HABILIDADES SOCIOEMOCIONAIS
CONHECIMENTO
PARA A VIDA
Não basta transmitir conteúdos. Há competências não cognitivas
essenciais para o sucesso acadêmico e profissional no século 21 –
capacidade de colaboração, pensamento crítico e criatividade são algumas
delas. E a escola pode ajudar a desenvolvê-las e contribuir para a formação
de indivíduos mais autônomos e atuantes na sociedade
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NEUROEDUCAÇÃO
n
Cristiane Capuchinho
o ano passado, foram divulgados os resultados do Programa Internacional de Avaliação de
Alunos (Pisa), da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O
exame avaliou a capacidade de resolver problemas do dia a dia de 85 mil estudantes de 15 anos
de vários países. Mais que raciocínio ou facilidade linguística, foram consideradas habilidades não
cognitivas, como autonomia, perseverança e capacidade de colaboração. O Brasil ficou em 38o
lugar entre 44 países que participaram.
Aprender melhor matemática, português ou ciências – os esforços pela educação sempre se voltaram para a maior exposição dos alunos a conhecimentos cognitivos. As estratégias são várias: aumentar o número de aulas, criar um currículo básico para todas as escolas, avaliar várias vezes ao ano os
estudantes para descobrir suas deficiências. No entanto, estimular essas habilidades pode não bastar.
Atualmente, um grupo de pesquisadores e gestores educacionais tem defendido a importância do
desenvolvimento de competências socioemocionais (veja quadro na pág. 23) nas escolas.
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HABILIDADES SOCIOEMOCIONAIS
CRIS TORRES/ SECRETARIA ESTADUAL
DE EDUCAÇÃO DO RIO DE JANEIRO
Alunos trabalham em grupo durante aula
de matemática do Colégio Estadual Chico
Anysio. Currículo da instituição traz a
disciplina projeto de vida, que incentiva
discussões sobre o próprio futuro
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Estudos mostram que
jovens que acreditam ser
responsáveis por seu destino, que têm perseverança e boa autoestima obtêm
melhores notas em testes.
Além disso, características
como responsabilidade, organização, comunicação e
capacidade de trabalhar em
grupo, entre outras, ajudam
as pessoas a ter sucesso na
solução de problemas da
vida e no mercado de trabalho. “Há evidência significativa de que as características
socioemocionais do estudante são
tão importantes quanto o conteúdo”, explica Daniel Santos, professor da Faculdade de Economia e
Administração da Universidade de
São Paulo (USP) em Ribeirão Preto, pesquisador das relações entre
desenvolvimento socioemocional
e aprendizagem.
Uma pesquisa com 25 mil estudantes da rede estadual do Rio
de Janeiro, realizada pelo Instituto
Ayrton Senna em 2013, mostrou
que jovens que se descreviam como
perseverantes e objetivos conseguiam melhores resultados em matemática que os que declaravam não
ter essas características. A capacidade de se abrir para o novo e aproNEUROEDUCAÇÃO
Para t rabalhar a Re volução
France sa de forma
integrada, por e xemplo, o
profe ssor de história e xplora
o Iluminismo, enquanto o de
f ilosof ia aborda liberdade e o
de literatura, romantismo
veitar experiências foram os traços
da personalidade (veja quadro na
pág. ao lado) que mais relacionados ao bom desempenho em português. A pesquisa envolveu alunos
do 5º ano do ensino fundamental
e do 1o e 3o anos do ensino médio.
O resultado aponta para a necessidade de um novo olhar sobre
as políticas educacionais: não basta
transmitir conteúdos, é preciso desenvolver competências que ajudem
os estudantes a usar o conhecimento
como ferramenta. “A gente defende
uma educação que integre os conteúdos ensinados na escola com a
vida do aluno. Propõe ensinar a matemática não só como um valor em
si mesmo, mas direcionar esse ensino para o estímulo de competências, para que os alunos a usem em
seu cotidiano e também em sua vida
futura”, explica a psicóloga e educadora Simone André, coordenadora
da área de educação complementar e juventude do Instituto Ayrton
Senna. A escola deve mudar o
modo de ver o professor, ainda considerado unicamente
um detentor de conhecimento válido a ser transmitido. O
novo modelo propõe o educador como um tutor dos estudantes, responsável por ajudá-los a aprender a aprender e,
assim, a construir o conhecimento ao lado dos jovens.
