VI Encuentro Internacional de Economia Política y Derechos Humanos
PELLUCCI, Erica.B.M1.
Eje 4. Economía social y solidaria
Palavras Chaves: Economia Solidária. Autogestão. Trabalho associado. Catadores de
materiais recicláveis.
O TRABALHO ASSOCIATIVO DOS CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS
DO BRASIL: CONTRADIÇÕES DE UM DISCURSO SOLIDÁRIO.
Este estudo tem como objetivo refletir sobre as contribuições teórico-práticas da
Economia Solidária junto aos/as catadores/as de materiais recicláveis do Brasil.
Buscaremos analisar a cadeia produtiva da reciclagem ressaltando o papel das
organizações associativas desses trabalhadores e das contradições presentes nas
intervenções dos agentes solidários. Assim como, problematizar os limites e
possibilidades desta “outra economia” defendida pelo modelo teórico de Paul Singer ao
tratarmos especificamente dos problemas do lixo urbano, da falta de trabalho
assalariado e do desenvolvimento sustentável.
É sabido que o mundo do trabalho sofreu grandes transformações a partir de
1973. A implementação de um novo modelo produtivo baseado na flexibilização da
acumulação do capital e em políticas neoliberais de redução da participação dos Estados
nacionais na economia, foram medida encontradas pelos capitalistas para solucionar o
problema da crise de sobreacumulação que estagnava o ciclo de crescimento do capital.
Para os trabalhadores latino-americanos essas mudanças significaram um aumento do
desemprego estrutural; crescimento da precarização das relações de trabalho;
eliminação dos direitos trabalhistas, historicamente conquistados pelos trabalhadores; a
insegurança com relação à permanência no emprego; o trabalho temporário; a baixa
remuneração; o retrocesso na ação sindical; elevados índices de pobreza, e o
acirramento dos problemas sociais.
No bojo desse contexto desfavorável à classe trabalhadora, muitos trabalhadores
-que nunca viveram plenamente o estado de Bem-Estar Social- passam a se organizar
coletivamente em torno de estratégias de sobrevivência e de trabalho como uma forma
de resistir ao desemprego e a precariedade. Entre essas organizações coletivas existem
1 Mestranda do programa de Pós-Graduação da Universidade Federal Fluminense, Rio de
Janeiro, Brasil. Email: [email protected]
aquelas que passam a seguir os princípios do associativismo/cooperativismo e começam
a ser conhecidas no Brasil sob a forma de movimento da Economia Solidária (ES). Esse
movimento envolve a defesa de formas alternativas de produção da vida em que se
valoriza o trabalho e não o capital. Ele também enfatiza as relações de solidariedade e a
autogestão como elementos fundamentais à criação de uma cultura do trabalho
emancipadora. E luta pela igualdade de gênero, pelo respeito a diferenças culturais, pela
preservação do meio ambiente, pela sustentabilidade, pela segurança alimentar e pelo
desenvolvimento local das comunidades2. Devemos ressaltar que além dos trabalhadores
de diversos ramos de atividades que participam desse movimento, temos também um
contingente significativo de representantes do “terceiro setor” 3 e das universidades. Sem
contar que na última década o governo institucionalizou a ES criando a Secretaria
Nacional de Economia Solidária (SENAES).
Uma das estratégias de sobrevivência e de trabalho que nasce nesse mesmo
período é a atividade da catação de materiais reciclados, que atualmente envolve cerca
de um milhão de desempregados no Brasil4. Vale destacar que essa estratégia tem uma
peculiaridade, ela não deriva de velhas iniciativas populares de garantia da
sobrevivência, como no caso do trabalho de ambulantes ou do trabalho familiar na
confecção de roupa e/ou produtos alimentícios. Mas sim de uma demanda inteiramente
nova gerada pelo desenvolvimento da cadeia produtiva da reciclagem.
O desenvolvimento da cadeia produtiva da reciclagem foi possível no Brasil
devido a uma convergência de fatores, tais como: a disponibilidade de grande massa de
desempregados a ser convertida em catador; o aumento nos preços dos derivados do
petróleo e o alto custo da extração de matéria-prima virgem, devido ao crescimento dos
2 Documento Final, Eixo temático I, da I Conferencia Nacional de Economia Solidaria,
Fundamento da Economia Solidária, Ministério do Trabalho e Emprego, Brasília, 2006, p. 57.
3 Esse setor se relaciona às instâncias privadas que possuem atribuições públicas, são
financiadas pelo governo, mas não estabelecem vínculos institucionais. Exemplo, as
Organizações Não Governamentais (ONGs).
4 Disponível em: <www.mncr.org.br>. Acessado em: 12/11/2011.
problemas ambientais denunciados pela sociedade civil desde a conferência de
Estocolmo em 1972.
