O Efeito da Monocultura da na Sobre a Agricultura Familiar
Ivano Ribeiro
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Resumo: A evolução dos meios produtivos e o fantástico crescimento das tecnologias na
agricultura, propiciaram uma significativa elevação na produção de grãos do Brasil, o
crescimento do agronegócio na última década, medido principalmente pelas exportações de
soja, contribui consideravelmente para o saldo positivo na balança comercial. Porém
juntamente com este desenvolvimento surgem as preocupações quanto aos aspectos sociais e
ambientais envolvidos neste processo. Mesmo sendo responsáveis por uma grande parcela da
produção de alimentos da cesta básica do brasileiro, a falta de incentivos aos pequenos
produtores fazem com que muitos abandonem a atividade agrícola, e os que permanecem no
campo buscam alternativas de produção para se manterem na atividade, ao mesmo tempo as
monoculturas avançam tanto em produção quanto em áreas de plantio, gerando
preocupação quanto à manutenção dos recursos naturais existentes no País.
Palavras-Chave: Agricultura Familiar, Êxodo Rural, Soja.
1 Introdução
A produção e o consumo de produtos derivados da soja se expandem de forma
acentuada pelo mundo. Usado na fabricação de óleo de cozinha e como gordura hidrogenada
na indústria alimentícia em geral, as áreas cultivadas avançaram de maneira muito rápida nos
últimos anos. Juntamente com o Brasil, os Estados Unidos e a Argentina também tiveram
considerável aumento da produção.
Contudo o crescimento das monoculturas é seguido por discussões sobre o fator
econômico e ambiental, já que, o País possui uma das maiores reservas naturais do planeta, e
por outro lado tem potencial para se tornar o maior produtor de se soja do mundo. Isto
demonstra a necessidade de implementação de ações que ao mesmo tempo permita o
desenvolvimento do agronegócio brasileiro e também permita que as pequenas propriedades
se desenvolvam, impedindo assim, o êxodo rural e gerando maior renda para os pequenos
municípios.
2 O Agronegócio Brasileiro
Mesmo não atingindo as expectativas de colheita devido à estiagem, a atividade
agrícola no Brasil vive um momento histórico. Segundo a FAEP - Federação da Agricultura
do Estado do Paraná (2005a) as exportações dos produtos agrícolas do País renderam 8,788
bilhões de dólares somente no primeiro trimestre deste ano, este valor é um recorde para o
período representando um crescimento de 12,1% se comparado aos 7,838 bilhões de dólares
do primeiro trimestre de 2004.
Este crescimento deve ser mantido e até mesmo superado segundo as projeções do
USDA - Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (2005), que prevê uma liderança
do Brasil nas exportações de soja em grãos podendo chegar a 54% das exportações mundiais
até o ano de 2014. Isto representará 49,4 milhões de toneladas ao contrário de países como
Estados Unidos e Argentina que deverão perder uma grande fatia do mercado internacional.
TABELA 01 - PROJEÇÕES DAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS DE SOJA EM GRÃO
– 2003/04 – 2014/15
Ano
Argentina
2003/ 2004/ 2005/ 2006/ 2007/ 2008/ 2009/ 2010/ 2011/ 2012/ 2013/ 2014/
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015
6,8
7,7
7,1
7,2
7,3
7,3
7,2
7,2
7,2
7,1
6,9
6,7
Brasil
19,8
22,3
23,1
25,9
29,2
33,7
37,7
40,5
43,2
45,3
47,4
49,4
EUA
24,1
27,5
29,9
30,1
29,9
28,7
28,0
28,0
28,0
27,9
27,9
28,0
China
0,3
0,2
0,3
0,3
0,3
0,3
0,3
0,3
0,2
0,2
0,2
0,2
Outros América Sul
3,2
3,8
4,0
4,2
4,5
4,8
5,1
5,3
5,6
5,9
6,2
6,5
Outros
1,1
1,2
1,2
1,2
1,2
1,2
1,1
1,1
1,1
1,1
1,1
1,1
75,9
79,4
82,4
85,3
87,6
89,9
92,0
Total
55,3 62,7 65,6 69,0 72,4
Fonte: USDA - Agricultural Baseline Projections to 2014.
