O DISCURSO ESTÉTICO DO CORPO NA MÍDIA E NA LITERATURA: AVALIAÇÃO DO AUTOCUIDADO EM MULHERES ADULTAS Deyliane Aparecida de Almeida Pereira 1 UFV [email protected] Leonice Aparecida Doimo 2 UFV Resumo: O Discurso Estético do Corpo na Mídia e na Literatura – avaliação o autocuidado da mulher adulta caracteriza-se metodologicamente por uma pesquisa bibliográfica que constam dos referenciais literários (Livros Científicos, Revistas, Jornais, Periódicos) e midiáticos (Televisão, Fotografias, Gravuras, Cinema) sobre o culto à beleza, a boa forma e o autocuidado, corpo magro e alto, malhado, sem gordura e sem celulite, ou seja, no julgamento entre o bom, o mau e o feio – a estética e a cultura corporal – está em alta neste momento. Produto social, cultural e histórico, o corpo que a sociedade atual fragmenta e compõe, regula seus usos, formas, normas e funções revelam questões dispares e extremas da construção do feminino - o corpo da mulher. Nos últimos anos, a mulher brasileira viveu diversas transformações físicas. Palavras - chave: Mulher, Corpo, Autocuidado. INTRODUÇÃO O Discurso Estético do Corpo na Mídia e na Literatura – avaliação o auto-cuidado da mulher adulta revela questões dispares e extremas da construção do feminino - o corpo da mulher. Consta dos referenciais sobre o culto à beleza e a boa forma, corpo magro e alto, malhado, sem gordura e sem celulite, ou seja, no julgamento entre o bom, o mau e o feio – a estética e a cultura corporal – está em alta neste momento. Produto social, cultural e histórico, o corpo que a sociedade atual fragmenta e compõe, regula seus usos, formas, normas e funções. Nos últimos anos, a mulher brasileira viveu diversas transformações físicas. Mary Del Priori observa esta passagem da construção do corpo feminino como “obsessiva e carregada de ansiedade” em “Corpo a Corpo com a Mulher” 3 Segundo esta autora, o ponto culminante foi quando a mulher se despiu no decorrer do século XX – a roupa curta com as partes corporais mais amostra, as transparências e o nu na mídia, nas televisões, nas revistas e nas praias, incentivou o desvelar do corpo em público. Muitas 1 Pereira, D. A. A. Graduanda em Licenciatura e Bacharel na Universidade Federal de Viçosa – Viçosa/MG, Bolsista PIBIC/CNPQ 2008-2009 e 2009-2010, Membro do Grupo de Estudos da Construção das Condutas Atléticas – UFV/DES. Email: [email protected] 2 Orientadora do Projeto “O DISCURSO ESTÉTICO DO CORPO NA MÍDIA E NA LITERATURA: AVALIAÇÃO DO AUTO-CUIDADO EM MULHERES ADULTAS” PIBIC 2009/2010. O Projeto recebe co-orientação da Profa. Dra. Marizabel Kowalski (UFV-MG) 3 Del Priori, M. Corpo a Corpo com a Mulher. São Paulo: Senac, 2000. soluções foram propostas e aceitas – cremes, vitaminas, silicones e colágenos – a pele tonificada, alisada, limpa, apresenta-se como uma nova forma de vestimenta, que não enruga nem amassa, a não ser pelo passar dos anos. A transfiguração das imagens do corpo e o auto-cuidado e o cuidado de si mesmo é a questão tratada neste estudo, abordada sociologicamente, visa a reflexão sobre os parâmetros sócio-cultural e histórico. Ser esteticamente perfeito parece impossível, tanto às mulheres quanto os homens, todos são extremamente insaciáveis e a forma física, muitas vezes, aparece como uma falsa medida de saúde. Ao observarmos a literatura vemos um corpo transformado e transtornado por dietas e exercícios e perguntamos - quais são os limites entre a saúde e a doença Enaltecemos também os usos e costumes modificados da alimentação, das maquiagens e adereços, ritos religiosos, tecnologias e facilidades, higiene, saúde, economia, socialização e política AUTOCUIDADO E O CUIDADO DE SI MESMO: OREM & FOCAULT O tema do Cuidado de si mesmo foi abordado de forma específica no livro “A hermenêutica do sujeito” de Focault, momento em que há apropriação por parte do Estado das formas possíveis de viver e