FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ
UNIVERSIDADE DE FORTALEZA - UNIFOR
VICE-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO - VRPPG
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
MESTRADO EM PSICOLOGIA
O SIGNIFICADO DA VIVÊNCIA DO PACIENTE EM TRATAMENTO
DE CÂNCER DE PRÓSTATA
SANDRA REBOUÇAS MACÊDO
ORIENTADOR: GEORGES D. J. BLOC BORIS
Fortaleza - CE
2008
2
SANDRA REBOUÇAS MACÊDO
O SIGNIFICADO DA VIVÊNCIA DO PACIENTE EM TRATAMENTO
DE CÂNCER DE PRÓSTATA
Dissertação apresentada ao Mestrado
de Psicologia como requisito parcial
para a obtenção do título de Mestre
em Psicologia pela Universidade de
Fortaleza - UNIFOR
Linha de Pesquisa: Produção e
Expressão
Sociocultural
da
Subjetividade
Orientação do Professor
Georges D. J. Bloc Boris.
Fortaleza - CE
2008
Doutor
3
_________________________________________________________________________
_
M141s
Macêdo, Sandra Rebouças.
O significado da vivência do paciente em tratamento de câncer de
próstata / Sandra Rebouças Macêdo. - 2008.
123 f.
Cópia de computador.
Dissertação (mestrado) – Universidade de Fortaleza, 2008.
“Orientação : Prof. Dr. Georges D. J. Bloc Boris.”
1. Câncer de próstata. 2. Incontinência urinária. 3. Subjetividade.
4. Fenomenologia. I. Título.
CDU 616.65-006
_________________________________________________________________________
4
SANDRA REBOUÇAS MACÊDO
O SIGNIFICADO DA VIVÊNCIA DO PACIENTE EM TRATAMENTO DE
CÂNCER DE PRÓSTATA
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________________
Professor Doutor Georges D. J. Bloc Boris
UNIFOR
________________________________________________________
Professor Doutor Luiz Gonzaga Porto Pinheiro
UFC
________________________________________________________
Professora Doutora Maria Celina Peixoto Lima
UNIFOR
_______________________________________________________
Professor Doutor Henrique Figueiredo Carneiro
Coordenador do Mestrado em Psicologia
UNIFOR
5
Certeza
De tudo, ficaram três coisas:
A certeza de que estamos sempre começando...
A certeza de que precisamos continuar...
A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...
Portanto, devemos:
Fazer da interrupção um caminho novo...
Da queda, um passo de dança...
Do medo, uma escada...
Do sonho, uma ponte...
Da procura, um encontro...
Fernando Sabino
6
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, a Deus, por estar sempre comigo, pois sinto Sua presença
constante em minha vida e Sua mão sempre a me guiar;
À minha mãe, sempre atenciosa, exemplo de amor e paciência, não só com seus
filhos, mas com todos aqueles que dela se aproximam. Não há palavras para
agradecer sua presença e seu amor incondicional em minha vida;
Ao meu pai (in memoriam), pelas boas lembranças deixadas de seu afeto, com
muita saudade, mas com a certeza de que nossos laços serão eternos;
Aos meus irmãos Alexandro e Jeová, que, à sua maneira, torcem pelo meu
sucesso e pela minha felicidade;
Às minhas cunhadas Aline e Viviane, pelo incentivo e pelo apoio, quando mais
precisei;
Ao meu sobrinho Artur, por me mostrar que a felicidade está nos momentos mais
simples dessa vida e, principalmente, quando vejo o seu sorriso dirigido a mim;
À minha madrinha Alda, pelas horas de orações que, com certeza, me
fortaleceram bastante. Minha gratidão por fazer parte da minha história, sempre
com o coração disposto a ajudar;
Aos meus amigos, simplesmente por serem como são, pelas horas que recorri aos
seus ombros e pela compreensão pelas horas nas quais precisei me ausentar;
Aos amigos que fiz na turma IX do Mestrado em Psicologia, em especial à minha
amiga-irmã Ilana, “presente de Deus”, como a chamo carinhosamente;
7
Ao meu orientador professor Georges Boris, por sua paciência, atenção e
solicitude, sempre. Hoje, para mim, um modelo de mestre que me inspirará pelos
próximos anos de minha carreira docente;
Ao Lucas Bloc, pela colaboração e pelo olhar cuidadoso, mesmo ainda
acadêmico, mas, desde já, com ares de um grande profissional;
Aos meus alunos, pelo incentivo e carinho. Este estudo, também, teve em vocês
uma fonte de estímulo, pois a responsabilidade de fazer parte de suas formações
me motiva, sempre e cada vez mais;
Aos meus pacientes que me narraram suas histórias, com tanta minúcia e clareza,
no intuito de valorizar este estudo, e pelo incentivo de diversas formas: palavras,
olhares, abraços e, inclusive, livros presenteados e outros pequenos grandes
gestos;
Aos médicos urologistas, que, direta ou indiretamente, colaboraram para o
enriquecimento desta pesquisa;
Aos professores doutores Luiz Gonzaga Porto Pinheiro, Maria Celina Peixoto Lima
e Leônia Cavalcante Teixeira pela participação tão significativa em minha banca. A
cada um, o meu muito obrigada pelo carinho com que leram e “cuidaram” deste
estudo.
8
RESUMO
O número estimado de casos novos de câncer de próstata no Brasil, em 2008, é
de 49.530. Tal valor corresponde a 52 casos novos a cada 100 mil homens. O
aumento, nas últimas décadas, das taxas de incidência de câncer de próstata
pode ser justificado pela modernização dos métodos diagnósticos, pela melhoria
na qualidade dos sistemas de informação do País e pelo aumento da expectativa
de vida do brasileiro. A taxa de incidência de câncer de próstata é cerca de seis
vezes maior nos países desenvolvidos, se comparada à dos países em
desenvolvimento. Em valores absolutos, o câncer de próstata é o sexto tipo de
câncer mais comum no mundo e o mais prevalente em homens, representando
cerca de 10% do total de casos de câncer. Ele é considerado o câncer da terceira
idade, uma vez que cerca de três quartos dos casos, no mundo, ocorrem a partir
dos 65 anos. Este tema tem sido bastante discutido, mas pouco se conhece a
respeito da subjetividade do paciente de câncer de próstata. Portanto, esta
pesquisa discutiu o significado da vivência do paciente em tratamento de câncer
de próstata. Para tanto, utilizei o método fenomenológico, com a aplicação de
entrevistas, através da pergunta disparadora “quais os eventos mais significativos
de sua vida?”, ouvindo pacientes que realizaram a cirurgia de retirada da próstata,
a prostatectomia radical, sobre sua própria experiência. Esta pesquisa pretendeu
trazer novos conhecimentos sobre o câncer de próstata no que diz respeito às
suas repercussões psicológicas, que poderão desmistificar as complicações do
tratamento, como, por exemplo, a incontinência urinária e as disfunções sexuais,
discutindo o sofrimento psíquico do paciente em tratamento, bem como
estimulando novas investigações sobre o tema. O local da coleta de dados foi meu
consultório particular de fisioterapia do assoalho pélvico. A amostra foi de 4
sujeitos do sexo masculino, na faixa etária entre 55 e 77 anos, pois é nesta faixa
etária que, mais comumente, ocorre o câncer de próstata. Após a realização das
entrevistas, surgiram as seguintes categorias ou unidades de sentido: o momento
do diagnóstico; a relação paciente-família-doença; a relação médico-paciente; o
enfrentamento da doença; e o papel de macho como fica?; a sexualidade pósprostatectomia radical; e a infantilização e a feminilização do uso de fraldas e de
protetores íntimos. Após discussão de tais categorias, pude compreender que,
além de acompanhamento médico, eles precisam de suporte psicológico para um
melhor enfrentamento da doença.
Palavras-chave: câncer de próstata, fenomenologia, subjetividade do doente,
incontinência urinária masculina, disfunção sexual.
9
ABSTRACT
The estimated number of new cases of prostate cancer, in Brazil, in 2008, is
49.530. Such value corresponds to 52 new cases for each 100 thousand men. The
increase, in the last decades, the incidence rate of prostate cancer can be justified
by the modernization of the diagnosis methods, by the improvement of the quality
of the Country’s Information systems and by the increase of life expectation of
Brazilian people. The incidence rate of prostate cancer is about six times higher in
developed countries compared to that of developing countries. In absolute values,
the prostate cancer is the sixth most common type of cancer in the world and it is
the type which mostly prevails in men, acting in about 10% of the total of cases of
cancer. It is considered the cancer of the third age, once that about three forth of
the cases in world reach men of 65 years old and above. This theme has been
enough discussed, but little is known regarding the patient’s subjectivity of prostate
cancer. Therefore, this research discusses the meaning of the patient's experience
while in cancer prostate treatment. For that, I used the phenomenologic method,
with the application of interviews, through a question-shot like “which is the most
significant events of your life?”, hearing patients who accomplished the surgery of
the prostate removal, the radical prostatectomy, about their own experience. This
research intended to bring new knowledge on the prostate cancer, in what it
concerns their psychological repercussions, so that it can demystify the
complications of the treatment, as, for instance, the urinary incontinence and the
sexual dysfunctions, discussing the patient's psychic suffering while in treatment,
as well as stimulating new investigations on the theme. The place of data collection
was my physiotherapy clinic for the pelvic floor. The sample was collected from 4
subject males, in the age group between 55 and 77 years, because it is in this age
group that the prostate cancer most commonly occurs. After the accomplishment of
the interviews, the following categories or sense units were so classified: the
moment of the diagnosis; the patient-family-disease relationship; the doctor-patient
relationship; facing the disease; and the “male”'s role where it stands?; the postprostatectomia radical sexuality ; and the infantilization and the feminization by the
use of diapers and of intimate protectors. After the discussion of such categories, I
could understand that, besides medical attendance, they need psychological
support for better facing the disease.
Key- words: prostate cancer, phenomenology, the patient’s subjectivity, masculine
urinary incontinence, sexual dysfunction.
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figuras
Figura 1 - Anatomia Pélvica Masculina - Localização da Próstata e da Bexiga.......9
Figura 2 - Anatomia Pélvica Masculina: Localização da Próstata e dos
Músculos do Assoalho Pélvico...............................................................20
Figura 3 - Anatomia Pélvica Masculina - Músculos do Assoalho Pélvico...............26
Figura 4 - Modelo de Qualidade de Vida na Velhice de Lawton.............................37
Quadros
Quadro 1 - Critérios Diagnósticos de Depressão Importante.................................47
11
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
DE - disfunção erétil
DS - disfunção sexual
Hz - hertz
ICS - Sociedade Internacional de Continência
IPSS - escore internacional de sintomas prostáticos
MAP’s - músculos do assoalho pélvico
ms - milisegundos
PSA - antígeno prostático específico
RM - ressonância magnética
SBU - Sociedade Brasileira de Urologia
sEMG - eletreomiografia de superfície
TC - tomografia computadorizada
TR - toque retal
US - ultra-som
USTR - ultra-som transretal
12
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................1
Capítulo 1- ABORDANDO A PRÓSTATA...............................................................7
1.1 O Câncer de Próstata e Suas Implicações.................................................7
1. 2 Anatomia da Próstata..............................................................................8
1. 3 Epidemiologia e Etiologia do Câncer de Próstata......................................9
1. 4 O Diagnóstico do Câncer de Próstata.....................................................12
Capítulo 2 - O TRATAMENTO DO CÂNCER
DE
PRÓSTATA E SUAS
CONSEQUÊNCIAS..........................................................................16
2.1 Opções de Tratamento do Câncer de Próstata........................................16
2.2 Complicações da Prostatectomia Radical................................................18
2.2.1 Disfunção erétil...................................................................................18
2.2.2 Estenose uretral..................................................................................19
2.2.3 Incontinência urinária..........................................................................20
2.3 A Fisioterapia do Assoalho Pélvico Pós-Prostatectomia Radical.............22
2.3.1 Objetivos da fisioterapia do assoalho pélvico.....................................22
2.3.2 A terapêutica
fisioterápica
da
incontinência
urinária
pós-
prostatectomia radical.........................................................................24
2.3.2.1 Biofeedback...........................................................................25
2.3.2.2 Eletroestimulação..................................................................27
2.3.2.3 Cinesioterapia........................................................................29
2.3.2.4 Terapia comportamental........................................................30
Capítulo 3 - O SUJEITO QUE ADOECE...............................................................31
3.1 A Subjetividade do Doente.......................................................................31
13
3.1.1 O Adoecer e o envelhecimento...........................................................33
3.2 A Sexualidade Masculina..........................................................................39
3.2.1 A sexualidade masculina na terceira idade.........................................39
3.2.2 A sexualidade pós prostatectomia radical...........................................41
.
3.3 A Psico-Oncologia no Tratamento do câncer de próstata........................43
3.3.1 A reabilitação
psicossocial
do
paciente
com câncer de
próstata...............................................................................................44
3.3.2 Psico-oncologia: uma abordagem psicossocial..................................46
Capítulo 4 - A PESQUISA QUALITATIVA E A FENOMENOLOGIA......................50
4.1 Tipo de Estudo.........................................................................................50
4.1.1 Pesquisa qualitativa............................................................................50
4.1.2 A fenomenologia.................................................................................51
4.2 Procedimentos Metodológicos..................................................................53
4.2.1 Sujeitos participantes........................................................................53
4.2.2 Instrumento de coleta de dados.........................................................54
4.2.3 Aspectos éticos..................................................................................55
4.2.4 Local e período ..................................................................................56
Capítulo 5 - EXPRESSANDO OS SENTIDOS DA EXPERIÊNCIA VIVIDA
DO TRATAMENTO DE CÂNCER DE PRÓSTATA...........................57
5.1 Análise e Discussão das Entrevistas........................................................57
5.2 Categorias ou Unidades de Sentido.........................................................61
5.2.1 O momento do diagnóstico.................................................................61
5.2.2 A relação paciente-família-doença..................................................... 65
5.2.3 A relação médico-paciente..................................................................67
5.2.4 O enfrentamento da doença................................................................72
5.2.5 E o papel de macho como fica?..........................................................79
5.2.6 A sexualidade pós-prostatectomia radical...........................................82
14
5.2.7 A infantilização e
a feminilização do
uso de fraldas e de
protetores íntimos................................................................................87
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................90
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................94
ANEXOS...............................................................................................................107
Anexo 1 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido...........................107
Anexo 2 - Pergunta disparadora................................................................109
Anexo 3 - Parecer do Comitê de Ética.......................................................110
15
INTRODUÇÃO
O aumento da expectativa de vida tem exigido um novo comportamento dos
profissionais da saúde, da psicologia e da sociologia, pois o número de idosos
vem aumentando de forma significativa. Neste sentido, a relação entre a saúde e a
doença tem sido alvo de muitas pesquisas. Por exemplo, o câncer de próstata é a
neoplasia mais freqüentemente diagnosticada nos homens e a sua segunda causa
de morte por doença maligna, depois do câncer de pulmão. O câncer de próstata
é um tumor que, após os 50 anos de idade, tem sua incidência aumentada em
dobro, a cada década de vida (Ferreira & Nardi, 1999). Segundo Gomes (2006),
corresponde à terceira causa de morte entre homens no Estado de São Paulo.
Portanto, é salutar pensar em mudanças imediatas preventivas e terapêuticas.
Estima-se que surjam 49.530 casos novos de câncer de próstata, no Brasil,
em 2008, correspondendo a um risco estimado de 52 casos novos a cada 100 mil
homens. Quando se observa esta estimativa por região, encontra-se o número de
38 casos novos por 100 mil habitantes, na região Nordeste (Inca, 2008). Diante da
situação alarmante dos casos de câncer de próstata, a Sociedade Brasileira de
Urologia (SBU) decidiu instituir o Dia Nacional de Combate ao Câncer de Próstata,
que
vem
sendo
divulgado
desde
2004
(SBU,
2007).
Calcula-se
que,
aproximadamente, 400.000 pessoas acima de 45 anos tenham a doença, mas,
anualmente, apenas 35.000 casos são diagnosticados, e, destes casos, 8.000
chegam a óbito. Campanhas são realizadas, anualmente, para destacar, entre a
população masculina, a importância dos exames preventivos e de detectar, o mais
precocemente possível, o câncer, pois se trata de uma doença curável, no seu
estágio inicial. Os homens devem realizar exames preventivos, anualmente, a
partir dos 45 anos de idade. Da prevenção ao diagnóstico do câncer, os
procedimentos passam por diversas etapas: os exames de sangue para dosagem
do antígeno prostático específico (PSA); o toque retal; a ultra-sonografia (US)
retal, utilizada para biópsia, e, então, pode-se chegar à necessidade de uma
16
prostatectomia radical, que é a retirada total da próstata. Algumas complicações
podem ocorrer por conta dos procedimentos cirúrgicos, principalmente quando se
opta pela prostatectomia radical: os pacientes podem apresentar problemas
geniturinários e sexuais (Gerber & Vargo, 2002).
Pouco se sabe, entretanto, sobre a subjetividade do paciente sob
tratamento do câncer de próstata, daí o interesse desta pesquisa voltada ao
significado da vivência do paciente, a partir de uma perspectiva fenomenológica:
como o paciente significa as vivências do seu tratamento, como elabora a
complexidade dos fenômenos psicológicos que acompanha o adoecimento do
homem com câncer de próstata e quais as implicações psicossociais da doença
são questões discutidas neste estudo. A literatura (Srougi, 1998, 2003, 2008;
Gerber & Vargo, 2002; Mariano, 2002; Sharkey, 2002; Lopes, 2005) acerca do
tratamento do câncer de próstata oferece, prioritariamente, uma abordagem
médica. Creio que os motivos da escassez de literatura em tal área são diversos,
mas, certamente, incluem, dentre eles, a difícil abordagem, por parte dos
profissionais da saúde, bem como por parte dos pacientes, da subjetividade do
paciente vítima de câncer. Para desfazer os mitos acerca dos métodos
diagnósticos e do tratamento, busquei compreender e discutir as falas dos
pacientes que se submeteram a tratamento do câncer de próstata, revelando
muitas de suas vivências e favorecendo a modificação de estereótipos, como, por
exemplo, a crença de que, após a cirurgia de próstata, o paciente sofre,
necessariamente, de disfunção urinária e sexual definitivas.
Na verdade, apenas em 3 a 8 % dos casos, a prostatectomia radical é
seguida de incontinência urinária (Srougi, 2003). Tais pacientes, geralmente,
perdem urina quando mudam de posição (de sentados para de pé ou de deitados
para sentados, por exemplo), em caminhadas e por conta de tosse ou de espirro.
Quando estão continentes, no final do tratamento fisioterápico, podem deixar de
usar qualquer tipo de protetor, pois não mais perdem urina involuntariamente
como antes, tornando o uso de absorventes desnecessário. A fisioterapia atua não
17
apenas sobre o mal estar físico dos pacientes, mas, também, sobre seu
sofrimento psicológico, pois, por exemplo, preciso convencê-los de que sua
incontinência urinária é temporária, auxiliando-os a reconstruir sua auto-estima.
Assim, a fisioterapia é, ao meu ver, um serviço de apoio, funcionando, neste
momento, como um tratamento eficaz para o paciente amenizar seu sofrimento
psíquico.
Atuo na área de fisioterapia das disfunções do assoalho pélvico, desde
1998. O assoalho pélvico é a região situada entre a uretra e o ânus, contendo
estruturas de sustentação dos órgãos pélvicos, bem como os esfíncteres urinários
e fecais, formados de musculatura lisa e estriada. As principais disfunções do
assoalho pélvico são: a incontinência urinária; a incontinência anal e fecal; as
disfunções sexuais; a constipação e as algias (dores) pélvicas. Tais disfunções
são causadoras de problemas de ordem social, física e psicológica, pois
modificam o estilo de vida do paciente. Em minha caminhada profissional, aprendi
a escutar meus pacientes, acolhendo suas angústias, seus medos e seu desejo de
cura. Os homens procuram o serviço de fisioterapia, geralmente, encaminhados
por seus urologistas, após a prostatectomia radical, em média, depois de 30 a 180
dias do pós-operatório. Percebo, ao avaliar tais pacientes, uma grande vontade de
cura e de recuperar o estilo de vida anterior à cirurgia. Modificações ocorrem em
suas rotinas por conta da necessidade de usar protetores higiênicos, que podem
ser, desde uma fralda geriátrica, até metade de um absorvente geriátrico ou
feminino (cortado ao meio por eles mesmos e adaptado) para absorver a perda de
urina.
No
tratamento
fisioterápico
para
reabilitar
as
funções
pélvicas
comprometidas após a cirurgia de retirada da próstata, são utilizadas técnicas
computadorizadas para reeducar a musculatura do assoalho pélvico e a atividade
vesical. A abordagem terapêutica não se resume apenas ao tratamento físico,
fazendo-se necessária uma especial atenção às implicações emocionais do
paciente de câncer de próstata. Seus aspectos emocionais devem ser levados em
18
consideração, pois, segundo Néri (1993), as doenças são o primeiro aspecto a ser
considerado como agente estressor, principalmente entre as pessoas da terceira
idade. Considerando o sofrimento psíquico causado pelo câncer de próstata, e
mesmo por seu tratamento, optei pela utilização do método fenomenológico nesta
pesquisa, pois ele permite investigar o significado atribuído pelos próprios
pacientes prostatectomizados à vivência da doença e de seu tratamento (Boris,
2002; Gomes, 2007). Para tanto, parti de uma pergunta acerca de sua história de
vida, que, certamente, os remetia a seu adoecimento e a seu tratamento. Os
dados foram categorizados a partir das falas mais significativas dos participantes
da pesquisa. Tais categorias receberam destaque por abordarem assuntos
significativos sendo merecedores de maior aprofundamento, pois tratam da
subjetividade do paciente sob tratamento de câncer de próstata. Os pacientes
entrevistados puderam entrar em contato com suas experiências de vida, com
seus sentimentos e, inclusive, com algumas vivências ocultadas aos seus
familiares e aos profissionais envolvidos no tratamento. A entrevista representou
um momento de revelação, no qual eles puderam retirar algumas de suas
“máscaras”, usadas para enfrentar as dores geradas pela doença e pelo
tratamento.
Estruturei esta dissertação da seguinte forma: no capítulo 1, “Abordando a
Próstata”, faço uma abordagem sucinta da anatomia da próstata, para melhor
compreensão dos capítulos seguintes. Foram, também, abordados, neste capítulo,
a epidemiologia, a etiologia e o diagnóstico do câncer de próstata, bem como suas
implicações.
No capítulo 2,
“O
Tratamento
do
Câncer
de Próstata
e Suas
Conseqüências”, discuto o tratamento do câncer de próstata, fazendo uma breve
explicação das suas diferentes modalidades e detendo-me mais acerca da
prostatectomia radical, seu principal recurso contra o câncer de próstata. Neste
mesmo capítulo, trato das complicações da prostatectomia radical, destacando a
incontinência urinária, a estenose uretral e a disfunção sexual. Em seguida,
19
descrevo as peculiaridades da fisioterapia do assoalho pélvico pós-prostatectomia
radical.
No capítulo 3, “O Sujeito que Adoece”, discuto a subjetividade do doente e
sua experiência de adoecimento. Abordo a sexualidade masculina, para, então,
tratar da sexualidade do paciente pós-prostatectomia radical. Explicito a
importância da psico-oncologia no tratamento do câncer de próstata, destacando a
sua contribuição na reabilitação psicossocial do paciente.
No capítulo 4, “A Pesquisa: Um Estudo Fenomenológico”, descrevo passo a
passo a pesquisa, explicando seu método, a fenomenologia, como um rico
instrumento
de
pesquisa
qualitativa.
No
item
sobre
os
procedimentos
metodológicos, descrevo os sujeitos e o instrumento de coleta de dados: para
melhor compreender os significados das vivências de meus pacientes, fiz uso da
entrevista como instrumento, na qual utilizei a seguinte pergunta disparadora:
quais os eventos mais significativos de sua vida? (anexo 2). No mesmo capítulo,
demonstro como tratei os aspectos éticos, a escolha do local e o período da
pesquisa, e como cheguei à análise e à discussão dos dados, que foram
elaboradas simultaneamente.
