Artigo Original
Auto-exame: Perfil das Mulheres em Jundiaí
Artigo submetido em 26/1/07; aceito para publicação em 3/9/07
Perfil das Mulheres no Município de Jundiaí quanto ao Hábito do
Auto-Exame das Mamas
Breast Self-Examination by Women in Jundiaí, São Paulo State, Brazil
João Bosco Ramos Borges1, Sirlei Siani Morais2, Telma Guarisi Borges3, Renata Guarisi4, Edna Marina Cappi Maia5, Juliana Carange Paganotti6,
Fernanda Silveira Barros7
Resumo
Objetivo: Estabelecer o perfil das mulheres que freqüentam a saúde pública de Jundiaí, segundo o hábito do autoexame das mamas, e determinar fatores associados. Métodos: Estudo descritivo, exploratório, de corte transversal,
aplicado às mulheres, que utilizaram a saúde pública de Jundiaí. Utilizou-se questionário pré-testado. Análise multivariada
realizada através de regressão logística com seleção de variáveis stepwise controladas pelo fator escolaridade. Resultados:
Com relação ao auto-exame, em um total de 332 mulheres brasileiras com idade superior a 16 anos, 131 (39,82%)
o faziam todos os meses e 198 (60,18%) nunca ou raramente o faziam. A maioria que não tinha o hábito de fazer
auto-exame possuía menos de 35 anos de idade (47%), e a maioria que o fazia todos os meses tinha mais de 50 anos
(43,5%). As mulheres que tinham nível médio/superior e que tiveram doença sexualmente transmissível tiveram mais
chance de fazer auto-exame todos os meses, bem como o fato do médico orientar sempre o auto-exame aumentou em
3,3 vezes a chance de fazê-lo em relação a quem nunca teve essa orientação. Associou-se esse resultado ao hábito de
fazer mamografia, em que mais de 53% das mulheres que examinavam mensalmente as mamas já haviam feito
mamografia, enquanto mais de 56% das mulheres que não tinham o hábito do auto-exame nunca haviam feito esse
exame. Conclusões: O auto-exame é conhecido pelas entrevistadas, embora mais da metade dessas não o realize. O
fator social e a educação médica em saúde foram fundamentais no hábito desse exame, bem como na prática de
mamografia.
Palavras-chave: Mama; Neoplasias da mama; Prevenção & controle; Auto-exame de mama; Diagnóstico precoce
1
Doutor em Tocoginecologia pela Faculdade de Medicina da USP. Professor Titular da Disciplina de Ginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí
Bioestatística do CAISM / Unicamp
3
Doutora em Tocoginecologia pela Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Professora Adjunta de Ginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí
4
Mestre em Tocoginecologia pela Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Professora Colaboradora da Disciplina de Ginecologia da Faculdade
de Medicina de Jundiaí
5
Doutora em Tocoginecologia pela Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Professora Adjunta de Ginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí
6
Médica Residente de Tocoginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí
7
Médica Residente da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
Trabalho desenvolvido pela disciplina de Ginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí
Endereço para correspondência: João Bosco Ramos Borges. Avenida Nove de Julho, 1177 - sala 11 - CEP: 13208010 - Jundiaí (SP), Brasil.
E-mail: [email protected]
2
Revista Brasileira de Cancerologia 2008; 54(2): 113-122
113
Borges JBR et al.
INTRODUÇÃO
O câncer de mama é um dos maiores problemas de
saúde pública em todo o mundo, sendo provavelmente
o mais temido pelas mulheres devido à sua alta
mortalidade e pelas suas repercussões psicológicas e na
qualidade de vida. Em razão disso, essa doença é hoje
de extrema importância para saúde pública no Brasil e
em nível mundial, motivando ampla discussão em torno
de medidas que promovam o seu diagnóstico precoce
e, conseqüentemente, a redução em sua morbiletalidade1,2.
