Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Centro Biomédico
Faculdade de Enfermagem
Lilian Silva de França
A luta das enfermeiras por um espaço na FAB: a turma pioneira de
oficiais (1981-1984)
Rio de Janeiro
2010
Lilian Silva de França
A luta das enfermeiras por um espaço na FAB: a turma pioneira de oficiais
(1981-1984)
Dissertação apresentada, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre,
ao Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem, da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Área de concentração:
Enfermagem, Saúde e Sociedade.
Orientadora: Profa. Dra. Jane Márcia Progianti
Rio de Janeiro
2010
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CBB
F814
França, Lilian Silva de.
A luta das enfermeiras por um espaço na FAB: a turma pioneira
de oficiais (1981-1984) / Lilian Silva de França. - 2010.
123 f.
Orientadora: Jane Márcia Progianti.
Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Faculdade de Enfermagem.
1. Enfermagem militar - Brasil – História – 1981-1984. 2.
Enfermeiras – Brasil. 3. Força Aérea Brasileira. I. Progianti, Jane
Márcia. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade de
Enfermagem. III. Título.
CDU
614.253.5
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação.
_________________________
Assinatura
_____________________
Data
Lilian Silva de França
A luta das enfermeiras por um espaço na FAB: a turma pioneira de oficiais
(1981-1984)
Dissertação apresentada, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre,
ao Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem, da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Área de concentração:
Enfermagem, Saúde e Sociedade.
Aprovada em 23 de fevereiro de 2010.
Banca Examinadora:
_________________________________________
Profª. Drª. Jane Márcia Progianti (Orientadora)
Faculdade de Enfermagem da UERJ
_________________________________________
Profª. Drª. Tânia Cristina Franco Santos
Escola de Enfermagem Anna Nery da UFRJ
_________________________________________
Profª. Drª. Suely de Souza Baptista
Escola de Enfermagem Anna Nery da UFRJ
Rio de Janeiro
2010
DEDICATÓRIA
Dedico essa dissertação aos meus queridos pais, Jorge de França e Nelma Silva de
França, que juntos são simplesmente a luz da minha vida, meus melhores amigos,
companheiros... simplesmente um belo presente de Deus.
Também dedico essa dissertação a todos os enfermeiros e enfermeiras do Quadro
Complementar de Oficiais da Aeronáutica (QCOA), meus queridos amigos de
profissão,
como
forma
de
reconhecimento
pela
relevância
do
trabalho
desempenhado por vocês nas unidades da FAB pelo Brasil, executando
brilhantemente a assistência de enfermagem nas diversas missões em terra, mar ou
ar.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por me permitir essa experiência de vida e por sempre me
levar por caminhos retos e prósperos;
Aos meus queridos pais, de quem herdei toda força e coragem para
desbravar as trilhas dos caminhos a mim destinados;
À minha irmã por sempre me incentivar e me motivar nessa jornada;
Ao meu marido Leandro por toda compreensão nos diversos dias e noites que
dediquei exclusivamente a esse projeto;
Às minhas amigas do Mestrado, Ingryd, Vanessa e Ana Paula Munhen, que
muito me auxiliaram nessa jornada;
Aos meus chefes Ten Cel Med Dargains e Ten Cel Enf Elizabeth, da Base
Aérea de Santa Cruz, por todo apoio dispensado;
Ao Núcleo de Pesquisa em História da Enfermagem Brasileira (NuphebrasEEAN/UFRJ), pelo auxílio no aprimoramento desse trabalho;
À minha querida professora Suely de Souza Baptista por toda orientação e
inspiração;
À minha querida orientadora, professora Jane Márcia Progianti, que me
recebeu de braços abertos e que me auxiliou a conduzir brilhantemente essa
dissertação;
Às minhas amigas de Pirassununga/SP, onde esse sonho foi construído, e
que muito me auxiliaram nos momentos difícieis: Cap Dent Marcelle, Ten Enf
Angela, Ten Enf Isis, Ten Enf Érika e 3S SEF Janice;
Aos sujeitos do meu estudo, por toda generosidade com que contribuíram
para essa pesquisa;
Agradeço ainda especialmente a algumas pessoas que foram fundamentais
no decorrer dessa dissertação: Ten Cel Enf Lídia (Diretoria de Saúde da Aeronáutica
- DIRSA), Maj Mus QFO FAB Sahara Burity (Museu Aeroespacial - MUSAL),Ten
QCOA Arq Rosana (Centro de Documentação e Histórico da Aeronáutica CENDOC) e Ten QCOA Bib Márcia (Museu Aeroespacial - CENDOC).
Obrigada a todos!
RESUMO
FRANÇA, Lilian Silva de. A luta das enfermeiras por um espaço na FAB: a turma
pioneira de oficiais (1981-1984). 2010. 123 f. Dissertação (Mestrado em
Enfermagem) – Faculdade de Enfermagem, Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2010.
Este estudo, de cunho histórico-social, tem como objeto a inserção de
enfermeiras como oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB) por meio do pioneiro
Quadro Feminino de Oficiais (QFO). O marco inicial do estudo refere-se ao início do
Estágio de Adaptação militar, em 02 de agosto de 1982 no Centro de Instrução
Especializada da Aeronáutica (CIEAR), localizado na cidade do Rio de Janeiro. O
marco final do estudo diz respeito ao término do período inicial obrigatório de dois
anos de cumprimento de serviço ativo dessas enfermeiras, que culminou com a
promoção das mesmas ao posto de 1°Tenente (1984). Os objetivos do estudo são:
descrever as circunstâncias de inserção das enfermeiras no processo seletivo do
QFO, analisar o processo de incorporação do habitus militar durante o Estágio de
Adaptação, e discutir as estratégias de luta das enfermeiras militares para ocuparem
seus lugares devidos nos hospitais da FAB. A técnica de coleta de dados utilizada
foi a entrevista e ocorreu no período de abril a maio de 2009 em hospitais da FAB
da cidade do Rio de Janeiro. Foram entrevistadas cinco enfermeiras militares da
primeira turma do QFO. O estudo foi cadastrado no SISNEP e aprovado pelo Comitê
de Ética da FAB. Todos os sujeitos assinaram o Termo de consentimento livre e
esclarecido e o Termo de doação de depoimento oral. O método utilizado foi o da
História oral temática o referencial teórico do estudo foi baseado no pensamento do
sociólogo francês Pierre Bourdieu, cujos conceitos de poder simbólico, habitus,
campo, espaço social e violência simbólica sustentaram a construção desta
dissertação. Para a análise e interpretação dos dados, seguimos os passos
propostos por Maria Cecília Minayo de ordenação de dados, que compreendeu a
transcrição na íntegra dos depoimentos; classificação cronológica e temática dos
documentos escritos; classificação dos dados e a análise final. Evidenciou-se que
diversos motivos incentivaram as enfermeiras a almejarem sua inserção na FAB
como a boa remuneração, estabilidade financeira, progressão profissional,
desbravamento de um novo campo de trabalho, clientela diferenciada,
aposentadoria com salário integral e pioneirismo na FAB. O objetivo do Estágio de
Adaptação militar foi inculcar do habitus militar nas candidatas a partir de
ensinamentos baseados na hierarquia, disciplina, ética, dever e compromisso militar.
Ao se inserirem nos hospitais da FAB, as enfermeiras receberam diversos cargos e
funções, galgando um poder simbólico sobre a equipe de enfermagem. As
inevitáveis lutas simbólicas dessas enfermeiras ocorreram com os médicos militares,
com a equipe de enfermagem, com as enfermeiras civis e com a própria
administração do hospital, e revelaram aspectos característicos de violência
simbólica desencadeada por lutas de gênero e pela manutenção do poder, visto que
as enfermeiras, dotadas de status de chefe e de militar, se inseriram num campo
eminentemente masculino.
Palavras-Chave: Enfermagem. História da enfermagem. Enfermagem militar.
Militares.
ABSTRACT
This study, historical-social, has as its object the inclusion of nurses as officers
of the Brazilian Air Force (FAB) by the pioneer Table Female Officers (QFO). The
first milestone in the study refers to the start of Stage Adaptation military on August
02th, 1982 in Center for Specialized Instruction Air Force (CIEAR), located in Rio de
Janeiro. The final conquest of the study relates to the expiration of the initial
mandatory two years of active service with these nurses, which led to the promotion
of same to the rank of 1st Lt. (1984). The study aims to describe the circumstances of
the nurses integration in the selection process of the QFO, analyze the process of
incorporation of military habitus during Stage Adaptation, and discuss strategies to
fight of the military to occupy their proper places in the FAB hospitals. The technique
of data collection used was the interview and took place between April and May 2009
in hospital of FAB in the city of Rio de Janeiro. Five nurses from military first group of
QFO were interviewed. The study was registered in SISNEP and approved by the
Ethics Committee of FAB. All subjects signed the informed consent and donation
term oral testimony. The method used was thematic oral history of the theoretical
study was based on the thought of French sociologist Pierre Bourdieu, whose
concept of symbolic power, habitus, field, social space and symbolic violence claimed
the construction of this dissertation. For the analysis and interpretation of data, we
follow the steps proposed by Maria Cecilia Minayo sort of data, which comprised the
full transcript of testimony, chronological and thematic classification of the written
documents, data classification and the final analysis. It was found that various
reasons have encouraged nurses to aim their insertion in the FAB as good pay,
financial stability, professional development, clearing a new field, distinguished
clientele, retirement with full pay and pioneer in FAB. The goal of the adaptation was
to inculcate the military habitus in military candidates from teachings based on
hierarchy, discipline, ethics, duty and military commitment . When they entered in
FAB hospitals, the nurses received a variety of positions and functions, climbing a
symbolic power of the nursing staff. The inevitable symbolic struggles of nurses
occurred with military doctors, with the nursing staff, with nurses and civilians, with
proper administration of the hospital, and showed the characteristic features of
symbolic violence triggered by gender struggles and maintaining power, as nurses,
with their status as military chief and, inserted in a predominantly male field.
Keywords: Nursing. History of nursing. Military nursing. Military personnel.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1-
Postos e graduações da Força Aérea Brasileira.....................................
15
Figura 2-
Chamada para o “I Encontro do Corpo Feminino da Aeronáutica” em
2007......................................................................................................... 18
Figura 3-
O Comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro-do-Ar Juniti Saito
(segundo da direita para a esquerda), inaugurando o monumento
alusivo aos 25 anos da mulher na FAB, no CIAAR (24/08/2007)............ 19
Figura 4-
Monumento alusivo aos 25 anos da mulher na FAB exposto no
CIAAR...................................................................................................... 19
Figura 5-
Selo comemorativo aos 25 anos de inserção da mulher na
FAB.......................................................................................................... 20
Figura 6-
Marca da “Força Aérea Brasileira” modelo 2B........................................
Figura 7-
Visita do Ministro da Aeronáutica ao alojamento das alunas do Quadro
Feminino de Oficiais no Centro de Instrução Especializada da
Aeronáutica (CIEAR)/RJ.......................................................................... 31
Figura 8-
Capa da Revista Aerovisão de maio de 1982.........................................
Figura 9-
Chegada das alunas ao CIEAR............................................................... 56
Figura 10-
Chegada das alunas ao alojamento do CIEAR.......................................
Figura 11-
Alunas do QFO com uniforme de Educação Física e com roupão de
banho....................................................................................................... 60
Figura 12-
Instrutoras da Marinha do Brasil acompanhadas pelo Ministro da
Aeronáutica Délio Jardim de Mattos........................................................ 64
Figura 13-
Instrutora da Marinha do Brasil no comando de uma esquadrilha
durante o Estágio de Adaptação ao QFO................................................ 64
Figura 14-
Grupamento de Alunas do QFO no desfile cívico-militar de 07 de
setembro de 1982 no Rio de Janeiro....................................................... 69
Figura 15-
Distintivo do Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica (CFRA)......... 70
Figura 16-
2° Tenente Enfermeira Neyde da Costa Carpinteira logo após a
formatura................................................................................................. 75
Figura 17-
Cópia do diploma de conclusão do Estágio de Adaptação ao QFO........ 75
23
47
56
Figura 18-
Adesivo comemorativo à formatura da 1ª turma do QFO nomeada
“Demoiselle” pelas formandas................................................................ 76
Figura 19-
Capa do convite de formatura da 1ª turma do QFO................................
