BASE E O RISCO DE BASE DO CAFÉ ARÁBICA NO BRASIL: UM ESTUDO EMPÍRICO
PARA O PERÍODO 2003-2010
Tema da Conferência: Derivativos de Commodities
Fabiano Gabriel1
Doutor, Mestre e Bacharel em Controladoria e Contabilidade pela FEA-USP
MBA em Mercado de Capitais e Derivativos pelo Instituto Educacional BMF&Bovespa
[email protected]
1
Este trabalho foi baseado na Monografia apresentada ao Programa de Pós-Graduação Lato Sensu MBA em Mercado
de Capitais e Derivativos do Instituto Educacional BMF&Bovespa. O autor agradece as sugestões de melhoria do
Professor e Orientador Félix Schouchana.
2
RESUMO
O objetivo do trabalho foi demonstrar, por meio de evidências empíricas, que é possível conhecer
previamente o comportamento de preços da base do café arábica, a fim de aumentar a efetividade
do hedge das cinco principais regiões produtoras no Brasil: Cerrado-MG, Mogiana-SP, Sul de
Minas, Paulista e Noroeste do Paraná. A análise dos resultados dos testes estatísticos aplicados para
uma amostra, com dados mensais no período 2003-2010, permitiu confirmar as três hipóteses da
pesquisa: (i) a base do café segue uma distribuição normal; (ii) a correlação entre as bases das
diferentes praças é positiva e estatisticamente significativa; e (iii) existe relação estável de longo
prazo entre o preço futuro e os preços à vista regionais. A principal contribuição do trabalho é a
apresentação de métricas quantitativas, úteis para fins de hedge: (i) intervalos de confiança para
avaliar se o valor da base do café está dentro de seu valor histórico regional; (ii) matriz de
correlação para avaliar o diferencial de valores entre bases de diferentes praças; e (iii) coeficientes
entre preços futuros e preços à vista para decisão de compra ou de venda nos mercados futuro e
regionais. Por fim, constatou-se que, embora seja possível realizar o hedge incorporando o
comportamento específico da base e do risco de base de cada praça, as regiões Cerrado-MG,
Mogiana-SP e Sul de Minas apresentam métricas comuns entre si, mas diferentes das regiões
Paulista e Noroeste do Paraná. Como sugestão para trabalhos futuros, recomenda-se a análise de
séries temporais com dados diários para verificar se os resultados se mantêm.
Palavras-chave: Risco de Base; Contrato Futuro; Café Arábica.
3
ABSTRACT
The objective of this study was to demonstrate, by empirical tests, that is possible to know the
behavior of the basis and basis risk of Arabica coffee for the five major producing regions in
Brazil: Cerrado-MG, Mogiana-SP, South of Minas Gerais, Paulista and Parana Northwest. The
results of the statistical tests applied to a sample, with monthly data for the period 2003-2010,
allowed us to confirm the three hypotheses of the research: (i) the basis follows a normal
distribution, (ii) the correlation between the basis of different regions is positive and statistically
significant, and (iii) there is long-term stable relationship between the futures price and the
regional spot prices. The main contribution of this work is to show useful quantitative metrics to
hedgers: (i) confidence intervals to assess whether the basis value of coffee is within its historical
value, (ii) correlation matrix to assess the differential values of basis between different regions, and
(iii) estimations of coefficients between futures prices and spot prices for the decision to buy or sell
in future or in regional spot markets. Finally, it was found that although it is possible to create a
hedge operation incorporating the specific behavior of the basis and the basis risk of each region,
the Cerrado-MG, Mogiana-SP and South of Minas Gerais have common metrics to each other, but
different comparing to the regions of Paulista and Parana Northwest. As a suggestion for future
research, we recommend the analysis of time series with daily data to verify whether the results are
the same.
Keywords: Basis Risk; Futures Contract; Arabica Coffee.
4
1
INTRODUÇÃO
“(...) quanto maior o conhecimento do comportamento da base, maiores serão as chances de
realizar uma boa operação de proteção ao risco. Estar atento ao comportamento da base é
condição essencial para um bom planejamento de hedge” (CORREA e RAÍCES, 2010, p.
77).
A diferença entre o preço à vista de determinado ativo e o preço do contrato futuro é
denominada base. Essas discrepâncias normalmente são verificadas em mercados de commodities
agrícolas e decorrem dos seguintes fatores: impossibilidade de compra ou venda do contrato futuro
para o mês desejado, características distintas do produto negociado, locais de entrega, custos
logísticos, variações de taxas de juros e câmbio, etc.
Como a base não é constante ao longo do tempo, sua variação caracteriza o risco de base,
que por sua vez pode influenciar positiva ou negativamente o agente que realiza uma operação de
hedge (proteção) contra a variação de preços. O risco de base não pode ser eliminado, mas sua
correta mensuração e interpretação são fundamentais para o aumento da efetividade da operação.
Embora existam diferenças entre o preço à vista regional do café arábica e o preço do
contrato futuro no primeiro vencimento, negociado na BMF Bovespa S/A Bolsa de Valores
Mercadorias e Futuros (BM&FBovespa), espera-se que as cotações à vista e futuras apresentem o
mesmo comportamento tendendo para um determinado valor histórico. Essa relação teórica é
esperada, pois, caso contrário, estaríamos diante de um cenário com possibilidades de ganhos sem
riscos persistentes ao longo do tempo, o que é pouco provável.
1.1
PROBLEMA DE PESQUISA
−
É possível conhecer previamente o comportamento de preços da base do café arábica no
Brasil, a fim de aumentar a efetividade do hedge?
1.2
HIPÓTESES
−
H1: A base do café segue uma distribuição normal.
−
H2: A correlação entre bases do café é positiva e estatisticamente significativa.
−
H3: Existe relação estável de longo prazo entre o preço futuro e o preço à vista do café.
5
1.3
OBJETIVOS
O objetivo geral do trabalho é:
Demonstrar, por meio de evidências empíricas, que o contrato futuro de café arábica é um
−
instrumento eficaz para realização de operações de hedge em diferentes praças.
Além disso, pretende-se atingir os seguintes objetivos específicos:
−
Identificar intervalos de confiança para valores prováveis da base do café.
−
Avaliar a significância da correlação de preços entre diferentes praças.
−
Estimar a relação entre preços futuros e preços à vista.
