O MODELO DE AMBIENTES INFORMATIZADOS NAS ESCOLAS Fernanda da Silva Lino (Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC.) O presente artigo pretende discutir sobre o modelo de ambientes informatizados nas escolas públicas, a partir das políticas do Proinfo. Procura-se refletir sobre a inserção das tecnologias digitais na vida cotidiana, em inúmeras dimensões, onde se destaca a importância de se estudar e compreender as mídias. Neste sentido, a partir da política de implementação da informatização das escolas, especialmente no município de Florianópolis, busca-se compreender os possíveis desdobramentos que as tecnologias midiáticas vêm acarretando para o trabalho educativo, problematizando-se as limitações encontradas neste trabalho a partir das concepções do campo da mídia educação. Por fim, propõe-se possibilidades de mudanças no modelo de sala informatizada adotado pelas escolas. Palavras-chave: ambientes informatizados, mídias, educadores, formação. O MODELO DE AMBIENTES INFORMATIZADOS NAS ESCOLAS A sociedade contemporânea vem passando por inúmeras mudanças em todas as suas dimensões, nas relações de trabalho, na vida cotidiana, nas maneiras de nos comunicarmos, como refletimos, aprendemos, percebemos, e interagimos no mundo. Com a expansão das tecnologias digitais e dos meios de comunicação, especialmente com o surgimento da internet, revelam-se alterações profundas no acesso ao saber e no surgimento e da renovação dos conhecimentos (Lévy, 2006). Ao utilizarem as TIC as pessoas modificam os processos de construção de saberes, pois, além de mudar as opiniões e as formas de interagir, a introdução de um novo meio de comunicação e de uma nova tecnologia comunicativa, num determinado momento da história da humanidade, passou a atingir a esfera da interação com o mundo, contribuindo para determinar a transformação da estrutura de percepção da realidade. (Di Felice, 2008, p. 21) Mas, como a Educação vai acompanhar estas transformações na sociedade e na maneira como percebemos o mundo? Muitos pesquisadores acreditam que para que a educação acompanhe as transformações, supere as desigualdades, democratize o conhecimento, tem se tornado fundamental uma re-significação das ações educativas, onde não basta apenas a inserção de recursos tecnológicos. Torna-se necessária uma revisão das políticas educacionais e das concepções de um ensino que fragmentam os saberes e objetivam somente a instrumentalização. Neste processo, de acordo com Silverstone (2002, p. 195), a mídia tem um papel central, pois oferece “recursos simbólicos tanto para a mudança como para a resistência às mudanças”. Portanto, é fundamental compreender os fenômenos das mídias, das tecnologias, o que as pessoas estão fazendo com elas, compreendê-las na nossa vida diária, em toda a sua complexidade e contradições, benefícios e riscos, acesso e exclusão. “Não podemos escapar à mídia”, pois ela permeia muitos aspectos da nossa vida e muitas dimensões da nossa experiência” (Silverstone, 2002, p. 09). Ademais, enquanto educadores, “ainda precisamos entender como a mídia entra em nosso mundo cotidiano, como sua poesia nos toca e nos capacita a compreender, manejar e avançar” (Silverstone, 2002, p. 89). E essa compreensão deve se estender também aos nossos alunos da escola pública, pois mesmo que sejam de famílias com baixa renda, ainda assim suas vidas estão completamente permeadas pelas mídias, principalmente a TV e agora a internet, e não podemos ignorar a influência delas na experiência concreta desses alunos. Podemos buscar para nossa dimensão reflexiva e prática o que a expansão digital trouxe em benefício para o ser humano, para o respeito à diversidade, para a liberdade, para a expressão, para a igualdade e justiça social, para a cultura e arte, e para uma Educação mais ampla e significativa. 1. A IMPLEMENTAÇÃO DAS TIC NAS ESCOLAS PÚBLICAS A inclusão de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), com a inserção de ambientes informatizados e inúmeros recursos em escolas públicas tem passado a fazer parte das políticas educacionais. No Brasil, depois da implementação do Programa Nacional de Informática na Educação (Proinfo) em 1997, que pretendeu introduzir as tecnologias de informática e telemáticas nas escolas da rede pública do país, houve um crescimento no número de laboratórios de informática. O objetivo do Proinfo, conforme Quartiero (2002), é “aproximar a cultura escolar dos avanços que a sociedade vem desfrutando com a utilização das redes técnicas de armazenamento, transformação, produção e transmissão