Quando se fala em saúde pública, o alvo é a prevenção
e o diagnóstico das moléstias, particularmente as de alta
mortalidade como o câncer de mama. No entanto sabese que as condições socioeconômicas, a situação
geográfica das populações, aspectos étnicos, diferenças nos
acessos individuais aos serviços de saúde oferecem
impedimento ao diagnóstico precoce das doenças. E, apesar
das décadas de 1980 e 1990 terem sido momento de
crescimento dos testes de rastreamento, o acesso a eles
não foi uniforme nos vários estratos sociais, pois o
rastreamento dos agravos da saúde, em especial na Área
Oncológica, sofre forte influência das condições
socioeconômicas3. Pessoas em condições socioeconômicas
desfavoráveis têm maior dificuldade de acesso ao sistema
de saúde, conseqüentemente, estão expostas ao
diagnóstico tardio de várias doenças, inclusive do
câncer4. É obrigação das políticas de saúde coletiva
suprimir as desigualdades individuais, promover
igualdade no consumo de seus serviços e, assim,
estabelecer eqüidade na saúde das pessoas, independente
de sua estratificação social.
As taxas crescentes de mortalidade no Brasil devemse, em parte, à descoberta tardia do câncer de mama5.
Dados obtidos mediante Registros Hospitalares de
Câncer (RHC) revelaram que, no período de 2000/
2001, metade dos casos diagnosticados no Brasil
encontravam-se localmente avançados ou disseminados6.
No estado de São Paulo, onde se realizou este estudo,
40% dos casos novos de câncer de mama correspondiam
a estadiamentos tardios (III ou IV) 7. Em Jundiaí,
município onde foi desenvolvido este estudo, a realidade
de diagnóstico tardio não é diferente8.
O Documento de Consenso para Controle do Câncer
de Mama5, elaborado em 2004 pelo Ministério da Saúde
do Brasil, afirma que a redução da mortalidade devido
a esta doença, observada em países desenvolvidos, está
associada à sua detecção precoce por meio da utilização
da mamografia e à oferta de tratamento adequado. No
entanto, infelizmente o mesmo documento confirma,
nas mulheres brasileiras, aumentos de incidência e
114 Revista Brasileira de Cancerologia 2008; 54(2): 113-122
mortalidade decorrentes desse tumor atribuídos,
principalmente, ao retardo no diagnóstico e na instituição
de terapêutica oportuna. O diagnóstico precoce do
câncer de mama está fundamentado na avaliação clínica
e no diagnóstico por imagem9. A ação efetiva que se
tem para a população é a prevenção secundária através
de diagnóstico em estágios iniciais da doença já que se
sabe que só será possível reduzir a mortalidade por câncer
com diagnóstico precoce, que identifique o tumor com
o menor tamanho possível e em estádio inicial9. Sabese que o diagnóstico precoce do câncer de mama está
ligado, indubitavelmente, ao acesso à informação para
as mulheres, conscientizando-as sobre a importância da
realização do exame clínico das mamas pelo médico e
do exame de mamografia, e também do auto-exame da
mama (AM)10.
A mamografia identifica lesões não-palpáveis, mas
apresenta alto custo e seus resultados operacionais não
têm sido factíveis para uso em grandes massas
populacionais nos países pobres como os da América
Latina. Assim, além do exame clínico pelos médicos
das mamas das mulheres, a realização do AM alcança
grande importância em países onde os recursos para
saúde pública são menores e o acesso a métodos
diagnósticos apresenta várias barreiras, como é o caso
do Brasil8,10. É fundamental implementar a boa cobertura
mamográfica e insistir na necessidade do exame clínico
das mamas pelos médicos no atendimento primário.
Mas acrescentar o AM seguramente é boa política para
saúde mamária inclusive para um melhor conhecimento
do câncer de mama. Os organismos internacionais de
saúde pública estimulam o princípio da utilização de
métodos mais simples para os de maior complexidade,
e o AM encontrou na literatura médica estudos que
demonstraram sua eficácia11 e a recomendação para sua
utilização no passado12,13. No entanto, o auto-exame das
mamas ainda tem seu lugar no contexto das práticas de
autocuidado com a saúde. No Brasil, as recentes Normas
e Recomendações do Ministério da Saúde para o Controle
do Cancer de Mama recomendam que o Sistema Único
de Saúde (SUS) "desenvolva ações de educação para o
ensinamento da palpação das mamas pela própria mulher
como estratégia dos cuidados com o próprio corpo".
