ECONOMIA SOLIDÁRIA: O COOPERATIVISMO COMO FERRAMENTA PARA O DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL. Hérica Ghislânia Guimarães Pires Cabral, UEPB. [email protected] Ivana Milena Sales Rolim de Vasconcelos, UEPB. [email protected] José Pires de Oliveira Junior, UFPB. [email protected] RESUMO O artigo traz uma reflexão sobre a COOPART, cooperativa de produção artesanal, localizada no cariri paraibano, na cidade de Boqueirão. A mesma foi fundada no dia 02 de fevereiro de 2006 e atualmente tem como presidente o Sr. Valdeilson Albuquerque Silva. Com o objetivo de geração de renda e desenvolvimento, atualmente opera com 25 cooperados, com renda média mensal de novecentos reais, o que significa 25 famílias beneficiadas. A cooperativa trabalha com o artesanato a partir do algodão colorido, tendo como fabricação as redes, tapetes, mantas, jogo americano e kit para banheiro. A produção se dá através do tear manual e elétrico, sendo 80% da produção, artesanal. A reflexão se estabelece a partir de uma visita, que configurou-se como visita técnica, com o cunho de avaliar a proposta de desenvolvimento local desenvolvida pela cooperativa. Para tanto, realizou-se ação conversacional, observando-se as atividades desenvolvidas, fotografando e filmando as situações de trabalho. O estudo analisa a gestão administrativa, social e ambiental desenvolvida na cooperativa e discute como a atividade pode se tornar um meio para incentivar o crescimento da renda dos cooperados e assim contribuir para promoção do desenvolvimento local sustentável. Palavras-chave: Cooperativa, Desenvolvimento Local, Sustentabilidade. INTRODUÇÃO Apesar da longa história e de sua importância socioeconômica, o cooperativismo é ainda pouco compreendido. Existe ainda uma deficiência no modo como se vê o cooperativismo, pesquisas comprovam que a suas características sociais e dinâmicas ainda não são atingidas em sua extensão. Para entender melhor este fenômeno, do cooperativismo, o artigo apresenta uma reflexão acerca de um projeto da COOPART, cooperativa de produção artesanal, localizada no cariri paraibano, na cidade de Boqueirão. Esse estudo se estabelece a partir de uma visita técnica em maio de 2010 com o objetivo de conhecer o trabalho realizado na Cooperativa em estudo, visando analisar como se dá o processo administrativo e de que forma sua atividade pode ou vem a contribuir para o desenvolvimento social e humano e consequentemente, o desenvolvimento econômico local. A COOPART traz como objetivo maior incentivar e manter viva o artesanato local, evitando assim a extinção dos “TEAR”, ferramenta tão utilizada para a produção de redes, contribuindo assim para a geração de renda e para o desenvolvimento local. A arte a partir do algodão colorido também é desenvolvida nas cidades de Campina Grande, São Bento, Aparecida, entre outras cidades paraibanas. O desenvolvimento desta pesquisa junto a cooperativa se justifica pela importância da atividade artesanal para a cidade, pela necessidade de preservação dessa cultura e por ser uma forte ferramenta para do desenvolvimento sustentável local. Cooperativa, segundo o conceito do cooperativismo, é uma associação autônoma de pessoas que se unem, por vontade própria, para satisfazer anseios e necessidades econômicas, sociais e culturais comuns, por meio de uma empresa de propriedade coletiva e administrada de forma democrática. De acordo com vários estudiosos, as cooperativas baseiam-se em valores de ajuda mútua e responsabilidade, democracia, igualdade, equidade e solidariedade, onde os membros acreditam nos valores éticos da honestidade, transparência, responsabilidade social e preocupação pelo seu semelhante. Desta forma, a presente pesquisa vem a analisar como se dá a gestão administrativa, social e ambiental desenvolvida na cooperativa e discute como a atividade pode se tornar um meio para incentivar o crescimento da renda dos cooperados e assim poder contribuir para promoção do desenvolvimento local sustentável. OBJETIVO O objetivo principal deste artigo é refletir sobre a atuação da COOPART, cooperativa de produção artesanal situada na cidade de Boqueirão, PB, analisando a gestão administrativa, social e ambiental desenvolvida na cooperativa e discutindo como a atividade pode se tornar um meio para incentivar o crescimento da renda dos cooperados e assim contribuir para promoção do desenvolvimento local sustentável. METODOLOGIA Para atingir o objetivo deste artigo foi necessário a realização de uma revisão bibliográfica e uma pesquisa documental sobre cooperativismo, artesanato e sustentabilidade. Após a pesquisa bibliográfica foi necessária uma visita na COOPART, que se configurou como visita técnica. Nesta ocasião, os cooperados forma entrevistados, de modo informal, através de entrevistas semi-estruturadas, para assim poder dar embasamento a pesquisa. O