de morrer. Esta estatização da vida biológica é conhecida como biopoder, produz-se um esvaziamento da subjetividade e do direito sobre o próprio corpo. Viver entra no campo do controle do saber e das intervenções do poder. Como forma de resistir aos embates e processos de (des) subjetivação por parte do Estado, os sujeitos realizam trabalhos vinculados ao cuidado de si, as biopolíticas. A expressão “cuidado de si mesmo” é usada por Focault para referenciar e traduzir uma noção complexa e rica que os gregos utilizavam para designar uma série de atitudes ligadas ao cuidado de si mesmo, ao fato de ocupar-se e de preocupar-se consigo que é a de epiméleia heautoû. A epiméleia heautoû é o modo de encarar as coisas, de estar no mundo, de praticar ações, de ter relações com o outro; certa forma de olhar para si mesmo; de ações que são exercidas de si para consigo pelas quais nos assumimos nos modificamos, nos purificamos, nos transformamos e nos transfiguramos. Práticas subjetivantes que permitem o autoconhecimento. Isto significa, por um lado, poder construir uma cultura de si que consiga testar a capacidade de um indivíduo se manter independente em relação ao mundo exterior e, por outro, um indivíduo poder ter um objetivo espiritual, ou seja, poder produzir certa transfiguração de si mesmo enquanto sujeito de conhecimentos verdadeiros. De acordo com a Teoria de Orem, a Teoria da Enfermagem do Déficit de Autocuidado, o autocuidado descreve e explica a prática de cuidados executados pela pessoa portadora de uma necessidade para manter a saúde e o bem-estar e que os seres humanos distinguem-se dos outros seres vivos por sua capacidade de refletir sobre si mesmos e seu ambiente, simbolizar o que vivenciam e utilizar criações simbólicas no pensamento, na comunicação para fazer coisas que são benéficas para si mesmos e para os outros. A partir dessa perspectiva, a saúde é um estado de totalidade ou integridade que inclui o corpo, as reações emocionais, o desenvolvimento mental, as atitudes e as razões; é um estado de integridade e inteireza que os indivíduos avaliam constantemente. É a forma pela qual uma pessoa manifesta sua existência, seu processo de vir a ser. Vir a ser pessoa é uma tarefa processual, enquanto coexistência com outros. Envolve comunicação com mundo, ações, o exercício do desejo humano de saber, de busca da verdade e de fazer o bem a si mesmo e aos outros. Autocuidado é um dos aspectos do viver saudável. É a realização de ações dirigidas a si mesmo ou ao ambiente, a fim de regular o próprio funcionamento de acordo com seus interesses na vida; funcionamento integrado e bem-estar. As ações de autocuidado constituem a prática de atividades que os indivíduos desempenham de forma deliberada em seu próprio benefício com o propósito de manter a vida, a saúde e o bem-estar. Essas ações são voluntárias e intencionais, envolvem a tomada de decisões, e têm o propósito de contribuir de forma específica para a integridade estrutural, o funcionamento e o desenvolvimento humano. Constituem a capacidade humana ou o poder de engajar-se no autocuidado. Essas ações afetadas por fatores básicos, tais como idade, sexo, estado de desenvolvimento e de saúde, orientação sócio-cultural, fatores do sistema de atendimento à saúde – modalidades de diagnóstico e de tratamento, fatores familiares, padrões da vida, como por exemplo, engajamento regular em atividades, fatores ambientais, adequação e disponibilidade de recursos. As ações de autocuidado têm certos propósitos a serem alcançados, denominados de requisitos de autocuidado, os quais foram classificados em universais, de desenvolvimento e de desvio de saúde. Os requisitos universais são comuns a todos os seres humanos, como por exemplo, a manutenção de um suprimento suficiente de ar, água e alimentos; provisão de cuidados associados com os processos de eliminação; manutenção