Figura 20-
Cópia da Carta-Patente do posto de 2º Tenente do QFO....................... 77
Figura 21-
Uniforme hospitalar n°1 e n°2 para o QFO.............................................. 85
Figura 22-
Enfermeira do QFO trajando o uniforme hospitalar n°2..........................
76
85
LISTA DE SIGLAS
CFRA –
Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica
CIAAR–
Centro de Instrução e Adaptação da Aeronáutica
CIEAR –
Centro de Instrução Especializada da Aeronáutica
EAN–
Escola Anna Nery
EB –
Exército Brasileiro
FAB –
Força Aérea Brasileira
FEB –
Força Expedicionária Brasileira
ICA –
Instrução do Comando da Aeronáutica
MAER –
Ministério da Aeronáutica
MB –
Marinha do Brasil
ONU –
Organização das Nações Unidas
PAISM –
Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher
QCOA –
Quadro Complementar de Oficiais da Aeronáutica
QFG –
Quadro Feminino de Graduadas da Reserva da Aeronáutica
QFO –
Quadro Feminino de Oficiais da Reserva da Aeronáutica
SIGPES –
Sistema de Informações Gerenciais de Pessoal da Aeronáutica
SISNEP –
Sistema Nacional de Informação sobre Ética e Pesquisa envolvendo
Seres Humanos
UERJ –
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS.....................................................................
12
1
A FORÇA AÉREA BRASILEIRA...............................................................
22
2
O CONTEXTO DO ESTUDO......................................................................
26
2.1
O Contexto Histórico-Social.....................................................................
26
2.2
O Surgimento do Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica...........
30
3
BASE TEÓRICA E METODOLÓGICA DO ESTUDO.................................
34
3.1
Base Teórica..............................................................................................
34
3.2
Trajetória Metodológica............................................................................
37
3.2.1 Tipo de Pesquisa e Abordagem..................................................................
37
3.2.2 Método........................................................................................................
38
3.2.3 Delimitação Temporal.................................................................................
39
3.2.4 Aspectos Éticos...........................................................................................
40
3.2.5 Fontes ........................................................................................................
40
3.3.6 Método de Análise de Dados......................................................................
45
4
ENFERMEIRAS EM BUSCA DE NOVOS DESAFIOS: O PROCESSO
SELETIVO...................................................................................................
5
O ESTÁGIO DE ADAPTAÇÃO: A INCULCAÇÃO DO HABITUS
MILITAR......................................................................................................
6
55
A INSERÇÃO DAS ENFERMEIRAS MILITARES NOS HOSPITAIS DA
FAB: AS LUTAS SIMBÓLICAS.................................................................
7
46
79
CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 102
REFERÊNCIAS........................................................................................... 108
APÊNDICE A – Carta de solicitação de autorização a Diretoria de Saúde
da Aeronáutica............................................................................................
116
APÊNDICE B – Roteiro de entrevista.........................................................
117
APÊNDICE C – Termo de consentimento livre e esclarecido....................
120
APÊNDICE D – Termo de doação de depoimento oral..............................
121
ANEXO A – Carta de autorização da Diretoria de Saúde da Aeronáutica.
122
ANEXO B – Carta de aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa.............
123
12
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este estudo, de cunho histórico-social, tem como objeto o processo de
inserção de enfermeiras como oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB) pelo Quadro
Feminino de Oficiais (QFO). O marco inicial refere-se ao ano em que foi criado, no
então Ministério da Aeronáutica (MAER), o Corpo Feminino da Reserva da
Aeronáutica (CFRA), através da Lei nº 6.924, de 29 de junho de 1981, que foi
regulamentada pelo Decreto nº 86.325, de 1º de setembro de 1981. O final deste
estudo diz respeito ao término do período inicial obrigatório de dois anos de
cumprimento de serviço ativo dessas enfermeiras, que culminou com a promoção
das enfermeiras ao posto1 de Primeiro-Tenente, em 1984.
É relevante iniciar o contexto deste estudo com um pouco sobre a história da
enfermagem militar no Brasil que se cruza com a história da inserção das mulheres
nas Forças Armadas brasileiras. Os primórdios da inserção das mulheres na
enfermagem militar brasileira remonta a 1942, ano da inserção do Brasil na Segunda
Guerra Mundial. A enfermagem, profissão eminentemente feminina, representa a
categoria profissional pioneira que inseriu profissionalmente mulheres nas Forças
Armadas. (BERNARDES; LOPES, 2007, p.452)
No tocante a essa inserção pioneira, cabe relembrar que o Serviço de Saúde
da Força Expedicionária Brasileira (FEB)
2
foi criado no Brasil durante a Segunda
Guerra Mundial com a função de mobilizar profissionais de saúde para a guerra. O
recrutamento de enfermeiras pelo Exército Brasileiro (EB) se deu por voluntariado,
sendo selecionadas 67 moças que realizaram o Curso de Emergência de
Enfermeiras da Reserva do Exército, que foram as primeiras mulheres e enfermeiras
a ingressarem no serviço ativo das Forças Armadas no país, passando a pertencer
ao Quadro de Enfermeiras da Reserva do Exército. Na ocasião, a Marinha do Brasil
(MB) não convocou mulheres para os seus Quadros que atuaram na Segunda
Guerra Mundial. (MEDEIROS, 2001, p.34-39)
1
Posto é o grau hierárquico do oficial, conferido por ato do Presidente da República ou do Ministro de Força
Singular e confirmado em Carta-Patente. (BRASIL, 1980) Os Postos da FAB são: 1◦Tenente, 2◦ Tenente,
Capitão, Major, Tenente-Coronel, Coronel, Brigadeiro, Major-Brigadeiro, Tenente-Brigadeiro e Marechal-do-Ar.
(BRASIL, 2008c)
2
A FEB era formada pelas três Forças Armadas: Marinha do Brasil, Exército Brasileiro e Força Aérea Brasileira.
(MEDEIROS, 2001, p.34-39)
13
O processo de seleção das enfermeiras da FAB para também integrarem o
Serviço de Saúde da FEB, diferentemente do EB, foi atribuído à Escola Anna Nery
(EAN). À época, a EAN era considerada a escola oficial padrão para efeito de
criação e equiparação de outras escolas de enfermagem. (BAPTISTA; BARREIRA,
2000, p.22)
De acordo com Medeiros (1987, p.135-223), foram recrutadas seis
enfermeiras voluntárias diplomadas pela EAN para servirem exclusivamente à FAB,
a saber: Antonieta de Holanda Martins, Isaura Barbosa Lima, Judith Areas, Maria
Diva Campos, Ocimara Ribeiro, e Regina Cerdeira Bordalo. As enfermeiras da FAB
foram enviadas para os Estados Unidos e lá receberam treinamento nos hospitais
americanos e acompanharam a tropa da Aeronáutica, servindo inicialmente no 154 th
Station Hospital em Civitavecchia e logo após no 12th General Hospital em TirrenaLivorno, onde permaneceram até o final da guerra.
Como cita Oliveira (2007, p.137), ao regressarem da Segunda Guerra
Mundial, em 1945, apesar de suas atuações nos hospitais de campanha terem sido
dignas de diversos elogios, as enfermeiras da FEB foram simplesmente
desmobilizadas.
Vale ressaltar que a luta dessas mulheres para continuarem ocupando as
posições de poder e de prestígio por elas conquistadas durante a Segunda Guerra
Mundial se arrastou por alguns anos. Esta situação só veio a ser resolvida mediante
a convocação das enfermeiras do EB e da FAB ao serviço ativo, no mesmo posto
que ocupavam durante a guerra, que era o de 2º Tenente, pelas Leis n° 3.160 de 01
de junho de 1957 e n° 3.632 de 10 de setembro de 1959. (BRASIL, 1957 e BRASIL,
1959)
Era de se esperar que com a inserção de mulheres na Segunda Guerra
Mundial, estariam abertas as portas para as mulheres trilharem a carreira militar,
entretanto, não foi o que aconteceu. As Forças Armadas do Brasil só recomeçaram
a incorporá-las às suas tropas muitos anos depois.
A seleção para mulheres
militares só reaparece em 1980 pela pioneira Marinha do Brasil, só que dessa vez a
inserção se daria por meio de concurso público federal exclusivo para mulheres
diplomadas e não mais por voluntariado.
Em 1980 foi criado o Corpo Auxiliar Feminino da Reserva da Marinha do
Brasil,
cujo
objetivo
era
compor
as
equipes
técnicas
e
administrativas,
desenvolvendo atividades relativas às suas áreas profissionais, como por exemplo:
14
medicina, enfermagem, odontologia, serviço social e farmácia. (ORICHIO, 2006,
p.55)
No ano seguinte, em 1981, a FAB realizou seu concurso público federal para
a composição do Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica (CFRA) que abrangia
o Quadro Feminino de Oficiais (QFO) e o Quadro Feminino de Graduados (QFG). O
QFO contemplava a presença de profissionais de enfermagem, psicologia,
fonoaudiologia, nutrição, serviço social, biblioteconomia e análise de sistemas,
enquanto que o QFG era composto pelas especialidades técnico de enfermagem e
área de informática. As principais características do QFO era a exclusividade de
acesso às mulheres e a possibilidade de seguir carreira na FAB até o posto de
Tenente-Coronel.
A ilustração a seguir (Figura 1), mostra os símbolos
representativos que fazem parte dos uniformes da Força Aérea Brasileira. O objetivo
da ilustração é auxiliar na compreensão do escalonamento dos postos da FAB,
grifando a promoção das oficiais do QFO ao longo da carreira militar:
15
OFICIAIS-GENERAIS
MARECHAL-DO-AR
(Apenas em tempos de guerra)
TENENTE-BRIGADEIRO-DO-AR
(Máximo posto em tempos de paz - Apenas para a especialidade Aviação)
MAJOR-BRIGADEIRO
BRIGADEIRO
OFICIAIS SUPERIORES
TENENTE-CORONEL
(Último posto alcançável para as militares do QFO)
CORONEL
MAJOR
OFICIAIS INTERMEDIÁRIOS
CAPITÃO
OFICIAIS SUBALTERNOS
PRIMEIRO TENENTE
SEGUNDO TENENTE
(Após a formatura do QFO)
ASPIRANTE-A-OFICIAL
(Alunas do QFO)
GRADUADOS
SUBOFICIAL
PRIMEIRO SARGENTO
CABO
TAIFEIRO-MOR
SOLDADO SEGUNDA CLASSE
TAIFEIRO SEGUNDA CLASSE
SEGUNDO SARGENTO
SOLDADO PRIMEIRA CLASSE
TERCEIRO
SARGENTO
TAIFEIRO PRIMEIRA
CLASSE
Figura 1 - Postos e graduações da Força Aérea Brasileira
Fonte: BRASIL. Comando da Aeronáutica. Centro de Comunicação Social da
Aeronáutica. Postos e Graduações da FAB. Brasília, DF, 2008c.
Disponível em:
<http://www.fab.mil.br/portal/capa/index.php?page=postos_graduacoes>.
Acesso em: 13 de maio de 2008.
16
Foi o Decreto n° 86.325, de 01 de setembro de 1981, que regulamentou a Lei
n° 6.924, de 29 de junho de 1981 que criou no Ministério da Aeronáutica o Corpo
Feminino da Reserva da Aeronáutica e também regulamentou as condições de
recrutamento, seleção inicial, matrícula, convocação, condições para a permanência
definitiva no serviço ativo e ainda estabeleceu normas para a organização e o
funcionamento dos Estágios de Adaptação. (BRASIL, 1981a; BRASIL, 1981b)
A motivação para a realização deste estudo, que trata sobre uma parte da
história da Força Aérea Brasileira que se cruza com uma parte importante da história
da enfermagem brasileira, é conseqüência da minha inserção como enfermeira
militar na FAB em 2005.