No quinto e último capítulo, “Expressando os Sentidos da Experiência
Vivida do Tratamento de Câncer de Próstata”, fiz a análise e a discussão das
entrevistas. Para tanto, separei as falas em categorias ou unidades de sentido,
que foram destacadas por mim, pois expressavam a subjetividade do paciente sob
tratamento do câncer de próstata, sendo divididas em sete categorias:
•
O Momento do Diagnóstico;
•
A Relação Paciente-Família-Doença;
•
A Relação Médico-Paciente;
•
O Enfrentamento da doença;
•
E o Papel de Macho como Fica?;
•
A Sexualidade Pós-Prostatectomia Radical;
20
•
A Infantilização e a Feminilização do Uso de Fraldas e de Protetores
Íntimos.
Foram discutidos temas, como a sexualidade do paciente, com destaque para a
disfunção sexual pós-prostatectomia radical, sendo investigado como é vivenciada
a sexualidade masculina após a cirurgia, assunto gerador de muita polêmica em
torno do tratamento do paciente com câncer de próstata. Destaco que, durante a
discussão do impacto causado pelo tratamento do câncer de próstata, foram
considerados não apenas seus aspectos físicos, mas, também, psicoemocionais,
relacionais e sócioeconômicos, dando-se ênfase à sua subjetividade. Tal
discussão me permitiu compreender que, além de acompanhamento médico, eles
precisam de suporte psicológico para um melhor enfrentamento da doença. Tal
suporte pode advir da família, dos amigos, do seu próprio médico e/ou de um
profissional especializado. As experiências vividas do momento do diagnóstico, da
escolha do médico e da modalidade de tratamento, das complicações cirúrgicas e
do papel de “macho” na família e na sociedade são algumas das categorias que
emergiram e que foram discutidas.
Por último, encerro esta pesquisa com minhas considerações finais, que
nada mais são do que um “fechamento” de tudo que foi discutido nesta
dissertação. É certo que não são, literalmente, finais, pois a subjetividade do
paciente vítima de câncer de próstata é um tema que vem sendo muito
recentemente explorado e, portanto, é, ainda, carente de maior aprofundamento.
Dessa forma, espero que novas compreensões possam surgir a partir deste
estudo, não apenas aos profissionais da saúde, mas, também, aos pacientes de
câncer de próstata.
21
CAPÍTULO 1: ABORDANDO A PRÓSTATA
Faz-se necessário compreender a etiologia, a incidência, o diagnóstico e o
tratamento do câncer de próstata para facilitar a discussão do sofrimento psíquico
vivido pelo paciente prostatectomizado. A necessidade de ir além do modelo
biomédico e de adotar uma perspectiva mais abrangente da saúde e da doença
fez-me elaborar um estudo que esclarecesse não apenas os seus aspectos
físicos, mas, principalmente, as conseqüências psicológicas desencadeadas pela
doença, bem como pelo seu tratamento. O câncer de próstata assume especial
significado por gerar impactos físicos e psíquicos, particularmente no homem da
terceira idade, já que sua incidência aumenta, significativamente, após os 65 anos.
Neste capítulo, os aspectos físicos serão abordados, para, em seguida, discutir os
aspectos psicológicos do paciente com câncer de próstata, numa perspectiva
sociocultural e de gênero.
1.1 O Câncer de Próstata e Suas Implicações
O câncer é uma doença que se origina nos genes de uma
única célula, tornando-a capaz de se proliferar até o ponto
de formar massa tumoral no local e à distância. Várias
mutações têm que ocorrer na mesma célula para que ela
adquira este fenômeno de malignidade e a biologia
molecular vem estudando com acuracidade estes detalhe
Yamaguchi (1994)
Câncer é um termo genérico, usado para descrever mais de duzentas
doenças, e se caracteriza por uma proliferação anormal e desordenada de um
determinado tecido (Denis et al., 2006). O câncer é uma doença com a qual
muitas pessoas temem se deparar, sendo o medo um dos principais motivos para
o descuido com os métodos preventivos ou com o diagnóstico precoce. Figueiredo
22
e Manfrin (2007) afirmam que a maioria dos cânceres surge na terceira idade, em
um percentual de 55% do total de casos, sendo a idade apontada como o mais
importante fator de risco isolado. Malzyner e Caponero (2004) consideram que,
“sob condições normais, a idade está intrinsecamente inter-relacionada com a
duração e o tempo de exposição, susceptibilidade do hospedeiro, envelhecimento
celular e fatores ambientais” (p. 345). Portanto, se tais dados forem somados ao
aumento da expectativa de vida, há uma probabilidade maior de pessoas idosas
desenvolverem câncer. A situação não é diferente com o câncer de próstata, que
é considerado um grande problema de saúde, apresentando morbidade,
mortalidade e perda de qualidade de vida significativas (Denis et al., 2006).
1. 2 Anatomia da Próstata
A próstata é uma glândula que tem tamanho equivalente a uma noz, em um
adulto jovem. Sua localização é considerada muito delicada (figura 1), pois,
anatomicamente, ela se situa, imediatamente, abaixo da bexiga e ao redor da
uretra, e, quando da sua retirada cirúrgica, parte dos esfíncteres de musculatura
lisa é removida, juntamente com os nervos, gerando incontinência urinária e
disfunção sexual pós-operatória, em alguns casos. Portanto, sua anatomia explica
alguns dos sintomas urinários que ocorrem com seu crescimento alterado, bem
como, no período pós-prostatectomia radical. Sua localização, também, justifica o
motivo de exames diagnósticos serem realizados, em sua maioria, através do
acesso retal. A próstata tem importante papel na fase reprodutiva do homem, por
produzir parte do líquido seminal, responsável pelo auxílio ao transporte dos
espermatozóides (Srougi, 2003). Na figura a seguir, na qual temos a próstata em
destaque, percebe-se a sua proximidade com a bexiga:
23
Próstata
Bexiga
Figura 1
Anatomia Pélvica Masculina: Localização da Próstata
e da Bexiga (Netter, 2008, p. 361).
Durante a retirada da próstata, é, também, retirada uma porção da uretra,
denominada de uretra prostática. Alguns fatores, como a habilidade do cirurgião, a
idade e a anatomia do paciente, o tamanho da sua próstata e a situação da sua
continência no pré-operatório, podem influenciar no surgimento da incontinência,
após a prostatectomia, assunto que será discutido mais adiante.
1.3 Epidemiologia e Etiologia do Câncer de Próstata
A incidência de todos os tipos de câncer geniturinário está aumentando,
podendo ser justificada pelo aumento da população idosa em todo o mundo e pela
modernização dos métodos diagnósticos. O câncer de próstata pode variar de
acordo com a situação geográfica: por exemplo, em São Paulo, são
diagnosticados 22 casos novos por 100 mil habitantes por ano (Ferreira & Nardi,
1999); nos Estados Unidos, a doença é identificada em 100 por 100 mil habitantes
(Srougi, 1998). Pode-se associar o alto percentual nos países desenvolvidos à
eficácia nos métodos de rastreamento, ou seja, à modernidade dos métodos
24
diagnósticos utilizados, à maior conscientização da população no que se refere à
prevenção (Gomes, 2006), e, também, aos fatores ambientais e alimentares
(Srougi, 2003).
Denis et al. (2006) alertam para a alta incidência da doença em todo o
mundo:
estima-se que haja aproximadamente 1,6 milhão de
pacientes vivos com câncer de próstata no mundo todo, e
isso representa 16% de todos os casos prevalentes de
câncer em 5 anos em homens. Desses casos, cerca de 900
mil tiveram origem nos países desenvolvidos do mundo, e o
restante nos países em desenvolvimento (p. 586).
A incidência do câncer de próstata é considerada a segunda maior em relação aos
outros tipos de câncer no homem, apenas perdendo para o de pulmão: “o câncer
de próstata é o segundo maior causador de mortes em homens e superará o
câncer de pulmão quando os hábitos tabagistas dos homens se modificarem”
(Keane; Kelly & McAleer, 2003, p. 189). Além da sua elevada incidência, o câncer
de próstata é uma doença comum nos idosos, com pico de incidência e de
mortalidade por volta dos 70 anos (Denis et al., 2006): “a doença responde por 1030% dos tumores clínicos registrados em homens, e por 60% de todas as mortes
masculinas por câncer” (p. 586). Tais índices chamam a atenção para o tema e
para a importância de esclarecer a população, especialmente, a masculina, para a
necessidade de maiores cuidados na saúde.
A etiologia do câncer de próstata é desconhecida, mas alguns fatores de
risco se destacam: a idade; a história familiar; a raça; a dieta; a presença de
cádmio1 no organismo; os hormônios e a vasectomia. Quanto aos fatores
genéticos, a probabilidade da doença ocorrer em homens que tenham um familiar
direto (pai ou irmão) com a doença é duas vezes maior do que nos que não o
tenham. Com relação aos fatores hormonais, especificamente, os andrógenos
1
Metal presente em todos os alimentos e bebidas, mas encontra-se mais concentrado em
mariscos, ostras e peixes de água salgada, alguns tipos de chá e na fumaça do cigarro.
25
circulantes (hormônios masculinos) aceleram o avanço da doença, quando ela já
está instalada. No que diz respeito aos fatores ambientais, são desencadeadores
do câncer de próstata a poluição do ar, as dietas ricas em cádmio, em zinco e em
gorduras, o déficit de vitamina A e o fumo. Por último, quanto aos fatores
infecciosos, os estudos não comprovaram ainda a relação das doenças
sexualmente transmissíveis com o câncer de próstata (Srougi, 1998; Ferreira &
Nardi, 1999). Tais fatores de risco podem ser divididos em reconhecidos e
suspeitos. Os reconhecidos são o envelhecimento, a raça, os fatores genéticos e
os andrógenos. Os suspeitos podem ser considerados a dieta ocidental, o
ambiente e a vasectomia (Keane et al., 2003). A suscetibilidade genética parece
responder por 13% dos cânceres de próstata registrados (Denis et al., 2006).
Johnston e McDermott (2003) afirmam que 80-90% dos cânceres podem ser
causados por fatores ambientais ou pelo estilo de vida. Harkin (2003) aponta que
os tumores surgem pelo acúmulo de várias alterações genéticas que afetam o
controle do crescimento celular. Mello Filho (2004) destaca a possibilidade dos
fatores psicossociais serem mais importantes para a promoção e a progressão do
que para o início do câncer.
Gomes (2006) destaca a alta incidência do câncer de próstata, fazendo
uma comparação entre os dados americanos e brasileiros, a partir de estudos da
American Cancer Society, que calcularam a estimativa de que 209.000
americanos desenvolveram a doença, atingindo a mortalidade em 14% dos casos.
Gomes estimou, transpondo tais dados para o Brasil, que 144.000 brasileiros
seriam afetados pela doença em 2006 e que 20.000 dos casos chegariam a óbito.
A partir disto, faz considerações importantes com relação aos sintomas:
o fato de que a maioria desses cânceres é assintomática,
correspondendo, pois, a achados anatomopatológicos de
necropsias por mortes de causas várias ou material
prostático biopsiado, na vigência de hiperplasia prostática
benigna e/ou prostatites, estima-se que 13% desses
tumores têm caráter indolente, assintomático, não
configurando causa de óbito nos seus portadores (p. 706).
26
Diante de tais informações, os métodos diagnósticos têm sua importância
aumentada, bem como as campanhas de prevenção, além do esforço da
comunidade médica e científica de divulgar a necessidade da consulta anual ao
especialista.
1. 4 O Diagnóstico do Câncer de Próstata
É importante destacar o papel da detecção precoce do câncer na cura do
paciente. Entretanto, para que ela ocorra, não somente os recursos tecnológicos
avançados são de suma importância, mas, também, a atitude do indivíduo, que
deve buscar precocemente a detecção da doença (Gimenes, 1994). O paciente
precisa ter interesse em realizar as consultas de prevenção, e, para tanto, deve
marcar consultas anuais com o especialista, o urologista.
Apesar das diversas campanhas, muitos homens continuam adiando as
consultas preventivas do câncer de próstata. Medidas preventivas devem ser
tomadas para a detecção precoce do câncer de próstata. Dentre elas, podemos
destacar o exame do toque retal, a medição do antígeno prostático específico
(PSA) e o ultra-som transretal (USTR): “cada um desses métodos, utilizado
isoladamente, identifica entre 29 e 40% das neoplasias prostáticas e, realizados
conjuntamente, diagnosticam 80% dos casos” (Srougi, 1998, p. 364). Abaixo,
descrevo sucintamente suas características:
•
Toque Retal (TR): este exame auxilia na detecção de alterações ou de assimetria
na forma, na consistência ou no enrijecimento da próstata, através do toque retal
manual, realizado pelo urologista. Porém, aproximadamente, 20% dos cânceres
de próstata se desenvolvem nas porções mais centrais da glândula, o que dificulta
o diagnóstico através deste exame, já que, nestes casos, sua palpação é mais
difícil (Srougi, 1998; Ferreira & Nardi, 1999; Kennedy, 2003; Denis et al., 2006);
27
•
Antígeno Prostático Específico (PSA): trata-se da detecção de uma glicoproteína
presente no epitélio prostático e que ajuda na liquefação do sêmen. Os valores
normais de PSA são considerados de 0 ng/ml a 4 ng/ml. O exame detecta a
possível progressão da doença (Srougi, 1998; Ferreira & Nardi, 1999; Kennedy,
2003; Denis et al., 2006; Gomes, 2006). “O PSA também pode ser usado como
marcador para monitorar pacientes com câncer, tanto antes quanto depois do
tratamento” (Keane et al., 2003, p. 197). Este exame revolucionou o tratamento do
câncer de próstata, pois, através dele, pode-se acompanhar o comportamento
prostático sem intervenções invasivas, até que sejam realmente necessárias;
•
Ultra-som Transretal (USTR): geralmente, é realizado após o exame do toque
retal e do PSA. É importante para conduzir a realização da biópsia. A biópsia
transretal da próstata deve ser indicada, quando o toque retal apresentou
resultado suspeito e o PSA foi maior do que 10 ng/ml, quando o PSA apresentouse entre 4 e 10 ng/ml, ou quando a relação da fração PSA livre/ fração PSA total2
for menor do que 0,20 ng/ml (Srougi, 1998; Ferreira & Nardi, 1999; Kennedy,
2003; Denis et al., 2006; Gomes, 2006);
•
Tomografia Computadorizada (TC): pode ser usada para identificar doença
metastática3, envolvendo linfonodos4 e sendo mais indicada quando o PSA for
maior do que 10 ng/ml. (Keane et al., 2003). A tomografia computadorizada utiliza
um aparelho de raios X que gira à sua volta, fazendo radiografias transversais do
corpo do paciente (Siemens, 2008b).
•
Ressonância Magnética (RM): também chamada de ressonância nuclear
magnética, é um método de diagnóstico por imagem que não utiliza radiação e
que permite retratar imagens de alta definição dos órgãos do corpo, através de
pulsos de energia das ondas de rádio. O aparelho de ressonância magnética
2
A relação PSA livre/PSA total é menor nos pacientes com câncer.
Ocorre quando há células do tumor primário em outras regiões do corpo.
4
Anteriormente denominados de gânglios linfáticos, são órgãos linfóides, ou seja, partes
integrantes do sistema imunológico.
3
28
percorre cada ponto do corpo do paciente, construindo um mapa em 2 ou 3
dimensões (2-D ou 3-D) dos tecidos para melhor analisar cada parte do segmento
estudado (Gould, 2008; Siemens, 2008a).
Os métodos de diagnóstico são utilizados pelos médicos para detectar o
mais precocemente possível o câncer da próstata, considerando que, o quanto
antes for diagnosticada a doença, maiores chances de cura e menores
possibilidades de complicações terá o paciente: “o grau de diferenciação, ou grau
do tumor, é reconhecido como fator prognóstico dominante, que prediz a doença,
tanto localizada como metastásica, independente da terapia aplicada” (Denis et
al., 2006, p. 588-589). O sistema de graduação de Gleason é uma avaliação
histológica da diferenciação do câncer de próstata. Por meio dele, é analisada a
localização das lesões. Cerca de 70% dos cânceres originam-se na zona
periférica, 15-20% na zona de transição e 15-20% na zona central da próstata. “O
risco de desenvolver câncer de próstata durante a vida é de 30%, mas apenas
10% dos cânceres serão clinicamente significativos” (Keane et al., 2003, p. 196).
Conhecer a localização do câncer de próstata tem significativa importância no que
diz respeito à evolução da doença e a seu prognóstico. Quanto mais o câncer for
localizado próximo da cápsula, melhor será o prognóstico da doença, ou seja
maiores as chances de cura.
As complicações da doença da próstata podem acarretar importantes
alterações na qualidade de vida do homem. Pensando em quantificá-las, foi criado
um questionário para avaliar a importância dos sintomas, bem como seu impacto
na qualidade de vida dos pacientes. No final da aplicação do questionário, obtémse uma soma de escore que pode variar de 0 a 35 pontos. Este escore é
conhecido como Escore Internacional de Sintomas Prostáticos (International
Prostate Symptom Score, ou IPSS) e contém perguntas tais como: “no último mês,
quantas vezes você observou que o jato de urina estava fraco? No último mês,
quantas vezes, em média, teve que levantar à noite para urinar?” (Zerbib & Perez,
2003, p. 61). Tal questionário pode dar ao profissional uma noção do estágio e do
29
impacto da doença, pois, de acordo com as mudanças físicas e fisiológicas, ou
seja, com os comprometimentos causados pelas alterações da próstata, o
paciente expressa maiores queixas, conseqüentemente, somando um maior
número de escores.
Três parâmetros clínicos são utilizados para determinar a gravidade da
doença: o escore de Gleason5, a extensão da doença e os níveis de PSA. O
escore de Gleason é expresso por uma escala que vai de 2 a 10, refletindo a
agressividade das células que compõem o tumor. O grau do câncer, avaliado pelo
escore de Gleason, deve estar entre 4 e 6 para obter os melhores resultados, ou
seja, a cura. A doença localizada tem vantagens no prognóstico, pois seu
tratamento é facilitado, principalmente, no que diz respeito à retirada total da
próstata, a prostatectomia radical, conseguindo, na maioria dos casos, a remoção
total do câncer (Sharkey, 2002; Srougi, 2003).
5
Através de uma peça de tecido prostático, obtida por meio de biópsia, o especialista, através de
análise microscópica, determina a agressividade da doença.
30
CAPÍTULO 2: O TRATAMENTO DO CÂNCER DE PRÓSTATA E SUAS
CONSEQUÊNCIAS
2.1 Opções de Tratamento do Câncer de Próstata
O tratamento do câncer de próstata pode ser curativo ou paliativo. O
tratamento paliativo abrange técnicas para evitar a proliferação do câncer, como o
bloqueio androgênico, enquanto o tratamento curativo envolve a prostatectomia
radical e a radioterapia. Em ambas as opções de tratamento, o médico precisa
usar o bom senso para considerar qual abordagem se adequará melhor ao seu
paciente (Ferreira & Nardi, 1999). No momento de eleger qual o tratamento do
câncer de próstata, o paciente tem forte tendência a consultar mais de um
especialista, o que é considerado aceitável e, inclusive, estimulado pelos
profissionais de saúde. Descrevo, abaixo, as principais opções de tratamento do
câncer de próstata para que, na discussão das entrevistas, as falas dos
participantes da pesquisa possam ser mais bem compreendidas:
•
Radioterapia: geralmente, é indicada nos casos de tumores localizados e nos
avançados. A radioterapia é uma terapêutica local, de aplicação delimitada e
específica. “Porém, os tecidos vizinhos podem ser comprometidos e os pacientes
podem apresentar sintomas colaterais devido ao comprometimento de órgãos
situados no trajeto da radiação” (Yamaguchi, 1994, p. 26). Estudos mostram que o
tratamento apenas com radioterapia apresenta uma alta recidiva da doença
(Ferreira & Nardi, 1999). Entretanto, Denis et al. (2006) consideram que a
radioterapia por feixe externo (uma das formas de aplicação), assim como a
braquiterapia (sementes radioativas são implantadas na próstata), são alternativas
válidas à cirurgia. As sessões são subdivididas de acordo com a dose total
desejada;
31
•
Bloqueio Androgênico: é o tratamento padrão para o câncer de próstata
metastático.
Tem
como
finalidade
bloquear
os
andrógenos
(hormônios
masculinos) provenientes dos testículos e das glândulas adrenais, suprimindo as
células tumorais prostáticas hormônio-sensíveis. Geralmente, é feito através de
vacinas aplicadas periodicamente. Há dois tipos diferentes de antiandrogênicos:
esteroidais e não-esteroidais. Apenas os antiandrogênicos não-esteroidais estão
aprovados para uso no tratamento do câncer de próstata, nos EUA, neste
momento (Damião et al., 2006; Oncoguia, 2008);
•
Prostatectomia Radical: é a ablação, ou seja, a retirada total da próstata, das
vesículas seminais e dos linfonodos peri-prostáticos. O tratamento é indicado
quando o câncer não saiu dos limites da glândula (Mariano, 2002). Pode provocar
algumas complicações, como a disfunção erétil6, a estenose uretral7 e a
incontinência urinária. Pode ser feita por via abdominal (retropúbica) através de
uma incisão abaixo do umbigo, perineal ou laparoscópica (Ferreira & Nardi, 1999;
Zerbib & Perez, 2003; Blum & Picus, 2004). Para Blum e Picus (2004), a
prostatectomia radical laparoscópica “é a técnica de ressecção mais comum
atualmente e possibilita o emprego de técnicas de preservação dos nervos, o que
aumenta a probabilidade de preservar a potência, bem como a continência total”
(p. 447-448). Neste caso, a disfunção sexual e a incontinência urinária ocorrem
em menor incidência. Após o procedimento cirúrgico, deve-se realizar o
acompanhamento periódico, que inclui a dosagem do nível de PSA e o TR, a cada
3 meses, no primeiro ano; a cada 6 meses, no segundo ano, e, anualmente, a
partir do terceiro ano. O resultado do PSA pós prostatectomia radical é importante
indicativo da necessidade, ou não, de tratamentos complementares, quando ainda
persistem células prostáticas no organismo.
6
7
Dificuldade de produzir ou de manter ereção.
Retração da sutura entre a bexiga e a uretra.
32
2.2 Complicações da Prostatectomia Radical
Como a prostatectomia radical é a opção mais eleita de tratamento do
câncer de próstata e devido ao paciente prostatectomizado chegar ao meu
consultório com maior freqüência para tratar da disfunção urinária, pretendo
discutir, principalmente, as complicações que mais comumente ocorrem após o
tratamento cirúrgico, não deixando de discutir as outras, tais como a disfunção
erétil e a estenose uretral.
2.2.1 Disfunção erétil
A disfunção erétil (DE), definida como a “incapacidade do homem de
conseguir e manter a ereção do pênis de modo suficiente a permitir uma relação
sexual satisfatória” (Kaiser, 1998, p. 44), passou a ser assim denominada, pois,
anteriormente, era conhecida como impotência sexual, tendo em vista que o termo
“impotência” pode levar à diminuição da auto-estima masculina, fazendo o homem
crer que não é capaz de realizar atividades da sua rotina diária ao estender tal
sentimento a outras atividades e funções. Assim, seu uso passou a ser evitado. A
ocorrência da disfunção erétil é considerada significativa após a prostatectomia
radical, como afirmam Blum e Picus (2004):
a impotência ainda é um problema importante, e a taxa de
impotência total aumenta com a doença e a idade avançada.
Estima-se que 50% dos homens que são completamente
potentes antes da cirurgia reterão a potência após o
procedimento, mas as ereções podem não apresentar a
mesma qualidade (p. 454).
Para obter uma ereção adequada, deve haver integridade do funcionamento de
nervos, artérias e veias (Ellsworth et al., 2003).