do equilíbrio entre atividade e repouso, entre outros. Os requisitos de desenvolvimento são tanto expressões especializadas de requisitos universais de autocuidado particularizadas por processos de desenvolvimento quanto novos requisitos, derivados de uma condição − gestação, ou associados a algum evento na vida da pessoa, como por exemplo, a perda de um parente. Finalmente, os requisitos no desvio de saúde são exigidos em condições de doença, lesão ou como conseqüência de medidas médicas para diagnosticar ou corrigir uma condição. Nesse sentido, o cuidado de si mesmo é uma atitude ligada ao exercício da política, a certo modo de encarar as coisas, de estar no mundo, de relacionar-se com o outro e consigo mesmo; de agir de si para consigo, de modificar-se, purificar-se, se transformar, e transfigurar-se. Esta forma de cuidar-se remete o sujeito à reflexão sobre seu modo de ser e agir, conferindo ao cuidado de si, além de uma dimensão política, uma noção da ética como estética da existência. Por outro lado, o autocuidado é vinculado à saúde humana, embora esteja referido ao exercício do desejo humano de saber, de busca da verdade e de fazer o bem a si mesmo e aos outros. Esse fato também confere ao autocuidado uma dimensão ética, mesmo que vinculado fortemente a um dos aspectos do viver saudável. O autocuidado é a realização de ações dirigidas a si mesmo ou ao ambiente a fim de regular o próprio funcionamento de acordo com seus interesses na vida, funcionamento integrado e bem-estar. As ações de autocuidado constituem a prática de atividades que os indivíduos desempenham de forma deliberada em seu próprio benefício com o propósito de manter a vida, a saúde e o bem-estar. DISCURSO ESTÉTICO DO CORPO NA MÍDIA E NA LITERATURA: CONTRADIÇÕES E AMBIGUIDADES DE UM DISCURSO VOLTADO PARA A PROMOÇÃO DA SAÚDE O ser humano desde sempre defendeu a apologia da saúde, enuncia-se como a preocupação de fazer sentir à população quotidiana, a necessidade do movimento corporal como fator implicativo na luta pelo bem-estar existencial. Desde os tempos antigos o homem teve especiais cuidados com o seu corpo. Aludindo, de forma superficial, à cultura da antiguidade grega, considerada como o período que mais contribuiu para a edificação da sociedade moderna, e os dias de hoje, no que respeita à influência da educação física na sociedade, podemos tecer algumas considerações pertinentes. Em Atenas as origens do pensamento atual surgem-nos já um conceito de educação liberal, humanista, misto de uma conjunção de vários fatores: desenvolvimento harmonioso quer do corpo quer da alma, numa perspectiva estética, artística, de procura da beleza. Integrava exercícios físicos, higiene e formação do caráter e cultivo do valor. O próprio Estado contribuiu de forma indubitável para a exeqüibilidade desta mentalidade ao permitir e estatuir a proliferação de vários ginásios, dos quais se destacam pela influência que tiveram a Academia e o Liceu, de Platão e Aristóteles respectivamente. Nos últimos anos surge uma nova cultura, que preconiza, sobretudo a mudanças estruturais, nos hábitos, nos costumes e nos estilos de vida das sociedades. Revela preocupação com a forma física, a aparência facial e o bem estar emocional proporcionado por estes tratamentos para que todos estejam de bem com ele e que sejam vistos e apreciados pelos outros. A importância destes investimentos é bem maior quando o cliente se satisfaz com o que conseguiu com seu esforço e dedicação, pois muitos deles não escapam a sacrifícios para tentar mantê-los belos e formosos, seduzindo e seduzidos por uma boa aparência, no caso, os corpos individuais, que são adornados, emperiquitados, que são construídos, que são cosmetizados em excesso, a sala de musculação, o salão de cabeleireiro e as modas de vestir estão aí para prová-lo, esses corpos se espiritualizam, angelizam-se. Basta