Ferro e Ácido Fólico Silvia Cristina Ramos Nutricionista Clínica do Instituto de Metabolismo e Nutrição (IMeN) – Pediatria e Gestação Especialista em Saúde Pública – FSP/USP Especializanda em Nutrição Materno Infantil – UNIFESP/EPM Docente do Curso de Nutrição Senac e Centro Método de Ensino Daniel Magnoni Médico Cardiologista e Nutrólogo Diretor do Instituto de Metabolismo e Nutrição (IMeN) Celso Cukier Médico Cirurgião do Aparelho Digestório e Nutrólogo Diretor do Instituto de Metabolismo e Nutrição (IMeN) 1 Sumário Resumo 3 Ferro 5 Metabolismo do Ferro 5 Funções 5 Metabolismo 6 Formas e Biodisponibilidade 7 Absorção do Ferro 8 Proteínas Reguladoras do Metabolismo do Ferro 9 Fontes Alimentares 11 Recomendações e Necessidades de Ferro 12 Deficiências 13 Suplementação 17 Ácido Fólico 19 Estrutura 20 Funções 21 Absorção e Metabolismo 22 Fontes Alimentares 24 Recomendações e Necessidades 24 Deficiências 25 Deficiência de Ácido Fólico na Gestação 26 Deficiência de Ácido Fólico na Lactação 30 Deficiência de Ácido Fólico e Doença Cardiovascular 31 Suplementação 32 Considerações Finais 32 Referências Bibliográficas 33 2 Resumo Ferro e ácido fólico são micronutrientes indispensáveis ao metabolismo normal. Participam de diferentes reações no organismo e, suas deficiências, podem acarretar prejuízos à saúde muitas vezes irreversíveis. Entre os grupos populacionais mais sujeitos a estas deficiências destacam-se crianças e gestantes. Nestes períodos existe um aumento da velocidade de crescimento e desenvolvimento celular e a necessidade destes nutrientes se eleva. O aumento das necessidades de ferro e ácido fólico foi exaustivamente estudado para garantir suprimento adequado destes nutrientes em diferentes fases da vida. No entanto o que se observa é a dificuldade dos indivíduos em atingir a ingestão dietética recomendada. Em casos onde haja desequilíbrio da ingestão e necessidades se instalam quadros de deficiência. A biodisponiblidade e os estoques corporais de ferro e folato são fundamentais para a manutenção normal da absorção e de níveis plasmáticos adequados. A absorção do ferro é em média de 25% e a do ácido fólico não é exatamente determinada, no entanto os folatos são muito sensíveis ao processo de cocção. Isso implica em uma absorção menor do que o estimado de ingestão. Nestes casos taxas de absorção devem ser calculadas para se ter valores mais aproximados da utilização dos nutrientes. Alimentos fontes de ferro e folatos incluem carnes e vísceras, vegetais de coloração verde escuro, leguminosas e em especial para ácido fólico o levedo de cerveja é a principal fonte alimentar. Deficiências de ferro apresentam em geral sintomas como palidez, anorexia, irritabilidade, redução da capacidade cognitiva, sendo este último de grande importância no grupo infantil. Com relação á deficiências de ácido fólico, muitos estudos indicam defeitos no tubo neural como a principal conseqüência da deficiência. Entretanto é relatada ainda síntese inadequada de nucleotídeos, elevação da homocisteína total no plasma podendo ocasionar baixo peso ao nascer, descolamento prematuro da placenta, prematuridade, anemia megaloblástica entre outros. A suplementação de ferro é preconizada considerando hemoglobina menor que 11g/dl para crianças e gestantes. A suplementação de ácido fólico deve ser realizada de forma preventiva pré-concepção e estendido até a 12a semana de gestação. 3 A suplementação destes nutrientes em períodos de grande necessidade orgânica é a forma de maior eficácia no combate as deficiências. 4 Ferro O ferro é nutriente essencial para o organismo e está envolvido em diversos processos metabólicos vitais, destacando-se o transporte de oxigênio e a produção de energia. Elementos minerais presentes em baixas concentrações nos tecidos denominados de elementos-traço, microelementos ou microminerais, sendo considerados benéficos ao organismo. O ferro é o microelemento mais abundante no organismo humano. (1,2) A carência de ferro, denominada anemia ferropriva tem uma distribuição universal. Estima-se que 25% da população mundial é atingida. Os grupos populacionais mais atingidos são as crianças de 4 a 24 meses de idade, os escolares, as adolescentes do sexo feminino, as gestantes e as nutrizes. (2,3,4) Para que alimentação garanta o fornecimento adequado de ferro é necessário conhecer os fatores que interagem na sua biodisponibilidade. Em situações fisiológicas específicas como a infância e a gestação, as necessidades estão aumentadas, exigindo suplementação do mineral. Metabolismo do Ferro Funções O ferro exerce papel fundamental na homeostase orgânica pois participa de processos celulares vitais como: transporte de oxigênio, produção de energia através do metabolismo oxidativo, crescimento celular atuando na síntese de ácidos nucléicos, síntese de neurotransmissores cerebrais, co-fator em reações enzimáticas e vários outros processo metabólicos. (1,5,6) Os componentes do ferro no organismo podem ser agrupados em duas categorias: Funções enzimáticas ou metabólicas Hemoglobina, mioglobina, citocromos e flavoproteínas Funções de armazenamento e transporte Transferrina, lactoferrina, ferritina hemosiderina 5 e A quantidade de ferro total no corpo humano é aproximadamente 50mg/Kg de peso corporal em homens e 40mg/Kg em mulheres adultas, variando em função da idade e do estado nutricional. Cerca de 67% do ferro corporal está presente na hemoglobina e o restante nas proteínas de estoque e enzimas corporais. (5,7) Metabolismo O ferro é o constituinte necessário da hemoglobina, uma proteína conjugada, composta de quatro grupos heme contendo ferro. Cada um está ligado a quatro cadeias polipeptídicas, que formam a molécula de hemoglobina. O heme é responsável pela cor característica e capacidade transportadora de oxigênio no sangue. (5) Figura 1: Estrutura Química da Hemoglobina (9) O oxigênio combinado à hemoglobina nos capilares sanguíneos forma a oxihemoglobina, que é transportada aos tecidos para a liberação de oxigênio