Este crescimento confirma o grande momento do agronegócio brasileiro, que
segundo a FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná (2005b) é responsável pelo
saldo na Balança Comercial de mais de 30 bilhões de dólares, e resultado da combinação
inigualável de território, água e sol em abundância, além do Brasil ser um dos países mais
bem equipados do mundo para competir no setor agropecuário e no de indústria alimentícia,
além das indústrias de biotecnologia que incrementam sementes que influenciam considerável
para o crescimento da produtividade agrícola. (The Ecologist, 1998)
O agronegócio brasileiro que ao mesmo tempo ativa a economia do País e gera
divisas, traz também preocupações quanto aos aspectos sociais e ambientais. As áreas de
plantio de soja avançam rapidamente na Amazônia, o desenvolvimento e inovações tem
transformado a soja em um cultivo adaptado às condições do sul da Amazônia, e logo poderá
avançar ao centro Amazônico, as florestas amazônicas fornecem algo entre 20% a 40% da
umidade que sustenta o clima do Brasil central, que hoje é o celeiro nacional das exportações.
A soja não é a única razão de desmatamento na Amazônia, mas é a mais lucrativa atualmente.
(PADUE, 2005)
Com este rápido crescimento das áreas cultivadas com soja, geralmente de grandes
produtores que dispões de recursos e infra-estrutura para a produção. Um aspecto que chama a
atenção é a falta de acesso às novas tecnologias, as dificuldades de suporte técnico, e as
políticas de crédito que enfraquecem cada vez mais os pequenos produtores que necessitam
evoluir tecnologicamente e adquirir insumos de boa qualidade, desenvolvendo cada vez mais
técnicas de produção e gerenciamento financeiro das propriedades para poderem se manter na
atividade. (Alves e Souza, 2000)
Contudo, as exigências impostas para a concessão de crédito a esta modalidade
acabam eliminando uma grande parte de pequenos agricultores dos programas de
financiamento, e mesmo quando conseguem as taxas de juros cobradas muitas vezes
inviabilizam o negócio.
Diante destas dificuldades, aliada a baixa demanda de mão-de-obra impulsionada
pela incorporação de modernas tecnologias nas operações de colheita e pós-colheita, como
comentam Balsadi, e Belik (2001), muitos abandonam o campo em busca de uma melhor
qualidade de vida nas áreas urbanas o que nem sempre se concretiza devido ao alto índice de
desemprego, o baixo nível de escolaridade, e a própria capacitação profissional destas pessoas
que na maioria se limitam ao conhecimento da prática agrícola.
Esta fuga da zona rural para os centros urbanos já ocorre a vários anos no País, e
Camarano e Abramovay (1999) comentam que o êxodo rural brasileiro foi um dos
movimentos migratórios mais intensos que o mundo conheceu, alçando um total de 27
milhões de pessoas entre 1960 à 1980, o que reduziu significativamente o número de
pequenas propriedades rurais.
TABELA 02 - POPULAÇÃO RESIDENTE EM ÁREAS RURAIS E URBANAS NO
BRASIL DE 1940 / 1996
Ano
1940
1950
1960
1970
1980
1991
1996
2000
População Rural
28.356.133
33.161.506
38.767.423
41.054.053
38.566.297
35.834.485
33.993.332
31.845.211
População Urbana
12.880.182
18.782.891
31.303.034
52.084.984
80.436.409
110.990.990
123.076.831
137.953.959
Total
41.236.315
51.944.397
70.070.457
93.139.037
119.002.706
146.825.475
157.070.163
169.799.170
Fonte: IBGE - Dados Históricos dos Censos/Censo Demográfico 2000.