As organizações médicas em mastologia, no Brasil e no
mundo, mantêm o auto-exame mamário incluído em
seus programas para câncer mamário. A Sociedade
Brasileira de Mastologia, no Projeto Diretrizes, inclui
o AM, e a "American Cancer Society" também o
recomenda. Está claro que o exame clínico das mamas
pelos profissionais, que cuidam da saúde da mulher, é
medida efetiva e superior ao AM e preconizada por
estas mesmas normas e sociedades médicas.
Auto-exame: Perfil das Mulheres em Jundiaí
A ausência de programas dirigidos à identificação
de tumores da mama, que na verdade é competência
das autoridades governamentais, acaba por trazer
prejuízos para a paciente. O Ministério da Saúde do
Brasil tem feito avanços nesta área, e ações
governamentais melhoraram a cobertura mamográfica
nos últimos anos 5,6. Importante aqui reiterar que a
discussão é aumentar a realização do AM para divulgar
e estimular o conhecimento das questões mamárias, entre
elas o câncer, mas nunca aqui propor a substituição da
mamografia que é método soberano no rastreamento
do câncer de mama. O rastreamento mamográfico é o
ideal, mas se ele ainda não está implantado de maneira
satisfatória para a cobertura e impacto desejados, além
do exame clínico das mamas pelos médicos, o AM pode
e deve ser utilizado. Estudos realizados na Finlândia14 e
Reino Unido 15 mostraram benefícios do AM, com
redução das taxas de mortalidade. E, em estudo realizado
em mulheres, que nunca haviam praticado o AM,
geralmente os nódulos identificados mediam 3,5cm,
enquanto, dentre as que o praticavam eventualmente,
os nódulos tinham cerca de 2,5cm; e, no caso das que o
faziam mensalmente, foram identificados nódulos com
aproximadamente 2,0cm ou menos. Ainda segundo o
mesmo estudo, a sobrevida em cinco anos entre
mulheres, que praticavam o AM, foi de 75% contra
59% entre as que não o faziam16. É claro que esses
estudos devem ser entendidos naquele momento em que
foram publicados. Hoje, cabe ao AM um papel de
autocuidado da mulher e não mais um método para
detecção precoce de tumores.
Com grau de implantação das ações governamentais
ainda insatisfatório para a prevenção e controle do câncer
de mama, apesar dos avanços das ações governamentais
para estruturação do rastreamento populacional
mamográfico, e com visão muito crítica sobre AM por
parte de profissionais de saúde, a mulher brasileira pode
se beneficiar com o AM. O diagnóstico precoce com
rastreamento, numa população que faz mamografia e
tem exame clínico das mamas por médicos capacitados
e que valoriza a questão mamária, praticando AM, levará
essas mulheres a sofrer menor mutilação, receber
tratamento menos agressivo, além de gerar menor custo
para a saúde pública17.
O AM não é método para diagnóstico precoce, lugar
em que a mamografia é soberana, mas sim atenção
complementar, que desperte a mulher para o
autocuidado, fazendo-a perceber qualquer alteração e,
com isso, procurar o profissional de saúde. Daí ser
necessária a mudança de comportamento do profissional
de saúde, com maior envolvimento e conscientização
de seu importante papel neste contexto.
Estudar a prática de AM em uma população pode
ajudar a entender a importância da questão da mama
para aquela amostra populacional10,18. O Município de
Jundiaí é exemplo dessa situação. Segundo estimativas
do Sistema de Informação Ambulatorial do Sistema Único
de Saúde (SIASUS) em 2006, o Município possuía
aproximadamente 121 mil mulheres acima de 19 anos e
61 mil mulheres acima dos 40 anos. Contudo não há dados
disponíveis sobre a cobertura de mamografia, nem
conhecimento sobre a educação de saúde da população
desse município. Foi com base nessa realidade, que se
resolveu estabelecer o perfil das mulheres, que freqüentam
a rede de saúde pública de Jundiaí, segundo o hábito do
auto-exame das mamas, e assim avaliar as características
sociodemográficas, antecedentes clínicos, características
ginecológicas, comportamento sexual, e os antecedentes
ginecológicos, bem como a que tipo de investigação médica
mamária anterior haviam sido submetidas essas mulheres.
