Ferro e Ácido Fólico
Silvia Cristina Ramos
Nutricionista Clínica do Instituto de Metabolismo e Nutrição (IMeN) – Pediatria e
Gestação
Especialista em Saúde Pública – FSP/USP
Especializanda em Nutrição Materno Infantil – UNIFESP/EPM
Docente do Curso de Nutrição Senac e Centro Método de Ensino
Daniel Magnoni
Médico Cardiologista e Nutrólogo
Diretor do Instituto de Metabolismo e Nutrição (IMeN)
Celso Cukier
Médico Cirurgião do Aparelho Digestório e Nutrólogo
Diretor do Instituto de Metabolismo e Nutrição (IMeN)
1
Sumário
Resumo
3
Ferro
5
Metabolismo do Ferro
5
Funções
5
Metabolismo
6
Formas e Biodisponibilidade
7
Absorção do Ferro
8
Proteínas Reguladoras do Metabolismo do Ferro
9
Fontes Alimentares
11
Recomendações e Necessidades de Ferro
12
Deficiências
13
Suplementação
17
Ácido Fólico
19
Estrutura
20
Funções
21
Absorção e Metabolismo
22
Fontes Alimentares
24
Recomendações e Necessidades
24
Deficiências
25
Deficiência de Ácido Fólico na Gestação
26
Deficiência de Ácido Fólico na Lactação
30
Deficiência de Ácido Fólico e Doença Cardiovascular
31
Suplementação
32
Considerações Finais
32
Referências Bibliográficas
33
2
Resumo
Ferro e ácido fólico são micronutrientes indispensáveis ao metabolismo normal.
Participam de diferentes reações no organismo e, suas deficiências, podem acarretar
prejuízos à saúde muitas vezes irreversíveis.
Entre os grupos populacionais mais sujeitos a estas deficiências destacam-se
crianças e gestantes. Nestes períodos existe um aumento da velocidade de crescimento e
desenvolvimento celular e a necessidade destes nutrientes se eleva.
O aumento das necessidades de ferro e ácido fólico foi exaustivamente estudado
para garantir suprimento adequado destes nutrientes em diferentes fases da vida. No
entanto o que se observa é a dificuldade dos indivíduos em atingir a ingestão dietética
recomendada. Em casos onde haja desequilíbrio da ingestão e necessidades se instalam
quadros de deficiência.
A biodisponiblidade e os estoques corporais de ferro e folato são fundamentais
para a manutenção normal da absorção e de níveis plasmáticos adequados. A absorção
do ferro é em média de 25% e a do ácido fólico não é exatamente determinada, no
entanto os folatos são muito sensíveis ao processo de cocção. Isso implica em uma
absorção menor do que o estimado de ingestão. Nestes casos taxas de absorção devem
ser calculadas para se ter valores mais aproximados da utilização dos nutrientes.
Alimentos fontes de ferro e folatos incluem carnes e vísceras, vegetais de
coloração verde escuro, leguminosas e em especial para ácido fólico o levedo de
cerveja é a principal fonte alimentar.
Deficiências de ferro apresentam em geral sintomas como palidez, anorexia,
irritabilidade, redução da capacidade cognitiva, sendo este último de grande importância
no grupo infantil. Com relação á deficiências de ácido fólico, muitos estudos indicam
defeitos no tubo neural como a principal conseqüência da deficiência. Entretanto é
relatada ainda síntese inadequada de nucleotídeos, elevação da homocisteína total no
plasma podendo ocasionar baixo peso ao nascer, descolamento prematuro da placenta,
prematuridade, anemia megaloblástica entre outros.
A suplementação de ferro é preconizada considerando hemoglobina menor que
11g/dl para crianças e gestantes. A suplementação de ácido fólico deve ser realizada de
forma preventiva pré-concepção e estendido até a 12a semana de gestação.
3
A suplementação destes nutrientes em períodos de grande necessidade orgânica
é a forma de maior eficácia no combate as deficiências.
4
Ferro
O ferro é nutriente essencial para o organismo e está envolvido em diversos
processos metabólicos vitais, destacando-se o transporte de oxigênio e a produção de
energia.
Elementos minerais presentes em baixas concentrações nos tecidos denominados
de elementos-traço, microelementos ou microminerais, sendo considerados benéficos ao
organismo. O ferro é o microelemento mais abundante no organismo humano. (1,2)
A carência de ferro, denominada anemia ferropriva tem uma distribuição
universal. Estima-se que 25% da população mundial é atingida. Os grupos
populacionais mais atingidos são as crianças de 4 a 24 meses de idade, os escolares, as
adolescentes do sexo feminino, as gestantes e as nutrizes. (2,3,4)
Para que alimentação garanta o fornecimento adequado de ferro é necessário
conhecer os fatores que interagem na sua biodisponibilidade. Em situações fisiológicas
específicas como a infância e a gestação, as necessidades estão aumentadas, exigindo
suplementação do mineral.
Metabolismo do Ferro
Funções
O ferro exerce papel fundamental na homeostase orgânica pois participa de
processos celulares vitais como: transporte de oxigênio, produção de energia através do
metabolismo oxidativo, crescimento celular atuando na síntese de ácidos nucléicos,
síntese de neurotransmissores cerebrais, co-fator em reações enzimáticas e vários outros
processo metabólicos. (1,5,6)
Os componentes do ferro no organismo podem ser agrupados em duas
categorias:
Funções enzimáticas ou metabólicas
Hemoglobina, mioglobina, citocromos e
flavoproteínas
Funções de armazenamento e transporte
Transferrina,
lactoferrina,
ferritina
hemosiderina
5
e
A quantidade de ferro total no corpo humano é aproximadamente 50mg/Kg de
peso corporal em homens e 40mg/Kg em mulheres adultas, variando em função da
idade e do estado nutricional. Cerca de 67% do ferro corporal está presente na
hemoglobina e o restante nas proteínas de estoque e enzimas corporais. (5,7)
Metabolismo
O ferro é o constituinte necessário da hemoglobina, uma proteína conjugada,
composta de quatro grupos heme contendo ferro. Cada um está ligado a quatro cadeias
polipeptídicas, que formam a molécula de hemoglobina. O heme é responsável pela cor
característica e capacidade transportadora de oxigênio no sangue. (5)
Figura 1: Estrutura Química da Hemoglobina (9)
O oxigênio combinado à hemoglobina nos capilares sanguíneos forma a oxihemoglobina, que é transportada aos tecidos para a liberação de oxigênio que atua em
diferentes processos oxidativos. (5,6,7)
A hemoglobina está presente nas hemácias. A proteína que contém ferro heme se
combina com o oxigênio nos pulmões e com o dióxido de carbono nos tecidos. A
6
mioglobina, também é uma proteína heme, e serve como reserva de oxigênio no
músculo. (5,6,8)
A produção oxidativa de ATP (adenosina trifosfato) dentro da mitocôndria
envolve muitas enzimas que contém ferro heme e não-heme. O ferro é elemento
essencial das citocromo catalases e peroxidades incluindo a enzima mitocondrial alfaglico-fosfato-oxidade. Os citocromos presentes nas células funcionam como cadeia
respiratória na transferência de elétrons e no armazenamento de energia através de
oxidação e redução alternadas de ferro (Fe2+ ∆ Fe3+). (5,6,10)
A deficiência de ferro pode afetar o metabolismo no músculo, independente da
anemia, refletindo redução das enzimas citocromos.