Nas últimas décadas, o trabalho precário e insalubre que os catadores realizavam
de forma individual nos lixões e nas ruas, passa a ser substituído progressivamente pelo
trabalho coletivo por meio de cooperativas e associações, muito estimulado pelo
movimento da ES. Através da ajuda dos agentes solidários5 esses trabalhadores
conseguem se organizar de forma menos precária em torno da produção da existência.
Além disso, o reconhecimento social do trabalho do catador também tem aumentado
devido ao incentivo da sociedade civil na preservação do meio ambiente e no
desenvolvimento da consciência ambiental.
Entretanto, ao analisarmos a natureza dessa atividade; os ganhos conquistados
pelos trabalhadores em relação às horas trabalhadas; a falta de direitos trabalhistas que
envolvem essa ocupação e o papel das cooperativas na produção capitalista, a situação
desses trabalhadores se torna complexa. Tanto o discurso do trabalho solidário,
supostamente desenvolvido nessas organizações coletivas, quanto o da importância do
papel ambiental dos catadores na sociedade, podem perder o fôlego ao relacionarmos
essa ocupação com os debates sobre o direito fundamento do ser humano ao trabalho
digno.
Podemos nos questionar por que o movimento da ES e seus agentes solidários
incentivam e reiteram a importância desse trabalho na sociedade contemporânea, uma
vez que fica difícil imaginar a participação das cooperativas de reciclagem na
construção de um circuito produtivo alternativo ao capitalismo e responsável por algum
desenvolvimento local comunitário.
Desse modo, buscaremos refletir sobre os antagonismos presentes na defesa do
movimento da Economia Solidária para com a formação de cooperativas e/ou
associação de catadores e os limites desse movimento ao analisarmos a problemática da
produção de resíduos sólidos e os debates sobre o trabalho digno. Para isso, partiremos
do pressuposto de que os trabalhadores/catadores são sujeitos que vivenciam
coletivamente, não de forma totalmente autônoma e livre, suas situações e relações de
produção determinadas, mas lidam e agem sobre essas determinações das formas mais
diversas possíveis (Thompson, 1978). Em outras palavras, não deixaremos de levar em
5 Versaremos sobre esses agentes mais a frente.
conta as mediações que o próprio trabalhador realiza diante de suas necessidades e das
determinações da cadeia produtiva da reciclagem. Além disso, consideramos que os
processos produtivos associados são entendidos como espaço/tempo de formação
humana, em que os horizontes econômico-sociais estão explícitos ou implicitamente
presentes nesse processo por mais contraditórios que possam parecer (TIRIBA, 2001).
Sendo assim, o presente estudo será estruturado em três momentos distintos: o
primeiro consiste na fundamentação teórica na qual apresentaremos de forma
exploratória a concepção de Paul Singer sobre a Economia Solidária e sua confrontação
tanto com a ideia de Rosa Luxemburgo sobre o papel das cooperativas no capitalismo,
quanto sobre os debates em torno do direito ao trabalho digno. Em um segundo
momento, problematizaremos o mundo do trabalho da reciclagem à luz do referencial
Thompsoniano. E em um terceiro e último momento serão traçadas algumas
considerações finais.
A ECONOMIA SOLIDÁRIA DE SINGER E SEUS GARGALOS
O aparecimento de organizações associativas guiadas pelos princípios do
cooperativismo popular6 é um fato observado por toda a America Latina a mais de uma
década. Essas iniciativas econômicas são apresentadas como estratégias de
sobrevivência e trabalho que se tornam visíveis frente ao desemprego estrutural que
assola os países dependentes.
Esse fenômeno social passa a ser objeto de interesse de acadêmicos e políticas
públicas de geração de trabalho e renda que o consideram manifestação do movimento
da Economia Solidária (ES). A ES é caracterizada, principalmente pelos acadêmicos,
como uma alternativa ao modelo econômico dominante, fundamentada em práticas de
cooperação solidária, em que a finalidade da atividade econômica é o trabalho e não a
acumulação privada do capital. Ela enfatiza a importância do desenvolvimento local
ambientalmente sustentável, do respeito à diversidade cultural e a de gênero 7. No Brasil,
6Estamos diferenciando o cooperativismo popular do “falso cooperativismo” cooptado pela lógica
capitalista. Este último incentiva a educação para a empregabilidade, como forma de tornar vendável a
força de trabalho no mercado capitalista (TIRIBA, 2004).
7 Documento Final, Eixo temático I, da I Conferencia Nacional de Economia Solidaria,
Fundamento da Economia Solidária, Ministério do Trabalho e Emprego, Brasília, 2006, p. 57.
um de seus teóricos mais conhecidos é o então Coordenador da Secretaria Nacional de
Economia Solidária (SENAES) o prof. Paul Singer.
