“JÁ É”: PSICANÁLISE E POLÍTICAS PÚBLICAS NO CAMPO SOCIOEDUCATIVO Andréa Máris Campos Guerra Aline Guimarães Benfica Guilherme del Debbio Em relação aos adolescentes brasileiros, envolvidos em atos infracionais, temos vivido, após implantação das medidas socioeducativas no Brasil uma mudança, em Minas Gerais – que acompanha mudança nacional – do perfil de crime cometido pelos jovens. Se até 2005 os maiores índices recaiam sobre o furto e o roubo, em 2010, esse perfil se modifica, recaindo sobre o microtráfico de drogas ilícitas. O armamento da população jovem, aliado aos ideais de consumo e às mudanças quanto aos ideais de regulação social (SOUZA, 2013-Monica Brandao), somaram-se na composição desse quadro, cujas consequências não são nada animadoras. Nesse contexto, a partir da extensão universitária, implementamos um modelo de trabalho que articula subjetividade e política. Trata-se de um projeto, “Já É’”, que se orienta pela associação de oficinas de arte e cultura ao trabalho de escuta psicanalítica individual e de conversações psicanalíticas – realizados, cada eixo, com diferentes jovens em diferentes espaços. O “Já É Psicanálise e Coletivo de arte de rua” realiza, em aglomerados urbanos com alto índice de homicídios e criminalidade, oficinas para construção de quadrinhos, problematizando e articulando a presença mais participativa e consciente de jovens no laço social. O “Já É Trocando uma Ideia” que, por demanda dos centros de internação e a partir de impasses ali identificados no cotidiano com os jovens, realiza conversações psicanalíticas com os mesmos. O processo é conduzido por três psicanalistas, em cinco encontros, sendo o primeiro e o último realizados com equipe e direção (para diagnóstico e devolução) e os demais com os jovens e membros da equipe. E, finalmente, o “JÁ É Espaço de Fala” acontece na oferta de atendimentos individuais aos adolescentes na clínica-escola da UFMG, realizados por psicólogos voluntários com supervisão e/ou construção do caso clínico, com orientação psicanalítica. O caso é encaminhado pelos centros socioeducativos, a partir de uma indicação institucional que sinaliza um mal-estar ou um embaraço subjetivo do jovem. Convidado, o adolescente consente ou não em vir e, daí, pode-se ou não firmar um laço transferencial de trabalho analítico. A dimensão política nos convoca a ler no ciclo repetitivo do circuito infracional a posição paradoxal de exclusão incluída, relacionada à estrutura de poder a qual estão submetidos pelo discurso capitalista. Dany-Robert Dufour, em “A arte de reduzir as cabeças” (2005), a partir de um diálogo estabelecido com Jacques Lacan, refere-se à astuciosa manobra do discurso capitalista que não apenas reduz os homens a um estado de produto consumível. O efeitos do discurso capitalista podem ser verificados também na arte de se reduzir os espíritos e as cabeças apontando para um processo de cassação do sujeito moderno e de fabricação de um novo sujeito” (p. 11, 2005). Essa nova forma de sujeito seria fruto da dessimbolização do mundo, consequência da transformação do homem em objeto de troca mercadológica. Não são mais os valores simbólicos que aparecem na ordem do dia, mas o jogo da circulação infinita dos homens tornados mercadoria. A psicanálise não desconsidera o mal radical presente no imperativo individual de satisfação exaltado na contemporaneidade pela via da satisfação consumista. Em sua aposta civilizatória, desde Freud se assinala o engajamento de cada sujeito em sua própria história, mas também não se perde de vista a civilização, o avanço da história da humanidade e seus avatares, responsabilizando-se ambos por sua cota de contribuição nesse processo que é sempre, de saída, local e subjetivo. Bem, no contexto atual, os efeitos do neo-liberalismo apontam o caminho oposto ao da renúncia pulsional, tese freudiana fundamental, em prol da civilização. Portanto, exige que atualizemos o mal-radical freudiano na contemporaneidade a partir de novos custos