CASUÍSTICA E MÉTODO
Estudo descritivo, exploratório e de corte transversal,
aplicado às mulheres, que utilizam a rede de saúde
pública de Jundiaí. Utilizou-se questionário estruturado,
codificado e pré-testado, baseado na Fundação
Internacional de Saúde e adaptado pelos autores. Foi
aplicado por alunos da Faculdade de Medicina de Jundiaí
(FMJ), após treinamento na fase de pré-teste, entre
março de 2002 e maio de 2003. Compareceram ao
Ambulatório de Especialidades da Faculdade de
Medicina de Jundiaí e Unidades Básicas de Saúde (UBS)
escolhidas aleatoriamente (Vila Maringá, Bairro
Ivoturucaia e Vila Agapeama) 405 mulheres, entre as
quais, foram selecionadas 332 mulheres com idade
superior a 16 anos (esta é a idade mínima para marcação
de consulta na Saúde da Mulher do Município) e
brasileiras. Foram excluídas apenas aquelas que se
recusaram a participar do estudo. O estudo foi aprovado
pela Comissão de Ética em Pesquisa da Faculdade de
Medicina de Jundiaí, sendo lido o termo de
consentimento pela entrevistadora, e assinado pela
entrevistada, caso concordasse com o mesmo. O banco
de dados foi elaborado nas informações coletadas nos
questionários, utilizando-se o programa Microsoft
EXCEL. Os dados foram avaliados através de tabelas
de contingência e pelos testes de qui-quadrado de
Pearson ou exato de Fisher. A análise multivariada foi
realizada por meio de regressão logística com seleção
de variáveis stepwise controladas pelo fator escolaridade.
O nível de significância considerado para a análise
estatística foi de 0,05 e os intervalos com 95% de
confiança.
Revista Brasileira de Cancerologia 2008; 54(2): 113-122
115
Borges JBR et al.
RESULTADOS
praticavam mensalmente tinham nível de escolaridade
intermediário (primeiro grau). Quanto ao índice de
massa corpórea (IMC), 61,6% das mulheres, que
apresentavam IMC menor do que 25, não tinham o
hábito de AM (tabela 1). Não houve diferença estatística
significativa quando essas mulheres foram analisadas
quanto à raça, estado marital ou classe social. Entre as
características clínicas avaliadas, não ser diabética, ter
sido portadora de DST no passado, particularmente
sífilis, apresentaram associação significativa com o
hábito de auto-exame mamário entre essas mulheres
(tabela 1). Observou-se que ter tido mais de uma gestação
A população feminina submetida ao questionário
ficou dividida quanto ao AM entre 131 (39,82%) que o
faziam todos os meses e 198 ( 60,18%) que nunca ou
raramente o faziam (tabela 1). A maior quantidade de
mulheres estudadas, que não tinha o hábito de fazer
AM, possuíam menos de 35 anos de idade (47%), sendo
que, ao contrário, a maioria, que o fazia todos os meses,
tinha mais de 50 anos (43,5%). Também, nunca ou
raramente faziam AM mulheres de escolaridade alta
(66,7%), enquanto 48,9% das mulheres que o
Tabela 1. Características sociodemográficas e antecedentes clínicos, segundo o hábito do auto-exame
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DST: Doença sexualmente transmissível
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Auto-exame: Perfil das Mulheres em Jundiaí
DISCUSSÃO
associou-se positivamente ao hábito de fazer auto-exame
das mamas. Já o status menopausal, o uso de terapia
hormonal e ter feito consulta ginecológica anterior não
se associaram à realização do auto-exame (tabela 2). Do
ponto de vista da influência do atendimento médico
anterior no hábito do AM, observou-se que mais de
65% das mulheres, que faziam o AM mensalmente,
haviam sido orientadas durante a consulta. Esse
resultado também se associa ao hábito de fazer
mamografia, em que mais de 53% das mulheres, que
examinavam mensalmente as mamas, já haviam feito
mamografia, enquanto mais de 56% das mulheres, que
não tinham o hábito de fazer o AM, nunca haviam feito
mamografia, pois seu médico não solicitava esse exame
(tabela 3). Com esses achados iniciais em análise
bivariada (quem faz AM versus quem não faz AM),
aplicou-se a regressão logística multivariada, usando
como variável dependente o hábito do AM, controlada
pela escolaridade (Tabela 4). Observou-se, assim, que
as mulheres, que têm segundo grau/nível superior e que
tiveram DST, possuem mais chance de fazer AM todos
os meses, bem como o fato do médico orientar sempre
o auto-exame aumenta em 3,3 vezes a chance de fazer
AM em relação a quem nunca é orientada. Para quem é
orientada ocasionalmente, há um aumento de 2,8 vezes
na chance de fazer AM (Gráfico 1).