Para esse autor, a ES surgiu como iniciativa proletária nos primórdios da
industrialização capitalista como resposta a pobreza e ao desemprego, resultantes da
adoção das máquinas a vapor pela Inglaterra no século XIX. Sua noção de ES esta
vinculada as concepções do socialista utópico Robert Owen, uma vez que considera
possível que determinadas características presentes nas cooperativas e associações
populares - tais como a posse dos meios de produção e a organização autogestionária do
trabalho - sejam formas de resistência ao capitalismo, que articuladas e fortalecidas
podem vir a transformar a sociedade.
Vale ressaltar que no tempo em que Owen pôs em prática seu plano de melhoria
das condições de vida dos trabalhadores, não existia o movimento sindical dos
trabalhadores. Este se desenvolveu pouco tempo depois influenciado não só pelas ideias
do industrial inglês, mas também por outros socialistas utópicos. Assim, Singer (2002)
considera relevante destacar que o movimento sindical cria um tipo de cooperativismo
estritamente ligado à luta de classe e muito combativo em meados da terceira década do
século XIX. Os trabalhadores em luta contra os empregadores não se limitavam as
reivindicações de melhores salários e condições de trabalho, mas tentavam substituí-los
no mercado. Assim, as greves eram armas de combate à eliminação do trabalho
assalariado.
Dessa forma, o autor defende que o movimento da ES historicamente se origina
da luta de classe dos trabalhadores no combate as condições de exploração em que eram
submetidos e ao próprio assalariamento. Assim, atualmente as cooperativas solidárias
conseguem não reproduzir a luta de classe, pois em seu interior não há relações de
assalariamento, nem hierarquias de poder. Ao seguirem o princípio do cooperativismo- a
autogestão-, os trabalhadores estabelecem outras relações de trabalho embasadas na
solidariedade, em que o trabalho não é mais fonte de alienação e de competição. Para o
professor de Economia, a autogestão seria a responsável por proporcionar um trabalho
mais emancipado e menos alienado ao trabalhador, já que por ela é possível
compreender e controlar todas as etapas do trabalho produtivo. Ele irá defender que
existem graus de autogestão diferentes em cada organização associada.
A economia solidária é formada predominantemente por
empreendimentos que, pela sua origem, são efetivamente
democráticos e igualitários e reafirmam estas características em
sua prática cotidiana. Elas constituem um modo de produção
que, ao lado de diversos outros – o capitalismo, a pequena
produção de mercadorias, a produção estatal de bens e serviços,
a produção privada sem fins de lucro –, compõem a formação
social capitalista, que é capitalista porque o capitalismo não só
prevalece quantitativamente em relação aos outros modos de
produção, mas molda a superestrutura legal e institucional de
acordo com os seus valores e interesses (SINGER, 2001).
Para Singer (2001,2002), o modo de produção capitalista é hegemônico, mas não
impede que outros modos de produção coexistam, já que é incapaz de inserir em seu
bojo toda a população economicamente ativa. Neste sentido, a ES cresceria em função
de periódicas crises sociais do capital. Mas o autor ressalta que ela se tornará realmente
uma alternativa real a esse sistema, quando os despossuídos do capital se
conscientizarem sobre a possibilidade da construção de outra organização do trabalho,
em que os meios de produção sejam daqueles que realmente geram produtos sociais. O
que leva a crer que a ES não é criação de intelectuais, mas tem relação direta com as
lutas da classe trabalhadora.
Com isso, o autor defende um novo projeto de sociedade. Entretanto, podemos
nos questionar se o problema do assalariamento isolado de uma totalidade teria
relevância para a luta da classe trabalhadora dentro do capitalismo. Acreditamos que
não, pois o combate ao assalariamento não deve vir desvinculado das reivindicações de
melhores condições de trabalho, nem o controle do grau de produtividade do trabalho.
Por isso que historicamente o movimento sindical luta pelos direitos trabalhistas que
tentam interferir nesses dois fatores.
Singer (2002) critica o sindicalismo dizendo que o mesmo passou a representar
uma poderosa organização que simplesmente reivindica novos direitos trabalhistas e
amplia os já conquistados, sem de fato contribuir com a eliminação da alienação que o
trabalho assalariado proporciona aos trabalhadores. Entretanto, o problema com as más
condições de trabalho, a falta de garantias de aposentadoria e férias remuneradas
persistem e são corriqueiras nas cooperativas solidárias, principalmente quando nos
referimos às cooperativas de catadores. O autor parece desconsiderar a funcionalidade
dessas unidades produtivas para o regime de acumulação flexível do capital. Ele dá a
entender que o capitalismo não seria um sistema que orienta outras formas de economia,
o que o leva a pensar que é possível conviver com diferentes modos de produção até que
a ES, através de seu crescimento endógeno, supere o capitalismo.