“Não são conteúdos teóricos ensinados por meio da
retórica, da explanação verbal. Não adianta explicar que
ficar nervoso na hora de uma
prova talvez interfira no resultado”, exemplifica a psicopedagoga Anita Abed, consultora
da Unesco sobre habilidades socioemocionais. O objetivo de tornar o
conhecimento útil e prover habilidades aos estudantes não é novo. Já
é aplicado por professores de todo
o país há anos. A diferença é que
agora a preocupação com o desenvolvimento completo do estudante
tem propostas sistêmicas, para que
se torne parte do programa da escola e da rede e não dependa unicamente da iniciativa do educador.
NA PRÁTICA
Para experimentar a proposta
no chão da escola, a rede estadual
do Rio de Janeiro iniciou em 2013
um projeto no Colégio Estadual
Chico Anysio, na zona norte da
Conheça as habilidades socioemocionais
A teoria da personalidade mais aceita atualmente pela psicologia é o modelo dos cinco grandes fatores,
que considera a existência de cinco domínios básicos, ou traços, que agrupam várias características. Com
base em um intenso estudo bibliográfico do modelo e de outras teorias psicológicas e educacionais, o Instituto Ayrton Senna, em parceria com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE),
distinguiu características relacionadas a esses traços e que podem ser estimuladas na formação escolar –
são as chamadas habilidades não cognitivas ou socioemocionais.
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Abertura a
experiências
novas:
abrange características
como interesse por novas
Consciência ou
vivências, curiosidade,
conscienciosidade:
imaginação e prazer
envolve perseverança,
em aprender
percepção da autonomia
ante os acontecimentos e
controle da impulsividade.
Sentimento de
responsabilidade pela
aprendizagem
DOMÍNIOS DA
PERSONALIDADE
Extroversão:
interesse pelo mundo
exterior e pela interação
com pessoas.
Engloba características
como sociabilidade,
entusiasmo e
autoconfiança
Estabilidade
emocional:
características que
demonstram constância
e inteligência na expressão
das reações emocionais,
Cooperatividade:
como autocontrole
capacidade de atuar
e calma
em grupo de forma
cooperativa e colaborativa –
o que demanda aspectos
como tolerância,
empatia e altruísmo
HABILIDADES SOCIOEMOCIONAIS
ESTRATÉGIAS
Relacionadas aos traços da personalidade,
podem ser desenvolvidas na escola
Aula socioemocional: a escola pode ter um
período de aulas em que o aluno pare para refletir
sobre suas características, seu projeto de vida e suas
necessidades
responsabilidade
pensamento crítico
capacidade de resolver problemas
colaboração
comunicação
criatividade
abertura para o novo
autocontrole ou capacidade de gerir emoções
Tecnologia em sala de aula: há diversos jogos de
tabuleiro e interativos criados para o ambiente de
sala de aula que, ao mesmo tempo, desenvolvem
características socioemocionais, como organização e
pensamento crítico
Treinamento de professores: a formação de
educadores deve considerar a importância das
habilidades socioemocionais e incentivar a discussão
de estratégias pedagógicas para desenvolvê-las lado
a lado com o conteúdo das disciplinas
Fontes: Instituto Ayrton Senna, Daniel Santos (Faculdade de Economia e Administração da USP em Ribeirão Preto) e Sandra Garcia (Mindlab)
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HABILIDADES SOCIOEMOCIONAIS
O educador moderno
Ele planeja tarefas que vão além do conteúdo programático, está
atento às características dos estudantes e aberto a interações
A
imagem do professor que entra na sala de aula, enche a lousa de matéria e despeja conteúdos nos ouvidos de seus estudantes está ficando para trás. O século
21 pede um educador mentor, capaz de ensinar estudantes a pensar e a usar conhecimentos adquiridos em sala de aula e no mundo, de ajudá-los a descobrir seus
interesses e talentos e a buscar o aprendizado de forma autônoma.
Essa é uma tendência da educação, de acordo com uma pesquisa de 2014 feita
pela plataforma internacional Wise (World Innovation Summit for Education), que
reúne referências e divulga novas abordagens em educação. O estudo School in 2030
ouviu 600 especialistas dos setores público e privado: 73% dos entrevistados disseram acreditar que, daqui a 15 anos, o professor terá como função orientar os alunos
ao longo de sua trajetória de aprendizagem.