A disfunção erétil atinge,
geralmente, homens com idade acima de 65 anos. Portanto, a idade é um fator
33
determinante desta complicação. Conforme Zerbib e Perez (2003), pode ocorrer
das seguintes formas:
•
disfunção sexual total, com ausência de ereção até um ano após a
intervenção (atinge cerca de 1/3 dos casos);
•
intumescência do pênis, mas sem rigidez suficiente para permitir uma
relação sexual com penetração (atinge outros 1/3 dos casos);
•
ereção insuficiente para manter relações sexuais com penetração (os 1/3
restante dos casos).
A incidência da DE após a prostatectomia radical varia de 16% a 82% (Ellsworth et
al., 2003). Srougi (2003) afirma que a DE ocorre em 50% dos pacientes operados,
entre 55 e 65 anos.
A DE pode ser revertida com medidas clínicas ou cirúrgicas. Os médicos
urologistas, na maioria das vezes, recomendam ao paciente prostatectomizado o
retorno espontâneo às atividades sexuais após cirurgia, podendo, em alguns
casos, fazer uso de medicação oral ou de injeções penianas intracavernosas,
para, em seguida, retornar às ereções espontâneas. Outras opções de tratamento
são os aparelhos a vácuo e as próteses penianas. Estas últimas, normalmente,
são evitadas pelos pacientes por exigir um novo procedimento cirúrgico e,
também, por implicar em um alto investimento financeiro.
2.2.2 Estenose uretral
É a retração da sutura entre a bexiga e a uretra, levando a uma redução da
força do jato da micção, o que dificulta o esvaziamento da bexiga. Por apresentar
tal característica, é de fundamental importância observar a qualidade do jato
urinário e, em caso de alteração, relatar ao urologista. Ocorre em 5% dos casos.
34
Seu tratamento requer uma nova intervenção, por via endoscópica, para
desobstruir a passagem da urina pela uretra (Zerbib & Perez, 2003). Em alguns
casos, estas novas intervenções podem agravar a recuperação da musculatura
lisa, que está em fase de cicatrização pós-operatória.
2.2.3 Incontinência urinária
Para
a Sociedade
Internacional
de
Continência (ICS) (1992), “a
incontinência urinária é uma condição na qual a perda involuntária de urina
constitui um problema social ou de higiene, e pode ser objetivamente
demonstrada” (Grosse & Sengler, 2002, p. 1). Porém, como afirmam Pereira et al.
(2006), tal problema é sub-reportado. Tal complicação é a que mais ocorre após a
prostatectomia radical. Durante o procedimento, pode ocorrer a remoção parcial
dos esfíncteres de musculatura lisa, localizada em volta da uretra (figura 2),
situada, exatamente, na área de incisão cirúrgica.
Bexiga
Músculos do
Assoalho Pélvico
Figura 2
Anatomia Pélvica Masculina: Localização da Próstata e dos
Músculos do Assoalho Pélvico (Netter, 2008, p. 361).
35
A incontinência urinária é a complicação principal da prostatectomia radical.
Considerando a modernização dos procedimentos cirúrgicos, tal complicação foi
reduzida para 2% a 4% dos casos de incontinência ortostática8 grave que
persistem por mais de seis meses após a cirurgia (Zerbib & Perez, 2003).
Entretanto, outras taxas foram encontradas por Blum e Picus (2004): “estimou-se
que 8% dos homens terão incontinência urinária de estresse (ou aos esforços)
após a cirurgia (...). Mas, infelizmente, outros estudos, mostram taxas de
complicações maiores” (p. 454). Grosse e Sengler (2002) apontam taxas de 3 a
26% de incontinência urinária após a prostatectomia radical. Após um ano, a taxa
é de 3,6 a 6% para as incontinências importantes, e de 10% para as
incontinências ocasionais. Percebe-se, portanto, uma variação de resultados muito
grande, fazendo-se necessários, ainda, estudos mais aprofundados sobre a
incidência deste sintoma como conseqüência da retirada total da próstata.
A queixa principal de incontinência urinária nos homens prostatectomizados
ocorre, mais freqüentemente, em relação aos esforços, como, por exemplo, nas
mudanças de posição, passar da posição sentada para em pé. Outra queixa
comum de perda urinária se refere a outros tipos de esforços, como a tosse, o
espirro e ao pegar objetos pesados. Tal incontinência é classificada como
incontinência urinária de esforço (IUE) (Grosse & Sengler, 2002, Zerbib & Perez,
2003).
Diante das queixas dos pacientes, algumas estratégias são adotadas,
visando à diminuição da perda de urina durante os pequenos e os médios
esforços, já que os grandes esforços são evitados durante o período de
convalescência da cirurgia. Em alguns casos de incontinência urinária pósprostatectomia, é indicado o tratamento conservador, como é chamada a
fisioterapia, já que não realiza recursos invasivos como os cirúrgicos, e o qual é
realizado com o intuito de fortalecer os esfíncteres urinários de musculatura
estriada (esfíncteres inferiores) e sua atuação junto aos esfíncteres de
8
Ocorre perda de urina, principalmente, quando o paciente se encontra em pé.
36
musculatura lisa (esfíncteres superiores), que foram parcialmente comprometidos
durante a cirurgia de retirada da próstata, já que têm sua localização na conexão
entre a bexiga e a uretra, ou seja, bem próxima à próstata (Grosse & Sengler,
2002). Desde 1948, Arnold Kegel, o primeiro a se dedicar e a desenvolver
pesquisas sobre o tema, deu o primeiro passo para o futuro reconhecimento de tal
especialidade. Sendo assim, a seguir, descreverei, de forma sucinta, os recursos
técnicos utilizados na fisioterapia do assoalho pélvico.
2.3 A Fisioterapia do Assoalho Pélvico Pós-Prostatectomia Radical
2.3.1 Objetivos da fisioterapia do assoalho pélvico
Na fisioterapia do assoalho pélvico, algumas técnicas são utilizadas com a
finalidade de reeducar o controle urinário. Cada paciente tem uma maneira própria
de lidar com sua doença e, conseqüentemente, com seu tratamento. É neste
sentido que os pacientes que desenvolvem processos depressivos por conta da
doença se mostram desestimulados com relação às suas atividades diárias. Em
contrapartida, a criação de novos significados para suas vidas faz parte dos
aspectos psicológicos que colaboram para o envelhecimento com bem-estar e
satisfação (Goldenstein & Neri, 1993; Néri, 1993). Os pacientes, mais
desestimulados com a possibilidade de cura usam as complicações cirúrgicas
como pretexto para se assumir como vítimas, mesmo sendo esclarecidos de que
as suas disfunções urinárias e sexuais são temporárias.
O resultado da fisioterapia depende muito da dedicação e da motivação do
paciente, pois ele deve realizar os exercícios no consultório, junto ao profissional,
e, também, em casa, diariamente. Em alguns casos, principalmente quando se
encontra com sintomas depressivos, faz-se necessário o seu encaminhamento
37
psiquiátrico ou psicológico. Alguns conseguem suprir suas angústias e medos com
a família e outros com o trabalho. Mas por que o médico especialista, ainda, não
adota, em sua rotina, a preocupação com a subjetvidade masculina durante o
enfrentamento do câncer de próstata? Esta é uma questão que merece especial
atenção, pois, há, ainda, grande dificuldade de abordar assuntos relativos à
subjetividade do paciente, por parte dos médicos.
Segundo Ellsworth et al. (2003), a incontinência urinária “pode levar à
ansiedade, ao desespero e à perda do autocontrole e da auto-estima (...) Pode
limitar as atividades sociais e a participação no sexo” (p. 163). Portanto, os
objetivos da fisioterapia no tratamento da incontinência urinária, segundo Tata,
(2000) e Moreno (2004a) são:
conscientização da contração e isolamento dos músculos agonistas
e antagonistas (músculos do assoalho pélvico e abdominais e
glúteos e adutores de quadril, respectivamente);
melhora da coordenação, da força e da capacidade de manutenção
da contração dos músculos do assoalho pélvico (MAPs);
aumento da superfície de corte transversal dos MAPs, promovendo
hipertrofia muscular;
aumento da capacidade de contrair os MAPs, principalmente nas
mudanças súbitas de pressão intra-abdominal (tosse, espirro e
esforços em geral);
facilitação da inibição do músculo detrusor, em casos de bexiga
hiperativa (pacientes com aumento da freqüência urinária).
Os exercícios do assoalho pélvico são capazes de melhorar ou, até mesmo,
de curar a incontinência urinária. Ao praticar exercícios localizados em um grupo
muscular específico, são realizados treinos de conscientização de cada fibra
componente desse grupo. No caso do assoalho pélvico, é promovida a hipertrofia
muscular, ou seja, o aumento do volume das fibras musculares, exercitando as
38
fibras tônicas, que representam 70% da musculatura do assoalho pélvico.
Conforme o paciente melhora seu controle voluntário de urina, ele passa a
recuperar, também, sua auto-estima, passando, inclusive, a se relacionar
socialmente melhor com os outros (Tata, 2000).
A fisioterapia do assoalho pélvico do paciente idoso deve ser considerada
um desafio, como argumenta Cott (2000):
é tarefa desafiadora ter de definir as metas da fisioterapia
para as pessoas da terceira idade. O fisioterapeuta precisa
dispor de uma ampla base de conhecimentos acerca dos
efeitos que a velhice, a doença e o ambiente exercem sobre
a capacidade motora das pessoas idosas. Ele precisa
desenvolver sua capacidade para resolver os problemas de
forma criativa, a fim de poder enfrentar os problemas
complicados que encontra, sobretudo nas pessoas
debilitadas da terceira idade (p. 195).
Apesar de a pessoa da terceira idade apresentar o mesmo potencial de resposta
de controle voluntário dos músculos do assoalho pélvico, sua resposta é mais
lenta do que a de um indivíduo jovem. Assim, embora ocorra mudança na
quantidade e na qualidade das fibras musculares que formam os esfíncteres
urinários, a reabilitação das suas funções ocorre de forma lenta, porém gradativa.
2.3.2
A
terapêutica
fisioterápica
da
incontinência
urinária
pós-
prostatectomia radical
A fisioterapia do assoalho pélvico passou a ser mais uma opção terapêutica
conservadora para tratar as disfunções pélvicas, como a incontinência urinária. Ela
recebe a denominação de conservadora por adotar procedimentos considerados
não invasivos (comparados à cirurgia, por exemplo), que são indicados como
primeira opção do tratamento, quando não há indicação cirúrgica para a doença.
As suas técnicas são, cada vez mais, modernizadas, contando, inclusive, com
equipamentos computadorizados, que auxiliam a reabilitar ou a prevenir as
39
disfunções do assoalho pélvico, ajudando o paciente a conhecer melhor seu
corpo, bem como reeducando seu controle sobre ele (Moreno, 2004b).
Pretendo, a seguir, descrever as técnicas mais utilizadas na reabilitação da
disfunção urinária após a prostatectomia radical. Tais técnicas são utilizadas pelo
fisioterapeuta com a intenção de minimizar ou de curar os sintomas de perda
urinária, bem como de acelerar o processo de recuperação da continência urinária
após a retirada total da próstata.
2.3.2.1 “Biofeedback”
A técnica surgiu quando o Dr. Arnold Kegel, médico ginecologista, em 1948,
montou um equipamento, fazendo uso de um manômetro e de uma sonda inflável,
que denominou de perineômetro: “biofeedback é um equipamento usado para
mensurar efeitos fisiológicos internos ou condições físicas das quais o indivíduo
não tem conhecimento” (Moreno, 2004b, p. 133). Os equipamentos existentes,
hoje, no mercado, são de duas modalidades: o “biofeedback” de pressão, que
quantifica a contração muscular em milímetros de mercúrio (mmHg), e o
“biofeedback” eletromiográfico de superfície (sEMG), que mede a atividade elétrica
gerada pela contração muscular, levando a um potencial de ação das fibras
musculares e gerando um registro visual e/ou auditivo. Ambos têm a finalidade de
guiar os exercícios dos músculos do assoalho pélvico, bem como de maximizar a
contração muscular (Grosse & Sengler, 1998; Moreno, 2004a; Stephenson &
O’Connor, 2004). O grande diferencial entre as modalidades é que, no
“biofeedback” eletomiográfico, pode-se monitorar a musculatura abdominal, que,
neste caso, é considerada musculatura sinérgica ou acessória.
Como o principal objetivo da técnica é monitorar os músculos do assoalho
pélvico (figura 3) para promover contrações localizadas e para que tais músculos
40
possam melhor exercer sua função no controle urinário, busca-se orientar o
paciente sobre a importância de se dissociar tais músculos. Ao observar a
resposta muscular de suas contrações, visualizada nos gráficos, o paciente passa
a ter melhor controle sobre as contrações dos músculos do assoalho pélvico e do
abdome, com a prática repetida dos exercícios monitorados.
Uretra
Músculos do
Assoalho Pélvico
Ânus
Figura 3.
Anatomia Pélvica Masculina: Músculos do Assoalho
Pélvico (Netter, 2008, p. 359).
Alguns cuidados quanto ao uso do “biofeedback” devem ser considerados,
como por exemplo: durante a avaliação, deve-se dar especial atenção ao tempo
de contração, bem como ao tempo de repouso muscular, e os exercícios devem
ser realizados em diferentes posturas (deitado, sentado e em pé) (Moreno,
2004a). O próprio paciente introduz um eletrodo anal, que é responsável pelo
monitoramento dos músculos estriados do assoalho pélvico, durante os exercícios
realizados por ele, e observa a formação dos gráficos através do monitor do
computador, cuja leitura é quantificada em microvolts. São feitos exercícios para
as fibras de contração rápida (fásicas) e as fibras de contração lenta (tônicas), ou
seja, respectivamente, exercícios de contração rápida, com sustentação de 1 a 2
segundos, e contrações sustentadas e repousos de 10 segundos, com a finalidade
41
de reforçar o mecanismo esfincteriano, promovendo uma hipertrofia, um aumento
do volume das fibras tônicas, bem como da velocidade e da força de contração
das fibras fásicas, ambas com a finalidade de proporcionar maior controle urinário.
2.3.2.2 Eletroestimulação
Moreno, Rotta e Castro (2004) afirmam que a eletroestimulação do
assoalho pélvico é capaz de aumentar a pressão intra-uretral, pois estimula,
diretamente, os nervos eferentes da musculatura peri-uretral e aumenta o fluxo
sanguíneo, restabelecendo as conexões neuromusculares, intensificando as
funções das fibras musculares e gerando hipertrofia e aumento de fibras fásicas
(rápidas). O estudo urodinâmico, exame realizado por urologistas com a finalidade
de investigar o comportamento da bexiga, em sua fase de enchimento e de
esvaziamento, permitiu que a eletroestimulação se transformasse numa técnica
eficaz, pois o exame consegue objetivar e quantificar a sua ação, realizando
comparações de antes e de após a fisioterapia (Grosse & Sengler, 2002).
Geralmente, os parâmetros para a aplicação da eletroestimulação são a
freqüência de 10 Hz e uma largura de pulso de 0,2 a 0,5 ms, nos casos de inibição
do músculo detrusor (em casos de bexiga hiperativa), e de 50 Hz e uma largura de
pulso de 0,2 a 0,5 ms, nos casos de fortalecimento dos músculos do assoalho
pélvico (figura 3). É importante destacar que a eletroestimulação, ou estimulação
elétrica funcional, realiza a estimulação do nervo responsável pela inervação da
região perineal, denominada de nervo pudendo, e, em resposta a tal estimulação
elétrica, ocorre a contração muscular dos músculos periuretrais e perianais
(Grosse & Sengler, 1998; Moreno et al., 2004). Nesta técnica, por meio da
emissão de impulsos elétricos através do eletrodo anal, é aplicado um programa
de fortalecimento das fibras musculares do assoalho pélvico. A freqüência de 50
Hz é a mais utilizada com os pacientes que apresentam perda de urina
involuntária, principalmente nos esforços, como nas tosses, nos espirros e nas
mudanças de decúbito. Outro programa utilizado é o de inibição do músculo
42
detrusor, com freqüência de 10 Hz, nos casos de pacientes que apresentam
sintomas de hiperatividade vesical (síndrome que apresenta aumento do número
de micções) (Grosse & Sengler, 2002). Orientações à prática de exercícios
domiciliares são realizadas com o intuito de melhorar o desempenho da atividade
muscular, a ser efetivada nos dias nos quais o paciente não faz tratamento
fisioterápico no consultório. Portanto, o fortalecimento dessa musculatura está
diretamente relacionado ao controle urinário, pois ela se localiza ao redor da uretra
e do ânus.
É durante a aplicação da eletroestimulação, na qual os pacientes
permanecem passivos, que muitos deles aproveitam para esclarecer dúvidas
sobre o tratamento e para falar um pouco de si mesmos. Nestes momentos,
conversas costumam ocorrer espontaneamente, em meu consultório, sobre
diversos assuntos, desde cultura, política e família até suas conquistas e derrotas,
bem como seus anseios e, especialmente, suas aflições sobre a fase da vida em
que estão e o enfrentamento da doença. A partir dos primeiros sinais de melhora
da incontinência urinária, o paciente passa a se preocupar, mais intensamente,
com outro “fantasma”: a disfunção erétil. Muitos pacientes já apresentavam
dificuldade de manter a ereção antes da cirurgia e, é claro, sua dificuldade pode
se agravar, após a cirurgia. Os pacientes sempre são orientados para que tenham
paciência, pois, para voltar a ter relações sexuais satisfatórias com suas parceiras,
é importante, primeiramente, recuperar o controle urinário, pois sua auto-estima
fica muito abalada com a perda involuntária de urina, o que pode comprometer
ainda mais a função sexual. Nesta fase, será preciso utilizar alguns recursos para
o retorno às práticas sexuais. Geralmente, nas disfunções sexuais, é indicado o
uso de medicamentos que facilitem a ereção, prescritos pelo médico urologista,
não descartando o acompanhamento de um psicólogo ou de um sexólogo, pois o
urologista trata das complicações físicas da disfunção erétil, enquanto o psicólogo
ou o sexólogo trata das complicações psicológicas, como a insegurança e a baixa
auto-estima.
43
As sessões de fisioterapia duram, aproximadamente, uma hora, e são
realizadas duas a três vezes por semana, em dias alternados, durante um período
de dois meses, em média. Após o tratamento, o paciente continua a prática dos
exercícios em casa e retorna para uma reavaliação fisioterápica, depois de três
meses.
Porém,
na
maioria
dos
casos,
os
pacientes
se
referem
ao
desaparecimento completo do sintoma de perda urinária nesse período,
permanecendo apenas com o retorno periódico ao urologista.
Destaco que a fisioterapia não apenas leva em consideração a limitação
física, mas, também, oferece apoio emocional aos pacientes, durante o tratamento
pós-prostatectomia, pois o fisioterapeuta mantém contato de longa duração com o
paciente. Eu, por exemplo, realizo 20 sessões de fisioterapia no paciente
prostatectomizado, com queixas urinárias, o que representa, aproximadamente, 20
horas de convívio. Portanto, enfatizo a relevância do papel do fisioterapeuta como
suporte emocional dos seus pacientes, nesta fase do tratamento.
2.3.2.3 Cinesioterapia
Como afirma Moreno (2004a), os exercícios do assoalho pélvico ficaram
conhecidos como “exercícios de Kegel”, pois tal ginecologista deu-lhe um grande
incentivo científico. Entretanto, somente em 1992, a Sociedade Internacional de
Continência (ICS) validou as técnicas de reabilitação do assoalho pélvico (Moreno,
2004a). A cinesioterapia não tem contra-indicações e pode ser realizada pelo
paciente, em domicílio, após ter adquirido conscientização da contração da
musculatura pélvica, o que, geralmente, é conseguido, no consultório ou no
ambulatório de fisioterapia, durante sessões iniciais, que variam de uma a três
vezes por semana. É importante ressaltar que, gradativamente, a posição dos
exercícios é modificada, iniciando-se na posição deitada, tendo como objetivo
finalizar as sessões com o treino na posição de pé. Para Pereira et al. (2006),
44
os exercícios terapêuticos para a melhora da coordenação,
força e resistência (endurance)9 da musculatura do assoalho
pélvico, os exercícios de Kegel, bem como a
eletroestimulação elétrica e o uso do biofeedback, têm
apresentado resultados significativos (p. 1208).
Os
exercícios
associados
a
outros
recursos
fisioterápicos
aceleram
o
fortalecimento da musculatura pélvica, modificando os sintomas com maior
brevidade.
2.3.2.4 Terapia comportamental
O tratamento comportamental é uma associação de técnicas cuja base é a
idéia de que pacientes com incontinência urinária podem ser educados sobre sua
patologia e desenvolver estratégias para minimizá-la ou eliminá-la (Moreno &
Souza, 2004). Para adotar medidas comportamentais, faz-se imprescindível
conhecer a rotina do paciente, investigando, minuciosamente, seus hábitos
alimentares e suas atividades físicas, inclusive seus hábitos de micção e
defecação,
para,
em
seguida,
poder
utilizar
a
terapia
comportamental
adequadamente. Para tanto, utiliza-se o diário miccional, ou seja, anotações de
suas micções em um período de um a três dias. Tal registro inclui o horário de
cada micção diurna e noturna e a sua magnitude, bem como as ocorrências de
perda de urina (Grosse & Sengler, 1998). As orientações comportamentais
dependem dos sintomas apresentados, mas, geralmente, são sugeridos: o
esvaziamento pontual, em horários pré-determinados para cada micção e a
diminuição de alimentos irritativos da bexiga, como a cafeína e os condimentos
(por exemplo, a pimenta), em especial quando o paciente apresenta sintomas de
hiperatividade, na qual o paciente apresenta a capacidade de armazenamento
reduzida, com intervalos de uma micção para outra bastante diminuídos.
9
Capacidade da musculatura para manter uma contração prolongada, em média por 10 segundos.
45
CAPÍTULO 3 - O SUJEITO QUE ADOECE
3.1 A Subjetividade do Doente
Para melhor compreender o sujeito que adoece, é preciso discutir como ele
significa sua saúde e sua doença. Segundo González-Rey (2004),
a
subjetividade
representa
um
sistema
aberto,
pluridimensional,
complexo
e
em
constante
desenvolvimento, que define sua qualidade por meio de uma
multiplicidade diferenciada de configurações, as quais não
se repetem em cada sujeito ou instância social concreta que
a constitui (p. 119).
Hoje, a concepção biopsicossocial predomina no estudo do ser humano, não
sendo mais possível separar corpo e mente. Para Gonzalez-Rey (2005) “a
questão do corpo está estreitamente relacionada à recuperação da emoção como
tema essencial na construção da subjetividade...” (p. 26). A partir de tal concepção
que integra corpo e mente, surgiu a psicossomática, que é considerada filosofia e
ciência, pois define o ser humano como seu objeto de estudo, investigando “os
mecanismos de interação entre as dimensões mental e corporal da pessoa”
(Riechelmann, 2002). De que forma o individuo significa a sua doença? Como o
sintoma surge com manifestações físicas e psíquicas? São estas algumas das
indagações da psicossomática (Ávila, 2002). Desta forma, fatores relacionados ao
corpo-mente não podem ser pensados separadamente; ao contrário, deve ser
enfatizada
a
íntima
relação
do
corpo,
da
mente,
do
ambiente
e,
conseqüentemente, da sociedade, que articula todos esses elementos da
investigação psicossomática. É por basear-se na relação corpo-mente que surgiu
a perspectiva da interdisciplinaridade, na qual profissionais de diferentes
especialidades passaram a atuar no tratamento do câncer, como os da medicina,
da psicologia, da enfermagem e da fisioterapia, todos buscando fazer o paciente
retornar, o mais rápido possível, às atividades desenvolvidas anteriormente à
46
doença, tais como as suas atividades profissionais, físicas e intelectuais. O mais
significativo desta nova concepção interdisciplinar ou transdisciplinar é a
integração entre as áreas da saúde, ou melhor, entre os profissionais, tendo o
paciente como foco de suas condutas. Quando se trabalha de forma
multidisciplinar, cada profissional exerce de forma integral, seu papel como
especialista da oncologia, enquanto, na interdisciplinaridade, se faz necessário
que, não apenas tais profissionais se envolvam com os pacientes, mas que
desenvolvam uma relação com os demais profissionais, com a finalidade de somar
forças e de alcançar a excelência em seus serviços, e, conseqüentemente, na
evolução do paciente.
