AÇÕES AFIRMATIVAS: RELAÇÕES SOCIAIS E REPRESENTAÇÕES DOS ALUNOS COTISTAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE Autor: Mayara de Jesus Oliveira Graduando em História pela Universidade Federal de Sergipe Integrante do Grupo de Estudos Culturais, Identidades e Relações Interétnicas (GERTS/CNPq/UFS). Pesquisadora voluntária (PICVOL/UFS) [email protected] Co-autor: José Alison Nascimento Garcia Graduando em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Sergipe Integrante do Grupo de Estudos Culturais, Identidades e Relações Interétnicas (GERTS/PICVOL/UFS). [email protected] Bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIBIC/UFS) Orientador: Prof° Dr° Frank Nilton Marcon (DCS/UFS) Introdução No presente trabalho pretendemos contribuir de forma significativa na discussão que versa sobre o uso das cotas na Universidade Federal de Sergipe, dando ênfase em aos qualitativos e quantitativos coletados em um questionário aplicado por meio do SIGAA/UFS sobre o tema, buscando assim, abordar problematizações a respeito da auto definição através da qual os jovens que estudam nesta instituição entendem a sua definição de cor, “pretos” ou “pardos”, e o uso das cotas na UFS. na tentativa de contrapor a discussão na qual o autor Jocélio Teles corrobora de forma significativa o entendimento de que nas ultimas décadas muitas análises comparativas procuraram marcar as nuances dos modos diversos de classificar certas categorias raciais que são recorrentes no Brasil, normalmente corriqueiras no dia-a-dia. O autor cita categorias em que as pessoas costumam declarar-se como: negro, mulato, pardo, crioulo, preto, moreno, moreno claro, estando, portanto, do lado oposto ao que ocorre nos Estados Unidos, no qual existe uma classificação que evidencia mais diretamente uma polarização “Brancos versus Pretos” (SANTOS, 2005, pg. 115). As referencias do nosso modo de classificação de acordo com as utilizados pelo IBGE. É de relevância para nosso trabalho buscar entender e analisar as narrativas destes jovens que fazem uso das ações afirmativas e de que forma eles se entendem como parte da mesma, nosso foco é tanto a cota social, quanto racial e o acesso por alunos oriundos de escola publica e que autodeclaram negros (ou pretos), pardos, ou indígenas para o ingresso á universidade publica. Os textos que antecederam a construção e aplicação do questionário foram de extrema importância. Pois tais leituras nos direcionaram no campo de pesquisa, como também deram uma visão geral sobre a temática pesquisada, propondo uma compreensão melhor do impacto das políticas afirmativas em universidades, para daí se fazer uma analise das informações do questionário e organiza-las. Por isso, realizamos juntamente com as leituras bibliográficas, a aplicação de um questionário como anteriormente citado, buscando verificar a forma como os alunos cotistas e também não cotistas se comportam frente ao programa de ações afirmativas (PAAF). É importante ressaltar que antes da construção do questionário foi feita uma discussão para que dentro do mesmo pudéssemos acordar como abordar questões relevantes do ponto de vista sócio educacional, econômico, étnico-racial, para assim compreendermos a expectativa de vida dentre outros aspectos á serem notados nos alunos cotistas e não cotistas da Universidade Federal de Sergipe. Com a pretensão de colhermos dados e formarmos um banco de informações referentes ao perfil social destes alunos e sobre o que eles pensam, objetivamos ampliar o entendimento sobre a eficácia e o sentido do sistema de reserva de vagas para escola pública, negros e indígenas na UFS. No que tange aos estudos sobre as cotas na UFS o livro organizado por os professores Frank Marcon e Josué dos passos Sobrinho reuni alguns artigos com a discussão sobre Políticas Afirmativas (cotas sociais e raciais) nas Universidades, focando o caso da Universidade Federal de Sergipe, onde ganhou novos