Em 2004, como aluna do último ano do curso de graduação da Escola de
Enfermagem Anna Nery, pleiteei um estágio extracurricular no Hospital de Força
Aérea do Galeão (HFAG), localizado na cidade do Rio de Janeiro. Após ser
aprovada no processo seletivo iniciei o estágio prático neste hospital, e me
identifiquei com o papel desempenhado pelas então, Majores-Enfermeiras do QFO,
cujas funções e atribuições estavam sempre relacionadas com chefia, liderança e
administração hospitalar.
Em 2005, aprovada no concurso público federal de caráter temporário para
enfermeira da FAB, por meio do Quadro Complementar de Oficiais da Aeronáutica
(QCOA), fui designada a servir num hospital de pequeno porte no interior da
Organização Militar Academia da Força Aérea, localizada na cidade de
Pirassununga/SP, e assim, já na condição de Tenente-Enfermeira, pude manter
contato com as demais enfermeiras pioneiras integrantes do Quadro Feminino de
Oficiais pelo Brasil.
Servindo atualmente na Base Aérea de Santa Cruz, na cidade do Rio de
Janeiro, continuo mantendo freqüentes contatos com essas enfermeiras, visto que
hoje elas galgam o posto de Tenente-Coronel Enfermeira e ocupam, em sua
maioria, os mais altos cargos de chefia de enfermagem dos grandes hospitais da
Força Aérea espalhados pelo Brasil.
Cabe ressaltar que Quadro Feminino de Oficiais (QFO) foi criado em 1981 e
extinto em 1991, quando foi substituído pelo Quadro que integro, o Quadro
Complementar de Oficiais da Aeronáutica (QCOA). As principais características do
QCOA são o caráter temporário de sua contratação não superior a nove anos de
efetivo serviço, a promoção máxima ao posto de Primeiro-Tenente, a possibilidade
17
de candidatura para profissionais de ambos os sexos e a abertura de vagas para
profissionais com nível superior em diversas especialidades como enfermagem,
serviço social, nutrição, biblioteconomia, fonoaudiologia, fisioterapia, pedagogia,
analise de sistemas, engenharia, direito e outras.
Meu interesse pela história da enfermagem brasileira desenvolveu-se durante
o curso de graduação em enfermagem na Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ), quando fui bolsista de Iniciação Científica com apoio do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) entre os anos de 2002 e 2004,
pelo no Núcleo de Pesquisa de História da Enfermagem Brasileira (Nuphebras), do
Departamento de Enfermagem Fundamental da Escola de Enfermagem Anna
Nery/UFRJ. Como bolsista, desenvolvi dois sub-projetos de Iniciação Científica 3,
recebi premiações 4 e publiquei um artigo na Revista Brasileira de Enfermagem 5.
Unir os temas “enfermagem”, “Força Aérea Brasileira” e “história da
enfermagem” foi bem fácil, pois ao realizar uma breve pesquisa acerca da temática,
percebi a existência de poucas fontes sobre a história da primeira turma do QFO e
quase nada sobre a trajetória das enfermeiras dessa turma. Assim, deparei-me com
uma face da história da enfermagem brasileira pouco explorada e decidi sobre o
objeto da minha dissertação de mestrado.
Indo ao encontro dos meus objetivos, durante todo o ano 2007, a FAB, por
meio do Centro de Comunicação Social da Aeronáutica, organizou uma série de
homenagens alusivas aos 25 anos de inserção da mulher na suas fileiras, tomando
como marco inicial a inserção da primeira turma no curso de formação ao QFO, em
agosto de 1982, ou seja, estava sendo desconsiderado o pioneirismo de inserção
das seis enfermeiras que participaram da Segunda Guerra Mundial.
Essas
homenagens
foram
amplamente
divulgadas
pelos
meios
de
comunicação nacionais e basearam-se em reportagens, criação de vídeo
institucional, realização de solenidades, desfile militar, “Portões Abertos” para a
população, palestras, exposições, formaturas, criação de um monumento (Figura 4),
3
“A enfermeira-chefe como figura-tipo nos campos de estágio hospitalares da Escola Anna Nery em meados do
século XX” e “Perfis de enfermeiras-chefes no sanatório de Tuberculose e de Psiquiatria em meados do século
XX”. Orientadora Profª Drª Ieda de Alencar Barreira
4
Prêmio “A Lâmpada” 2004 / 2° lugar - Categoria Aluno de Graduação- Escola de Enfermagem Anna Nery e
Prêmio “Nuphebras 11 anos fazendo História” 2004 / 3° lugar- Categoria discente- Escola de Enfermagem Anna
Nery.
5
“FRANÇA,L.S.;BARREIRA,I.A. A enfermeira-chefe como figura-tipo em meados do século XX”. Rev Bras
Enferm, Brasília, DF, v.57.n.4, p.508-11, jul/ago. 2004.
18
lançamento de um selo (Figura 5) e de um carimbo em parceria com o Ministério das
Comunicações e a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. (D´AGOSTINO;
FURRER; BARBOSA, 2007, p.05)
A abertura das homenagens ocorreu entre os dias 24 e 26 de agosto de 2007,
com o I Encontro do Corpo Feminino da Aeronáutica que foi realizado no Centro de
Instrução e Adaptação da Aeronáutica (CIAAR), que é uma Organização Militar de
Ensino localizada em Belo Horizonte/MG. (NONATO; MEIRELES, 2007, p.04-05)
A Figura 3 mostra que a abertura do evento contou com a presença do
Comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro-do-Ar Juniti Saito, que inaugurou o
monumento alusivo aos 25 anos da mulher na FAB, exposto no CIAAR.
Figura 2 - Chamada para o “I Encontro do Corpo Feminino da Aeronáutica”, em
2007
Fonte: FERREIRA, L. C.; BARROS, K. S. Fim de semana histórico no CIAAR. Noticiário da
Aeronáutica. Brasília, DF, Ano XXX, n.13, p.06-07, ago. 2007a.
19
Figura 3 - O Comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro-do-Ar Juniti Saito
(segundo da direita para a esquerda), inaugurando o monumento alusivo aos 25
anos da mulher na FAB, no CIAAR (24/08/2007)
Fonte: FERREIRA, L.C.; BARROS, K.S. 25 anos da mulher militar na FAB será comemorado em BH.
Noticiário da Aeronáutica, Brasília, DF, Ano XXX, n. 11, p.07, jul. 2007b.
Figura 4 - Monumento alusivo aos 25 anos da mulher na FAB exposto CIAAR
Fonte: VICTOR, E. A Força Aérea Brasileira e seus vôos pioneiros e modernos. Aerovisão,
Brasília,DF, Ano XXXIII, n. 220, p.40-42, jul./ set. 2007a.
20
Figura 5 - Selo comemorativo aos 25 anos de inserção da mulher na FAB
Fonte: ENCONTRO DO CORPO FEMININO DA AERONÁUTICA, n.1, 2007, Belo
Horizonte. Anais... Belo Horizonte: CIAAR, 2007.
Para o desenvolvimento do estudo, os seguintes objetivos foram traçados:
•
Descrever as circunstâncias de inserção das enfermeiras no processo
seletivo do Quadro Feminino de Oficiais da Aeronáutica;
•
Analisar o processo de incorporação do habitus militar durante a
realização de atividades desenvolvidas no Estágio de Adaptação; e
•
Discutir as estratégias de luta das enfermeiras militares para ocuparem
seus lugares devidos nos hospitais da Força Aérea Brasileira.
Além de promover a produção da pesquisa em enfermagem, este estudo
engaja-se também no objetivo de estimular novos desafios para a profissão de
enfermagem e de permitir o avanço de conhecimentos sobre a história da
enfermagem brasileira, história da enfermagem militar brasileira e ainda sobre a
história das conquistas da mulher na sociedade ao longo do tempo.
A dissertação está estruturada em quatro capítulos:
Nas Considerações Iniciais apresento o objeto de estudo, o marco inicial e
final, o contexto do surgimento da inserção da mulher na enfermagem militar
brasileira durante a Segunda Guerra Mundial, o retorno da enfermagem militar no
Brasil na década de 1980, a justificativa do estudo, minha aproximação com o
objeto, minhas indagações, os objetivos do presente estudo, a relevância do estudo
e a estruturação da dissertação.
No Primeiro Capítulo apresento um pouco sobre a história do campo do
estudo, que é o da Força Aérea Brasileira.
21
No Segundo Capítulo enfoco o contexto político e social do final da ditadura
militar brasileira, o movimento feminista e o Programa de Assistência Integral à
Saúde da Mulher (PAISM) como importante conquista da mulher na sociedade. Por
fim, situo no contexto histórico, social e político do Brasil, a criação do Corpo
Feminino da Reserva da Aeronáutica.
No Terceiro Capítulo apresento a base teórica e metodológica do estudo,
apresentando alguns conceitos de Pierre Bourdieu como poder simbólico, violência
simbólica, habitus, campo social e dominação masculina. Descrevo ainda a
metodologia que foi utilizada para o alcance dos objetivos e o processo de análise
de dados.
No Quarto Capítulo trago a temática do processo seletivo para o ingresso no
Quadro Feminino de Oficiais e enfoco as razões e motivações que levaram as
enfermeiras a concorrerem a uma vaga neste concurso.
O Quinto Capítulo é dedicado ao Estágio de Adaptação, que foi o curso de
formação, fundamental para a inculcação do habitus militar.
No Sexto Capítulo descrevo a inserção no campo e as lutas simbólicas
vivenciadas pelos sujeitos durante o desenvolvimento das atividades diárias.
Nas Considerações Finais, apresento uma reflexão sobre os itens discutidos
ao longo de toda a dissertação que permitiram o alcance dos objetivos propostos.
22
1 A FORÇA AÉREA BRASILEIRA
Conhecer um pouco sobre o surgimento e sobre a missão da instituição Força
Aérea Brasileira, que é o campo do estudo, auxilia a situar essa instituição no
cenário político nacional e na compreensão da sua relevância para o Brasil.
O surgimento da Força Aérea Brasileira ocorreu durante a Segunda Guerra
Mundial. Embora o debate em torno da criação de uma Força Aérea única, fundindo
as já existentes aviações do Exército e da Marinha, assim como a criação de um
Ministério exclusivo para gerenciar a aviação brasileira viesse ocorrendo desde o
início dos anos 30, a guerra na Europa acabou por reforçar essa tendência,
consolidando a idéia de que era preciso centralizar os meios aéreos do país.
O desperdício e os problemas decorrentes de um gerenciamento em
separado de múltiplas aviações, militares e civis, constituiu-se num dos principais
argumentos em favor da criação do Ministério do Ar, e além disso, somando-se às
carências materiais típicas de um país com insuficiência de recursos financeiros,
havia ainda toda uma organização militar estruturada ainda nos moldes da Primeira
Guerra Mundial.
Após amplos debates e campanhas na imprensa, Getúlio Vargas, em 20 de
janeiro de 1941, assinou o Decreto-Lei n° 2.961, criando o Ministério da Aeronáutica
(MAER) e estabelecendo a fusão das Forças Aéreas do Exército e da Marinha numa
só corporação, denominada Forças Aéreas Nacionais. Pouco depois, em 22 de maio
de 1941, o Decreto-Lei n° 3.302 mudou o nome da recém-nascida Força Aérea para
Força Aérea Brasileira (FAB), nome que permanece até os dias de hoje. (BRASIL,
1941a; BRASIL, 1941b)
23
Figura 6 - Marca da “Força Aérea Brasileira”
modelo 2B
Fonte:BRASIL. Comando da Aeronáutica. Centro de Comunicação Social da
Aeronáutica. Manual de uso da marca da Força Aérea Brasileira.Brasília,DF,fev.
