Prof. Paulo Cezar Neves Junior
Tribunal de Contas
Trata-se de órgão constitucional com função de fiscalizar e
controlar as contas de todas as pessoas físicas e jurídicas que lidam
com recursos públicos, podendo impor sanções em casos de infrações.
A doutrina vem atualmente destacando que o Tribunal de
Contas não é mero órgão auxiliar do Poder Legislativo, uma vez que não
o integra, sendo uma de suas funções a de auxiliar no controle externo
da fiscalização prevista no art. 70 da CF.
O Ministro Carlos Ayres Brito afirma que o Tribunal de Contas é
“órgão da pessoa jurídica União, diretamente, sem pertencer a qualquer
dos três Poderes federais” (“O regime constitucional dos Tribunais de
Contas” in Cadernos de soluções constitucionais, p. 22).
Com efeito, é órgão dotado de estrutura própria e competência
especificada na Constituição Federal.
Em nosso país, surgiu com o Decreto n.º 966-A, de 07/09/1890.
Características:
- encontra seu fundamento no Estado de Direito, que, exigindo
do próprio Estado a submissão às leis, pressupõe um órgão
controlador da atividade estatal com o fim de se evitar as
ilegalidades na sua atuação;
- apesar do nome, tampouco se trata de órgão do Poder
Judiciário, não exercendo, ao contrário do que afirmam alguns,
função jurisdicional em seu sentido próprio; a Súmula n.º 6 do
STF confirma a inexistência de coisa julgada nas decisões do
Tribunal de Contas;
- não julga pessoas, mas apenas contas, ou seja, limita-se a
proferir decisão técnica, considerando-as regulares ou
irregulares;
- o exame das contas dá-se quanto ao mérito e quanto à
legalidade (vide parâmetros do controle acima);
- em suas atividades, pode apreciar a constitucionalidade das
leis e atos do Poder Público (Súmula 347 do STF).
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Composição
Tribunal de Contas da União (TCU) é composto por nove
Ministros e tem sede no Distrito Federal, possuindo quadro próprio de
pessoal e atuação em todo o território nacional
Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão nomeados
dentre brasileiros que satisfaçam os seguintes requisitos:
I - mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de
idade;
II - idoneidade moral e reputação ilibada;
III - notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e
financeiros ou de administração pública;
Sobre este requisito, o STF já decidiu que “a qualificação profissional
formal” não é necessária, bastando a avaliação de notório saber feita
subjetivamente pelo nomeante (AO 476, Rel. p/ o ac. Min. Nelson Jobim,
julgamento em 16-10-1997, Plenário, DJ de 5-11-1999.)
IV - mais de dez anos de exercício de função ou de efetiva
atividade profissional que exija os conhecimentos mencionados
no inciso anterior.
A escolha dos Ministros do TCU é feita da seguinte maneira:
I - 1/3 de indicação do Presidente da República com aprovação
do Senado Federal, sendo dois alternadamente dentre
auditores e membros do Ministério Público junto ao Tribunal,
indicados em lista tríplice pelo Tribunal, segundo os critérios de
antigüidade e merecimento;
“O Ministério Público junto ao TCU não dispõe de fisionomia institucional
própria e, não obstante as expressivas garantias de ordem subjetiva
concedidas aos seus Procuradores pela própria Constituição (art. 130),
encontra-se consolidado na 'intimidade estrutural' dessa Corte de Contas,
que se acha investida – até mesmo em função do poder de autogoverno
que lhe confere a Carta Política (art. 73, caput, in fine) – da prerrogativa
de fazer instaurar o processo legislativo concernente a sua organização, a
sua estruturação interna, a definição do seu quadro de pessoal e a
criação dos cargos respectivos." (ADI 789, Rel. Min. Celso de Mello,
julgamento em 26-5-1994, Plenário, DJ de 19-12-1994.)