e de novas coordenadas. Desenvolvendo novas formas de trabalhar que estejam a altura da sintomatologia de nossa época. Caso clínico Monique chegou para atendimento devido à dificuldades de relacionamento na instituição. Relata que tentou esfaquear uma menina que havia “falado mal” dela. Por isso a internação. Entretanto, ela diz de um outro ato infracional, ao seu ver mais significativo: a tentativa de homicídio de seu padrasto, com tiros de revólver. Segundo ela, sua convivência com este era muito ruim. Antes de sair com o revólver em direção ao padrasto, disse ter ido ao encontro de seu pai. Faz “bagunça” no centro socioeducativo, chuta as coisas, quebra tudo: se não for na hora que eu quero, eu faço isso. Porque depois não precisa mais não. Caracterizou-se como “folgada” e “valente”. Pediu para ser atendida no Já É porque tinha medo de que, mesmo após o cumprimento de sua medida socioeducativa, voltasse a “aprontar”: Ponho muita maldade nos outros, alega. Me sinto ofendida e tento ofender os outros. Tô sabendo trabalhar com isso, não. Só quando eu aprender isso, que eu vou poder ir embora. Meu psicológico é muito fraco. Trazia para os atendimentos sua necessidade de controlar, dominar seus impulsos. Seu pai biológico separou-se de sua mãe quando tinha 10 anos. Ela relata o incômodo com a presença do novo namorado de sua mãe. Afirma que depois da chegada do namorado na residência sua mãe esta passou a não lhe dar mais atenção: eu podia ir pra qualquer lugar e chegar a hora que eu quisesse. Monique tratou de dar o seu jeito: envolveu-se com um traficante da região com quem casou e mudou-se para o morro. Lá se encontrou com armas, drogas e festas. Foi um vício. Não tinha escola nem trabalho. Eu ia pra casa da minha mãe, dizia que não voltaria pro morro, mas no dia seguinte tava lá de novo. Se tornou valente e folgada. Enfrentava tudo e todos. Desafiava as autoridades. Nem polícia conseguia me tirar do morro. Para garantir seu sustento, acabou se envolvendo com o tráfico de drogas. Se tornou valente após a morte de seu namorado. Esta morte, disse a adolescente, segundo os rumores em sua comunidade, poderia estar relacionada ao fato de que outro rapaz - um dos piores matadores do morro e o assassino de seu companheiro - gostava dela. Dizia que seu namorado era a pessoa mais importante de sua vida. Faziam tudo juntos. Não se desgrudavam. Com ele, não precisava de mais nada. Sua morte deixoulhe um vazio muito grande. Comenta que ele era uma pessoa com muita maldade. Para se resolver as coisas com ele, era no revide violento. Na época em que namoravam, Monique se dizia “boba e pura”, nem um pouco valente: fiquei assim depois que ele morreu. Chegou a mencionar que pegou no revólver pela primeira vez e foi dar tiro no padrasto logo após a morte de seu namorado: não tinha mais nada a perder. Com relação ao seu pai diz que ele violentava sua mãe sem motivos. As filhas tinham medo dele que fazia uso de drogas pesadas, mas nunca deixou de ser um trabalhador. E brigava só com minha mãe. A gente (ela e as irmãs) ele tratava bem. Movia sais e terra por nós. Ao separar-se do pai de Monique, a mãe, segundo a adolescente, não queria que ela e as filhas se encontrassem mais com ele. Para a gente não ficar igual a ele, mas a gente ficou foi pior. Só que minha irmã não ficou com maldade. Eu já fiquei. Gostava muito da irmã que era igual a um homem, mas era uma mulher. Era desafiador lidar com olhar do outro: é vendo a forma como o outro a vê que faz com que ela pense que o outro desconfia dela, que ache que ela está mentindo. Relata um episódio em que, ao conversar com outra menina, com a qual dizia manter uma relação amorosa dentro do centro socioeducativo, fez um gesto de levantar a mão para buscar um objeto. Esta menina se assusta e faz um movimento de se proteger contra uma possível agressão que esperava receber de Monique. A adolescente se surpreende e diz: todo mundo tem medo de mim, disse. Eu não aviso que faço, eu vou lá e