Formas e Biodisponibilidade
O ferro do organismo tem dupla origem: ferro exógeno, ingerido por meio dos
alimentos, e ferro endógeno, proveniente da destruição das hemácias, que libera cerca
de 27 mg do mineral, que em seguida é reutilizado. (5)
O ferro dietético é classificado
em duas formas, de acordo com o seu
mecanismo de absorção: ferro heme e ferro não-heme. O ferro heme encontra-se na
estrutura do anel de protoporfirina das hemoproteínas. Ele é encontrado em alimentos
de origem animal sob a forma de hemoglobina ou mioglobina, representando cerca de
40% do ferro do tecido animal. (5,6,7,11)
Esta forma tem elevada absorção
e não é influenciada pelos fatores que
interferem na absorção do não heme, como a ionização e a capacidade de se ligar a
outras substâncias. O ferro heme apresenta-se na sua forma iônica Fe2+ (ferroso), é
solúvel no meio alcalino da luz intestinal, sendo facilmente absorvido. A absorção do
ferro heme é alta: cerca de 15 a 30% no indivíduo normal e 30 a 50% no indivíduo
com baixa reserva de ferro. Dado que a absorção do ferro heme é relativamente
independente da combinação com os alimentos e está só ligeiramente influenciada pelo
estado nutricional do indivíduo, sua contribuição na dieta pode ser estimada medindose quimicamente o conteúdo da dieta, supondo uma absorção de 25%. (2,11)
Cerca de 80 a 90% do ferro presente nas dietas ocidentais estão na forma de
ferro não heme. O ferro não heme predomina na forma oxidada Fe3+ (férrico), é menos
7
solúvel no organismo. A biodisponibilidade de ferro não heme é menor em relação ao
ferro heme, sendo influenciada por fatores dietéticos, além do nível de ferro corpóreo.
Alguns fatores que podem
afetar a biodisponibilidade
de elementos traço
incluindo o ferro são:
A) Composição Dietética: (tabela 1) qualidade da proteína (animal ou vegetal),
balanço de aminoácidos, quantidade de proteína, quantidade do elemento traço,
interações de nutrientes, promotores (ácidos ascórbico, ácido cítrico), inibidores
(fitato, oxalato, fibras, polifenóis), deficiência de micronutrientes.
B) Preparação ou Processamento Alimentar: alimento cru, processo de cocção,
fermentação, moagem e outros processos
C) Fatores do Indivíduo: idade, sexo, estado fisiológico, estado nutricional, doença,
formação étnica, situação econômica.
Absorção do Ferro
A manutenção dos níveis
normais de hemoglobina
no sangue requer um
suprimento adequado de ferro e, portanto um controle da permuta de ferro entre o
organismo e o meio. (8)
A primeira etapa da absorção do ferro é representada pela passagem do ferro do
lúmen para as células da mucosa. O ferro deve estar disponível no lúmen do duodeno
e jejuno para entrar no eritrócito. Na maior parte do ferro presente no duodeno está na
forma férrica a qual se precipita apH abaixo de 3,0, se não estiver na forma de quelato.
(2)
Este ferro é ionizado pelo suco gástrico, reduzindo ao estado ferroso, e quelado com
substâncias solubilizantes, tais como ácido ascórbico, açúcares e aminoácidos que
contém enxofre. Conforme
o quimo
passa para o duodeno, adição de secreções
duodenais aumenta o pH para 7,0, ponto no qual a maioria dos íons férricos está
precipitada a não ser que tenha sido quelado. O íon ferroso é significantemente mais
solúvel em (pH 7,0) ficando disponível para absorção.
(6,8)
As mucinas desempenham
papel importante neste mecanismo uma vez que se ligam ao ferro em pH ácido e o
mantém em solução de pH neutro. (2,8)
Os complexos de ferro são captados pela membrana na borda em escova por
um processo mediado por um transportador dependente de energia. Este ferro passa
através da célula e entra no fluído extracelular. (2,8,11)
8
Tabela 1 : Interações dietéticas que alteram a biodisponibilidade do ferro. (11)
Proteínas Reguladoras do Metabolismo do Ferro
A transferência das células da mucosa para o corpo é afetada pelos depósitos de
ferro orgânico. A taxa de liberação do ferro da mucosa intestinal é regulada pela
saturação de transferrina. Dois íons férricos são ligados a transferrina para o transporte
até os tecidos. Teorias indicam que o número de receptores de transferrina se ajusta as
necessidades individuais. As deficiências de ferro na dieta são refletidas primariamente
na saturação de transferrina circulante. (6)
9
Transferrina: A transferrina é a proteína transportadora do ferro encontrada no
plasma e nos líquidos extravasculares sendo constituída, de uma única cadeia
polipeptídica. A lactoferrina tem estrutura muito semelhante à da transferrina, sendo
secretada no leite e sintetizada pelos granulócitos. Cada sítio fixa um átomo de ferro
férrico. A afinidade da transferrina pelo ferro é muita elevada: a um pH de 7,4. Foi
determinada a estrutura do receptor da transferrina (figura 2). A concentração do
receptor circulante está relacionada com o nível de eritropoese, aumentando também na
deficiência de ferro. (8)
Figura 2: Representação esquemática do receptor de transferrina humana. (8)
A transferrina é normalmente saturada até um terço da sua capacidade total de
ligação do ferro. (CTLF). Se o ferro não é necessário, a transferrina permanece saturada
e é menos absorvida a partir das células mucosas. Se o ferro
for necessário, a
transferrina está menos saturada quando alcança as células mucosas intestinais, e mais
ferro passa da mucosa para a transferrina. (6)
Ferritina: A ferritina garante uma reserva solúvel de ferro no interior das
células. Consiste de uma cápsula de apoproteína que engloba um núcleo de ferro. A
principal função da ferritina é a de constituir uma reserva intracelular de ferro que
10
poderá ser utilizada na síntese de proteínas e enzimas que contêm ferro. O processo
compreende uma ligação inicial a sítios situados no interior de estrias na cápsula
protéica seguida do ingresso na cápsula e formação de um núcleo de ferro. Depois que
um pequeno núcleo de ferro foi estabelecido, a oxidação pode ocorrer diretamente na
superfície desse núcleo. (6,8)
Figura 3: As principais vias do metabolismo do ferro no homem. Os números junto à
setas indicam mg Fe/dia; o ferro é essencialmente “heme” no tecido muscular e
ferritina/hemossiderina nas células hepáticas. (8)
Fontes Alimentares