2008a. Disponível em:
<http://www.fab.mil.br/portal/capa/index.php?page=manual_marca>. Acesso em: 12
mar. 2009.
A Força Aérea Brasileira obteve seu batismo de fogo durante a Segunda
Guerra Mundial participando da guerra anti-submarino no Atlântico Sul. Na Europa,
como integrante FEB, lutou ao lado dos Aliados na frente italiana. Foram enviadas
para a Itália duas unidades aéreas da FAB, o 1º Grupo de Aviação de Caça, (o
Senta a Pua!), e a Primeira Esquadrilha de Ligação e Observação (1ª ELO).
Em 2001, o Ministério da Aeronáutica (MAER) foi extinto e transformado em
Comando da Aeronáutica (COMAER), passando a ser subordinado ao Ministério da
Defesa pela Medida Provisória n.º 2.216-37, de 31 de agosto de 2001, no segundo
mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (1999-2002). (BRASIL, 2001)
Hoje, a FAB é a maior Força Aérea da América Latina em contingente,
número de aviões e poder de fogo. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha,
pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e
regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade
suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia
dos poderes constitucionais, da lei e da ordem. (BRASIL, 1988)
As Forças Armadas atuarão quando os instrumentos relacionados no artigo
144 da Constituição da República Federativa do Brasil6 estiverem esgotados,
6
A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida pela preservação da
ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: polícia federal,
polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, policiais militares e corpo de bombeiros
militares. (BRASIL, 1988)
24
indisponíveis, inexistentes ou insuficientes. Nesta hipótese, após mensagem do
Presidente da República, serão ativados os órgãos operacionais das Forças
Armadas, que desenvolverão, em área previamente estabelecida e por tempo
limitado, as ações de caráter preventivo e repressivo necessárias para assegurar o
resultado das operações na garantia da lei e da ordem. (BRASIL, 2004b)
As atribuições constitucionais do Comando da Aeronáutica são: defender a
pátria e garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem. (BRASIL, 2007b)
Defender a Pátria significa preservar a independência, a autodeterminação e
a soberania do país para exercer os atos políticos. Significa, também, assegurar o
respaldo para a manutenção da unidade nacional, das instituições e da integridade
do patrimônio nacional, abrangendo o território, os recursos materiais e os valores
histórico-culturais. Ou seja, defender a pátria significa preservar os interesses vitais
da Nação. (BRASIL, 2007b)
Garantir os poderes constitucionais traduz-se por assegurar, no quadro de um
Estado Democrático de Direito, a existência e, sobretudo, o livre exercício dos
poderes da República. (BRASIL, 2007b)
Por garantir a lei, entende-se assegurar, por iniciativa de qualquer um dos
poderes constitucionais, e quando insuficiente ou esgotada a capacidade das
demais expressões e instrumentos do poder nacional, o cumprimento da lei, dos
direitos e deveres estabelecidos no ordenamento jurídico vigente. (BRASIL, 2007b)
Garantir a ordem significa assegurar condições para o equilíbrio e a harmonia
sociais, proporcionando o nível de segurança necessário ao desenvolvimento do
País, que configuram a ordem interna - mais abrangente do que a ordem pública,
que é arbitrada por lei. Para a garantia dos poderes constitucionais, da lei e da
ordem, a Força Aérea contribui com as outras Forças e órgãos federais exercendo o
controle do espaço aéreo de áreas sensíveis; executando a defesa das instalações
aeronáuticas, aeroportuárias e de outras instalações consideradas de interesse;
provendo o transporte aéreo necessário à atuação das demais organizações
envolvidas; e dando suporte de apoio logístico, de inteligência, de comunicações e
de instrução sempre que solicitado. (BRASIL, 2007b)
As atribuições subsidiárias do Comando da Aeronáutica consistem em tratar
dos assuntos de sua competência, quer de natureza militar, quer de natureza civil,
buscando sempre a racionalização de todos os recursos envolvidos com os objetivos
de cooperar com o desenvolvimento nacional, cooperar com a defesa civil; orientar,
25
coordenar e controlar as atividades de aviação civil; prover a segurança da
navegação aérea; contribuir para a formulação e condução da política aeroespacial
nacional, estabelecer, equipar e operar, diretamente ou mediante concessão, a infraestrutura aeroespacial, aeronáutica e aeroportuária; operar o Correio Aéreo Nacional
e cooperar na repressão a delitos transnacionais. Resumidamente, a missão da
Aeronáutica é: “Manter a soberania do espaço aéreo nacional com vistas à defesa
da Pátria”. (BRASIL, 2007b)
A Aeronáutica é uma instituição nacional permanente e regular, organizada
com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da
República. É composta por suas Organizações Militares, suas instalações, suas
aeronaves, seus equipamentos e os seus membros. Denominam-se Organizações
Militares, as organizações da Aeronáutica que possuem denominação oficial,
regulamento, Quadro de organização e Quadro de cargos privativos, próprios. O
Comando da Aeronáutica, órgão integrante da estrutura regimental do Ministério da
Defesa e subordinado diretamente ao Ministro de Estado da Defesa, tem por
finalidade preparar os órgãos operativos e de apoio da Aeronáutica para o
cumprimento da sua destinação constitucional e das atribuições subsidiárias.
(BRASIL, 2004a)
O § 1º do artigo 10 da Lei n° 6.880, de 09 de dezembro de 1980, que dispõe
sobre o Estatuto dos Militares, cita que quando houver conveniência para o serviço
de qualquer das Forças Armadas, o brasileiro possuidor de reconhecida
competência técnico-profissional ou de notória cultura científica poderá, mediante
sua aquiescência e proposta do Ministro da Força interessada, ser incluído nos
Quadros ou Corpos da Reserva e convocado para o serviço na ativa em caráter
transitório. (BRASIL, 1980)
26
2 O CONTEXTO DO ESTUDO
2.1 O contexto histórico-social
O contexto do estudo, de redemocratização do país, tem relações diretas com
o contexto anterior, que foi o da ditadura militar no Brasil (1964-1979). O período da
ditadura militar foi marcado por perseguições, mortes, torturas e desaparecimentos.
Foram sucessões de atos institucionais, atos complementares, leis de segurança
nacional, e decretos-leis que configuraram a ditadura como um regime forte,
destinado a conservar a ordem, entendendo como desordem qualquer manifestação
de opinião contrária. O discurso da ditadura militar era “moralizar” o país através de
suas regras econômicas, políticas e comportamentais do cidadão. (COLLING, 1997,
p.21 e 22).
No final da década de 1970, amplos setores sociais passaram a exigir fim da
ditadura militar. Em 1979 permitiu-se a reorganização de diversos partidos políticos
e três anos depois foram realizadas eleições diretas para governadores.
Alencar; Carpi; Ribeiro (1994, p.404) citam que o general João Batista
Figueiredo fora eleito presidente em 1978 por via indireta e governou com uma
Constituição reformada, o que permitiu a extinção dos Atos Institucionais. Entretanto,
o Executivo ainda era árbitro supremo já que, através das chamadas “salvaguardas”
do Estado, podia-se decretar o Estado de Emergência ou o Estado de Sítio,
independentemente de consulta ao Legislativo.
De acordo com Alencar, Carpi e Ribeiro (1994, p.404), em agosto de 1979,
após uma ampla campanha pública, foi decretada a anistia, beneficiando muitos
brasileiros presos ou exilados que buscaram integra-se novamente à vida nacional.
Por outro lado, o governo forçou uma reforma partidária com o objetivo de dividir a
oposição. Nesse contexto foram extintos os partidos políticos vigentes, a Arena
(Aliança Renovadora Nacional) e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), e
surgem diversos outros partidos como PDT (Partido Democrático Trabalhista), PSD
(Partido Democrático Social), PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro),
PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), e o PT (Partido dos Trabalhadores). Ações
27
terroristas, praticadas por grupos clandestinos contrários à abertura política
marcaram esse período.
À época, a conjuntura econômica não era nada satisfatória. Alencar, Carpi e
Ribeiro (1994, p.406-415) mostram que no período de 1960 a 1976, os 5% de maior
renda (cerca de cinco milhões de brasileiros) tiveram sua participação aumentada
em mais de 10%, enquanto que os 80% mais pobres (cerca de 76 milhões de
brasileiros) tiveram seus rendimentos diminuídos em mais de 10%, ou seja, a renda
nacional não estava sendo distribuída, estava havendo uma concentração de renda
e as classes de alta renda tiveram sua capacidade de comprar multiplicada,
resultando num incremento à industrialização. A situação econômica do país não era
boa, a dívida externa atingiu 50 bilhões de dólares em 1980, o processo inflacionário
atingia níveis inéditos de 94,7% de junho de 1979 a maio de 1980 e o fenômeno do
desemprego agravou-se. No final da década de 1970, a população brasileira
chegava a 125 milhões e existia um abismo que separava a minoria extremamente
rica da grande massa empobrecida.
Em 1980, o Brasil já era predominantemente urbano, com 70% da população
vivendo em cidades com mais de 50 mil habitantes e o resultado foi o declínio da
qualidade de vida nas metrópoles. O Rio de Janeiro já contava com mais de um
milhão de favelados, a mortalidade infantil aumentava, crescia o número de
automóveis nas ruas e também os índices de acidentes automobilísticos. A maior
parte dos brasileiros enfrentava condições cada vez piores de moradia, transporte
coletivo, de saúde, higiene, educação e lazer. As cidades já contavam com cerca de
15 milhões de menores abandonados, cresce a especulação imobiliária e junto com
ela a poluição atmosférica, das águas, sonora e visual. A saúde da população
também estava um caos. Nessa época, 40% da população era desnutrida e 20
milhões de pessoas tinham dentição precária. A proliferação de doenças endêmicas
e epidêmicas era facilitada por uma ausência de infra-estrutura e higiênica básica.
(ALENCAR; CARPI; RIBEIRO, 1994, p.415)
A expansão do mercado de trabalho e do sistema educacional que estava em
curso num país que se modernizava, gerou, ainda que de forma excludente, novas
oportunidades para as mulheres. Este processo de modernização, acompanhado da
efervescência cultural de 1968, de novos comportamentos afetivos e sexuais
relacionados ao acesso a métodos anticoncepcionais e ao recurso às terapias
psicológicas e à Psicanálise, impactou no mundo privado. Novas experiências
28
cotidianas entraram em conflito com o padrão tradicional de valores nas relações
familiares, sobretudo por seu caráter autoritário e patriarcal. Nessas circunstâncias,
o Ano Internacional da Mulher, 1975, oficialmente declarado pela Organização das
Nações Unidas (ONU), propiciou o cenário para início do movimento feminista no
Brasil, ainda fortemente marcado pela luta política contra o regime militar. (SARTI,
2004, p.39)
O reconhecimento oficial pela ONU da questão da mulher como problema
social, favoreceu a criação de uma fachada para um movimento social que ainda
atuava nos bastidores da clandestinidade, abrindo espaço para a formação de
grupos políticos de mulheres que passaram a existir abertamente. Outro traço que
marca a trajetória particular do feminismo no Brasil, pelo menos quando comparado
ao dos países europeus, diz respeito ao próprio caráter dos movimentos sociais e
sua relação com o Estado. Os movimentos sociais urbanos organizaram-se em
bases locais, enraizando-se na experiência cotidiana dos moradores das periferias
pobres, dirigindo suas demandas ao Estado como promotor de bem-estar social.