González-Rey (2004) considera que as relações do homem com o meio
social se expressam no psiquismo através das suas emoções e concepções. O
contexto social age, constantemente, sobre o paciente, quer seja na sua saúde,
quer seja na sua doença. Afirma que “a qualidade das emoções e sua
significação, para o desenvolvimento humano, são um grande desafio para a
construção do conhecimento psicológico” (p. 85). Baseio-me nesta concepção
para buscar compreender o significado que os homens investigados atribuem ao
seu adoecimento, bem como qual a percepção que têm de seus sentimentos,
durante tal fase de suas vidas.
Compreender a subjetividade do sujeito que adoece é compreender o que
ele fala, pois sua fala pode dizer muito do que ele sente. Amatuzzi (2008) afirma
que “o homem não é um ‘bicho’ que fala, mas ele é a própria palavra” (p. 9). Para
tratar do ser humano, “a consideração do sentido é fundamental” (p. 10). Assim,
“fazemos de nossa ignorância nossa virtude e nos lançamos à procura de um
deciframento do universo que é a própria procura de nossa significação” (Ávila,
2002, p. 16). Entendo que compreender o ser humano representa entendê-lo, na
saúde e na doença. Portanto, a questão que investigo é a percepção que o
homem prostatectomizado tem da sua doença e de seu tratamento, discutindo
como ele atribui significados diversos à sua própria experiência vivida.
47
3.1.1 O adoecer e o envelhecimento
Adoecer é um evento complexo e com variáveis implicações, que podem ir
desde a relação do paciente com o próprio corpo, bem como, também, às suas
mudanças comportamentais (Lopes, 2005). Como considera Neri (1993), as
doenças podem gerar diferentes graus de ansiedade, dependendo da história
pessoal, do suporte afetivo, do nível social e dos valores individuais do doente.
No câncer, tais reações, também, podem ocorrer, pois, segundo Deshields (2004),
“à medida que o tratamento do câncer avançou, as taxas de sobrevida elevaramse, levando a uma maior atenção sobre a qualidade de vida, que engloba um
conjunto
de
questões
que
são
maciçamente
influenciadas
por
fatores
psicossociais” (p. 594). Sendo assim, a interação entre corpo e mente deve ser
considerada no tratamento do câncer, independentemente de sua localização.
Conseqüentemente, as terapias psicológicas devem ser uma opção de tratamento
para auxiliar o paciente na superação da doença e no seu respectivo tratamento.
Ávila (2002) afirma que “o sujeito tem o seu corpo, e, mais que isso, ele é o
seu corpo” (p. 10). Ao adoecer, seu corpo não pode ser separado de sua mente,
ou seja, seu psiquismo está envolvido no processo do adoecimento, já que o
homem engloba diversas dimensões: física, social, mental e emocional. A doença,
na concepção psicossomática:
trata-se de processos e mecanismos que afetam o corpo,
perturbando suas funções e acarretando transformações
que colocam em risco seja uma área ou função localizada
do organismo, seja ele todo, quando pode estar
comprometida sua sobrevivência (p. 23).
Desta forma, Ávila propõe que “o homem é um ser total, corpo e mente
indissolúveis” (p. 36), mas, para ser integral ou pleno, é preciso que sua mente
esteja em exercício. Quando se trata de um paciente com câncer de próstata, as
decisões acerca do tratamento, geralmente, são tomadas em um breve espaço de
tempo, não tendo ele muita opção de escolha diante do seu quadro, o que não o
48
impede de tentar negar que seu corpo adoeceu e que, agora, seu corpo-mente
reage a tal evento.
Sobre este momento, alguns investigadores remetem ao
estresse de adaptação, por meio do qual o organismo inicia uma resposta de
defesa, reagindo ao processo da doença (Angerami - Camon, 2002; Ávila, 2002).
Cada doente reage de forma individual ao adoecimento, pois fatores internos e
externos contribuem para sua resposta adaptativa.
Papaléo Netto (2006) afirma que, para compreender a saúde, deve-se
considerar “a complexa inter-relação entre aspectos físicos, funcionais e
psicológicos da saúde e da doença, além das considerações sócio-econômicas e
fatores ambientais” (p. 11). Conforme Néri (1993), os próprios idosos diferenciam
os principais agentes estressores em quatro categorias:
1. problemas de saúde;
2. questões sociais;
3. problemas familiares;
4. problemas de amigos e de vizinhos e a necessidade de ajudá-los.
Endosso tal percepção, pois tenho ouvido o mesmo registro de meus pacientes
com relação aos agentes estressores. Tais problemas geram sofrimento psíquico,
e, conseqüentemente, grande estresse. Os idosos saudáveis conseguem se
adaptar com mais facilidade às situações de estresse, mas, quando são
acometidos de doenças, elas passam a desencadear problemas que afetam todas
as dimensões do indivíduo. Como mostra a classificação de agentes estressores
referida acima, primeiro, são citadas as doenças; em seguida, as questões sociais,
que são muito valorizadas pelas pessoas da terceira idade, sendo uma das
principais formas de ocupação de seu tempo nessa fase da vida, quer ocorram em
sua comunidade, por meio de atividades voluntárias, quer em outras atividades em
grupo; outros fatores desencadeadores de estresse nos idosos são os problemas
familiares, que podem atingi-los de diversas maneiras, gerando angústia por não
poderem solucionar o problema ou por perceber um ente querido enfrentando
49
alguma dificuldade; por último, são citados como agentes estressores os
problemas dos amigos e dos vizinhos, pessoas do seu convívio diário, às vezes,
bem mais freqüente do que com seus filhos, genros, noras e netos. Em seu
estudo, Néri pôde observar que os problemas de saúde superam os demais.
Contudo, é relevante destacar que, mesmo sob a influência de agentes
estressores importantes, o idoso ainda se envolve com problemas sociais dos
grupos mais próximos de sua convivência diária, como os amigos e os vizinhos.
Seguindo a mesma linha de pensamento, Goldfarb (1998) afirma que as limitações
corporais e a consciência da ação do tempo são temas essenciais, quando se
trata do enfrentamento da dor e das emoções no envelhecimento:
quando um acontecimento ligado à dor ou emoção irrompe
em uma história singular, a construção que o sujeito fará
dessa ocorrência dependerá não só da conexão particular
entre seu corpo e sua psique, mas também da resposta que
sua dor ou emoção gere no outro. Emoção e dor vão
formando sucessivas representações do corpo, que se
articularão com as motivações inconscientes, e juntas
decidirão sobre a eleição da causa à qual o sujeito vai
atribuir o sentido histórico dos acontecimentos de sua vida.
A identidade de um sujeito será então esta história que ele
mesmo escreve, na qual fala de seu corpo. A história do
sujeito é a história das marcas relacionais de dor e emoção
em seu corpo; esta é sua identidade (p. 44-45).
Portanto, na terceira idade, são necessários diversos processos adaptativos para
podermos considerá-la bem sucedida. Néri (1993) e Freire (2000) destacam que o
processo de adaptação é multidimensional: é emocional por promover habilidades
de auto-regulação para lidar com os agentes estressores; é cognitivo por gerar
soluções de problemas; e é comportamental por sugerir ações efetivas e
competência social.
O envelhecimento e a velhice nos remetem à variabilidade e à plasticidade,
que são mais solicitadas nesse período da vida que, geralmente, sofre um
aumento dos agentes estressores. É na velhice que a capacidade de adaptação
às mudanças da vida é mais exigida, como destaca Zimerman (2000): “é preciso
50
ter coragem para enfrentar a terceira idade, para superar as perdas, continuar
amando e tendo prazeres na vida” (p. 32). Cada indivíduo reage à velhice de
forma diferente, pois a sua plasticidade é extremamente variável:conforme sua
história de vida e sua personalidade, cada sujeito pode ter diferentes respostas ao
mesmo agente estressor. Entretanto, não podemos deduzir que, por serem
pessoas experientes e com uma “bagagem” importante de experiências, elas não
possam se mostrar frágeis em determinadas situações, como no caso de uma
doença.
Como
afirma
Néri
(1993),
“a
plasticidade
comportamental
ou
adaptatividade é o critério para avaliar o potencial e o grau de preparação do
indivíduo para lidar com vários tipos de demandas” (p. 28). Compartilhando da
mesma concepção, Freire (2000) afirma que “há evidências de que as pessoas
mais velhas tornam-se mais eficazes nos usos de processos adaptativos” (p. 27).
Carvalho (1994) considera que os pacientes acompanhados por ela demonstraram
que, após o tratamento do câncer, reformularam suas vidas. Pondera que a
doença pode ser um importante determinante para uma maior integração do
indivíduo e afirma que “o sistema imunológico é fortemente afetado pelos
sentimentos e que determinados tipos de atitude psicológica podem influenciar
positivamente nosso sistema de defesa” (p. 279). Compreende, desta forma, o
equilíbrio psicológico do paciente em tratamento de câncer como um referencial
de cura, dependendo do acompanhamento que ele recebe, tanto por parte da
família quanto dos amigos ou dos profissionais. Destaco a condição psicológica do
paciente como um instrumento de fundamental importância na sua recuperação e
no tratamento das suas funções comprometidas, pelo processo de envelhecimento
ou por patologias a ele associadas.
Néri (2006) considera que diversas condições estão relacionadas à
qualidade de vida na velhice. No modelo de qualidade de vida de Lawton (figura
3), percebe-se claramente a integração entre o bem-estar psicológico da pessoa
idosa com os demais aspectos envolvidos na sua percepção da qualidade de vida,
na sua competência comportamental e nas condições ambientais. O modelo de
Lawton explica objetivamente tal integração entre os diversos aspectos envolvidos
51
na construção da qualidade de vida na terceira idade:
Bem-estar
psicológico
Qualidade de
Vida percebida
Competência
comportamental
Condições
ambientais
Figura 4. Modelo de qualidade de vida na velhice, de Lawton (Néri, 2006, p. 60).
O bem-estar psicológico na velhice está relacionado, por exemplo, aos
sentimentos positivos que os idosos desenvolvem acerca da sua vida, ao seu
interesse em aprender habilidades novas, à sua capacidade de concentração e,
até mesmo, à sua imagem corporal. As condições ambientais estão relacionadas
ao conforto do lar, à sua segurança, aos recursos financeiros e ao tipo de
transporte utilizado. Para a obtenção da qualidade de vida ou um envelhecimento
bem sucedido, o bem-estar psicológico deve ser construído pelo próprio indivíduo,
em conjunto com tais aspectos anteriormente citados. O bem-estar psicológico
está intimamente ligado à qualidade de vida percebida pelo próprio indivíduo,
como ele percebe suas metas significativas de vida, sua auto-realização, bem
como sua competência comportamental, ou seja, a capacidade de se adaptar às
diversas situações, em busca de satisfação e de auto-realização, domínios que
estão, também, relacionados às condições ambientais, que envolvem os âmbitos
familiar, profissional e pessoal.
Zimerman (2003) aponta que aprender a conviver com as limitações é o
segredo do bem-viver: “as pessoas mais saudáveis e otimistas têm mais
52
condições de se adaptarem às transformações trazidas pelo envelhecimento” (p.
25). Considerando que o processo de envelhecimento envolve mudanças
funcionais, emocionais, socioeconômicas e cognitivas, faz-se necessário avaliar a
situação multidimensional dos idosos. Ao conhecer como o idoso realiza suas
atividades diárias, por exemplo, seus hábitos de vida, podemos saber os cuidados
que tem com relação à sua saúde, e, conseqüentemente, à sua vida. Tais
cuidados podem ser considerados, inclusive, preventivos. Segundo Elias et al.
(2003),
viver a velhice constitui-se em atitude complexa, uma vez
que inclui um duplo desafio: enfrentar as transformações do
processo de envelhecimento, utilizando recursos pessoais e
do meio, e buscar e lutar por uma vida com qualidade (p. 69).
Sabendo das principais alterações da saúde na terceira idade, práticas
preventivas podem ser a melhor opção para favorecer a longevidade. Papaléo
Netto (2006) considera que
na maioria das pessoas, tais manifestações somáticas e
psicossociais começam a se tornar mais evidentes a partir
do fim do fim da terceira década de vida (...) muito antes da
idade cronológica que demarca socialmente a velhice (p.
10).
Aspectos físicos e psicológicos estão prejudicados na senescência, sendo
necessária uma nova postura de enfrentamento do processo de envelhecimento,
inclusive, com novas condutas de adaptação para saber lidar com seus sinais e
sintomas do envelhecimento. Tais alterações, já esperadas, como, por exemplo,
as mudanças na sexualidade do idoso, requerem algumas estratégias para seu
enfrentamento no intuito de prolongar, por mais alguns anos, a sua atividade
sexual, como será discutido a seguir.
53
3.2 A Sexualidade Masculina
3.2.1 A sexualidade masculina na terceira idade
Sobre a velhice, Rosita Santos (2006) afirma que “muitas expectativas
sobre essa fase da vida são mitos que passam a ser aceitos pelas pessoas e
determinam o modo como elas envelhecem (p. 71). Muitas pessoas consideram a
terceira idade uma fase da vida na qual não deve haver qualquer atividade sexual,
pois não associam o idoso ao prazer. Muitos idosos acreditam que as alterações
sexuais que surgem com o passar dos anos devem ser aceitas e se acomodam a
elas. Ribeiro Filho (2006) considera que ocorre uma diminuição da atividade
sexual com o envelhecimento, o que não significa que haja desinteresse pelo
sexo. Zimerman (2000) afirma que a atividade sexual na velhice é desestimulada
pela família e pela sociedade: “velho não tem vida sexual - esse mito é mais um
desrespeito com que a sociedade trata o velho, e com o qual ele próprio
compactua” (p. 43). São muitos os motivos para o idoso se afastar de uma vida
sexual ativa: aspectos sociais, físicos e emocionais podem, de forma isolada ou
associada, interferir na qualidade de sua vida sexual, mas, quando a pessoa,
mesmo de idade avançada, valoriza tal atividade, busca estratégias para
minimizar os seus obstáculos.
No caso dos homens de terceira idade, o comprometimento sexual mais
comum é a disfunção sexual (DS). A DS pode ser definida como “a persistente
incapacidade de manter ereção suficiente para uma relação sexual satisfatória”
(Ribeiro Filho, 2006, p. 746). Uma outra definição de DS pode ser “a diminuição
persistente dos padrões normais de interesse ou resposta sexual” (Hawton, 1997,
p. 529) Hoje, a causa mais comum da DS é vascular, mas as interferências
neurológicas, hormonais ou medicamentosas podem contribuir para seu
surgimento. Um outro fator causador de DS na terceira idade é a cirurgia de
54
retirada da próstata, a prostatectomia radical(Kaiser, 1998). Destaco que a função
sexual masculina normal não envolve apenas a capacidade de manter ereção,
mas depende da harmônica interação de fatores culturais, sociais e psicológicos.
Na terceira idade, é possível manter a vida sexual e considerar o amor e a
sexualidade de outras formas, valorizando mais o toque e o olhar, por exemplo
(Sueli Santos, 2006). Portanto, a sexualidade pode assumir, na terceira idade,
outras formas de expressão, que podem ser vivenciadas com os respectivos
parceiros, ou, até mesmo, com a família e os amigos, como declara Ribeiro Filho
(2006): “o velho não deixa de amar, mas reinventa formas amorosas” (p. 1303),
podendo manifestar sua sexualidade na forma em que se veste ou, até mesmo,
como se cuida. Sueli Santos (2006) concorda com tal concepção, afirmando que
o sexo e o amor na velhice mudam o caráter explosivo e
exuberante da juventude, tomando a forma da ternura, do
carinho, do toque sutil, da valorização da sensibilidade dos
pequenos gestos, respeitando as diferenças de suas
manifestações no homem e na mulher (p. 1303).
Portanto, é comum que, na velhice, seja necessária uma reconstrução da
sexualidade, já que o sexo adquire outras formas de expressão e a imagem
corporal, as relações com os parceiros, bem como o corpo e a mente se
modificam, mas não impedindo de vivê-la. Como considera Rosita Santos (2006),
“a sexualidade é uma dimensão humana que nos acompanha até a última fase da
vida. Portanto, sua vivência é benéfica e saudável em todas as idades, uma vez
que propicia prazer e bem-estar” (p. 75). Nesta fase da vida do homem de terceira
idade, objeto da atenção deste estudo, as experiências sexuais acumuladas em
sua história de vida podem auxiliá-lo nas estratégias de adaptação para driblar a
DE. Outro fator que pode ser considerado positivo é o relacionamento com sua
parceira, que, em geral, é sua companheira há bastante tempo e com a qual
mantém fortes vínculos emocionais.
As alterações na função sexual podem se apresentar de diversas maneiras.
Cairoli (2003) considera comum um homem idoso apresentar, na esfera sexual:
55
•
diminuição gradual do desejo, da resposta erétil e da sensibilidade
peniana;
•
maior tempo para conseguir uma ereção, precisando de maior
estímulo físico direto, e com declínio gradual da rigidez;
•
ereções menos responsivas aos estímulos visuais, psicológicos ou
não genitais;
•
redução da duração do orgasmo, com diminuição da força de
contração da musculatura pélvica;
•
redução da força de emissão e ejaculação, a última com menor
período de inevitabilidade;
•
rápida detumescência pós-orgasmo;
•
período refratário prolongado.
Tais limites podem ser enfrentados com auxílio de um médico especialista, em
conjunto com um terapeuta sexual. Muitas são as estratégias existentes,
atualmente, como, por exemplo, os medicamentos orais e as próteses penianas
insufláveis, e as possibilidades de superar as modificações próprias da idade
avançada e de buscar uma vida sexual ativa e prazerosa.
3.2.2 A sexualidade pós-prostatectomia radical
Não há muita informação, na literatura especializada, sobre a sexualidade
do paciente prostatectomizado, talvez por ser um assunto de difícil abordagem, já
que, para muitos, não é fácil expor sua intimidade. Uma das complicações
cirúrgicas da prostatectomia radical é a disfunção erétil. Na terceira idade, quando
são mais comuns os problemas da próstata, a função erétil pode já se encontrar
com alterações. Portanto, nesta fase, faz-se necessário que o homem,
dependendo
da
sua
história
de
vida,
ressignifique
sua
sexualidade,
independentemente das suas condições físicas, pois, como considera Sueli
56
Santos (2006), “a sexualidade não está determinada apenas pela constituição
biológica, mas é uma construção psicossexual” (p. 1302). Segundo Gianini (2007),
a DE pode atingir a essência da masculinidade, o orgulho e o prazer de viver de
muitos homens. Os conflitos gerados pela DE, comumente, desencadeiam perda
da auto-estima. Além da relação com a(o) parceira(o), há outros aspectos a serem
considerados no que se refere à sexualidade do portador de câncer:
muitas vezes, a sexualidade humana é considerada apenas
uma função sexual, quando, na verdade, se trata de um
complexo processo, no qual aspectos biológicos, sociais,
culturais e ético-valorativos interatuam e se integram (p. 25).
Entretanto, não se pode afirmar que todo paciente prostatectomizado desenvolva
disfunção sexual (DS), pois apenas um percentual apresenta queixa importante
após a cirurgia, mas, caso ela venha a ocorrer, ele precisa adotar estratégias para
enfrentá-la. A DS pode alterar a percepção de sua qualidade de vida, podendo
comprometer não apenas sua vida sexual, mas, também, a relacional, inclusive
causando repercussão nos demais aspectos de sua vida, como a social.
Para o diagnóstico da DS, podem ser realizados alguns exames para
identificar a sua causa, tais como o “doppler” peniano, que verifica o estado
vascular do pênis através da medição da sua pressão e dos níveis hormonais
(testosterona, testosterona biodisponível e hormônio luteinizante), que devem ser
dosados. Outro exame é o teste de tumescência peniana noturna, que verifica a
função peniana durante o sono, indicado para homens com menos de 50 anos, já
que, após essa idade, é mais comum apresentarem comprometimento dessa
função (Kaiser, 1998). Lopes (2005) afirma: “os efeitos colaterais do tratamento do
câncer afetam não só a auto-imagem, mas também a própria identidade sexual”
(p. 35). Por estas razões, é imprescindível, que o paciente converse com seu
médico, antes de tomar qualquer decisão de tratar a DS, pois a escolha do
tratamento deve ser levada em consideração por ambos.
57
3.3 A Psico-Oncologia no Tratamento do Câncer de Próstata
A psico-oncologia investiga o impacto do câncer na subjetividade do
paciente, na sua família e nos profissionais que lidam, diariamente com ele, bem
como a influência das variáveis psicológicas e comportamentais relacionadas ao
seu surgimento e evolução sobre eles (Gimenes et al., 2002). É recente o
interesse pelos aspectos psicossociais do câncer. Uma abordagem mais recente
ainda é a preocupação com a qualidade de vida do paciente com câncer. A psicooncologia destaca o papel dos aspectos psicossociais tanto na etiologia quanto no
desenvolvimento, bem como na prevenção e na reabilitação da doença,
perpassando, também, o suporte familiar e da equipe multidisciplinar (Gimenes,
1994). Portanto, a psico-oncologia é uma abordagem multidimensional e pode ser
definida, segundo Carvalho (1994), como o “ramo da medicina que se ocupa da
assistência ao paciente com câncer, do seu contexto (familiar e social) e dos
aspectos médico-administrativos presentes no contexto desse paciente” (p. 45). A
psico-oncologia assume o papel de “auxiliar o paciente e sua família a lidar com os
efeitos colaterais dos tratamentos e seus impactos no dia-a-dia” (p. 44). A partir
da portaria nº 3.535 do Ministério da Saúde, publicada no Diário Oficial da União,
em 14/10/1998, a presença do psicólogo nos serviços de suporte, nos centros de
atendimento em oncologia, junto ao SUS tornou-se obrigatória (Carvalho, 2002).
Esta realidade, também, deveria ser exigida dos serviços particulares, pois
entendo que o paciente oncológico precisa de acompanhamento psicoterápico,
não importando de qual tipo de serviço, público ou privado, ele faça uso.
A psico-oncologia transcende diversos saberes científicos, na busca de
uma maior compreensão da doença e um suporte transdisciplinar para o paciente
com câncer. Temas como a percepção do estigma que envolve a doença, o
significado da experiência pessoal com o câncer e a percepção da especificidade
do câncer e do paciente com câncer dizem respeito à psico-oncologia. Não
apenas o paciente com câncer é alvo de seus estudos, mas, também, o
58
profissional que lida com a doença, adotando alguns objetos de pesquisa, como,
por exemplo, os limites da atuação do profissional, a necessidade de que ele
desenvolva uma percepção e uma compreensão do mundo interno do paciente,
bem como uma habilidade de comunicação e de lidar com a dor, o sofrimento e a
morte, mantendo sua disponibilidade de atendê-lo (Gimenes et al., 2002).
3.3.1 A reabilitação psicossocial do paciente com câncer de próstata
As informações anatômicas, fisiológicas, diagnósticas e terapêuticas são
explicadas ao paciente para uma melhor compreensão de sua vivência, bem como
de seu comportamento diante do adoecimento. Reconhecer e considerar o
desconforto gerado pelo câncer de próstata e pelo seu tratamento deve ser atitude
expressiva do profissional e dos demais interessados no paciente. Portanto,
ponderar o adoecimento, bem como o sofrimento psíquico por ele gerado é de
fundamental importância para o acompanhamento e a reabilitação do paciente.
O câncer de próstata não é muito diferente de outros cânceres, pois,
também, gera alguns comprometimentos temporários e permanentes para o
paciente. No caso do câncer de próstata, ocorrem alterações das funções urinária
e sexual, que podem ser temporárias ou permanentes. A doença causa, portanto,
impactos que podem comprometer várias funções e que devem ser considerados,
como destaca Gillis (2006):
a Organização Mundial de Saúde estipulou um modelo para
descrever o impacto da doença ou lesão em um indivíduo.