A determinação de ferro em alimentos é importante devido à necessidade da
estimativa de seu teor para fins nutricionais. As principais fontes de origem animal são
11
as carnes vermelhas e as vísceras, em especial o fígado (8 a 10 mg/100g), e os moluscos
bivalves (7,7 a 26 mg/100g). Entre as fontes de origem vegetal, as leguminosas secas
(5,5 a 8,5 mg/100g) contêm quantidades elevadas. Os vegetais são a base da dieta da
maior parte da população mundial. Esta apresenta baixa biodisponibilidade de ferro,
quando comparada com dietas que contêm carne. (2)
Vegetais de coloração verde escura (espinafre, agrião, entre outros) apresentam
ferro não heme. Entretanto, o que precisa ser evidenciado é a capacidade do organismo
em aproveitar este ferro oferecido para exercer as suas mais diversas funções, o que
determina a sua biodisponibilidade.(4)
Tabela 2: Tipos e fontes de ferro. (1)
Tipo de Ferro
Ferro não heme
Fonte Alimentar
Biodisponibilidade
Cereais, leguminosas, tubérculos - Variável
e hortaliças
- Influenciado pelas reservas orgânicas
-Influenciado pela dieta
Ferro heme
Carne bovina, carne suína, aves, - Alta
peixes e miúdos
- Pouco influenciado pelas reservas orgânicas
- Pouco influenciado pela dieta
Recomendações e Necessidades de Ferro
As necessidades corporais de ferro podem variar em função da idade, sexo,
estado fisiológico (gravidez e lactação) e patológico (infecções). Gestantes e crianças,
devido à expansão do volume sanguíneo e crescimento dos tecidos, apresentam
necessidades maiores de ferro, sendo, portanto mais vulneráveis ao desenvolvimento da
deficiência de ferro. (1)
O trato intestinal tem um papel muito importante no mecanismo de reciclagem
do ferro corporal, pois a absorção pode ser modificada conforme as necessidades do
organismo, ou seja, quando as reservas são baixas, ocorre aumento significativo da
absorção e, contrariamente, quando altas, sua inibição. Como as necessidades de ferro
corporal estão relacionadas às diversas etapas da vida, o grau de absorção intestinal de
ferro também está vinculado à faixa etária. Exemplificando, uma criança de 12 meses
apresenta absorção quatro vezes maior do que outras de diferentes grupos etários. (2,4,12)
12
Levando em consideração esses aspectos, pode-se entender que as necessidades
diárias de ferro são pequenas e variam conforme a fase da vida. Dessa forma,
considerando
absorção de 10%, a RDI (Recommended Dietary Intake) preconiza
ingestão diária de ferro em diferentes fases da vida podem ser consultadas na tabela 3.
(7)
Tabela 3: Recomendações diárias de ingestão de ferro em diferentes faixas etárias (7)
Faixa Etária
Ferro
mg/dia
Crianças
0 - 6 meses
0,27
7 – 12 meses
11
1 – 3 anos
7
4 – 8 anos
10
Homens
9 – 13 anos
8
14 - 18 anos
11
19 – 30 anos
8
31 – 50 anos
8
50 – 70 anos
8
> 70 anos
8
Mulheres
9 – 13 anos
8
14 - 18 anos
15
19 – 30 anos
18
31 – 50 anos
18
50 – 70 anos
8
> 70 anos
8
Gestantes
≤ 18 anos
27
19 – 30 anos
27
31 – 50 anos
27
Lactantes
≤ 18 anos
10
19 – 30 anos
9
31 – 50 anos
9
Deficiências
A deficiência de ferro é a deficiência nutricional mais comum em todo o mundo.
(1,2,3,4,6)
13
A anemia é definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como a
condição na qual o conteúdo de hemoglobina no sangue está abaixo do normal como
resultado da carência de um ou mais nutrientes essenciais, seja qual for a causa dessa
deficiência. As anemias podem ser causadas por deficiência de vários nutrientes como,
por exemplo, ferro, zinco, vitamina B12 e proteínas. Porém a anemia causada por
deficiência de ferro, denominada anemia ferropriva, é muito mais comum que as demais
(estima-se que 90% das anemias sejam causadas por carência de ferro) e afeta grande
parcela da população mundial de praticamente todos os estratos sociais, dos mais
privilegiados aos mais carentes, especialmente o grupo materno-infantil: lactentes, préescolares, escolares, gestantes e nutrizes, embora homens adolescentes e adultos e os
idosos também possam ser afetados por ela. (1,11,13) Outros grupos considerados de risco
incluem adolescentes grávidas. (6)
Deve-se estabelecer se essa deficiência é devido à ingestão inadequada de ferro
(deficiência de ferro primária), ou devido ao aumento da absorção de ferro exigido por
várias condições fisiológicas e/ou patológicas, como por exemplo, parasitismo
hemorragias, treinamento físico intenso – (deficiência de ferro secundária). (13)
No Brasil, a anemia por deficiência de ferro (anemia ferropriva) é o problema
nutricional de maior magnitude, sobretudo em crianças menores de dois anos e
gestantes, atingindo cerca de 50% e 35% desses dois grupos populacionais,
respectivamente. (11)
Foram identificados três estágios na instalação da deficiência de ferro. (4)
No primeiro estágio, há diminuição da ferritina sérica, que está diretamente
relacionada com as reservas de ferro. No segundo estágio, há um declínio da
concentração de ferro sérico e aumento da capacidade de ligação do ferro. Quando há
restrição na síntese de hemoglobina, ocorre o terceiro estágio, podendo-se instalar a
anemia. Na anemia ferropriva, as hemácias que eram normocíticas e normocrômicas
sofrem alterações morfológicas, tornando-se microcíticas e hipocrômicas. (4,14)
A definição operacional de anemia, em termos dos níveis de hemoglobina, foi
estabelecida pela OMS, adotando o nível de 11,0 g/dl para crianças menores de seis
anos e gestantes. Para crianças de 6 a 14 anos e mulheres adultas não grávidas, 12 g/dl e
homens adultos, 13 g/dl. (11)
14
Os sinais clínicos de anemia são de difícil reconhecimento, muitas vezes
passando despercebidos como palidez, anorexia, apatia, irritabilidade, redução da
capacidade de atenção e déficits psicomotores. (11,13)
Entre os grupos mais vulneráveis à ocorrência de anemia ferropriva têm-se
crianças de 6 a 24 meses, destacando-se o primeiro ano de vida, e em especial o
segundo semestre, quando se inicia a alimentação complementar. O déficit de ferro pode
levar a alterações da pele e mucosas, gastrintestinais, peso baixo para a idade, redução
do trabalho físico e da função imunitária. A anemia também prejudica o
desenvolvimento físico, motor, psicológico, comportamental, cognitivo e de linguagem.
