OBRA ANALISADA
GÊNERO
AUTOR
DADOS BIOGRÁFICOS
Brejo das almas
Poesia
Carlos Drummond de Andrade
Nascimento: 31 de outubro de 1902. Itabira, Minas Gerais.
Morte: 17 de agosto de 1987
“No dia 5 de agosto morre a mulher que mais amou, sua amiga,
confidente e filha Maria Julieta. Desolado, Drummond pede a sua
cardiologista que lhe receite um “infarto fulminante”. Apenas
doze dias depois, em 17 de agosto de 1987, Drummond morre
numa clínica em Botafogo, no Rio de Janeiro”.
Fonte: http://www.memoriaviva.com.br/drummond/index2.htm
BIBLIOGRAFIA
Prosa
1944 – Confissões de Minas (ensaios e crônicas)
1945 – O gerente (conto)
1951 – Contos de Aprendiz (contos)
1952 – Passeios na Ilha (ensaios e crônicas)
1957 – Fala, Amendoeira (crônicas)
1962 – A bolsa e a vida (crônicas e poemas)
1970 – Cadeira de balanço (crônicas)
Poesia
1930 – Alguma poesia
1934 – Brejo das almas
1940 – Sentimento do mundo
1942 – José
1945 – A rosa do povo
1948 – Novos poemas
1951 – A mesa
1951 – Claro enigma
1952 – Viola de bolso
1954 – Fazendeiro do ar
1955 – Soneto da Buquinagem (Viola de bolso novamente
encordoada)
1957 – Ciclo
1959 – A vida passada a limpo
1962 – Lição de coisas
1964 – Viola de bolso II
1967 – Versiprosa
1968 – Boitempo e a falta de quem ama
Foi traduzido para alemão, búlgaro, chinês, dinamarquês,
espanhol, francês, holandês, inglês, italiano, norueguês, sueco e
tcheco.
RESENHA
O livro situa-se entre os dois importantes livros de poema de
Drummond, Alguma poesia, livro de estréia, e Sentimento do
mundo.
Composto por 27 poemas, o livro, durante muito tempo, foi
esquecido pela crítica tendo sido pouco analisado.
O primeiro poema do livro, “Aurora”, demonstra a atmosfera
pessimista do poeta.
O poeta ia bêbedo no bonde.
O dia nascia atrás dos quintais.
As pensões alegres dormiam tristíssimas.
As casas também iam bêbedas.
Tudo era irreparável.
Ninguém sabia que o mundo ia acabar
(apenas uma criança percebeu mas ficou calada),
que o mundo ia acabar às 7 e 45.
Últimos pensamentos! últimos telegramas!
O amor, como sempre em Drummond, é visto com desdém – é
só mais um produto:
Como é maravilhoso o amor
(o amor e outros produtos).
No poema, a morte vem como sacramento, o inevitável destino
dos homens.
Dançai, meus irmãos!
A morte virá depois
como um sacramento.
Drummond mantém a temática do cotidiano que vemos em
Alguma poesia e que veremos em Sentimento do Mundo. As
ruas, os bêbados, os bondes, o funcionário público são figuras
vistas com frequência, na obra de Drummond.
Drummond mescla essas figuras do cotidiano com o sentimento
de não pertencer ao mundo, com a desilusão, com a
desesperança.
Em “Soneto da perdida esperança”, um fato corriqueiro,
perder o bonde1, se torna metáfora para perder a esperança:
Perdi o bonde e a esperança.
Volto pálido para casa.
A rua é inútil e nenhum auto
passaria sobre meu corpo
¹
Aqui, bonde está no sentido real. Não se trata de uma expressão ou gíria: o poema
foi escrito quando os meios de transporte coletivos ainda eram os bondes.
O livro passeia pela inadequação ao mundo – um mundo que já
é “caduco” (expressão que aparecerá depois em Sentimento do
mundo, no poema Mãos dadas).
No poema, “Poema patético”, Drummond expressa sua
desesperança em relação ao amor: a vida é tratada com
descaso, a morte parece corriqueira:
Que barulho é esse na escada?
É o amor que está acabando,
é o homem que fechou a porta
e se enforcou na cortina.
No poema, “Hino nacional”, há uma exaltação à pátria, além
de uma crítica contundente e feroz:
Precisamos descobrir o Brasil!
Escondido atrás das florestas,
(...)
Precisamos educar o Brasil.
Compraremos professores e livros,
(…)
Cada brasileiro terá sua casa
com fogão e aquecedor elétricos, piscina,
(…)
Precisamos, precisamos esquecer o Brasil!
