomarem; ela
é o único solo no qual frutos maduros medram.
Embora nós, com uma constituição
física que não seja adequada a nossa profissão,
possamos agir por pouco tempo e raramente a
contento, não obstante o pensamento
constantemente desperta nosso sentido de
cumprimento do dever, ainda que robustos
estejamos enfraquecidos para atuar.
Unicamente, se nós escolhemos uma profissão
para qual nós não possuímos talento, nós
jamais a desempenharemos de uma maneira
valorosa, e assim logo reconheceremos
envergonhados nossa própria incapacidade, e
diremos a nós mesmos que somos seres inúteis
na Criação, que somos um membro na
sociedade incapaz de realizar sua profissão. A
conseqüência natural é então a
autocondenação. E qual sentimento é mais
doloroso, qual é o menos capaz, entre todos
aqueles que o mundo exterior oferece, de vir
a ser substituído? A autocondenação é uma
serpente que em perpétua agitação corrói o
peito, que sorve o sangue vívido do coração,
e mistura-se com o veneno do ódio e do
desespero.
Um engano em relação a nossa
aptidão para uma profissão que foi examinada
pormenorizadamente por nós é uma falta que
recairá em desforra sobre nós mesmos, e ainda
que não seja repreendida pelo mundo exterior,
causa em nosso peito uma dor tão mais terrível
do que a repreensão poderia suscitar.
Se nós levamos tudo isso em
consideração, e nossas condições de vida nos
permitem escolher qualquer profissão, então,
nós podemos (per) seguir aquela que nos
proporcione a maior dignidade/respeito, que
está fundada em idéias, de cuja verdade nós
estamos totalmente convencidos, que
apresenta o mais vasto campo para agir em
prol da Humanidade, e para nós mesmos nos
aproximarmos do escopo comum e universal
da perfeição, para o qual cada profissão é
apenas um meio.
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p. 103-117, 2007.
CALDAS, M. J. de , et al.
A dignidade é aquilo que eleva o
Homem ao máximo, o que empresta às suas
ações, a todo seu esforço a mais alta nobreza,
o que o deixa intocado, admirado e, de modo
sublime, acima de toda gente.
Dignidade pode, no entanto, ser
somente proporcionada pela profissão na qual
nós não nos afiguramos como instrumentos
servis, mas antes onde nós atuamos de modo
independente em nossa esfera; isto pode ser
proporcionado apenas por uma profissão que
não exija qualquer ato reprovável, mesmo que
o seja (apenas) na aparência, uma profissão
em que se pode alcançar o melhor com orgulho
nobre. Uma profissão que concede isto não é
sempre a mais alta, mas frequentemente a de
maior excelência. Contudo, visto que uma
profissão sem dignidade nos rebaixasse, então
sucumbiríamos seguramente sob o fardo de
uma tal, baseada em idéias que nós
reconhecemos tardiamente como falsas. E já
que não mais vemos socorro, salvo na autoilusão, (imaginemos) qual salvação
desesperada o auto-engano proporcionaria!
Aquelas profissões, tanto as que
não intercedam na vida, como aquelas que
lidam com verdades abstratas, são as mais
perigosas para o jovem, cujos princípios ainda
não estão sólidos, cuja convicção ainda não
está firme e inabalável. Não obstante estas
profissões parecem, ao mesmo tempo, ser as
mais sublimes quando elas deitam raízes
profundas no peito, na medida em que nós
somos capazes de sacrificar nossa vida e
nossas aspirações pelas idéias que as
governam.
Elas podem tornar afortunados os
que têm vocação para elas, mas destruir os que
precipitados irrefletidamente, servos do
momento, a agarram.
Por outro lado, o melhor
conhecimento que nós temos das idéias sobre
as quais nossa profissão está baseada,
empresta-nos um ponto de vista/critério
11
115
melhor na sociedade, aumenta nosso próprio
valor, faz nossas ações inabaláveis.