de informações” (p. 71). De acordo com dados do portal do INEP, até 2005, das 207.234 escolas públicas de ensino fundamental e médio do país, 33.226 receberam laboratórios de informática, representando 16,03% do total de escolas. O Proinfo registrou a adesão de 92% dos municípios brasileiros e cerca de dez milhões de alunos da Educação Básica foram beneficiados em 2009 com 26 mil laboratórios de informática. Para isso, o Ministério da Educação investiu R$ 293 milhões1, o que representa 1,16% dos gastos que o Ministério da Educação recebeu do Governo Federal. O município de Florianópolis passou a inserir computadores na Rede Municipal de Ensino (RME), com a efetiva criação de um Núcleo de Tecnologia Educacional (NTE) em 1998, como parte do Proinfo. Hoje o NTE coordena 30 Salas Informatizadas em: 26 escolas básicas (1º a 9º ano), 02 escolas desdobradas (anos iniciais), 01 creche (crianças 1 No ano de 2009 o Ministério da Educação recebeu R$ 40,5 bilhões do Governo Federal. de zero a seis anos) e 01 Núcleo Educação de Jovens e Adultos, com a presença de um profissional responsável em cada uma das Salas Informatizadas (SI), chamado de auxiliar de ensino de tecnologia educacional. Cada sala informatizada é equipada, com recursos do Proinfo, por doze computadores conectados a rede, uma impressora, um scanner, uma televisão, e um DVD. O movimento de expansão e inserção das tecnologias nas vidas das pessoas, em diversos âmbitos, é promovido por forças científicas, políticas e principalmente econômicas. Neste movimento, a escola ocupa um papel central, pois é a responsável pela formação não só humana, científica e ética, mas pela produção da mão de obra destinada ao mercado de trabalho cada vez mais permeado por instrumentos tecnológicos. A educação, no entanto, especialmente na realidade brasileira, tem dificuldades em incorporar as transformações que o sistema impõe, e igualmente para transformá-lo, “muda a sociedade e somente mais tarde muda a educação” (Libâneo, 1997, p. 130). No Brasil, o Programa Nacional de Informática na Educação (Proinfo) merece atenção, pois se destaca em termos de quantidade e abrangência, e atualmente é a principal ação governamental para a implantação da informática nas escolas. O programa é realizado com parceria entre o Ministério da Educação e os governos estaduais e municipais (Quartiero, 2002, p.73). Na pesquisa sobre o Proinfo em Santa Catarina, Quartiero afirma que este programa faz parte das políticas públicas brasileiras de informatização da Educação, em articulação com o movimento mundial, que foi desencadeado, a partir dos anos noventa, por dois fatos: “a rápida expansão da internet, e a política lançada nos Estados Unidos pela administração Bill Clinton/ Al Gore” (p. 55). Mas apesar de ser um dos responsáveis pela inserção dos computadores nas escolas, com a adesão de 92% dos municípios brasileiros, Quartiero ressalta que para além de pensarmos em atingir metas numéricas temos de pensar na utilização que as pessoas podem fazer das informações disponíveis na Internet, o que significam em termos de melhoria da qualidade de vida dessas pessoas. Fora desta discussão estaremos sempre desenvolvendo projetos, usando uma expressão originária dos meios populares, “para inglês ver”. (2002, p. 69) Em relação a este tipo de programa, Muniz Sodré (2002) analisou o Programa TV Escola, lançado em 1996, e o Programa Sociedade da Informação (Soinfo), lançado em 2000. Para o autor, esses programas não tratavam de transformar as condições reais em que se assentam as velhas estruturas educacionais, e sim de trocar as perspectivas sociais de inclusão do maior número possível de sujeitos nacionais na educação formal qualificada e no mercado de trabalho pelos simulacros cibernéticos de “inclusão de todos na rede”. Em outras palavras, nenhum reflexo de desejo coletivo, tão-só adequação a um cenário tecnoburocrático. (p. 104) Conforme Sodré, a política educacional desses programas se orienta por projetos de organizações internacionais, como por exemplo, o Banco Mundial, e “diretrizes mercantilistas”, e não pelos interesses e anseios da sociedade civil (p. 104). A incorporação das tecnologias na escola, fruto da demanda social, é parte da estratégia global de política educacional. Portanto, além de todos os desafios que temos a frente, devemos estar muito atentos ao direito de poder participar da elaboração dessas políticas educacionais, assim como na implementação e aplicação delas, adequando-as ao nosso contexto e exercendo assim nossa cidadania. 