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COLITES MICROSCÓPICAS
Flávio Antonio Quilici
Fernando Cordeiro
Lisandra Carolina M. Quilici
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas o acesso ao intestino grosso pela colonoscopia e suas múltiplas biópsias
possibilitou o reconhecimento de novas enfermidades cólicas com manifestações clínicas bem
definidas.
Entre elas estão as “Colites Microscópicas”, denominadas de colite colagenosa e colite linfocítica.
Ambas caracterizam-se por apresentar diarréia aquosa com colonoscopia normal à observação do
endoscopista (macroscopia), porém com alterações à microscopia (biopsias seriadas).
COLITE COLAGENOSA
Foi descrita por Lindstrom em 197615, com vários relatos na literatura desde então. No entanto, só foi
bem estabelecida como entidade patológica da gastroenterologia nos estudos publicados em 1987
por Williams e Rhodes25.
É entidade rara, ocorrendo em aproximadamente 4/1000 pacientes submetidos à biopsia durante a
realização da colonoscopia cuja indicação para a endoscopia foi por doenças não neoplásicas13. É
mais freqüente em mulheres na proporção de 7,5 mulheres para um homem13 e embora seja
diagnosticada em todas as faixas etárias, apresenta maior prevalência entre os 40 e 70 anos com
média aos 5910,26. Sua forma familial foi relatada em duas famílias com dois indivíduos cada que
apresentavam a colite colagenosa e em uma das famílias havia história de doença autoimune23.
Sua etiopatogenia é controversa e há algumas teorias para justificá-la:
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- o enfermo apresenta um aumento do colágeno pela sua síntese desordenada;
- o excesso de colágeno é produto resultante da alteração vascular12 ou
- o aumento do colágeno é conseqüência de um infiltrado inflamatório crônico autoimune21.
Sabe-se, no entanto, que esse colágeno em excesso na camada subepitelial é do tipo 3, resultado do
reparo de algum tipo de ferimento.
Quadro Clínico
Caracteriza-se pela presença de diarréia aquosa associada a dor abdominal, tipo cólica, crônica e
persistente. A diarréia é resultado do aumento da espessura da camada de colágeno subepitelial que
impede a absorção de soluções7.
As fezes diarréicas podem conter muco, porém, sem sangue. Também não há perda de peso ou
vômitos. Remissões clínicas podem ocorrer e seus sintomas são muito similares aos da Síndrome do
Intestino Irritável17.
Há vários casos relatados de colite colagenosa associada a outra enfermidade, incluindo lupus4,
artrite reumatóide6, espru tropical18, fibrose pulmonar24, carcinóide ileal múltiplo16, esclerodermia5 e
linfoma de Hodgkins22.
Diagnóstico
A investigação de rotina para determinar a causa da diarréia, tais como exames microbiológicos e
radiologia contrastada de cólon8 (enema opaco) são invariavelmente normais.
A colonoscopia também não apresenta alterações macroscópicas e o diagnóstico somente será
confirmado pelo exame histopatológico. Daí a importância da colonoscopia para seu diagnóstico. Um
fato que precisa ser enfatizado é quando em colonoscopia macroscopicamente normal deve ser
realizadas biopsias? A resposta para esta pergunta é que em todo enfermo com presença de diarréia,
mesmo com colonoscopia macroscopicamente normal ele deverá ser submetido a biopsias seriadas
em todos os seus segmentos.
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Histopatologia
A camada de colágeno subepitelial normal na parede cólica, em geral, tem a espessura de 3 µm14. O
diagnóstico definitivo de colite colagenosa é feito pela presença, nas biopsias, de uma camada de
colágeno subepitelial com espessura variando entre 10 e 93 µm2 (fig 1).
======= ENTRA FIGURA 1 =========
É reconhecido que a espessura da camada de colágeno é mais exuberante no cólon que no reto11 e
por isso, o diagnóstico de colite colagenosa não pode ser excluído pelo exame retossigmoidoscópico.