(1,4,14)
Estudo transversal com objetivo de verificar a prevalência de anemia ferropriva
nesta faixa etária foi realizado na cidade de Goiânia – Brasil. Foram entrevistadas 120
mães, sendo inclusos no estudo 110 lactentes de 6 a 12 meses de idade, a termo e não
gemelares. Os exames realizados foram hemograma completo por contagem eletrônica,
ferro sérico, ferritina sérica e proteína C-reativa, os quais foram utilizados na avaliação
da etiologia ferropriva nos anêmicos. Crianças com
hemoglobina < 11g/dl foram
consideradas anêmicas. A prevalência de anemia observada foi de 60,9%. (14)
Outro estudo transversal realizado em creches públicas da cidade de Cuiabá
com crianças até 3 anos de idade. Com o objetivo de estudar a prevalência de anemia
em crianças menores de 36 meses de idade encontrou prevalência de 63 % de anemia e
22,5% em sua forma grave. A anemia mostrou-se associada com idade, déficit ponderal
e estatural e com tempo de ingresso na creche. A prevalência de desnutrição (< -2 zscore) foi de 0,8% de acordo com o índice de peso/altura, 5,0% segundo peso/idade, e
10,3% de inadequação na altura/idade. A proporção de crianças anêmicas foi, portanto,
6 vezes maior do que o déficit de altura e 12 vezes maior que o déficit ponderal. A
desnutrição, em geral, não se apresentava associada com anemia, mas, tomando-se
como ponto de corte valores extremos de déficits antropométricos (< -2 z-score), seja
de altura ou de peso para idade, percebe-se associação com anemia. (15)
O ferro é um dos nutrientes mais importantes na gestação. A carência é
identificada como um dos maiores problemas de saúde pública, atingindo mais de 50%
das gestantes de todo o mundo. A anemia ferropriva durante a gestação está relacionada
ao maior risco de mortalidade materna, parto prematuro e baixo peso ao nascer. (1,12,16,18)
15
Estima-se que 1040mg de ferro são utilizadas durante a gestação. O ferro é
transferido para o feto (∼300mg) e usado na formação da placenta (50 – 75mg),
expansão das células vermelhas (∼450mg) e variações sanguíneas durante a gestação
(∼200mg). As concentrações de hemoglobina, ferro sérico, porcentagem de saturação
da transferrina e transferrina sérica diminuem ao longo da gestação como reflexo da
hemodiluição. (18)
A determinação da ferritina sérica é mais sensível do que a da hemoglobina para
o diagnóstico de anemia ferropriva, refletindo as condições dos depósitos de ferro.
A OMS recomenda suplementação de ferro para todas as gestantes no último
trimestre de gestação como medida profilática.
O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) recomenda como
suplementação de rotina (30mg/dia) para todas gestantes a partir da primeira consulta
pré-natal. Quando confirmado pelos exames laboratoriais baixo nível de hemoglobina
ou hematócrito a dose suplementar de ferro deve ser de 60 a 120mg/dia. Quando os
parâmetros laboratoriais voltarem a normalidade dever ser retomada a prescrição de
30mg/dia. (17)
No Brasil, há escassez de estudos com amostras representativas em mulheres de
15 a 49 anos. Em centros de saúde de uma área metropolitana do município de São
Paulo, encontrou-se prevalência de anemia de 3,6%, 20,9% e 32,1% no primeiro,
segundo e terceiro trimestres de gravidez, respectivamente Outro estudo realizado em
1990 encontrou prevalência de anemia de 30,3% entre 710 gestantes na primeira
consulta do pré-natal, mas quando analisou apenas o último trimestre da gestação, a
prevalência aumentou para 40,4%. Em São Paulo, outros estudos com gestantes
encontraram prevalências em torno de 30%. (1)
Estudo realizado com adolescentes gestantes atendidas na Rede Básica de Saúde
de um Município da Grande São Paulo, foi realizado para avaliar a prevalência de
anemia neste grupo e planejar ações de saúde. Por meio de dosagem de ferritina sérica,
transferrina sérica, hemoglobina e hematócrito, caracterizaram-se o estado nutricional
de ferro de 79 gestantes adolescentes de primeira consulta pré-natal ( ≤ 20 semanas de
gestação).Todos os valores hematológicos estudados foram menores entre as gestantes
do segundo trimestre gestacional
em relação às do primeiro, sendo as diferenças
estatisticamente significativas (p<0,05) apenas para hemoglobina. Verificou-se que
16
64,3% e 32,1% possuíam, respectivamente, menos de 500 mg e 300 mg de ferro em
suas reservas, sendo que 5,4% apresentavam carência grave do mineral. Segundo
critério da Organização Mundial da Saúde 19,0% das gestantes era ferro-deficientes
(saturação da transferrina < 16,0 %) e 13,9% eram anêmicas (Hemoglobina < 11 g/dl).
(19)
A figura 4 demonstra a freqüência acumulada deste estudo no qual que 32,1%
das adolescentes tinham reservas de ferro inferiores a 300 mg e 64,3% menos que 500
mg de ferro.
Figura 4: Distribuição de freqüências acumuladas do conteúdo de depósito de ferro,
calculado a partir da determinação da ferritina sérica. (19)
Suplementação
A suplementação medicamentosa é bastante eficaz na prevenção e controle da
anemia.
Nos primeiros dias após o início da terapia com ferro, entre o 7º e o 12º dia,
observa-se maior atividade eritropoiética, sendo esta proporcional à concentração inicial
da hemoglobina. O primeiro mês de suplementação é fundamental para o sucesso do
tratamento, já que o período de maior absorção compreende as primeiras semanas após
17
o início da terapia com ferro. A duração da administração do suplemento deve ser de 4 a
5 meses, pois apesar da normalização da concentração de hemoglobina ocorrer após 2
meses, são necessários mais 2 a 3 meses para reposição das reservas orgânicas de ferro.
Considera-se como resposta positiva o aumento de 0,1g/dL na concentração de
hemoglobina do quarto dia em diante. (1,4)
Os suplementos de ferro contendo sais ferrosos devem ser oferecidos de
preferência uma hora antes das refeições, visto que são melhor absorvidos, evitando que
substâncias inibidoras (como taninos, fitatos e polifenóis) presentes em alguns
alimentos comprometam a absorção do ferro. Também não devem ser administrados
junto com leites, chás, outros suplementos vitamínicos ou de minerais e antiácidos.
Diversas
organizações
internacionais
sugerem
que
os
programas
de
suplementação profilática para lactentes e pré-escolares devem ter alta prioridade,
principalmente em locais onde a prevalência de anemia é elevada, e quando a maioria
dos alimentos consumidos pelas crianças não é fortificado com ferro. Tais
recomendações encontram-se na tabela 4.
Para a gestante, a suplementação profilática com ferro, apresenta benefícios como:
(12,18,20)
1. Aumento na concentração da hemoglobina sérica e na reserva tecidual do
mineral durante a gravidez e pós-parto. Um estudo realizado na Tanzânia (onde
há a maior incidência de deficiência de ferro) demonstrou que a suplementação
com ferro durante a gravidez e a lactação aumenta de forma significativa as
reservas teciduais do nutriente.
2. Incremento das reservas de ferro no feto em desenvolvimento e no recémnascido, o que está associado a um melhor desenvolvimento cognitivo durante a
infância e na idade escolar.
3. Melhora na relação mãe e filho. Uma mãe que não está cansada interage mais
com o filho e isso repercute no melhor desenvolvimento psicomotor e emocional
infantil.
18
Tabela 4: Recomendações em relação à suplementação com ferro para crianças menores
de 24 meses de idade.
Ácido Fólico
Dentre os nutrientes essenciais envolvidos na eritropoiese normal destacam-se o
ferro, a vitamina B12 e os folatos.