Comprometimento é a perda ou anormalidade de estrutura
fisiológica ou função psicológica ou anatômica. Deficiência
representa qualquer restrição ou falta, resultante da diminuição na
capacidade de um indivíduo agir de maneira considerada normal
para um ser humano. Desvantagem é o prejuízo para o indivíduo,
resultante do comprometimento ou deficiência, que limita ou
impede o desempenho normal ou habitual para aquele indivíduo
(p. 823).
59
Quando ocorre uma disfunção decorrente do câncer, as terapias de reabilitação
têm o objetivo de revertê-la ou de evitar a incapacidade. O tratamento pode exigir
a participação de profissionais de diferentes especialidades. Médicos, psicólogos,
enfermeiros, nutricionistas, assistentes sociais e fisioterapeutas são alguns dos
profissionais que estão, diretamente ou indiretamente, ligados ao paciente em
tratamento de câncer. A reabilitação pode ser definida como “o processo de
restauração ou maximização da qualidade de vida de um indivíduo por meio da
atenção às suas funções física, psicológica, vocacional e aos papéis sociais
desempenhados por ele” (p. 819). O paciente recebe apoio técnico e emocional da
equipe transdisciplinar que o acompanha. Tal suporte pode incentivar o paciente a
enfrentar a doença de maneira mais positiva, ou, até mesmo, o tratamento com
melhores expectativas de cura e, conseqüentemente, com possibilidade de dar
continuidade às suas funções pessoais e profissionais em condições desejadas.
A família, também, se destaca com importante papel nesse contexto. Sua
importância na recuperação do paciente é fundamental, pois, diante do sofrimento
psíquico vivenciado por ele, ela é considerada um apoio que passa a ter sentido
de encorajamento, estimulando o indivíduo a lutar pela vida, pois a torna
significativa. A família pode incentivar o paciente na realização do tratamento,
preocupar-se com seu progresso e a alcançar a cura para conviver, muitos anos,
ao seu lado. Alguns estudos mostram a importância da família no tratamento do
câncer. Mello Filho (2004), por exemplo, acompanhou pacientes com vários tipos
de câncer, e constatou a influência das posturas familiares na evolução de cada
caso. Os casos que não tiveram bom prognóstico tinham más relações familiares.
Podemos, portanto, perceber que a família pode interferir de forma positiva ou
negativa no tratamento do câncer. A mulher e os filhos podem participar,
ativamente, do processo de recuperação do paciente, pois é neles que o paciente
se apóia para encontrar motivação para lutar conta o câncer e continuar vivendo
ao lado de seus entes queridos. Portanto, a família é considerada o principal ponto
de apoio para o doente. Para Campos (2004), a família extensa, ou seja, os
parentes envolvidos por consangüinidade, casamento ou adoção, tem funções
60
afetiva, socializadora e cuidadora, “à medida que determinadas normas e valores
são exercidos e sustentados pelos membros da família, e à medida que os laços
afetivos são mantidos, gerando a preocupação de se cuidarem uns aos outros”
(p.143). Desta forma, a integração familiar influencia na subjetividade do paciente
e vice-versa, pois naqueles em que existem fortes vínculos familiares percebe-se
uma melhor postura de enfrentamento da doença.
3.3.2 Psico-oncologia: uma abordagem psicossocial
Durante muito tempo o diagnóstico de câncer era considerado uma
sentença de morte. Contudo, tal realidade se modificou, incorporando, inclusive,
novas concepções acerca da doença. Segundo Gimenes et al. (2002), “a palavra
câncer é utilizada para descrever um grupo de doenças que se caracterizam pela
anormalidade das células e pela sua divisão excessiva” (p. 49). Entretanto, o
diagnóstico do câncer, freqüentemente, ainda é acompanhado de depressão
(Moraes, 1994), pois pode gerar sofrimento psíquico no paciente. Portanto, na
apresentação do diagnóstico, ou seja, no momento em que o médico confirma a
doença ao paciente, deve ter toda cautela com relação à maneira como a
informação é transmitida, pois pode ser significativa no decorrer do tratamento.
Yamaguchi (1994) considera que
uma doença que traz consigo o discutível estigma da morte
incorporado à nossa cultura traduz-se necessariamente
numa relação médico-paciente com características
diferentes de situações menos contundentes (...) Mas,
quando esse diagnóstico chega ao indivíduo, a primeira
reação costuma ser o medo de que, no seu caso, além de
não ser curado, o câncer vá trazer consigo muito sofrimento,
humilhação física e dor (p. 30).
Lopes (2005) concorda com tal perspectiva, pois afirma que muitos pacientes com
câncer se tornam deprimidos pelo estigma da doença, como a possibilidade de
morte e pelas limitações a ela associadas. Segundo Kubler-Ross (1989), durante
61
a possível aceitação da morte, o paciente desenvolve um processo de luto que se
divide em 5 fases: a primeira fase é a de negação e de isolamento, que,
comumente, ocorre no momento do diagnóstico; a raiva, na segunda fase, o
fazendo se sentir revoltado por estar doente; a terceira fase é a de barganha, na
qual o paciente negocia com seus médicos e amigos a possibilidade de cura; na
quarta fase, de depressão, ele não mais nega a doença, mas, ao contrário,
percebe sua gravidade e receia suas conseqüências; e, por último, a quinta fase,
da aceitação, em que reconhece sua condição de finitude, como ser humano.
Cada paciente enfrenta o câncer de uma maneira, desenvolvendo
mecanismos de defesa peculiares a cada indivíduo. Alguns pacientes podem
apresentar quadros depressivos durante o tratamento, expressando sentimentos
de desamparo ou de desespero. As depressões, na velhice, são, geralmente,
associadas a perdas, a doenças, a carências e a aspectos sociais (Zimerman,
2000). Quando todos esses aspectos encontram-se reunidos em um mesmo
momento, torna-se mais difícil seu enfrentamento e não apenas o paciente, mas,
também, os profissionais envolvidos devem estar atentos aos primeiros sintomas
de depressão. Quando as pessoas estão deprimidas, apresentam tendência a
sentimentos de culpa e acham que estão decepcionando ou dando trabalho à sua
família.
Podem se tornar mais irritadas e ansiosas, com alterações no seu
comportamento de rotina, como, por exemplo, desinteresse na higiene pessoal, na
leitura ou em ver televisão. Critérios são utilizados para identificar os sintomas
depressivos, como mostra o quadro a seguir:
- O conjunto de sintomas deve estar presente por ≥ 2 semanas
- É necessário um destes sintomas:
- Depressão do humor
- Diminuição no interesse das atividades da vida diária
- São necessários pelo menos quatro desses sintomas:
- Alteração do apetite ou no peso
- Insônia ou hipersonia
- Agitação ou retardo psicomotor
- Fadiga
- Sentimento de inutilidade ou culpa
- Déficit na capacidade de concentração
- Idéias, planos ou tentativas de suicídio
Quadro 1. Critérios Diagnósticos para Depressão Importante (Deshields, 2004, p. 595).
62
Tais sintomas devem ser observados, pois, quanto antes diagnosticada a
depressão, mais precocemente será realizada sua abordagem terapêutica. O
câncer é uma doença que gera diversos sentimentos, o que pode ser muito
complexo para quem acompanha seu desenvolvimento. Por exemplo, a raiva e a
depressão tendem a desaparecer quando expressas de maneira completa
(Mattheus-Simonton, 1990).
Os profissionais da saúde devem buscar uma conduta mais empática e
sensível, ao abordar um paciente com câncer.
Segundo Fernandes (2005):
“cuidar em uma visão integral é uma escuta acolhedora das múltiplas dimensões
do humano em uma ética de respeito ao homem e à sua natureza, numa prática
integradora dos saberes da saúde e do bem-estar” (p. 84). Afirma que o
profissional deve exercitar a “arte de cuidar” buscando interagir não apenas com o
paciente, mas também, com sua família e com os demais profissionais da equipe
de saúde. Segundo Lopes (2005) a ciência já não delimita, como antes, a doença
em seus aspectos somático e psíquico, corporal e emocional, fazendo uma nova
proposta, na qual “corpo e mente devem ser tratados conjuntamente” (p. 83).
Portanto, as implicações psíquicas do câncer sobre as pessoas devem ser
constante foco de atenção dos profissionais da saúde que lidam com elas. Assim,
os profissionais de saúde envolvidos diretamente no diagnóstico e no tratamento
da doença devem traçar estratégias para não fragilizar, ainda mais, o paciente e
sua família.
Os profissionais devem utilizar alguns princípios básicos de
aconselhamento durante a informação do diagnóstico:
atenção positiva incondicional: preocupar-se, de fato, e aceitar o paciente
como pessoa;
empatia: capacidade e disposição de perceber o mundo pelos olhos do
paciente;
congruência: coerência entre os sentimentos, as idéias e o comportamento
do profissional de saúde.
63
As atitudes citadas acima, defendidas por Rogers (1977; 1992), se assemelham a
algumas
condutas
médicas
relatadas
pelos
meus
pacientes,
que
têm
compartilhado comigo as diferentes atitudes dos especialistas ao lhes transmitir o
diagnóstico do câncer de próstata, bem como as etapas a serem percorridas
durante o tratamento da doença. Porém, outras são totalmente distantes do
modelo proposto. Tais posturas, tão divergentes, podem gerar diferentes
comprometimentos, pois, quando o paciente busca um profissional para um
tratamento no qual sua vida é o mais importante, deseja que tal profissional o trate
segundo princípios éticos e humanos, necessários para um bom relacionamento
médico-paciente, e, conseqüentemente, para um bom resultado no tratamento e
na sua recuperação. A postura do profissional da saúde diante do paciente com
câncer de próstata foi um dos temas discutidos nesta dissertação. Os pacientes
com câncer de próstata traçam um perfil do profissional que desejam ter ao seu
lado, para melhor acompanhar o enfrentamento da doença e do tratamento.
64
CAPÍTULO 4 - A PESQUISA: UM ESTUDO FENOMENOLÓGICO
4.1 Tipo de Estudo
4.1.1 Pesquisa qualitativa
Numa pesquisa qualitativa, princípios norteadores do seu planejamento são
utilizados com a finalidade de definir claramente o objeto, de operacionalizar
corretamente as relações teóricas, de discutir os fenômenos investigados e de
criar estratégias para formular considerações gerais. Muitos são os investigadores
que adotam a pesquisa qualitativa, que tem prestado grandes contribuições às
ciências humanas, sociais e da saúde. Como afirmam Denzin e Lincoln (2006),
a pesquisa qualitativa é infinitamente criativa e interpretativa.
A tarefa do pesquisador não se resume a deixar o campo
levando pilhas de materiais empíricos e então redigir
facilmente suas descobertas. As interpretações qualitativas
são construídas (p. 37).
Pode-se afirmar que “a pesquisa qualitativa é orientada para a análise de casos
concretos em sua particularidade temporal e local, partindo das expressões e
atividades das pessoas em seus contextos locais” (Flick, 2004, p. 28). É através
da pesquisa qualitativa que se pode investigar a subjetividade, adentrando na
dimensão de sentidos da psique humana (González-Rey, 2005). Conforme
Angerami-Camon (2001), "a subjetividade é a condição primeira da filosofia que
tenta reduzir a existência humana à existência da singularidade do sujeito (...), é o
conjunto de princípios onde a realidade da condição humana é a objetividade” (p.
28). Considero, então, que a pesquisa qualitativa investiga a subjetividade nas
experiências vividas do sujeito.
65
4.1.2 A fenomenologia
Como meu objetivo é compreender o significado da vivência do paciente em
tratamento de câncer de próstata, optei por utilizar o método fenomenológico para
melhor compreender sua subjetividade. Moreira (2007) considera que “a
fenomenologia não é uma escola ou uma doutrina, mas somente um movimento
que
engloba
distintas
escolas
cujo
denominador
comum
é
o
método
fenomenológico” (p. 99). Neste sentido, optei pela utilização do método
fenomenológico, acreditando que seus instrumentos facilitariam meu contato com
as questões íntimas vividas pelos sujeitos investigados, na intenção de melhor
conhecer a vivência dos pacientes em tratamento do câncer de próstata. A
fenomenologia, etimologicamente, é “o estudo ou a ciência do fenômeno, sendo
que, por fenômeno, em seu sentido mais genérico, entende-se tudo o que
aparece, que se manifesta ou se revela por si mesmo” (p. 63). Desta forma
Merleau- Ponty (1994) considera que a fenomenologia é o estudo das essências e
tem como objetivo principal compreender as experiências vividas de forma
particular, a partir da sua realidade, mas sem nenhuma intenção de análise ou de
explicação de sua causa.
Para Merleau-Ponty, corpo e mente estão intimamente relacionados, ou
seja, os eventos corporais sempre têm uma significação para a consciência,
evidenciando a interação íntima entre tais instâncias: “o corpo, para a
fenomenologia, não é o corpo objetivo, que nega o espírito” (Capalbo, 2003, p.
13). Portanto, é na relação do corpo-mente com o mundo que ocorre a experiência
humana, o que nos remete à sua existência (Merleau-Ponty,1994). Capalbo (2003)
destaca que, “como categoria da filosofia existencial, o termo existência significa a
maneira de ser do homem” (p. 17). Sua existência é discutida por diversos
pensadores, dentre eles, Merleau-Ponty, um dos principais representantes da
fenomenologia existencial, que considera o homem como ser-no-mundo e como
ser-no-mundo-com-os-outros, ou seja, como sujeito integrante do mundo, se
66
mostrando tal qual é, não distinguindo o sujeito do seu corpo no universo. Desta
forma, Merleau-Ponty afirma que
tudo aquilo que sei do mundo, mesmo por ciência, eu o sei a
partir de uma visão minha ou de uma experiência do mundo
sem a qual os símbolos da ciência não poderiam dizer nada.
Todo o universo da ciência é construído sobre o mundo
vivido... (p. 3).
Para tanto, só é possível conhecer a subjetividade do paciente em tratamento de
câncer de próstata compreendendo como ele significa sua vivência da doença e
do tratamento. Para Trindade e Bruns (2003), “o homem tem a responsabilidade
por sua existência, a qual se manifesta temporal, espacial e historicamente” (p.
227). Temos, portanto, responsabilidade pelas nossas escolhas e pelo nosso
modo de ser no mundo. Para tanto, os fenômenos vividos devem ser considerados
significativos, mesmo que haja uma tendência em reduzi-los (Rovaletti, 2003).
Baseada nestas considerações, o que realmente me interessou, nesta pesquisa,
foi a experiência vivida, do sujeito investigado no seu dia-a-dia, isto é, como ele
atribui significados ao tratamento de câncer de próstata, pois tal fenômeno poderia
manter-se encoberto se não fosse desvendado pela investigação fenomenológica.
Neste sentido, Moreira (2002) acrescenta que “a fenomenologia é uma ciência
cujo propósito é descrever fenômenos particulares, ou a aparência das coisas,
como experiência vivida. A experiência vivida do mundo da vida de todo dia é o
foco central da investigação fenomenológica” (p. 67).
Em uma investigação fenomenológica, o pesquisador deve desfazer-se de
suas idéias preconcebidas sobre o fenômeno em estudo. Tal postura, denominada
de epoqué, significa que o pesquisador deve pôr “entre parênteses” os seus
valores, preconceitos e conhecimentos acerca do fenômeno investigado (Boris,
2002; Moreira, 2002, Moreira, 2007). É importante ressaltar que o pesquisador não
nega o mundo em um estudo fenomenológico, mas apenas o coloca “entre
parênteses”. Portanto, coloquei “de lado”, provisoriamente, principalmente na
primeira fase da pesquisa, minha experiência de 10 anos de consultório,
67
reabilitando pacientes com disfunções urinárias, e todas minhas idéias
preconcebidas, como profissional, sobre os meus pacientes prostatectomizados. O
principal aspecto considerado, numa pesquisa fenomenológica, é a percepção que
o sujeito pesquisado tem de sua própria experiência, para, posteriormente,
receber a interpretação que o pesquisador fará dela, elaborando unidades de
sentido. Portanto, os fenômenos são percebidos a partir dos sentidos, mas são,
por sua vez, dotados de sentidos (Merleau-Ponty, 1994). Neste aspecto, a análise
intencional do objeto em estudo, as vivências dos pacientes em tratamento de
câncer de próstata, teve como intenção alcançar os significados atribuídos aos
seus fenômenos de consciência.
4.2 Procedimentos Metodológicos
Os procedimentos metodológicos se referem às etapas que orientam a
organização e a exposição dos resultados obtidos (Gomes, 2007). Assim,
descrevo, abaixo, os passos desta pesquisa, ou seja, como foi realizada a escolha
da amostra; os instrumentos utilizados na coleta dos dados, isto é, as entrevistas,
meio de captar a expressão dos significados da vivência dos homens
prostatectomizados; os critérios éticos; o local e a data da realização das
entrevistas; e, para finalizar, como analisei os dados e os discuti.
4.2.1 Sujeitos participantes
Os sujeitos entrevistados tinham entre 55 e 77 anos, é nesta faixa etária
que mais comumente, os homens são acometidos de câncer de próstata e
realizam a prostatectomia radical. A amostra investigada foi de 4 sujeitos do sexo
masculino. Os sujeitos participantes foram pacientes meus, que estavam se
68
submetendo a tratamento de câncer de próstata ou que já o tinham realizado.
Considero que o vínculo pré-existente à pesquisa facilitou, significativamente, a
aplicação das entrevistas. Remeto às contribuições de González-Rey (2005), que
enfatiza a importância do vínculo interativo entre pesquisador e sujeitos
participantes no processo de produção das informações. Acredito que o número
de sujeitos pesquisados foi suficiente para proporcionar contribuições significativas
sobre o fenômeno investigado nesta pesquisa, pois não é o número de
participantes que gera informações relevantes, mas a essência de suas vivências,
descritas durante as entrevistas, bem como minha percepção, como pesquisadora
do fenômeno investigado.
4.2.2 Instrumentos de coleta de dados
Como se trata de uma pesquisa qualitativa, sigo as referências de Minayo
(1994), que afirma que, neste tipo de estudo, se trabalha “com o universo de
significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a
um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não
podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis” (p. 21-22). Para tanto, fiz
uso de entrevistas, que foram gravadas com o intuito de compreender os sentidos
da experiência vivida dos pacientes em seu tratamento de câncer de próstata, ou
seja, indaguei como eles significaram o impacto do diagnóstico de câncer, bem
como o enfrentamento da doença e do seu tratamento. Uma pergunta disparadora
(anexo 2) foi utilizada no início das entrevistas, convidando o sujeito entrevistado a
falar dos eventos mais significativos de sua vida, no intuito de que abordasse o
evento da doença de forma a não gerar nele mal-estar com uma pergunta direta.
Nestas entrevistas, explorei a história de vida dos pacientes para chegar às suas
elaborações acerca de sua experiência vivida, pois simbolizam a sua
compreensão do outro, de sua doença, de seu corpo e de seu tratamento. Neste
sentido, remeto a Riechelmann (2002), que afirma que
69
o corpo deixa de ser simples máquina e se torna uma
pessoa quando visto em conjunto com a história de vida. E
história de vida é basicamente construída como
conseqüência da interação do indivíduo com seu contexto
social. Tal interação se dá inicialmente na vida privada, com
a microssociedade familiar, e depois na vida pública, num
contexto social mais amplo (p. 177).
Desta forma, considero que para investigar a subjetividade do paciente em
tratamento de câncer de próstata foi preciso explorar o seu contexto sóciocultural,
bem como sua percepção dele. Baseada em Gomes (1998), considero que é
neste contexto que se introduz a entrevista como um convite à comunicação com
meus sujeitos de pesquisa, não cabendo, portanto, qualquer análise quantitativa
nem, tampouco, o julgamento de seu comportamento. Nas entrevistas, emergiram
temas específicos, tais como a vivência do momento do diagnóstico de câncer de
próstata, a decisão da cirurgia, as fases pré e pós-operatória, bem como a
sexualidade do paciente pós-prostatectomia radical. González-Rey (2005) acredita
que, “na subjetividade, qualquer momento da história do sujeito pode aparecer
como um elemento de sentido da configuração subjetiva atual de sua experiência”
(p. 220). Busquei dar ênfase aos sentidos atribuídos pelos pacientes, durante suas
entrevistas, às suas experiências vividas. Posteriormente, pude fazer a sua
redução a algumas unidades de sentido, ou categorias, agrupando as expressões
subjetivas mais significativas dos entrevistados. Finalmente, tais categorias foram
interpretadas à luz das considerações de meus aliados teóricos, conforme
discutidas na primeira parte desta dissertação.
4.2.3 Aspectos éticos
As
entrevistas foram
realizadas individualmente,
após os
sujeitos
pesquisados concordarem e assinarem um termo de consentimento livre e
esclarecido (anexo 1), obedecendo à resolução 196/96. Ocorreram em horário
estabelecido entre eles e eu, com duração média de 50 minutos. Para evitar a
70
identificação dos participantes deste estudo, foram usados nomes fictícios, como
recurso ético.
4.2.4 Local e período
Realizei as entrevistas no período de julho a outubro de 2008. O local de
realização da coleta de dados foi meu consultório particular, pois os participantes
desta pesquisa foram pacientes que realizaram tratamento fisioterápico, sob meus
cuidados profissionais. Por entender que se trata de um assunto de difícil
abordagem, percebi que o vínculo profissional já existente facilitou a expressão da
experiência vivida dos pacientes e, principalmente, acerca da sua doença.
71
CAPÍTULO 5 - EXPRESSANDO OS SENTIDOS DA EXPERIÊNCIA VIVIDA DO
TRATAMENTO DE CÂNCER DE PRÓSTATA
5.1 Análise e Discussão das Entrevistas
Como afirma Creswell (2007), “o objetivo do pesquisador, então, é dar
sentido (ou interpretar) aos significados que outras pessoas têm para o mundo” (p.
26). Seguindo o método proposto por Gomes (1998; 2007), organizei este estudo
em três etapas: a descrição, a redução e a interpretação dos dados. A descrição
“é uma apropriação da realidade do modo que ela é, ou seja, tomar o que é
possível, dada a condição humana de ser um self corporificado com poder de
movimento” (Gomes, 2007, p. 230). Nesta etapa, as entrevistas foram transcritas
para poderem ser organizadas em categorias. É importante considerar que o
primeiro momento da descrição ocorreu ao escutar os entrevistados, pois, naquele
instante, suas falas já expressavam significados para mim, como pesquisadora.
Na fase de descrição, o pesquisador reconhece que o fenômeno existe, mas não
permite, nesse instante, fazer qualquer análise. Durante esta fase, foi necessário
ouvir, repetidas vezes, as falas, para transcrevê-las em sua totalidade, não
perdendo sequer uma expressão para não correr o risco de modificar os sentidos
das falas.
Na segunda etapa, de redução, após a leitura de cada entrevista,
identifiquei as unidades de sentido, ou categorias, que compreendem percepções,
experiências e sentimentos expressos nas falas dos entrevistados e que
considerei importante que fossem mais bem discutidos. Portanto, encontrei sete
unidades de sentido ou categorias, que serão discutidas a seguir:
1. O momento do diagnóstico;
2. Relação paciente-família-doença;
72
3. A relação médico-paciente;
4. O enfrentamento da doença;
5. E o papel de macho como fica?;
6. A sexualidade pós-prostatectomia radical;
7. A infantilização e a feminilização do uso de fraldas e de protetores íntimos.
A terceira etapa, de interpretação, é “o encontro da intencionalidade que o
objeto traz com a intencionalidade do sujeito que se apropria do objeto” (Gomes,
2007, p. 230), pois as categorias, que foram criadas segundo a percepção do
pesquisador, foram, então, discutidas na tentativa de explorar as falas, ou seja, na
busca de melhor compreender o fenômeno estudado. Neste sentido, a
interpretação é uma discussão das categorias, articulando minhas percepções da
experiência vivida a partir das falas dos entrevistados com as proposições de
meus aliados teóricos sobre cada tema destacado. Assim, nesta etapa da
pesquisa, os dados foram discutidos com a intenção de compreender os
significados das vivências dos pacientes em tratamento de câncer de próstata.