Organizados em torno de reivindicações de infra-estrutura urbana básica como
água, luz, esgoto, asfalto e bens de consumo coletivos, esses movimentos tinham
como parâmetro o mundo da reprodução - a família e suas condições de vida - que
caracteriza a forma tradicional de identificação social da mulher, e esta foi a razão
da existência do feminismo. (SARTI, 2004, p.40)
A anistia de 1979 permitiu a volta dos exilados (homens e mulheres) no
começo dos anos 1980. Esse retorno contribuiu para fortalecer a corrente feminista
no movimento das mulheres brasileiras. As exiladas traziam em sua bagagem não
apenas a elaboração de sua experiência política anterior, com também a influência
de um movimento feminista atuante, principalmente da Europa. Além disso, a própria
experiência de vida no exterior, com uma organização doméstica distinta dos
tradicionais padrões patriarcais da sociedade brasileira, repercutiu decisivamente
tanto em sua vida pessoal quanto em sua atuação política. O saldo do exílio, de
umas, e a experiência de ter ficado no país nos anos 1970, de outras, que
construíram o feminismo local, fez deste encontro de aliadas um novo panorama.
(SARTI, 2001, p.41)
Nos anos 80 o movimento de mulheres no Brasil era uma força política e
social consolidada. Explicitou-se um discurso feminista em que estavam em jogo as
relações de gênero. As idéias feministas difundiram-se no cenário social do país,
29
produto não só da atuação de suas porta-vozes diretas, mas do clima receptivo das
demandas de uma sociedade que se modernizava como a brasileira. Os grupos
feministas alastraram-se pelo país. Houve significativa penetração do movimento
feminista em associações profissionais, partidos, sindicatos, legitimando a mulher
como sujeito social particular. (SARTI, 2001, p.41)
Outra importante conquista social da mulher na época do restabelecimento da
democracia no Brasil foi a criação do Programa de Assistência Integral à Saúde
Mulher (PAISM). O PAISM foi lançado pelo Ministério da Saúde em 1983, sendo
anunciado como uma nova e diferenciada abordagem da saúde da mulher e
constitui-se também na primeira vez em que o Estado brasileiro propôs
explicitamente, e implantou, embora de modo parcial, um programa que
contemplava a regulação da fecundidade. Esse fato levantou suspeitas acerca de
possíveis intenções ocultas de controle da natalidade. O PAISM foi pioneiro,
inclusive no cenário mundial, ao propor o atendimento à saúde reprodutiva das
mulheres, no âmbito da atenção integral à saúde, e não mais a utilização de ações
isoladas em planejamento familiar, e por isso os movimentos de mulheres, de
imediato, passaram a lutar por sua implementação. A adoção do PAISM representou
um passo significativo em direção ao reconhecimento dos direitos reprodutivos das
mulheres, mesmo antes de ganhar os diversos foros internacionais de luta. (OSIS,
1998, p.31)
O momento em que o PAISM foi lançado era de grande efervescência no
Brasil, com intensa atuação de movimentos sociais e da sociedade civil, em geral,
lutando pelo restabelecimento da democracia. Considerando o conteúdo e os
antecedentes do Programa, observa-se que ele reuniu condições para se constituir
em um evento socialmente relevante, um fato capaz de mobilizar muitos setores da
sociedade para discutí-lo. Assim, é possível depreender que o lançamento do
PAISM teve um amplo significado social, constituindo-se em elemento promotor de
debates, bastante importantes naquele momento histórico de democratização da
sociedade brasileira. O ponto crucial do conteúdo do PAISM foi a inclusão da
anticoncepção como uma das atividades da assistência integral à saúde da mulher.
Isto porque essa inclusão se contrapôs à abordagem do planejamento familiar que
era, até então, largamente praticada no país. (OSIS, 1998, p. 28 e 29)
30
2.2 O Surgimento do Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica
Amplamente falando sobre as conquistas das mulheres, no Brasil, as
mulheres ganharam o direito de freqüentar universidades em 1874, a partir de 1932
puderam ser votadas, mas só a partir de 1981 puderam jogar futebol
profissionalmente, o principal esporte do país. Mas o grande conjunto de mudanças
para as mulheres do Brasil veio realmente a partir dos anos 1980, quando aumentou
a bancada feminina no Congresso Nacional, surgiram as primeiras delegacias
voltadas para o atendimento a mulheres vítimas de violência e por último as escolas
militares se abriram para elas, primeiro, a Marinha e depois a Aeronáutica.
(D´ARAÚJO, 2003, p.73)
É interessante ainda situar a questão da mulher como integrante das Forças
Armadas. As mulheres são consideradas em geral, como seres que precisam ser
“protegidos”, e isso justificava a exclusão delas de certas atividades consideradas de
risco e de rigor disciplinar e, portanto, masculinas, e por isso, até então, elas eram
excluídas da vida militar. (D´ARAÚJO, 2003, p.72)
A vida militar é associada a riscos, alta mobilidade geográfica, separação
temporária da família, exposição a perigos, treinamentos intensivos, disciplina férrea,
exercícios físicos pesados, obediência profissional acima de qualquer direito ou
dever pessoal, além da violência da guerra. (MCCUBBIN; DAHL; HUNTER apud
D´ARAÚJO, 2003, p.72)
Por isso, a relação da mulher com a vida militar sempre esteve associada
apenas ao seu papel de esposa e aos constrangimentos que a profissão do marido
exercia sobre ela e sua família. Socialmente, a mulher poderia ser afetada pela vida
militar, mas não poderia ser parte dela. Um dos aspectos mais mencionados em
relação à família do militar (sexo masculino) é a instabilidade da vida escolar dos
filhos e a impossibilidade de a esposa poder dedicar-se a uma profissão, pois em
função das freqüentes mudanças, as esposas se veriam obrigadas a exercer as
funções de donas de casa abandonando uma possível carreira no mercado de
trabalho. Este enfoque sobre as mulheres e as Forças Armadas começou a mudar à
medida em que novos direitos foram emergindo, entre eles o de a mulher poder
escolher uma profissão vinculada às polícias e às próprias Forças Armadas.
(D´ARAÚJO, 2003, p.72-73)
31
Situando a criação do Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica (CFRA) no
contexto histórico-social do Brasil, observamos que este Corpo, destinado
exclusivamente ao ingresso das mulheres na FAB, surge no bojo do governo
presidencial de João Baptista Figueiredo que vigorou de 15 de março de 1979 a 15
de março de 1985. O então Ministro da Aeronáutica, Délio Jardim de Mattos, cujo
mandato fora de 1979 a 1985, participou ativamente da articulação, formulação e
implantação da criação do CFRA.
A figura abaixo mostra a visita do Ministro da Aeronáutica, Délio Jardim de
Mattos (figura central de terno claro) ao alojamento das alunas do Quadro Feminino
de Oficiais no Centro de Instrução Especializada da Aeronáutica (CIEAR)/RJ.
Figura 7 - Visita do Ministro da Aeronáutica, Délio
Jardim de Mattos ao alojamento das alunas do
Quadro Feminino de Oficiais no Centro de
Instrução
Especializada
da
Aeronáutica
(CIEAR)/RJ
Fonte: CYRINO, S.B.F. A história da mulher na Força Aérea
Brasileira e as perspectivas para o futuro In:
ENCONTRO DO CORPO FEMININO DA
AERONÁUTICA, n. 1, 2007, Belo Horizonte. Anais...
Belo Horizonte: CIAAR, 2007.
O CFRA surge sob os moldes do Corpo Feminino de Oficiais da Reserva da
Marinha, que também foi por processo seletivo público exclusivo para mulheres, e
que também tinha o objetivo de compor as equipes técnicas e administrativas que
desenvolveriam atividades relativas às suas áreas profissionais. A cerimônia de
formatura do Corpo Feminino de Oficiais da Reserva da Marinha ocorreu em 12 de
dezembro de 1981. (ORICHIO, 2006, p.55)
32
Observa-se que tanto o pioneiro Corpo Feminino de Oficiais da Reserva da
Marinha, quanto o Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica, surgem
coincidentemente muito próximos e durante o contexto histórico nacional de
redemocratização.
O CFRA foi destinado a suprir a Aeronáutica com Oficiais e Graduados para o
exercício de funções técnicas e administrativas nas Organizações Militares,
mediante convocação para o serviço ativo. As funções técnicas e administrativas
seriam exercidas apenas por pessoal habilitado e qualificado nas categorias
profissionais a serem estabelecidas e divulgadas, anualmente, pelo Ministro da
Aeronáutica. (BRASIL, 1981b)
Observamos que esta explicação mostra o porquê da criação dos referidos
Quadros, mas não explica o porquê da exclusividade feminina.
Nessa época, já havia diversos outros oficiais militares de diversas profissões
na Aeronáutica, e havia também algumas poucas mulheres civis exercendo funções
diversas, entretanto ainda não havia nenhuma mulher militar.
O CFRA era constituído por dois Quadros: o Quadro Feminino de Oficiais da
Reserva da Aeronáutica (QFO), composto de pessoal graduado ou pós-graduado
por estabelecimento de ensino de nível superior em cursos reconhecidos
oficialmente, de conformidade com a legislação federal e pelo Quadro Feminino de
Graduados da Reserva da Aeronáutica (QFG), composto de pessoal com habilitação
profissional adquirida em cursos de estabelecimento de ensino médio. (BRASIL,
1981b)
Compreender a posição da mulher na sociedade à época nos ajuda a explicar
o contexto de abertura de um campo profissional para mulheres. Remetendo ao
histórico da ditadura militar no Brasil, torna-se viável traçar uma hipótese do porquê
da criação de vagas para as mulheres nas Forças Armadas. Analisando todo o
contexto histórico à época, de fim da ditadura militar, redemocratização do país,
retorno de exilados políticos e movimento feminista, é possível considerar que um
forte objetivo era proporcionar a retomada da simpatia e da confiança da população
pelo militarismo no Brasil.
A inserção de mulheres militares na FAB também traria lucros simbólicos para
a instituição. Permitindo a inserção de mulheres nas Forças Armadas, haveria uma
grande divulgação nacional positiva sobre o concurso, abriria-se um campo
profissional para as mulheres, indo ao encontro dos ideais feministas, dos direitos
33
iguais entre os sexos e ainda seria desfeita a imagem dos terríveis e misteriosos
“homens militares” que percorreram a imprensa durante a ditadura no Brasil.
Nesse sentido, Bourdieu (1999, p.58) cita que quando a aquisição do capital
simbólico e do capital social constitui a única forma possível de acumulação, as
mulheres são valores que é preciso conservar ao abrigo da ofensa e da suspeita,
valores que investidos nas trocas, podem produzir alianças, isto é, capital social e
aliados prestigiosos. O lucro simbólico que elas podem trazer depende, por um lado,
do valor simbólico das mulheres disponíveis para troca, isto é, de sua reputação e
sobretudo de sua castidade.
34
3 BASE TEÓRICA E METODOLÓGICA DO ESTUDO
3.1 Base Teórica
Ao realizar buscas por fontes sobre o assunto, senti-me ainda mais motivada
pelo tema, à medida em que foram sendo levantadas questões como a inculcação e
incorporação do habitus militar com seus princípios de hierarquia, disciplina, ética,
dever e compromisso militar e as inevitáveis lutas simbólicas que ocorreram entre os
agentes que atuaram no mesmo campo.
Assim, o referencial teórico do estudo é baseado no pensamento do sociólogo
francês Pierre Bourdieu, cujos conceitos de poder simbólico, habitus, campo, espaço
social e violência simbólica sustentaram a construção desta dissertação.
Estes conceitos surgiram da análise dos fatos narrados pelos sujeitos durante
as entrevistas e evidenciaram que os referidos conceitos se encaixaram nas etapas
em questão, como a divulgação do processo seletivo, a motivação para a
participação neste concurso, as etapas do processo de seleção, o curso de
formação militar, a solenidade de formatura e, por fim, a inserção nos hospitais da
FAB, onde efetivamente iniciaram-se as lutas simbólicas entre as enfermeiras
recém-chegadas e os agentes que já dominavam o campo.
De acordo com Bourdieu (1989, p.7-14), o poder simbólico é invisível, sempre
dissimulado, constrói a realidade fazendo com que os agentes a ele se subordinem.