19
A folacina e o folato são descritores genéricos para um grupo de compostos
quimicamente e nutricionalmente semelhantes ao ácido fólico. Funcionam como
coenzimas no transporte de fragmentos de carbono simples no metabolismo de
aminoácidos e na síntese de ácidos nucléicos. (6)
O folato se tornou conhecido durante estudos de fatores de crescimento não
identificado em bactérias e animais. O termo ácido fólico deriva do latim folium, que
significa folha. Nesta mesma década (1940), foi possível isolar, cristalizar e identificar a
estrutura desta vitamina, bem como elaborar formas sintéticas para o uso no tratamento
de enfermidades carenciais. (6,21,22)
Na segunda metade do século XX, foi possível conhecer melhor esta vitamina,
sua importância na dieta e seu potencial na prevenção de enfermidades como o câncer,
doenças cardiovasculares e defeitos congênitos. (23)
Estrutura
Os folatos constituem um grupo de compostos heterocíclicos nos quais o ácido
pteroico está conjugado com um ou diversos resíduos de ácido Lglutâmico. Em geral, os
termos folatos e ácido fólico são considerados como sinônimos. Outros utilizam os
folatos para designar os poliglutamatos que são as formas desta vitamina naturalmente
presentes na alimentação e reservam o termo ácido fólico para o monoglutamato
sintético, o ácido pteroilglutâmico. O tetra-hidrofolato (THF) é o composto presente em
todas as formas biologicamente ativas dos folatos, com diferentes substituições nas
posições 5 e 10 do núcleo pteridina. (figura 1) (23,24)
Figura 5: Estrutura do Ácido Fólico (24)
20
Funções
O ácido fólico é uma vitamina hidrossolúvel sendo pouco armazenada no
organismo. É essencial para as reações metabólicas específicas no meio celular e vital
para o funcionamento e crescimento normal do organismo. (25)
Folato é cofator essencial em muitas reações do metabolismo intermediário,
como: transferência de unidades de carbono, síntese de nucleotídios, interconversão de
aminoácidos (metionina-homocisteína), requerendo cobalamina de forma a prover Sadenosilmetionina para a metilação do DNA, RNA e proteínas, essencial para períodos
de rápida proliferação celular, como a gestação, por conta do crescimento e
desenvolvimento fetal, além da intensa atividade hematopoiética. (22)
O ácido fólico atua na formação de produtos intermediários do metabolismo e
está envolvido na formação celular. (5)
O ácido tetrahidrofólico funciona como carreador para os grupos formil, metil
ou hidroximetil de carbono simples. Desempenha papel importante
na síntese de
purinas (guanina e adenina) e da piramidina (timina), compostos utilizados na formação
do ácido desoxirribonucléico (DNA) e ácido ribonucléico (RNA) das nucleoproteínas,
as quais são essenciais para a divisão celular.
O grupo metila do 5-metil-THF que é utilizado pela metionina sintase, uma
enzima dependente da vitamina B12 para metilar a homocisteína em metionina. Os
distúrbios da remetilação da homocisteínaem metionina produzem aumento da taxa de
homocisteína.A homocisteinemia ou a falta de metionina podem causar distúrbios no
desenvolvimento fetal. Além disso, a perturbação desse ciclo de metilação resulta na
incapacidade da célula em metilar outros compostos importantes como proteínas, lípides
e DNA. (6,21,22,23)
Durante períodos de inadequada ingestão ou absorção de folato, ocorrem
modificações bioquímicas decorrentes deste estado e anormalidades na transferência de
unidades de carbono no metabolismo. Estas anormalidades (hiperhomocisteínemia e
hipometilação do DNA) podem resultar em conseqüências deletérias incluindo aumento
de doenças crônicas. (25)
A conversão da nicotinamida em N-metilnicotinamida adicionando-se um grupo
metil simples, e a oxidação da fenilalanina em tirosina necessita de folato. O folato é
21
essencial para a formação das hemácias e leucócitos na medula óssea e para maturação
do heme.(6)
Figura 6: Interação entre as vitaminas do complexo B, folato e homocisteína. (21)
Absorção e Metabolismo
A absorção do folato alimentar em concentrações fisiológicas no homem é feita
principalmente no primeiro terço do intestino delgado, por processo ativo saturável
dependente de pH (no máximo 6,3) e de sódio, apesar de ocorrer também em toda a
extensão do mesmo. Nesta absorção interferem várias enzimas conjugases presentes na
mucosa do intestino que desconjugam os poliglutamatos em monoglutamatos, através
da redução ou da metilação dos diferentes compostos. Porém, em altas concentrações,
atravessa diretamente a parede dos enterócitos sem tais modificações. (21,27)
Apenas os monoglutamatos são absorvidos no intestino delgado. O folato
usualmente na forma de poliglutamato nos alimentos, é quebrado para a forma de
monoglutamato pela folil conjugase do pâncreas e conjugase mucosa da parede
intestinal. A biodisponibilidade naturalmente presente nos alimentos varia de 40 a 70%.
(6,27)
Durante ou após a absorção, o ácido monoglutâmico é transformado em ácido
metiltetrahidrofólico e armazenado. (6) O folato encontra-se no plasma distribuído em
22
três frações: o folato livre, e os ligados aos transportadores de baixa e de alta afinidade
que são responsáveis pelo transporte do folato para as células da medula, reticulócitos,
fígado, fluido cerebroespinhal e células tubulares renais. (1,5)
Os folatos monoglutamatos são convertidos a poliglutamatos pela ação da
enzima pteroilpoliglutamato sintase, que reconhece tetrahidrofolato (THF), porém
parece não reconhecer 5-metil THF que, ou sofre demetilação ou é utilizado antes da
poliglutamação. A poliglutamação intracelular é de grande importância na regulação da
homeostase de folato, pois essencialmente todo folato celular se encontra na forma de
poliglutamatos para suas diversas funções de coenzimas, bem como para ser retido na
célula. (22,26)
O folato é estocado principalmente no fígado e secretado na bile, onde a
circulação entero-hepática reabsorverá e reutilizará esses folatos, diminuindo as perdas
orgânicas. O folato se torna essencial para a manutenção do nível sérico, pois se estiver
reduzido, poderá interferir no fornecimento de folato para a medula óssea e outros
tecidos. O folato circulante, principalmente como metil-THF, em sua maioria é
transportado ligado a proteínas de baixa afinidade como albumina, globulina e
hemoglobina e apenas uma pequena parte do folato plasmático está ligado à proteína
ligante específica de alta afinidade (folate binding proteins: FBPs). (22)
Figura 7: Algumas Reações do
Metabolismo
do
Folato
e
transferência
de unidades de
carbono. (27)
Legenda:
Ado: adenosil
DHF: ácido dihidrofólico
THF: ácido tetrahidofólico
dTMB: deoxitimidina monofosfato
dUMP: deoxiuridina monofosfato
FAD: flavina adenina dinucleotídeo
IMP: inosina monofosfato
PLP: piridoxal fosfato
RH: molécula aceptora de metil
RCH3: produto da metilação
23
Fontes Alimentares
O ácido fólico está amplamente distribuído na natureza, sendo sua principal
fonte o levedo de cerveja. Encontra-se nos vegetais de folha verde escuro como o
espinafre, o aspargo, o repolho e o brócolis, além das vísceras, carnes, ovos e feijão.