que atua em diferentes processos oxidativos. (5,6,7) A hemoglobina está presente nas hemácias. A proteína que contém ferro heme se combina com o oxigênio nos pulmões e com o dióxido de carbono nos tecidos. A 6 mioglobina, também é uma proteína heme, e serve como reserva de oxigênio no músculo. (5,6,8) A produção oxidativa de ATP (adenosina trifosfato) dentro da mitocôndria envolve muitas enzimas que contém ferro heme e não-heme. O ferro é elemento essencial das citocromo catalases e peroxidades incluindo a enzima mitocondrial alfaglico-fosfato-oxidade. Os citocromos presentes nas células funcionam como cadeia respiratória na transferência de elétrons e no armazenamento de energia através de oxidação e redução alternadas de ferro (Fe2+ ∆ Fe3+). (5,6,10) A deficiência de ferro pode afetar o metabolismo no músculo, independente da anemia, refletindo redução das enzimas citocromos. Formas e Biodisponibilidade O ferro do organismo tem dupla origem: ferro exógeno, ingerido por meio dos alimentos, e ferro endógeno, proveniente da destruição das hemácias, que libera cerca de 27 mg do mineral, que em seguida é reutilizado. (5) O ferro dietético é classificado em duas formas, de acordo com o seu mecanismo de absorção: ferro heme e ferro não-heme. O ferro heme encontra-se na estrutura do anel de protoporfirina das hemoproteínas. Ele é encontrado em alimentos de origem animal sob a forma de hemoglobina ou mioglobina, representando cerca de 40% do ferro do tecido animal. (5,6,7,11) Esta forma tem elevada absorção e não é influenciada pelos fatores que interferem na absorção do não heme, como a ionização e a capacidade de se ligar a outras substâncias. O ferro heme apresenta-se na sua forma iônica Fe2+ (ferroso), é solúvel no meio alcalino da luz intestinal, sendo facilmente absorvido. A absorção do ferro heme é alta: cerca de 15 a 30% no indivíduo normal e 30 a 50% no indivíduo com baixa reserva de ferro. Dado que a absorção do ferro heme é relativamente independente da combinação com os alimentos e está só ligeiramente influenciada pelo estado nutricional do indivíduo, sua contribuição na dieta pode ser estimada medindose quimicamente o conteúdo da dieta, supondo uma absorção de 25%. (2,11) Cerca de 80 a 90% do ferro presente nas dietas ocidentais estão na forma de ferro não heme. O ferro não heme predomina na forma oxidada Fe3+ (férrico), é menos 7 solúvel no organismo. A biodisponibilidade de ferro não heme é menor em relação ao ferro heme, sendo influenciada por fatores dietéticos, além do nível de ferro corpóreo. Alguns fatores que podem afetar a biodisponibilidade de elementos traço incluindo o ferro são: A) Composição Dietética: (tabela 1) qualidade da proteína (animal ou vegetal), balanço de aminoácidos, quantidade de proteína, quantidade do elemento traço, interações de nutrientes, promotores (ácidos ascórbico, ácido cítrico), inibidores (fitato, oxalato, fibras, polifenóis), deficiência de micronutrientes. B) Preparação ou Processamento Alimentar: alimento cru, processo de cocção, fermentação, moagem e outros processos C) Fatores do Indivíduo: idade, sexo, estado fisiológico, estado nutricional, doença, formação étnica, situação econômica. Absorção do Ferro A manutenção dos níveis normais de hemoglobina no sangue requer um suprimento adequado de ferro e, portanto um controle da permuta de ferro entre o organismo e o meio. (8) A primeira etapa da absorção do ferro é representada pela passagem do ferro do lúmen para as células da mucosa. O ferro deve estar disponível no lúmen do duodeno e jejuno para entrar no eritrócito. Na maior parte do ferro presente no duodeno está na forma férrica a qual se precipita apH abaixo de 3,0, se não estiver na forma de quelato. (2) Este ferro é ionizado pelo suco gástrico, reduzindo ao estado ferroso, e quelado com substâncias solubilizantes, tais como ácido ascórbico, açúcares e aminoácidos que contém enxofre. Conforme o quimo passa para o duodeno, adição de secreções duodenais aumenta o pH para 7,0, ponto no qual a maioria dos íons férricos está precipitada a não ser que tenha sido quelado. O íon ferroso é significantemente mais solúvel em (pH 7,0) ficando disponível para absorção. (6,8) As mucinas desempenham papel importante neste mecanismo uma vez que se ligam ao ferro em pH ácido e o mantém em solução de pH neutro. (2,8) Os complexos de ferro são captados pela membrana na borda em escova por um processo mediado por um transportador dependente de energia. Este ferro passa através da célula e entra no fluído extracelular. (2,8,11) 8 Tabela 1 : Interações dietéticas que alteram a biodisponibilidade do ferro. (11) Proteínas Reguladoras do Metabolismo do Ferro A transferência das células da mucosa para o corpo é afetada pelos depósitos de ferro orgânico. A taxa de liberação do ferro da mucosa intestinal é regulada pela saturação de transferrina. Dois íons férricos são ligados a transferrina para o transporte até os tecidos. Teorias indicam que o número de receptores de transferrina se ajusta as necessidades individuais. As deficiências de ferro na dieta são refletidas primariamente na saturação de transferrina circulante. (6) 9 Transferrina: A transferrina é a proteína transportadora do ferro encontrada no plasma e nos líquidos extravasculares sendo constituída, de uma única cadeia polipeptídica. A lactoferrina tem estrutura muito semelhante à da transferrina, sendo secretada no leite e sintetizada pelos granulócitos. Cada sítio fixa um átomo de ferro férrico. A afinidade da transferrina pelo ferro é muita elevada: a um pH de 7,4. Foi determinada a estrutura do receptor da transferrina (figura 2). A concentração do receptor circulante está relacionada com o nível de eritropoese, aumentando também na deficiência de ferro. (8) Figura 2: Representação esquemática do receptor de transferrina humana. (8) A transferrina é normalmente saturada até um terço da sua capacidade total de ligação do ferro. (CTLF). Se o ferro não é necessário, a transferrina permanece saturada