7º Congresso da Água AVALIAÇÃO DE PESTICIDAS E NITRATOS NA ÁGUA SUBTERRÂNEA DE ECOSSISTEMAS AGRíCOLAS DE 1996 A 2000 Sofia BATISTA *(1); Maria J. CEREJEIRA **(1); Emília SILVA ***(1); Paula VIANA (2); Leonor Serôdio(2) * Engº Agrónomo, Doutoranda; ** Engº Agrónomo, Prof. Auxiliar com Agregação; *** Engº Agrónomo, Mestre; (1) ISA, Tapada da Ajuda, DPPF/SAPI, 1349-017, Lisboa, +351.21.3653222; [email protected]; (2) Engº Químico, IA, Laboratório de Referência do Ambiente, Rua da Murgueira, Zambujal, 2721-865 Alfragide RESUMO Os pesticidas e fertilizantes azotados constituem importantes factores de produção que deverão ser cuidadosamente utilizados, de forma a não afectar a qualidade dos recursos naturais, nomeadamente da água subterrânea, recurso precioso, cuja protecção se afigura prioritária. A detecção destes produtos na água subterrânea de áreas agrícolas de vários países, nomeadamente em Portugal, conduziu à necessidade de intensificação dos estudos de avaliação do seu impacte na qualidade deste recurso natural. Apresenta-se, neste trabalho, uma síntese dos estudos conduzidos, no período 1996-2000, em ecossistemas agrícolas (milho, tomate, batata, hortícolas, arroz, vinha e pomóideas), com vulnerabilidade hidrogeológica, do Ribatejo e Oeste e da Beira Litoral, onde se avaliou a ocorrência de pesticidas e de nitratos na água subterrânea. Refere-se a abordagem integrada adoptada, baseada em estudos de campo, modelação e de laboratório e evidenciam-se os principais resultados obtidos. No total de 241 captações nas quais se procedeu à pesquisa de resíduos de pesticidas, observou-se em 59% a detecção de pelo menos um dos pesticidas e/ou metabolitos em análise, sendo que 19% do total de captações apresentaram níveis, de pelo menos um dos compostos, superiores a 0,1? g/L. Das 25 substâncias activas analisadas, 17 foram detectadas em amostras de água subterrânea. A atrazina, o seu metabolito desetilatrazina e a simazina apresentaram as maiores frequências de detecção em concentrações superiores a 0,1 ? g/L, respectivamente, de 12%, 11% e 6%. No total de 303 captações nas quais se determinou o teor de nitratos, 14% apresentaram concentrações de nitratos no intervalo >50 mg/L-100 mg/L de NO3-, e 18% da totalidade das captações registaram concentrações que ultrapassaram os 100 mg/L de NO3-. Relativamente à ocorrência conjunta de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos e de nitratos na água subterrânea não se verificou uma relação directa entre os níveis máximos doseados de ambos os parâmetros. No entanto, observou-se, em geral, um aumento das frequências de detecção de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos com o aumento da gama de concentrações de nitratos. Os resultados obtidos, e ilustrados neste trabalho, têm contribuído para o esclarecimento do impacte do uso de pesticidas e nitratos na qualidade da água subterrânea de diversos ecossistemas agrícolas. Evidencia-se a necessidade de uma melhor gestão dos factores de produção utilizados na agricultura, em particular dos pesticidas, adubos azotados e água de rega, em particular em áreas agrícolas mais vulneráveis a estas contaminações. PALAVRAS CHAVE: pesticidas, nitratos, água subterrânea, Ribatejo e Oeste, Beira Litoral. 1 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água 1 INTRODUÇÃO A utilização de factores de produção na Agricultura, como os pesticidas e fertilizantes, nomeadamente os adubos azotados, podem conduzir à contaminação das águas e, em particular, das águas subterrâneas com estes produtos, como tem sido evidenciado em vários estudos a nível mundial (BARBASH & RESEK, 1997; FIELDING et al., 1991; FUNARI et al., 1995; KOLPIN et al., 1998; SCHEIDLEDER et al., 1999; SPALDING & EXNER, 1993). Em Portugal foram também desenvolvidos vários estuos que revelaram a exposição da água subterrânea de áreas agrícolas a pesticidas e/ou nitratos (BATISTA, 1996; BATISTA et al., 2000, 2001; 2002; CEREJEIRA, 1993; CEREJEIRA et al., 1995a,b, 2000, 2003; FRANCÉS et al., 2001; LOBO-FERREIRA et al., 1995; MOURA, 1996; PARALTA et al., 2003; SILVA, 1998; SILVA-FERNANDES et al., 1999). No sentido de proteger a qualidade da água e prevenir riscos para a saúde humana, foram implementadas várias Directivas a nível da Comunidade Europeia, como a Directiva 80/778/CEE, de 15 de Julho de 1980, com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva 98/83/CE, de 3 de Novembro de 1998, relativa à qualidade da água destinada ao consumo humano; Directiva 91/676/CEE, de 12 de Dezembro de 1991, relativa à protecção das águas contra a poluição causada