ver a voga da dietética, a busca da juventude que faz furor, o desenvolvimento da meditação ou das diversas técnicas da “new age”, para se convencer disso. Após dois séculos de lógica contábil, onde denominou a economia mundial como economia em si, parece que, alguns decênios, todos os valores se inverteram. Em primeiro lugar a liberação dos corpos e do sexo, que desembocou na liberdade do corpo e do sexo, o que é sensivelmente diferente, pois a primeira colocação (liberação dos corpos e do sexo) ainda está numa lógica instrumental, que vai servir-se do corpo e do sexo, a segunda tende a acalmar o corpo e o sexo, ela não instrumentaliza, tampouco os ultrapassa, como um certo moralismo desejaria fazer crer, mas os torna mais simples, isto é, que sejam vividos em si mesmos, por si mesmos, acentuando o presente, o evento, em uma palavra, o estar vivo. Assim vivenciados, o corpo e esse sexo exprimem uma espécie de pureza, situada bem além da angústia do pecado, do sentimento de culpa, e outras lógicas do dever-estar que isso não deixa impulsionar. Expressões triviais, como “estar bem com seu corpo”, “estar bem com sua cabeça”, ou, de uma maneira um tanto vulgar, “estar na sua”, são esclarecedoras a este respeito. As visões de mundo subjetivas parecem explicar a solidez, e, ao mesmo tempo, a desenvoltura de uma postura corporal que não pode ser separada de uma atitude intelectual, até mesmo poética. Por uma forma de transubstanciação, pode-se dizer que o mental jorra do material. É assim que, nas nossas reflexões sobre o problema do hedonismo (busca pelo prazer), parece ser o nascimento pelo qual a vasta matriz universal da fisiologia quando esta tenta parar a vida psíquica, ou seja, trata-se de uma idéia geral que se aplica bem à embriaguez erótica, mas que se pode sem medo extrapolar para o ambiente hedonista dionisíaco, que abrange em certas épocas, a vida de todos os dias. A nossa, certamente, é deste tipo, e é assim que essa transubstanciação se torna completamente banal. O que também torna, de muitas maneiras, porosas as barreiras e mais frágeis as separações entre o sonho e a realidade, a natureza e a cultura, o corpo e o espírito. De fato, o próprio dessa “vida psíquica” ou desse “mental” que jorra da matéria, do corpo, e que nos modifica em uma coisa completamente diferente, é certamente o ser abrangente, restaurando, de maneira orgânica, a globalidade que o racionalismo tinha cortado em rodelas. Em suma, a imagem do imaginário popular, as imagens imateriais, passando pelos desenhos, sempre foi um lugar de refúgio, uma maneira de viver a dissidência, a expressão dessa utopia renovada, que é a busca de uma socialidade perfeita ou, pelo menos, de uma socialidade onde o peso do constrangimento e da necessidade seja menor. Donde os sonhos, os desejos e as fantasias que ela não deixou suscitar, dos quais sempre desconfiaram todos os poderes eclesiásticos, políticos e intelectuais. A mais bela escapada está inscrita no âmago da imagem que se tem do corpo. Ela sempre remete a um alhures supostamente melhor (nos momentos de revolta, de revolução ou de uma mudança importante de conceitos morais), alhures que se pode imaginar, no cinema, na mídia, na publicidade, nos quadrinhos, na poética e na erótica, despertando o sentimento de pertença a uma cultura da casa. A imagem do corpo, nesse sentido, não é de maneira alguma uma duplicação da realidade, ela tampouco é o reflexo de uma infra-estrutura a qual pertenceria toda a realidade. A indústria cosmética atinge todos os setores da sociedade, instauram-se uma verdadeira fábrica de corpos (padronização de corpo e globalização do gosto e dos valores de beleza). Este fato decorre do surgimento de: “uma indústria altamente diversificada e em crescimento que procura atender gregos e troianos, elites consumidoras e consumidores populares. Temos cremes