1.4
JUSTIFICATIVAS
Teoricamente, o hedger não pode controlar os preços futuros ou à vista determinados pelo
mercado, mas, na prática, caso haja o conhecimento prévio do comportamento da base e do risco de
base, esse fator pode e deve ser incorporado no planejamento da operação a fim de aumentar sua
efetividade.
2
2.1
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O CONTRATO FUTURO DE CAFÉ
O Brasil ocupa posição de destaque no mercado de café mundial, sendo o maior país
produtor e o segundo maior país consumidor (THE ECONOMIST, 2011). De acordo com
estimativas da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), a produção nacional prevista
para o período 2010/2011 é de 47 milhões de sacas de 60kg, movimentado aproximadamente R$ 7
bilhões por ano.
Independentemente do papel que determinado agente econômico exerça na cadeia produtiva
(comprado ou vendido), existe uma exposição natural ao risco de variação de preços do café. Essa
oscilação decorre da própria especificidade do negócio agrícola, ou seja, forte dependência de
variações climáticas, de métodos de cultivo, da localização, da relação entre oferta e demanda e
também de indicadores financeiros como taxa de juros e câmbio.
6
Uma das principais formas de proteção contra variações de preços de mercado de um
determinado ativo é por meio da negociação de contratos futuros padronizados e negociados em
bolsa. Segundo Castellano (2009, p.19), essa padronização inclui as particularidades do ativo
objeto, a data de vencimento, a quantidade, as condições de entrega e as formas de liquidação. A
única variável não padronizada é o preço, que é determinado pelo mercado.
As principais especificações do contrato futuro negociado na BMF&Bovespa são:
−
Objeto de negociação: café arábica cru, em grão, de produção brasileira, tipo 6 ou melhor,
bebida dura ou melhor, para entrega no município de São Paulo.
−
Unidade de negociação: 100 sacas de 60 kg.
−
Cotação: US$/saca, com duas casas decimais.
−
Meses de vencimento: março, maio, julho, setembro e dezembro.
−
Data de vencimento: sexto dia útil anterior ao último dia do mês de vencimento.
−
Pontos de entrega2: armazéns credenciados pela BMF&Bovespa.
De acordo com Silva Neto (2006, p.36), “Uma das principais vantagens dos contratos
padronizados é sua intercambialidade”, ou seja, para liquidar direitos e deveres decorrentes da
compra de um contrato futuro, basta realizar uma venda do mesmo tipo de contrato para o mesmo
vencimento. Essa característica é essencial para o hedger que busca proteção contra variações de
preços (risco de mercado).
Outro mecanismo fundamental dos contratos futuros é a prática do ajuste diário (i.e. ajuste
ao preço de mercado), que juntamente com as margens de garantia, permitiu que o sistema se
tornasse cada vez mais seguro e relevante em termos de volumes negociados.
Em 2010, por exemplo, foram negociados 674.006 contratos futuros de café arábica,
totalizando um volume de R$ 23,3 bilhões. Esse montante representou 36,2% do volume total
negociado com futuros de commodities agrícolas no Brasil (BM&FBOVESPA, 2011).
Observa-se que, apesar da negociação ocorrer no Brasil, a cotação do contrato futuro de café
arábica é em dólares norte-americanos. Isso se justifica basicamente por duas razões: (i)
normalmente os exportadores de café não pré-determinam um preço fixo, mas sim a bolsa na qual
será efetuada a fixação do preço; e (ii) pela relação pré-existente entre a cotação no mercado
brasileiro e a da Intercontinental Exchange (ICE), denominada anteriormente New York Board of
Trade (NYBOT), principal local para precificação mundial do café.
2
Embora a liquidação física seja possível, na maioria dos contratos realiza-se a liquidação financeira.
7
Quando o diferencial de preços entre o contrato futuro negociado na BMF&Bovespa e
aquele negociado na ICE exacerbam certos limites, teoricamente existe uma oportunidade de
arbitragem (i.e. compra de contrato futuro no local no qual o preço está inferior e venda no local no
qual o preço é superior). O escopo deste trabalho limita-se à análise do comportamento de preços
futuros apenas da bolsa local, ou seja, da BMF&Bovespa.
2.2
BASE E O RISCO DE BASE
O preço futuro de uma commodity agrícola, como o café, é determinado em função do seu
preço à vista, somados aos custos de armazenagem até o vencimento do contrato e aos juros do
período. Essa relação decorre da teoria da arbitragem, “(...) segundo a qual não é possível obter-se
constantemente lucro operando-se em dois mercados e aproveitando-se de quaisquer distorções no
preço desses mercados” (SILVA NETO, 2006, p. 47).
A diferença entre o preço à vista de determinado ativo e o preço do contrato futuro é
denominada base. De acordo com Hull (2005, p. 98), em uma situação de hedge, a base pode ser
definida conforme a equação 1.
Base = PV − PF
(1)
Onde:
PV = preço à vista do ativo a ser hedgeado
PF = preço futuro do contrato utilizado
Segundo a literatura, quando o preço futuro é maior do que o preço à vista, a base está
normal; caso contrário, está invertida. Quando a diferença de preço entre o mercado à vista e o
futuro diminui (estreitamento), a base se fortalece. Por outro lado, quando essa diferença aumenta
(alargamento), a base se enfraquece.
Lopes, Galdi e Lima (2009, p.45) afirmam que “na medida em que a data de vencimento do
contrato futuro se aproxima, o preço do contrato futuro converge para o preço à vista do ativo”. Isso
acontece devido às oportunidades de arbitragem que levariam novamente os preços ao equilibro.
Em resumo, para que não haja arbitragem consistente no tempo, o preço do café na data de
vencimento do contrato futuro deve ser igual ao preço futuro para o mesmo vencimento. Essa
tendência de convergência é condição fundamental para os hedgers.
8
Entretanto, conforme alertam Correa e Raíces (2010, p.75), “Mesmo com os preços
tendendo a convergir, nem sempre isso se dá de forma linear, absoluta”. Essas discrepâncias ou
imperfeições podem decorrer: (i) da impossibilidade de comprar ou vender um contrato para o mês
desejado; (ii) do produto negociado em bolsa não ser idêntico ao produto possuído; (iii) do local de
depósito ser distante daquele determinado pela bolsa, (iv) de variações de taxa de juros e câmbio,
etc.