No entanto, assim como Singer, acreditamos que a ES tem um potencial para
desenvolver práticas de produção, comercialização, finanças e consumo, baseadas na
solidariedade, nas relações democráticas, na cooperação, no desenvolvimento
comunitário e humano. Entretanto, consideramos que a ES é diretamente relacionada à
Economia Popular8 e parte integrante do sistema capitalista. Como Razeto (1999),
entendemos que as relações de solidariedade não são consideradas como algo já dado a
partir de uma esfera moral, mas praticada no dia a dia dos trabalhadores, que
contraditoriamente não deixam de viver as relações sociais capitalistas. Assim, a
solidariedade pode ser considerada como uma racionalidade presente no trabalho
associado do setor popular.
Apesar das organizações associativas potencialmente desmercantilizarem a força
de trabalho quando priorizam as relações autogestionárias de produção, há também
limites históricos que envolvem a inserção na lógica do mercado para venda e aquisição
de produtos. Portanto, o trabalho independente é executado segundo uma obrigação por
resultados compatíveis com os ditames da esfera da circulação. Assim, essas
organizações por mais autogestionárias que possam ser não conseguem romper com a
alienação do trabalho em sua totalidade.
Esse processo é contraditório. De um lado traz a vantagem de preservar os
postos de trabalho e a possibilidade da autogestão, entendida como um processo
democrático de gestão da produção, não necessariamente relacionado à formação de
cooperativas. Por outro, facilita a desarticulação da luta de classe, já que os
trabalhadores poderão assumir uma postura de microempresários, perder seus diretos
trabalhistas e a sua identidade de classe. Devemos ressaltar que Luxemburgo (2010) já
denunciava que as cooperativas são seres híbridos dentro do sistema capitalista, uma
vez que a esfera da circulação, em fase da concorrência, domina a esfera da produção e
determina as condições de existência de qualquer unidade produtiva. Daí resulta a
incapacidade dos trabalhadores em driblar as exigências da concorrência do mercado, o
que os levam a adotarem medidas semelhantes a dos capitalistas em seus
8A Economia Popular subsiste de forma subalterna aos diferentes modos de produção e/ou modelos de
desenvolvimento econômico, mas que se tornou visível no contexto da crise do trabalho assalariado
estável. Assim, suas atividades estão presentes em todas as formações econômico-sociais, uma vez que os
seres humanos sempre acumularam forças individuais e coletivas encontrando meios para a produção
social de sua existência (TIRIBA, 2001).
empreendimentos, tais como a intensificação do trabalho e a dispensa de funcionários.
Os trabalhadores que se “autogovernam” contraditoriamente tendem a desempenhar
entre eles o mesmo papel do patrão capitalista.
Luxemburgo (2010) ainda nos esclarece que as cooperativas de produção não
podem ser consideradas como reformas sociais gerais
“pela simples razão de pressupor a sua realização geral,
antes de tudo, a supressão do mercado mundial e a dissolução da
economia mundial atual em pequenos grupos locais de produção
e de troca, constituindo no fundo, por conseguinte, um
retrocesso da economia do grande capitalismo à economia
mercantil da Idade média” (LUXEMBURGO, 2010, p. 85).
Neste sentido, é difícil imaginar o desenvolvimento solidário de cooperativas de
produção que competem com o grande capital mundial e não se sucumbem a suas
determinações, principalmente quando pensamos no tempo socialmente necessário à
produção. O que geralmente acontece é uma intensificação do trabalho por meio da
autoexploração do trabalhador, como uma das formas de garantir condições mínimas de
competitividade. Para Tavares (2002) trata-se de uma falsa autonomia marcada pelo
desassalariamento e pela precariedade, onde o tempo de trabalho socialmente necessário
ainda continua ativo.
Na mesma perspectiva de Tavares, Barbosa (2007) aponta no plano político,
como o trabalho não assalariado ganha notoriedade no Programa das Nações Unidas
para o desenvolvimento (PNUD) e na Organização Internacional do Trabalho (OIT). A
autora denuncia que o discurso da OIT é contraditório. A organização aponta as
fragilidades do trabalho regulado pelo mercado acusando o trabalho infantil e escravo,
ao mesmo tempo defende o trabalho em condições de liberdade, segurança e dignidade
humana. Além disso, limita sua ação à regulação das condições contratuais do trabalho
ignorando até mesmo as características intrínsecas a natureza da ocupação e as
condições técnicas dos ramos das atividades. Na verdade, a OIT apela para um discurso
moral, em que o “trabalho descente” é o slogan para combater os males apontados pela
corrosão do emprego.
Apesar de não ser nosso objetivo versar sobre as implicações idealistas do
conceito de “trabalho descente”, consideramos relevante a busca pelo trabalho digno.
Sabemos que no atual modo de produção a harmonização entre capital e trabalho é
impossível, mas não devemos deixar de lado as discussões travadas pelos direitos
humanos em defesa do trabalho digno. A autora Miraglia (2010) advoga a favor desse
termo como um direito fundamental de todos os seres humanos, que deve garantir a
dignidade na sociedade capitalista e a garantia do acesso à vivência, não a mera
sobrevivência.