de 3 reais e de 300; academias de 25 reais e de 250, tratamento de cabelo de 10 e de 300 e uma variabilidade de preços nas intervenções médicas” (LOVISOLO). Outorga um novo sentido de sociabilidade, onde há predomínio da busca pela realização imediata e a busca do hedonismo pelo indivíduo. O consumo de artefatos, que antes supérfluo, tornam-se fundamentais para o “autocuidado” e/ou “cuidado de si mesmo”. A imagem idealiza-se em aparência física: corpos atraentes, bonitos, altos, tonificados, magros, em boa forma, malhados, sem gorduras e celulite – o “julgamento entre o bom, o mau e o feio... estão em alta na sociedade” (KOWALSKI). Revistas reproduzem sempre o mesmo modelo, criam manequins de loja ou bonecas de plástico e não mulheres reais. Assim, o segredo das construções corporais atuais, seja pela via da cirurgia plástica seja pela via do photoshop (e em ambos os casos, contando com bons diretores e bons fotógrafos para a produção das melhores poses e ângulos) está em saber olhar o imaginário que viemos a chamar de “a beleza feminina”. Enaltecemos também os usos e costumes modificados da alimentação, das maquiagens e adereços, ritos religiosos, tecnologias e facilidades, higiene, saúde, economia, socialização e política. Estas observações preliminares do estudo possuem pelo controle de comportamento, da conduta e do habitus no processo de civilização de Norbert Elias cultuando o padrão estético imposto à mulher pela cultura. Entretanto, afirmamos que em todas as sociedades, o corpo tem uma realidade social e uma física. Isso significa que a forma, o tamanho (dimensões) e os adornos podem transmitir informações sobre a posição da pessoa na sociedade, inclusive sua idade, gênero, ocupação e ligação a certos grupos, tanto religiosa como seculares, assim exploramos Savarin e Lovisolo na busca pela JUBESA – Juventude, Beleza e Saúde. CONCLUSÕES A tirania da perfeição física empurrou a mulher não para a busca de uma identidade, mas de uma identificação, ao mesmo tempo, que se reconhece à importância da saúde como fonte de prazer, a medicina tem feito inúmeros avanços para aumentar o bemestar, muito mais para dissolver a velhice e prolongar a vida. A transfiguração das imagens do corpo é a questão tratada neste estudo, abordada sociologicamente, visa a reflexão sobre os parâmetros sócio-cultural e histórico. No contexto sócio-cultural a magreza é o vínculo à estética corporal como conceito de beleza e pontua os fatores culturais e sociológicos. O discurso estende-se desde as pequenas cidades às metrópoles ser “Top”, estar “Top”. Mas como chegar a perfeição estética? Este parâmetro conduz a algumas relevâncias como, por exemplo: o que é ser gordo ou ser magro no imaginário social! Já o parâmetro histórico destaca o extremo da curva da construção do corpo feminino cuja pretensão é a análise do discurso estético que submete aqui a um questionamento – o estilo esguio; esbelto e o culto à magreza são modismos equivocados do mundo moderno na avaliação do auto-cuidado da mulher adulta? As observações preliminares do estudo estão presentes no controle de comportamento, da conduta e do habitus no processo de civilização de Norbert Elias cultuando o padrão estético imposto à cultura da mulher. Entretanto, afirmamos que em todas as sociedades, o corpo tem uma realidade social e uma física. Isso significa que: a) A forma, o tamanho (dimensões) e os adornos podem transmitir informações sobre a posição da pessoa na sociedade, inclusive sua idade, gênero, ocupação e ligação a certos grupos, tanto religiosos como seculares. b) A pesquisa na Educação Física sugere uma antecipação, pelo menos, no plano das preocupações em relação ao movimento atual pela saúde e pelo prolongamento da vida, incluindo as elaborações da Biotecnologia, do Esporte, da Sociedade e do auto cuidado através das Ciências da Saúde; área explorada