Quem opta por uma profissão, e
que muito a estima, estremecerá de fazer-se
indigno a ela, ele já atuará por isso dignamente,
pois sua posição na sociedade é digna.
Mas o guia principal que nos
conduz à escolha de uma profissão é o Bem
da
Humanidade,
nosso
próprio
aprimoramento. Não se imagina que ambos os
interesses possam se enfrentar como inimigos,
que um precise eliminar o outro; antes a
Natureza do Homem é de tal modo orientada
que ele só pode alcançar sua completeza, se
ele agir para a perfeição, para o Bem de seu
meio. Se ele trabalha somente para si, é bem
provável que ele possa se tornar um erudito
famoso, um grande sábio, um excelente poeta,
mas jamais um Homem completo, verdadeiro
e grande.
A História aponta os maiores
Homens aqueles que, quando agiram pelo Bem
Comum, enobreceram-se eles próprios; a
experiência enaltece como o mais feliz dos
homens aquele que fez feliz o maior número
de pessoas. A religião, ela própria, nos ensina
que o ideal a que todas as pessoas aspiram é
ter se sacrificado pela Humanidade, e quem
ousa apagar tais palavras?
Se nós elegermos uma profissão na
qual podemos trabalhar o máximo para a
Humanidade, então os fardos não podem nos
abater pois eles são/representam sacrifícios
(feitos para o bem) de todos; então não
usufruímos qualquer alegria pequena, limitada
e egoísta, antes nossa felicidade pertence a
milhões, nossos atos, embora silenciosos,
continuarão a fazer efeito, e nossas cinzas
serão umedecidas pelas lágrimas candentes
dos Homens nobres1.
Marx.
____________
Tradução livre.
Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p.103-117, 2007.
116
Observação de um jovem na escolha de uma profissão...
Gesamteinschätzung:
Ziemlich gut.
CD-ROM - Mathias Bertram (org) – Marx .
Engels. Augewählte Werke. Digitale
Bibliothek - Vol 11. Berlin: Directmedia, 1998.
Die Arbeit empfiehlt sich durch GedankenReichthum und gute, planmäßige Anordnung.
Sonst verfällt der Verfasser auch hier in den
ihm gewöhnlichen Fehler, in ein übertriebenes
Suchen nach einem seltnen, bilderreichen
Ausdrucke; daher fehlt der Darstellung an den
vielen angestrichenen Stellen die nöthige
Klarheit und Bestimmtheit, oft Richtigkeit, wie
in den einzelnen Ausdrücken, so in den
Satzverbindungen.
Wyttenbach.
2/3
Recomenda-se o trabalho por sua riqueza de
pensamentos e por uma boa disposição
metódica. Aliás, por isso mesmo, o autor recai
também, aqui, em seus habituais erros, em uma
busca exagerada por expressões metafóricas
e difusas; por isso, falta à composição, nas
muitas passagens marcadas, a necessária
clareza e precisão, e freqüentemente exatidão
(ao escrever), como em algumas sentenças
isoladas, por exemplo, em períodos
compostos.
Wyttenbach
2/3.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1) Fontes Primárias:
Institut für Marxismus-Leninismus beim
Zentralkomitee der Kommunistischen Partei
der Sowjetunion & Institut für M a r x i s m u s L e n i n i s m u s b e i m Zentralkomitee der
Sozialistischen Einheitspartei Deutschlands Karl Marx, Friedrich Engels Gesamtausgabe
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Werke – Artikel – Entwürfe. Bd. 1 - Karl Marx,
Werke. Artikel. Literarische Versuche bis März
1843. - Berlin: Dietz Verlag, 1975. (com
aparato crítico).
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(dir. par L. Althusser). Paris: François
Maspero, 1966 (na contra-página encontra-se
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–
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Weber, Max – A Ética Protestante e o Epírito
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Wheen, Francis – Karl Marx. Trad. V. Ribeiro.
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Rev. Univ. Rural, Sér. Ciências Humanas. Seropédica, RJ, EDUR, v. 29, n. 2, jul.-dez., p.103-117, 2007.
117
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