Para ter o papel de mentor, o professor precisa de formação especializada e de
tempo. Em uma tarefa de matemática, pode simultaneamente trabalhar competências como colaboração entre alunos e solução de problemas, mas para isso não basta
explanação verbal. O docente precisa planejar tarefas que vão além do conteúdo programático que pode ser apresentado em uma explicação e tem ainda de estar aberto
à interação dos estudantes e atento a suas características.
“Para que o professor faça a mediação com o objetivo de desenvolver as habilidades socioemocionais em seus alunos, ele precisará desenvolvê-las em si mesmo por
meio de experiências pessoais intensas, significativas e mediadas por profissionais
que possam oferecer modelos de mediação eficientes”, indica a psicopedagoga Anita
Abed. “É um desenvolvimento gradual, processual e constante que poderá instrumentalizá-lo para realizar esse trabalho.”
A criação de projetos, a troca de experiências entre alunos e professores e o ensino por habilidade, não por conteúdo (veja artigo na pág. 28), trazem bons resultados
não apenas no desempenho dos estudantes – os professores também passam a ver
mais significado em sua profissão. “Esse trabalho mostra ao professor um valor que
às vezes ele esquece que tem”, aponta Maria Aparecida Jacomelli, diretora de ensino
da Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro.
Em uma pesquisa realizada pelo Instituto Mindlab com professores de escolas
públicas de 12 estados, 33% afirmaram ter uma relação ruim com seus alunos; 38%
dos docentes não percebem que seu trabalho tem um valor próprio.
É importante lembrar, também, que não bastam formação e tempo de aula. Os
professores precisam de condições para desenvolver esse trabalho, e o contrato
de dedicação exclusiva em uma única unidade escolar é um estímulo importante.
“Quando o professor é aulista, ele não cria vínculo com o projeto pedagógico da escola, não trabalha de maneira integrada com os outros professores. É preciso um investimento nesse professor, que deve ter um salário mais alto”, comenta Simone André.
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NEUROEDUCAÇÃO
capital fluminense, que integra os
conteúdos disciplinares exigidos
pelo Ministério da Educação ao
desenvolvimento de capacidades
socioemocionais.
Nessa escola, os alunos de ensino médio têm aulas em turno
integral, mas com um modelo diferente do ensino comum. As disciplinas são divididas em grupos
de conhecimento, como ciências
exatas, humanas, linguagens e matemática, e há um espaço reservado para o desenvolvimento de
projetos de pesquisa e para que os
estudantes discutam e trabalhem
os próprios projetos de vida.
A divisão das aulas por áreas
de conhecimento é para que os
professores articulem o que está
sendo trabalhado em diferentes
disciplinas e, assim, o estudante
tenha uma visão global do tema.
Para trabalhar os conteúdos relacionados à Revolução Francesa,
por exemplo, o professor de história explora o Iluminismo, enquanto o de filosofia aborda liberdade
e igualdade, e o de literatura trata
do romantismo. “Os professores
têm um encontro na semana para
planejar os conteúdos em grupo
e discutir como podem colaborar
entre si”, explica Maria Aparecida
Jacomelli, diretora de ensino da
Secretaria Estadual de Educação
do Rio de Janeiro.
Na área de pesquisa, os estudantes trabalham em grupos de oito a
dez alunos e escolhem uma questão em que gostariam de intervir.
Simone André cita como exemplo
um grupo de alunos que notaram
que, apesar de faltar dinheiro para
que a merenda pudesse ser melhorada, havia muito desperdício de
comida em sua unidade. A partir
da observação e da problematiza-
ção, fizeram pesquisas e montaram
um projeto para melhorar a gestão
da comida. A iniciativa reduziu o
desperdício e, assim, a merenda
ganhou mais qualidade.
Muitos podem ver o exemplo
como um sucesso pontual de um
grupo de alunos dedicados. No entanto, o resultado não se dá apenas
em uma ou duas propostas bem-sucedidas. Segundo André, esses alunos mostraram ganhos de
aprendizagem 50% a 70% maiores
em comparação aos outros estudantes da rede estadual. “E também se tornam mais responsáveis,
preparados e persistentes na vida.
Desenvolvem a capacidade de ouvir o outro e de se posicionar diante dele”, comenta a psicopedagoga.
tros espaços para discutir. Não é
só sair dali com o diploma de nível médio, mas com olhar crítico.