A existência de poucos estudos sobre AM em nosso
meio, somada às discussões sobre benefícios desta
prática no Brasil, sobretudo para as populações carentes
e desinformadas, foram grande estímulo para a realização
do presente estudo. O recente envolvimento dos autores
com a Saúde Pública de Jundiaí, na tentativa de aumentar
a cobertura mamográfica e de citologia oncológica nas
populações SUS dependentes daquele Município, foi
também motivo do interesse nesta pesquisa.
Poucos municípios brasileiros têm mamografia
disponibilizada para rastreamento do câncer de mama,
em um país que há ainda restrições ao acesso à
mamografia. Nesta realidade de saúde pública, pode-se
prescindir do auto-exame mamário? As dúvidas sobre o
valor do AM nos países de primeiro mundo que possuem
programas de rastreamento implantados com sucesso
podem ser transferidas para nossa realidade em saúde
pública de terceiro mundo? Embora existam evidências
de que o AM gera excesso de condutas indevidas e
preocupações exageradas em mulheres de países como
o Canadá, em que o acesso aos serviços médicos está
garantido a todas as mulheres, será que não haveria
benefício, em termos de saúde pública, se o AM fosse
mais preconizado, estimulado e praticado,
Tabela 2. Características ginecológicas, segundo o hábito do auto-exame
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Tabela 3. Investigação médica anterior, segundo o hábito do auto-exame
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principalmente em países como o nosso, no qual o acesso
aos serviços de saúde é precário?
Também, não é possível dissociar o papel dos
responsáveis pela adoção de políticas públicas e dos
profissionais de saúde da responsabilidade de atuar
quanto ao aspecto da educação da população para a
saúde. Cecatti et al.10 mostraram que os centros de saúde
foram as principais fontes de informação para a
realização do AM (56,2%), sendo que a maioria das
mulheres apresentou tanto conhecimento inadequado
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1
(92,6%) quanto prática inadequada (83,2%) para a
realização desse procedimento. Um programa de AM
bem conduzido, com treinamento ideal, boa
reprodutividade pelas mulheres após serem orientadas
pelos agentes de saúde, não teria papel interessante nos
países em desenvolvimento sem programa de
rastreamento mamográfico implantados? No mínimo,
estaria se fazendo educação sanitária e estimulando
cidadania em saúde.