faço. Sua mãe era assim: contava as coisas apenas depois de tê-las feito. Em relação a esse empuxo-ao-agir, a adolescente relata que deparando-se com situações que lhe afetavam, reagia com toda valentia, batia nas adolescentes do centro socioeducativo, jogava cadeiras para o alto. Durantes os atendimentos seus atos foram se espaçando: “Não dá pra dar tanta importância pra elas, senão eu acabo batendo”, A ausência da mãe nas visitas ocorridas no centro socioeducativo a deixavam agressiva e angustiada. Disse ser nervosa por qualquer coisinha porque sua mãe arrumou um padrasto e que este fato ela não poderia aceitar tão facilmente. Monique apontou que antes da separação de seus pais e de sua ida para o morro, sua mãe lhe servia como uma referência importante. Incentivava a filha a estudar, trabalhar e se dedicar a ser guarda-mirim, o que almejava antes de seguir o percurso infracional. O marido da minha mãe tomou a minha mãe de mim. Mas fui eu que quis sair de casa. Minha mãe não me mandou embora. Se deixasse, queria a atenção da minha mãe toda pra mim, mas sei que não é assim. Minha mãe me dá atenção, conversa comigo, o problema dela é tempo. Se minha mãe só falasse que não era pra fazer tal coisa, eu fazia, claro, só pra contrariar ela. Eu gostava quando ela me explicava porque não era pra fazer. O olhar vigilante do outro a incomodava. Tudo o que fazia era sempre sob o olhar do outro (dos agentes socioeducativos, do juiz, da instituição que a privava de sua liberdade). Não prescindia do Outro: “eu preciso que tenha gente ali antes para depois eu conseguir fazer sozinha”, apontou em uma das sessões quando se agitou ao pensar que estaria sozinha, sem as regras a serem seguidas da instituição, após o cumprimento de sua medida. O cálculo de Monique, para que realmente se sentisse livre em relação ao mortífero de seu gozo, era não retornar à sua cidade natal, à casa de sua mãe. Decidiu que morar com a tia e a prima em uma cidade vizinha seria a solução inicial. “Lá vou trabalhar com minha tia no salão dela e vou voltar a estudar”. Lá ninguém a conhecia, não a veriam como “bicho”. Lá ela teria a chance de se apresentar de outra forma ao outro, já que não se reconhecia mais. Inscreveu-se em um curso de cabeleireiro. Tomou-o como uma possível direção para a sua vida “lá fora”. Dizia que antes de mudar-se para o morro costumava pintar o cabelo de sua mãe e irmãs e era elogiada por isso. No centro socioeducativo tornou-se referência, conforme disse nos atendimentos, no trato do cabelo de suas colegas na instituição. Lá, comentou, era tratada como uma aluna, como as outras, não como alguém que estava privada de sua liberdade. Achava que, não fosse o curso, não teria qualquer outra perspectiva de trabalho ou vida fora do centro socioeducativo. Quando envolvida com o tráfico era apreendida constantemente pela polícia, mas sempre era “liberada”. Contou, então, da audiência que teve com o juiz, após o ato cometido contra a menina: foi um barraco. Disse a ele sobre as “falhas da sociedade” (escola que não a aceita, polícia que não a prende) e argumentou que se fosse liberada mais uma vez iria voltar atrás da menina para esfaqueá-la novamente. “Aí o juiz foi e me prendeu”. Já após um bom percurso nos atendimentos, Monique trouxe um sonho: ela e o seu namorado/marido em uma praça pública, desconhecida por ela, em um bairro próximo ao morro onde moraram quando este ainda estava vivo. Ele estava de blusa azul e bermuda e conversavam de forma amena e alegre. Não se lembra do conteúdo do que falavam no sonho, mas disse ter acordado triste e com saudades dele. Nos últimos dias de sua internação e na última sessão dos atendimentos, quando já aguardava a instituição solicitar ao juiz o encerramento de sua medida socioeducativa afirmou que era a menina mais velha na instituição. Disse que recomendava às meninas novas que chegavam no centro socioeducativo a não saírem de suas casas, de suas famílias. Declarou que sua experiência de ter deixado sua