2. O TRABALHO COM OS MEIOS EM FLORIANÓPOLIS E A MÍDIA EDUCAÇÃO Em pesquisas realizadas na RME de Florianópolis relacionadas a trabalhos sobre mídias e tecnologias, é possível verificar que as tecnologias e os recursos disponíveis na SI das escolas passam cada vez mais a serem inseridos nos trabalhos educativos por parte dos professores, assim como tem se ampliado as possibilidades pedagógicas dos meios. Entretanto, essas pesquisas também relatam algumas limitações e desafios a serem transpostos. Um primeiro aspecto a ser enfrentado pela Educação, em relação às atividades realizadas nos ambientes informatizados, é a visão instrumental que muitos profissionais de ensino possuem dos recursos midiáticos. De acordo com Mello (2007, p. 120), embora Florianópolis seja um dos municípios com maior índice de inclusão digital no Brasil, o uso pelos adolescentes ainda é essencialmente um meio de comunicação e espaço de lazer. Embora estas dimensões sejam importantes, o pesquisador conclui que estes adolescentes não ultrapassam a barreira do consumo dos conteúdos da mídia. Praticamente não aproveitam as inúmeras possibilidades de produção e divulgação da sua comunidade, da sua cultura, do que gostam e aprendem. Assim como não aproveitam o potencial democrático da Internet, de participação e de reivindicação no espaço público. (p. 120) Na pesquisa sobre Mídia-Educação no contexto escolar: Mapeamento crítico dos trabalhos realizados nas escolas de Ensino Fundamental em Florianópolis, Pereira (2008, p. 100) verificou que as próprias coordenadoras encaram os recursos disponíveis na SI como um complemento da sala de aula. Neste sentido, Pereira conclui que “há pouco trabalho analítico e reflexivo, sendo priorizados o uso e a produção” (p. 221). Observa-se assim a emergência de um trabalho escolar com as tecnologias e mídias voltado para a dimensão não só prática, mas também teórica, reflexiva e crítica, já que não basta somente o acesso à informação aos meios, não basta apenas instrumentalizar, para que se faça a Educação que se almeja, pois “o simples domínio da técnica não possibilita o uso da tecnologia no sentido pleno” (Pretto, 2002, p. 176). O acesso a diversos equipamentos e modernos recursos não é garantia de promoção da aprendizagem e da cidadania, embora as políticas públicas mostrem-se dispostas a equipar as escolas e capacitar os alunos, como tem sido a base da política global pela mídia, “como se ver e ouvir fosse compreender. Como se informação fosse conhecimento. Como se acesso fosse participação” (Silverstone, 2002, p. 211). A pesquisadora Kreuch (2008, p. 07) observa que a participação dos alunos nas produções midiáticas da escola ainda é, na maioria das situações, “tutelada e didatizada”. No entanto, de acordo com Fantin (2008), também não basta garantir somente a participação e a autoria dos alunos apenas no âmbito do uso das tecnologias, sendo necessário uma apropriação da cultura por meio da interação com todos os objetos que alimentam o pensar e o fazer: livros, filmes, programas de televisão, sites da Internet, peças de teatro, apresentações musicais, mostras de dança, exposições, etc. (p. 71) Por isso se torna fundamental um trabalho educativo com os meios e as tecnologias que ampliem o repertório cultural dos alunos, já que estar alfabetizado hoje pressupõe o domínio de outras habilidades que não somente de decodificação do alfabeto, mas “a apropriação de diferentes linguagens da cultura contemporânea” (p. 75). Ainda de acordo com a autora, muitos pesquisadores têm tratado do conceito de alfabetização midiática, media literacy ou multiliteracies (p.72), como Bazalgette, Buckingham, Rivoltella, Hobbs e Livingstone, dada a importância da apropriação destas outras linguagens pelos alunos para a aprendizagem e para uma cidadania plena. Em relação à alfabetização midiática dos educadores, Fantin (2008, p. 75) questiona “em que medida, nós, professores, circulamos por outros tipos de representações da realidade que não acontecem só pela escrita e envolvem as representações visuais, musicais, eletrônicas, digitais e outras que vão além?”