É prepará-lo para ser um melhor
pai, estudante, funcionário. Fazê-lo aprender que é importante pesquisar e trabalhar solidariamente”,
diz.
A proposta aos poucos ganha
adeptos entre escolas das redes
pública e privada. Em São Paulo,
o Instituto Social para Apoiar, Motivar e Reconhecer Talentos (Ismart), entidade privada que apoia
quase mil jovens de baixa renda e
alto desempenho escolar com bolsas de estudos em colégios particulares de elite, também está focado
em desenvolver competências socioemocionais.
A organização propicia aos jovens matriculados nos ensinos
fundamental e médio rodas de
conversas semanais ou mensais
com pedagogos e psicólogos. Ali,
debatem o cotidiano e os problemas que surgem em sala de aula
e os estimulam a falar sobre o que
esperam de seu futuro. “Trabalhamos com o que precisam a cada
momento. No começo, é necessário ajudá-los a organizar seus
DUPLA ESCOLA
A rede estadual pretende expandir partes dessa experiência
para outras 53 escolas do Rio que
participam do programa Dupla
Escola, de parcerias com instituições privadas. Nessas unidades,
foi adotada a disciplina de projeto
de vida e apostou-se na formação
e colaboração entre professores.
“Esse componente curricular melhora a participação dos
alunos nas outras disciplinas e também a relação entre os profesEnquanto capacidade s
sores e estudantes”, diz
cogniti vas aparentemente
Jacomelli. A diretora
de ensino conta que,
se consolidam até
ao longo de sua expea ju ventude, as
riência, observou que
os alunos não veem
socioemocionais
sentido no estudo, em
continuam maleáveis ao
se preparar por tanto
tempo apenas para
longo da v ida
prestar vestibular ou
fazer o Enem. “Esse
jovem precisa de ou-
NEUROEDUCAÇÃO
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HABILIDADES SOCIOEMOCIONAIS
estudos, trabalhar a perseverança
e estimular a autonomia”, diz Inês
França, coordenadora pedagógica
do Ismart, enumerando aspectos
importantes para a superação de
barreiras sociais.
Em Pernambuco, a rede estadual
apostou em jogos digitais para melhorar
o desempenho das escolas com baixos
resultados no ensino médio
Jogos que ensinam
E
m um dos dias da semana, os alunos têm no calendário aula de jogos. O professor medeia as tarefas
tentando levar os estudantes a encontrar as soluções,
“provocando reflexão”, explica a pedagoga Sandra
Garcia, diretora pedagógica do Mindlab, instituição
privada de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias educacionais de estímulo a competências.
Os jogos servem de condutores para que as crianças sejam confrontadas com discussões que as ajudem em outras áreas da vida. Um deles é o sapinho,
para crianças de 4 e 5 anos. Elas precisam trabalhar
colaborativamente para que o sapo-rei consiga eliminar todos os seus concorrentes. A estratégia depende da movimentação horizontal, vertical ou diagonal.
“Além de terem de trabalhar em grupo, eles aos poucos são apresentados a noções que mais tarde vão ter
de usar nas aulas de matemática”, diz Sandra.
Durante as brincadeiras, os alunos aprendem diversos métodos para a solução de problemas. Apesar
dos nomes engraçadinhos, como detetive, semáforo
ou alpinista, as estratégias são muito semelhantes
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NEUROEDUCAÇÃO
àquelas usadas na ciência ou no mercado de trabalho.
No método semáforo, o estudante deve parar
(vermelho), pensar no problema e planejar a solução
(amarelo) e agir (verde). No detetive, os jovens são
chamados a investigar cautelosamente o problema,
procurando pistas até encontrar a solução. Já no formato alpinista, os estudantes aprendem que, conforme o problema, a melhor forma de resolvê-lo é escalonar as tarefas. “Cada tarefa tem um método mais
apropriado para resolvê-lo. Os métodos são apresentados sempre em um jogo para que a criança experimente seu uso”, diz a pedagoga. A ideia é que, depois
de ver que isso funcionou durante a brincadeira, ele
leve para a vida.
Entre os jogos desenvolvidos há também um que
as crianças devem levar para casa e jogar com os pais.
“Isso é para que a família comece a participar do processo de aprendizagem. Ele ajuda a criar um vínculo
maior com a família”, explica. O kit de jogos e a formação de professores já estão funcionando em mais de
800 escolas privadas e públicas de todo o país.