De acordo com Miceli (2008, p.69), quando o mercado físico não varia da mesma forma que
o futuro, a operação de hedge não será perfeita. Esse risco é conhecido como risco de base e decorre
da diferença entre os preços à vista e futuros não se igualarem, conforme explicitado na equação 2:
(2)
S t − S t −1 ≠ Ft − Ft −1
Onde:
St = preço à vista no vencimento do contrato futuro
St-1 = preço à vista no momento da operação do contrato futuro
Ft = preço futuro no vencimento do contrato futuro
Ft-1 = preço futuro no momento da operação do contrato futuro
Ainda segundo Miceli (2008, p.69), “Essa diferença e o risco de base não podem ser
eliminados. Entretanto, o risco pode ser conhecido e mensurado, fazendo-se uma comparação por
longo tempo entre os preços nas diferentes praças e calculando-se o desvio-padrão, de forma a
incorporá-lo”. Seguindo essa orientação, pode-se calcular facilmente o risco de base por meio da
equação 3.
t
∑1 [Base −média(Base)]
2
t
Risco de base =
(n − 1 )
(3)
Onde:
Base = preço à vista – preço futuro no primeiro vencimento
n = número de observações da amostra
A mensuração e a interpretação do risco de base são fundamentais para aumento da
efetividade das operações de hedge com café. Segundo Hull (2005, p. 101), “(...) o risco de base
pode levar à melhora ou piora da posição do hedger”.
9
Para o agente que busca proteção contra o aumento de preços, o hedger de compra, se a base
enfraquecer (fortalecer), sua posição melhorará (piorará). Por outro lado, para o agente que busca
proteção contra a queda de preços, o hedger de venda, se a base enfraquecer (fortalecer), sua
posição piorará (melhorará).
Os exemplos dados a seguir, baseados em Correa e Raíces (2010) e Miceli (2008), buscam
explicitar essa relação.
2.3
HEDGE DE COMPRA
Suponha que, em outubro de 2010, uma torrefadora de café na região Mogiana-SP tenha
fechado um contrato de suprimento de 10.000 sacas de café, para entrega em dezembro de 2010.
Tendo em vista o risco de alta no preço do café, o que poderia comprometer a margem de lucro da
torrefadora, a empresa faz um hedge de compra de contratos futuros.
Em outubro de 2010, a cotação do café negociado à vista na região, segundo dados do
Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), era US$ 191,46. A cotação para o
contrato futuro com vencimento em dezembro de 2010 era US$ 222,68. Portanto, a base, ou seja, o
diferencial entre o preço à vista da região Mogiana-SP e o preço do contrato futuro no primeiro
vencimento, era US$ -31,22.
Passados três meses, em dezembro de 2010, temos a seguinte situação: cotação do café à
vista na região Mogiana-SP, US$ 226,67; e cotação final do contrato futuro, US$ 253,12. O valor
da nova base passou a ser US$ -26,45. A base não ficou constante, isto é, houve um fortalecimento
(estreitamento) de 4,77; variando de US$ -31,22 para US$ -26,45. De acordo com a equação 2, o
diferencial entre os preços à vista e futuro não se igualam: 35,21 ≠ 30,44. Portanto, conforme
demonstram os cálculos a seguir, o hedge não será perfeito.
No mercado físico, a torrefadora desembolsou US$ 2.266.700,00 (US$ 226,67 x 10.000
sacas). No mercado futuro, ela obteve um ganho de US$ 304.400,00 ((US$ 253,12 – US$ 222,68) x
100 x 100). Portanto, o custo total da compra de café para a torrefadora foi de US$ 1.962.300,00, ou
US$ 196,23/saca. Observa-se que o preço do mercado à vista na região, três meses antes, era de
US$ 191,46. A diferença de US$ 4,77, desfavorável ao torrefador, decorre exatamente do
fortalecimento da base ocorrido no período.
Isso não significa que a operação não protegeu o torrefador contra a alta de preços do café.
No exemplo dado, caso o agente não tivesse realizado a operação de hedge, o aumento dos custos
de compra do café seriam de 18,39% (US$ 226,67/US$ 191,46). Entretanto, com a operação de
10
compra de contratos futuros, desconsiderando os custos da bolsa, esse aumento foi da ordem de
apenas 2,49% (US$ 196,23/US$ 191,46), considerando o diferencial da base.
Essa situação hipotética, mas com cotações reais, demonstra que o agente não pode mudar
os preços determinados pelo mercado, mas, caso houvesse um conhecimento prévio do
comportamento da base, esse fator poderia ser incorporado no planejamento do hedge.
2.4
HEDGE DE VENDA
Obviamente se o fortalecimento da base foi desfavorável ao agente que buscava proteção
contra a alta de preços do café, para o hedger de venda, o fortalecimento da base melhorará sua
situação final. Para facilitar esse entendimento, serão utilizados os mesmos dados e período do caso
anterior.
Suponha que, em outubro de 2010, um produtor de café na região Mogiana-SP deverá
vender 10.000 sacas de café para entrega em dezembro de 2010. Tendo em vista o risco de queda no
preço do café, o que poderia comprometer sua margem de lucro, o produtor faz um hedge de venda
de contratos futuros.
Em outubro de 2010, as cotações do café à vista e futuro eram de US$ 191,46 e US$ 222,68,
respectivamente. E, em dezembro de 2010, as cotações do café à vista e futuro totalizaram US$
226,67 e US$ 253,12, respectivamente. A base passou de US$ -31,22 para US$ -26,45, ocorrendo
um fortalecimento de US$ 4,77. Portanto, conforme demonstram os cálculos a seguir, o hedge
também não será perfeito.
No mercado físico, o produtor recebeu US$ 2.266.700,00 (US$ 226,67 x 10.000 sacas). No
mercado futuro, ele obteve um resultado negativo de US$ 304.400,00 ((US$ 222,68 – US$ 253,10)
x 100 x 100). Portanto, o resultado total da venda de café foi de US$ 1.962.300,00, ou US$
196,23/saca. Observa-se que o preço do mercado à vista na região, três meses antes, era de US$
191,46. A diferença de US$ 4,77, favorável ao produtor, decorre exatamente do fortalecimento da
base ocorrido no período.