por nitratos de origem agrícola; e Directiva 2000/60/CE, de 23 de Outubro de 2000, conhecida por Directiva-Quadro da Água, que inclui uma lista de substâncias prioritárias, que engloba vários pesticidas: alacloro, atrazina, clorfenvinfos, clorpirifos, diurão, endossulfão, isoproturão, lindano, simazina e trifluralina. Por outro lado, no âmbito da Directiva 91/414/CEE, de 15 de Julho de 1991, relativa à colocação de produtos fitofarmacêuticos no mercado, foi estabelecido que não deverá ser concedida autorização às substâncias activas cuja concentração na água subterrânea seja susceptível de exceder o valor de 0,1 ? g/L. De referir que com este valor de 0,1 ? g/L, inicialmente definido no âmbito da Directiva 80/778/CEE, a Comissão Europeia expressou o seu ponto de vista, segundo o qual os pesticidas não devem estar presentes na água para consumo humano. De facto, este valor, que não se baseia em estudos toxicológicos, traduz um princípio de precaução, tendo sido estabelecido com base nos limites de detecção dos métodos analíticos existentes à data da sua primeira referência. A complexidade dos estudos de avaliação da exposição da água a pesticidas, devida ao elevado número de substâncias activas existentes no mercado, às suas exigências analíticas (não existe um método analítico multi-resíduos que possibilite o doseamento de todas as substâncias activas, sendo necessário para algumas subtâncias métodos muito específicos) e aos seus elevados custos analíticos, exige que estes estudos sejam realizados de forma ponderada. Assim, neste trabalho utilizou-se uma abordagem integrada, baseada em estudos de campo, modelação e estudos de laboratório, no sentido de: ? avaliar os pesticidas mais usados em importantes ecossistemas agrícolas, localizados em áreas com vulnerabilidade da água subterrânea a contaminações elevada; ? determinar o potencial de contaminação da água subterrânea dos pesticidas mais usados, através de modelação. Uma vez que os pesticidas apresentam comportamentos ambientais distintos consoante as suas propriedades físico-químicas e de partição ambiental, devem ser seleccionados para análise os pesticidas com maior potencial de lixiviação; ? optimizar métodos multirresíduos de extracção de resíduos de pesticidas de amostras de água e de doseamento dos resíduos por cromatografia gasosa (GC) e cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de massa (GC-MS). Apresenta-se, neste trabalho, uma síntese dos resultados obtidos, no período 1996-2000, relativamente à exposição da água subterrânea de ecossistemas agrícolas de milho, tomate, batata, 2 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água hortícolas, arroz, vinha e pomóideas, do Ribatejo e Oeste e da Beira Litoral, a pesticidas e nitratos. De referir que os resultados foram discutidos de forma mais detalhada por BATISTA (2003). 2 METODOLOGIA 2.1 Selecção das áreas de estudo Na selecção das áreas de estudo foi dada prioridade a zonas onde o risco de contaminação fosse potencialmente mais elevado. Deste modo, seleccionaram-se áreas com elevada vulnerabilidade da água subterrânea do ponto de vista hidrogeológico, com importantes reservas hídricas subterrâneas e com elevada importância agrícola, dando-se prioridade a áreas de culturas regadas onde se aplicam regularmente pesticidas e fertilizantes azotados. Com base em informação obtida por consulta bibliográfica (LOBO-FERREIRA & OLIVEIRA, 1995; INAG, 2001; RIBEIRO, 2001), foi possível identificar áreas com elevadas disponibilidades hídricas subterrâneas e com elevada vulnerabilidade da água subterrânea a contaminações do ponto de vista hidrogeológico na Beira Litoral, Ribatejo, Algarve e, ainda, nalgumas zonas do Alentejo e do Oeste. Considerando, também, a importância agrícola, a representatividade regional/nacional dos ecossistemas agrícolas (INE, 2001a-h) e o uso de pesticidas (ANIPLA, 1995, 1996; SILVA, 1998; PEREIRA et al., 2000), foram seleccionados como prioritários para estudo ecossistemas agrícolas de milho, batata, hortícolas, tomate para indústria, arroz, vinha e pomóideas, no Ribatejo e Oeste e na Beira Litoral. De referir que no período 1996-98 os estudos foram apenas desenvolvidos no Ribatejo e Oeste, tendo sido alargados à região da Beira Litoral em 1999. 