que forma um interessante campo de estudos na elucidação dos limites entre a saúde e a doença na utilização de métodos (invasivos e evasivos) como meio na busca do corpo perfeito. c) Avançamos também no sentido de entendermos melhor os mecanismos de reapropriação das propostas da Antropologia Bio-Cultural e de outras formas de atuação da Educação Física, pois o que caracteriza o homem é o fato dele necessitar continuamente estar produzindo sua existência estética, pois é o único animal a subjugar – o alto e o baixo, o belo e o feio como caracteres da beleza humana. Iniciamos a análise dos parâmetros interpretativos entre imagens midiáticas do corpo na moda e as mudanças ocorridas no perfil das mulheres, determinantes para a construção do modelo estético do III milênio. No discurso ético e social dos profissionais da estética corporal e do esporte e sua influência sociológica singular da cultura (costumes e tradições) em transformação, questionamos os limites entre a saúde e a doença. Compreendemos sociologicamente explicações relevantes para a “magreza” como padrão estético atual versus fatores culturais brasileiros no discurso do auto-cuidado das mulheres. Os desvios corporais de peso, em relação aos padrões considerados normais, e em especial a obesidade ou gordura, tornaram-se um inimigo combatido por uma forte aliança de interesses, abrangendo desde o Estado, as companhias seguradoras, a indústria, os profissionais da área da saúde e, de modo geral, as diversas organizações e profissionais participantes do que poderíamos denominar movimento pela saúde. Atualmente, a obesidade, a inatividade corporal e o fumo são os grandes inimigos do movimento que aposta na saúde, mediante a formação de hábitos de alimentação, atividade corporal e controle de estimulantes, principalmente, o fumo, o álcool e as drogas. O valor da saúde, eixo central do movimento (entendido como elevação da esperança de vida ou longevidade, manter a forma, fitness e o aumento da qualidade de vida), expande-se pelo mundo, associado numa esportivização da cultura, particularmente, através dos estilos de vida apresentados como novos e mediados por novos hábitos, formas de pensar e sentir as relações com o corpo. Trata-se, no seu sentido mais amplo, da construção dos “eus”, de identidades individuais ou subjetividades nas quais os novos complexos de relações com os corpos passaram a ser centrais e integrantes, portanto, do nosso cotidiano. De praxe, a emergência de novos hábitos alimentares e de atividade corporal, que acompanham as argumentações desenvolvidas no movimento pela saúde, possuem fundamentos de tipo técnico englobados por valores estéticos e morais 4 . Os esforços por 4 O argumento técnico especifica os meios racionais para atingirmos objetivos. Os argumentos técnicos podem ter uma base empírica ou científica. A correlação positiva, de um lado, gordura, fumo e inatividade formar e manter hábitos prolongados da vida, mantenedores da boa forma física e que aumentem sua qualidade, apenas pode encontrar seus sentidos em valores estéticos e morais. Os objetivos da longevidade ou de fitness, por exemplo, apenas fazem sentido em relação a valores. Não se encontra no mundo da natureza esse objetivo e a interpretação neodarwiniana da teoria da evolução 5 somente apresentam como objetivo natural a reprodução genética, raramente realizado por meio da prolongação da vida. (embora possam ser apresentados como naturais, os objetivos em pauta ancoram seus significados em valores, em movimentos ou jogos, portanto, da cultura). No plano dos valores morais, além do imperativo de manter a saúde, conservar e prolongar a vida, os esforços de construção e de manutenção de novos hábitos pareceriam vincular-se ao valor moral do autocontrole, quer dizer, ao valor da “mente” ou “consciência” ou “superego” em controlar os impulsos (pelos