. É preciso que os professores reflitam sobre os usos que fazem dos meios e os seus consumos culturais. Neste sentido, a formação de professores para atuar em Mídia-Educação deve incluir tanto a prática, voltada também para a ampliação do nosso repertório cultural, como reflexão teórica sistemática. A alfabetização midiática faz parte dos estudos acerca do campo da Mídia Educação, campo que têm contribuído muito para a reflexão e o trabalho educativo com as mídias. Conforme Fantin (2006, p. 37), a Mídia Educação pode ser compreendida “como práxis educativa com um campo metodológico e de intervenção didática; e como instância de reflexão teórica sobre esta práxis”, constituindo-se um campo de identidade plural. Conforme Rivoltella, citado em Fantin (2006, p. 85), trabalhar com MídiaEducação abrange o trabalho educativo em três dimensões, “com, sobre e através” dos meios. Trabalhar “com” os meios enquanto o uso das ferramentas e dos recursos (contexto metodológico ou tecnológico); trabalhar “sobre” os meios, interpretando, discutindo e avaliando os conteúdos (contexto crítico); e trabalhar “através” dos meios, onde as mídias são utilizadas como forma de expressão e autoria (contexto produtivo). Mas para que um trabalho mídia educativo se realize algumas questões devem ser enfrentadas. Além da superação do uso de tecnologias midiáticas apenas como ferramentas didáticas, existem algumas resistências e limitações de professores e auxiliares de tecnologia em relação aos trabalhos educativos com os meios. Pereira (2008, p. 104), que acompanhou uma reunião de avaliação anual das coordenadoras2 de SI, verificou que há resistência de alguns professores, falta de interesse e de conhecimento em relação ao uso dos recursos tecnológicos. Também há dificuldades técnicas, há demora na resolução dos problemas técnicos e muitas vezes são resolvidos apenas parcialmente, além do acesso à internet ser lento. O pesquisador observou também que falta tempo em comum para planejamento entre coordenadora, professores e equipe pedagógica, mas que as coordenadoras sugerem a realização de oficinas dentro da própria escola, assim como do planejamento integrado (p. 140). Por outro lado, a partir da pesquisa “Os usos dos meios, os consumos culturais e a formação de professores em mídia-educação3”, muitos professores relatam que acham a formação recebida pelo NTE insuficiente, e não se sentem plenamente preparados para realizar projetos na SI ou com outros recursos tecnológicos disponíveis na escola. É importante ressaltar que a maioria desses professores não recebeu formação para este trabalho durante a sua graduação de licenciatura, e a inserção das tecnologias na escola tem sido muito mais intensa nos últimos anos. Além disso, alguns professores ainda não fazem uso de muitas dessas tecnologias na sua vida particular, e não tem tempo disponível para investir em formação paralela. Muitos também expressam sua inquietude com mais esta responsabilidade, pois consideram o trabalho com as mídias como mais uma tarefa diante da quase sempre atribulada função de educador, que tem que cumprir os programas e os currículos. Entre os aspectos que limitam o trabalho educativo com os meios, a questão da formação é uma das que mais se revela entre as inquietações, tanto de professores quanto dos profissionais de SI. No caso de Florianópolis os cursos oferecidos pelo NTE não contemplam todos os professores da Rede, de maneira integral. Com formação insuficiente durante a graduação e a falta de tempo para formações paralelas, os professores se sentem despreparados para esta tarefa, e não encontram nos cursos 2 Coordenadoras eram as professoras que atuavam nas salas informatizadas até 2009. A partir de 2010 os profissionais passaram a serem chamados de auxiliares de ensino de tecnologia educacional. 3 Pesquisa realizada em parceria entre a Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC e a Università Cattolica del Sacro Cuore, UCSC, de Milão/Itália, que realizou um mapeamento dos usos dos meios e dos consumos culturais de professores do Ensino Fundamental de Florianópolis, a fim de levantar subsídios para pensar a formação de professores em mídia-educação. Pesquisa semelhante também está sendo desenvolvida em Milão, para futuro cruzamento e análise dos dados nos diferentes contextos socioculturais. Ver Fantin 2009. tradicionais oferecidos pela Rede Municipal de Educação de Florianópolis uma formação adequada, “que lhes desse segurança e significados educacionais consideráveis para a realização de interlocuções pedagógicas no âmbito da mídia-educação” (Mendes, 2008, p. 160). Algumas formações oferecidas pelo NTE, de acordo com Pereira (2008, p. 100), podem estar muito direcionadas aos programas, e isso pode limitar as atividades na SI, no sentido de que quando o software muda o trabalho que era feito com ele não é adaptado aos novos softwares disponíveis. “Melhor seria realizar formações voltadas às finalidades pedagógicas, utilizando sempre diversas ferramentas, de forma a promover a compreensão do processo e não do uso desta ou daquela ferramenta” (p. 100). Em qualquer processo educativo, envolvendo as tecnologias midiáticas ou não, a ênfase deve estar voltada para a intencionalidade das ações, onde o professor precisa ter claro não necessariamente o meio em si, mas a mediação que deseja fazer. 