2.2 Selecção dos pesticidas a analisar Na selecção dos pesticidas a analisar deu-se prioridade às substâncias activas com elevado potencial de contaminação da água subterrânea, devido ao seu uso nas áreas de estudo e às suas propriedades físico-químicas e de partição ambiental. Procedeu-se à recolha de informação sobre o uso de produtos fitofarmacêuticos (pesticidas de uso agrícola) nas áreas de estudo, junto de empresas comerciais de venda de pesticidas com representatividade nas áreas agrícolas em estudo e, também, directamente junto dos agricultores. No entanto, os dados não foram tão aprofundados e exactos como pretendido. Não foi possível recolher informação quantitativa sobre o consumo de pesticidas em todas as zonas agrícolas em estudo. Esta limitação deveu-se a grandes dificuldades na obtenção das quantidades de venda destes produtos nos postos de venda onde esta é efectuada e na discriminação destes valores para as diferentes culturas. Os produtos fitofarmacêuticos pertencem a variadas famílias químicas (SILVA-FERNANDES, 2002), apresentando, portanto, propriedades físico-químicas e comportamentos ambientais distintos. Para as substâncias activas com elevado uso nas áreas de estudo recolheram-se os dados sobre a massa molar, o ponto de fusão, a solubilidade na água, a pressão de vapor, o coeficiente de partição carbono orgânico-água (Koc), o coeficiente de partição octanol-água (Kow) e a meia vida no solo. A avaliação da afinidade dos produtos fitofarmacêuticos para o compartimento água foi realizada com base no cálculo do nível I do modelo de fugacidade de Mackay, considerando a sua última versão (MACKAY et al., 1997). Para avaliar o potencial de contaminação da água subterrânea recorreu-se quer ao índice GUS (GUSTAFSON, 1989), quer ao índice de lixiviação de BACCI & GAGGI (1993). No Quadro 1 apresentam-se, a título de exemplo, os resultados obtidos com estes modelos para três pesticidas, que evidenciam potencial de distribuição ambiental distinto. 3 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água Quadro 1 - Potencial de contaminação do compartimento água, particularmente da água subterrânea, dos pesticidas atrazina, clorpirifos e clortalonil, avaliado através do cálculo do nível I do modelo de fugacidade de Mackay (MACKAY et al., 1997) e dos índices de lixiviação GUS (GUSTAFSON, 1989) e de BACCI & GAGGI (1993). Pesticida atrazina clorpirifos clortalonil Distribuição ambiental prevista na água (%) 78% 2% (3) 7% (3) GUS (1) 3,56 0,32 1,27 Índice de lixiviação de Bacci & Gaggi (2) 5,53x10-1 1,08x10-2 2,43x10-2 (1) se GUS>2,8 - pesticida lixiviável; se GUS<1,8 - pesticida não lixiviável e se 1,8<GUS<2,8 - pesticida de transição; (2) se índice? 1x10-1 - pesticida lixiviável; se 1x10-2? índice? 9x10-2 - pesticida de transição e se índice? 9x10-3 - pesticida não lixiviável; (3) com base nos resultados do modelo de Mackay, o clorpirifos distribui-se maioritariamente para o solo (95%) e o clortalonil para o ar (87%). Considerando como critérios de selecção quer o potencial de contaminação da água subterrânea dos pesticidas mais usados nas áreas em estudo, em particular dos herbicidas (em geral, com maior potencial de lixiviação), quer a sua inclusão nas listas prioritárias definidas no projecto Europeu SMT4 CT96 2142 (JASKULKÉ et al., 1999) e no âmbito da Directiva Quadro da Água (CE, 2001), bem como a possibilidade destes pesticidas serem analisados através de GC e GC-MS (técnicas disponíveis no Laboratório de Ecotoxicologia da SAPI/DPPF, do ISA), seleccionaram-se para análise os herbicidas alacloro, atrazina, metolacloro, metribuzina, molinato, prometrina e simazina; e os insecticidas dimetoato e lindano. Consideraram-se, ainda, os herbicidas: cianazina, diclobenil, etofumesato, pendimetalina, propazina, terbutilazina, terbutrina e trifluralina; e os insecticidas: clorpirifos, endossulfão e pirimicarbe, que, apesar de não apresentarem elevado uso nas áreas de estudo (para as culturas seleccionadas) e/ou não evidenciarem elevado potencial de contaminação da água subterrânea, foram considerados prioritários no Projecto Europeu referido, pelo que havia todo o interesse na optimização de metodologias analíticas para o seu doseamento. Seleccionaram-se, também, para análise dois metabolitos da atrazina, desetilatrazina (DEA) e desisopropilatrazina (DIA), e o herbicida propanil, muito usado no arroz, e o seu metabolito 3,4-dicloroanilina (3,4-DCA). 2.3 Metodologia analítica 2.3.1 Amostragem e doseamento de pesticidas As amostras de água subterrânea (3x1 L) colhidas nas captações, após bombagem da água (sempre que possível), foram transportadas para o laboratório em condições refrigeradas para se proceder à extracção e análise dos resíduos de pesticidas. Procedeu-se à optimização de técnicas para extracção e doseamento de resíduos de pesticidas em amostras de água, de modo a que abrangessem o maior número de pesticidas possível (métodos multi-resíduos), tendo-se avaliado os métodos (quando aplicável) relativamente às recuperações obtidas, limites de detecção, precisão com base na repetibilidade para cada pesticida em análise, bem como a linearidade do sistema (BATISTA, 2003). O número de substâncias analisadas foi aumentando ao longo do período 1996-2000, à medida que se iam optimizando novos métodos analíticos (Quadro 2). 