Neste sentido, podemos nos perguntar se as cooperativas de catadores de
materiais recicláveis pertencentes ao movimento da ES possibilitam a existência do
trabalho digno. Embora os trabalhadores possuam a liberdade de se organizar no interior
da cooperativa de forma solidária e autogestionária, a própria natureza dessa atividade
fere o conceito de trabalho digno. Na Associação de Trabalhadores da Usina de Triagem
e Reciclagem de Viçosa (ACAMARE)- na cidade de Viçosa, interior do Estado de
Minas Gerais, no Brasil-, as catadores trabalham em uma usina de reciclagem com
maquinário elaborado para facilitar o trabalho de triagem dos resíduos e há coleta
seletiva no município. Contudo, ainda são triados resíduos odontológicos altamente
contagiosos, a remuneração é inferior a um salário mínimo e as horas trabalhadas às
vezes ultrapassam às 40h semanais (ALEXANDRINO, 2009).
Ao nos referirmos ao trabalho digno como direito fundamental do ser humano,
entendemos que o mesmo deve assegurar ao trabalhador a participação ativa, com
relação ao destino de sua própria existência e de sua vida em sociedade. Assim, deve-se
evitar qualquer tipo de atividade degradante e desumana, que não garanta condições
mínimas para uma vida saudável do próprio trabalhador e de sua família (Miraglia,
2010). O trabalho de catador não se enquadra neste modelo. Apesar da ES defender a
autogestão nas cooperativas de catadores, não é através dela que obterão melhores
condições de trabalho. Independente da gestão adotada, os resíduos irão se acumular nos
galpões produzindo mau cheiro e atraindo roedores transmissores de doenças, o que
torna o ambiente de trabalho sempre insalubre. Neste sentido, por mais que a catação de
materiais recicláveis seja a saída para o desemprego de um grande contingente de
trabalhadores, não podemos deixar de considerar que essa atividade por si só, não tem
condições de proporciona mínima dignidade.
Por mais que a ES, assim como outros movimentos da sociedade civil, relacione
essa atividade ao desenvolvimento sustentável, sabemos que a reciclagem passa a existir
para solucionar um problema do próprio sistema capitalista e não como uma alternativa
ao mesmo. Contudo, as cooperativas de catadores ganham respaldo governamental a
partir da lei federal Nº 11.4459 e com a criação da Secretaria Nacional de Economia
9 A Lei Nº11. 445 se referi às diretrizes nacionais para o saneamento básico. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11445.htm. Acessado em:
Solidária (SENAES), cresce o incentivo a formação de novas organizações por todo o
país.
A SENAES amplia a participação dos agentes solidários - responsáveis por
popularizarem os princípios do cooperativo autogestionário- através do incentivo
financeiro as organizações de apoio que já existiam e a criação de novas no âmbito
municipal. Os agentes que militavam no movimento da ES se encontravam nas
Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCPs), na Associação Nacional
de Trabalhadores em Empresas de Autogestão e Participação Acionária (ANTEAG), em
alguns sindicatos como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e na Igreja Católica
através da Caritas.
Em geral, a ação educativa desses agentes é centrada na instrução técnicoadministrativa, na qual os trabalhadores aprendem a gerir suas cooperativas e/ou
associações para transformá-las em fontes de renda, através do trabalho autogestionário
e solidário. Entretanto, o público alvo desses agentes são trabalhadores desempregados,
pouco escolarizados, que não possuem capital para formalizar a atividade econômica.
Neste sentido, nós nos perguntamos: Como esses agentes podem estimular o exercício
dos princípios autogestionários de horizontalidade das relações de trabalho e do rodízio
de funções dentro de organizações associadas em que o analfabetismo impera?
Como exemplo de atuação desses agentes solidários, miramos nas ações das
ITCPs, que a mais de dez anos realizam trabalhos de formação junto a esse
trabalhadores. Barros (2003) em pesquisa realizada entre os anos de 2001 a 2003 sobre
o projeto societário e educativo das Incubadoras da rede de ITCPs, já assinalava que as
mesmas apresentavam processos muito contraditórios entre seu projeto político e suas
práticas educativas. Ela aponta que as ações educativas dessas incubadoras tendem a
reproduzir a lógica da pedagogia do capital, apesar de defenderem uma
educação/formação para o cooperativismo popular. A autora faz essa afirmação
embasada na ausência de um projeto político pedagógico coerente e sistematizado
presente nas Incubadoras Populares Universitárias, e pelo maior financiador das ações
educativas das ITCPs ser o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e não o Ministério
da Educação (MEC).
20/12/2011.
Neste sentido, essas ações educativas são caracterizadas por uma formação
minimalista e de curta duração, restrita ao saber fazer, ou melhor, direcionada a uma
capacitação para o trabalho cooperativo afastada dos fundamentos econômicofilosóficos do trabalho e da articulação com a escolarização. Isso significa que a
tendência das incubadoras é depositar na capacitação profissional seu projeto educativo,
o que de certa forma, é a instrução que historicamente foi direcionada aos trabalhadores.