Estudo em Pelotas-RS mostrou o crescimento da
Auto-exame: Perfil das Mulheres em Jundiaí
Tabela 4. Hábito de realizar o auto-exame todos os meses, segundo alguns fatores de exposição - análise multivariada
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83141181
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OR: Odds Ratio
IC: Intervalo de confiança
Gráfico 1. Fatores de exposição para hábito do auto-exame todos
os meses - Odds Ratio - regressão logística multivariada com critério
de seleção de variáveis stepwise
2.80
1.24
6.31
3.28
8.35
1.29
6.41
1.52
27.09
4.65
21.2
1.02
1.42
Fundamental
6.65
0.30
Médio / Superior
DST
Sempre
Às vezes
Fator de Proteção
Fator de Risco
adesão dos pacientes às políticas públicas em saúde,
com mudanças positivas na prática de AM pelas
pacientes, de 1995 para 2005, em que houve aumento
de 50% para 80%, como fruto de campanhas específicas
e consultas com profissionais envolvidos com a atenção
à saúde19. E diferente da mamografia, em que a maior
adesão aumentou com o nível social, o crescimento do
hábito de AM ocorreu mesmo entre as mulheres de
nível socioeconômico baixo.
Jundiaí vive hoje este momento de busca de
mudança, pois os dados municipais até 2005 eram
preocupantes com relação ao câncer mamário 8. E,
apesar de maior disponibilidade de mamografia para o
SUS a partir daquele ano, ainda não ocorreram as
mudanças esperadas no diagnóstico mais precoce da
doença. Neste momento, os médicos e profissionais da
rede pública passam por um programa de educação
continuada, treinamento e qualificação com relação ao
rastreamento do câncer mamário. Além de implementar
a mamografia, busca-se o exame clínico mamário das
mulheres de forma organizada e correta.
Neste estudo, observou-se que quase 40% das
mulheres fazem AM mensal, enquanto pouco mais de
60% não o fazem ou raramente o fazem. Isso está de
acordo com os achados de Freitas et al. que observaram
que 50% das pacientes conheciam o AM e somente
30% das mulheres o praticavam de maneira adequada20.
Também, Monteiro et al. constataram que a maioria
das entrevistadas de seu estudo realizava o AM em
freqüência não preconizada e mais de um terço não o
realizava21. Entre as mulheres participantes da Fase 1
do Estudo Pró-Saúde, a freqüência de realização do AM
foi de 43% das participantes, relatando prática "todo
mês" ou "quase todo mês". A maior prática de AM
neste último estudo talvez sofra o viés de uma amostra
diferenciada, na grande maioria composta de
funcionários da saúde e de bom nível de escolaridade22.
Este estudo atual também mostrou que a maioria das
mulheres, que não praticava o AM mensalmente, tinha
menos de 35 anos de idade (47%). E a maioria que o fazia
tinha mais de 50 anos (43,5%). Estes achados são diferentes
de Monteiro et al.21 que encontraram maior prática de
AM antes dos 40 anos e no qual as mulheres acima de 60
anos não examinavam suas mamas. A educação em saúde
talvez já tenha mudado o comportamento das mulheres de
Jundiaí, já que é sabido que o câncer de mama tem maior
incidência após os 50 anos.
Este estudo também avaliou a relação entre o grau de
escolaridade e o hábito do AM. Constatou-se que as
mulheres com nível escolar: segundo grau e superior têm
mais chance de fazer o exame todos os meses, o que está
de acordo com os achados de Freitas Júnior et al.20
Diferente da literatura, este estudo também não
mostrou correlação estatística significativa entre raça,
estado marital, estado menopausal e hábito de AM. No
entanto vale lembrar que, nos países de terceiro mundo,
o nível de escolaridade aumenta de acordo com o
Revista Brasileira de Cancerologia 2008; 54(2): 113-122
119
Borges JBR et al.
socioeconômico. Nesta situação, talvez, a raça negra
tenha menor escolaridade.
Em mulheres praticantes do AM, também foi avaliada
a relação entre a prevalência das que o realizavam
mensalmente e a classe social, observando-se tendência,
embora estatisticamente não significativa, de redução deste
hábito em direção às classes mais altas. Esse resultado sugere
a hipótese de que, à medida que as mulheres têm acesso à
saúde, com consulta ginecológica e mamografia,
preocupam-se menos com a prática do AM. Esses achados
se repetem em outro estudo brasileiro19.