4 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água Quadro 2 – Pesticidas monitorizados em cada ano de estudo e métodos analíticos utilizados, no período 1996-2000. Pesticidas analisados E: LLE D: GC-NPD (confirmação por GC-MS) 1996-98 LD (? g/L) X 0,006 X 0,002 Método analítico E: SPE com discos SDB D: GC-MS 1999 2000 E: SPME com fibra de 65? m"carbowax"/divinilbenzeno D: GC-MS 2000* LD (? g/L) 0,016 0,006 --0,020 0,030 0,071 0,012 0,015 --0,042 0,054 0,016 0,018 0,011 0,015 0,017 0,014 0,012 0,007 0,021 0,007 0,011 0,007 0,019 0,013 LD (? g/L) alacloro X X 0,009 atrazina X X 0,012 cianazina X 0,006 clorpirifos X 0,005 DEA X X 0,012 DIA X X 0,015 diclobenil X 0,017 3,4-DCA X 0,004 dimetoato X 0,023 ? -endossulfão X 0,014 ? -endosulfão X 0,017 etofumesato X 0,011 lindano X 0,010 metolacloro X 0,008 X X 0,006 metribuzina X 0,008 X X 0,015 molinato X 0,002 pendimetalina X 0,005 pirimicarbe X 0,012 prometrina X X 0,007 propanil X 0,030 propazina X 0,015 simazina X 0,011 X X 0,011 terbutilazina X 0,014 terbutrina X 0,012 trifluralina X 0,005 E - método de extracção; D - método de doseamento; LLE - extracção líquido-líquido; SPE - extracção em fase sólida; SPME - microextracção em fase sólida; GC-NPD - cromatografia gasosa com detector específico de azoto e fósforo; GC-MS - cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de massa. * em 2000 procedeu-se à optimização do método de extracção por SPME e doseamento por GC-MS. DEA -desetilatrazina; DIA - desisopropilatrazina; 3,4-DCA - 3,4-dicloroanilina. 2.3.1 Amostragem e doseamento de nitratos Em cada captação de água subterrânea (furos, poços e nascentes) procedeu-se à colheita de uma amostra de água de 250 mL para doseamento de nitratos. De 1996 a 1998, a concentração do ião nitrato foi determinada, no Laboratório de Análises Ambientais e Controlo da Qualidade (LAACQ) do INETI, por potenciometria com eléctrodo selectivo, de acordo com o procedimento INETI/LAACQ 200.16. Em 1999 e 2000, esta análise foi efectuada na exDGA (actual IA) por autoanalisador de fluxo contínuo segmentado com detecção por absorção 5 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água molecular (SFA – “Segment Flow Analysis”), cujo método se encontra descrito no manual de procedimentos do IA. 3 RESULTADOS 3.1 Pesticidas e metabolitos na água subterrânea No total de 241 captações seleccionadas, cujas amostras foram analisadas, observou-se em 59% a detecção de pelo menos um dos pesticidas e/ou metabolitos em análise, sendo que na Beira Litoral a frequência de detecção, de pelo menos um pesticida e/ou metabolito, foi de 81%, enquanto que no Ribatejo e Oeste o valor observado foi de 52% (Quadro 3). Estes resultados confirmam a elevada vulnerabilidade da água subterrânea a contaminações, nas áreas seleccionadas para estudo. No total de captações analisadas 19% apresentaram níveis, de pelo menos um dos compostos, superiores a 0,1? g/L, valor máximo admissível (VMA) em águas para consumo humano (Decreto-Lei nº243/2001). Na Beira Litoral e no Ribatejo e Oeste observou-se, respectivamente, que em 34% e 15% das captações analisadas a concentração,, de pelo menos um dos pesticidas e/ou metabolitos foi superior a 0,1? g/L (Quadro 3). As maiores frequências de detecção verificadas na Beira Litoral, relativamente ao Ribatejo e Oeste, estão provavelmente relacionadas com características locais e com o facto de, na primeira Região, se ter procedido à amostragem da água a níveis mais superficiais e, portanto, mais vulneráveis a contaminações. Na maioria dos Concelhos estudados foi detectado pelo menos um pesticida e/ou metabolito em captações de água subterrânea, sendo que em vários desses Concelhos, como em Almeirim, Azambuja, Bombarral, Chamusca, Golegã, Montijo, Salvaterra de Magos e Torres Vedras, no Ribatejo e Oeste, e Aveiro, Coimbra, Figueira da Foz, Montemor-o-Velho e Oliveira do Bairro, na Beira Litoral, foram seleccionadas captações para análise que apresentaram níveis de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos superiores a 0,1 ? g/L. Nos Concelhos de Almeirim, Montijo, Salvaterra de Magos (Ribatejo e Oeste) e Montemor-o-Velho (na Beira Litoral) foram, inclusivamente, detectados