No caso das cooperativas de catadores os problemas com o analfabetismo são
enormes. Na pesquisa de Conceição (2005) sobre a situação econômica de cinco
cooperativas de catadores do interior do Estado de São Paulo, o número de analfabetos
somado aos que tinham até quatro anos de escolaridade ultrapassava os 50% do total de
cooperados. Apesar dessas cooperativas não terem relação direta com o movimento da
ES, esse fato pode complicar ainda mais a existência de um trabalho autogestionário
dentro dessas organizações.
Devemos ressaltar que a formação proporcionada pelos agentes solidários pode
gerar um intercâmbio interesses entre o saber acadêmico e o saber da prática, propiciar
espaços de discussão sobre o mundo do trabalho, direitos do trabalhador e todas as
temáticas que envolvem a gestão das organizações associativas, mas será difícil o
estimulo ao desenvolvimento de prática autogestionárias, já que os próprios
trabalhadores colocarão nas mãos dos mais escolarizados os cargos de maior
responsabilidade, fato que acontece na ACAMARE.
Dessa forma, ação pedagógica desses agentes parece perpetuar a separação entre
o trabalho intelectual e manual, entre a concepção e execução, separando o mundo do
fazer e o mundo do pensar, em que o conhecimento historicamente construído continua
longe de ser conquistado. Não basta os agentes incentivarem discursivamente sobre a
necessidade da alfabetização na tentativa de reiterar a responsabilidade para com o
problema (Barros, 2003). Antes de receber a formação técnica para o trabalho, o
trabalhador deveria ser escolarizado, pois mesmo que esse processo educativo não seja a
expressão de uma educação voltada aos interesses da classe trabalhadora, ele empodera
e proporciona mínimas condições de autonomia.
A partir disso, como pensar processos educativos emancipadores que
concretamente buscam romper com a lógica capitalista do “baixo preço do sangue e do
suor humano transformados em mercadorias” continuamente a ampliar o capital?
( MARX, 2010, p.535).
“ESCRAVOS DISFARÇADOS DE LIBERTOS”
A conferência de Estocolmo em 1972 marcou o inicio das políticas a níveis globais
voltadas às questões ambientais. O discurso das organizações internacionais, como da
Organização das Nações Unidas (ONU) e da UNESCO, veio no sentido de promover a
conservação dos recursos naturais e questionar os modelos de consumo. Entretanto, pouco ou
nada se questionou sobre o modelo de produção adotado, e sua relação com os desastres
ambientais.
Mészáros em seu livro Produção destrutiva e estado capitalista faz uma crítica ao
sistema capitalista, afirmando que este sistema produtivo é incapaz de estabelecer limites
significativos. Para ele, tudo que em uma época parece ser “demais” se torna “muito pouco” em
outra. Isso resulta não do suprimento real das necessidades, mas sim, do próprio sistema
produtivo capitalista ser constrangido pelas limitações do consumo a criar sempre mais
“necessidades”, o que Marx já apontava como sendo uma tendência progressiva de expansão do
capital.
Para o Filósofo Húngaro os avanços produtivos são considerados a priori benéficos e
desejados. Porém, não se questiona as condições nas quais tais avanços são adquiridos nem
tampouco suas implicações danosas. Assim, os mesmos acabam sendo responsáveis por
modificarem de forma inevitável os padrões de consumo, bem como a forma pela qual são
utilizados, tanto os bens a serem consumidos quanto os instrumentos com os quais se produzem
esses bens.
De forma geral, a tendência do modo de produção capitalista é produzir cada vez mais
em prazos cada vez menores. Por isso, a durabilidade dos artigos é inimiga desse sistema, o que
contraditoriamente compromete a sua própria qualidade. A tendência, segundo Mészáros
(1996), é a adoção da chamada “taxa de utilização decrescente”, justificada pelos economistas
pela função da necessidade de concorrência e pela utilidade racional dos recursos do trabalho.
Contraditoriamente, temos por um lado a produção cada vez maior de mercadorias
justificada pela aplicação dessa taxa, responsável pela geração de resíduos poluentes e pelo
modelo de consumo descartável. Por outro lado, temos o discurso ecológico que incentiva o
equilíbrio da sociedade do descartável sem, no entanto, impulsionar transformações
significativas da base produtiva. E fazendo parte dessa lógica- em que se defende moralmente
uma forma de equilibrar os danos ao meio ambiente, mas na prática o que impera é a geração de
capital- temos a cadeia produtiva da reciclagem.