e é menos absorvida a partir das células mucosas. Se o ferro for necessário, a transferrina está menos saturada quando alcança as células mucosas intestinais, e mais ferro passa da mucosa para a transferrina. (6) Ferritina: A ferritina garante uma reserva solúvel de ferro no interior das células. Consiste de uma cápsula de apoproteína que engloba um núcleo de ferro. A principal função da ferritina é a de constituir uma reserva intracelular de ferro que 10 poderá ser utilizada na síntese de proteínas e enzimas que contêm ferro. O processo compreende uma ligação inicial a sítios situados no interior de estrias na cápsula protéica seguida do ingresso na cápsula e formação de um núcleo de ferro. Depois que um pequeno núcleo de ferro foi estabelecido, a oxidação pode ocorrer diretamente na superfície desse núcleo. (6,8) Figura 3: As principais vias do metabolismo do ferro no homem. Os números junto à setas indicam mg Fe/dia; o ferro é essencialmente “heme” no tecido muscular e ferritina/hemossiderina nas células hepáticas. (8) Fontes Alimentares A determinação de ferro em alimentos é importante devido à necessidade da estimativa de seu teor para fins nutricionais. As principais fontes de origem animal são 11 as carnes vermelhas e as vísceras, em especial o fígado (8 a 10 mg/100g), e os moluscos bivalves (7,7 a 26 mg/100g). Entre as fontes de origem vegetal, as leguminosas secas (5,5 a 8,5 mg/100g) contêm quantidades elevadas. Os vegetais são a base da dieta da maior parte da população mundial. Esta apresenta baixa biodisponibilidade de ferro, quando comparada com dietas que contêm carne. (2) Vegetais de coloração verde escura (espinafre, agrião, entre outros) apresentam ferro não heme. Entretanto, o que precisa ser evidenciado é a capacidade do organismo em aproveitar este ferro oferecido para exercer as suas mais diversas funções, o que determina a sua biodisponibilidade.(4) Tabela 2: Tipos e fontes de ferro. (1) Tipo de Ferro Ferro não heme Fonte Alimentar Biodisponibilidade Cereais, leguminosas, tubérculos - Variável e hortaliças - Influenciado pelas reservas orgânicas -Influenciado pela dieta Ferro heme Carne bovina, carne suína, aves, - Alta peixes e miúdos - Pouco influenciado pelas reservas orgânicas - Pouco influenciado pela dieta Recomendações e Necessidades de Ferro As necessidades corporais de ferro podem variar em função da idade, sexo, estado fisiológico (gravidez e lactação) e patológico (infecções). Gestantes e crianças, devido à expansão do volume sanguíneo e crescimento dos tecidos, apresentam necessidades maiores de ferro, sendo, portanto mais vulneráveis ao desenvolvimento da deficiência de ferro. (1) O trato intestinal tem um papel muito importante no mecanismo de reciclagem do ferro corporal, pois a absorção pode ser modificada conforme as necessidades do organismo, ou seja, quando as reservas são baixas, ocorre aumento significativo da absorção e, contrariamente, quando altas, sua inibição. Como as necessidades de ferro corporal estão relacionadas às diversas etapas da vida, o grau de absorção intestinal de ferro também está vinculado à faixa etária. Exemplificando, uma criança de 12 meses apresenta absorção quatro vezes maior do que outras de diferentes grupos etários. (2,4,12) 12 Levando em consideração esses aspectos, pode-se entender que as necessidades diárias de ferro são pequenas e variam conforme a fase da vida. Dessa forma, considerando absorção de 10%, a RDI (Recommended Dietary Intake) preconiza ingestão diária de ferro em diferentes fases da vida podem ser consultadas na tabela 3. (7) Tabela 3: Recomendações diárias de ingestão de ferro em diferentes faixas etárias (7) Faixa Etária Ferro mg/dia Crianças 0 - 6 meses 0,27 7 – 12 meses 11 1 – 3 anos 7 4 – 8 anos 10 Homens 9 – 13 anos 8 14 - 18 anos 11 19 – 30 anos 8 31 – 50 anos 8 50 – 70 anos 8 > 70 anos 8 Mulheres 9 – 13 anos 8 14 - 18 anos 15 19 – 30 anos 18 31 – 50 anos 18 50 – 70 anos 8 > 70 anos 8 Gestantes ≤ 18 anos 27 19 – 30 anos 27 31 – 50 anos 27 Lactantes ≤ 18 anos 10 19 – 30 anos 9 31 – 50 anos 9 Deficiências A deficiência de ferro é a deficiência nutricional mais comum em todo o mundo. (1,2,3,4,6) 13 A anemia é definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como a condição na qual o conteúdo de hemoglobina no sangue está abaixo do normal como resultado da carência de um ou mais nutrientes essenciais, seja qual for a causa dessa deficiência. As anemias podem ser causadas por deficiência de vários nutrientes como, por exemplo, ferro, zinco, vitamina B12 e proteínas. Porém a anemia causada por deficiência de ferro, denominada anemia ferropriva, é muito mais comum que as demais (estima-se que 90% das anemias sejam causadas por carência de ferro) e afeta grande parcela da população mundial de praticamente todos os estratos sociais, dos mais privilegiados aos mais carentes, especialmente o grupo materno-infantil: lactentes, préescolares, escolares, gestantes e nutrizes, embora homens adolescentes e adultos e os idosos também possam ser afetados por ela. (1,11,13) Outros grupos considerados de risco incluem adolescentes grávidas. (6) Deve-se estabelecer se essa deficiência é devido à ingestão inadequada de ferro (deficiência de ferro primária), ou devido ao aumento da absorção de ferro exigido por várias condições fisiológicas e/ou patológicas, como por exemplo, parasitismo hemorragias, treinamento físico intenso – (deficiência de ferro secundária). (13) No Brasil, a anemia por deficiência de ferro (anemia ferropriva) é o problema nutricional de maior magnitude, sobretudo em crianças menores de dois anos e gestantes, atingindo cerca de 50% e 35% desses dois grupos populacionais, respectivamente. (11) Foram identificados três estágios na instalação da deficiência de ferro. (4) No primeiro estágio, há diminuição da ferritina sérica, que está diretamente relacionada com as reservas de ferro. No segundo estágio, há um declínio da concentração de ferro sérico e aumento da capacidade de ligação do