resíduos daqueles produtos em concentrações superiores a 1,0 ? g/L (Quadro 3). Verificou-se que os níveis mais elevados de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos (>10 ? g/L) se registaram principalmente em captações profundas (?170 m), situadas no Ribatejo e Oeste. Estes valores elevados de resíduos são, possivelmente, devidos a contaminações pontuais (localizadas), nomeadamente decorrentes da contaminação directa das captações por retorno da calda para o interior das mesmas, quando dos tratamentos fitossanitários. No entanto, também foram observadas concentrações desta ordem numa captação com 18 m de profundidade (Figura 1), localizada na Beira Litoral. Pelo contrário, a maioria das captações com níveis de resíduos no intervalo >0,1 ? g/L-1,0 ? g/L têm profundidades inferiores a 47 m (Figura 1), sendo esta exposição da água subterrânea, possivelmente, devida a lixiviação dos pesticidas e/ou metabolitos ao longo da zona vadosa (não saturada). 6 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água Quadro 3 - Ocorrência de pesticidas e/ou metabolitos em captações de água subterrânea (%), em áreas agrícolas do Ribatejo e Oeste e da Beira Litoral, no período 1996-2000. Região/ Concelho Nº Captações analisadas Ribatejo e Oeste Abrantes 6 Almeirim 11 Azambuja 4 Benavente 12 Bombarral 1 Caldas Rainha 1 Cartaxo 5 Chamusca 12 Coruche 2 Golegã 21 Loures 3 Lourinhã 10 Moita 1 Montijo 26 Nazaré 2 Palmela 6 Peniche 2 Salv. Magos 35 Santarém 5 Setúbal 7 Sintra 3 Torres Vedras 4 Total Rib. Oeste 179 Beira Litoral Anadia 5 Aveiro 1 Cantanhede 3 Coimbra 7 Figueira da Foz 3 Ílhavo 4 Mont.-o-Velho 33 Oliveira Bairro 4 Vagos 2 Total Beira Litoral 62 TOTAL 241 <LD – inferior ao limite de detecção % Captações sem detecção de resíduos (<LD) <0,05 33 27 25 42 0 100 40 50 100 19 100 40 100 53 100 83 100 37 60 100 100 75 48 17 37 0 42 0 0 60 17 0 29 0 40 0 27 0 17 0 37 20 0 0 0 26 50 0 50 16 0 0 0 25 0 23 0 20 0 4 0 0 0 2 20 0 0 0 11 0 18 25 0 100 0 0 8 0 29 0 0 0 8 0 0 0 12 0 0 0 25 10 0 18 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 8 0 0 0 12 0 0 0 0 5 20 0 100 0 0 25 21 0 0 19 41 60 0 0 14 33 75 21 25 100 29 27 20 0 0 29 33 0 15 50 0 18 13 0 100 0 57 33 0 28 25 0 26 14 0 0 0 0 0 0 15 0 0 8 5 com níveis máximos de resíduos (? g/L) 0,05-0,1 >0,1-1,0 >1,0 7 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água 80 Nível de resíduos (ug/L) 70 60 50 40 30 20 10 0 0 50 100 150 200 Prof. (m) 250 300 350 1 Nível de resíduos (ug/L) 0,9 0,8 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0 0 50 100 150 200 Prof. (m) 250 300 350 Figura 1 – Relação entre o nível de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos e a profundidade das captações onde foram detectados, no Ribatejo e Oeste e na Beira Litoral, no período 1996-2000. Relativamente às substâncias activas pesquisadas entre 1996 e 2000, a atrazina e a simazina foram as mais frequentemente detectadas, com frequências de detecção, respectivamente, de 53% e 31%. Estas foram, também, as substâncias activas que apresentaram maiores frequências de detecção acima de 0,1 ? g/L: 12% para a atrazina e 6% para a simazina (Quadro 4). A desetilatrazina (DEA) e desisopropilatrazina (DIA), metabolitos da atrazina, pesquisados em 1999 e 2000, foram detectados, respectivamente, em 60% e 52% das 103 captações analisadas. Estes resultados evidenciam a importância de se proceder não só ao estudo dos resíduos de pesticidas, mas também dos seus metabolitos, em particular dos que apresentam um elevado potencial de contaminação das águas subterrâneas. Observou-se uma frequência de detecção de resíduos de DEA em concentrações superiores a 0,1 ? g/L de 11%. No entanto, não foram doseados resíduos de DIA em concentrações superiores a 0,1 ? g/L (Quadro 4). 8 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água Quadro 4 - Pesticidas detectados nas captações de água subterrânea seleccionadas, em áreas agrícolas do Ribatejo e Oeste e da Beira Litoral, no período 1996-2000. Nº Período de análise/ Culturas % Captações Valor máximo Captações Pesticidas e metabolitos com níveis máximos de resíduos doseado (? g/L) analisadas ? 