Ressalta-se novamente que, o hedger não pode mudar os preços determinados pelo mercado,
mas, caso haja um conhecimento prévio do comportamento da base, conforme explicitado na
equação 3, esse fator pode e deve ser incorporado no planejamento do hedge, conforme será
demonstrado na parte empírica deste trabalho.
11
Entretanto, previamente à descrição da metodologia empregada para testar as hipóteses da
pesquisa, no capítulo seguinte são apresentadas e discutidas as evidências empíricas de pesquisas já
desenvolvidas no Brasil que tratam direta ou indiretamente do mercado futuro de café,
principalmente no que se refere ao estudo do comportamento da base e do risco de base.
2.5
EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS
Fileni e Marques (1999) investigaram o desempenho do contrato futuro de café por meio da
análise do risco de base, da efetividade do hedge e da razão de hedging de mínima variância. Os
autores concluíram que o contrato futuro foi eficiente como redutor do risco de preço para as
principais regiões produtoras em Minas Gerais, no período 1995-1998.
Nogueira, Aguiar e Lima (2002) demonstraram que a operação de hedge para o mercado de
café arábica das principais regiões produtoras de Minas Gerais e São Paulo na BM&F é mais efetiva
do que a realizada na bolsa de Nova York. Os autores analisaram a razão ótima e efetividade do
hedge para o período 1996-2000.
Fontes, Castro Júnior e Azevedo (2003) mensuraram os valores da base e o risco de base da
atividade cafeeira em cidades de Minas Gerais e São Paulo para o período 1994-2001. A
diversidade dos valores demonstra que cada localidade apresenta características próprias de
comercialização, as quais devem ser consideradas quando da realização do hedge.
Barros e Aguiar (2005) avaliaram o risco de base para o período 1998-2003, focando os
retornos das estratégias de hedge com contratos futuros em cinco regiões produtoras de café do país.
Os autores concluíram que há oportunidades de ganho tanto para hedgers de venda quanto de
compra, porém as oportunidades de estratégias de compra são poucas e a lucratividade é menor
comparativamente às estratégias de venda.
Diferentemente dos estudos que buscaram avaliar o comportamento da base e do risco de
base, Mól et al. (2006) examinaram o processo da volatilidade dos retornos do café, por meio de
modelos Auto-regressivos com Heterocedasticidade Condicional (ARCH). Os resultados empíricos
para o período 1995-2001 sugerem sinais de assimetria na volatilidade das séries mais distantes do
vencimento do contrato.
Por fim, Miceli (2006) analisou empiricamente os fundamentos que regem a estrutura de
preços do café, concluindo que: (i) a volatilidade média não sofre grandes alterações e, à medida
que sua magnitude cresce, a probabilidade desse efeito continuar se reduz; (ii) os preços do café
12
seguem os de mercado; e (iii) os preços futuros negociados na BM&FBovespa possuem correlação
positiva com os preços da bolsa norte-americana.
De uma maneira geral, essas evidências sugerem que o contrato futuro de café e o
conhecimento da base e do risco de base são úteis para a realização de operações de hedge.
3
METODOLOGIA DA PESQUISA
Embora existam diferenças entre o preço à vista do café arábica e o preço do contrato futuro
no primeiro vencimento, espera-se que as cotações à vista e futuras apresentem o mesmo
comportamento tendendo para um determinado valor histórico. Teoricamente isso é esperado, pois,
caso contrário, estaríamos diante de um cenário com possibilidades de ganhos sem riscos
constantes. Portanto, a fim de investigar essa relação teórica, o capítulo apresenta a descrição e as
limitações da metodologia empregada para responder, por meio de evidências empíricas, à seguinte
questão de pesquisa: é possível conhecer previamente o comportamento de preços da base do café
arábica no Brasil, a fim de aumentar a efetividade do hedge?
3.1
AMOSTRA E COLETA DE DADOS
Foram utilizadas duas bases de dados para realização da pesquisa: a do Centro de Estudos
Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) ESALQ/USP para levantamento dos preços à vista do
café arábica e a base da BMF&Bovespa para obtenção das cotações do contrato futuro. Buscou-se
utilizar o maior número de dados possíveis, observando dois critérios principais: (i) atualidade dos
dados, e (ii) disponibilidade de informações publicadas pelo CEPEA em seu sítio na internet.
Baseando-se nesses critérios, o período de análise compreendeu os anos de 2003 a 2010.
Foram levantados preços médios mensais do café arábica tipo 6, bebida dura para melhor, para as
cinco principais regiões produtoras do país: Cerrado-MG, Mogiana-SP, Sul de Minas, Paulista e
Noroeste do Pará.
Os preços regionais representam valores a retirar e foram obtidos por meio do diferencial de
cada região em relação ao indicador calculado pelo CEPEA. Para uma comparação correta com a
cotação do contrato futuro, os preços em reais foram transformados para dólares norte-americanos,
utilizando-se a média mensal da PTAX800 divulgada pelo Banco Central do Brasil. Portanto, os
preços à vista para cada região estão expressos em US$/saca de 60 kg.
13
Para construção da base com as cotações dos contratos futuros utilizou-se o Sistema de
Recuperação de Informações da BMF&Bovespa. Inicialmente, foram baixadas as cotações diárias
de todos os contratos e selecionadas apenas aquelas que se referiam ao primeiro vencimento do
contrato. Na sequência, foram calculadas as cotações médias mensais.
A Tabela 1 demonstra o critério adotado para cálculo das cotações médias do primeiro
vencimento dos contratos futuros para o período 2003-2010. As cotações estão expressas na mesma
moeda e unidade dos preços à vista, ou seja, em US$/saca de 60 kg.
Tabela 1 – Mês de referência e 1º vencimento do contrato futuro
Mês de referência
janeiro / ano t
fevereiro / ano t
março / ano t
abril / ano t
maio / ano t
junho / ano t
julho / ano t
agosto / ano t
setembro / ano t
outubro / ano t
novembro / ano t
dezembro / ano t
Fonte: do Autor.
1º vencimento do contrato futuro
março / ano t
março / ano t
março / ano t
maio / ano t
maio / ano t
julho / ano t
julho / ano t
setembro / ano t
setembro / ano t
dezembro / ano t
dezembro / ano t
dezembro / ano t
Por fim, após a obtenção das séries dos preços à vista das cinco regiões e das cotações dos
contratos futuros no primeiro vencimento, foram calculadas as respectivas bases regionais (preço à
vista menos o preço do contrato futuro). Como o período analisado compreende 8 anos, as
observações das séries temporais totalizaram 96 meses.