A dificuldade de acesso ao exame clínico das mamas
pelo médico e aos exames diagnósticos, como a
mamografia, são fatores que, de certa forma, podem estar
estimulando as mulheres de classe social mais baixa a
praticar o AM, já que passa a ser a única forma de cuidado
mamário acessível. Dentre os fatores determinantes da
realização de mamografia e da freqüência à consulta
ginecológica que o solicitaria, a classe social é,
provavelmente, o que exerce maior influência19.
Constatou-se neste estudo que metade das mulheres,
que examinava as mamas mensalmente, tinha o IMC
maior do que 25, enquanto 61,6% das mulheres, que
não praticavam o hábito de AM, apresentavam IMC
menor do que 25. Com melhor consciência sobre câncer
de mama, e sendo a obesidade um dos fatores de risco
para o câncer de mama apontados na literatura, o IMC
aumentado deve motivar maiores prevalências da prática
de AM. Em estudo brasileiro em Pelotas-RS, não houve
correlação entre o IMC e as condutas preventivas com
relação ao câncer de mama19.
Este estudo também mostrou maior prática de hábito
de AM entre as não-diabéticas. Provavelmente, a mesma
mulher, que tem maior cuidado com saúde e mais acesso
à educação de saúde, pratica mais o AM e tem menos
doença, dentre elas a diabetes.
O achado de hábito mais freqüente de AM entre as
mulheres, que apresentaram doenças sexualmente
transmissíveis (DST), foi outro resultado interessante deste
estudo. Tentativa de entender que esse achado seria
associar a maior consciência do corpo em uma mulher
que exercita melhor sua sexualidade, e talvez pratique
mais sexo, tendo maior intimidade com sua anatomia.
Daí conseqüentemente esta mulher estaria mais exposta
às DST, mas também se colocaria mais receptiva à prática
do AM. Paradoxal, no entanto, sendo mais consciente de
seu corpo não ter os cuidados preventivos para DST.
Ao observar a Tabela 4, em análise multivariada,
verifica-se também que as mulheres de melhor nível
educacional (segundo grau/superior) têm maior chance
de praticar mensalmente o AM. Definitivamente, a saída
para a saúde e a melhoria dos índices de morbiletalidade
120 Revista Brasileira de Cancerologia 2008; 54(2): 113-122
passam por avanços em educação para nossas
populações carentes.
Quando se fala da influência do atendimento anterior
médico no hábito de AM, está se falando de resultados em
educação de saúde, práticas preventivas e hábitos saudáveis.
Neste estudo, observou-se que mais de 65% das mulheres,
que faziam o AM mensalmente, haviam sido orientadas
durante a consulta médica. Mais importante ainda foi
verificar que o hábito de AM se associou positivamente ao
hábito de fazer mamografia (no grupo etário, que deveria
fazer este exame), sendo que 53% das mulheres que se
auto-examinavam mensalmente já haviam feito
mamografia. Ao contrário, 56% das mulheres, que não
praticavam o AM, nunca haviam feito aquele exame. E o
mais grave é que não fizeram mamografia pelo fato do
médico não solicitar o exame.
Segundo Caetano & Helene23, o médico não ensina
AM por esquecimento, o que se justifica pelo fato de
que a maioria dos serviços, que realiza atendimento em
saúde da mulher apresenta proposta de implementar AM,
o que, no entanto, não é acompanhada de treinamento
adequado dos profissionais para essa prática24.
Em outro estudo, entre os motivos da não-realização
do AM pelas mulheres, aparecem justificativas como
"não achar necessário" e "falta de interesse",
demonstrando que apenas transmitir a informação não
é suficiente para a mudança de comportamento, já que
a prática do AM depende da decisão da mulher, a partir
da compreensão e interpretação que tem da possibilidade
de prevenir e ser responsável pela sua própria saúde23.
A participação e o envolvimento do profissional de saúde
nesta questão é fundamental.
Segundo este estudo, também foi observado que
além de estimular AM, o médico, que se envolve, seria
também aquele que se preocuparia em pedir
mamografia.
Apesar de não discutido nos resultados deste estudo,
mais de 94% das mulheres se preocupavam com as
questões da mama. Mas apenas pouco mais de 60%
dos médicos se preocupavam com essas questões,
segundo análise dessas mulheres (Tabela 4).