Segundo Tanaka20 a biopsia retal sozinha diagnostica somente 27% dos enfermos e a biopsia do
sigmóide 71% deles.
A arquitetura glandular normal está preservada em ambas as colites microscópicas (colagenosa e
linfocítica).
Diagnóstico diferencial
Uma longa lista de enfermidades que apresentam diarréia crônica precisa ser excluída, entre outras:
o uso abusivo de laxativos, síndrome de mal-absorção, colite isquêmica, síndrome do intestino
irritável, doença de Crohn, retocolite ulcerativa, hipertiroidismo, esclerodermia, amiloidóse e doença
diverticular.
Tratamento
Vários tratamentos já foram empregados para a colite colagenosa com diferentes graus de sucesso.
A terapia com antidiarreicos, como a loperamida e com antiinflamatórios como a mesalazina, têm
pequena valia. O melhor benefício tem sido obtido com o uso de prednisona3 com redução da
espessura da camada de colágeno e melhora da diarréia.
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COLITE LINFOCÍTICA
Enquanto a colite colagenosa é uma entidade nosológica bem reconhecida, a colite linfocítica é
controversa. Sua primeira descrição ocorreu na publicação de Read19 em 1980, seguida pela de
Kingham12 (1982) que documentaram o aumento uniforme de células inflamatórias linfocíticas na
lâmina própria da mucosa do cólon de pacientes com diarréia crônica.
Quadro Clínico e Diagnóstico
Muitas das características desta colite microscópica linfocítica são similares às da colite colagenosa,
tais como, história crônica de diarréia aquosa, com redução da absorção de fluidos pela mucosa
cólica (sódio e cloro) e com exames complementares normais incluindo a colonoscopia
macroscopicamente normal e prevalência etária9. Na verdade as similaridades são tantas que há uma
suposição que a colite linfocítica seria um estágio precoce da colite colagenosa. No entanto, as
diferenças entre as duas colites microscópicas são evidenciadas por Giardello8 (1989) pela
prevalência maior em mulheres (1,3:1) e presença de HLA A1 e HLA A3 nos pacientes com colite
linfocítica, fato que não acontece na colite colagenosa ou mesmo, em outras doenças autoimunes.
Histopatologia
As biopsias seriadas durante a colonoscopia mostram o aumento de células linfocitárias, células
plasmáticas e ocasionalmente neutrófilos na lâmina própria do cólon1 sem, no entanto, evidência de
aumento da espessura da membrana basal (fig. 2).
======== ENTRA FIGURA 2 ========
No epitélio normal colorretal há a presença de cerca de 5 células T linfocíticas intraepiteliais por 100
células epiteliais e no paciente com colite linfocítica esta proporção aumenta para 25 células T
lnfocíticas por 10013.
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Diagnóstico diferencial
É com a colite colagenosa pela sua similaridade. Daí a importância de fazer-se biopsias de todos os
segmentos cólicos e não somente do reto, sabendo-se que para o diagnóstico, em especial, da colite
colagenosa é importante a coleta de biopsias no cólon proximal.
Tratamento
É o mesmo da colite colagenosa, com os melhores resultados sintomáticos obtidos com o uso de
prednisona. A terapia com antidiarreicos, como a loperamida e com antiinflamatórios como a
mesalazina, também têm pequena valia.
LEITURAS RECOMENDAS
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11. Jessurun J, Yardley JH, Giardiello FM, Hamilton SR, Bayless TM. Chronic colitis with
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LEGENDAS DAS FIGURAS
Figura 1
Colite colagenosa: achado à histologia do aumento da espessura de colágeno na camada
subepitelial da mucosa cólica.
Figura 2
Colite linfocítica: aumento das células inflamatórias crônicas na lâmina própria da mucosa cólica
com várias células linfocíticas permeando o epitélio glandular.
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