Mesmo com o abandono da atividade agrícola por milhares de pessoas, o Brasil
ainda possui um grande número de propriedades constituído pela chamada agricultura
familiar, composta por pequenos e médios produtores representam a imensa maioria de
produtores rurais do Brasil. São cerca de 4,5 milhões de estabelecimentos, dos quais 50%
estão situados no Nordeste brasileiro. O segmento detém somente de 20% das terras e
responde por 30% da produção total. Em alguns produtos básicos da dieta do brasileiro como
o feijão, arroz, milho, hortaliças, mandioca e pequenos animais este setor chega a responder
por 60% da produção. (Portugal, 2002)
TABELA 3 - PRODUÇÃO REALIZADA DAS SAFRAS DE ARROZ, FEIJÃO,
MILHO E SOJA - BRASIL - 1996-2002
Ano
1996
1997
1998
1999
Arroz
8.643.803
8.351.665
7.716.090
11.709.694
Feijão
2.449.396
2.840.243
2.191.153
2.830.915
Milho
29.589.791
32.948.044
29.601.753
32.239.479
Soja
23.155.274
26.391.448
31.307.440
30.987.476
2000
2001
2002
11.134.588
10.184.027
10.457.093
3.061.964
2.453.419
3.064.228
32.314.250
41.955.265
35.932.962
32.820.826
37.881.339
42.124.898
Fonte: ibge - Indicadores Agropecuários 1996-2003
Este segmento é fundamental para a economia dos pequenos municípios, segundo o
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2000), 4.928 municípios brasileiros
possuem menos de 50 mil habitantes, sendo que destes quatro mil possuem menos de 20 mil
habitantes. Estas famílias são responsáveis pela por grande parte das atividades ligadas ao
comércio, prestação de serviços e geração de empregos destas localidades.
Dados do IBGE (2002), demonstram ainda que os municípios com menos de 20 mil
habitantes, as atividades primárias são essenciais para a economia local, e a pesca (60,1%), a
agricultura (69,3%) e a pecuária (69,4%) estão sendo muito comprometidas devido a
problemas ambientais, principalmente ao uso indiscriminado de agrotóxicos que é largamente
utilizado em áreas onde se predomina a monocultura.
Nos últimos anos houve um grande crescimento das atividades ligadas à agricultura
orgânica entre os pequenos produtores, isto devido à necessidade de maior mão de obra e a
melhor rentabilidade dos produtos. Porém a legislação impõe uma faixa territorial mínima
entre as culturas orgânicas e o plantio convencional eliminando o risco de contaminação. Em
grandes lavouras muitos produtos são aplicados com uso de aviões, isto prejudica e limita em
muito as áreas próprias para o plantio destes produtos.
3 Uso de Agrotóxicos
O Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo, gastando
anualmente, cerca de 2,5 bilhões de dólares nessas compras, além do alto volume de uso,
muitos dos herbicidas são aplicados em áreas próximas aos corpos d'água e são, portanto,
comumente encontrados em águas superficiais afetando peixes e outros animais. Para Younes
e Galalgorchev (apud TOMITA E BEIRUT, 2002), estes produtos possuem grande
mobilidade, podendo alcançar águas subterrâneas, o que pode prejudicar em muito a
qualidade de vida das populações próximas.
Para Andrioli (2003), a maioria dos rios, fontes de água e solos, estão sendo
progressivamente contaminados, e no caso das plantações de soja transgênica existe ainda o
fato do herbicida ser aplicado sobre as plantas durante sua fase de desenvolvimento
vegetativo, deixando resíduos nas plantas que podem repassar a contaminação também aos
grãos e conseqüentemente ao consumidor.
Existe uma grande necessidade de uma maior fiscalização dos órgãos públicos
quanto ao volume, e composição dos agrotóxicos usados no Brasil, muitos entram no País
ilegalmente e usados de forma inadequada comprometendo a saúde da população e do meio
ambiente.
4 Considerações Finais
O investimento apenas nas monoculturas, á algo muito perigoso e já penalizou o País
ao longo da história, com a borracha, o cacau e o café. (SHIVA,2003). Aumentar a produção é
necessário, assim como, manter os recursos naturais existentes e apoiando as pequenas
propriedades.
O crescimento do agronegócio é fundamental para o desenvolvimento da Nação, más
deve ser acompanhado por políticas públicas que permitam a manutenção das pequenas e
médias agriculturas, incentivando as culturas alternativas para que os produtores possam ter
produtos competitivos no mercado.
As medidas necessárias para atender a agricultura familiar, são medidas que exigem
rapidez, pois o processo de transformação é muito acelerado.
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Download

O efeito da Monocultura sobre a agricultura familiar.