casa lhe deu “liberdade demais”. Um mês mais tarde, após seu retorno à casa de sua tia no município vizinho da residência de seu núcleo familiar, soubemos que Monique deu continuidade ao atendimento clínico com uma psicóloga da cidade. Soubemos ainda que hoje ela continua a trabalhar acerca do significante “liberdade”, não sem o outro para acompanhá-la. DISCUSSÃO Padecemos de um supereu, na atualidade, que produz um excedente, que retorna de formas variadas e sempre virulentas: compulsões, violência, adicções. Quando o contemporâneo ganha contornos tupiniquins, “a porca toce o rabo”. É o que testemunha Monique, como vimos. Assolada pela exigência superegóica de ser como um “homem”, valente e folgado, acreditava, assim, encarnar o objeto de amor da mãe – afnal, assim fora o pai para sua mãe. Presa de um ideal, submetida, na mais íntima experiência subjetiva, a esse imperativo, comparece na cena pública como uma pessoa/mulher destemida, um bicho a quem todos temem. Perigosa, incontrolável pela polícia, temida no morro, incontida pelos agentes socioeducativos, ela se apresenta através de seus atos que, curiosamente, contém um endereçamento amoroso: queria que a mãe a tivesse contido, fazia o contrário do que ela falava, pois gostava de ouvi-la explicando porque não era para fazer. Ao supor perdido o amor da mãe, cujo olhar se volta para o padrasto, foge de casa, vai para o morro e lá encontra onde alojar seu ódio: na maldade, inicialmente, de seu companheiro. Ela era pura e boba. Com ele, com quem sentia nada faltar, encontro uma parceria que a completava: o ódio na maldade dele, o amor, dele, devotado a ela. Permanecia o silêncio da pulsão de morte, da palavra que nunca vinha em seu auxílio na busca de decifrar o desejo do Outro. O pai fora embora, a mãe não lhe conteve com uma palavra de proibição quando ela sai de casa, o namorado, com ele tudo se resolve no revide violento, a polícia a prende e a solta. Sem continente (mais que sem contenção) simbólico, ela se perde no mar de gozo, exaltado pelo incômodo objeto olhar que a desnuda na verdade que lhe escapa. Diante do vazio do Outro, na travessia da puberdade, é reenviada ao seu próprio ponto de alienação e desconhecimento (objeto a) e, sem saber-fazer com isso, de novo, aprende com os objetos idealizados, porque amados (os homens), a agir sem avisar. Traço infantil que recolhe do que a experiência feminina da mãe lhe permitira inscrever e agora resgatar pelo avesso na adolescência, identificada a uma posição masculina. Ela não entra no por acaso. Há um traçado infantil que a convida. Fosse seu contexto outro, o desfecho teria sido diferente. É nesse ponto da torção do caso, que o mais íntimo se depara com o mais exterior ao sujeito: a estrutura do discurso capitalista no contemporâneo. Os nomes do pior que encontra para se nomear nessa travessia da infância à vida adulta (valente e folgada), ela os apre(e)nde no morro, para onde foge, sem haver alguém que a resgate. Desde Freud (1908/1976), fantasiamos que não somos amados na infância, que somos adotados, que nossos pais se odeiam e não nos amam o suficiente ou o quanto esperávamos. Quando uma adolescente de fato foge e ninguém a busca de volta, quando seus pais de fato se odeiam e quase se matam diariamente, entre fantasia e realidade parece acontecer uma sobreposição que exige denso trabalho de mediação simbólica. Nesse caso, nem o outro, nem a própria jovem encontram essa mediação. Onde ela não encontra a transmissão de um modelo a ser destruido, para ser substituido, ela faz suas experimentações, aos moldes do ensaio e errro. E “não dá nada para ela”, nada se interpõe ao gozo. Ela encontra anteparo no amor de um homem: uma das respostas na travessia adolescente para uma menina. Um homem que opera com ela aos moldes da forma como seu pai operava com sua mãe: poucas palavras, muita agressividade. Ela aprendeu rápido a agir assim. Afinal, não fora a própria mãe quem lhe indicara o caminho: (não) ficar igual ao