Portanto, o objetivo foi articular a fundamentação teórica com a vivência dos
sujeitos sobre o fenômeno pesquisado, captada durante as entrevistas. Esta etapa
consistiu na composição de um texto que respondesse as perguntas da pesquisa,
seguido da indicação de diferentes perspectivas, bem como de sugestões e das
considerações finais, acompanhadas de suporte teórico (Gomes, 1998; 2007;
Boris, 2002).
A realização das entrevistas foi, para mim, uma experiência surpreendente
e extremamente emocionante, pois os sujeitos colaboradores desta pesquisa eram
pacientes que haviam realizado ou estavam realizando tratamento fisioterápico
comigo, após terem se submetido à cirurgia de prostatectomia radical. Acreditava
que os conhecia bastante, bem como suas histórias de vida, uma vez que, durante
o tratamento fisioterápico, conversávamos em boa parte dos atendimentos, mas
fiquei surpresa ao me deparar com depoimentos inéditos e comoventes, o que fez
consolidar minhas percepções no que diz respeito ao método fenomenológico,
73
pois, como pesquisadora, pude vivenciar as suas etapas propostas pelo método
de Gomes (1998; 2007).
As entrevistas foram a forma que escolhi para melhor compreender as
vivências desses homens, que, freqüentemente, são ocultadas, no seu dia a dia,
dos profissionais de saúde e dos próprios familiares. Assim, nas entrevistas, pude
explorar situações, emoções, sentimentos e discursos dos pacientes, enfim, suas
vivências, que me deram a oportunidade de ter acesso a um universo ainda tão
pouco compreendido: as vivências masculinas, no que se refere ao tratamento do
câncer de próstata.
O primeiro entrevistado, José, logo concordou em participar da pesquisa,
pois disse que se sentia muito satisfeito de poder colaborar com um estudo que
poderia ajudar outros que, como ele, iriam enfrentar o câncer. Casado, 66 anos,
pai de duas filhas já adultas e aposentado, cursava uma segunda faculdade,
demonstrando grande satisfação pessoal por conta disso.
O segundo entrevistado, Antônio, 68 anos, casado, bancário aposentado,
hesitou em aceitar o convite para participar da pesquisa, pois se considera uma
pessoa bastante tímida, com dificuldade de se expressar, mas, em poucos
instantes, já estava contando sua história com evidente espontaneidade, como
sempre conversávamos, antes. Mesmo assim, foi o participante que falou menos.
Inclusive, ao final de sua entrevista, o último assunto abordado ficou, a meu ver,
incompleto, pois tratava da disfunção sexual, problema ainda não muito bem
enfrentado por ele, como discutirei mais adiante.
Ao contrário, o terceiro paciente, Pedro, deteve-se, a maior parte do tempo
da entrevista, no assunto que, em sua opinião, mais afeta a qualidade de vida do
ser humano: a sexualidade. Em nenhum momento, sentiu-se constrangido,
mesmo sendo um homem de 77 anos, casado, pai de quatro filhos e empresário
74
local, de falar de sua intimidade com suas parceiras, bem como da fase de
adaptação a novas estratégias para sua satisfação sexual e delas, também.
O quarto entrevistado, Moisés, 55 anos, o mais jovem dos entrevistados,
funcionário público recém-aposentado, casado pela segunda vez, pai de 4 filhos,
dos quais dois menores de idade do segundo casamento, também teve facilidade
de se expressar, narrando sua experiência com muita precisão e segurança.
Inclusive, mostrou-se um grande estudioso do câncer de próstata, pois disse ter
realizado diversas pesquisas na “Internet”, para saber mais sobre a doença. Em
sua fala, transmitiu, em cada momento, muita determinação e confiança em seu
tratamento.
Os quatros entrevistados, cada um com as peculiaridades próprias de sua
subjetividade, sua idade e seu estilo de vida, proporcionaram contribuições
significativas a esta pesquisa, e, também, à minha experiência como pessoa e,
principalmente, como profissional de saúde que trabalha com pacientes que,
muitas vezes, buscam em mim um “porto seguro” ou um suporte, num momento
de muita fragilidade física e psicológica.
É importante destacar que a pergunta disparadora “quais foram os eventos
mais significativos de sua vida?” (anexo 2), foi escolhida por ser bastante aberta e
abrangente de modo a deixar os entrevistados à vontade para falar, se
desejassem, sobre seu câncer de próstata. Assim, os paciente discorreram com
muita minúcia sobre suas vivências.
As entrevistas foram gravadas e, em seguida, integralmente transcritas.
Passaram por uma detalhada identificação de categorias, ou seja, das falas mais
significativas dos participantes. Depois, passei a analisar individualmente cada
categoria. Em cada categoria, pude encontrar a expressões não apenas das
particularidades do participante da pesquisa, mas do gênero masculino, pois os
homens passam boa parte de suas vidas acreditando que são fortes e capazes de
75
superar quaisquer dificuldades, mas, ao se confrontarem com o câncer de
próstata, se percebem “fragilizados”, termo bastante utilizado por eles para definir
as mulheres. Como tal experiência de suas vidas foi significada por cada um deles
é o que será discutido adiante. As falas mais significativas foram recortadas e
agrupadas de acordo com cada categoria a ser discutida, para facilitar sua
compreensão. Tais unidades de sentido, ou categorias, foram organizadas em
sete temas. Assim, busquei compreender o significados das suas falas, através
não apenas das palavras, mas acrescentando minhas observações como
pesquisadora, fundamentada em meus aliados teóricos. Neste sentido, Amatuzzi
(2008) considera que “compreender significa ouvir o silêncio que se rompe com a
fala” (p. 39). Amatuzzi relaciona o silêncio à fala, bem como a inspiração à obrade-arte, destacando o quanto o silêncio, também, deve ser valorizado, pois, sem
ele a fala não teria sentido. Para tanto, precisei considerar os momentos de
silêncio durante as entrevistas, no qual os pacientes precisavam de uma pausa
para melhor elaborar suas falas. Tive também que identificar determinados temas
que não emergiram, naturalmente, por possível dificuldade de enfrentamento do
mesmo por parte do paciente, como será discutido a seguir.
5.2 Categorias ou Unidades de Sentido
5.2.1 O Momento do Diagnóstico
O momento de maior impacto, para meus entrevistados, foi, exatamente, o
dia em que receberam a notícia de que estavam com câncer. Ellsworth, et al.
(2003) afirma que “o diagnóstico do câncer de próstata é um choque para a
maioria dos homens” (p. 180). Destaca que os pacientes estão, até o momento do
diagnóstico, se sentindo bem e, muitas vezes, não apresentam sintomas que
interfiram, diretamente, na sua saúde. É comum que, ao realizarem exames de
76
rotina, se deparem com o câncer. O sentimento de fragilidade, somado ao medo e
a sinais de ansiedade, afloram com relação ao seu futuro e ao de suas famílias.
Segundo Gianini (2007), há uma forte carga de estresse que acompanha o
homem quando recebe o diagnóstico da doença, seguida de possíveis lacerações
e estigmas, que podem ser causados pelo tratamento. Este momento deve ser
acompanhado de muita sensibilidade por parte do médico (Silva, 2001). Segundo
Horta et al. (2003), a partir da comunicação do diagnóstico, “o paciente é
confrontado com diversos aspectos existenciais, dentre os quais seus valores,
convicções, crenças, sentimentos e emoções” (p. 152). Meus entrevistados,
também, transmitiram, nas suas falas, sua dor psíquica em relação à descoberta
do câncer de próstata:
quando me vi com o problema do câncer, eu diria que o
impacto maior que eu senti foi, exatamente naquele dia que
eu recebi a notícia, que eu estava com um tumor. Foi o que
me “desarmou” um bocado e me deixou muito fragilizado:
primeiro, em relação ao que poderia me acontecer e, em
conseqüência, o que podia vir a acontecer à minha família,
caso eu viesse a faltar. Isso foi um impacto muito grande
(José).
Quando o paciente diz ter se sentido “desarmado”, significa que, até então, ele
não esperava que seu mundo, protegido e seguro, fosse ser afetado, mas o
diagnóstico do câncer fez com que ele se sentisse desprotegido e fragilizado. É,
portanto, neste momento, que o papel do profissional de saúde assume importante
função, pois a maneira como o diagnóstico é transmitido pode gerar importantes
repercussões psíquicas no paciente.
As diferentes culturas prescrevem que os médicos se comportem, quanto
ao diagnóstico, de maneiras diversas, pois algumas delas defendem que ele seja
omitido, enquanto outras reforçam que ele seja, apenas parcialmente, revelado
(Silva, 2001). Em nossa realidade, o que mais comumente ocorre é a franqueza
do médico, revelando o diagnóstico e o seu prognóstico ao paciente. Inclusive, é
comum que seja o próprio paciente quem recebe o resultado da biópsia. Assim,
77
geralmente, no momento do diagnóstico, os pacientes se encontram sozinhos e se
encaminham ao laboratório cheios de dúvidas e de receios. Manifestações de
emoção são vividas no momento do recebimento do laudo laboratorial da biópsia
da próstata:
foi terrível! Eu peguei a biópsia. Abri o envelope, lá, no
laboratório. Eu me preparei porque eu estava quase certo do
conteúdo da biópsia. Procurei um cantinho pra ficar pra que
eu pudesse vivenciar essa emoção intensa e abri o envelope
pra saber o que tinha lá dentro (Moisés).
Antônio relatou já ter enfrentado outro momento bastante estressante em sua vida,
antes de ser surpreendido pelo diagnóstico de câncer de próstata, pois, sete anos
antes, foi vítima de um diagnóstico errado de câncer de esôfago, que fez com que
ele tomasse medidas radicais e irreversíveis em sua vida, inclusive pedindo
demissão do seu emprego e mudando de cidade. Segundo Morais (1997), “o
doente recebe o diagnóstico do médico como verdade inquestionável” (p. 92).
Quando iniciei a entrevista, tomando como base a pergunta disparadora (anexo 2),
Antônio foi bastante detalhista ao narrar a sua primeira história de câncer:
quando eu recebi o resultado do exame, “faltou chão nos
pés”, sei lá: é uma sensação, assim, ruim demais, que não
tem nem como descrever. De lá mesmo, lá da clínica, eu já
liguei pra minha mulher e falei pra ela que eu tinha câncer no
esôfago e que, a partir dali, a vida da gente ia passar por
uma mudança muito grande.
Apesar de sua atitude ser uma das formas possíveis de reação diante do
diagnóstico, Silva (2001) afirma que “o melhor é não fazer mudanças drásticas
imediatamente e, muito menos, adotar uma política de isolamento” (p. 239). Às
vezes o paciente decide alterar seus planos de vida por considerar o diagnóstico
como uma sentença de morte. Suas decisões, neste momento, devem ser,
calmamente, pensadas, inclusive, sendo compartilhadas com sua família, já que a
situação envolve a todos, direta ou indiretamente. Antônio, ao enfrentar, pela
78
segunda vez, o impacto do diagnóstico de câncer, agora, de próstata, reagiu com
atitudes mais racionais e menos impulsivas:
aí, sei lá, foi “o mundo se acabando” de novo! Aquela coisa
da cabeça “fervendo” demais. Só que, dessa vez, o baque foi
menor: já tinha passado por esse susto antes, até porque eu
faço os exames, todo ano. Aí, eu imaginei que tivesse bem
no início. Aí, eu fiquei mais tranqüilo.
A ansiedade, no momento do diagnóstico, é alta. Por isto, alguns
pesquisadores defendem a idéia de que o diagnóstico deve ser dado,
cautelosamente, evitando falar diretamente no câncer, mas em tumor ou alteração
celular, para, em seguida, usar os termos mais definitivos (Silva, 2001). O
recebimento do diagnóstico, para meus entrevistados, foi acompanhado de visível
sofrimento, pois sabiam das implicações da doença e de seu tratamento, já que
tinham sido abordadas, anteriormente, entre eles e médicos:
sem dúvida nenhuma, o diagnóstico do câncer de próstata
me machucou bastante porque eu já sabia, por informação
do médico que me acompanhava, há muito tempo, porque
eu fazia controle de próstata, há muitos anos, que 60%,
segundo ele, que era a primeira informação, que aqueles
que se submetiam à prostatectomia radical ficavam
impotentes (Pedro).
ali, pra mim, parecia que o mundo foi um turbilhão na minha
cabeça. “Faltou terra nos pés”: parecia que o mundo se
abrisse num buraco imenso e eu caísse dentro. Eu fiquei
gelado; me deu uma dor de cabeça intensa; ficou tudo,
assim, escuro em volta de mim; tive que “me segurar” pra
não cair. Depois, eu fiz um esforço pra seguir. Depois, eu
dirigi por bastante tempo, bastante tempo (Moisés).
Segundo Boris (2002), a imposição de valores e de estereótipos socioculturais que
preconizam o que é ser homem faz com ele desempenhe um papel de um ser
forte e viril. Talvez, tal condição de macho seja esperada, também, na
comunicação do diagnóstico do câncer de próstata, exigindo que o paciente
enfrente o momento como tal.
79
O momento do diagnóstico, para todos meus os entrevistados, provocou
sofrimento psíquico, pois, neste instante, sentiram que seu “mundo” desabou. De
acordo com Osanai (2004), “embora o paciente tenha o direito de saber seu
diagnóstico, a forma como essa informação será revelada não pode ser nociva ao
estado geral, com possível repercussão em seu possível tratamento” (p. 239-240).
Cada entrevistado, ao comentar sobre as emoções vividas neste momento, se
referiu a muita ansiedade diante de um problema que desencadeia repercussões
em diversas áreas de sua vida. É, portanto, um momento que deve ser
considerado de forma individualizada, pois cada paciente tem subjetividade
diferente dos demais.
5.2.2 A relação paciente-família-doença
Nesta categoria, discuto como o paciente vivencia, junto à sua família, a
experiência de estar com câncer. Os amigos têm um papel psicossocial muito
importante para o paciente, mas a presença da família, neste momento, é, sem
dúvida, fundamental. Segundo Mello Filho (2004), a família é “importante agente
na revelação do diagnóstico e no seu papel terapêutico, de apoio...” (p. 53), tendo
a importante função de suporte emocional para o paciente, seja como apoio, seja
como fonte de motivação para o tratamento. “A família sempre foi e continua
sendo o grande cadinho das experiências humanas” (p. 57). Pode, entretanto,
também, ser fator desencadeador de sofrimento psíquico, diante da incerteza da
cura:
pois bem, e o medo de uma recidiva, o medo de não ter mais
uma vida mais longeva, uma vez que eu tenho duas crianças
pequenas, que eu tenho de protegê-las. São duas meninas
(Moisés).
Naquele dia em que eu recebi a notícia que eu estava com
um tumor, foi o que me “desarmou” um bocado e me deixou
muito fragilizado: primeiro, em relação ao que poderia me
80
acontecer e em conseqüência o que podia vir a acontecer à
minha família, caso eu viesse a faltar (José).
Dar a notícia, principalmente, àqueles que os amam é o problema mais
difícil da doença para os pacientes (Servan-Schreiber, 2007). A mulher,
freqüentemente, se torna a melhor amiga e a companheira incondicional durante o
tratamento do câncer de próstata. Algumas foram referidas, explicitamente, nas
falas de meus entrevistados:
aí, minha esposa ligou porque eu não tinha dado notícia e eu
tinha dado o horário que ia pegar o exame e eu não tinha
ligado naquele horário porque não tinha nem condição de
falar. Mas foi uma emoção muito forte, realmente... Eu
lembro que, realmente, eu me emocionei muito, mas minha
mulher me deu muita força: me falou umas palavras de
conforto pra eu ter coragem pra resistir, pra lutar (Moisés).
Segundo Ellsworth et al. (2003) as mulheres se preocupam com o tempo de
sobrevida de seus companheiros. É um momento, também, para elas, de muito
estresse, pois algumas precisam assumir os dois papéis: o de esposa e o de
organizadora dos compromissos da família, mesmo que por um tempo
determinado, podendo gerar descontentamento da parte delas. (Silva, 2001).
Quando os filhos são adultos, o que ocorre na maioria dos casos, entre
homens de meia-idade, eles, também, se tornam importantes pontos de apoio
para o enfrentamento da doença. González-Rey (2004) afirma que “família é o
grupo social no qual o homem expressa sua maior intimidade e espontaneidade”
(p. 29). No caso de Moisés, ele contou com o filho no momento do diagnóstico, e,
depois, no momento da sua recuperação pós-operatória:
e, à noite, eu procurei meu filho mais novo, do meu primeiro
casamento, de 23 anos: é o filho que eu tenho mais apego.
Aí, eu contei pra ele, também, com toda aquela emoção do
primeiro dia (Moisés).
81
A participação da família é fundamental para a recuperação do paciente,
pois é nela que ele encontra motivação para lutar contra a doença e as
implicações do seu tratamento. Portanto, ela é considerada uma forte aliada no
tratamento (Lopes, 2005). Como afirma Servan-Schreiber (2007), a atitude da
família em relação ao paciente “não reduz o perigo, mas reduz a solidão” (p. 67).
Eu tive alta. Então, eu fui para um hotel, aqui, em Fortaleza.
Minha esposa estava comigo e minhas duas filhas. Ficaram,
aqui, três dias comigo, e o restante, o meu filho ia dormir
comigo, lá, no hotel (Moisés).
Nesta fala de meu entrevistado destaco a participação ativa da mulher e dos
filhos, desde o momento do diagnóstico até o tratamento pós-operatório. Como
eles superam as ansiedades relacionadas a tal fase emocionalmente difícil? É,
exatamente, por conta do desgaste emocional de tal experiência que sugiro o
suporte de um profissional da psicologia para esses casos, o que se coaduna à
proposta de Mello Filho (2004) de tratamento psicológico, não apenas para o
paciente, mas, também, para o casal e para a família. Porém, tal realidade não
ocorre nos procedimentos de saúde de nosso País.
5.2.3 A relação médico-paciente
Esta categoria, também, emergiu das falas dos entrevistados, quando eles
discutiram comigo o tratamento e suas implicações. É importante que o paciente
seja esclarecido quanto às suas dúvidas, desfazendo mitos que foram criados por
falta de informação, situação comum no passado, já que o câncer da próstata,
hoje, assume nova realidade no contexto social. A facilidade da Internet aproximou
o paciente das informações sobre o assunto, bem como vem proporcionando uma
maior divulgação do tema nos veículos de comunicação. Assim, faz toda a
diferença, nessas circunstâncias, a escolha dos procedimentos que antecedem a
82
cirurgia, bem como a sua detalhada explicação, pois são consideradas
informações muito importantes pelo paciente.
Conforme Lopes (2005), “há um crescente cuidado na área da saúde, em
que o ponto alto se torna a valorização e a humanização do atendimento, e a
excelência em lidar com a arte e dignidade frente à temática de saúde, vida e
morte” (p. 85). Angerami-Camon (2002) enfatiza que, para que ocorra a
humanização dos atendimentos na área da saúde, é necessário que ocorra a
humanização do profissional de saúde. Umas das formas de atingir tal
humanização é o diálogo franco, que possibilita maior aproximação entre médico e
paciente. Assim, os médicos com mais sensibilidade para compreender o valor
desse contato, mais provavelmente são escolhidos como cirurgiões dos pacientes
que procuram um profissional com tal perfil. Esta particularidade demonstra a
tendência dos pacientes, ao buscarem um cirurgião para se submeter à
prostatectomia radical, a eleger a empatia dos profissionais como um critério tão
importante quanto sua habilidade cirúrgica, como destaca José:
se você se encontra nessa situação de fragilidade e encontra
alguém que te “dê a mão” e que te dê algum ânimo, acho
que é mais fácil de você fazer essa cirurgia, esse tratamento,
do que com aquele que já te deixa ciente de que o que te
acontecer é culpa, exclusivamente, sua. Então, pra mim,
realmente, foi mais tranqüilo de fazer com o terceiro médico.
A escolha do médico é de suma importância para o paciente Cada paciente
tem sua concepção do profissional ideal para assumir o seu caso: “alguns
pacientes sentem-se bem com um médico tradicional - um profissional delicado e
carinhoso, que lhes segure a mão. Outros se sentem mais seguros com um
médico direto e pouco emotivo, que apenas as informe sobre os fatos” (MattheusSimonton, 1990, p. 71). Há, ainda, os pacientes que preferem o meio termo,
aquele profissional que soma as duas características acima citadas. Buscar uma
segunda opinião é atitude bastante comum nos casos de diagnóstico de câncer e,
conseqüentemente, no tratamento cirúrgico. Foi o que ocorreu no caso de José,
83
pois buscou outra opção, na qual se sentiu protegido e, profissionalmente, em
“boas mãos”:
porque ele me pareceu mais seguro e não me apavorou. E
me deu mais segurança, que eu acho que é isso,
exatamente, que o paciente procura quando procura um
profissional (...) Eu estava entregando a minha saúde, a
minha vida, né, pro médico, que é o bem mais importante
que eu tinha (José).
Respeitar a decisão do paciente quando ele decide ser acompanhado por
dois especialistas, simultaneamente, também, deve ser uma postura do médico
que o acompanha, o que não significa que o vínculo entre médico e paciente
termine, mesmo nos casos em que um outro profissional participe do tratamento.
Segundo Silva (2001), “é relevante que o médico demonstre senso de
compromisso com o paciente e que se empenhe em cuidar dele” (p. 31). Tal
confiança ocorreu no relacionamento entre Antônio e seu médico:
aí, eu disse: “doutor, o seguinte: e se eu for fazer naquele
hospital em São Paulo? Eu já conheço, eu já estive lá,
anteriormente”. “Então, vamos fazer o seguinte: você vai
fazer a cirurgia, lá, e eu vou fazer só o acompanhamento,
aqui”. Aí, eu já marquei, lá, a consulta.
A postura humanizada do especialista, bem como sua abordagem
terapêutica diante das possíveis condutas a serem adotadas no tratamento do
câncer, tem caráter decisivo na escolha do cirurgião pelo paciente. O médico deve
ser, ao mesmo tempo, tecnicamente competente e humanamente acolhedor
(Silva, 2001), pois, nesta situação, inicia-se, também, um forte vínculo entre
médico e paciente:
ele me disse a mesma coisa que os outros dois disseram.
Agora, ele me disse de uma maneira diferente. Ele dizia que
poderia acontecer a incontinência e que dependia, primeiro,
em que estágio estava o tumor, a localização, né? (José).
O médico explicou: “nós temos dois tratamentos pra fazer,
aqui. Nós vamos fazer a radioterapia ou a cirurgia, mas,
como você tem uma expectativa de vida maior, seria mais
84
recomendável que você faça a cirurgia. Se você fizer a radio
ou a cirurgia, daqui a cinco anos, os tratamentos se
equivalem, mas, daqui a dez anos, se você fizer a cirurgia,
você vai estar bem mais seguro” (Antônio).
As conversas com o médico para esclarecer os diversos passos do
tratamento
são
consideradas,
pelos
pacientes,
muito
importantes,
pois,
dependendo da postura do médico, os pacientes podem encontrar segurança
suficiente para dar início, o quanto antes, aos procedimentos médicos
necessários, na medida em que o tempo pode ser um grande aliado no processo
da cura:
lá chegando, ele me explicou quais seriam os prós e quais
seriam os contra, qual seria o ônus da cirurgia. E disse do
problema da incontinência, o que seria a incontinência, a
“história” da disfunção sexual e a “história” da ereção, que
podia voltar e podia não voltar. Havia tratamento, que seria
através de medicamentos: em última análise, uma prótese,
mas o mais importante, naquela altura, dizia ele, era curar a
vida (José).
Portanto, a relação entre médico e paciente deve ser permeada de confiabilidade
e de cumplicidade. O profissional que atende um público com tal demanda de
sofrimento psíquico deve ter uma escuta cuidadosa e empática, ser congruente
com o que pensa e sente por ele e aceitar seu paciente, assim, adotando uma
postura ética humanizada (Moreira, 2007). Esta é uma das condições mais
importantes do tratamento do câncer de próstata, como José comentou:
de todos os pontos que nós abordamos, pra mim, o mais
importante foi a abordagem do médico. Acho que, nesse
instante, o médico é muito importante para o paciente.