3. OUTRAS POSSIBILIDADES DE TRABALHO COM OS MEIOS NA ESCOLA Nós, educadores e pesquisadores contemporâneos, que nos vemos diante da complexidade desses grandes desafios, temos o compromisso de procurar a superação e maior significação dos processos de ensino e aprendizagem. Embora as salas informatizadas sejam espaços que concentrem inúmeras possibilidades educativas, com muitos recursos para trabalhos mídia-educativos, torna-se necessário questionar este modelo centralizador das tecnologias, que, como foi verificado, enfatiza a instrumentalização e o uso de computadores. A escola dispõe de vários outros meios de comunicação, e de tecnologias, que muitas vezes ficam em segundo plano diante dos recursos digitais da SI. Consideramos importante situar algumas tendências de outros modelos em alguns países, para nos auxiliar na discussão de diferentes possibilidades de ambiente informatizado. Em Portugal as salas de aula das escolas básicas e do ensino secundário têm um Kit tecnológico que, além de computadores, incluem quadros interativos e videoprojetores. A maioria desses recursos estão centralizados num ambiente, como um laboratório de informática. Na França a informática deixou de ser disciplina, e é empregada como ferramenta tecnológica. As salas de aulas de disciplinas (como Físico-Química, História-Geografia) cada vez mais são equipadas com computadores, interfaces e softwares. Conforme Valente e Almeida (1997), na França o uso do espaço informático em educação articulase em torno de duas tendências: a interligação dos equipamentos em redes de dados (locais e à distância) e o emprego de equipamentos portáteis. “Tal prática tem como objetivo reduzir a necessidade de espaço para os equipamentos, levantando a suposição do fim da “sala de informática" e a reflexão sobre a derrubada das paredes da escola surgindo novos cenários pedagógicos” (p. 08). Nos EUA as tecnologias (computadores) estão presentes tanto na sala de aula, como em laboratórios de informática. Em depoimento, uma professora que atuou no ensino nos Estados Unidos, relatou que existe o laboratório de informática, nos moldes semelhantes dos daqui, com a presença de um professor ou técnico que ensina 'informática'', voltado para a instrumentalização. Mas afirmou que também há um computador em sala de aula, normalmente conectada a internet, disponível para professores e alunos. Para Rivoltella (2007): As escolas provavelmente ganhariam mais se tivessem um computador em cada sala em vez de uma sala de informática com todos os computadores dentro – e 30 ou 40 turmas brigando para usar o espaço. Isso permitiria inserir as tecnologias nas práticas cotidianas. Outros meios e outros modelos de espaços midiatizados, como, por exemplo, distribuir os computadores com rede nas salas de aula, poderia ser mais promissor para um trabalho educativo em contexto de uso. O acesso à rede de internet em cada sala de aula poderia promover processos educativos muito mais democráticos, interdisciplinares e descentralizados de todos os recursos disponíveis. Com a presença de computadores conectados a internet em todas as sala de aula, é possível derrubar a barreira que alguns professores possuem com o trabalho com as mídias, e com a visão da sala informatizada como o único espaço destinado às mídias na escola. Além de familiarizar alunos e professores cotidianamente aos diferentes recursos, promoveria uma articulação muito maior entre os meios, os conteúdos e a construção de conhecimento. Apesar das SI serem o modelo de informatização concebido a partir das políticas do Proinfo, é fundamental garantir a autonomia da escola quanto ao uso e a distribuição dos equipamentos recebidos. Se a alfabetização midiática pressupõe muito mais o que o simples acesso as informações, como colocar todos os recursos tecnológicos que a escola dispõe a serviço da promoção de aprendizagens significativas e da ampliação do repertório cultural de professores e alunos? Por isso a importância de repensarmos o modelo vigente de SI. Verifica-se que o modelo atual de ambientes informatizados pode se mostrar como uma das barreiras para a educação para as mídias. Neste sentido, algumas experiências de ambientes informatizados têm sido discutidos para superar a fragmentação dos meios. Entre