ferro. Quando há restrição na síntese de hemoglobina, ocorre o terceiro estágio, podendo-se instalar a anemia. Na anemia ferropriva, as hemácias que eram normocíticas e normocrômicas sofrem alterações morfológicas, tornando-se microcíticas e hipocrômicas. (4,14) A definição operacional de anemia, em termos dos níveis de hemoglobina, foi estabelecida pela OMS, adotando o nível de 11,0 g/dl para crianças menores de seis anos e gestantes. Para crianças de 6 a 14 anos e mulheres adultas não grávidas, 12 g/dl e homens adultos, 13 g/dl. (11) 14 Os sinais clínicos de anemia são de difícil reconhecimento, muitas vezes passando despercebidos como palidez, anorexia, apatia, irritabilidade, redução da capacidade de atenção e déficits psicomotores. (11,13) Entre os grupos mais vulneráveis à ocorrência de anemia ferropriva têm-se crianças de 6 a 24 meses, destacando-se o primeiro ano de vida, e em especial o segundo semestre, quando se inicia a alimentação complementar. O déficit de ferro pode levar a alterações da pele e mucosas, gastrintestinais, peso baixo para a idade, redução do trabalho físico e da função imunitária. A anemia também prejudica o desenvolvimento físico, motor, psicológico, comportamental, cognitivo e de linguagem. (1,4,14) Estudo transversal com objetivo de verificar a prevalência de anemia ferropriva nesta faixa etária foi realizado na cidade de Goiânia – Brasil. Foram entrevistadas 120 mães, sendo inclusos no estudo 110 lactentes de 6 a 12 meses de idade, a termo e não gemelares. Os exames realizados foram hemograma completo por contagem eletrônica, ferro sérico, ferritina sérica e proteína C-reativa, os quais foram utilizados na avaliação da etiologia ferropriva nos anêmicos. Crianças com hemoglobina < 11g/dl foram consideradas anêmicas. A prevalência de anemia observada foi de 60,9%. (14) Outro estudo transversal realizado em creches públicas da cidade de Cuiabá com crianças até 3 anos de idade. Com o objetivo de estudar a prevalência de anemia em crianças menores de 36 meses de idade encontrou prevalência de 63 % de anemia e 22,5% em sua forma grave. A anemia mostrou-se associada com idade, déficit ponderal e estatural e com tempo de ingresso na creche. A prevalência de desnutrição (< -2 zscore) foi de 0,8% de acordo com o índice de peso/altura, 5,0% segundo peso/idade, e 10,3% de inadequação na altura/idade. A proporção de crianças anêmicas foi, portanto, 6 vezes maior do que o déficit de altura e 12 vezes maior que o déficit ponderal. A desnutrição, em geral, não se apresentava associada com anemia, mas, tomando-se como ponto de corte valores extremos de déficits antropométricos (< -2 z-score), seja de altura ou de peso para idade, percebe-se associação com anemia. (15) O ferro é um dos nutrientes mais importantes na gestação. A carência é identificada como um dos maiores problemas de saúde pública, atingindo mais de 50% das gestantes de todo o mundo. A anemia ferropriva durante a gestação está relacionada ao maior risco de mortalidade materna, parto prematuro e baixo peso ao nascer. (1,12,16,18) 15 Estima-se que 1040mg de ferro são utilizadas durante a gestação. O ferro é transferido para o feto (∼300mg) e usado na formação da placenta (50 – 75mg), expansão das células vermelhas (∼450mg) e variações sanguíneas durante a gestação (∼200mg). As concentrações de hemoglobina, ferro sérico, porcentagem de saturação da transferrina e transferrina sérica diminuem ao longo da gestação como reflexo da hemodiluição. (18) A determinação da ferritina sérica é mais sensível do que a da hemoglobina para o diagnóstico de anemia ferropriva, refletindo as condições dos depósitos de ferro. A OMS recomenda suplementação de ferro para todas as gestantes no último trimestre de gestação como medida profilática. O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) recomenda como suplementação de rotina (30mg/dia) para todas gestantes a partir da primeira consulta pré-natal. Quando confirmado pelos exames laboratoriais baixo nível de hemoglobina ou hematócrito a dose suplementar de ferro deve ser de 60 a 120mg/dia. Quando os parâmetros laboratoriais voltarem a normalidade dever ser retomada a prescrição de 30mg/dia. (17) No Brasil, há escassez de estudos com amostras representativas em mulheres de 15 a 49 anos. Em centros de saúde de uma área metropolitana do município de São Paulo, encontrou-se prevalência de anemia de 3,6%, 20,9% e 32,1% no primeiro, segundo e terceiro trimestres de gravidez, respectivamente Outro estudo realizado em 1990 encontrou prevalência de anemia de 30,3% entre 710 gestantes na primeira consulta do pré-natal, mas quando analisou apenas o último trimestre da gestação, a prevalência aumentou para 40,4%. Em São Paulo, outros estudos com gestantes encontraram prevalências em torno de 30%. (1) Estudo realizado com adolescentes gestantes atendidas na Rede Básica de Saúde de um Município da Grande São Paulo, foi realizado para avaliar a prevalência de anemia neste grupo e planejar ações de saúde. Por meio de dosagem de ferritina sérica, transferrina sérica, hemoglobina e hematócrito, caracterizaram-se o estado nutricional de ferro de 79 gestantes adolescentes de primeira consulta pré-natal ( ≤ 20 semanas de gestação).Todos os valores hematológicos estudados foram menores entre as gestantes do segundo trimestre gestacional em relação às do primeiro, sendo as diferenças estatisticamente significativas (p<0,05) apenas para hemoglobina. Verificou-se que 16 64,3% e 32,1% possuíam, respectivamente, menos de 500 mg e 300 mg de ferro em suas reservas, sendo que 5,4% apresentavam carência grave do mineral. Segundo critério da Organização Mundial da Saúde 19,0% das gestantes era ferro-deficientes (saturação da transferrina < 16,0 %) e 13,9% eram anêmicas (Hemoglobina < 11 g/dl). (19) A figura 4 demonstra a freqüência acumulada deste estudo no qual que 32,1% das adolescentes tinham reservas de ferro inferiores a 300 mg e 64,3% menos que 500 mg de ferro. Figura 4: Distribuição de freqüências