prismas após a divulgação dos resultados do processo seletivo de 2010, primeiro ano de adoção das cotas na UFS. No primeiro momento das discussões houve várias oportunidades da comunidade acadêmica e outros representantes sociais para a participação das discussões, dos dados e das propostas estabelecidas pelos pesquisadores e pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão – CONEPE. Segundo (MARCON e SUBRINHO, 2010), existiram e ainda existem indivíduos contrários às cotas, onde recorrem “... às instâncias internas e externas universidade e nesse sentido impetrem recursos e mandatos para corrigir injustiças que julgam terem sido vítimas. Assim, a democracia é conflituosa, tensa e com regras” (MARCON e SUBRINHO, 2010). As cotas geram ao seu redor grupos distintos, grupos esses que segundo (MARCON e SUBRINHO, 2010), produzem uma discriminação positiva, “... ampara no lugar de rebaixar, promove ao invés de inferiorizar. Enquanto não houver oportunidades semelhantes para todos, a chama “igualdade” (...) pode gerar e aprofundar distâncias entre os indivíduos e os grupos sociais”. Ao analisar os dados referentes à concorrência do vestibular da UFS de 2010 foram observados pontos interessantes que precisam ser analisados para tentar solucionar alguns problemas existentes no processo seletivo como afirma (MARCON e SUBRINHO, 2010), “... a relação entre candidatos e vagas do grupo B é no geral maior do que a relação de candidatos do grupo A. (...) fica a constatação de que os candidatos do B enfrentam uma concorrência interna maior do que a do grupo A. A relação entre candidatos vagas do grupo C, por sua vez, é maior que a relação geral de candidatos/vaga” (MARCON e SUBRINHO, 2010). Isso prova que os cotistas estão enfrentando uma concorrência maior do que a situação normal, sem o uso das cotas. Também existem os pontos negativos das cotas, é quando ela nivela a disputa como as suas características criando grupos com trajetórias familiares, escolares e sociais. Portanto, como defende o professor (ENNES, 2010) “... a UFS precisa com urgência discutir, definir e implantar ações no campo pedagógico e da assistência estudantil que garantam a permanência de alunos sócia, econômica e culturalmente vulnerável sob o risco de anular os efeitos das cotas e sua importância para a democratização do acesso à universidade pública” (ENNES, 2010). Sobre auto definição étnica Apresentamos um gráfico no qual entendemos servir para reflexão no andamento deste trabalho. Levando em conta a classificação do IBGE como você define sua cor*? 60,00% 50,00% 40,00% 30,00% 20,00% 10,00% 0,00% (a) Amarela (b) Branca (c) Indigena (d) Parda (e) preta Podemos observar que a maioria se define pela cor parda. Esta audefinição estaria ligada as suas formas de sociabilidades na Universidade e fora dela? Achamos que é algo que deve ser ainda posto para reflexão. Normalmente no cotidiano as pessoas se dirigem umas as outras quando se trata da cor de outrem, fica tentando evidenciar certa diferença entre ser parda mestiça e negra, mas é interessante anotar que quando se trata do indivíduo mesmo declarar sua cor soa como algo mais autentico e implícito no que diz respeito a sua identidade declarada, pois alguém que diz “você pode até ser parda ou mestiça, mas eu sou é preta mesmo”, está de certa forma corroborando com sua autoafirmação identitária. As análises que (SHERIF, 2002) faz em relação à auto declaração de cor é ligado ao que muitos antropólogos chamam de “identidade de raça”, pois um indivíduo pode declarar-se negro, pardo, mestiço, enfim, “homens de cor”, como costumam mencionar em nosso cotidiano, fazendo que suscite assim o slogan “Não deixe sua cor passar em branco”, Slogan esse do movimento negro, segundo a autora (SHERIF, 2002, pg. 216) na tentativa assim, de evitar o termo “negro” que segundo a mesma autora no mesmo texto, diz que as pessoas acreditam ser mais pejorativo o fato de serem chamadas