pai? Só que ela ficou pior... Seu companheiro era um traficante violento. Com ele, seu ódio encontra forma e vazão. Ela quer aprender com o namorado a saber-fazer com seu gozo e com seu abandono. Com a entrada do padrasto na vida da mãe, ela não se cabe mais ali e sai. Busca o pai (que talvez teria lhe oferecido um horizonte), mas não o encontra. O que seu olhar captura é um modo de operar no mundo, orientado pelo saber do crime – que ela espreita, curiosa, da janela para dele se apropriar. Aí subjetividade e política se encontram, exatamente no ponto em que uma perda exige novo enquadre, ela responde tornando-se uma infratora, que denuncia, em juizo, as falhas da sociedade. A infração que a mobiliza é repetida na segunda tentativa de homicídio que comete. Ao perder o companheiro, no luto em que se vê identificada a ele, toma seu revólver e vai ajustar as contas com o único que pode, agota, encarnar seu mal – não mais dividido com o namorado: o padrasto. Se alguém tem contas a pagar, não é ela. É dele que ela vem cobrar, na devastação que a morte do companheiro a coloca. Ela procura, mesmo nesse ato, o pai, mas nada encontra. Tenta cifrar o gozo com o tiro. Interessante que esse ato, dotado de tal valor simbólico operatório para assinalar a abertura de uma nova posição, sequer chega perto da dimensão política que porta. É pela segunda tentativa de homicídio que ela responde. Aquela na qual todo o ódio da primeira tentativa retorna de maneira traumática, produzindo angústia. Nada se escreve no campo da justiça dos homens na primeira. Nada produz a elisão necessária que mata, arrefece ou dá outro destino à força viva da experiência. O que circula au délà de la langage sempre retorna ao mesmo ponto, em outro tempo. Não é isso a pulsão de morte na forma da compulsão à repetição? É somente porque há uma rede que a detém no socioeducativo, que ela consegue colocar palavras no lugar de atos endereçados ao olhar do Outro, para desvelá-la e, ao mesmo tempo, cerni-la com seu desejo. Seja o juiz que lhe dá a medida de seu ato, no julgamento que fora “um barraco”, o analista, que sustenta na transferência seu pior, deixando-o cair, sem que o sujeito caia com ele, pra dali nascer outro nome; seja o pai e a rede familiar; finalmente as figuras do Outro a detém, oferecendo-lhe uma palavra que apazigua o corpo, um intervalo no qual ela emerge, desconhecida de si mesma. Não sente nenhuma falta do jeito que era antes com toda a valentia que aprendeu a forjar, e como a mais velha no centro socioeducativo, testemunha para as mais jovens que não se deve deixar a própria casa. A única possibilidade vislumbrada de reconstrução subjetiva e de presença no laço social era fora de sua casa, em um campo neutro no qual não seria novamente apreendida pelo Outro no mesmo lugar. Fora necessário mudar-se de cidade para que, do Outro, não retornasse o mesmo, para que o outro não reincidisse no aprisionamento simbólico. A segunda volta que a jovem opera, no plano subjetivo e político, produz experiências de emoções, lutos e sonhos que lhe acenam um novo horizonte de vida. Ao decidir-se pelo curso de cabeleireira, lembra com emoção do pai. Ao deixar cair o semblante de valentia, sonha e se entristece com a perda do namorado. Ao ver-se mais velha, reconhece um novo saber-fazer que porta e deseja transmitir. Da guarda mirim da mãe, pergunta-se por coisas de mulher. Não à toa também, quando o semblante fálico, que articulava sua identificação masculina, perde sua função, ela vai se ocupar de unhas, cabelo, beleza, num novo endereço. Referência Bibliográfica: DUFOUR, Dany-Robert. A arte de reduzir as cabeças. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2005. FREUD, Sigmund. Sobre as teorias sexuais infantis (1908). In: _____. Edição Standart das obras Psicológicas Complestas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro, Imago, 1976, vol. IX, p 213-232. Lacan, Jacques. O seminário, livro 9: A Identificação. Inédito, 1961-62. Inédito no Brasil.