Sabemos que essa cadeia produtiva nasce de um período de crise estrutural do emprego
proporcionada pelo modelo neoliberal de acumulação e se torna um negócio altamente
lucrativo. Bosi (2010) faz uma análise dos dados fornecidos pelo CEMPRE 10, apontando os
rendimentos crescentes da reciclagem de latinhas de alumínio e plásticos no Brasil. Ele afirma
que enquanto na Europa e nos Estados Unidos grande parte da reciclagem de materiais é feita
por meio de programas de coleta seletiva, na America Latina essa coleta é realizada
majoritariamente por catadores.
Até meados do final da década de 1980, os trabalhadores catavam sucatas como uma
forma de complementar a renda, como é o caso de inúmeros exemplos da ES. Entretanto, a
ocupação como catador se firmou a partir da década de 1990 no Brasil devido aos altos índices
de desemprego. Foi a partir da disponibilidade de um grande contingente de trabalhadores
desempregados a ser convertidos em catadores, que o setor da reciclagem passa a se estruturar
no país, já que não se encontrou uma solução mais econômica de recolhimento e triagem dos
materiais recicláveis para a indústria (BOSI, 2010).
Fatores como o aumento do preço dos derivados do petróleo, a necessidade do capital
de buscar matéria-prima mais barata- como uma forma imperialista de solucionar o problema da
crise que se alastrava desde 1973- e a preocupação da sociedade civil para com os problemas
ambientais causado pelo desenfreado desenvolvimento do capitalismo, também contribuíram
para tornar a reciclagem uma alternativa viável economicamente na perspectiva do capital.
Assim, o que motiva o aparecimento dessa atividade não é essencialmente a preservação
ambiental, mas os ganhos econômicos em potencial. Por isso os resíduos orgânicos, por
exemplo, tem pouquíssima proeminência se comparados à reciclagem de latinhas de alumínio.
Com o desenvolvimento das indústrias da reciclagem, o trabalho do catador passa a ser
mais organizado. A coleta e a venda de materiais recicláveis, que em décadas anteriores eram
realizadas individualmente, passam a ser coletivas e envolver o trabalho associado de
cooperativas e/ou associações. As políticas públicas de geração de trabalho e renda e os agentes
da ES são um dos colaboradores da criação dessas organizações associativas. Essa colaboração,
apesar de melhorar a organização do trabalho e possibilitar um aumento na geração de renda,
também favorece prefeituras e atravessadores a estabelecerem relações de cunho comercial e
não trabalhistas com os catadores.
As relações tradicionais entre patrões e empregados são substituídas por relações
mercantis entre “iguais”. Contudo, os trabalhadores não deixam de vender sua força de trabalho
de forma indireta, uma vez que os galpões e o maquinário das cooperativas, na maioria das
10 “Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre) é uma associação sem fins lucrativos
dedicada à promoção da reciclagem dentro do conceito de gerenciamento integrado do lixo”.
Disponível:
<http://www.cempre.org.br/imprensa.php?codeps=fHx8fHx8fHx8fHx8fDE1>.
Acesso em: 20/12/2011.
vezes, são de propriedade do poder público. Neste sentido, o trabalho insalubre e precário que
os catadores realizam se integra ao circuito de valorização do capital na condição de trabalho
subordinado à esfera da circulação.
Ao mesmo tempo, não podemos desconsiderar que o processo é contraditório.
Os catadores se encontram em condições de extrema pobreza e as cooperativas e/ou
associações podem significar um espaço de resgate de sua condição de sujeitos sociais e
políticos perante a sociedade. Mesmo levando em conta o problema histórico que
envolve a auto-organização dos trabalhadores em cooperativas, podemos observar que
são as necessidades e expectativas que fazem as pessoas se agruparem e lutarem contra
forças antagônicas. Essas cooperativas, ao serem guiadas pelos princípios da ES e
enfrentarem diariamente o peso das determinações do capital, acabam construindo uma
nova cultura do trabalho, em que velhas e novas formas de organização do trabalho
possibilitam a formação de “economia moral” como sugere Thompson (1998). Além
disso, essas organizações de trabalho, aparentemente, possibilitam espaços de formação
política e de agrupamento de interesses, em que os sujeitos envolvidos passam a
protestar e/ou resistirem contra as condições de trabalho que consideram injustas.
Exemplo disso é a mobilização dos catadores em torno do Movimento Nacional de
Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR).
Este movimento luta por melhores condições de trabalho, por direitos trabalhistas e pela
qualidade de vida dos catadores. Ele se apoia na defesa da ação direta popular como método e
princípio, acreditando no protagonismo do povo, na solidariedade de classe, e não depende de
filiação a partidos políticos ou sindicatos 11. O MNCR procura defender os direitos mínimos do
catador, não chegando a lutar por mudanças sociais radicais. Podemos caracterizá-lo como
sendo uma simples resistência ou como uma “rebelião do estômago”, em que não se prioriza
nada além das necessidades imediatas de sobrevivência.