eles tem se investido em experiências de distribuição dos equipamentos em salas de aula, ao invés de instalá-los em um único ambiente na escola. Uma escola da rede municipal de Florianópolis tem a proposta de um Kit tecnológico em cada sala, com dois computadores conectados a internet, um aparelho de TV, de DVD, videoteca e biblioteca. O projeto está em fase de implantação, e já foi instalado em duas salas de aula. Também passamos a acompanhar projetos de distribuição de laptops para cada aluno. No início deste ano foram distribuídos laptops educacionais, o “Laptop XO”, em uma escola municipal de Florianópolis. Cada aluno do 1º ao 6º ano recebeu um laptop para utilizar em sala de aula, sendo que o equipamento também poderá ser levado para casa4. Muitas escolas também estão adquirindo lousas digitais. A inserção das tecnologias nas salas de aula, embora venha se mostrado como uma tendência bastante promissora, só alcançará plenamente seus objetivos se estiver aliada a um programa de formação de professores, que esteja presente desde a graduação e no decorrer de toda a prática educativa. As concepções do campo da Mídia Educação pressupõem uma formação que propicie uma visão integrada e crítica dos meios, pois, para Fusari, é necessário reformular as noções que alguns professores possuem a respeito dos recursos tecnológicos, pois para além de “auxílios”, são componentes essenciais das 4 O projeto foi realizado em parceria entre o Ministério da Educação, a Secretaria Municipal de Educação, a Secretaria Municipal de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico Sustentável, FAPESC e Fundação CERTI - Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras. relações comunicacionais educacionais (2004, p. 106). Segundo a pesquisadora, é preciso “tomar consciência e discutir, clarificar, mudar, ampliar nossas concepções, nossos saberes sobre mídias e comunicação na especificidade educacional escolar” (p. 105). Além de uma formação adequada, a perspectiva de inserção de tecnologias nas salas “só funciona se todos os professores estiverem dispostos a trabalhar com o computador no dia-a-dia” (Rivoltella, 2007). Os trabalhos midiáticos na escola não precisam ser reduzidos a um único ambiente centralizado, nem ao uso instrumental dos computadores, nem a elaboração de projetos específicos, com agendamento prévio. O trabalho educativo com as tecnologias, no caso das escolas com salas informatizadas, também não pode depender unicamente das auxiliares de ensino de tecnologia educacional, já que todos os professores devem estar habilitados para atuar com as mídias. De acordo com Rivoltella (2007), se apenas um professor responde pelo conhecimento da tecnologia e da mídia (como ocorre em muitas escolas que têm salas de informática), os outros tendem a se desinteressar pelo assunto. E, para ser eficaz, esse trabalho precisa ser feito em equipe. Para o autor, a mídia deve permear todos os processos de ensino e aprendizagem, como um tema transversal, presente em toda prática educativa. Para tanto, os professores devem construir as competências necessárias para atuar no cenário educativo contemporâneo. 3.1 O Mídia-Educador No contexto atual surge a necessidade dos educadores redimensionarem suas práticas e concepções de ensino, no encontro de uma atuação que garanta a educação cidadã. As concepções da Mídia Educação propõem um novo perfil de professor, o mídiaeducador, ou educomunicador, que seria basicamente um mediador cultural, mediador “entre as culturas e os meios, as culturas das crianças, a sua própria também e entre a cultura da escola e a da tradição cultural” (Rivoltella apud Fantin, 2006, p. 235). Este perfil deveria ser comum a todos os educadores, das mais diferentes áreas. A pesquisadora francesa Jacquinot afirma que o educomunicador é o professor do século XXI, que integra as mídias nas suas práticas pedagógicas, e não necessariamente um professor especializado responsável pela formação das mídias. Com esta perspectiva: Cada professor deve possuir, além de seus saberes e as competências profissionais próprias de sua disciplina, também aquelas relativas às mídias, que deverão ser incorporados ao seu fazer educação. Disso resulta que a mídiaeducação deva ser um patrimônio de cada professor. (FANTIN, 2006, p. 95) Assim, as competências do mídia-educador envolvem mediação cultural e técnica. De acordo com Rivoltella (apud Fantin, 2006, p. 235), as competências do mídia educador englobam competências reflexivas, semióticas, lingüística, sociológica, didáticas e pedagógicas, entre outras. O