Para que o poder simbólico seja exercido é preciso que haja cumplicidade daqueles
que se submetem, com a consciência ou não daqueles que a ele estão sujeitos ou
mesmo que o exercem. O poder varia de acordo com a posição ocupada pelo
agente no campo social.
O poder simbólico constitui um poder de construção da realidade que tende a
estabelecer o sentido imediato do mundo, em particular do mundo social. Dessa
forma, a cultura dominante tem papel relevante, pois contribui no sentido de
assegurar uma comunicação imediata entre os seus membros e assim distinguindoos das outras classes; para a desmobilização das classes dominadas; para a
legitimação da ordem estabelecida, através da definição das distinções.
(BOURDIEU, 1989, p. 9-10).
35
Para Bourdieu (1989, p.14), o poder simbólico age como o poder de construir
o dado pela enunciação, de fazer ver e fazer crer, de confirmar ou de transformar a
visão do mundo e a ação sobre este. Trata-se de um poder capaz de permitir a
obtenção daquilo que equivale ao obtido pela força física ou econômica. O autor
também afirma que as relações de comunicação são, na maioria das vezes,
relações de poder, que podem inclusive permitir a acumulação de poder simbólico.
Evidencio neste estudo o poder simbólico exercido tanto sobre enfermeiras
durante o treinamento militar, quanto o poder simbólico exercido sobre elas e por
elas durante sua chegada e inserção de fato nos hospitais da FAB.
De acordo com Bourdieu (1989, p.11-12), o poder simbólico traz consigo a
violência simbólica, que é caracterizada pelo autor como a dominação de uma
classe sobre a outra, reforçando a sua própria força que a fundamenta, e
contribuindo para a “domesticação dos dominados”.
Assim, violência simbólica entre o dominador e o dominado é expressa de
forma subjetiva nas relações de dominação e só se institui de fato por intermédio da
efetiva adesão que o dominado concede ao dominante e por conseqüência também
concede à dominação. (BOURDIEU, 1999, p.47)
Bourdieu (1996, p.29-30) cita que historicamente, a dominação masculina não
deixa de ser uma forma particular e particularmente acabada de violência simbólica,
evidenciando que divisões espaciais entre espaços masculinos e femininos no
trabalho e nos corpos são diferenciados, permanecendo a dominação do masculino
sobre o feminino.
A força simbólica é uma forma de poder que é exercida sobre os corpos como
que por magia, sem que haja qualquer coação física, entretanto essa magia só atua
com o apoio das predisposições que agem como impulsionadoras na zona mais
profunda dos corpos. (BOURDIEU, 1999, p.50)
Campo é um espaço multidimensional que possui objetivos específicos e é
hierarquizado de acordo com a distribuição desigual dos diversos tipos de capital de
seus agentes, o que confere a estes diferentes posições, poderes e força.
(BOURDIEU, 1989, p.134-135)
Espaço social, de acordo com o autor significa:
O espaço social é um espaço multidimensional, um conjunto aberto de campos
relativamente autônomos, ou seja, subordinados quanto ao seu funcionamento e às
suas transformações. No interior de cada um dos subespaços, estabelecem-se lutas
contínuas de diferentes formas envolvendo os ocupantes das posições dominantes e
36
os ocupantes das posições dominadas. As alianças e lutas concorrenciais são
estabelecidas com o propósito de assegurar as posições no interior dos espaços ou,
em outras circunstâncias ampliá-las. (BOURDIEU, 1989, p.153)
O presente estudo considera como espaço social as Forças Armadas
brasileiras e como campo considera a instituição Força Aérea Brasileira, enfocando
inicialmente o Centro de Instrução Especializada da Aeronáutica (CIEAR), localizado
no Campo dos Afonsos/RJ, onde foi realizado o curso de formação militar e
posteriormente os hospitais da FAB onde os sujeitos foram designados a servir após
a formatura.
Outro conceito que será utilizado neste estudo é o de habitus, e mais
especificamente o de habitus profissional e o habitus militar. Habitus é um
conhecimento adquirido, uma disposição incorporada, duradoura e transferível, que
resulta de um longo processo de aprendizado, produto do contato das pessoas com
as diversas estruturas sociais.
O habitus primário é aquele que é produzido e adquirido nas relações
familiares. O habitus adquirido em conseqüência da inserção em outros espaços
sociais resulta da percepção, apreciação e da ação realizada em determinadas
condições sociais. E mais, através do habitus, o passado da pessoa sobrevive, mas
de forma atualizada. (BOURDIEU, 1989, p.61)
Assim, utilizarei ainda a análise do Estágio de Adaptação como um processo
de inculcação do habitus militar buscando reproduzir os objetivos da instituição
Força Aérea Brasileira, de imposição da cultura dominante como cultura legítima.
Bourdieu (1989, p.81) cita ainda que tanto a razão quanto a razão de ser de
uma instituição, ou de uma medida administrativa e dos seus efeitos sociais, não
está na vontade de um indivíduo ou de um grupo, mas sim no campo de forças
antagonistas ou complementares no qual, em função dos interesses associados às
diferentes posições e dos habitus dos seus ocupantes, se gerem as vontades e no
qual se redefine continuamente, na luta (e através da luta) a realidade das
instituições e dos seus efeitos sociais, previstos e imprevistos.
Durante a inserção das enfermeiras nos hospitais da FAB, foi possível
observar a incorporação de um capital específico mediante a associação do habitus
militar com o habitus profissional, permitindo com que as mesmas galgassem lucros
simbólicos e poder no campo, gerando as lutas simbólicas.
37
As lutas simbólicas ocorrem pelo poder de se fazer ver, de se fazer crer e se
dar a conhecer, pois em meio à luta pela imposição de uma visão do mundo
legítima, os agentes detêm um poder proporcional ao seu capital simbólico, ou seja,
ao reconhecimento que recebem de um grupo. (BOURDIEU, 1998, p.82)
3.2 Trajetória Metodológica
3.2.1 Tipo de pesquisa e abordagem
Trata-se de uma pesquisa qualitativa de natureza histórico-social que visa
discutir o processo de inserção de enfermeiras como oficiais da Força Aérea
Brasileira.
A pesquisa qualitativa trabalha com o universo de motivos, significados,
crenças, aspirações, valores e atitudes, correspondendo a um espaço mais profundo
das relações dos processos que não podem ser simplesmente reduzidos à
operacionalização de variáveis. (MINAYO, 1995, p.05)
Minayo (2004, p.23) destaca ainda que a pesquisa social tem uma carga
histórica e assim como as teorias sociais refletem a posições frente à realidade,
momentos do desenvolvimento e da dinâmica social, preocupações e interesses de
classes e grupos determinados. A pesquisa social não pode ser estática ou
estanque. Ela só pode ser conceituada historicamente e entendendo-se todas as
contradições e conflitos que permeiam o seu caminho.
A abordagem histórica investiga acontecimentos, processos e instituições do
passado para verificar sua influência na sociedade de hoje e para compreendermos
melhor o presente. (LAKATOS; MARCONI, 2003)
Na avaliação da trajetória da enfermagem na sociedade brasileira, é
necessário considerar inicialmente que os diversos momentos da vida do país
resultaram do jogo de forças políticas, econômicas e ideológicas que também
configuraram a organização sanitária de cada época, e que não se estruturaram
apenas para atender às necessidades da população, mas resultaram da
38
concorrência entre os vários grupos sociais que formam o sistema produtivo e que
apresentavam demandas divergentes entre si. (BARREIRA, 1999b, p.90)
A pesquisa histórica assumiu uma nova versão a partir da História Nova, que
ampliou o corpus documental histórico quando passou a considerar a existência de
novas fontes, como documentos figurados, orais, textos escritos, fotografias, filmes,
produtos de pesquisas arqueológicas e outros. A História Nova compreende em uma
nova concepção do documento, vindo acompanhada de críticas ao mesmo. A
História Nova destaca a relevância destes documentos e reconhece-os como
documentos históricos. (LE GOFF, 1992, p.256 e 281)
Barreira (1999b, p.90) ressalta que os estudos históricos interessam muito à
enfermagem, pois a construção de uma memória coletiva é o que possibilita a
tomada de consciência daquilo que somos realmente, enquanto produto histórico, o
desenvolvimento da auto-estima coletiva e a tarefa de (re)construção da identidade
profissional. Assim, o desvelamento da realidade mediante o estudo da história da
enfermagem é libertador e permite um novo olhar sobre a profissão.
Barreira (1999b, p.90) comenta que também é necessário compreender que
se a enfermagem, enquanto prática social, é condicionada pelo contexto onde atua,
ela também exerce influência na sociedade em que se insere, segundo as forças
sociais em jogo no campo da saúde e, além disso, que sobre as determinações
históricas recorta-se a ação coletiva de homens e mulheres e a ação de pessoas
que ocupam posições estratégicas, em dado momento ou situação, pois a aceitação
de que o indivíduo só pode atuar dentro das condições determinadas pela
organização econômica da sociedade e pelo poder político, não elimina a força de
certas personalidades nem a imprevisibilidade das opções individuais. Assim, é
preciso reconhecer que na história da enfermagem, no passado e no presente,
ressaltam figuras que, por sua atuação, se constituem em marcos referenciais.
3.2.2 Método
O método utilizado será o da História Oral Temática. Meihy (2007, p.38) cita
que a história oral temática, mesmo abrigando índices de subjetividade, é mais
passível de confrontos que se regulam a partir de datas, fatos, nomes e situações, e
39
geralmente equivale à formulação de documentos que se opõem às situações
estabelecidas. A história oral temática é sempre de caráter social e nela as entrevistas
não são capazes de se sustentarem sozinhas ou em versões únicas.
Vale ressaltar ainda que de acordo com Meihy (2007, p.39), atualmente a
história oral já é parte integrante do debate sobre a função do conhecimento social e
atua em uma linha que questiona a tradição historiográfica centrada em documentos
oficiais; por isso ela é hoje inerente aos debates sobre a tendência da história
contemporânea. Como pressuposto, a história oral implica uma percepção do
passado como algo que tem continuidade hoje e cujo processo histórico não está
acabado e é isso que a marca como história viva.
A história oral privilegia a realização de entrevistas com pessoas que
realmente
participaram
ou
presenciaram
os
acontecimentos
tendo
como
conseqüência a produção de fontes de consulta para outros estudos e a formação
de um acervo aberto para pesquisas futuras. (ALBERTI, 2005, p.18).
Para Alberti (2005, p.30) a história oral como um método de pesquisa não é
um fim em si mesma, e sim um meio de conhecimento e seu emprego é justificado
quando o contexto da investigação científica já está previamente definido.
Thompson (1998, p.18) cita que a História Oral contribui para a elaboração de
uma história democrática, possibilitando novas versões da história ao dar voz a
diferentes narradores e ainda permitiu construir a história a partir das próprias falas
daqueles que a vivenciaram e que participaram de determinado período, mediante
suas referências e também seu imaginário.
3.2.3 Delimitação temporal
O marco inicial do estudo refere-se ao ano em que foi criado, no então
Ministério da Aeronáutica (MAER), o Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica
(CFRA), através da Lei nº 6.924, de 29 de junho de 1981 que foi regulamentada pelo
Decreto nº 86.325, de 1º de setembro de 1981. O marco final deste estudo diz
respeito ao término do período inicial obrigatório de dois anos de cumprimento de
serviço ativo dessas enfermeiras, que culminou com a promoção das mesmas ao
posto de 1° Tenente (1984).
40
3.2.4 Aspectos Éticos
O presente projeto foi cadastrado no SISNEP (Sistema Nacional de
Informação sobre Ética e Pesquisa envolvendo seres humanos) com a folha de rosto
nº 236.315. O SISNEP é um sistema de informação via internet que facilita o registro
de pesquisa entre seres humanos e orienta a tramitação de cada projeto para que
todos sejam submetidos à apreciação ética antes do seu início.