acumuladas do conteúdo de depósito de ferro, calculado a partir da determinação da ferritina sérica. (19) Suplementação A suplementação medicamentosa é bastante eficaz na prevenção e controle da anemia. Nos primeiros dias após o início da terapia com ferro, entre o 7º e o 12º dia, observa-se maior atividade eritropoiética, sendo esta proporcional à concentração inicial da hemoglobina. O primeiro mês de suplementação é fundamental para o sucesso do tratamento, já que o período de maior absorção compreende as primeiras semanas após 17 o início da terapia com ferro. A duração da administração do suplemento deve ser de 4 a 5 meses, pois apesar da normalização da concentração de hemoglobina ocorrer após 2 meses, são necessários mais 2 a 3 meses para reposição das reservas orgânicas de ferro. Considera-se como resposta positiva o aumento de 0,1g/dL na concentração de hemoglobina do quarto dia em diante. (1,4) Os suplementos de ferro contendo sais ferrosos devem ser oferecidos de preferência uma hora antes das refeições, visto que são melhor absorvidos, evitando que substâncias inibidoras (como taninos, fitatos e polifenóis) presentes em alguns alimentos comprometam a absorção do ferro. Também não devem ser administrados junto com leites, chás, outros suplementos vitamínicos ou de minerais e antiácidos. Diversas organizações internacionais sugerem que os programas de suplementação profilática para lactentes e pré-escolares devem ter alta prioridade, principalmente em locais onde a prevalência de anemia é elevada, e quando a maioria dos alimentos consumidos pelas crianças não é fortificado com ferro. Tais recomendações encontram-se na tabela 4. Para a gestante, a suplementação profilática com ferro, apresenta benefícios como: (12,18,20) 1. Aumento na concentração da hemoglobina sérica e na reserva tecidual do mineral durante a gravidez e pós-parto. Um estudo realizado na Tanzânia (onde há a maior incidência de deficiência de ferro) demonstrou que a suplementação com ferro durante a gravidez e a lactação aumenta de forma significativa as reservas teciduais do nutriente. 2. Incremento das reservas de ferro no feto em desenvolvimento e no recémnascido, o que está associado a um melhor desenvolvimento cognitivo durante a infância e na idade escolar. 3. Melhora na relação mãe e filho. Uma mãe que não está cansada interage mais com o filho e isso repercute no melhor desenvolvimento psicomotor e emocional infantil. 18 Tabela 4: Recomendações em relação à suplementação com ferro para crianças menores de 24 meses de idade. Ácido Fólico Dentre os nutrientes essenciais envolvidos na eritropoiese normal destacam-se o ferro, a vitamina B12 e os folatos. 19 A folacina e o folato são descritores genéricos para um grupo de compostos quimicamente e nutricionalmente semelhantes ao ácido fólico. Funcionam como coenzimas no transporte de fragmentos de carbono simples no metabolismo de aminoácidos e na síntese de ácidos nucléicos. (6) O folato se tornou conhecido durante estudos de fatores de crescimento não identificado em bactérias e animais. O termo ácido fólico deriva do latim folium, que significa folha. Nesta mesma década (1940), foi possível isolar, cristalizar e identificar a estrutura desta vitamina, bem como elaborar formas sintéticas para o uso no tratamento de enfermidades carenciais. (6,21,22) Na segunda metade do século XX, foi possível conhecer melhor esta vitamina, sua importância na dieta e seu potencial na prevenção de enfermidades como o câncer, doenças cardiovasculares e defeitos congênitos. (23) Estrutura Os folatos constituem um grupo de compostos heterocíclicos nos quais o ácido pteroico está conjugado com um ou diversos resíduos de ácido Lglutâmico. Em geral, os termos folatos e ácido fólico são considerados como sinônimos. Outros utilizam os folatos para designar os poliglutamatos que são as formas desta vitamina naturalmente presentes na alimentação e reservam o termo ácido fólico para o monoglutamato sintético, o ácido pteroilglutâmico. O tetra-hidrofolato (THF) é o composto presente em todas as formas biologicamente ativas dos folatos, com diferentes substituições nas posições 5 e 10 do núcleo pteridina. (figura 1) (23,24) Figura 5: Estrutura do Ácido Fólico (24) 20 Funções O ácido fólico é uma vitamina hidrossolúvel sendo pouco armazenada no organismo. É essencial para as reações metabólicas específicas no meio celular e vital para o funcionamento e crescimento normal do organismo. (25) Folato é cofator essencial em muitas reações do metabolismo intermediário, como: transferência de unidades de carbono, síntese de nucleotídios, interconversão de aminoácidos (metionina-homocisteína), requerendo cobalamina de forma a prover Sadenosilmetionina para a metilação do DNA, RNA e proteínas, essencial para períodos de rápida proliferação celular, como a gestação, por conta do crescimento e desenvolvimento fetal, além da intensa atividade hematopoiética. (22) O ácido fólico atua na formação de produtos intermediários do metabolismo e está envolvido na formação celular. (5) O ácido tetrahidrofólico funciona como carreador para os grupos formil, metil ou hidroximetil de carbono simples. Desempenha papel importante na síntese de purinas (guanina e adenina) e da piramidina (timina), compostos utilizados na formação do ácido desoxirribonucléico (DNA) e ácido ribonucléico (RNA) das nucleoproteínas, as quais são essenciais para a divisão celular. O grupo metila do 5-metil-THF que é utilizado pela metionina sintase, uma enzima dependente da vitamina B12 para metilar a homocisteína em metionina. Os distúrbios da remetilação da homocisteínaem metionina produzem aumento da taxa de homocisteína.A homocisteinemia ou a falta de metionina podem causar distúrbios no desenvolvimento fetal. Além disso, a perturbação desse ciclo de metilação resulta na incapacidade da célula em metilar outros compostos importantes como proteínas, lípides e DNA. (6,21,22,23) Durante períodos de inadequada ingestão ou absorção de folato, ocorrem modificações bioquímicas decorrentes deste estado e anormalidades na transferência de unidades de carbono no metabolismo. Estas anormalidades (hiperhomocisteínemia e hipometilação do DNA) podem resultar em conseqüências deletérias incluindo aumento de doenças crônicas. (25) A conversão da nicotinamida em N-metilnicotinamida adicionando-se um grupo metil simples, e a oxidação da fenilalanina em tirosina necessita de folato. O folato é 21 essencial para a formação das hemácias e leucócitos na medula óssea e para maturação do heme.