Apesar de sua grande presença na alimentação, é relativamente fácil a ocorrência de
deficiência da vitamina, já que ela é muito sensível. Por exemplo, o cozimento
prolongado destrói 90% do conteúdo de folatos dos alimentos e essa perda aumenta
quando se alcaliniza o meio com adição de substâncias como o bicarbonato de sódio.
Além de ser termosensível, é pouco resistente ao contato com a luz e oxigênio
atmosférico. (5,6,21)
Tabela 5: Quantidades de ácido fólico em alguns alimentos.(21)
Recomendações e Necessidades
As exigências folato foram definidas historicamente como a quantidade de
ingestão necessária para
impedir uma deficiência severa com sintomas clínicos.
Recentemente, a ingestão é associada com a manutenção de reações normais de
transferência de unidades de carbono como descritas no metabolismo do nutriente.(28)
As necessidades de folato variam em função da idade, sexo, estado fisiológico
(gravidez e lactação). Gestantes, nutrizes, lactentes e idosos são considerados grupo de
24
risco para deficiência de ácido fólico. As recomendações podem ser consultadas na
tabela 6.
Para gestantes o aumento da necessidade é associado com o rápido crescimento
de estruturas maternas e o crescimento e desenvolvimento celular do feto. Diferentes
estudos foram realizados para determinar a ingestão do ácido fólico por este grupo. A
recomendação de 600 µg foi considerada suficiente para manter os níveis séricos de
folato considerando a excreção urinária. (26,28)
Os requerimentos de folato para nutrizes ou lactantes estão aumentados pela
quantidade de folato que é diariamente secretado no leite materno onde é necessário
manter um fluxo normal deste nutriente. No entanto, alterações fisiológicas que afetem
a lactação podem aumentar as necessidades de folato. (28)
Tabela 6: Recomendações diárias de ingestão de folato em diferentes faixas etárias (28)
Folato (µg/dia)
Faixa Etária
Crianças
0 - 6 meses
7 – 12 meses
1 – 3 anos
4 – 8 anos
Homens
9 – 13 anos
14 - 18 anos
19 – 30 anos
31 – 50 anos
50 – 70 anos
> 70 anos
Mulheres
9 – 13 anos
14 - 18 anos
19 – 30 anos
31 – 50 anos
50 – 70 anos
> 70 anos
Gestantes
≤ 18 anos
19 – 30 anos
31 – 50 anos
Lactantes
≤ 18 anos
19 – 30 anos
31 – 50 anos
65
80
150
200
300
400
400
400
400
400
300
400
400
400
400
400
600
600
600
500
500
500
Deficiências
A principal conseqüência metabólica da deficiência de ácido fólico é a alteração
no metabolismo do DNA. Isso resulta em alterações da morfologia nuclear celular,
especialmente naquelas células com as velocidades de multiplicação mais rápida
25
(hemácias, leucócitos e células epiteliais do estômago, intestino, vagina e cérvix
uterino). (6)
Para a síntese de nucleotídeos, é necessário também, a presença da cobalamina,
que atua como coenzima na síntese de metionina a partir da homocisteína, catalisada
pela enzima metionina sintase, que requer metilCbl como coenzima e 5-metiltetrahidro-folato (5-metil-THF) como co-substrato. Por este motivo, é difícil distinguir a
deficiência clínica de uma vitamina da outra, exceto por testes específicos, pois ambas
podem resultar em anemia megaloblástica. Neste caso haverá síntese insuficiente de
nucleotídeos, resultando numa replicação celular ineficaz que, em tecidos de acentuada
proliferação celular, como o hematopoiético, levará ao aparecimento de megaloblastose,
com a presença de células germens gigantes que possuem citoplasma suficiente, mas
cromatina insuficiente para a divisão celular; culminando na macrocitose de eritrócitos,
eritrocipenia, leucopenia e trombopenia. (22)
A elevação no plasma de homocisteína total é o fator de risco para doença
cardiovascular, desordens degenerativas e problemas relacionados à gestação como pré
eclampsia, defeitos no tubo neural, deslocamento prematuro da placenta. Altas
concentrações de homocisteína são correlacionadas com baixos níveis séricos de folato.
O aumento efetivo da ingestão de folato diminui a homocisteína plasmática. (29,31)
As principais implicações da deficiência de folato no organismo serão discutidas
a seguir.
Deficiência de Ácido Fólico na Gestação
As deficiências de ferro, principalmente, e de folato, expressas ou não como
anemias, são as mais comuns em gestantes, mesmo em países desenvolvidos. Os altos
requerimentos nesse período são difíceis de atender através da dieta habitual,
especialmente em mulheres de baixo nível sócio-econômico, necessitando de
suplementação materna no cuidado pré-natal para cobrir esses requerimentos elevados.
As deficiências desses nutrientes podem afetar o crescimento fetal e o desenvolvimento
normal do sistema nervoso; afetar a síntese de ácidos nucléicos e de proteínas; além de
impedir uma eritropoiese materna eficaz num momento de intensa atividade metabólica.
(22)
26
Durante a gestação os níveis sanguíneos maternos de folato (eritrocitário e
plasmático) diminuem normalmente, talvez como conseqüência da expansão do volume
sangüíneo e do aumento da excreção urinária da vitamina, sendo que neste período sua
absorção mantém-se inalterada. (18,30)
Diferentes estudos observacionais, randomizados e controlados, realizados em
diversos países atentam para ingestão e deficiências de ácido fólico na gestação. Alguns
estudos observacionais mostraram associações positivas entre o estado maternal de
folato e o peso ao nascer, atuando preventivamente no retardo do crescimento intrauterino (RCIU). (32)
Figura 8: Prevalência de retardo do crescimento intrauterino (RCIU) em diferentes
países; (baixo peso nascer para idade gestacional P<10).
(32)
A placenta é rica em proteínas que captam folato atuando como receptores da
membrana nesta captação. No início da gestação a placenta ainda não está formada, não
existindo mecanismo de proteção do embrião para as deficiências da circulação
materna, sendo o estado nutricional e reservas nutricionais da mãe vitais neste período.
(18)
27
Além de retardo do crescimento intrauterino, condições obstétricas tais como:
descolamento de placenta, morte neonatal, baixo peso ao nascer, prematuridade,
toxemia, hemorragia pós parto, atraso de maturação do sistema nervoso, anemia
megaloblástica e malformação fetal são relacionadas com deficiência de folato durante a
gestação.