Entretanto, ao buscarmos compreender o movimento histórico e as contradições da
realidade a partir das ações e das experiências desse grupo social “marginalizado”, é possível
desvendar aspectos mais precisos das particularidades que envolvem essa realidade social. É
possível considerar a contradição existente entre a consciência do conformismo e a consciência
da resistência como consciência do vir-a-ser de classe. Podemos refletir sobre a cultura do
trabalho das cooperativas de catadores através da noção de economia moral de Thompson. As
11 Informações disponíveis em:
regionais>, acessado em 26/12/2011.
<http://www.mncr.org.br/box_1/estruturas-
cooperativas atuam sob a pressão do modo de produção hegemônico, mas também articulam
outras relações culturais em suas organizações associativas.
Assim, não podemos reduzir essas organizações ao simples papel que possuem na
cadeia produtiva da indústria da reciclagem, nem tão pouco superestimar seu potencial perante
os trabalhadores através do MNCR. O mais adequado, segundo Thompson (1978), é considerálas como organizações ambíguas, que carregam elementos de negação do capitalismo, mas ao
mesmo tempo os reproduz.
CONSIDERAÇÃO FINAL
Ao buscar refletir sobre as contribuições teóricas da Economia Solidária
embasada nas ideias de Paul Singer e da prática educativa dos agentes solidárias junto
aos/as catadores/as de materiais recicláveis no Brasil, conseguimos traçar alguns
indicativos de seus limites e possibilidades.
Devido aos problemas sociais causados pelo desemprego estrutural, fica difícil
invalidar as iniciativas populares em busca da manutenção da vida e do possível apoio
da sociedade civil e do poder público no auxílio a esses trabalhadores. Mesmo assim,
devemos ficar atentos aos discursos moralizantes que transformam trabalho precário em
trabalho solidário e trabalho insalubre em ecologicamente correto.
Sabemos que as cooperativas solidárias têm seus limites históricos muito bem
delineados e por mais que se organizem em redes sempre estarão submetidas às
determinações do mercado capitalista. Além disso, o trabalho associado não é
independente e nem proporciona diretamente a desalienação do trabalhador, já que ele
não consegue superar na prática todas as faces da alienação do trabalho. O fruto do
trabalho, na maioria das vezes, aparece como uma coisa estranha e independente do
produtor, ainda que os trabalhadores consigam dominar em partes uma etapa da
produção. Há uma desmercantilização da força de trabalho, mas não a desalienação do
trabalho em sua totalidade.
Neste sentido, podemos afirmar que a Economia Solidária (ES) com seu
principio autogestionário questiona a propriedade privada dos meios de produção e a
venda da força de trabalho. No entanto, apesar de defender o trabalho e não a
acumulação do capital, a solidariedade no lugar da competição, ao se tornar uma
política pública, a ES corre o risco de anular a luta de classes e tornar os problemas da
geração de trabalho e renda em simples “problemas sociais” que o Estado poderá
solucionar.
A partir disso, a cooperativa de catadores é entendida pela ES como uma
solução para um processo de “exclusão social” vivenciada por esses trabalhadores, que
possibilita a humanização da ocupação. Assim, os agentes solidários, em suas
intervenções junto aos catadores proporcionam o contato com o conhecimento técnicoadministrativo que podem vir a auxiliá-los na busca por melhores condições de geração
de renda.
Esse processo educativo pode de fato influenciar os trabalhadores na
construção de uma nova cultura do trabalho e criar ambientes de conscientização
política. Entretanto, não poderá mudar a natureza da atividade, nem a sua
funcionalidade para com a cadeia produtiva da reciclagem, o que em última instância
determina a qualidade de vida dos catadores.
Sabemos que a reciclagem não se desenvolveu no Brasil em detrimento dos
problemas ambientais provocados pela desenfreada e nefasta expansão do capitalismo,
mas sim no momento em que se torna uma atividade lucrativa para o capital. O discurso
“verde” não significa nada além de uma agregação de valor, que somado ao “selo” do
“socialmente justo” aumenta ainda mais a lucratividades dos produtos “politicamente
corretos”, como é o caso das mercadorias produzidas pela Coca-Cola e pela Suzano.
Neste sentido, podemos observar que as cooperativas de catadores são espaços
contraditórios, ao mesmo tempo, que são uma alternativa ao desemprego de milhares de
trabalhadores, também proporcionam a manutenção do trabalho precário, que não
possibilita nada além da subsistência. Desse modo, é conveniente agregarmos essa
atividade como um exemplo de organização associada solidária? Não seria a mesma
coisa de defendermos o trabalho precário autogerido?
Sabemos que estamos diante de uma situação complexa em que os discursos
solidários parecem escamotear condições de trabalho cada vez mais degradantes,
entretanto não podemos considerar que os trabalhadores/catadores são seres passivos
nessa história. A luta de classe continua e por mais que as determinações do capital
imponham precárias condições de vida, elas são sempre mediadas por esses sujeitos,
que ao se organizarem podem transformar a difícil realidade de os cercam.
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