autor propõe um kit de “ferramentas” do mídiaeducador. Neste kit faz parte: metodologias para leitura de contextos; competências para o planejamento da intervenção formativa; técnicas para a gestão da aula e dos grupos; competências de tutoria e avaliação; conhecimento das linguagens e dos processos dos meios; e metodologias e práticas didáticas (Rivoltella, 2005, p. 6). Não resta dúvidas que o perfil do mídia-educador tem sido cada vez mais emergente no nosso contexto educativo. Para Rivoltella (2005, p. 04), “em uma sociedade da comunicação e da informação, nenhum educador pode prescindir de competências comunicativas”. No entanto, como o professor poderá integrar as mídias no seu fazer pedagógico, no cotidiano de suas práticas educativas, se em muitos dos casos, a maioria dos recursos estão centralizados em um único ambiente na escola? Reconhecemos a importância de um ambiente informatizado, para a realização de projetos específicos com todos os alunos, e de um profissional responsável pela articulação deste ambiente. Mas acreditamos que um trabalho mídia educativo só poderá ser plenamente realizado se as mídias estiverem mais próximas aos professores e aos alunos, na rotina do trabalho educativo. Por isso apoiamos a distribuição de computadores conectados a rede, aparelhos de televisão, projetores, máquinas fotográficas, biblioteca, aparelho de DVD, e outras mídias, em todas as salas de aula. Entretanto, é importante destacar a importância da formação em mídia-educação com caráter crítico, reflexivo, instrumental e produtivo, para que todos os recursos disponíveis, seja na sala informatizada, seja nas salas de aula, não sejam apenas instrumentos. E para não repetir o erro de diversos outros programas de informatização das escolas. De acordo com Juana Sancho (apud Fantin) a introdução das TIC na escola por si só não muda nada, e neste sentido a formação de professores é fundamental, pois “os alunos [futuros professores] saem da universidade, a maioria deles, sem ter questionado a narrativa básica da escola. Então, quando vão à escola é muito difícil, numa estrutura tão rígida, tentar um novo tipo de ensino e aprendizagem que seja minimamente diversificado”. A pesquisadora Sancho (1998) também propõe cinco aspectos a serem considerados na formação de professores: formação crítico-situacional, formação conceitual, formação técnico-pedagógica, formação instrumental, e formação auto-reflexiva. Na formação crítico-situacional, os professores devem receber uma formação ampla e continuada sobre os avanços das TIC, propiciando-lhes conhecimentos que guiem suas decisões curriculares e ofereçam sugestões para a prática educativa (p. 32). A formação conceitual refere-se as novas maneiras de abordar o conhecimento propiciado pelas TIC, e as habilidades cognitivas e sociais que isto supõe. A formação técnico-pedagógica consiste em uma aproximação amplo das possibilidades educativas que as TIC oferecem, contextualizadas as diferentes maneiras de ensinar e aprender. A formação instrumental aborda a familiarização com os computadores e com todos os equipamentos tecnológicos. E por fim, a formação auto-reflexiva é realizada a partir da análise do papel dos alunos e do próprio professor neste novo contexto (p. 33). Estes aspectos apontados para a formação na dimensão da mídia-educação nos auxiliam a pensar nos caminhos da formação dos educadores no contexto contemporâneo, do professor do século XXI, a partir de experiências educativas cada vez mais permeadas por tecnologias midiáticas. Por isso a importância de estarmos abertos para novas possibilidades, e também atentos na elaboração e na implementação das políticas públicas de inserção digital das escolas, evitando assim aspectos exclusivamente instrumentais, onde se apresentam visões reduzidas e parciais dos meios e das tecnologias. 5. REFERÊNCIAS BIANCHI, Paula. Formação em Mídia-Educação (Física): Ações colaborativas na rede municipal de Florianópolis/Santa Catarina. Florianópolis, 2009. Dissertação de Mestrado – Programa de Mestrado em Educação Física – Universidade Federal de Santa Catarina. DI FELICE, Massimo. (Org.) Do público para as redes: a comunicação digital e as novas formas de participação social. São Paulo: Difusão, 2008. FANTIN, Monica. Mídia-Educação: conceitos, experiências e diálogos Brasil-Itália. Florianópolis: Cidade Futura, 2006. -------------. Os cenários culturais e as multiliteracies na escola. Comunicação e Sociedade. Vol. 13. Universidade do Minho, 2008. -------------. 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