0,1 ? g/L >0,1 ? g/L analisados 1996-2000 alacloro M, H, B, O 241 11 4 74 atrazina M 241 41 12 30 metolacloro M, O 241 8 4 56 metribuzina B, T 241 10 2 1,4 simazina V, F, O 241 25 6 2,4 1999-2000 DEA --103 49 11 0,31 DIA --103 52 0 0,09 prometrina H, B, O 103 4 0 0,07 2000 clorpirifos V, F, M, H, B, T, O 79 1 0 <0,05 3,4-DCA --79 3 2 3,8 dimetoato V, F, H, B, T, O 79 0 4 1,2 ? -endossulão V, F, M, B, T 79 1 5 1,4 ? -endossulão V, F, M, B, T 79 5 1 0,69 lindano V, F, M, H, B, T 79 3 5 1,1 molinato A 79 1 4 16 propazina 79 1 0 0,07 terbutilazina V, F, M 79 1 0 <0,05 DEA -desetilatrazina (metabolito da atrazina); DIA - desisopropilatrazina (metabolito da atrazina); 3,4-DCA - 3,4dicloroanilina (metabolito do propanil). V-vinha; F-fruteiras; M-milho; H-hortícolas; B-batata; T-tomate; A-arroz; O-outras. Outros pesticidas e metabolitos, analisados em 1999 e/ou 2000, foram pontualmente detectados (frequência de detecção ?8%): clorpirifos, 3,4-DCA, dimetoato, ? e ? -endossulfão, lindano, molinato, prometrina, propazina e terbutilazina (Quadro 4). Os herbicidas cianazina, diclobenil, etofumesato, pendimetalina, propanil e trifluralina e o insecticida pirimicarbe não foram detectados nas amostras de água subterrânea. 3.2 Nitratos na água subterrânea Do total de 303 captações, nas quais se determinou o teor de nitratos, 55% apresentaram concentrações superiores a 10 mg/L de NO3-, com valores semelhantes para a Beira Litoral (56%) e para o Ribatejo e Oeste (55%). Do total de captações analisadas 11% apresentaram concentrações de nitratos no intervalo >25 mg/L-50 mg/L de NO3-, correspondendo o valor 50 mg/L de NO3- ao valor máximo admissível (VMA) em águas para consumo humano (Decreto-Lei nº243/2001). Na Beira Litoral e no Ribatejo e Oeste observou-se, respectivamente, que em 5% e 12% das captações analisadas a concentração de nitratos situou-se nessa gama de concentrações. A frequência de detecção de nitratos em concentrações no intervalo >50 mg/L-100 mg/L de NO3- foi de 13-14% no Ribatejo e Oeste e na Beira Litoral e, obviamente, na totalidade das captações. Em 14% das captações do Ribatejo e Oeste, em 35% das captações da Beira Litoral e em 18% da totalidade das captações as concentrações de nitratos doseadas ultrapassaram, mesmo, os 100 mg/L de NO3- (Quadro 5). 9 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água Quadro 5 - Ocorrência de nitratos em captações de água subterrânea (%), em áreas agrícolas do Ribatejo e Oeste e da Beira Litoral, no período 1996-2000. Região/ Concelho Ribatejo e Oeste Abrantes Almeirim Azambuja Benavente Bombarral Caldas Rainha Cartaxo Chamusca Coruche Golegã Loures Lourinhã Moita Montijo Nazaré Palmela Peniche Salv. Magos Santarém Setúbal Sintra Torres Vedras Total Rib. Oeste Beira Litoral Anadia Aveiro Cantanhede Coimbra Figueira da Foz Ílhavo Mont.-o-Velho Oliveira Bairro Vagos Total Beira Litoral TOTAL % Captações com níveis máximos de nitratos (mg/L de NO3-) >10-25 >25-50 >50-100 Nº Captações analisadas ? 10 11 11 10 12 2 1 12 17 2 22 8 13 2 29 3 8 4 35 13 8 8 10 241 18 36 90 92 50 100 75 18 100 18 50 15 50 38 33 50 75 40 62 75 25 70 45 9 0 10 8 0 0 17 12 0 9 0 0 50 31 0 25 0 26 23 13 13 10 15 9 45 0 0 0 0 0 12 0 9 13 31 0 14 0 25 25 11 15 13 0 10 12 27 18 0 0 0 0 8 59 0 23 13 23 0 17 0 0 0 9 0 0 0 0 14 36 0 0 0 50 0 0 0 0 41 25 31 0 0 67 0 0 14 0 0 63 10 14 5 1 3 7 3 4 33 4 2 62 303 60 0 67 57 33 75 36 25 50 44 45 20 0 33 0 0 0 0 0 0 3 12 0 0 0 0 0 0 6 0 50 5 11 0 0 0 14 33 25 15 0 0 13 14 20 100 0 29 33 0 42 75 0 35 18 >100 Na maioria dos Concelhos estudados foram doseadas concentrações superiores a 25 mg/L de NO3-. Em vários desses Concelhos, como Abrantes, Almeirim, Bombarral, Cartaxo, Chamusca, Golegã, Loures, Lourinhã, Montijo, Nazaré, Salvaterra de Magos, Sintra e Torres Vedras, no Ribatejo e Oeste, e Anadia, Aveiro, Coimbra, Figueira da Foz, Ílhavo, Montemor-o-Velho e Oliveira do Bairro, na Beira Litoral, foram seleccionadas captações que apresentaram concentrações superiores a 50 mg/L de NO3. Nos Concelhos de Abrantes, Bombarral, Golegã, Loures, Lourinhã, Nazaré, Salvaterra de Magos, 10 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água Sintra e Torres Vedras, no Ribatejo e Oeste, e Anadia, Aveiro, Coimbra, Figueira da Foz, Montemor-oVelho e Oliveira do Bairro, na Beira Litoral, foram, inclusivamente, doseadas concentrações mais elevadas, superiores a 100 mg/L de NO3- (Quadro 5). Verificou-se que os níveis mais elevados de nitratos (>50 mg/L de NO3-) se registaram, principalmente, em captações com profundidades iguais ou inferiores a 50 m, tendo as concentrações superiores a 200 mg/L de NO3- sido observadas em captações relativamente superficiais (<20 m) (Figura 2), como seria de esperar. 500 450 Nitratos (mg/L) 400 350 300 250 200 150 100 50 0 0 50 100 150 200 250 Prof. (m) 300 350 400 450 Figura 2 – Relação entre o nível de nitratos (mg/L de NO3-) e a profundidade das captações onde foram detectados, no Ribatejo e Oeste e na Beira Litoral, no período 1996-2000. 