De outro lado, os auditores pertencem ao quadro do TCU, auxiliando e
podendo substituir os Ministros. Na função de auxílio, o auditor preside a
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instrução de processos, relatando-os com proposta de decisão a ser
votada pelos Ministros.
Estas carreiras são tratadas na Lei n.º 8.443/92 (Lei Orgânica do TCU),
principalmente nos arts. 77 a 84.
II - 2/3 por indicação direta do Congresso Nacional.
Os Ministros detêm as mesmas garantias, prerrogativas,
impedimentos e vencimentos dos Ministros do Superior Tribunal de
Justiça.
O auditor, quando em substituição a Ministro, terá as mesmas
garantias e impedimentos do titular e, quando no exercício das demais
atribuições da “judicatura”, as de juiz de Tribunal Regional Federal.
Atribuições do Tribunal de Contas (art. 71 da CF).
A Constituição de 1988 fortaleceu o Tribunal de Contas, assim
definindo suas atribuições:
1º) Emitir parecer sobre as contas anuais prestadas pelo
Chefe do Executivo.
Presidente da República deve apresentar contas perante o
Congresso Nacional nos 60 dias seguintes à abertura da sessão
legislativa (art. 84, XXIV, da CF), sob pena de crime de responsabilidade
(art. 85, VI, da CF).
Prestação de contas anual deve ser feita por todas as pessoas
políticas (simetria obrigatória - ADI 2.472-MC, Rel. Min. Maurício Corrêa,
julgamento em 13-3-2002, Plenário, DJ de 3-5-2002.).
O Tribunal de Contas tem prazo de 60 dias para apresentar
seu parecer, sendo que o Legislativo não é obrigado a segui-lo, pois se
trata de uma análise política.
No caso de Município, a rejeição do parecer do Tribunal de
Contas do respectivo Estado deve contar com decisão de 2/3 dos
membros da Câmara Municipal (art. 31, §2º da CF).
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A doutrina defende a necessidade de se observar o
contraditório desde a elaboração do parecer pelo Tribunal de Contas até
o julgamento das contas pelo Legislativo.
E se o Presidente da República não apresenta contas
tempestivamente? Primeiro, pode ser caracterizado crime de
responsabilidade (art. 85, VI, da CF). Segundo, o Tribunal de Contas
deve comunicar o fato ao Congresso Nacional, cabendo à Câmara dos
Deputados tomar providências para a tomada de contas (art. 51 da CF).
Poderá o Congresso elaborar relatório do exercício financeiro encerrado
nos termos do previsto na Constituição de 1967 alterada pela EC n.º
1/69.
2º) Fiscalizar e julgar as contas de qualquer autoridade ou
responsável por dinheiro, bens e valores públicos.
Ex.: Ministros de Estado, Presidente e Diretores de Autarquias,
Presidentes de Tribunais, Diretores de Entidades Filantrópicas ou
ONGs, que receberam dinheiro público etc. A doutrina destaca que,
quando o chefe do Executivo realiza despesas como ordenador, está
sujeito a este julgamento do TCU, sendo a hipótese do inciso I aplicável
apenas para a prestação anual de contas. A jurisprudência não tem
acompanhado esta posição doutrinária (TSE - REspe n. 33.747-AgR/BA,
Rel. Min. ARNALDO VERSIANI e STF – liminar na Rcl 10616 MC, Rel.
Min. GILMAR MENDES).
Aqui, não há participação do Legislativo.
Apenas o Tribunal de Contas decide. Este julgamento não é
jurisdicional. Em caso de condenação, o tema pode ser submetido ao
Judiciário.
O entendimento do STF sobre o tema é:
- as sociedades de economia mista e as empresas públicas
estão sujeitas à fiscalização do TCU (MS 25.092);
- somente o Chefe do Poder Executivo é que não tem suas
contas julgadas pelo Tribunal de Contas; os demais Poderes sujeitam-se
a tal julgamento (ADI 849, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em
11-2-1999, Plenário, DJ de 23-4-1999.).