Os defeitos de tubo neural (DTNs) tais como a anencefalia e a espinha bífida,
estão entre os mais graves defeitos do nascimento. Estes são definidos como
malformações do sistema nervoso central causado por um desenvolvimento alterado em
etapas precoces da embriogênese. (18,21,22)
O sistema nervoso é formado nas primeiras semanas de gestação. A partir da
terceira semana gestacional, surge a placa neural, uma área de espessamento do
ectoderma embrionário, que dará origem ao tubo neural, e estes se diferenciarão
formando o sistema nervoso central e periférico, respectivamente. O tubo neural começa
a se formar entre 22o e 23o dias pós-concepção, permanecendo temporariamente
aberto, cefálica e caudalmente. Essas aberturas, os neuróporos, se fecharão normalmente
durante a 4ª semana de desenvolvimento embrionário. As paredes do tubo neural se
espessarão para formar o encéfalo e a medula espinhal. Muitas malformações
congênitas que atingem a medula espinhal, bem como o encéfalo e/ou as meninges,
resultam do fechamento defeituoso do neuróporo caudal e rostral, respectivamente,
próximo ao final da 4a semana. (22)
Os defeitos do tubo neural (DTN) englobam defeitos cranianos como
anencefalia, meningocele (que não afeta o tecido neural) e encefalocele (que pode ou
não envolver o cérebro), e defeitos que ocorrem na porção caudal do tubo neural como
espinha bífida com meninges protundentes, acompanhada de hidrocefalia, e espinha
bífida oculta que não acarreta impedimento funcional. Crianças com anencefalia
morrem após nascer, embora a maioria das crianças com espinha bífida cresça até a fase
adulta. Estes defeitos ocorrem quando o tubo neural falha em fechar para formar a
coluna vertebral e o crânio, no início da gestação, normalmente no final da 6a semana
após o último período menstrual da mulher, entre o 24º e 28º dia pós-concepção.
Considerado um período crítico, pois a mulher pode ainda não saber que está grávida.
Cerca de 95% das crianças que nascem com DTN não são de famílias com história
pregressa desse problema; embora mulheres que já tiveram filhos com DTN tenham um
28
risco muito alto de recorrência nas gestações subseqüentes. Portanto, a prevenção da
primeira ocorrência é de vital importância. (22, 23,33)
Figura 9: Espinha bífida (mieolomeningocele e meningocele). (33)
A freqüência de fetos com DTNs abortados espontaneamente é dez vezes maior
que a taxa de DTNs ao nascer. Além disso, existe uma relação positiva entre as taxas
29
de das gestações que chegam ao final e DTNs naquelas que terminam em aborto
espontâneo. Isso sugere que apenas a deficiência severa de folato aumenta o risco de
morte fetal, onde a síntese de DNA foi muito reduzida e o baixo peso ao nascer é
importante. (31)
Deficiência de Ácido Fólico na Lactação
Apesar do requerimento de folato na gravidez ter sido extensivamente estudado,
as necessidades de folato durante a lactação são pouco exploradas. A literatura indica
que mulheres aparentemente saudáveis podem tornar-se deficientes em folato no
período pós-parto. As antigas recomendações do National Research Council – NRC
(1989) para folato durante a lactação foram baseadas no requerimento estimado de
mulheres não grávidas e não lactantes (180mg/dia), com um adicional de 100mg/dia
para cobrir as perdas devido à produção de leite. (21)
Tal incremento foi baseado assumindo-se que o conteúdo de folato no leite
humano era de 113nmol/L e na produção média diária de leite de 800ml/dia, uma vez
estabelecida a lactação. No entanto, em estudo que avaliou o conteúdo de folato do leite
humano verificou-se que este tinha em média 195 nmol/L, ou seja, um valor 72% maior
que o usado previamente e que as perdas de folato devido à produção de leite eram
também maiores. A partir destes achados foi estimado que o requerimento médio de
folato durante a lactação seria de 455mg/dia, sendo 320mg/dia o requerimento médio de
folato para mulheres não grávidas mais o adicional de 135mg/dia para a síntese de leite.
Confirmando tais achados, a RDA para folato durante a lactação foi recentemente
aumentada de 280 para 500mg/dia. (28,37)
O leite humano contém uma concentração relativamente elevada do folato na
forma de monoglutamato. A concentração de folato diminui em conseqüência da
depleção de folato maternal, de modo que a mãe tenda a ter seus estoques diminuídos
para manter a concentração de folato no leite.
(38)
Neste caso deficiências de folato
durante o aleitamento materno são pouco comuns.
A concentração de ácido fólico no leite materno depende do estado de folato da
mulher e da duração da lactação. Comparado com o colostro, o leite maduro tem uma
maior concentração desta vitamina e existem provas de que o folato do leite humano se
30
encontra em maior proporção como monoglutamato que seria melhor absorvido, o que
explicaria o melhor estado nutricional de ácido fólico de crianças alimentadas com o
leite materno.(21)
Deficiência de Ácido Fólico e Doença Cardiovascular
Altas concentrações de homocisteína são associadas ao aumento de oclusão
vascular. Erros do metabolismo da homocisteína resultam em elevação da mesma no
plasma (200-300 µmol/L), podendo ser observado especialmente na doença
tromboembólica. A diminuição de homocisteína no plasma pode impedir ou minimizar
eventos vasculares.
A elevação leve
da homocisteína (> 15 µmol/L) ocorre em 20-30% dos
pacientes com aterosclerose. Sendo normalizado com a ingestão de folato. Embora não
exista evidência quanto à disfunção endotelial o aumento de homocisteína é bem
correlacionado com aterosclerose, doença isquêmica e declínio da função renal (figura
10). (34,35,36)
Figura 10: Possíveis implicações da elevação de homocisteína plasmática. (34)
Fumo
Hipercolesterolemia
Outros
Estenose Aterosclerótica
Angina pectoris
Hipertensão
Aterosclerose
Aterosclerose e trombose
secundária
Infarto do Agudo do Miocárdio
Nefroesclerose
Aterogênese
Trobogênese
Homocisteína
Elevada
↓ Folato
↓ Vitamina B12
Genótipo TT
Outros
Trombose Arterial Primária
Infarto do Agudo do
Miocárdio
Trombose venosa
Tromboembolismo
31
Suplementação
As ingestões dietéticas adicionais recomendadas para um período pré concepção,
gestação e lactação, baseado em uma absorção de 50% do alimento, não são facilmente
atingidas sem suplementação. (6)
Estudos têm demonstrado que a suplementação de ácido fólico, desde três meses
antes da concepção até a décima segunda semana da gestação, pode prevenir os DTNs
no feto. A razão para a administração antes da gestação se deve ao fato do tubo neural
se formar entre o 25º e 27º dia após a concepção. Portanto, antes que a maioria das
mulheres saiba que estão grávidas. (12,18)
Recomenda-se suplementação diária de 0,4 a 0,8mg de ácido fólico durante o
período periconcepcional para mulheres que nunca tiveram filhos com defeitos no
fechamento do tubo neural e 4 mg par as que já tiveram filhos portados desta doença.(18)
Considerações Finais
Ferro e ácido fólico são nutrientes
fundamentais em diferentes reações do
metabolismo. Deficiências destes nutrientes, em diferentes fases da vida podem
acarretar prejuízos irreversíveis.
A suplementação de ferro e de ácido fólico durante a gestação, como comentado
anteriormente deve fazer parte da rotina especialmente de mulheres em idade fértil,
daquelas que planejam engravidar e de gestantes. Uma vez que a maioria das
deficiências e desordens do metabolismo destes nutrientes ocorre neste período.