COMBATER DESIGUALDADES
O estímulo das competências socioemocionais pode ser um valioso
aliado na superação de desigualdades. “É muito mais fácil treinar as
pessoas quando são mais novas. Em
termos de desigualdade, crianças
que tiveram estímulo em casa provavelmente chegam à escola com
mais capacidade de enfrentá-la”,
afirma Santos. “O resultado escolar
reproduz socialmente a desigualdade que já existia e isso vai se refletir,
mais tarde, no salário.”
O Instituto Ayrton Senna desenvolveu um instrumento para avaliar
habilidades socioemocionais, chamado SENNA. Testado em uma amostra piloto de 25 mil estudantes da rede
estadual fluminense, estabeleceu relações entre ambiente familiar, escola e
características socioemocionais dos
jovens. Os resultados sugerem, por
exemplo, que 23% da diferença entre
estudantes com pontuação alta ou
baixa em conscienciosidade, aspecto
referente à tendência a ser responsável e organizado, poderia ser eliminada se os pais do segundo grupo
começassem a incentivá-los a estudar.
Enquanto capacidades cognitivas
aparentemente se consolidam até a
juventude, explica Santos, as habilidades não cognitivas continuam
maleáveis ao longo da vida. “Talvez a
escola consiga trabalhá-las e influenciar a vida dos indivíduos, de forma
a reduzir a desigualdade e a superar
desvantagens competitivas.”
O QUE TEM DE MUDAR
Se não é novidade a importância
de alunos autônomos, responsáveis,
capazes de discutir e construir conhecimento, qual a dificuldade em
aplicar isso no ambiente escolar?
A grande quantidade de conteúdos
programáticos e a falta de tempo
dos professores na escola são alguns
dos problemas apontados pelos pesquisadores.
Quando os professores se veem
obrigados a trabalhar com um grande número de conteúdos em poucas
aulas de no máximo 50 minutos, e
às vezes ainda dão aula em mais de
uma escola, muitos não veem alternativa a não ser preparar material
de aula para estudantes passivos.
“O professor está, no mais das vezes, pressionado por todo o sistema
(coordenação, pais, eles próprios)
a cumprir os conteúdos programáticos presentes nos PCNs, no planejamento pedagógico, na apostila,
enfim, ‘preocupar-se com os conteúdos’”, diz Anita Abed.
Discutir o conteúdo, trabalhar
com projetos de pesquisa e estimular o estudo autônomo em geral
leva mais tempo. A redução do nú-
mero de disciplinas e dos conteúdos
programáticos é discutida há algum
tempo como alternativa de dar mais
liberdade ao professor e melhorar a
qualidade de ensino.
A Base Nacional Comum, um
descritivo dos conteúdos e conhecimentos necessários a cada ano da
educação básica, é uma demanda
antiga de professores, pesquisadores e gestores ao Ministério da
Educação, que agora parece fazer
esforços para atender a ela. Na segunda quinzena de março, o novo
secretário da Educação Básica,
Manuel Palácios, marcou reuniões
com a Secretaria da Educação de
Pernambuco para conhecer o currículo criado para a rede do estado. A
experiência será levada a um grupo
de trabalho para que a base comum
seja elaborada até 2016.
“De pouco adianta termos uma
lista com n matérias se o professor
não consegue ter tempo para trabalhá-las adequadamente. Precisamos
pensar em uma educação que instrumentalize o aluno para fazer o
que quiser na vida, não em uma que
dê conhecimento enciclopédico”,
avalia Simone André. “O professor
pode até levar mais tempo para ensinar de uma maneira participativa,
mas é um ensino mais efetivo, mais
significativo.” ◗
Cristiane Capuchinho é jornalista e
cientista social.
LEITURAS SUGERIDAS
Skills for social progress – The power of social and emotional skills. OECD Skills Studies, OECD Publishing,
março de 2015. DOI:10.1787/9789264226159-en
Socio-emotional development and learning in school. Daniel Santos, Ricardo Primi e outros. The 2014 annual
meeting for the Latin American Meeting of the Econometric Society (LAMES), São Paulo, 2014.
O desenvolvimento das habilidades socioemocionais como caminho para a aprendizagem e o sucesso escolar
de alunos da educação básica. Anita Lilian Zuppo Abed. Ministério da Educação e Cultura – Conselho Nacional
de Educação/Unesco, São Paulo, 2014.
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CONHECIMENTO PARA A VIDA