de “negro” do que de “preto” ou “pardo”, já que o primeiro termo mencionado remete a memória da escravidão e de como normalmente os escravos eram chamados por seus patrões. Acompanhemos o raciocínio do autor “... As palavras que usamos para falar de afrobrasilidade não são apenas sinais claros micro políticos que dizem que aos nossos interlocutores qual é a nossa posição no labirinto de discursos sobre raça e seus significados, mas indicam também um fato incontestável: o português falado no Brasil sempre teve um vocabulário rico, ambíguo e politicamente eloquente para se referir-se á cor e á raça.” (...) “o peso da palavra negro sempre foi mais descritivo ou taxonômico” (SHERIF, 2002, pg. 217). Como mencionamos o termo identidade, e de fato é, algo que está em questão nos dias atuais por sua complexidade em um contexto social, pois remete não apenas o sujeito objetivo como também subjetivo, a atribuição de pertencer ou não a um grupo étnico está inteiramente condensada na autoafirmação do próprio autor, em ele mesmo declarar sua identificação a tal grupo, seguindo noção de fronteira étnica (BARTH, 1998). Podemos supor que havendo essa fronteira o autor tem possibilidade de intercalar sua dita “identidade” para momentos em que pode ser oportuno o uso de certa identidade, como por exemplo, o uso da identidade negra para conseguir entrar na universidade, através das cotas raciais e sociais. Seguindo o raciocínio de Fredrik Barth entendemos que as fronteiras étnicas são utilizadas para compreender as dinâmicas do grupo em que ele encontra-se inserido. Barth dinamiza a identidade étnica como algo que não pode ser vista como estática, podendo se decompor a partir de relações como alguma coisa que pode ser impressa em qualquer outra identidade, mesmo apresentando coletividade ou individualidade, sendo então relativo ao “interesse”, situação, enfim, o contexto em se passa. A relação mutua existente entre os sujeitos e grupos, deixam mudanças continuas que de certa forma acaba figurando e modelando a identidade, estando sempre alheio a um chamado processo de exclusão ou inclusão, definindo quem esta inserida no grupo e quem não estão no mesmo (BARTH, 1998). O uso da cor para atribuir-se, entretanto, como um grupo étnico, é algo que vai além da ideia de utilizar-se de certa situação, pois no caso do nosso questionário aplicado aos sujeitos em questão: alunos matriculados em cursos na UFS, ou seja, utilizaram de um meio (cotas) para se chegar a um fim (ingresso a universidade). Retomando Sherif, buscamos então repensar como as pessoas são designadas por outros em relação à atribuição de sua cor ou raça, “... Na maioria das vezes, em conversas, a pessoa pode ser designada como “aquele escuro”, “aquele preto”, “aquele moreno”, ou “aquele de cabelo cacheado”, com a mesma frequência, a pessoa é descrita por meio de comparações, como “ele é um pouco mais escuro do que eu” (SHERIF, 2002, pg. 220). Isso sabemos, que realmente é corriqueiro e que muitas vezes passa-se por despercebido, mas é algo impresso em nossa forma de atribuir a cor de outras pessoas. A questão de enquadrar ou não o perfil social e acadêmico de alunos cotistas na Universidade Federal de Sergipe em uma perspectiva simplista de nação, cidadãos, atrelados a ideia de unidade social, que é algo que buscamos a ideia de Stuart Hall, quando ele trata as culturas nacionais como comunidades imaginadas Hall ilustra o sujeito fragmentado e suas identidades culturais. De acordo com o autor, nação pode ser entendida como um sistema e representação cultural que extrapola a noção de legitimidade do ser social, pois as pessoas não são apenas cidadãs, já que partilham uma gama de significados (narrativas estratégias discursivas, mitos fundacionais). Segundo Hall, raça não é uma categoria biológica, logo não tem validade científica. No entanto, é uma categoria discursiva que abarca formas de falar, práticas sociais, características