alimentos, estimulantes e inatividade) dos “corpos” 6 . Por conseguinte, o movimento pela saúde surge, prima fácil, como conscientizador ou moralizador das relações que os indivíduos mantêm com seus corpos. Uma certa falha moral tenderia a ser associada aos indivíduos que não cuidam de seus corpos, que perdem o controle de demandas, fisiológicas ou psicológicas, excessivas. Dizer autocontrole significa dizer autonomia em relação a demandas socialmente caracterizadas como vícios. A gordura, por exemplo, poderia ser associada à falta de temperança; valor significativo há um par de séculos atrás, embora os termos; autocontrole e equilíbrio no horizonte da autonomia do indivíduo; descrevam os objetivos da ação no presente. Então, traduzida para a nossa linguagem, a gordura parece estar associada à falta de domínio sobre si mesmo, de autocontrole e de equilíbrio entre as entradas e saídas, consumo e gasto. Em outros termos, possuir hábitos considerados agressivos e violentos para o corpo, mesmo no caso de se reconhecer serem gerados pela inércia do próprio corpo em interação com o social, figura-se como sendo uma conduta moralmente questionável. Há por certo, muitos críticos dos valores estetizantes do corpo. Basicamente, acham imoral que poderosos esforços de alimentação, atividade corporal, ingestão de produtos químicos, uso de cosméticos, realização de cirurgias entre outros, sejam realizados pelos indivíduos, e especialmente pelas mulheres, para atingirem padrões corporais esteticamente valorizados. Tais esforços seriam imorais, pois os indivíduos abandonariam sua autonomia para aceitarem padrões estéticos externos, entregando-se à dominação de uma sociedade consumista. Entretanto não raro, esses mesmos críticos se apóiam em apelos em favor da saúde, pois consideram que esses esforços estetizantes também significam uma violência, uma agressão contra a saúde do corpo dos indivíduos e seu efeito negativo extremo poderia ser a anorexia. corporal, com doenças cardiovasculares, do outro, possui uma base empírica. Não está provado que a presença de um dos dois elementos mencionados estejam associados significativamente com as doenças cardiovasculares. O argumento teria uma base científica se os mecanismos que subjazem à correlação estivessem claramente explicados. Os objetivos são de praxe, traduções de valores morais ou estéticos. Há escolha valorativa entre desenvolver hábitos alimentares e de atividade corporal vivenciados como custosos, ou entregar-se aos prazeres da mesa e da inatividade. A escolha apenas pode ancorar-se valorativamente (valor da saúde, do autocontrole, das formas corporais entre outros). De fato, quando realizamos uma escolha, habitualmente em contexto de incerteza, tendemos a aceitar e formular argumentos que a reforcem. Cf. LOVISOLO (1995). 5 NEUMAN, A. As Cartas de Charles Darwin. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. 6 O termo “corpos” está aqui sendo usado de modo metafórico. De fato, o problema é que os “corpos” não pareceriam contar com mecanismos de auto-regulação para a ingestão de alimentos, o consumo de estimulantes e a entrega à inatividade. Assim, os “corpos” pareceriam poder entregar-se com facilidade a “consumos” que os destruiriam. Devemos levar em consideração que a formação de novos hábitos demanda altos custos no imediato, que apenas podem ser compensados pelas expectativas de futuros benefícios compensadores. No cotidiano, os argumentos morais, estéticos e técnicos aparecem entremeados e os indivíduos geram misturas, embora com ênfases circunstanciais, desses argumentos nos processos de construção de seus “eus” e de suas “imagens sociais”. Neste texto, o que pretendo fazer é sugerir as hipóteses de que: a) Os argumentos técnicos não avançaram significativamente nos últimos duzentos anos; b) Tampouco avançaram significativamente as recomendações básicas de