Tão majestoso, tão sem limites, tão despropositado,
(…)
O Brasil não nos quer! Está farto de nós!
Nosso Brasil é no outro mundo. Este não é o Brasil.
Nenhum Brasil existe. E acaso existirão os brasileiros?
Cético, Drummond demonstra toda a sua desconfiança com a
religião, parafraseando a oração católica Salve rainha (Gemendo
e chorando nesse cale de lágrimas):
Mas de nada vale
gemer ou chorar,
de nada vale
erguer mãos e olhos
para um céu tão longe,
para um deus tão longe
ou, quem sabe? para um céu vazio.
Em “Convite triste”, o poeta celebra essa insatisfação com o
mundo, essa inadequação:
Meu amigo, vamos sofrer,
vamos beber, vamos ler jornal,
vamos dizer que a vida é ruim,
meu amigo, vamos sofrer.
Vamos fazer um poema
ou qualquer outra besteira.
Em “Segredo”, a metapoesia que se encontrava em Alguma
poesia, ainda está presente:
A poesia é incomunicável.
Fique torto no seu canto.
Não ame.
Já, em “Necrológio dos desiludidos do amor”, ressalta-se a
desilusão com amor. O poeta assume um tom cético em relação
ao amor:
Os desiludidos do amor
estão desfechando tiros no peito.
Do meu quarto ouço a fuzilaria.
(…)
O poeta não utiliza desiludidos com o amor, e sim, desiludidos
do amor – evidenciando que é próprio do amor desiludir.
Apesar de desiludidos, ainda têm poesia no corpo:
Os médicos estão fazendo a autópsia
dos desiludidos que se mataram.
Que grandes corações eles possuíam.
Vísceras imensas, tripas sentimentais
e um estômago cheio de poesia.
ESTILO DE ÉPOCA
Vísceras, tripas, estômago, aqui, como o interior do ser, o mais
íntimo e profundo.
Modernismo
O livro Brejo das almas é escrito no auge da primeira fase
modernista, quando ainda se tem necessidade de chocar, de
abalar a elite cultural da época.
Entretanto, o livro já não mostra esta característica tão
fortemente como em Alguma poesia, livro anterior.
Apesar de não ter, tão explicitamente, as marcas modernistas,
Brejo das almas não se afasta das tendências da época. Há a
exaltação da pátria e dos valores nacionalistas como vemos em
Hino nacional.
Características:
Defender a reconstrução da cultura brasileira;
Crítica ao nosso passado histórico e as nossas tradições
culturais;
Eliminação definitiva do nosso complexo de colonizados,
apegados a valores estrangeiros.
Caráter anárquico.
INTERTEXTUALIDADE
Em “Grande homem, pequeno soldado”, há uma relação com
uma cantiga de roda:
Bão Balalão
Bão, babalão,
Senhor Capitão,
Espada na cinta,
Ginete na mão.
Chico Buarque também compôs “Ana de Amsterdam”, em clara
ligação com “Desdobramento de Adalgisa”
Sou Ana do dique e das docas
Da compra, da venda, das trocas de pernas
Dos braços, das bocas, do lixo, dos bichos, das fichas
Sou Ana das loucas
Até amanhã
Eu cruzei um oceano
Na esperança de casar
Fiz mil bocas pra Solano
Fui beijada por Gaspar
“Desdobramento de Adalgisa”
Sou Adalgisa de fato,
pensais que sou minha irmã
ou que me espelho no espelho.
Amai-me e não repareis!
Uma Adalgisa traída
presto se vinga da outra.
Visão Crítica
Brejo das Almas não vinha recebendo da crítica especializada a
devida atenção que lhe caberia. Situado entre as duas maiores
obras de Drummond, o livro foi, durante muito tempo relegado a
segundo plano.
Uma leitura atenta, entretanto, revela muito mais da obra do
que se pode imaginar. A crítica moderna, contudo, já demonstra
a importância desta obra como seguimento da poética
drummondiana.
Em 1947, Antonio Houaiss, renomado crítico brasileiro, escreveu
um importante estudo sobre os cincos primeiros livro de
Drummond. Para esse crítico, os poemas posteriores a Brejo das
almas seriam “o desdobramento previsível pelo qual a poesia de
Drummond passaria” (HOUAISS, A. “Drummond”, in:
Drummond mais seis poetas e um problema. Rio: Imago, 1976).
Outro importante crítico, Antonio Candido, escreveria um
singular estudo em 1995: “Inquietudes na poesia de
Drummond” onde ressaltaria a importância de Brejo das Almas,
considerando que nesta obra, Drummond seria um “poeta mais
maduro”.
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