Às vezes, a postura de distanciamento do médico, considerada positiva
pelo paciente por parecer objetividade, pode ser uma forma de o profissional se
manter emocionalmente afastado do seu paciente (Mattheus-Simonton, 1990):
eu confiei muito no médico. Foi meu genro que me indicou
esse médico: ele é professor da Universidade, é preceptor
85
dos alunos da cadeira de urologia. Então, por esses
referenciais, eu confiei nele, embora ele não seja homem de
muita conversa: é bem objetivo, mas eu parti para confiar
nele, e eu acredito que ele fez o melhor pra mim (Moisés).
Destaco que o profissional da saúde é muito cobrado nestes casos, ou seja, tem
que lidar com um paciente que enfrenta uma doença que requer tratamento
cirúrgico, muitas vezes, com a incerteza de cura e a possibilidade de algumas
complicações pós-operatórias. Tal situação faz com que o paciente passe a exigir
muito dele, buscando confiança, clareza das informações e objetividade nos
procedimentos, além de um tratamento humanizado:
então, o médico que me acompanhava disse o seguinte:
“rapaz, tu não vai morrer disso, não! Tu vai morrer de outra
coisa. Cuida do coração, de outra coisa, porque, à medida
que você envelhece, a virulência do câncer se torna menor;
porque, à medida que a testosterona vai sumindo, vai
sumindo, também, a possibilidade de desenvolvimento do
câncer, mas, de qualquer forma, o pessoal continua
morrendo disso (Pedro).
Questionamentos dos pacientes sobre as possíveis complicações cirúrgicas
sempre têm lugar especial nas consultas, sejam pré-operatórias, sejam pósoperatórias. São conversas, principalmente, sobre a disfunção sexual, pois as
informações prévias sempre assustam os homens que precisam realizar a retirada
total da próstata, mas nem sempre ocorrem de forma adequada, desencadeando
ansiedade e insegurança no paciente. Neste sentido, Morais (1997) afirma que
a existência de um diálogo aberto em tal espaço, ou seja, um
diálogo sem fronteiras, sem omissões entre os atores, não
se torna possível em decorrência de vários fatores
mencionados - falta de tempo dos profissionais, diferenças
de linguagem entre médicos e pacientes (p. 137-138).
Tal diálogo é difícil, em alguns casos, devido à inexperiência ou à inabilidade do
médico de tratar de problemas que têm forte relação com a subjetividade do
paciente. José descreveu assim sua conversa com o médico:
86
perguntou se eu conhecia quais seriam as conseqüências e
começou a dizer que, em 80% dos casos, acontecia a
impotência e a incontinência, e que ele dizia aquilo para mim
para que ele, depois, não fosse cobrado de alguma coisa,
mas eu achei, realmente, não sei, se um excesso de
sinceridade ou uma falta de cuidado com o paciente. O que
me pareceu, naquele momento, é que o médico estava me
dizendo é que a função dele, ele cumpriria, que seria fazer a
cirurgia, mas que, pelo resultado, ele não se
responsabilizava.
A apreensão da subjetividade do paciente com câncer de próstata não é fácil, pois
exige do profissional de saúde uma capacidade de observação, repleta de
sensibilidade e de empatia:
até que, quando eu fui mostrar (o exame) ao médico, e o
médico, de maneira muito objetiva, muito clara, disse que eu
estava com um problema, um “problemão” e que tínhamos
que cuidar do problema, agora, ou seja, tratar da cirurgia
(Moisés).
Assim, como afirma Silva (2001) “o médico é o guia, a bússola do paciente” (p.
15). Sua postura pode influenciar, diretamente, a esperança e a capacidade de
auto-ajuda do paciente. A confiança depositada pelo paciente no médico assume
proporções significativas no tratamento do câncer de próstata. Portanto, a
discussão desta categoria gerou um alerta aos profissionais da saúde no que se
refere à forma como são abordados a doença e os procedimentos adotados no
tratamento. A formação dos profissionais de saúde deveria proporcionar maiores
conhecimentos acerca da psicologia, para suprir sua dificuldade de lidar com a
subjetividade do paciente e com seu sofrimento psíquico.
5.2.4 O enfrentamento da doença
A postura de enfrentamento, conhecida como coping, diante do diagnóstico
de câncer, é considerada um passo importante para o tratamento, pois possibilita
87
maiores condições para a sua cura, já que pode decidir o futuro do paciente.
Segundo Servan-Schreiber (2001), é preciso aprender a lutar contra o câncer e,
para tanto, é preciso aprender, também, a nutrir a vida dentro de si mesmo.
González-Rey (2004) destaca a relação entre a forma de enfrentar um evento com
as suas conseqüências sobre a saúde humana. Quando o evento é uma doença,
outros sintomas podem se manifestar, associados a ela. Enfrentar a doença e
lançar mão dos modernos recursos para debelá-la é a opção mais escolhida de
enfrentamento, até porque o objetivo principal dos pacientes é preservar a sua
vida:
eu acreditava que ia ficar bom (Antônio).
Foi o que decidiu José, após receber o diagnóstico de câncer de próstata: com
uma perspectiva otimista, resolveu reagir e enfrentar o desafio de seguir sua vida
com saúde, ao lado de suas filhas e da mulher:
a idéia que eu tive era uma só: eu sabia que estava com
uma doença grave e que tinha que partir para definir isso,
tentar a cura, se possível. E, em seguida já marquei uma
passagem para São Paulo, porque meu médico era em São
Paulo.
Na direção oposta, uma postura sempre negativa, sem expectativa de cura, foi
constantemente adotada por Pedro, paciente que ainda realiza tratamento do
câncer de próstata. Mesmo tendo realizado sua cirurgia de retirada total da
próstata, há mais de 2 anos, suas taxas de PSA vem se normalizando há apenas
3 meses, ou seja, ele continua enfrentando a doença. González-Rey (2004) afirma
que pacientes que assumem atitudes pessimistas apresentam função imune mais
baixa, tornando-se mais vulneráveis a doenças. O desespero é marcante na fala
de Pedro, expressando, claramente, terem se esgotados todos os seus recursos
psicológicos:
eu desejei ter morrido na cirurgia (...) O médico tentou
minimizar, alegando que a cirurgia tinha evoluído e, hoje, o
88
percentual dos homens impotentes, depois da cirurgia, era
bem menor, mas eu não acreditei, como continuo não
acreditando porque, praticamente, todas as pessoas que
fazem a cirurgia radical de próstata ficam impotentes.
Segundo Coelho (2001), do ponto de vista psicológico, “não é a dor que a
doença traz que incomoda, é algo mais subjetivo: é a dor de saber-se doente, de
perder a condição de sadio” (p. 70). A forma como o paciente lida com sua vida e
com sua morte é bastante particular. É em razão de seu comportamento e de sua
capacidade de enfrentamento que podemos perceber o impacto e as implicações
do câncer na vida das pessoas:
Depois, eu comecei a pensar mais positivamente porque
acho que é o seguinte: como dizia a estatística que 80% dos
casos ou até 90% dos casos era curado, eu me coloquei
entre os 90% e não me coloquei entre os 10%. E, como o
terceiro médico me disse que há um percentual de
ocorrência de impotência e de incontinência, eu me coloquei,
exatamente, no sentido oposto (José).
Morais (1997) afirma que “o câncer e a morte provocam e extraem do ser
humano os mais recônditos sentimentos, desarmonizam e/ou paralisam os
movimentos e funções, transformam o estado de humor e possibilitam outras
reflexões” (p. 16). É o que a fala de Moisés evidencia:
a gente não vê o sonho de uma criança; a gente não vê um
alvorecer,; um pôr do sol; a gente não vê, não ouve uma
palavra de uma criança; tantas e tantas vezes, eu não ouvi
os meus filhos. E, de repente, a gente se apercebe o quanto
perdeu tempo na vida, o quanto desperdiçou. Então, eu acho
que essa doença me fez morrer um pouco, mas me fez
nascer de novo.
Deve-se destacar a importância do enfrentamento do câncer para a reabilitação e
a ressignificação da vida do paciente. Sua autovalorização, ou seja, sua autoestima pode influenciar no processo de enfrentamento da doença, bem como,
também, no significado que fatos externos adquirem para ele (González-Rey,
2004). Assim, Moisés utilizou a doença para reconstruir sua vida, que assumiu
significados, até então, não percebidos por ele, antes da doença:
89
eu reconheço isso e essa realidade que se instalou em mim
me fez, assim, dar uma guinada totalmente. Aquele homem
que foi para mesa de cirurgia, ele morreu, ali, na mesa de
cirurgia, e nasceu um novo homem, um novo olhar sobre a
vida, uma nova perspectiva da vida, que me permite ver as
coisas mais simples que estão ao nosso redor.
Portanto, as transformações decorrentes do câncer podem despertar uma nova
postura de vida do paciente, a partir de seu enfrentamento, como ServanSchreiber (2007) destaca, em sua biografia: “me dei conta de que a doença me
fazia experimentar pela primeira vez uma espécie de nova identidade, não menos
desprovida de vantagens” (p. 70).
As complicações pós-prostatectomia radical são esperadas, pois os
pacientes, temporariamente, se encontram incapazes de controlar sua urina e sua
função erétil. A incontinência é uma das complicações da prostatectomia radical
que gera consideráveis implicações psíquicas para o paciente, mas cada um
reage de forma diferenciada com relação a ela, valendo a pena ressaltar que é
temporária:
podia ocorrer comigo, como podia ocorrer com outras
pessoas, e, na verdade, a questão da incontinência, eu acho
que estou superando. Acho que vou superar, não tenho
dúvida quanto a isso. E, na verdade, eu não estou
preocupado, hoje, com a “história” da incontinência porque
eu sei que vou curar. Penso mais na possibilidade de
recuperar a impotência (José).
Outra importante preocupação do paciente em relação à doença é, na
verdade, a sua recidiva. Os procedimentos usados para dar continuidade ao
combate ao câncer de próstata são a quimioterapia e a radioterapia, que,
normalmente, são consideradas tratamentos complementares ao tratamento
cirúrgico, mas, também, podem ser realizadas antes da cirurgia. Sua aplicação
significa que as células cancerígenas ainda estão presentes no organismo e seus
impactos psíquico e físico podem agravar o caso, como mostram as palavras de
90
José, que foi esclarecido pelo seu médico sobre tais procedimentos, e de Pedro,
que realizou mais de um ano de tratamento radioterápico pós-prostatectomia
radical:
no caso da quimioterapia, ele não aconselhava porque não
dava bons resultados. Ele dizia que 70% dos casos em que
se usava a quimioterapia, em menos de 10 anos, havia
retorno e, nos casos em que era aplicado o procedimento
radical, a prostatectomia, o índice de retorno era bem menor,
era de 30% (José).
Mas a verdade é que a radioterapia é uma “caça sem
endereço”: visa localizar, extinguir o foco, qualquer que
tenha de células cancerosas, mas você não tem o
“endereço”, não sabe onde elas estão. É tanto que eles
procuram, sempre, fazer do assoalho pélvico, se é recente
(Pedro).
Outra consideração significativa acerca desta categoria é a crença na cura
como estratégia usada para combater, não apenas a doença, mas, também, o
medo de morrer, provando que a postura de otimismo pode fazer parte desse
momento tão doloroso:
a certeza, eu tirei, primeiro, da confiança que o médico me
passou, e, depois, da perspectiva que eu tinha de, ao invés
de me colocar do lado negativo, do percentual negativo, eu
fui para o lado otimista. Por que podia acontecer com 20% e
não podia acontecer comigo? Por que eu vou ter que me
incluir entre os 80% que têm incontinência e impotência a
vida inteira? E isso me deu muita força, e, a partir daí, eu
passei a trabalhar mais esse lado, de esperar pelo melhor e
não pelo pior. É muito mais fácil (José).
A postura do médico pode ter forte influência na atitude positiva do
paciente, gerando maior possibilidade de sucesso no tratamento:
isso me faz lembrar uma história que, em uma determinada
ocasião, um poeta francês passou em uma praça em Paris, e
avistou um mendigo com um chapéu na calçada e uma
tábua escrita: “ajude-me! Sou um pobre cego!” Ele passou,
de manhã; voltou à tarde, e tava, lá, o moço no mesmo lugar,
sem nada no chapéu. Aí, ele pegou a plaqueta, mudou os
91
dizeres e saiu. Duas horas depois, ele retornou. Aí, ele
voltou e tava, lá, o mendigo com o chapeuzinho, com várias
moedas dentro. Ele não fez nada: só fez mudar a frase, onde
estava escrito “ajude-me! Sou um pobre cego”, e colocou “é
primavera em Paris e eu não posso ver”! Quer dizer: a
simples forma de abordar o assunto modifica a realidade das
coisas (José).
Assim, ressalto que o paciente busca, no profissional de saúde, alguém com
habilidades cirúrgicas e humanas, ou seja, com postura profissional segura e, ao
mesmo tempo, empática com o paciente:
portanto, eu acho o médico, numa ocasião dessa, muito
importante porque, como eu disse pra você, o segundo
médico
me
deixou
desamparado,
completamente
desamparado: só no terceiro que eu senti segurança. E, se o
terceiro não tivesse me dado confiança, eu teria, talvez,
procurado um quarto, um quinto, um sexto, até eu conseguir
alguém em que eu visse mais que um médico, um amigo
interessado em me ajudar (José).
O paciente, ao submeter-se a tratamento de câncer de próstata, tem a
expectativa de que o tratamento oferecido pelo seu médico seja transparente em
todos seus aspectos, inclusive com relação aos procedimentos médicos e a seus
termos técnicos, discutindo com ele a evolução da doença e do tratamento, tanto
em suas implicações físicas e psíquicas, quanto sociais:
dependia, também, do organismo do paciente, da idade do
paciente, e que, acima de tudo, dependia da experiência do
médico porque ele dizia que a incontinência acontecia,
normalmente, em função do estágio do tumor, onde ele era
dissecado, os tecidos, e daria mais trabalho, mas ele achava
que, com a minha idade, tinham outros tratamentos que
podiam ser aplicados (...) Há fatores positivos e não só
fatores negativos numa circunstância dessa (José).
Assim, concordo com Gianini (2007), que afirma que o diagnóstico precoce do
câncer de próstata, somado às modificações no estilo de vida do paciente e aos
recursos avançados no tratamento do câncer de próstata, pode torná-lo uma
doença prevenida ou, pelo menos, mantida sob controle, permitindo que o
92
paciente tenha, ainda, muitos anos com qualidade de vida. É nesta perspectiva
que a fala de Moisés, abaixo, se destaca:
eu estou esperando, agora, uma evolução natural do póscirúrgico, o organismo, ver se essa incontinência é eliminada
de vez. Aí, espero que as outras funções orgânicas, também,
voltem e eu possa ter qualidade de vida. E, aí, a vida
continua.
O câncer de próstata faz os pacientes ressignificarem alguns valores de
suas vidas. A doença provoca “ansiedades reais, pois o futuro do paciente pode
ser substancialmente alterado em virtude das seqüelas do tratamento” (Silva,
2001, p. 44). Pensando em suas possibilidades futuras, eles modificam suas
expectativas em relação aos seus projetos. Moisés adota um comportamento
inusitado, em que parece perceber a oportunidade de uma nova vida após a
cirurgia, tomando a decisão de reconstruir os laços afetivos com sua família e,
principalmente, consigo mesmo:
eu estou me reconstruindo. A impressão que eu tenho é que
é uma nova dimensão da vida. A gente vive brigando com a
vida, vive competindo, lutando com tantas coisas que a
gente chama de valores, tantos parâmetros da vida! Na
verdade, a gente briga por coisas bobas, que não vale a
pena. E, quando a gente se vê diante da morte, a gente faz
uma reavaliação de tudo isso e vê que tudo é uma coisa
idiota, estúpida (Moisés).
Portanto, a maneira como uma doença crônica pode interferir na vida do
paciente é influenciada, pelo tipo de doença, pela psicodinâmica familiar, bem
como pelas suas condições sociais e financeiras (Angerami-Camon, 2001). O
enfrentamento da doença mostrou-se positivo, para a maioria dos entrevistados,
como mostra a fala acima. Apenas um deles, Pedro, demonstra, muito desespero
e descrença com relação à doença, ao tratamento e à cura, sendo, justamente ele,
o único a não incluir a família no seu processo de adoecimento e de tratamento.
Destaco que tal paciente ainda não conseguiu debelar o seu câncer, tendo
concluído as sessões de radioterapia recentemente.
93
5.2.5 E o papel de macho como fica?
Segundo Boris (2002), atualmente vem ocorrendo uma modificação no
padrão de comportamento masculino, fazendo com que este homem exponha sua
subjetividade com maior espontaneidade, sem medo ou culpa. Contudo tal
mudança ainda se apresenta bastante confusa, principalmente, no que diz
respeito ao papel de “macho”. Boris aponta a ocorrência de uma “crise da
condição e da subjetividade masculinas, que estaria sendo gerada pelas
progressivas mudanças socioculturais, forçando o homem de hoje a reavaliar a
percepção de sua condição de macho” (p. 60). Entretanto, a sociedade
contemporânea, ainda, exige uma postura forte e imbatível do homem, gerando,
no momento de enfrentamento de uma doença grave, um grande receio de
decepcionar, não apenas a sua parceira, mas a sua família, a si mesmo e a
própria sociedade. Nas entrevistas, os pacientes puderam se mostrar tal como
são, expressando seus sentimentos a este respeito, em palavras, gestos e mesmo
em seus silêncios, quando, por alguns instantes, interrompiam a fala para poder
prosseguir seus depoimentos. Destaco o questionamento de José com relação ao
seu papel como homem e provedor do seu lar, ou seja, como ele se percebe e é
percebido pela sociedade:
como seria minha vida a partir daí? Qual seria minha função
como ser humano, como homem? E me veio a idéia de que
pelo que eu tinha entendido, poderia acontecer comigo,
daqui pra frente, um estado de mutilação em termos de
reprodução, sexualidade, em razão da incontinência, que eu
sabia, também, que podia ocorrer.
Conforme Mattheus-Simonton (1990), “o homem que tem um modelo do tipo
‘machão’ ficará com muito medo ao pensar no câncer solapando suas forças e
assustado demais para revelar seu medo a outra pessoa” (p. 86). Neste caso,
medo, insegurança e ansiedade são emoções que não fluem, e que, muitas vezes,
ficam restritas a “quatro paredes”, mas puderam encontrar espaço em nossas
94
entrevistas: o medo de falhar no papel de provedor da família, a insegurança com
relação ao seu futuro e ao de sua família foram discutidos por nós. Em alguns
casos, trata-se do primeiro contato com morte ou, até mesmo, a primeira doença
grave em suas vidas.
A preocupação mais evidente, nas entrevistas, é a família. Os pacientes se
emocionaram ao falar dela de uma forma, muitas vezes, ainda não permitida por
eles mesmos. Foi, sem dúvida, um dos momentos mais emocionantes desta
pesquisa esperar que José, extremamente emocionado, após uma breve pausa,
pudesse se recuperar para dar continuidade à sua fala. Amatuzzi (2008) afirma
que “silêncio pré-verbal que mobiliza e dá vida à fala é identificado como o
sentimento” (p. 24). O depoimento deste paciente estampa, com nitidez, o silêncio
anterior à fala, envolvida de muita emoção:
o sentimento foi, exatamente, esse: o da perda que
representaria isso, não pra mim, mas pra minha família, pra
minhas filhas, pra minha esposa. Eu confesso à senhora que
foi, nesse momento, que eu chorei, pela primeira vez! (José).
Assim, considero tal emoção, expressa pelo paciente, uma demonstração do rigor
que nossa cultura impõe ao homem, e imitando-o na sua experiência emocional.
Porém, creio que tal concepção pode ser transformada. É nesta perspectiva que
Boris (2002) considera que alguns homens já reconsideram seus papéis
socioculturais, principalmente junto à sua família.
A maioria dos pacientes que se submeteu à prostatectomia radical já têm
filhos adultos, mas alguns têm filhos ainda pequenos, geralmente, fruto de um
segundo casamento, o que faz aumentar a preocupação com relação ao seu papel
de provedor do lar e de protetor dos filhos. É, exatamente, o caso de Moisés:
eu queria, ao menos, ver minhas filhas ficarem adultas
porque, até lá, elas vão estar em condições de se defender
da vida, de enfrentar melhor a vida.
95
Segundo Servan-Schreiber (2007), os homens estão mais habituados a proteger
os outros do que a receber proteção. Não apenas a preocupação consigo mesmos
envolve suas falas, mas, também, a preocupação com a sua dependência e o
trabalho que poderão causar à sua família, pois precisam de cuidados especiais,
por um determinado período, o que gera sofrimento psíquico:
eu sou muito preocupado com a dependência. A
dependência física e psíquica é terrível. A dependência física
é você não poder andar, não poder correr, não poder fazer
exercício, não poder usar seu corpo, normalmente, como
poderia usar. Aí, vem a dependência psicológica: você acha
que é um “peso”, que vai dar trabalho, vai criar problema
para os outros (...) Não tem muita razão para estar vivo,
principalmente, porque não há esperança (Pedro).
No tratamento preventivo do câncer de próstata, o exame de toque retal é
um das circunstâncias incômodas mais lembradas pelos entrevistados, pois agride
sua masculinidade, tão cuidadosamente preservada. Outro momento bastante
lembrado como gerador de mal-estar é a fisioterapia do assoalho pélvico, que,
também, faz uso da via anal para reabilitar a incontinência urinária pós-operatória.
Na maioria dos casos, tais métodos de avaliação e de tratamento são motivo de
sofrimento psíquico para os pacientes. Porém, tal sofrimento é superado pelos
benefícios proporcionados:
os aspectos positivos da fisioterapia é que você pode
apressar a cura ou adiantar o resultado que você obteria,
esperando, sem fazer nenhum tratamento. Ele vai acelerar o
resultado que se espera ser alcançado. E o negativo, eu não
sei. Poderia abordar, agora, por exemplo, a “história” da
masculinidade, mas, já, eu, que venho fazendo o
acompanhamento de próstata, há dez anos, seria o toque
(José).
Assim, destaco que a percepção dos homens acerca de seu papel de “macho”
ainda interfere, significativamente, na relação do paciente com a doença e com
seu respectivo tratamento, pois é agente geradora de angústia e de muita
ansiedade, desde a fase de diagnóstico até o pós-operatório.
96
5.2.6 A sexualidade pós-prostatectomia radical
A sexualidade, um dos assuntos abordados nas entrevistas, não foi
explorado espontaneamente apenas por um dos participantes da pesquisa. Cada
um demonstrou valores diferenciados com relação a tal tema, variando de uma
postura de aceitação, à de acomodação, não sendo descartada, também, a
possibilidade de negação do problema. Para Segal (1994), o homem permanece
com o encargo de ter uma excelente performance sexual, confundindo
masculinidade com desempenho sexual. O impacto maior do tratamento do câncer
de próstata ainda está relacionado à sua sexualidade e ao seu papel de macho
em nossa sociedade, interferindo, também, em sua auto-estima, como destacam
as falas destes pacientes:
olha, é o seguinte: eu acho que, talvez, o maior impacto que
causa no homem, nessa “história” do câncer de próstata, é a
sensação de impotência (José).
Então, isso tudo causa um impacto muito grande. Tira, às
vezes, o entusiasmo de viver. Mexe muito com o desejo de
viver, principalmente, alguém como eu, que, ao longo da
vida, gostou sempre de mulheres, dessa coisa e tal. Mexe
muito. Ao longo da vida, eu acho que a força que mais
impulsiona o homem a trabalhar é o sexo: inclusive, os
animais todos. O sexo tem um peso fortíssimo: você
trabalha, luta porque você quer conquistar a “fêmea” (Pedro).
Para José, a sexualidade não era considerada o ponto mais importante da sua
recuperação, pois estava mais preocupado em recuperar a continência urinária do
que a função erétil:
se você começa a sentir essa possibilidade, você começa a
se sentir meio homem, uma pessoa mutilada, uma pessoa
inútil. Esse, talvez, seja o impacto maior para o homem. Mas,
por outro lado, se você pensar nessa possibilidade, eu acho
que você associa, talvez, até psicologicamente, à
possibilidade de uma cura efetiva. Por isso, eu continuo
apostando
que
esse
problema
será
superado,
tranqüilamente. E, se eu não superá-lo, volto a dizer, não
97
tenho a menor possibilidade de recorrer a um método
artificial, como a prótese.