3.3 Presença conjunta de pesticidas e/ou metabolitos e nitratos na água subterrânea Relativamente à ocorrência conjunta de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos e de nitratos na água subterrânea não se verificou uma relação directa entre os níveis máximos doseados de ambos os parâmetros (Figura 3). As captações que apresentaram níveis máximos de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos no intervalo >0,1 ? g/L-1,0 ? g/L apresentaram, paralelamente, valores máximos de nitratos de 1,3 mg/L457 mg/L de NO3-. As concentrações de pesticidas e/ou metabolitos superiores a 1,0 ? g/L foram detectadas em oito captações com valores de nitratos iguais ou inferiores a 10 mg/L de NO3- e, ainda, em cinco captações com valores de nitratos entre 37 mg/L e 311 mg/L de NO3-/L. 11 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água Nível de resíduos (ug/L) 80 70 60 50 40 30 20 10 0 0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 450 500 Nível de resíduos (ug/L) Nível máximo de nitratos por captação (mg/L) 1 0,9 0,8 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0 0 50 100 150 200 250 300 350 400 Nível máximo de nitratos por captação (mg/L) Figura 3 – Relação entre o nível máximo de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos e o nível máximo de nitratos observados nas captações de água subterrânea analisadas, no Ribatejo e Oeste e na Beira Litoral, no período 1996-2000. No conjunto das duas Regiões, observou-se, em geral, um aumento das frequências de detecção de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos, nomeadamente em concentrações no intervalo >0,1 ? g/L-1,0 ? g/L com o aumento da gama de concentrações de nitratos consideradas. As frequências de detecção de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos para captações com gamas de concentrações de nitratos <10 mg/L, 10 mg/L-25 mg/L, 25 mg/L-50 mg/L, 50 mg/L-100 mg/L, 100 mg/L200 mg/L e >200 mg/L de NO3- foram, respectivamente, de 41%, 45%, 73%, 76%, 84% e 83%. As frequências de detecção de resíduos no intervalo >0,1 ? g/L-1,0 ? g/L para captações com as referidas gamas de concentrações de nitratos foram, respectivamente, de 5%, 3%, 12%, 22%, 34% e 33% (Figura 4). 12 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água 100 Nível máx. de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos (? g/L): 90 % de captações 80 70 <LD 60 <0,05 50 ? 0,05 - ? 0,10 40 > 0,10 - ? 1,0 >1,0 30 20 10 0 0-10 10-25 25-50 50-100 100-200 >200 (N=99) (N=29) (N=26) (N=37) (N=38) (N=12) Figura 4 – Ocorrência de pesticidas e/ou metabolitos na água subterrânea consoante o nível máximo de nitratos observado (mg/L de NO3-) nas captações estudadas, no Ribatejo e Oeste e na Beira Litoral, no período 1996-2000. <LD – inferior ao limite de detecção Os nitratos são frequentemente apontados como um indicador, de baixo custo, da presença dos pesticidas na água subterrânea, em áreas agrícolas. No entanto, em geral, existe uma fraca correlação entre as concentrações de nitratos e as concentações de pesticidas (BARBASH & RESEK, 1997; HALLBERG, 1989; LIBRA et al., 1984). De facto, poucos estudos evidenciaram uma correlação significativa entre as concentrações destes compostos (BARBASH & RESEK, 1997). No estudo desenvolvido por CEREJEIRA (1993), em Portugal, nos Concelhos da Chamusca e Golegã, procedeu-se, também, à comparação entre os níveis doseados para a atrazina e para os nitratos, tendo-se observado uma grande dispersão dos pontos. No entanto, verificou-se uma certa tendência para os valores mais elevados de atrazina corresponderem, também, a valores elevados de nitratos nas amostras de água subterrânea. Todavia, em muitos estudos, nomeadamente naqueles em que não se registaram correlações entre as concentrações dos pesticidas e nitratos, observou-se, frequentemente, que a probabilidade de detectar pesticidas na água subterrânea aumenta com o valor da concentração de nitratos (BARBASH & RESEK, 1997; HALLBERG, 1989), tal como no presente trabalho, em que se verificou um aumento da frequência de detecção dos pesticidas e/ou metabolitos em análise com o aumento da concentração de nitratos na água subterrânea. 