Laganá & Imanische24 afirmam ser o serviço de saúde
e os meios de comunicação em massa os maiores
disseminadores do conhecimento e ensino da prática
do AM. É importante também que a detecção precoce
do câncer de mama, por meio do ensino do auto-exame,
seja de responsabilidade de todos os que assistem
pacientes do sexo feminino, e não apenas daqueles, que
atuam em programas específicos para esse fim25.
A importância do envolvimento do profissional, que
assiste à saúde da mulher, é evidente, no Gráfico 1,
pode-se observar que a chance de praticar AM aumenta
em 3,3 vezes quando o médico orienta sempre o auto-
Auto-exame: Perfil das Mulheres em Jundiaí
exame em relação àquela que nunca é orientada. E,
mesmo para aquela, que é orientada ocasionalmente, a
chance de praticar AM aumenta em 2,8 vezes.
A literatura refere que, pelo fato de 73% dos tumores
serem detectados pela própria mulher, a realização do
auto-exame das mamas pode representar papel na
detecção do tumor nos locais em que não existem
programas de rastreamento1. O AM, por ser um método
simples, de custo mínimo, de rápida execução e,
principalmente, por não necessitar de aparelho ou
aparatos para a sua prática, se apresenta como método
interessante de autocuidado.
O auto-exame também é importante para a difusão
e divulgação de informações a respeito do câncer de
mama, desde os seus fatores de risco até a diminuição
dos temores com relação ao seu tratamento22. Deve-se
lembrar que não se está aqui difundindo AM como meio
de diagnóstico de câncer de mama. Diagnóstico precoce
de câncer de mama se faz com mamografia e exame
clínico das mamas por profissional capacitado.
No Brasil, como país em desenvolvimento, onde os
recursos para a saúde são escassos, não havendo ainda
mamógrafos disponíveis necessários para atender às
necessidades da população feminina, e com uma saúde
pública que tem dificuldade em obter profissionais
treinados nos mais longínquos municípios do país para
realizar o exame clínico das mamas das mulheres, o
AM pode representar importante forma de detecção
menos tardia do câncer de mama, e talvez viável em
momento prévio à implantação dos programas de
rastreamento. Principalmente, como meio de despertar
preocupação com questões da mama.
É necessário, no entanto, salientar que o foco
principal é, além do exame clínico das mamas, por
médicos qualificados responsáveis pela saúde das
mulheres, a implantação dos programas de rastreamento
mamográfico acessíveis às brasileiras, com ampla
cobertura da população, como, nos anos recentes, as
ações governamentais vêm estruturando.
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Abstract
Objective: The objective of this study was to establish a profile of breast self-examination (BSE) by women attending
the public health service in Jundiaí, São Paulo State, Brazil, and to determine associated factors. Methods: This
descriptive, exploratory, cross-sectional study was carried out with women attending the public health service in
Jundiaí. A pre-tested questionnaire was used. Multivariate logistic regression analysis was performed with stepwise
variable selection controlled by level of schooling. Results: 332 Brazilian women over 16 years of age were classified
according to BSE. 131 women (39.82%) performed BSE monthly, and 198 (60.18%) never or rarely performed it.
Most women who did not have the habit of performing BSE were under 35 years of age (47%), and most who
performed it monthly were over 50 (43.5%). High school/college graduates and women with a history of a sexually
transmitted disease were more likely to perform BSE monthly. Women who were routinely oriented by their
physicians to perform BSE were 3.3 times more likely to perform it monthly. More than 53% of women who
performed BSE had already undergone mammography, while more than 56% of women who did not have the habit
of performing BSE had never had a mammogram. Conclusions: The women were familiar with breast selfexamination, but more than half of them did not perform it. Social factors and medical education in health proved
important for both this habit and mammography.
Key words: Breast; Breast neoplasm; Prevention & control; Breast self-examination; Early diagnosis
122 Revista Brasileira de Cancerologia 2008; 54(2): 113-122
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Perfil das Mulheres no Município de Jundiaí quanto ao Hábito do