Entretanto, destaco que, mesmo falando, tranqüilamente, sobre a disfunção erétil,
o mesmo paciente não usa diretamente, os termos impotência ou disfunção erétil,
sempre incluindo a expressão “história da”, antes deles. Muitas vezes, o que é
verbalizado pelo paciente não manifesta, claramente, o que ele pretende significar,
naquele instante, o que pode ser percebido pelo profissional de saúde (AngeramiCamon, 2001).
agora, a “história” da impotência, como disse o médico é
mais demorada, ele disse que há casos, por exemplo, que
leva dois anos, e que depois de dois anos, dificilmente, você
tem ainda recuperação. Há pacientes, por exemplo, que
usam a medicação, usam a segunda, não tem efeito, usam o
injetável; pára e retorna, normalmente. Quer dizer: porque
cada organismo é um organismo (...) E a “história” da
impotência, pra mim, é um problema perfeitamente superável
(José).
Antônio foi o único entrevistado que não abordou a sua sexualidade
espontaneamente, porém, quando perguntei se ele mantinha uma vida sexual
ativa, respondeu que não, mas que acreditava que ficaria bem. O paciente parece
buscar um distanciamento dos seus sentimentos como meio de controle sobre
suas experiências positivas e negativas (Segal, 1994), como ocorreu neste caso: o
desejo de continuar vivenciando plenamente sua sexualidade foi afastado do seu
dia a dia e de sua parceira, pois sequer conversam sobre o assunto. Após o
término da entrevista, conversei com ele e lhe perguntei se tinha interesse em
procurar um especialista em acompanhamento psicoterapêutico para casais, ao
quê ele demonstrou interesse. Vale a pena ressaltar que este paciente completou
um ano da prostatectomia radical e sua segunda mulher é muito mais jovem do
que ele:
esse problema da ereção não normalizou, mas eu acho que,
com o tempo, vai voltar ao normal, né?
98
Crenças e mitos exercem efeito profundo na resposta sexual dos pacientes e
modelam o seu humor e a sua ansiedade (Naccarato & Perchon, 2004). Assim, é
evidente a dificuldade de Antônio de aceitar o problema da disfunção erétil e de
falar sobre ela. Aconteceu, exatamente, o oposto com Pedro, pois, ao falar sobre
os impactos do tratamento do câncer de próstata sobre sua sexualidade,
expressou, minuciosamente, suas queixas e a significação que atribuiu ao
momento:
eu sempre dei importância muito grande ao sexo: sexo é,
talvez, a força mais importante a me mover ao longo da vida.
O diagnóstico do câncer de próstata e precisar operar foi,
realmente, um choque muito grande (Pedro).
Mais uma vez, a fala de Pedro se destaca da dos demais entrevistados, pois ele
enfrenta o tratamento do câncer de próstata, fazendo uso de medicamentos que,
também, interferem na sua sexualidade, diminuindo o desejo sexual e a
capacidade de ereção, o que agrava, mais ainda, seu quadro depressivo:
você pode ter algum início de “ressurreição”, depois de uns
seis meses, oito meses, mas, se tiver um tratamento
complementar, “mata de vez” (se referindo à função erétil).
Quando eu falo de tratamento complementar, eu tô falando
da quimioterapia, que, normalmente, é feita com o
“Casodex”, que é a bicalamida, eu acho, um hormônio
feminino que, quimicamente, castra o homem. E a
radioterapia complementar, quando é feita, também,
prejudica uma possível ressurreição da potência sexual.
Então, isso, realmente, tem um impacto muito grande na vida
da gente (...) Eu fiquei assexuado, eu não disse à senhora!
Fiquei assexuado. Houve um período, entre o tratamento da
radioterapia e a cirurgia, em que eu cheguei a ter algumas
ereções e alguns contatos plenos (...) É: piorou, a
radioterapia complicou, piorou. Depois disso, eu tive um
período de desinteresse, de apatia total nessa área.
Sentir desejo e não ser capaz de ter ou de manter a ereção faz com que estes
homens se sintam ainda mais frustrados com relação à sua masculinidade, pois os
tratamentos hormonais, necessários em casos em que o câncer persiste, alteram
99
o desejo e diminuem seu sofrimento psíquico, pelo menos, no que se refere ao
desempenho sexual:
a “bicalamida” tem uma característica diferente, eu imagino:
ela afasta o desejo, ela tira o desejo. E, se você não sente o
desejo, se você não sente a necessidade, você sofre menos,
né? (Pedro).
Ellsworth et al. (2003) consideram necessário, no tratamento do câncer de
próstata, que o paciente, juntamente com sua parceira, redirecionem seu
relacionamento sexual. Adaptação às perdas, seja de relacionamento, seja da
função sexual, se faz necessária, em alguns casos:
até mesmo porque você tem pessoas que você quer bem,
com quem você sempre se ajustou muito bem, nesta área, e
você tem que aceitar e tem que entender que vai ter que
perder essas pessoas (Pedro).
Segundo Srougi (2003), estratégias para contornar a disfunção sexual são
adotadas por alguns pacientes, sempre iniciando pela opção mais simples, que é
a medicação via oral, ou seja, comprimidos que podem auxiliar a obtenção da
ereção, no período pós-operatório tardio, normalmente quando o paciente já
recuperou, totalmente, ou em parcela significativa, a continência urinária. Outra
opção de tratamento para a disfunção erétil é a inserção de próteses penianas,
mas ela nem sempre é recebida com naturalidade pelos pacientes, já que se trata
de uma maneira mecânica de conseguir ter relações sexuais. Entretanto, nem
todos os pacientes elegem a sexualidade ou o tratamento para a disfunção erétil
como essenciais, como podemos observar nas falas a seguir:
eu não sei se eu faria ou não, uma prótese. Não sei porque
eu acho o seguinte: eu sei que seria uma fantasia muito
grande. Eu conto como a “história” do silicone (de mama).
Seria muito artificial, e, fazer, eu não faço. Eu acredito que a
medicação resolve. E, além do mais, seria uma questão, até,
de vencer a “história” do desejo, né, que é perfeitamente
contornável, e do apego (José).
100
Os recursos existem: existe a prótese, que é a solução pra
muita gente, mas não é aplicado em todos os casos. Eu
lembro de uma consulta que eu fiz e, no meu caso, não seria
aplicado: pelo menos, no momento, não seria aplicado.
Então, tem que se usar os recursos, que são carícia,
aconchego, beijo, essa coisa que, se for feita com muito
equilíbrio, que se for feita, eu diria, com sabedoria, leva a
satisfação ao parceiro, mas você não pode se satisfazer,
pelo menos, se percebe isso, mas a gente se gratifica um
pouco. É possível você ter um orgasmo, assim, mas é
trabalhoso: não é fácil (Pedro).
A recuperação da função sexual pós-prostatectomia radical é um processo
lento e gradativo, que ocorre, geralmente, em um período que varia,
aproximadamente, de 3 meses a um ano após a cirurgia. A fala de Moisés, que se
encontra, há, apenas, 42 dias, no pós-operatório, manifesta uma discreta
preocupação com sua vida sexual, mas, ao mesmo tempo, que afirma a
possibilidade de usar outras estratégias, como medicamentos, considera, também,
sua aceitação para enfrentar possíveis complicações sexuais, ou seja, a DE pósprostatectomia radical:
eu estou numa idade relativamente jovem. Opções viáveis,
por enquanto, seriam os medicamentos orais ou injetáveis.
Prótese, eu acredito que eu não aceitaria, não. Se,
realmente, houver uma disfunção permanente, eu aceitarei,
com naturalidade. Já falei com minha esposa sobre isso,
também (Moisés).
Mesmo diante de tantas dificuldades na esfera sexual, Pedro continua com forte
vontade de viver sua sexualidade, mantendo momentos de intimidade que não
trazem satisfação direta a ele, mas que, ao satisfazer sua parceira, provocam sua
satisfação como macho:
posteriormente, surgiu uma pessoa com quem a gente se
relacionou e tem, mas no sentido de satisfazer a parceira: aí,
você usa a mão, usa a língua, usa o que você puder usar, o
que permite a realização, pra satisfazer a parceira... E a
gente termina ficando satisfeito em conseguir com que a
parceira se realize (Pedro).
101
Ao contrário do que eu imaginava, este homem busca reconstruir sua sexualidade,
pois sua função erétil já apresentava as alterações próprias da sua idade, 77 anos,
mas mantém um relacionamento estável com sua parceira, com a qual
desenvolveu cumplicidade e companheirismo (Angerami-Camon, 2001). Assim, a
sexualidade tem se mostrado um desafio, não apenas físico, mas, também,
emocional e social para tal paciente submetido à prostatectomia radical. Os
pacientes que ainda não apresentaram alguma resposta da função erétil
demonstram certa resistência a adotar estratégias de enfrentamento às
complicações cirúrgicas. Porém, Pedro demonstrou que é possível uma
significativa adaptação à disfunção, inclusive, comprovando a possibilidade de sua
satisfação sexual e de sua parceira, mesmo não tendo condição de obter ereção.
Portanto, é importante destacar que o paciente prostatectomizado pode ter uma
vida sexual prazerosa, desde que aceite suas restrições e que se disponha a
explorar outras formas de vivenciar sua sexualidade (Rosita Santos, 2006).
5.2.7 A infantilização e a feminilização do uso de fraldas e de protetores
íntimos
A incontinência urinária obriga o paciente a usar protetores (fraldas
geriátricas) nos primeiros dias de pós-operatório. Em seguida, tal recurso pode dar
lugar a um protetor de menor volume (absorvente geriátrico), pois, quando ele
apresenta perdas insignificantes de urina (gotas), pode fazer uso de um
absorvente masculino ou, às vezes, feminino, para, mais adiante, dispensar o uso
de qualquer protetor higiênico. Com a utilização da fralda e dos absorventes, uma
possível sensação de infantilização e/ou de feminilização pode ocorrer ao
paciente, pois, ao retirar a sonda, colocada após a cirurgia e que, em média,
permanece durante 10 dias, ele não tem controle voluntário sobre sua micção.
Quando abordaram sobre o tema, a expressão “sensação terrível” foi utilizada por
dois entrevistados, buscando descrever o impacto psicológico gerado pela
102
utilização de um recurso próprio às crianças, em seus primeiros anos de vida, e às
mulheres:
é uma sensação terrível, né? (Antônio).
Ah, é uma sensação terrível! É a sensação de você estar
começando tudo de novo: você volta à infância,
completamente
desamparado,
desamparado
completamente, né? E, ao mesmo tempo que tem quem
cuide de você, você não quer que cuide: fugindo da proteção
dos outros, né? E, ao mesmo tempo, tendo a necessidade
de alguma coisa que te ampare e você não sabe o que é. É
uma incerteza muito grande (José).
Em suas poucas palavras, pude perceber a intensidade da experiência destes
pacientes em relação ao uso de protetores íntimos. No caso de José, tal uso gerou
os sentimentos de desamparo e de conflito, evitando o cuidado de terceiros e
mesmo da família. A expressão “sensação terrível” se repete com Antônio, sendo
tudo o que ele conseguiu expressar sobre o tema, pois ele faz uso diário dos
protetores, há, aproximadamente, um ano. Considerando sua dificuldade de
expressar sentimentos, posso avaliar o impacto psíquico do uso de fraldas sobre
ele. Boris (2002) considera que ser homem, hoje, significa lidar com a grande
diversidade das manifestações possíveis da masculinidade e das relações sociais
de gênero” (p. 402). A dificuldade deste homem de expressar sua subjetividade,
considerando tal atitude “coisa de mulher” (p.402) pode ser uma dessas
manifestações. Desta forma, ter que usar protetores íntimos gerou nos pacientes
uma aproximação simbólica do gênero feminino, tão evitada por eles.
Assim, o uso das fraldas e de protetores íntimos gerou falas de intensa
sensação de constrangimento e de fragilidade. O fato de precisarem fazer uso de
protetores íntimos e de fraldas, associadas às mulheres e às crianças pequenas,
fez com que os pacientes prostatectomizados vivenciassem uma sensação de
incapacidade física, bem como, também, demonstrem estar emocionalmente
abalados:
103
realmente, a sonda, aquela bolsa coletora, forma um quadro
um pouco, assim, ligeiramente depressivo, mas eu superei
bem essa fase e tirei a sonda com 8 dias, e, depois, passei
para o fraldão: aí, já é outra etapa (Moisés).
Por outro lado, tal experiência, plena de incertezas e que requer adaptações
físicas e emocionais, pode iniciar um novo ciclo na vida desses homens, que
lançam mão de diversos recursos para superar os desafios da doença e do
tratamento do câncer de próstata:
no segundo dia, terceiro dia, você troca uma, duas, três,
quatro fraldas. Aí, aos poucos, vai se normalizando. Hoje,
por exemplo, no início, eu usava uma fralda maior, mas, aí,
já estou usando aquele “dry man” 10 (José).
Imagina você: eu, um homem com a idade que eu tenho,
tenho uma profissão que não existe muito oportunidade pra
poesia, acostumado a lidar com a violência, lidar com
bandidos, acostumado a comandar homens e, de repente,
eu, usando fraldas, numa situação de total impotência, total
fragilidade! Aquilo me abalou também, porque foi um lado
frágil ao qual eu não estava acostumado a ter vivência com
ele. E, ainda, estou usando (...) O fraldão, em si, é muito pelo
estereótipo, pelo estigma que ele traz (Moisés).
Ávila (2002) considera que “o universo simbólico que o paciente constrói
inclui a totalidade de suas vivências e, neste processo, este universo simbólico
constrói, por sua vez, o caráter e a qualidade dessas vivências” (p. 42). A vivência
simbólica da infantilização e da feminilização, devido ao uso das fraldas e dos
protetores íntimos faz emergir, no paciente, sentimentos de fragilidade e de
incapacidade, que podem, inclusive, desencadear um episódio depressivo. O
temor da dependência das fraldas ou dos protetores íntimos para a incontinência
temporária pós-prostatectomia radical passa a ser, então, um dos fantasmas do
enfrentamento do câncer de próstata.
10
Modelo de absorvente masculino.
104
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio da compreensão das experiências subjetivas dos pacientes
submetidos a tratamento de câncer de próstata, pude perceber que eles
desenvolvem maior contato com sua condição humana, pois se aproximam, cada
vez mais, das suas emoções, até então, evitadas, ou mesmo, reprimidas. Às
vezes, o que não é verbalizado pelo paciente expressa mais e melhor o que ele
evita reconhecer, o que pode ser percebido pelo profissional da saúde atento à
subjetividade de seus pacientes. Na entrevistas, os participantes da pesquisa
alternaram momentos em que expressavam desespero, vivido durante algumas
fases do tratamento, com momentos de otimismo e de aceitação. Cada um deles
demonstrou, de forma peculiar, lançar mão de mecanismos de defesa na busca de
equilibrar suas dores emocionais e físicas, durante a vivência das adversidades do
câncer de próstata.
O momento do diagnóstico foi considerado, por todos os participantes desta
pesquisa, o momento mais estressante e significativo da sua vida. A abordagem
do médico, a decisão sobre o tratamento, a possibilidade de complicações
cirúrgicas e o medo de morrer foram temas expressados nas entrevistas, sendo
vividos, sobretudo, como momentos combinados de medo e de esperança.
Normalmente, os pacientes recebem o diagnóstico do câncer de próstata através
de laudo laboratorial da biópsia, sendo, portanto, um dos recursos a serem
revistos pelos profissionais da saúde, pois os pacientes relataram, imediatamente
após a leitura do diagnóstico, experimentar sintomas que representavam uma
somatização das fortes emoções vividas com o impacto do descobrimento do
câncer. Junto ao choque do diagnóstico, algumas angústias foram sentidas e
registradas pelos pacientes. A perda do papel de provedor da família é uma das
suas principais preocupações, pois se sentem responsáveis, financeira e
moralmente, por suas famílias, principalmente quando têm filhos pequenos,
percebendo a fragilização do seu papel masculino perante a sociedade.
105
A relação médico-paciente é intensamente permeada de fortes significados,
não apenas técnico-científicos, mas, também, humanos, principalmente, no que se
refere à confiança, à empatia e à sensibilidade, características que os pacientes
esperam encontrar no médico. A fala dos entrevistados demonstrou que a postura
humanizada do médico é uma das condições para este ser escolhido como o
profissional que irá acompanhar seu tratamento. A habilidade e competência
técnica, também, são destacadas por eles como importantes na decisão desta
relação.
A família assume, durante o tratamento do câncer de próstata, um papel
importante de apoio, principalmente, se há abertura e disponibilidade para o
diálogo e a solidariedade. A mulher, geralmente, desempenha uma função ímpar
ao lado do paciente, oferecendo-lhe apoio incondicional, mesmo diante da
possibilidade de mudanças em sua vida sexual, decorrentes dos efeitos colaterais
do tratamento do câncer de próstata. Alguns filhos, quando adultos, transformamse nos melhores amigos dos pacientes, não apenas servindo-lhes de companhia,
mas, também, de suporte emocional, enquanto os filhos ainda pequenos se
tornam forte motivação para a cura.
Cada paciente enfrenta o câncer de forma bastante individualizada, o que
pode ter diversas implicações, desde a relação com sua família, até o sentido de
sua vida. Reações adversas, como raiva, medo e ansiedade, são bastante
compreensíveis, tratando-se de uma doença que ameaça sua vida. Tal doença,
ainda envolta em estigmas e muitas incertezas, faz com que o paciente passe por
um choque, percebendo sua fragilidade como ser humano, mas, muitas vezes,
logo em seguida, precisa reagir com determinação para seguir em busca da cura.
A sexualidade dos pacientes submetidos à prostatectomia radical costuma
ficar fortemente abalada, física e emocionalmente, pois sua auto-estima tem
relação íntima com o exercício de sua função sexual, proporcionando prazer e
intimidade. No caso particular do tratamento do câncer de próstata, faz-se
106
necessário o uso de algumas estratégias para manter ou para recuperar a
atividade sexual com suas parceiras. Dentre as complicações da prostatectomia
radical, a disfunção erétil é a principal preocupação do paciente, e, em segundo
lugar, a incontinência urinária. Como os pacientes que participaram desta
pesquisa já vinham se tratando, da incontinência urinária sob meus cuidados
profissionais em fisioterapia do assoalho pélvico, mostraram-se bastante otimistas
em relação à recuperação de seu controle urinário, pois se percebiam capazes de
certa continência, mesmo ainda fazendo uso de algum tipo de protetor íntimo para
conter as discretas perdas de urina. Com relação à disfunção erétil, apenas um
dos participantes da pesquisa a considerou a complicação mais grave da
prostatectomia radical em relação à sua qualidade de vida. Percebo, portanto,
uma grande facilidade de adaptação dos pacientes à reconstrução da sua
sexualidade, após o tratamento do câncer de próstata.
No que diz respeito às implicações físicas e psíquicas do tratamento do
câncer de próstata, percebo-as como um momento de possível ressignificação de
suas expectativas e metas de vida desses homens. Muitos passaram a revalorizar
a família e seus relacionamentos afetivos-sexuais, segundo a percepção deles
mesmos. Considero, ainda, que o persistente estigma do câncer vem assumindo
contornos mais suaves, porém continua gerando forte impacto psíquico sobre
quem recebe seu diagnóstico. Mesmo muitos sabendo que o câncer de próstata,
quando diagnosticado em sua fase inicial, tem, como prognóstico, um risco
mínimo de levar tais pacientes a óbito, a perspectiva negativa deles sempre
predomina, especialmente, na fase inicial do tratamento ou quando do diagnóstico,
embora podendo se modificar, gradativamente, no transcurso do tratamento, pois
depende da atitude de enfrentamento dos pacientes.
A discussão deste tema está longe de ser esgotada, até mesmo porque
envolve muita complexidade, o que não me permite estabelecer um ponto final ou
um fechamento definitivo dos questionamentos aqui abordados. Pelo contrário,
esta pesquisa teve o objetivo, apenas, de iniciar uma discussão acerca da
107
subjetividade do paciente em tratamento de câncer de próstata, buscando que os
profissionais de saúde proporcionem aos seus pacientes a condição de manifestar
seu sofrimento psíquico, diante do enfrentamento da doença e do tratamento,
oferecendo-lhes adequado suporte, não apenas físico, mas, também, psicológico.
Desta forma, as diversas categorias que emergiram deste estudo indicam quão
imperativo é trabalhar interdisciplinarmente no tratamento do câncer de próstata,
uma vez que, são muitas e necessárias as possibilidades de atuação dos
profissionais de saúde nas diferentes áreas envolvidas. Neste sentido, por
exemplo, a psicologia vem fazendo uma tentativa de inserir uma nova dimensão
de interdisciplinaridade e de investir, com veemência, na humanização dos
atendimentos realizados na área da saúde. Assim, espero que este estudo possa
favorecer com que os profissionais da saúde compreendam a relevância de
desempenhar seu papel, não apenas com habilidade técnica e amplos
conhecimentos científicos, mas, adotando, também, um olhar acolhedor,
humanizado e solidário diante do sofrimento psíquico dos seus pacientes.
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121
ANEXOS
Anexo 1 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
1. TÍTULO: “O SIGNIFICADO DA VIVÊNCIA
TRATAMENTO DE CÂNCER DE PRÓSTATA”
DO
PACIENTE
EM
2. JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O universo do câncer masculino ainda é
pouco explorado nos aspectos subjetivos, portanto, o interesse do estudo
se deve à necessidade de conhecer mais o significado da vivência do
paciente em tratamento do câncer de próstata, buscando colaborar com a
melhora da qualidade de vida dos pacientes que realizaram a cirurgia de
retirada da próstata, bem como daqueles que ainda irão realizá-la.
Esclarecendo as dúvidas mais comuns, não apenas da área médica, mas
principalmente da área psicológica. Como por exemplo, os mitos e
estereótipos acerca da disfunção sexual e da incontinência após
prostatectomia (cirurgia de retirada da próstata).
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: As coletas dos dados serão
realizadas através de encontros individuais com horários pré-estabelecidos,
nos quais os sujeitos serão convidados a falar dos eventos mais
significativos de suas vidas, se utilizando uma pergunta disparadora: “Quais
foram os eventos mais significativos de sua vida?”. Estas falas serão
gravadas, posteriormente, serão dispostas em categorias, destacando-se
as falas mais significativas, relacionadas ao câncer de próstata, para em
seguida serem analisadas e discutidas.
4. RISCOS ESPERADOS: a pesquisa não oferece riscos ao sujeito.
5. QUESTÕES ÉTICAS: este termo de consentimento livre e esclarecido foi
elaborado de acordo com a resolução 196/96 do Conselho Nacional de
Saúde. Os sujeitos terão acesso às informações e liberdade para desistirem
a qualquer momento de participar da pesquisa e serão assegurados quanto
ao anonimato e ao sigilo das informações coletadas no decorrer do estudo,
o qual será utilizado em favor da ciência e do bem estar dos sujeitos
envolvidos.
6. DADOS DO PESQUISADOR(A):
Nome: Sandra Rebouças Macêdo
Rua Antônio Augusto 1271 sala 405
e-mail: [email protected]
Telefones: 9987 90 35
122
7. DADOS DO SUJEITO DA PESQUISA
Nome:
Endereço:
telefone
e-mail:
8. CONSENTIMENTO PÓS-ESCLARECIDO
Eu,
________________________________________________,
após
entendimento do que foi esclarecido, concordo em participar do presente
protocolo de pesquisa.
Fortaleza, ____ de __________________de 2008.
________________________________ ______________________________
Sujeito da pesquisa
Pesquisador (a)
123
Anexo 2 - Pergunta Disparadora
Quais foram os eventos mais significativos de sua vida?
124
Anexo 3- Parecer do Comitê de Ética
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o significado da vivência do paciente em tratamento de câncer de