objetivo foi colher o máximo de informações sobre as atividades desenvolvidas, produtos fabricados, renda média mensal e a forma como se desenvolve a atividade na cooperativa em estudo. Além das entrevistas, houve todo o processo de visualização da forma de trabalho da cooperativa, que serviu de base para os resultados alcançados. RESULTADO A cidade de Boqueirão está localizada no interior paraibano, foi fundada por volta de 1664/65, por Antônio de Oliveira Lêdo, fazendeiro, que veio a falecer em 1751. Pai de cinco filhos, três do primeiro casamento e dois do segundo. A família Oliveira Lêdo teve um papel crucial e diferenciador nas entradas de gado no sertão paraibano. Foram os Oliveira Lêdo os primeiros a se situarem no interior da Paraíba, fixaram-se onde, atualmente, está localizada a cidade de Boqueirão, então denominada Carnoió, terra dos ferozes índios cariris. A fazenda dos Oliveira Lêdo tornou-se, então, o centro irradiador da ocupação do Sertão. A independência do município, no seu aspecto administrativo, ocorreu em 1959, embasada pela Lei n. 2.078 de 30 de abril, desmembrando-se da vizinha cidade de Cabaceiras e ficando formada por 5 distritos, a saber: Sede, Alcantil, Bodocongó, Caturité e Riacho de Santo Antonio. Na classificação das microrregiões, Boqueirão encontra-se na microrregião dos Cariris Velhos, tendo por limites demarcatórios ou fronteiriços as cidades de Campina Grande, Caturité, Cabaceiras, Barra de Santana e Riacho de Santo Antônio. Em 1960, a população do município era de 19.600 habitantes, com uma densidade demográfica de 15,99 hab/km². Já em 1980 a população era de 30.624 habitantes, com densidade demográfica de 24,36 hab/km². No total da população houve um crescimento apreciável no seu contingente, em todo o território municipal. Atualmente, cobre uma área de 425 Km2, com uma população de 15. 877 habitantes, com densidade demográfica de 37,4 hab/km², segundo dados do IBGE/2006. O município apresenta uma estrutura comercial bastante diversificada, com micro e pequenos empresários que investem tanto no comércio de bens de consumo quanto nas construções e moradias; como também, empresários do setor têxtil, tanto artesanal quanto industrial, como é o caso do comércio de tapetes e redes, e da confecção de roupas em jeans. Com relação à produção artesanal de redes e cobertores, Boqueirão já foi conhecida como um dos municípios mais ativos na produção e comercialização destes produtos. Todavia, sofreu, durante um longo período, um decréscimo considerável desta atividade comercial. A cooperativa conta com vinte e cinco cooperados, com predominância do sexo feminino, que segundo elas se dá por conta de questões culturais, visto que os homens acreditam que “atividades de artesanato é coisa para mulher”. A faixa etária predominante é entre 25 e 40 anos, desta forma observa-se que adolescentes e mulheres mais jovens não se interessam pelas atividades desenvolvidas na cooperativa. Os motivos desse desinteresse não forma investigados nesta pesquisa. Os cooperados são residentes na cidade de Boqueirão, entre a zona urbana e rural, e desenvolvem o artesanato com fios antes de ingressarem na COOPART. Obeserva-se também que todos os cooperados possuem baixo nível de escolaridade, apresentando no máximo o ensino fundamental completo. A maioria já desenvolveu atividades informais, como doméstica, auxiliar de serviços gerais, atuando nas plantações e colheita de tomate, pimentão e banana, além de serviços de ajudante de pedreiro, garçom, entre outros. Existem vários produtos que podem ser produzidos a partir do algodão colorido. Toalhas e trilhos de mesa, capas de almofadas e colchas são os mais conhecidos, além de peças para o vestuário, capas para utensílios domésticos, entre outros. O trabalho na cooperativa ocorre no horário, das 08:00 às 17:00, com intervalo de duas horas para almoço e é também realizado nas residências em horário variável. Esta flexibilidade se dá devido à necessidade de conciliação das tarefas domiciliares com as atividades da cooperativa. As peças são concebidas pelos cooperados mediante modelo e desenho previamente definidos por uma cooperada, que junto ao SEBRAE desenvolve este trabalho, que leva em consideração a demanda e o público alvo que o produto irá se destinar. Todo material utilizado é estocado na cooperativa e comprados por apenas uma pessoa, que verifica o estoque e acompanha a necessidade de abastecê-lo. No geral, as peças são produzidas para estoque e são comercializadas em uma loja da própria cooperativa, situada logo na entrada da cidade, localização esta estratégica, pois chama a atenção dos turistas que passam para conhecer e visitar o açude local. Também são comercializadas as peças dentro e fora do estado, em feiras artesanais. Todo o processo produtivo se dá através de Tear elétrico e manual, sendo 80% do