(6) Figura 6: Interação entre as vitaminas do complexo B, folato e homocisteína. (21) Absorção e Metabolismo A absorção do folato alimentar em concentrações fisiológicas no homem é feita principalmente no primeiro terço do intestino delgado, por processo ativo saturável dependente de pH (no máximo 6,3) e de sódio, apesar de ocorrer também em toda a extensão do mesmo. Nesta absorção interferem várias enzimas conjugases presentes na mucosa do intestino que desconjugam os poliglutamatos em monoglutamatos, através da redução ou da metilação dos diferentes compostos. Porém, em altas concentrações, atravessa diretamente a parede dos enterócitos sem tais modificações. (21,27) Apenas os monoglutamatos são absorvidos no intestino delgado. O folato usualmente na forma de poliglutamato nos alimentos, é quebrado para a forma de monoglutamato pela folil conjugase do pâncreas e conjugase mucosa da parede intestinal. A biodisponibilidade naturalmente presente nos alimentos varia de 40 a 70%. (6,27) Durante ou após a absorção, o ácido monoglutâmico é transformado em ácido metiltetrahidrofólico e armazenado. (6) O folato encontra-se no plasma distribuído em 22 três frações: o folato livre, e os ligados aos transportadores de baixa e de alta afinidade que são responsáveis pelo transporte do folato para as células da medula, reticulócitos, fígado, fluido cerebroespinhal e células tubulares renais. (1,5) Os folatos monoglutamatos são convertidos a poliglutamatos pela ação da enzima pteroilpoliglutamato sintase, que reconhece tetrahidrofolato (THF), porém parece não reconhecer 5-metil THF que, ou sofre demetilação ou é utilizado antes da poliglutamação. A poliglutamação intracelular é de grande importância na regulação da homeostase de folato, pois essencialmente todo folato celular se encontra na forma de poliglutamatos para suas diversas funções de coenzimas, bem como para ser retido na célula. (22,26) O folato é estocado principalmente no fígado e secretado na bile, onde a circulação entero-hepática reabsorverá e reutilizará esses folatos, diminuindo as perdas orgânicas. O folato se torna essencial para a manutenção do nível sérico, pois se estiver reduzido, poderá interferir no fornecimento de folato para a medula óssea e outros tecidos. O folato circulante, principalmente como metil-THF, em sua maioria é transportado ligado a proteínas de baixa afinidade como albumina, globulina e hemoglobina e apenas uma pequena parte do folato plasmático está ligado à proteína ligante específica de alta afinidade (folate binding proteins: FBPs). (22) Figura 7: Algumas Reações do Metabolismo do Folato e transferência de unidades de carbono. (27) Legenda: Ado: adenosil DHF: ácido dihidrofólico THF: ácido tetrahidofólico dTMB: deoxitimidina monofosfato dUMP: deoxiuridina monofosfato FAD: flavina adenina dinucleotídeo IMP: inosina monofosfato PLP: piridoxal fosfato RH: molécula aceptora de metil RCH3: produto da metilação 23 Fontes Alimentares O ácido fólico está amplamente distribuído na natureza, sendo sua principal fonte o levedo de cerveja. Encontra-se nos vegetais de folha verde escuro como o espinafre, o aspargo, o repolho e o brócolis, além das vísceras, carnes, ovos e feijão. Apesar de sua grande presença na alimentação, é relativamente fácil a ocorrência de deficiência da vitamina, já que ela é muito sensível. Por exemplo, o cozimento prolongado destrói 90% do conteúdo de folatos dos alimentos e essa perda aumenta quando se alcaliniza o meio com adição de substâncias como o bicarbonato de sódio. Além de ser termosensível, é pouco resistente ao contato com a luz e oxigênio atmosférico. (5,6,21) Tabela 5: Quantidades de ácido fólico em alguns alimentos.(21) Recomendações e Necessidades As exigências folato foram definidas historicamente como a quantidade de ingestão necessária para impedir uma deficiência severa com sintomas clínicos. Recentemente, a ingestão é associada com a manutenção de reações normais de transferência de unidades de carbono como descritas no metabolismo do nutriente.(28) As necessidades de folato variam em função da idade, sexo, estado fisiológico (gravidez e lactação). Gestantes, nutrizes, lactentes e idosos são considerados grupo de 24 risco para deficiência de ácido fólico. As recomendações podem ser consultadas na tabela 6. Para gestantes o aumento da necessidade é associado com o rápido crescimento de estruturas maternas e o crescimento e desenvolvimento celular do feto. Diferentes estudos foram realizados para determinar a ingestão do ácido fólico por este grupo. A recomendação de 600 µg foi considerada suficiente para manter os níveis séricos de folato considerando a excreção urinária. (26,28) Os requerimentos de folato para nutrizes ou lactantes estão aumentados pela quantidade de folato que é diariamente secretado no leite materno onde é necessário manter um fluxo normal deste nutriente. No entanto, alterações fisiológicas que afetem a lactação podem aumentar as necessidades de folato. (28) Tabela 6: Recomendações diárias de ingestão de folato em diferentes faixas etárias (28) Folato (µg/dia) Faixa Etária Crianças 0 - 6 meses 7 – 12 meses 1 – 3 anos 4 – 8 anos Homens 9 – 13 anos 14 - 18 anos 19 – 30 anos 31 – 50 anos 50 – 70 anos > 70 anos Mulheres 9 – 13 anos 14 - 18 anos 19 – 30 anos 31 – 50 anos 50 – 70 anos > 70 anos Gestantes ≤ 18 anos 19 – 30 anos 31 – 50 anos Lactantes ≤ 18 anos 19 – 30 anos 31 – 50 anos 65 80 150 200 300 400 400 400 400 400 300 400 400 