Antes de ser enviado ao Comitê de Ética da Casa Gerontológica de
Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes, que responde pela aprovação dos projetos
de pesquisa em saúde no âmbito da Aeronáutica na cidade do Rio de Janeiro,
solicitei o parecer sobre a coleta de dados à Diretoria de Saúde da Aeronáutica
(Apêndice A) resultando num parecer favorável desta Diretoria (Anexo A). Após a
aprovação da pesquisa pela Diretoria de Saúde da Aeronáutica, esta mesma
Diretoria enviou o projeto para o Comitê de Ética e Pesquisa da Casa Gerontológica
de Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes, que também resultou num parecer
favorável sob o protocolo de pesquisa nº 0001.0.339.000-09 (Anexo B).
3.2.5 Fontes
As principais fontes utilizadas foram os documentos escritos e os
depoimentos orais dos sujeitos do estudo.
Documentos escritos
Foram utilizados diversos documentos escritos como Constituição Federal da
República Federativa do Brasil, Medida Provisória, Leis, Decretos-lei, Decretos,
Portarias, Regulamentos, Estatuto dos militares, Diário Oficial da União, revistas e
jornais da época, Manual da Aluna, comprovante de inscrição deferida, comprovante
de pagamento da taxa de inscrição, Formulário de preenchimento de opções de
localidades, convite de formatura, diploma de conclusão de Estágio de Adaptação e
Carta-Patente.
41
Para o cumprimento da fase de ordenação de dados, todos os documentos
foram organizados por temáticas, a saber: processo seletivo, Estágio de Adaptação
e inserção nos hospitais da FAB; e posteriormente foram organizados em ordem
cronológica. As leituras tiveram papel de grande importância nessa fase seleção de
fontes e antes que fossem utilizadas na pesquisa, cada fonte recebeu uma ficha de
identificação, com a finalidade de informar o tipo de documento, origem, local, data
de elaboração, autor, título, assuntos, objetivos, demais informações pertinentes e
observações gerais.
Os documentos escritos foram buscados entre os meses de abril a julho de
2009 e foram localizados na Biblioteca Nacional, Biblioteca da Faculdade de
Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Biblioteca Setorial de
Pós-Graduação da Escola de Enfermagem Anna Nery/Universidade Federal do Rio
de Janeiro, exposição do Museu Aeroespacial da Força Aérea Brasileira intitulada “A
força mulher - A trajetória da mulher militar na FAB: Passado - Presente - Futuro” 7,
acervo pessoal dos sujeitos do estudo, Biblioteca do Museu Aeroespacial (MUSAL),
Centro de Documentação e Histórico da Aeronáutica (CENDOC), Centro de
Instrução Especializada da Aeronáutica (CIEAR), Sistema de Informações do
Congresso Nacional (SICON) 8 e site oficial da FAB 9.
Depoimentos orais dos sujeitos do estudo
Os depoimentos foram coletados na perspectiva da História Oral Temática
através de entrevistas que seguiram um roteiro, ainda que flexível, com a finalidade
de obter informações essenciais à compreensão da situação, informações essas que
os documentos não fornecem.
A técnica de coleta de dados dos depoentes foi a entrevista e com a
finalidade de guiá-la, segui um roteiro elaborado por mim (Apêndice B) para que
fossem direcionadas as indagações de acordo com os objetivos do estudo, por isso,
estruturei-os em categorias, a saber: identificação, formação profissional, processo
seletivo, Estágio de Adaptação, formatura e inserção nos hospitais da FAB.
7
(BRASIL, 2007a)
8
(BRASIL, 2008d)
9
(BRASIL, 2008b)
42
Alberti (2005, p.37-38) cita que as entrevistas temáticas são aquelas que
versam prioritariamente sobre a participação do entrevistado no tema escolhido e
que em geral, a escolha de uma entrevista temática é adequada para o caso de
tema que tem estatuto relativamente definido com a trajetória de vida dos
depoentes, como por exemplo, um período determinado cronologicamente, uma
função desempenhada ou o envolvimento e a experiência em acontecimentos ou
conjunturas específicas.
Os sujeitos do estudo foram 05 enfermeiras da primeira turma do Quadro
Feminino de Oficiais da Aeronáutica e que já haviam sido nomeadas ao posto de
Tenente-Coronel Enfermeira. Ao cederem os depoimentos, quatro dos cinco sujeitos
ainda estavam no serviço ativo e apenas uma já estava na Reserva Remunerada da
Aeronáutica.
Os potenciais sujeitos foram buscados por mim no mês de setembro de 2008,
por meio do Sistema de Informações Gerenciais de Pessoal da Aeronáutica
(SIGPES), através do Sistema Tico-Tico, que consiste em um almanaque virtual de
Oficiais (Marechal-do-Ar, Tenente-Brigadeiro, Major-Brigadeiro, Brigadeiro, Coronel,
Tenente-Coronel, Major, Capitão Segundo-Tenente e Primeiro Tenente), Graduados
(Suboficiais e Sargentos), Praças especiais (Alunos de curso de formação de
Oficiais), e Praças (Cabos, Soldados e Taifeiros) do serviço ativo da Aeronáutica.
Trata-se de um conteúdo de consulta reservado aos militares do Comando da
Aeronáutica por meio de senha pessoal fornecida após cadastro individualizado.
Desta forma, foi utilizada a busca avançada pelos potenciais sujeitos com os
seguintes parâmetros: QUADRO: Quadro Feminino de Oficiais, DATA DA
FORMATURA:
06/12/1982,
POSTO:
Tenente-Coronel,
ESPECIALIDADE:
Enfermagem.
Após a primeira busca realizada foram excluídas as militares que não
servissem em Organizações Militares do Estado do Rio do Janeiro pela viabilidade
da pesquisa. Assim, foram encontrados 10 (dez) potenciais sujeitos que estavam
alocados nas seguintes Organizações Militares: Casa Gerontológica de Aeronáutica
Brigadeiro Eduardo Gomes (CGABEG), Diretoria de Saúde da Aeronáutica (DIRSA),
Hospital de Força Aérea do Galeão (HFAG), Hospital Central da Aeronáutica (HCA),
Hospital de Aeronáutica dos Afonsos (HAAF), e Instituto de Fisiologia Aeroespacial
Brigadeiro Médico Roberto Teixeira (IFISAL).
43
Entretanto, ao entrar em contato com as referidas Organizações militares, fui
informada que três dos potenciais sujeitos, apesar de seus nomes constarem no
SIGPES, já haviam sido transferidas para a Reserva Remunerada, logo, não
estavam mais cumprindo o expediente de trabalho e por esse motivo me foram
negados seus telefones particulares. Um outro sujeito em potencial encontrava-se
em licença especial para tratamento médico de dependente e, portanto, também não
estava cumprindo expediente. Outro potencial sujeito recusou-se a participar da
pesquisa e outro não foi encontrado.
Durante a realização de uma das entrevistas, a entrevistada me forneceu o
telefone de uma Tenente-Coronel enfermeira que estava na Reserva Remunerada.
Desta forma convidei-a para a entrevista e fui bem sucedida.
As demais enfermeiras que se inseriram como sujeitos da pesquisa foram
contactadas por mim por meio telefônico diretamente para as Organizações Militares
em que estas servem e desta forma foi marcado um encontro com cada uma
separadamente nos respectivos locais de trabalho. As entrevistas ocorreram entre
os meses de abril e maio de 2009.
A média de idade das participantes do estudo é de 51 anos de idade, 80%
possui o estado civil solteira e 20% divorciada, 80% estudou na Escola de
Enfermagem Anna Nery e apenas 20% na Universidade Gama Filho, 80% terminou
a graduação em enfermagem em 1981 e 20% em 1980, 80% era recém-formado
quando ingressou na FAB apenas 20% teve uma experiência de trabalho anterior.
Sobre a escolha da profissão de enfermeira, 100% escolheu cursar a graduação em
enfermagem porque admirava a profissão e desejava uma carreira na área da
saúde.
Com a autorização dos sujeitos, os depoimentos foram gravados em formato
digital mp3 num dispositivo portátil com diversas funções. A função do aparelho
utilizada foi a gravação de voz. Para a transcrição do depoimento o arquivo de som
foi transferido para um microcomputador. O recurso utilizado foi o programa de
computador e executor de mídia digital Windows Media Player 9 series® que
facilitou a execução do áudio permitindo avanço e retrocesso do som quando
necessário. Cada entrevista durou aproximadamente cinqüenta minutos. Alguns dias
após as entrevistas, os depoimentos orais foram transcritos por mim, na íntegra, em
programa editor de texto Word 2007®, integrante do Microsoft® Office Home and
Student 2007.
44
Com a finalidade de formalizar a cessão dos depoimentos orais obtidos, foi
lido aos sujeitos o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice C) que foi
elaborado de acordo com o preconizado na Resolução nº 196, do Conselho Nacional
de Saúde (CNS), que aprova as diretrizes e normas para pesquisa envolvendo seres
humanos. O referido termo contempla as principais informações sobre o projeto,
como objeto de estudo, objetivos, as formas de contato com o pesquisador. Por
exigência das próprias entrevistadas, visto que quatro das cinco entrevistadas ainda
estavam no serviço ativo, este termo de consentimento também garantiu o
anonimato e confidencialidade nesta pesquisa, e por isso, durante a citação de
trechos de depoimentos, foi atribuída a letra (E) para todas as entrevistadas, seguida
de um número que indica a ordem da coleta dos depoimentos. (BRASIL, 1996)
Após a transcrição dos depoimentos os sujeitos assinaram o Termo de
Doação de Depoimento Oral (Apêndice D). Os depoimentos foram colocados em um
CD (compact disc) e doados ao Centro de Memória Nalva Pereira Caldas da
Faculdade de Enfermagem da UERJ, contribuindo para a história da enfermagem
brasileira como fontes primárias para estudos posteriores.
Foi realizada uma entrevista-piloto, em setembro de 2008, para a verificação
do instrumento de coleta de dados. Durante a entrevista surgiram muitas
informações novas que auxiliaram na melhoria do roteiro, entretanto a depoente não
se recordava de muitos fatos importantes que se relacionavam diretamente ao
objeto de estudo, por isso a entrevista piloto não foi incluída na pesquisa total.
Após a realização da entrevista foi solicitado aos sujeitos o fornecimento de
qualquer fonte primária do acervo pessoal que pudesse servir como informação para
a pesquisa ou apenas ilustração. Assim, os sujeitos doaram para a pesquisa a cópia
dos seguintes itens: diploma de conclusão do Estágio de Adaptação, Carta-Patente,
Manual da Aluna, comprovante de inscrição deferida, comprovante de pagamento da
taxa de inscrição, fotografias, Revista Aerovisão de maio de 1982, formulário de
preenchimento de opções para classificação, adesivo comemorativo pela formatura
da 1a turma do QFO e convite de formatura da referida turma.
Demais fontes
Para a realização dessa dissertação, também foram utilizadas outras fontes
como que abordavam aspectos relevantes sobre a temática do estudo, como artigos,
45
livros, três dissertações, uma tese e uma palestra em slides intitulada A história da
mulher na Força Aérea Brasileira e as perspectivas para o futuro, que foi
apresentada durante o I Encontro do Corpo Feminino da Aeronáutica, que ocorreu
no Centro de Instrução Especializada da Aeronáutica (CIAAR), em Belo Horizonte ,
no ano de 2007. As referidas fontes foram localizadas na Biblioteca da Faculdade de
Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, na Biblioteca Setorial de
Pós-Graduação da Escola de Enfermagem Anna Nery/Universidade Federal do Rio
de Janeiro e no Museu Aeroespacial. Foram utilizadas figuras e fotografias com a
finalidade meramente ilustrativa.
3.2.6 Método de análise de dados
Para a análise e interpretação dos dados, segui a sugestão de Minayo (2004,
p.234-238) que contempla os seguintes passos: ordenação de dados, classificação
dos dados e análise final.
Durante a fase de ordenação dos dados, eu mesma transcrevi na íntegra os
cinco depoimentos, realizei uma ordenação cronológica e temática dos documentos
escritos, e articulei os depoimentos orais com os documentos escritos.