3.2
TRATAMENTO ESTATÍSTICO E ANÁLISE DE DADOS
3.2.1 Testes de aderência à distribuição normal
A fim de testar a hipótese da normalidade das bases regionais do café, pode-se aplicar o
Teste Kolmogorov-Smirnov que analisa o grau de concordância entre a distribuição de um conjunto
de valores amostrais e determinada distribuição teórica específica, como a Normal.
Segundo a formulação do teste, descrita por Siegel (1956, p.47-52), primeiramente
calculam-se e acumulam-se as frequências esperadas para cada célula. Em seguida, colocam-se as
frequências em ordem crescente e calculam-se as frequências teóricas. Após calcular os desvios
absolutos entre as frequências acumuladas teóricas e observadas, identifica-se o Desvio Máximo,
14
que representa a estatística teste. Por fim, obtém-se o P-valor dessa estatística ou compara-se a
estatística teste com a estatística tabelada.
Embora o teste seja facilmente modelado em planilhas eletrônicas, por questões práticas,
utilizou-se o software SPSS Statiscs 17.0 para testar a normalidade das bases. A hipótese nula
considera que a amostra foi extraída da distribuição teórica especificada. Caso a hipótese nula de
normalidade da base não seja rejeitada, é possível estimar intervalos de confiança específicos para
os valores das bases de cada região.
3.2.2 Testes de correlação
Para testar a hipótese da correlação positiva e significativa entre as bases regionais do café,
calculou-se o Coeficiente de Correlação de Pearson ( ρ ). Segundo a literatura, o ρ varia de -1 a +1.
Em relação ao comportamento das bases, espera-se que a correlação entre as bases regionais seja
muito próxima de +1, indicando que os valores altos (baixos) de uma das variáveis correspondam a
valores altos (baixos) da outra. Valores próximos de zero indicariam a ausência de correlação
positiva.
De acordo com Stevenson (2001, p. 379), uma das formas para testar a significância da
correlação, ou seja, para verificar se a relação linear medida entre duas variáveis é estatisticamente
diferente de zero, é por meio da aplicação do seguinte teste t:
t=
ρ −0
(1 − ρ )/(n − 2 )
2
(4)
O cálculo da matriz de correlações e do teste de significância foi realizado por meio do
software Microsoft Excel. Caso as correlações sejam próximas de +1 e estatisticamente
significativas, é possível afirmar que o comportamento do diferencial de preços à vista e futuro é
similar entre as regiões analisadas.
3.2.3 Testes de cointegração
Para testar a terceira e última hipótese da pesquisa serão aplicados testes de cointegração a
fim de verificar a existência ou não de uma relação estável de longo prazo entre o preço futuro e o
preço à vista do café nas cinco regiões analisadas.
15
Segundo Gujarati (2006, p. 659), “do ponto de vista econômico, duas variáveis serão
cointegradas se tiverem entre elas uma relação de longo prazo, ou de equilíbrio”. Como a maioria
das séries temporais econômico-financeiras é estacionária em diferença, mas não estacionária no
nível, pode-se obter uma regressão espúria, ou seja, quando duas variáveis são relacionadas pelas
suas correlações com uma terceira variável. Daí a importância do teste.
Obviamente a literatura que trata da análise de séries temporais é extensa. Como esse
recurso vem sendo utilizado de maneira crescente nas pesquisas empíricas da área, optou-se pela
descrição direta dos passos do teste de cointegração. Para o leitor ainda não familiarizado com os
conceitos de estacionariedade e de testes de raiz unitária, recomenda-se a consulta às obras de
Matos (2000), Hill, Griffiths e Judge (2006) e Wooldridge (2007).
De acordo com esses autores, uma das possíveis formas para analisar a cointegração entre
duas variáveis (x e y) é o teste de Engle-Granjer. Em resumo, aplica-se o teste de raiz unitária de
Dickey-Fuller (DF) ou de Dickey-Fuller Aumentado (ADF) aos resíduos estimados da regressão
cointegrante ( εˆ ), conforme demonstrado na equação 5.
∆εˆt = γεˆt −1 + υ t
(5)
O valor t do coeficiente estimado γ segue a estatística tau. Caso a hipótese nula de que os
resíduos de mínimos quadrados são não estacionários seja rejeitada, conclui-se que as duas séries
são cointegradas, existindo, portanto, uma relação estável de longo prazo entre o preço futuro e os
preços à vista. Estima-se, por fim, o mecanismo de correção de erros para identificar a velocidade
do ajuste das distorções de curto prazo (que ocorrem normalmente) para o equilíbrio de longo
prazo, conforme demonstra a equação 6.
∆y t = β 1 ∆xt + δε t −1 + υ t
(6)
Caso o coeficiente δ seja estatisticamente significativo, seu valor indica a velocidade do
ajuste do desequilíbrio de curto prazo.
Abaixo, apresenta-se uma descrição resumida das etapas do teste de cointegração realizado
no software E-views:
1.
Testar se as séries dos preços à vista de cada uma das cinco regiões e dos preços dos contratos
futuros no primeiro vencimento são Integradas de Ordem (I1), ou seja, estacionárias na
primeira diferença.
2.
Estimar a regressão cointegrante no nível e armazenar os resíduos.
16
3.
Aplicar o teste de raiz unitária Dickey-Fuller (DF) ou Dickey-Fuller Aumentado (ADF) nos
resíduos da regressão estimada no passo anterior.
4.
Avaliar se os resíduos são estacionários. Caso positivo, então existe relação de longo prazo
(cointegração) entre as séries. Realiza-se o passo final.
5.
Estimar o modelo de correção de erros, que descreve o comportamento de curto prazo das
variáveis como uma função do desvio da relação de longo prazo.
Por fim, caso as relações entre preços futuros e preços à vista de cada região analisada sejam
de longo prazo, demonstra-se que a operação com contratos futuros de café arábica constitui um
instrumento eficaz para o hedger se proteger contra a variação de preços.