controle da obesidade e c) O argumento estético, talvez, tenha preeminência história sobre o moral na estratégia de desenvolvimento do autocontrole. Em relação ao ponto “c” diria que a estética do corpo foi um poderoso ardil, particularmente sobre os jovens, sobretudo para abrir caminho dos argumentos morais do movimento pela saúde. O que se pode afirmar é que o corpo ocidental está em plena metamorfose. Não se trata mais de aceitá-lo tal como ele é, mas sim de corrigi-lo, transformá-lo e reconstruí-lo. O indivíduo contemporâneo busca em seu corpo uma verdade sobre si mesmo que a sociedade não consegue mais lhe proporcionar. Na falta de realizar-se em sua própria existência, este indivíduo, homem, mulher, ou seja, quem tiver outra opção, procura realizar-se através de seu corpo. Ao mudá-lo, ele/ela buscam transformar a sua relação com o mundo, multiplicando os seus personagens sociais baseados em modelos forjam sua representação. A body art já pode ser vista nas ruas. A sociedade do espetáculo, cada vez mais poderosa, erige a aparência física em dever e responsabilidade de cada indivíduo. A profundeza do “eu” encarna-se à flor da pele, o corpo torna-se lugar da salvação, sendo uma forma de não passar despercebido, uma maneira de destacar-se na cena social. Quando o laço social se desfaz, quando o individualismo se expande, somente o olhar do outro pode nos proporcionar uma verdadeira existência social. A mise-en-scène da aparência se transforma assim num imperativo. Mas não podemos esquecer que o corpo tem alguém como recheio. Quem é você neste corpo? Que corpo você está usando ultimamente? Que corpo está representando você no mercado das trocas imaginárias? Que imagem você tem oferecido ao olhar alheio para garantir seu lugar no palco das visibilidades em que se transformou o espaço público no Brasil, na televisão, na sua cidade e na sua academia? Que recursos você utilizou e utiliza? O que as clínicas cirúrgicas e estéticas podem oferecer? O que a sociedade cobra? Qual o preço de seu corpo-imagem? Fique atento, pois o corpo que você usa e ostenta vai dizer quem você é! Pode determinar oportunidades de trabalho. Pode significar a chance de uma rápida ascensão social. Acima de tudo, o corpo que você veste, preparado cuidadosamente à custa de muita ginástica, aperfeiçoado por meio de modernas intervenções cirúrgicas e bioquímicas, o corpo que resume praticamente tudo o que restou do seu ser é a primeira condição para que você seja feliz!!?? Não porque ele seja o corpo, a sede pulsante da vida biológica. Não porque possua uma vasta superfície sensível ao prazer do toque – a pele, esse invólucro tenso que protege o trabalho silencioso dos órgãos. Não pela alegria com que experimentamos os apetites, os impulsos, as excitações, a intensa e contínua troca que o corpo efetua com o mundo. O corpo-imagem que você apresenta ao espelho da sociedade vai determinar sua felicidade não só por despertar o desejo ou o amor de alguém, mas por constituir o objeto privilegiado do seu amor próprio: a tão propalada auto-estima, a que se reduziram todas as questões subjetivas na cultura do narcisismo. Nesses termos, o corpo é ao mesmo tempo o principal objeto de investimento do amor narcísico e a imagem oferecida aos outros – promovida, nas últimas décadas, ao mais fiel indicador da verdade do sujeito, da qual depende a aceitação e a inclusão social. O corpo é um escravo que devemos submeter à rigorosa disciplina da indústria da forma (enganosamente chamada de indústria da saúde) e um senhor ao qual sacrificamos nosso tempo, nossos prazeres, nossos investimentos e o que sobra de nossas suadas economias. REFERÊNCIAS Barnard, M. Moda E Comunicação. Rio De Janeiro: Rocco, 2003. Boa Forma. Janeiro de 2003. Bollon, P. A Moral Da Máscara. Rio De Janeiro: Rocco, 1993. Braune, F. 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