Engatinhar é preciso Quando seu filho descobre que pode se movimentar sem a sua ajuda, ele desenvolve conexões cerebrais que vão ser importantes para o aprendizado da fala e da escrita. Quem anda direto pode sentir falta dessa etapa depois. Caia no chão com ele. Muitos pais e mães ficam cheios de orgulho quando o filho pula a fase do engatinhar. Andar direto é isto como sinônimo de precocidade, quase um atestado de QI acima da média, daquelas coisas que a gente gosta de comentar na sala de espera do pediatra. Não é à toa que nos espantamos quando o médico aconselha a pôr o filho no chão e estimulá-lo a, exatamente, engatinhar. "Ué, mas isso não é voltar atrás?" Não mesmo. Essa é uma etapa tão importante que pode ajudar seu filho depois, na hora de aprender a falar, a escrever, a copiar a lição... A coisa parece meio maluca, mas faz sentido. "Quanto mais possibilidades motoras a criança tem, mais preparada a estrutura neurológica estará para as funções superiores - aprendizado da escrita, da fala e do pensamento", afirma Fernanda Rombino, que trabalha com reorganização neurofuncional. Ao engatinhar, o campo visual do bebê aumenta, e ele adquire percepção de espaço e tempo - começa a notar volume, distância... "Fica mais fácil fazer a progressão espacial, que é a noção de que a criança vai precisar, por exemplo, para passar ao caderno o que vê na lousa", exemplifica Izabel Bicudo, psicomotricista e presidente da Sociedade Brasileira de Psicomotricidade. O fato de o bebê saltar essa fase está ligado à maturação do seu sistema neurofuncional. "Pode ter causa genética (talvez você mesmo ou os avós nunca tenham engatinhado) ou se dever à falta de estímulos", diz Dr. Mauro Muszkat, neuropediatra e coordenador do Núcleo de Atendimento Neuropsicológico Infantil. Nada de pânico. "O sistema neurológico vai se desenvolver normalmente", garante o médico. O interessante é proporcionar oportunidades para que seu filho se movimente dessa maneira, mesmo que ele já caminhe. www.seremdesenvolvimento.com Foi o que fez Carolina Campos, mãe de Dylan. O menino começou a andar aos 9 meses. "Primeiro ele circulava pela casa se apoiando em tudo. De repente, começou a andar", conta a mãe. "Hoje ele também engatinha. Procuro deixar alguns brinquedos próximos para que ele exercite o engatinhar. Engatinhar, no dicionário, é andar de gatinho, sustentando o corpo em quatro pontos. Quando seu filho conseguir virar de bruços, prepare-se! Os bracinhos já estão mais fortes, e, um belo dia, ele joga o corpo para frente, vira a barriga para baixo, apóia as mãos e os joelhos no chão, empina a bundinha e lá vai atrás do que lhe chamar mais a atenção. "É instintivo fazer movimentos cruzados (braço direito e perna esquerda) como os gatos", explica a fonoaudióloga Fernanda Rombino. Com o passar do tempo, a cadeia muscular, sob o comando do cérebro, adquire maior organização. Aos poucos os reflexos se tornam ações voluntárias, aprendidas. "Até então, qualquer ação do bebê era ato reflexo, como buscar o peito da mãe para mamar", complementa. A vivência que a criança, arrastando-se pelo chão, adquire é fundamental para o amadurecimento do mesencéfalo - parte do cérebro responsável pela remessa de mensagens ligadas à realização de movimentos. Com o deslocamento do bebê, os dois hemisférios cerebrais passam a trabalhar unidos. Entre o oitavo e o nono mês, aproximadamente, o bebê desfruta dessa incrível sensação de liberdade. Ele está apto para suas primeiras expedições pela casa. "É a descoberta de um novo mundo, a criança cria novas relações espaciais e ganha um repertório mais amplo", afirma Dr. Mauro. Agora tudo é uma ação motora. "A partir da experiência corporal, das novas vivências, o bebê constrói imagens e pensamentos", acrescenta a psicomotricista Izabel Bicudo. O desenvolvimento das crianças pode ser avaliado por três aspectos: neuromotor, anato-fisiológico e psicológico. O primeiro é responsável pela consciência do eixo corporal, que é fundamental para o equilíbrio e as noções de lateralidade (percepção do que está à direita ou à esquerda, na frente ou atrás...). O segundo está ligado ao fortalecimento muscular, à formação da curvatura cervical e lombar, posicionando a coluna de forma mais correta, e à curva plantar, que o pezinho do bebê não tinha antes. Nessa fase de início de independência, de autonomia e mobilidade, a criança descobre que a mãe é uma coisa e ela www.seremdesenvolvimento.com outra. "Até então, o bebê achava que ele e a mãe eram a mesma pessoa. O desenvolvimento psicológico surge a partir das experiências corporais", completa Izabel. Então, coloque seu filho no chão e deixe que ele ganhe o mundo. AJUDE SEU FILHO A ENGATINHAR Não tenha receio de colocar o bebê no chão. Estique um edredom ou um tapetinho próprio para bebês, vendido em loja de brinquedos. A criança precisa de espaço para se exercitar. Crie um ambiente seguro. A melhor maneira de descobrir onde estão os riscos é sair, você mesmo, engatinhando pela casa. Coloque no chão objetos que chamem atenção, mas os deixe um uma distância que possibilite que o bebê engatinhe. Leve a criança diante do espelho para que ela se reconheça. Se possível, instale no quarto do bebê um espelho no sentido horizontal bem próximo ao chão. Ele observará seus movimentos. Já é possível distraí-los com brincadeiras como: "Cadê? Achou!". Eles adoram se esconder atrás de qualquer coisa. Estimule a visão da criança com brinquedos coloridos e objetos externos, relacionados a cenas do cotidiano. Exemplo: dar nome às coisas, mostrar o cachorro, a árvore, os pássaros etc. POR TATIANA ARANHA Revista Pais e Filhos - Edição 425 - Agosto/2005 www.seremdesenvolvimento.com