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3º) apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de
admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e
indireta, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas
e pensões.
Em síntese, todo ingresso e toda saída de pessoal do serviço
público devem ser analisados pelo Tribunal de Contas.
Exceções dessa apreciação: nomeações para cargo de
provimento em comissão e melhorias posteriores nos benefícios
previdenciários que não alterem o fundamento legal do ato concessório.
Essa análise não vincula a Administração que dela pode
discordar, não cabendo ao Tribunal de Contas impor suspensão de
pagamento, tendo em vista que não lhe fora outorgado este poder.
Observação: Súmula Vinculante n.º 3 do STF: “Nos processos
perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a
ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação
de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a
apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria,
reforma e pensão”.
4.º) Realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos
Deputados, do Senado Federal, de Comissão parlamentar técnica
ou de inquérito inspeções e auditorias em qualquer órgão público
de qualquer dos poderes, suas autarquias e fundações.
Esta fiscalização é feita de forma ampla, alcançando todos os
aspectos e parâmetros do controle externo já acima analisados.
5º) fiscalizar as contas nacionais das empresas
supranacionais de cujo capital social a União participe, de forma
direta ou indireta, nos termos do tratado constitutivo;
Ex.: Itaipu Binacional e Banco Brasileiro Iraquiano S.A. – BBI.
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6º) Fiscalizar a aplicação de recursos repassados
voluntariamente pela União a Estado, Distrito Federal ou Município.
Não se aplica aos casos de recursos originários dos Estados,
do Distrito Federal ou dos municípios (MS 24.312, Rel. Min. Ellen
Gracie, julgamento em 19-2-2003, Plenário, DJ de 19-12-2003) e nem
de transferências obrigatórias.
7º) prestar as informações solicitadas pelo Congresso
Nacional sobre a fiscalização contábil, financeira, orçamentária,
operacional e patrimonial e sobre resultados de auditorias e
inspeções realizadas;
8º) aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de
despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei,
que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao
dano causado ao erário;
Necessita de lei para ser aplicada, já que, em matéria punitiva
(penal ou administrativa), exige-se a tipicidade das infrações e sanções.
A Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União (Lei n.º
8.443/92) trata do assunto sobretudo nos arts. 57 e 58.
Estas decisões possuem eficácia de título executivo (“As
decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão
eficácia de título executivo” (art. 71, § 3.º, da CF). Não há necessidade
de inscrição em dívida ativa, sendo a cobrança feita pelos procuradores
que representarem a pessoa jurídica a que está vinculado o Tribunal de
Contas (RE223.037).
9º) Diante de irregularidade, determinar prazo para o exato
cumprimento da Lei. Caberá ao Administrador regularizar o ato, se
possível, revogá-lo ou anulá-lo. Caso não atendido, o Tribunal de
Contas pode sustar a execução do ato impugnado, comunicando
tal fato à Câmara do Deputados e ao Senado Federal.
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Trata-se de controle concomitante.
Deve ser observado o contraditório e a ampla defesa.
Todavia, se o problema for relacionado a contrato
administrativo, o ato de sustação deve ser adotado pelo Poder
Legislativo, o qual comunicará o Executivo se for o caso, sendo que se
estes não tomarem providências no prazo de noventa dias, o Tribunal de
Contas decidirá a respeito (art. 71, §§ 1.º e 2.º, da CF). Caso o
Legislativo ou o Executivo tomarem providências, mas concluírem pela
legalidade do ato, não pode o Tribunal de Contas se insurgir.
Exemplo: licitação em curso, a qual deveria ser feita por
concorrência, mas o foi por tomada de preços. Verificada a ilegalidade,
deverá haver anulação do procedimento licitatório com a realização de
outro adequado. Diante dessa situação, o Tribunal de Contas deve
determinar prazo para o administrador regularizar a situação. Se este
não atender à recomendação, poderá o Tribunal sustar a execução do
ato, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado
Federal. Dependendo da gravidade da situação e para evitar maiores
prejuízos, pode sustar o ato de imediato.