físicas etc. Se a grande maioria das nações é formada por diversos povos é um equívoco dizermos que raça determina a nacionalidade. Daí, Stuart Hall coloca que as identidades nacionais são passíveis do jogo de poder e das contradições internas, já que contam com significante diversidade em suas composições (HALL, 2001, pg. 4754). Pretendemos traçar as características que estão impressas em alunos matriculados na UFS, por assim entender a importância, que as abordagens relacionadas às ações afirmativas principalmente o uso das cotas sociais e raciais nas universidades ganha notoriedade por trazer a discussão sobre raça, etnicidade e inclusão. Por isso é de suma importância que se investigue como estes jovens estão sendo introduzidos nas instituições de ensino superior, entendendo suas relações dentro e fora da universidade. No livro “Multiculralismo” (SEMPRIMI, 1999) o autor faz uma análise sobre a “problemática do lugar e dos direitos das minorias em relação à maioria” assim o multiculturalismo é a diferença, direitos da minoria, reconhecimento identidário. Ela vê as ações afirmativas como uma adoção de políticas públicas que facilitam o acesso das minorias ao ensino superior e sendo como segunda área de “confronto multicultural” onde sempre os negros como sendo a minoria eram isolados do meio social e devido as discriminações das minorias merecem uma política compensatórias que visem estreitar esse caminho ao acesso ao campo universitário e que o acesso ao nível superior é uma grande “alavanca da mobilidade social” para a integração dos grupos marginalizados pela sociedade. No entanto, “As consequências humanas e sociais dessas políticas são igualmente objeto de criticas. Para alguns, estudantes, as condições facilitadoras de sua admissão na universidade criariam falta de confiança e perda de autoestima”. Conclusão Pretendemos assim fazer uma analise processual das representações sociais dos alunos da Universidade Federal de Sergipe com relação às cotas, e como isso vem sendo percebida pela comunidade acadêmica envolvida. As Ações Afirmativas na Universidade Federal de Sergipe são políticas compensatórias, como sendo uma questão sobre as desigualdades sociais e raciais. Essas desigualdades observam-se em todos os setores da vida nacional: mercado de trabalho, sistema de saúde, setor público. É importante ressaltar que dificilmente conseguiremos apontar todos os nuances que o nosso objeto apresenta de forma completa, pois se trata de um tema espinhoso, de um material de pesquisa muito denso e de questões de caráter polêmico. As maneiras de autodeclarar-se como negro, pardo, branco, amarelo, índio, mestiço e etc. não estão necessariamente a uma ideia de cor no sentido do pigmento de cor da pele, mas atreladas ao sentimento de pertencimento a algum grupo étnico cultural, e esse pode ser um norte ao que estar á muito tempo em voga. Referencias bibliográficas BARTH, Fredrik. Grupos étnicos e suas fronteiras. In: POUTINGNAT. Teoria da etnicidade. São Paulo: UNESP, 1998. ENNES, Marcelo Alario. Cotas e democracia. Disponível em: http://www.ufs.br/?pg=artigoid=135. Acesso em: 02/02/2010. HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução Tomás Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro. 6. ed. Rio de Janeiro. MARCON, Frank. SOBRINHO, Josué Modesto dos Passos. Ações afirmativas e políticas inclusivas no ensino público superior: a experiência da Universidade Federal de Sergipe. – São Cristóvão: Editora UFS, 2010. SANTOS, Jocélio Teles dos. De pardos disfarçados a brancos pouco claros. SEMPRIMI, Andréa. Multiculturalismo. Tradução Laureano Pelegrin. Bauru, SP: EDUSC, 1999. SHERIFF, Robin. E. Como os senhores chamavam os escravos: discursos sobre cor, raça e racismo num morro carioca. In: MAGGIE, Yvone (org.) Raça como retórica. Ed. Civilização brasileira. 2002. *Gráfico extraído do questionário aplicado aos alunos da UFS por meio do SIGAA/UFS. 2012.