3.3
LIMITAÇÕES DA PESQUISA
Comparativamente aos trabalhos anteriores, esta pesquisa utiliza um período de amostra
relativamente longo, ou seja, a análise é realizada com dados mensais para oito anos. Por uma
questão de indisponibilidade dos preços à vista, não foram utilizados dados diários, o que poderia
trazer maior precisão às estimativas.
Mesmo com um amplo período de análise, uma das principais limitações desta pesquisa
(como a de qualquer outra realizada na área de finanças) é a de que a estimativa de intervalos de
confiança ou de relações entre variáveis baseada em valores passados não necessariamente se
repetirá no futuro. Em pesquisas acadêmicas é comum o uso de níveis de significância para mitigar
esse problema. Dessa forma, o risco de erros na rejeição e aceitação de hipóteses pode ser
estatisticamente controlado, tal como realizado neste trabalho.
4
4.1
ANÁLISE DOS RESULTADOS
ESTATÍSTICAS DESCRITIVAS
As Tabelas 2 e 3 apresentam as estatísticas descritivas para preços e bases do café.
17
Tabela 2 – Estatísticas descritivas para os preços do café arábica
US$/saca 60 kg
Futuro
Cerrado
Mogiana
Média
Mediana
Desvio padrão
Coeficiente de variação
Mínimo
Máximo
Observações
Fonte: do Autor.
130,62
131,37
42,24
0,32
55,17
253,12
96
117,90
118,05
38,60
0,33
50,39
229,24
96
117,21
117,74
37,99
0,32
50,21
226,67
96
Sul de
Minas
116,11
116,48
37,55
0,32
50,01
224,84
96
Paulista
110,91
111,64
35,75
0,32
47,12
204,28
96
Noroeste
Paraná
108,50
108,83
34,88
0,32
45,58
201,28
96
Tabela 3 – Estatísticas descritivas para as bases do café arábica
Base – US$
Cerrado
Mogiana
-12,72
-11,76
6,67
0,52
-37,72
-0,19
96
-13,41
-12,45
6,86
0,51
-39,49
-0,90
96
Média
Mediana
Desvio padrão
Coeficiente de variação
Mínimo
Máximo
Observações
Fonte: do Autor.
Sul de
Minas
-14,51
-13,28
7,15
0,49
-40,95
-1,56
96
Paulista
-19,71
-18,39
9,16
0,46
-50,54
0,79
96
Noroeste
Paraná
-22,12
-20,99
9,77
0,44
-55,65
-3,45
96
De acordo com a Tabela 2, observa-se que as séries dos preços (futuro e à vista) apresentam
um coeficiente de variação pouco acima de 30%, indicando a presença de volatilidade no mercado
de café arábica. Cerrado, Mogiana e Sul de Minas possuem médias de preços similares. Paulista e
Noroeste do Paraná diferenciam-se pelos preços mais baixos.
Em relação às bases, conforme demonstra a Tabela 3, pode-se constatar que ela é normal e
não invertida (preço futuro superior aos preços à vista). Pode-se afirmar também que: (i) Cerrado,
Mogiana e Sul de Minas apresentam valores médios da base similares; (ii) Paulista e Noroeste do
Paraná possuem uma base mais alargada, ou seja, o diferencial de preços à vista em relação ao
preço futuro é maior, comparativamente às demais regiões.
4.2
NORMALIDADE DA BASE
A Figura 1 apresenta a distribuição de frequências acumuladas para as bases das cinco
regiões analisadas.
18
Figura 1 – Histogramas das bases
Fonte: do Autor.
De acordo com essa primeira inspeção visual, sugere-se que comportamento das bases siga
uma distribuição normal. Entretanto, para fazer essa constatação formal, devem-se avaliar os
resultados do teste de normalidade Kolmogorov-Smirnov, conforme a Tabela 4.
19
Tabela 4 – Teste de normalidade das bases
One Sample Kolmogorov-Smirnov Test
N
Normal Parametersa,,b
Most Extreme Differences
Mean
Std. Deviation
Absolute
Positive
Negative
Kolmogorov-Smirnov Z
P-Value
Fonte: do Autor.
Cerrado
Mogiana
96
-12,73
6,67
0,11
0,07
-0,11
1,12
0,16
96
-13,41
6,86
0,12
0,07
-0,12
1,15
0,14
Sul de
Minas
96
-14,51
7,15
0,11
0,07
-0,11
1,07
0,20
Paulista
96
-19,71
9,16
0,11
0,08
-0,11
1,06
0,21
Noroeste
Paraná
96
-22,12
9,77
0,11
0,09
-0,11
1,03
0,24
Considerando o P-valor da estatística teste, não se pode rejeitar a hipótese nula de que a
distribuição das bases segue uma normal. Portanto, ao confirmar a primeira hipótese da pesquisa, é
possível identificar intervalos de confiança para valores prováveis da base do café.
Para cálculo do intervalo de confiança, utilizou-se um nível de significância de 5%, ou seja,
em 95% dos casos a base de cada região deve estar dentro de seu respectivo intervalo (+ ou – 1,96
desvios-padrão), conforme demonstra a Tabela 5.
Tabela 5 – Intervalo de confiança para as bases
95% de Confiança
Limite inferior
Limite superior
Fonte: do Autor.
Cerrado
Mogiana
-25,80
0,35
-26,86
0,04
Sul de
Minas
-28,51
-0,50
Paulista
-37,66
-1,76
Noroeste
Paraná
-41,27
-2,98
Essas informações são úteis para auxiliar o hedger no seu planejamento de busca de
proteção contra o risco de variação de preços. Por exemplo, se o valor da base em dado momento do
tempo estiver fora desse intervalo, existe uma forte probabilidade de que o mesmo retorne para o
seu padrão histórico.
Além disso, também confirmamos que as bases das regiões Paulista e Noroeste do Paraná
possuem um intervalo de confiança maior (as bases são mais largas) comparativamente às regiões
Cerrado, Mogiana e Sul de Minas.
4.3
CORRELAÇÃO ENTRE BASES DE DIFERENTES PRAÇAS
Mesmo com intervalos de confiança particulares para a base de cada região, os dados da
Tabela 6 demonstram que as correlações entre as bases é estatisticamente significativa e positiva,
com valores muito próximos de 1.