10º)
representar
ao
Poder
competente
sobre
irregularidades ou abusos apurados, bem como encaminhar ao
Legislativo relatório de suas atividades.
O Poder Legislativo pode efetuar, em sede de fiscalização
financeira, orçamentária, contábil, operacional e patrimonial, o controle
externo das contas do respectivo Tribunal de Contas (ADI 687, Rel. Min.
Celso de Mello, julgamento em 2-2-1995, Plenário, DJ de 10-2-2006).
A Fiscalização feita pela Comissão Mista Permanente do
Congresso Nacional (art. 166, § 1.º, da CF)
A Comissão mista permanente do Congresso Nacional, diante
de indícios de despesas não autorizadas, ainda que sob a forma de
investimentos não programados ou de subsídios não aprovados, poderá
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solicitar à autoridade governamental responsável que, no prazo de cinco
dias, preste os esclarecimentos necessários.
Não prestados os esclarecimentos, ou considerados estes
insuficientes, a Comissão solicitará ao Tribunal pronunciamento
conclusivo sobre a matéria, no prazo de trinta dias.
Entendendo o Tribunal irregular a despesa, a Comissão, se
julgar que o gasto possa causar dano irreparável ou grave lesão à
economia pública, proporá ao Congresso Nacional sua sustação.
É o que dispõem o art. 72 e seus parágrafos da CF.
Tribunais de Contas e Princípio da Simetria (art. 75 da CF)
As normas constitucionais que tratam do Tribunal de Contas da
União (arts. 70 a 74 da CF) aplicam-se, o que couber, aos Tribunais de
Contas dos Estados, Distrito Federal e Municípios.
Assim, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, quanto a seus Tribunais de Contas temos:
- não podem ser atribuídas competências diversas daquelas
previstas na Constituição Federal;
Ex.: já foi julgado inconstitucional preceito que atribuía competência ao
Tribunal de Contas de Estado para pedir intervenção estadual em
município (ADIN 2.631/PA).
- deve ser seguido o modelo federal para sua composição,
sendo que, nos Estados e no Distrito Federal, serão integrados
por sete Conselheiros;
“No Tribunal de Contas estadual, composto por sete
Conselheiros, quatro devem ser escolhidos pela Assembléia
Legislativa e três pelo chefe do Poder Executivo estadual,
cabendo a este indicar um dentre auditores e outro dentre
membros do Ministério Público, e um terceiro à sua livre
escolha.” (Súmula 653 do STF)
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- pode ser criado Tribunal de Contas estadual específico para
tratar das contas de seus municípios (ADI 687, Rel. Min. Celso
de Mello, julgamento em 2-2-1995, Plenário, DJ de 10-2-2006.).
No âmbito municipal, dispõe a Constituição (art. 31 e §§): o
parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as
contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará
de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da
Câmara Municipal (deve ser respeitado o contraditório do
prefeito para haver rejeição de suas contas); as contas dos
Municípios ficarão, durante sessenta dias, anualmente, à
disposição de qualquer contribuinte, para exame e apreciação,
o qual poderá questionar-lhes a legitimidade, nos termos da lei;
é vedada a criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de
Contas Municipais. Obs.: só dois Municípios no Brasil
possuem Tribunal de Contas (São Paulo e Rio de Janeiro),
não podendo ser criados outros municipais.
Já decidiu também o STF: “a aprovação pela Câmara Municipal
de contas de Prefeito não elide a responsabilidade deste por
atos de gestão.” (Inq 1.070, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,
julgamento em 24-11-2004, Plenário, DJ de 1º-7-2005.)
Denúncia direta ao Tribunal de Contas (art. 74, §2º):
qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte
legítima para denunciar irregularidade ou ilegalidades perante o Tribunal
de Contas.
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