4 CONCLUSÕES No total de 241 captações, em que se procedeu à análise de pesticidas e/ou metabolitos, observou-se em 59% a detecção de pelo menos uma das substâncias em análise, valor este relativamente elevado, que confirma a elevada vulnerabilidade da água subterrânea a contaminações, nas áreas seleccionadas para estudo. Todavia, é de referir que apenas 19% do total de captações apresentaram níveis, de pelo menos um dos compostos, superiores a 0,1? g/L, valor máximo admissível (VMA) em águas para consumo humano (Decreto-Lei nº243/2001). Verificou-se que os níveis mais elevados de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos (>10 ? g/L) se registaram principalmente em captações profundas (?170 m), possivelmente, devido a contaminações pontuais (localizadas), nomeadamente decorrentes da contaminação directa das 13 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DOS RECURSOS HÍDRICOS 7º Congresso da Água captações por retorno da calda para o interior das mesmas, quando dos tratamentos fitossanitários. Pelo contrário, a maioria das captações com níveis de resíduos no intervalo >0,1 ? g/L-1,0 ? g/L têm profundidades inferiores a 47 m, sendo esta exposição da água subterrânea, possivelmente, devida a lixiviação dos pesticidas e/ou metabolitos ao longo da zona vadosa (não saturada). Das 25 substâncias activas analisadas, 17 foram detectadas em amostras de água subterrânea. A atrazina, o seu metabolito desetilatrazina e a simazina apresentaram as maiores frequências de detecção em concentrações superiores a 0,1 ? g/L, respectivamente, de 12%, 11% e 6%. No total de 303 captações, nas quais se determinou o teor de nitratos, 14% apresentaram concentrações de nitratos no intervalo >50 mg/L-100 mg/L de NO3-, correspondendo o valor 50 mg/L de NO3- ao valor máximo admissível (VMA) de nitratos em águas para consumo humano (Decreto-Lei nº243/2001). Em 18% da totalidade das captações foram, mesmo, registadas concentrações que ultrapassaram os 100 mg/L de NO3-. Verificou-se que os níveis de nitratos superiores a 50 mg/L de NO3- foram doseados, principalmente, em captações com profundidades iguais ou inferiores a 50 m, e todas as concentrações superiores a 200 mg/L de NO3- foram observadas em captações relativamente superficiais (<20 m). Relativamente à ocorrência conjunta de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos e de nitratos na água subterrânea não se verificou uma relação directa entre os níveis máximos doseados de ambos os parâmetros. No entanto, observou-se, em geral, um aumento das frequências de detecção de resíduos de pesticidas e/ou metabolitos, nomeadamente em concentrações no intervalo >0,1 ? g/L-1,0 ? g/L com o aumento da gama de concentrações de nitratos. Os resultados obtidos, e ilustrados neste trabalho, têm contribuído para o esclarecimento do impacte do uso de pesticidas e nitratos na qualidade da água subterrânea de diversos ecossistemas agrícolas. A presença de vários pesticidas e metabolitos e de nitratos na água subterrânea evidenciam a necessidade de uma melhor gestão dos factores de produção utilizados na agricultura, em particular dos pesticidas e adubos azotados, e das técnicas de rega, em áreas agrícolas vulneráveis a estas contaminações. A protecção de plantas deverá ser realizada segundo a óptica da protecção integrada, recorrendo-se ao uso de pesticidas apenas quando necessário e procedendo-se a uma selecção criteriosa das substâncias activas a usar, nomeadamente no que diz respeito ao seu potencial de contaminação da água subterrânea. De modo a limitar as contaminações pontuais da água subterrânea, é necessário evitar o retorno da calda para o interior das captações e a incorrecta eliminação das embalagens de pesticidas e dos restos de calda. Deverão ser adoptados sistemas de produção integrada. As fertilizações deverão ser realizadas de forma equilibrada e fraccionada, tendo em atenção as necessidades da cultura e as disponibilidades do solo e da água de rega. Deverá, também, ser assegurada uma correcta gestão da rega, executada com oportunidade e adoptando métodos e dotações adequadas, com base nas necessidades de água da cultura, do clima da região e das características do solo, de modo a maximizar a absorção de água e de nutrientes do solo e a reduzir os riscos de lixiviação de agroquímicos para as águas subterrâneas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANIPLA (1995) – Produtos fitofarmacêuticos – um mercado em recuperação. Gazeta das Aldeias, Junho/95: 17. ANIPLA, 1996 – Mercado da protecção das plantas em Portugal e sua evolução. Actas Simpósio Protecção das Plantas, Agricultura e Ambiente, EAN, Oeiras, 9-10 Maio 1996, 55-67. BACCI, E. & GAGGI, C. (1993) – Simple models for ranking pesticide mobility from soils. In: A.M. Del Re, E. Capri, S.P. Evans, P. Natali & M. Trevisan (Ed.) – Proc. IX Symposium on Pesticide Chemistry. Mobility and degradation of xenobiotics. Piacenza, Italy, 12-13 Octuber 1993, p.209-219. BARBASH, J.E. & RESEK, E.A. 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