20
Tabela 6 – Matriz de correlação entre as bases
Correlação entre bases
Cerrado
Cerrado – MG
1,0000
Mogiana – SP
0,9923
(0,0000)
0,9814
(0,0000)
0,9125
(0,0000)
0,8445
(0,0000)
Sul de Minas
Paulista
Noroeste do Paraná
Mogiana
Sul de
Minas
Paulista
Noroeste
Paraná
1,0000
0,9932
(0,0000)
0,9389
(0,0000)
0,8895
(0,0000)
1,0000
0,9556
(0,0000)
0,9135
(0,0000)
1,0000
0,9762
(0,0000)
1,0000
Fonte: do Autor.
Os números entre parênteses indicam o P-valor do teste de significância.
As correlações são maiores entre as regiões: (i) Cerrado, Mogiana e Sul de Minas, com
aproximadamente 99%; e (ii) Paulista e Noroeste do Paraná, com 97%. Embora todas as correlações
sejam estatisticamente significativas, a menor correlação encontrada, de 84%, foi entre as bases da
região do Cerrado e Noroeste do Paraná.
Ao confirmar a segunda hipótese da pesquisa, pode-se afirmar que o comportamento do
diferencial de preços à vista e futuro é similar entre as regiões analisadas. Essa evidência é
importante, pois, apesar das particularidades de cada região, o contrato futuro pode ser eficaz para
fins de hedge, independentemente da localização na qual o preço à vista é negociado.
4.4
RELAÇÃO ENTRE O PREÇO FUTURO E O PREÇO À VISTA
Previamente à análise dos resultados do teste de cointegração, a Figura 2 apresenta os
gráficos da relação estimada entre preço futuro e preços à vista para cada região analisada.
21
280
280
240
240
200
200
160
160
120
120
80
80
40
40
03
04
05
06
FUTURO
07
08
09
03
10
04
05
06
FUTURO
CERRADO
280
280
240
240
200
200
160
160
120
120
80
80
40
07
08
09
10
MOGIANA
40
03
04
05
06
07
FUTURO
08
09
10
MINAS
240
200
160
120
80
40
04
05
06
FUTURO
07
08
04
05
06
FUTURO
280
03
03
09
10
PARANA
Figura 2 – Preço futuro e preços à vista regionais
Fonte: do Autor.
07
08
PAULISTA
09
10
22
De acordo com a Figura 2, constata-se uma forte correlação entre os preços à vista regionais
e futuros, sendo estes últimos sempre superiores aos primeiros. Entretanto, para uma estimativa
segura dessa relação é necessário aplicar os passos descritos no capítulo 3.2.3.
O primeiro teste verifica a estacionariedade de cada série temporal. Conforme condição
exigida para aplicação da regressão cointegrante, as séries devem ser Integradas de Ordem 1 (I1),
ou seja, estacionárias na primeira diferença. Para isso, deve-se rejeitar a hipótese nula da existência
de raiz unitária. A Tabela 7 contém os resultados principais do teste Dickey-Fuller Aumentado
(ADF), realizado com intercepto, tendência e duas defasagens para cada série.
Tabela 7 – Teste de estacionariedade
Teste de raiz unitária
Futuro
Cerrado
Mogiana
Sul de
Minas
-2,01
-3,87**
Paulista
Estatística ADF do nível
-2,00
-1,99
-2,00
-2,42
***
**
**
Estatística ADF da 1ª diferença
-4,88
-3,92
-3,93
-4,29***
Fonte: do Autor.
***, ** e * correspondem à significância estatística nos níveis 1%, 5% e 10% respectivamente.
Noroeste
Paraná
-2,29
-4,29***
Com um nível de significância de 1%, constata-se que as séries Futuro, Paulista e Noroeste
do Paraná são estacionárias na primeira diferença. Cerrado, Mogiana e Sul de Minas também são
estacionárias na primeira diferença, mas com um nível de significância de 5%.
Como a condição de estacionariedade foi respeitada, procede-se a estimativa da relação
entre preços futuros e à vista no nível (variáveis denominadas em preço e não em diferença).
Embora teoricamente o preço futuro seja formado a partir do preço à vista, essa relação na
prática também pode ser reversa, ou seja, o preço à vista ser determinado em função da cotação do
contrato futuro. Além disso, é comum em pesquisas empíricas, utilizar o preço à vista como
variável dependente a fim de estimar a razão ótima e a efetividade do hedge. Portanto, para
estimação das regressões cointegrantes, utilizaram-se os preços à vista como variável dependente e
o preço futuro como variável independente.
A Tabela 8 apresenta os resultados principais das estimativas das regressões cointegrantes,
bem como o resultado da estatística do teste de Dickey-Fuller (DF) aplicado aos resíduos. Para que
a relação seja válida no nível, os resíduos devem ser estacionários. Nesse caso, a literatura
econométrica recomenda a aplicação do teste de raiz unitária aos resíduos, sem considerar tendência
e intercepto.
23
Tabela 8 – Regressão cointegrante
Variável dependente: preço à vista
Cerrado
Mogiana
Sul de
Minas
0,88***
1,05
98,15%
0,0000
-5,04***
Paulista
Noroeste
Paraná
0,81***
2,13
97,18%
0,0000
-4,00***
Preço Futuro
0,90***
0,89***
0,83***
Intercepto
-0,35
0,77
1,88
2
R ajustado
98,07%
98,18%
97,22%
Prob. (F)
0,0000
0,0000
0,0000
Estatística DF do resíduo
-5,07***
-5,19***
-4,00***
Fonte: do Autor.
***, ** e * correspondem à significância estatística nos níveis 1%, 5% e 10% respectivamente.
Em todas as regiões, observa-se uma relação estatisticamente significativa e positiva entre o
preço futuro e os preços à vista, com um nível de significância de 1%. Os coeficientes que
determinam a relação entre preço futuro e preço à vista são da ordem de aproximadamente 0,89 nas
regiões Cerrado, Mogiana e Sul de Minas e de 0,82 nas regiões Paulista e Noroeste do Paraná.
Constata-se, também, que os preços futuros explicam aproximadamente 98% dos preços à vista.
Ressalta-se que o modelo acima é válido pois, em todas as regressões, os resíduos são
estacionários, conforme demonstra a significância do teste de raiz unitária DF.