trabalho artesanal. Este trabalho é desenvolvido de forma constante, com rotina diária de trabalho, visto que há a necessidade de atender a demanda. A renda financeira sofre variação, que chega a aproximadamente oitocentos reais por cooperado, e este é o principal motivo que levam os cooperados a se manter na atividade. Observando a atividade sendo desenvolvida, observou-se que a mesma se dá em processos repetitivos, mecanizados, que geralmente levam o cooperado ao cansaço excessivo. A atividade também gera poluição através dos resíduos gerados, restos de foi e lã, que são descartados aleatoriamente, sem nenhuma preocupação ambiental. CONCLUSÃO Com o efeito da Globalização, o desemprego estrutural e tecnológico vem atingido os trabalhadores de todo o mundo. O Brasil também foi atingido e é nesse cenário de fechamento de firmas e de desemprego que provoca marginalização e exclusão, além do agravamento da pobreza que os trabalhadores passam à buscar alternativas de sobrevivência, lutando assim por melhores condições de vida. Neste sentido, surgem vários e diversos empreendimentos coletivos onde as pessoas se associam para em conjunto produzir e reproduzir meios de vida sob a forma de cooperativas ou associações, ou grupos informais. Essas iniciativas baseadas nos princípios de autogestão e cooperação são entendidas, por vários autores como SINGER E SOUSA (2000), NASCIMENTO (2004), TAUILE E RODRIGUES (2002), que colocam a Economia Solidária como uma nova maneira de realizar as atividades econômicas, cuja prática baseia-se na autogestão, que consiste na ajuda mútua, na satisfação das necessidades humanas, na autonomia do trabalhador. De acordo SINGER E SOUZA “quando uma nova empresa solidária surge, a sua estruturação segue uma lógica completamente diferente”. Conforme Albuquerque (2003), A autogestão é o princípio central da economia solidária. E para a mesma há uma diversidade de concepções, destacando-se duas fundamentais: a primeira Como prática gerencial, ligada a técnicas administrativas, e a segunda como um “conjunto de práticas sociais que se caracteriza pela natureza democrática das tomadas de decisão que propicia a autonomia de um coletivo”. Dessa forma, para o autor, a autogestão tem uma dimensão global, que passam a ser elementos da vida social. Nesse caso, em uma empresa autogerida, o poder de decisão pertence a todos os trabalhadores, independente de suas qualificações e do seu poder aquisitivo. Na sua dimensão econômica o excedente líquido do que foi produzido deverá ser dividido entre os trabalhadores de acordo com regras definidas.. o que configura repartição do poder, do ganho, união dos esforços e estabelecimento de um agir coletivo, ou seja, a cooperação como uma ação social. Após este estudo verificou-se que a cooperativa visitada não desenvolve atividade administrativa de acordo com os princípios do cooperativismo, ou seja a auto gestão, onde todos participam e cooperam entre si com o objetivo comum. Verificouse, portanto, que a mesma desenvolve princípios empresariais, baseados em hierarquia e tomada de decisões centralizada, o que compromete o sentido de cooperativismo. A cooperativa em questão, atua com fins lucrativos e a distribuição deste não é feita de forma clara, com prestação de contas e com a participação do todos os cooperados. Percebeu-se que os cooperados se sentem como funcionários e não desenvolveram o espírito solidário, com sentido de cooperar e assim desenvolver atividades de forma compartilhada, com objetivos em comum. Mesmo utilizando o algodão colorido como matéria prima, o que presumia que havia uma preocupação ambiental, verificou-se que não há preocupação com as sobras da produção, com formas de reutilizar ou a melhor maneira de descartar no meio ambiente, o que configura uma total falta de compromisso com responsabilidade ambiental, que teoricamente, a cooperativa deveria ter. Desta forma, nota-se que a cooperativa em questão não está preparada para contribuir com o desenvolvimento sustentável local, visto que a mesma não cumpre os princípios de uma gestão participativa, não estabelece critérios ambientais e sociais para seguir, além de não demonstrar preocupação com o desenvolvimento dos seus cooperados. REFERÊNCIAS BRAVERMAN, Harry.Trabalho e capital monopolista: a degradação do trabalho no século XX. (tradução: Nathanael C. Caxeiro). Editora Guanabara. Rio de Janeiro, 1987. 379 p. CYBERARTES<http://www.cyberartes.com.br/indexFramed.asp? pagina=indexAprenda.asp&edicao =140>. Acesso em 08/05/2006 GROZ, André. Crítica da Divisão do Trabalho. Editora Martins Fontes, 2 ed. São Paulo, 1996; KLAES, L.S. Cooperativismo e ensino a distancia. Florianópolis/SC. 2005. (Tese de Doutorado em Engenharia de Produção). UFSC NAMORANDO, R. Cooperativismo – um horizonte possível. 2005. 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