400 400 400 600 600 600 500 500 500 Deficiências A principal conseqüência metabólica da deficiência de ácido fólico é a alteração no metabolismo do DNA. Isso resulta em alterações da morfologia nuclear celular, especialmente naquelas células com as velocidades de multiplicação mais rápida 25 (hemácias, leucócitos e células epiteliais do estômago, intestino, vagina e cérvix uterino). (6) Para a síntese de nucleotídeos, é necessário também, a presença da cobalamina, que atua como coenzima na síntese de metionina a partir da homocisteína, catalisada pela enzima metionina sintase, que requer metilCbl como coenzima e 5-metiltetrahidro-folato (5-metil-THF) como co-substrato. Por este motivo, é difícil distinguir a deficiência clínica de uma vitamina da outra, exceto por testes específicos, pois ambas podem resultar em anemia megaloblástica. Neste caso haverá síntese insuficiente de nucleotídeos, resultando numa replicação celular ineficaz que, em tecidos de acentuada proliferação celular, como o hematopoiético, levará ao aparecimento de megaloblastose, com a presença de células germens gigantes que possuem citoplasma suficiente, mas cromatina insuficiente para a divisão celular; culminando na macrocitose de eritrócitos, eritrocipenia, leucopenia e trombopenia. (22) A elevação no plasma de homocisteína total é o fator de risco para doença cardiovascular, desordens degenerativas e problemas relacionados à gestação como pré eclampsia, defeitos no tubo neural, deslocamento prematuro da placenta. Altas concentrações de homocisteína são correlacionadas com baixos níveis séricos de folato. O aumento efetivo da ingestão de folato diminui a homocisteína plasmática. (29,31) As principais implicações da deficiência de folato no organismo serão discutidas a seguir. Deficiência de Ácido Fólico na Gestação As deficiências de ferro, principalmente, e de folato, expressas ou não como anemias, são as mais comuns em gestantes, mesmo em países desenvolvidos. Os altos requerimentos nesse período são difíceis de atender através da dieta habitual, especialmente em mulheres de baixo nível sócio-econômico, necessitando de suplementação materna no cuidado pré-natal para cobrir esses requerimentos elevados. As deficiências desses nutrientes podem afetar o crescimento fetal e o desenvolvimento normal do sistema nervoso; afetar a síntese de ácidos nucléicos e de proteínas; além de impedir uma eritropoiese materna eficaz num momento de intensa atividade metabólica. (22) 26 Durante a gestação os níveis sanguíneos maternos de folato (eritrocitário e plasmático) diminuem normalmente, talvez como conseqüência da expansão do volume sangüíneo e do aumento da excreção urinária da vitamina, sendo que neste período sua absorção mantém-se inalterada. (18,30) Diferentes estudos observacionais, randomizados e controlados, realizados em diversos países atentam para ingestão e deficiências de ácido fólico na gestação. Alguns estudos observacionais mostraram associações positivas entre o estado maternal de folato e o peso ao nascer, atuando preventivamente no retardo do crescimento intrauterino (RCIU). (32) Figura 8: Prevalência de retardo do crescimento intrauterino (RCIU) em diferentes países; (baixo peso nascer para idade gestacional P<10). (32) A placenta é rica em proteínas que captam folato atuando como receptores da membrana nesta captação. No início da gestação a placenta ainda não está formada, não existindo mecanismo de proteção do embrião para as deficiências da circulação materna, sendo o estado nutricional e reservas nutricionais da mãe vitais neste período. (18) 27 Além de retardo do crescimento intrauterino, condições obstétricas tais como: descolamento de placenta, morte neonatal, baixo peso ao nascer, prematuridade, toxemia, hemorragia pós parto, atraso de maturação do sistema nervoso, anemia megaloblástica e malformação fetal são relacionadas com deficiência de folato durante a gestação. Os defeitos de tubo neural (DTNs) tais como a anencefalia e a espinha bífida, estão entre os mais graves defeitos do nascimento. Estes são definidos como malformações do sistema nervoso central causado por um desenvolvimento alterado em etapas precoces da embriogênese. (18,21,22) O sistema nervoso é formado nas primeiras semanas de gestação. A partir da terceira semana gestacional, surge a placa neural, uma área de espessamento do ectoderma embrionário, que dará origem ao tubo neural, e estes se diferenciarão formando o sistema nervoso central e periférico, respectivamente. O tubo neural começa a se formar entre 22o e 23o dias pós-concepção, permanecendo temporariamente aberto, cefálica e caudalmente. Essas aberturas, os neuróporos, se fecharão normalmente durante a 4ª semana de desenvolvimento embrionário. As paredes do tubo neural se espessarão para formar o encéfalo e a medula espinhal. Muitas malformações congênitas que atingem a medula espinhal, bem como o encéfalo e/ou as meninges, resultam do fechamento defeituoso do neuróporo caudal e rostral, respectivamente, próximo ao final da 4a semana. (22) Os defeitos do tubo neural (DTN) englobam defeitos cranianos como anencefalia, meningocele (que não afeta o tecido neural) e encefalocele (que pode ou não envolver o cérebro), e defeitos que ocorrem na porção caudal do tubo neural como espinha bífida com meninges protundentes, acompanhada de hidrocefalia, e espinha bífida oculta que não acarreta impedimento funcional. Crianças com anencefalia morrem após nascer, embora a maioria das crianças com espinha bífida cresça até a fase adulta. Estes defeitos ocorrem quando o tubo neural falha em fechar para formar a coluna vertebral e o crânio, no início da gestação, normalmente no final da 6a semana após o último período menstrual da mulher, entre o 24º e 28º dia pós-concepção. Considerado um período crítico, pois a mulher pode ainda não saber que está grávida. Cerca de 95% das crianças que nascem com DTN não são de famílias com história pregressa desse problema; embora mulheres que já tiveram filhos