Por fim, para conclusão das etapas do teste de cointegração, deve-se estimar o mecanismo
de correção de erros, que descreve o comportamento de curto prazo das variáveis como uma função
do desvio da relação de longo prazo. Nesse caso, utilizam-se como variável dependente as variações
dos preços à vista e como variáveis independentes as variações nos preços futuros e o resíduo
defasado da regressão cointegrante. Caso o coeficiente do resíduo defasado seja estatisticamente
significativo, o mesmo representa a própria magnitude da correção das perturbações de curto prazo,
conforme demonstram os dados da Tabela 9.
Tabela 9– Modelo de correção de erros
Variável dependente: variação do
Sul de
Noroeste
Cerrado Mogiana
Paulista
preço à vista
Minas
Paraná
Variação do Preço Futuro
0,70***
0,70***
0,70***
0,60***
0,61***
***
***
***
***
Resíduo defasado
-0,33
-0,33
-0,33
-0,22
-0,23***
R2 ajustado
72,88%
73,64%
74,14%
70,24%
71,65%
Fonte: do Autor.
***, ** e * correspondem à significância estatística nos níveis 1%, 5% e 10% respectivamente.
Observa-se que em todos os casos, o coeficiente dos resíduos defasados é negativo e
significativo. Isso significa que existem desequilíbrios de curto prazo, cujos ajustamentos ocorrem à
base de -0,33 ao mês para as regiões Cerrado, Mogiana e Sul de Minas, e de aproximadamente 0,22 nas regiões Paulista e Noroeste do Paraná.
24
Desses resultados, podem-se extrair ainda duas interpretações práticas: (i) os coeficientes da
variação do preço futuro expressam a razão ótima de hedge para cada região, e (ii) o R2 ajustado
constitui uma importante proxy para a efetividade do hedge. Em todas as regiões os coeficientes são
significativos e a efetividade do hedge é superior a 70%, resultado superior aos reportados por
Fileni e Marques (1999) e Nogueira, Aguiar e Lima (2002).
Portanto, confirma-se a terceira e última hipótese da pesquisa, ou seja, existe relação estável
de longo prazo entre o preço futuro e os preços à vista. Essa evidência é fundamental para
demonstrar que o contrato futuro de café arábica é um instrumento eficaz para realização de
operações de hedge em diferentes praças.
4.5
APLICAÇÕES PRÁTICAS PARA FINS DE HEDGE
Quando não há conhecimento prévio do comportamento da base e do risco de base de um
ativo, a incerteza em relação à efetividade da operação de hedge aumenta. Nesse sentido, os
resultados deste trabalho são relevantes para a atuação profissional dos agentes que buscam
proteção contra risco de variação de preços, na medida em que permitem o uso de:
−
Intervalos de confiança para avaliar se o valor da base do café está dentro de seu valor
histórico regional (Tabela 5).
−
Matriz de correlação para avaliar o diferencial de valores entre bases de diferentes praças
(Tabela 6).
−
Coeficientes entre preços futuros e preços à vista para auxiliar no estabelecimento de
estratégias de compra ou de venda nos mercados futuro e regionais (Tabelas 8 e 9).
Voltemos aos casos desenvolvidos no capítulo 2. No momento da contratação do hedge de
venda, a base da região Mogiana era US$ -31,22. Como o intervalo de confiança da região aponta
que o valor não deveria ultrapassar US$-26,86, espera-se a ocorrência de seu fortalecimento (como
de fato ocorreu, passando para US$-26,45) o que beneficia o produtor. Já o hedger de compra
poderia ter verificado que a relação entre o preço futuro e à vista era 0,86; abaixo do coeficiente de
longo prazo 0,89. Portanto, havia evidências que indicavam que os preços à vista poderiam
aumentar, conforme de fato ocorreu. Esses exemplos ilustram como os resultados desta pesquisa
podem ser úteis para aumentar a efetividade do hedge.
25
5
CONCLUSÕES
A operação de proteção contra o risco de variação de preços é essencial para a gestão de
margens de lucro de compradores e vendedores de commodities agrícolas. No caso do café, o hedge
torna-se ainda mais relevante devido à posição de destaque que o Brasil ocupa no mercado
internacional e ao volume crescente dos contratos futuros negociado em bolsa.
Teoricamente, espera-se que o preço à vista de um ativo seja convergente ao preço futuro, na
medida em que o contrato se aproxima do vencimento. Entretanto, na prática, o mercado à vista não
varia da mesma forma que o futuro, o que inviabiliza a estruturação de operações de hedge perfeito.
Isso decorre do risco de base, que não pode ser eliminado, mas sim mensurado e incorporado
previamente à estrutura da operação.
O presente trabalho demonstrou, por meio de evidências empíricas, que é possível conhecer
previamente o comportamento de preços da base do café arábica, a fim de aumentar a efetividade
do hedge das cinco principais regiões produtoras no Brasil: Cerrado-MG, Mogiana-SP, Sul de
Minas, Paulista e Noroeste do Paraná. A análise dos resultados dos testes estatísticos aplicados para
uma amostra, com dados mensais no período 2003-2010, permitiu confirmar as três hipóteses da
pesquisa: (i) a base do café segue uma distribuição normal; (ii) a correlação entre as bases das
diferentes praças é positiva e estatisticamente significativa; e (iii) existe relação estável de longo
prazo entre o preço futuro e os preços à vista regionais.
Confirmadas as hipóteses, a principal contribuição da pesquisa é a apresentação de métricas
quantitativas, baseadas em testes estatísticos e econométricos, úteis ao hedger de compra ou de
venda de cada região específica: (i) intervalos de confiança para avaliar se o valor da base do café
está dentro de seu valor histórico regional; (ii) matriz de correlação para avaliar o diferencial de
valores entre bases de diferentes praças; e (iii) coeficientes entre preços futuros e preços à vista para
decisão de compra ou de venda nos mercados futuro e regionais. Esta última métrica é
particularmente inédita na literatura nacional.
Por fim, constatou-se que, embora seja possível realizar o hedge incorporando o
comportamento específico da base e do risco de base de cada praça, as regiões Cerrado-MG,
Mogiana-SP e Sul de Minas apresentam métricas comuns entre si, mas diferentes das regiões
Paulista e Noroeste do Paraná. Como sugestão para trabalhos futuros, recomenda-se a análise de
séries temporais com dados diários para verificar se os resultados se mantêm.
26
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BASE E O RISCO DE BASE DO CAFÉ ARÁBICA