Em crianças, a presença de sintomas relacionados a possível deficiência de ferro,
devem ser observados cuidadosamente, diagnosticados e a suplementação deve ser
realizada de forma a reverter o quadro clínico previamente instalado.
A alimentação pode prover parte
do folato e ferro necessário, porém
dificilmente alcançaria as recomendações.
A suplementação eficaz pode reduzir riscos como: defeitos no tubo neural, parto
prematuro, pré eclampsia, hemorragia pós parto, anemia ferropriva, baixo peso ao
nascer e outros distúrbios relacionadas à preservação da função vascular.
32
Referências Bibliográficas
1. Assao T Y., et al. A importância do ferro na saúde e nutrição do grupo materno infantil.
Compacta Nutrição; 2004 (3)
2. Brigide P. Disponibilidade de ferro em grãos de feijão comum(Phaseolus vulgaris L.)
irradiados. Piracicaba; 2002 [Tese de Mestrado - Escola Superior de Agricultura “Luiz de
Queiroz”, Universidade de SãoPaulo/USP]
Booth IW , Aukett MA. Iron deficiency anaemia in infancy and early childhood. Arch Dis
Child 1997;76:549-554 ( June )
4. Queiroz SS, Torres MAA. Anemia Ferropriva na Infância J. Pediatr. 2000; 76
(Supl.3):S298-S304
5. Franco G. Tabela de Composição Química dos Alimentos. 9 ed. São Paulo: Atheneu, 1998.
6. Mahan, LK, Escott-Sutmp S. Krause: Alimentos Nutrição e Dietoterapia. 9ª ed. São Paulo,
Editora Roca, 1998.
7. Dietary Reference Intakes for Vitamin A, Vitamin K, Arsenic, Boron, Chromium, Copper,
Iodine, Iron, Manganese, Molybdenum, Nickel, Silicon, Vanadium, and Zinc (2001) disponível em: http://books.nap.edu/catalog/10026.html
8. Deficiência de ferro no lactente e na criança. Anais Nestlé V. 52 1996
9. www.biologia.edu.ar/ macromoleculas/structup.htm
10. Orellana MB, Guajardo V. Actividad del citocromo P450 y sualteración en diversas
patologías Rev Méd Chile 2004; 132: 85-94
11. Germano RMA. Disponibilidade de ferro na presença do b-caroteno e o efeito dos
interferentes em combinações de alimentos. Piracicaba;2002 [Tese de Mestrado - Escola
Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de SãoPaulo/USP]
12. Ribeiro LC, Alimentação e Nutrição na Gestação. Compacta Nutrição, 3(2), 2002.
13.Carência de Ferro- Ministério da Saúde disponível em: http://dtr2001.saude.gov.br/bvs/
14. Hadler, MC, Juliano MC. Sigulem DM. Anemia do lactente: etiologia e prevalência. J.
Pediatr (Rio J), 2002, vol.78, no.4, p.321-326.
15. Brunken, GS, Guimarães, LV, Fisberg M. Anemia em crianças menores de 3 anos que
freqüentam creches públicas em período integral. J. Pediatr (Rio J), jan./fev. 2002, vol.78,
no.1, p.50-56
16. Nutrition During Pregnancy and Lactation: An Implementation Guide (1992)
33
Institute of Medicine (IOM). Dsiponível em: http://www.nap.edu/books/0309047382/html
17. Vitolo M R. Nutrição: da gestação à adolescência. Rio de janeiro: Reichmann & Affonso
Editores, 2003.
18. Ramos SC. Nutrição na Gestação. In: Magnoni D. Cukier C. Perguntas e Respostas m
Nutrição Clínica. 2 ed. São Paulo: Roca, 2004
19. Fujimori E., et al. Anemia e deficiência de ferro em gestantes adolescentes.Rev Nutr,
Campinas, 13(3): 177-184, set.,/dez., 2000
20. Suplementação com micronutrientes em mulheres grávidas e lactantes. Disponível em:
http://www.medicinafetalonline.com.br/Moron/Micron_allen.doc 05/04/2005
21. Ribeiro L C, et al. Ácido Fólico:sua importância em situações fisiológicas do ciclo vital.
Compacta Nutrição.
22. Melo GJO. A importância do ácido fólico para o desenvolvimento embrionário e seu papel
protetor de ocorrência de gestações afetados por defeitos no tubo neural. Cadernos
Interdisciplinares: Saúde Tecnologia e Questão Social; 2004(1) v.1
23. Czeizel AE. Vitaminas na gravidez e na primeira infância. – Ácido Fólico. Anais Nestlé
1996; (53)
24. www. biopscologia.net
25. Vannucchi H., Jordão Jr AA. Vitaminas hidrossolúveis.In: Dutra-de-Oliveira, JE,
Marchini JS . CiênciasNutricionais. São Paulo: Sarvier, 1998. p.191-207.
26. Bailey LB, Gregory JF. Folate metabolism and requeriments. J. Nutr. 1999; 129:779-782
27. Forssén KM, et al. Folates and Dairy Products: A Critical Update. Journal of the
American College of Nutrition 2000 (19):2, 100S–110S
28. Dietary Reference Intakes for Thiamin, Riboflavin, Niacin, Vitamin B6, Folate, Vitamin
B12,
Pantothenic
Acid,
Biotin,
and
Choline
Disponível
em:
http://www.nap.edu/catalog/6015.html
29. Lamers Y. Langenohl RP, Moser R, Pietrzik K. Supplementations with [6S]-5methiytetrahydrofolate or folic acid equally reduces total homocysteine concentrations in
health women. Am J Clin Nutr 2004:73 473-8
30. Picciano MF. Pregnancy and Lactation: Physiological Adjustments, Nutritional
Requirements and the Role of Dietary Supplements. J. Nutr. 2003; 133: 1997S–2002S
31. Scholl TO. Johnson WG. Folic acid: Influence on the outcome of pregnancy. Am J Clin
Nutr 2000;71(suppl):1295S-303S
34
32. Fall CHD., et al. Micronutrients and Fetal Growth. J. Nutr. 2003; 133:1747S-1756S
33.Folato disponível em:
http://www.nlm.nih.gov/medlineplus/spanish/ency/esp_imagepages/19086.htm
34. Brattström L. Wilcken DL. Homocysteine and cardiovascular disease: cause or effect?
Am. J. Clin Nutr, 2000; 72: 315 – 323
35.Homocysteine Studies Collaboration Homocysteine and Risk of Ischemic Heart Disease
and Stroke: A Meta-analysis JAMA, Oct 2002; 288: 2015 - 2022.
36. Bree A. Verschuren WMM, Blom H. Kromhout D. Association between B vitamin intake
and plasma homocysteine concentration in the general Dutch population aged 20–65 y. Am J
Clin Nutr 2001;73:1027–33.
37. Picciano MF. Iron and folate supplementation: an effective intervention in adolescent
femalesAm J Clin Nutr 1999;69:1069–1070.
38. Allen LH. Supplement: Nutrient Composition for Fortified Complementary Foods B
Vitamins: Proposed Fortification Levels for Complementary Foods for Young Children. J.
Nutr. 2003; 133:3000S-3007S
35
Download

Ferro e Ácido Fólico