com DTN tenham um 28 risco muito alto de recorrência nas gestações subseqüentes. Portanto, a prevenção da primeira ocorrência é de vital importância. (22, 23,33) Figura 9: Espinha bífida (mieolomeningocele e meningocele). (33) A freqüência de fetos com DTNs abortados espontaneamente é dez vezes maior que a taxa de DTNs ao nascer. Além disso, existe uma relação positiva entre as taxas 29 de das gestações que chegam ao final e DTNs naquelas que terminam em aborto espontâneo. Isso sugere que apenas a deficiência severa de folato aumenta o risco de morte fetal, onde a síntese de DNA foi muito reduzida e o baixo peso ao nascer é importante. (31) Deficiência de Ácido Fólico na Lactação Apesar do requerimento de folato na gravidez ter sido extensivamente estudado, as necessidades de folato durante a lactação são pouco exploradas. A literatura indica que mulheres aparentemente saudáveis podem tornar-se deficientes em folato no período pós-parto. As antigas recomendações do National Research Council – NRC (1989) para folato durante a lactação foram baseadas no requerimento estimado de mulheres não grávidas e não lactantes (180mg/dia), com um adicional de 100mg/dia para cobrir as perdas devido à produção de leite. (21) Tal incremento foi baseado assumindo-se que o conteúdo de folato no leite humano era de 113nmol/L e na produção média diária de leite de 800ml/dia, uma vez estabelecida a lactação. No entanto, em estudo que avaliou o conteúdo de folato do leite humano verificou-se que este tinha em média 195 nmol/L, ou seja, um valor 72% maior que o usado previamente e que as perdas de folato devido à produção de leite eram também maiores. A partir destes achados foi estimado que o requerimento médio de folato durante a lactação seria de 455mg/dia, sendo 320mg/dia o requerimento médio de folato para mulheres não grávidas mais o adicional de 135mg/dia para a síntese de leite. Confirmando tais achados, a RDA para folato durante a lactação foi recentemente aumentada de 280 para 500mg/dia. (28,37) O leite humano contém uma concentração relativamente elevada do folato na forma de monoglutamato. A concentração de folato diminui em conseqüência da depleção de folato maternal, de modo que a mãe tenda a ter seus estoques diminuídos para manter a concentração de folato no leite. (38) Neste caso deficiências de folato durante o aleitamento materno são pouco comuns. A concentração de ácido fólico no leite materno depende do estado de folato da mulher e da duração da lactação. Comparado com o colostro, o leite maduro tem uma maior concentração desta vitamina e existem provas de que o folato do leite humano se 30 encontra em maior proporção como monoglutamato que seria melhor absorvido, o que explicaria o melhor estado nutricional de ácido fólico de crianças alimentadas com o leite materno.(21) Deficiência de Ácido Fólico e Doença Cardiovascular Altas concentrações de homocisteína são associadas ao aumento de oclusão vascular. Erros do metabolismo da homocisteína resultam em elevação da mesma no plasma (200-300 µmol/L), podendo ser observado especialmente na doença tromboembólica. A diminuição de homocisteína no plasma pode impedir ou minimizar eventos vasculares. A elevação leve da homocisteína (> 15 µmol/L) ocorre em 20-30% dos pacientes com aterosclerose. Sendo normalizado com a ingestão de folato. Embora não exista evidência quanto à disfunção endotelial o aumento de homocisteína é bem correlacionado com aterosclerose, doença isquêmica e declínio da função renal (figura 10). (34,35,36) Figura 10: Possíveis implicações da elevação de homocisteína plasmática. (34) Fumo Hipercolesterolemia Outros Estenose Aterosclerótica Angina pectoris Hipertensão Aterosclerose Aterosclerose e trombose secundária Infarto do Agudo do Miocárdio Nefroesclerose Aterogênese Trobogênese Homocisteína Elevada ↓ Folato ↓ Vitamina B12 Genótipo TT Outros Trombose Arterial Primária Infarto do Agudo do Miocárdio Trombose venosa Tromboembolismo 31 Suplementação As ingestões dietéticas adicionais recomendadas para um período pré concepção, gestação e lactação, baseado em uma absorção de 50% do alimento, não são facilmente atingidas sem suplementação. (6) Estudos têm demonstrado que a suplementação de ácido fólico, desde três meses antes da concepção até a décima segunda semana da gestação, pode prevenir os DTNs no feto. A razão para a administração antes da gestação se deve ao fato do tubo neural se formar entre o 25º e 27º dia após a concepção. Portanto, antes que a maioria das mulheres saiba que estão grávidas. (12,18) Recomenda-se suplementação diária de 0,4 a 0,8mg de ácido fólico durante o período periconcepcional para mulheres que nunca tiveram filhos com defeitos no fechamento do tubo neural e 4 mg par as que já tiveram filhos portados desta doença.(18) Considerações Finais Ferro e ácido fólico são nutrientes fundamentais em diferentes reações do metabolismo. Deficiências destes nutrientes, em diferentes fases da vida podem acarretar prejuízos irreversíveis. A suplementação de ferro e de ácido fólico durante a gestação, como comentado anteriormente deve fazer parte da rotina especialmente de mulheres em idade fértil, daquelas que planejam engravidar e de gestantes. Uma vez que a maioria das deficiências e desordens do metabolismo destes nutrientes ocorre neste período. Em crianças, a presença de sintomas relacionados a possível deficiência de ferro, devem ser observados cuidadosamente, diagnosticados e a suplementação deve ser realizada de forma a reverter o quadro clínico previamente instalado. A alimentação pode prover parte do folato e ferro necessário, porém dificilmente alcançaria as recomendações. A suplementação eficaz pode reduzir riscos como: defeitos no tubo neural, parto prematuro, pré eclampsia, hemorragia pós parto, anemia ferropriva, baixo peso ao nascer e outros distúrbios relacionadas à preservação da função vascular. 32 Referências Bibliográficas 1. Assao T Y., et al. 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