Na fase de classificação dos dados realizei uma leitura exaustiva dos achados
que permitiu a construção das categorias empíricas e teóricas das idéias contidas
em cada documento. Ao realizar a leitura de cada documento, agrupei os dados nas
temáticas pré-estabelecidas ou nas categorias que emergiam do texto. Nesta fase
também organizei e agrupei as fotografias e as figuras nas categorias do estudo
para que essas ilustrações pudessem auxiliar o leitor na visualização dos fatos.
Na etapa da análise final pude articular os documentos escritos e os
depoimentos orais ao referencial teórico da pesquisa, apontando para a hipótese
teórica e para os objetivos do estudo.
46
4 ENFERMEIRAS EM BUSCA DE NOVOS DESAFIOS: O PROCESSO SELETIVO
Este
capítulo
discute
principalmente
os
aspectos
relacionados
às
circunstâncias de inserção das enfermeiras no processo seletivo do Quadro
Feminino de Oficiais da Aeronáutica. Para entendermos melhor os fatos que
ocorreram à época, mostrarei como foi a divulgação do concurso, ou seja, como as
candidatas tiveram acesso às informações sobre o processo seletivo, quais foram as
razões e motivações para concorrer a uma vaga nesse concurso e por último
mostrarei os depoimentos das entrevistadas sobre a vivência pessoal e familiar no
que tange à aprovação de fato.
A divulgação do concurso ocorreu por diversos meios de comunicação em
todo o Brasil como jornais de grande circulação, folhetos, revistas da Aeronáutica e
outros. Assim, as candidatas enfermeiras tomaram ciência da abertura do concurso
público federal que abrangia vagas para o ingresso na FAB como oficiais, que
proporcionaria, dentre outros benefícios, estabilidade financeira e promoções
periódicas de posto e, além disso, pela primeira vez aceitaria mulheres militares em
suas fileiras.
Em maio de 1982, a Revista Aerovisão, do então Ministério da Aeronáutica,
trouxe em sua capa a foto de três modelos vestidas com as fardas desenhadas
exclusivamente para as mulheres, e a chamada para a reportagem foi intitulada “A
mulher na Força Aérea Brasileira”, evidenciando que o objetivo principal da
reportagem era divulgar o processo seletivo principalmente para o efetivo da
Aeronáutica e seus familiares, já que o âmbito de distribuição da revista era apenas
interno. (BRASIL,1982e)
47
Figura 8 – Capa da Revista Aerovisão de maio de
1982
Fonte: BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Aerovisão. A mulher na
Força Aérea Brasileira. Brasília, DF, Ano X, n. 111, maio.
Paginação irregular. 1982e.
Dentre os jornais importantes que circulavam á época, destaca-se a
reportagem do jornal O Fluminense de 28 de fevereiro de 1982, com o título:
“Inscrição para o Corpo Feminino” trazendo ao leitor as principais informações
referentes ao processo seletivo:
O Ministério da Aeronáutica colocará a disposição dos interessados a partir de hoje
até 12 de abril, as inscrições para o concurso de admissão ao Estágio de Adaptação
ao Quadro Feminino de Oficiais da Reserva. O Corpo Feminino da Reserva da
Aeronáutica é composto de: I-alunas dos estágios de adaptação, II- alunas do
Quadro Feminino de Oficiais (QFO) e III- alunas do Quadro Feminino de Graduadas
(QFG). (INSCRIÇÃO...,1982, p.10)
Da mesma forma, o jornal Última Hora de 01 de março de 1982 divulgou uma
nota com o título “Corpo Feminino da Aeronáutica tem inscrições” que informava
sobre a abertura das inscrições, os requisitos básicos para a participação no
48
processo seletivo, os locais de realização de inscrições, as especialidades e as
vagas inicialmente previstas no edital:
O Ministério da Aeronáutica vai abrir inscrições hoje [...] para o concurso de
admissão ao estágio de adaptação ao Quadro Feminino de Oficiais da Reserva [..].
Para participar do concurso a candidata deve ser brasileira, não estar sub judice ou
condenada, ser solteira e não servir de arrimo, estar com a situação regularizada, ter
no máximo 28 anos [...] No Rio, a inscrição pode ser feita no Centro de Instrução
Especializada da Aeronáutica [...] O Quadro Feminino abrange as seguintes
especialidades cujas vagas serão por todo o país: Enfermagem (41), Psicologia (16),
Fonoaudiologia (4), Nutrição (6), Assistência social (8), Biblioteconomia (15) e
Análise de sistemas (10). (CORPO..., apud CYRINO, 2007)
Chama a atenção ainda, a nota publicada no jornal O Globo, intitulada
“Mulheres nas Forças Armadas”, onde é feita uma crítica pelo jornalista sobre a
abertura de vagas para mulheres na FAB: “[...] O ingresso das moças nas Forças
Armadas não parece oferecer qualquer vantagem social, excetuando-se, é claro, a
melhoria do nível econômico das referidas jovens e de suas famílias [...]”
(MENDONÇA apud CYRINO, 2007).
Podemos observar que o objetivo principal da divulgação da seleção era
mostrar que tratava- se de um processo seletivo de âmbito nacional e aberto a
qualquer candidata do sexo feminino que satisfizesse aos requisitos previstos no
edital e principalmente que detivesse o capital cultural específico para a profissão
escolhida.
Pode-se evidenciar que a divulgação do concurso ocorreu em diversos meios
de comunicação, demonstrando a transparência do processo seletivo e reafirmando
seu caráter público de candidatura.
Realizando uma análise mais profunda do processo seletivo, Bourdieu
(2001a, p.61) acrescenta que o poder dos agentes e dos mecanismos que dominam
atualmente o mundo econômico e social repousa em uma concentração
extraordinária de todos os tipos de capital, econômico, político, militar, científico,
tecnológico, fundamento de uma dominação simbólica sem precedente, que se
exerce através do domínio das mídias, elas próprias manipuladas, não raro à sua
revelia.
Assim, observamos que a propaganda, que enfatiza um curso de formação
militar exclusivo para mulheres, traz embutido um apelo a participação das
candidatas do sexo feminino pela reafirmação da suas características de gênero e
de possuir o capital cultural desejado. A disponibilização de vagas para profissões,
49
em sua maioria, eminentemente femininas, foi nitidamente um meio de facilitação
para a atração de um grande número de mulheres.
A Portaria nº 1.550/GM3, de 07 de dezembro de 1981, que se refere às
instruções reguladoras para recrutamento, seleção inicial, matrícula e ingresso no
QFO cita que as principais condições para o ingresso no Quadro eram: ser brasileira
nata; não estar sub judice ou condenada, ser solteira e não servir de arrimo; ter no
máximo 28 anos de idade referidos a 01 de janeiro do ano em que o Estágio de
Adaptação ao QFO for iniciado, estar habilitada em uma das profissões divulgadas,
requerer inscrição ao comandante do CIEAR, local onde seria realizado o Estágio de
Adaptação militar, indicar a localidade onde desejava servir e ter recolher a taxa de
inscrição no valor de Cr$1.200,00 (um mil e duzentos cruzeiros). (BRASIL, 1981c)
Duas restrições importantes do edital, que são os critérios de “ser solteira e
não servir de arrimo” merecem atenção especial.
No edital não estão explícitas as inferências do estado civil ou da condição de
prover qualquer tipo de auxílio à família com a candidatura ou investidura à carreira
militar. Percebe-se, que neste quesito, o edital mostrou-se como um instrumento de
violência simbólica à medida que segregou diversas candidatas do sexo feminino
pelo seu estado civil ou posição junto à família, não sendo encontrado qualquer
motivo para a existência tais restrições.
De acordo com Bourdieu (1996, p.29-30) a dominação masculina é uma
forma particular de violência simbólica, proporcionando divisões entre espaços
masculinos e femininos, e reforçando a autoridade do homem sobre a mulher.
Dando continuidade às etapas do processo seletivo, o comprovante de
pagamento da taxa de inscrição deveria ser enviado ao CIEAR, juntamente com o
cartão de inscrição devidamente preenchido e com fotografia. Posteriormente este
cartão seria devolvido à candidata por via postal com as indicações de inscrição
deferida ou indeferida e ainda com os dados necessários para a concentração
inicial, que para as candidatas do Rio de Janeiro, ocorreu no estádio Jornalista Mário
Filho, o Maracanã.
No concurso de admissão com vistas à matrícula no Estágio de Adaptação,
as candidatas foram submetidas aos seguintes exames de caráter eliminatório:
conhecimentos especializados (prova de enfermagem), conhecimentos gerais (prova
de Estudos de Problemas Brasileiros e prova de Língua Portuguesa), exame
médico, exame de aptidão física e teste psicotécnico. (BRASIL, 1981c)
50
As candidatas selecionadas para a matrícula deveriam apresentar o diploma
da profissão oficialmente reconhecido pela legislação federal pertinente e registrado
no Ministério da Educação e Cultura e ainda a carteira do registro em Conselho
Regional. (BRASIL, 1981c)
Esses requisitos evidenciam que as candidatas deveriam ter um capital
cultural específico, que era o curso superior em enfermagem completo, cursado em
instituição de ensino reconhecida nacionalmente.
Bourdieu (1989, p.149) comenta sobre a importante relação existente entre o
diploma e o reconhecimento social, onde o valor relativo do trabalho não determina o
valor do nome, mas o valor institucionalizado do título que serve de investimento que
permite que se mantenha o valor do trabalho. Assim, o título profissional ou escolar
é uma espécie de regra jurídica de percepção social, um ser-percebido que é
garantido como um direito.
Quanto às razões e motivações, observa-se que diversos foram os motivos
que levaram as enfermeiras a aspirarem ao ingresso no espaço social das Forças
Armadas e no campo da Força Aérea Brasileira.
Assim, observa-se que o desbravamento de um novo campo de trabalho
como enfermeira e como militar foi motivo para a participação das candidatas no
processo seletivo:
Primeiro porque era uma coisa assim nova! A mulher nas Forças Armadas...só tinha
Marinha, um ano na frente... e também a segurança do trabalho. Um campo novo
para poder trabalhar como militar e como enfermeira, e também seguro. (E1)
Quanto à motivação da candidata pelo desbravamento de um novo campo de
trabalho como enfermeira e como militar, concordo com Notat apud Barreira (1999a,
p.125), quando dizem que as profissões femininas ou feminilizadas nota-se uma
aspiração intensa pelo reconhecimento social e pela criação de novas identidades, o
que caracteriza um movimento, no qual as mulheres tentam, por via da qualificação,
se desvencilhar da idéia de vocação.
As Forças Armadas detêm o monopólio do uso legítimo da violência previsto
em lei. O sistema militar é estruturado com base nas relações de comandoobediência que estão de acordo com a disciplina e a hierarquia e é norteado pela
crença absoluta no valor da corporação e por ser totalmente leal à nação, que
51
significa algo muito maior do que a própria corporação e do que a vida de cada um
dos seus integrantes. (LEIRNER, 1997, p.19 e 68)
No entanto, algumas enfermeiras procuraram a carreira militar pela
possibilidade de conhecer diversas as regiões do Brasil e por acreditar num bom
emprego:
[...] Eu queria conhecer o Brasil, mas eu queria conhecer o Brasil sem perder o
emprego! Eu tinha que ficar num lugar que favorecesse as duas coisas, um bom
emprego e que eu pudesse morar em vários estados... (E2)
Este bom emprego poderia ser pela excelente remuneração, estabilidade
financeira, clientela diferenciada e a aposentadoria com salário integral:
O salário! O salário era muito mais alto que os outros! E dava estabilidade [...] Uma
clientela diferenciada, não corre risco de vida, porque em outros hospitais... um
salário mais alto que a média, pode trabalhar num emprego só, pode trabalhar e
cuidar dos seus filhos [...] Você está tranqüilo, vai se aposentar com o salário
integral [...] (E5)
O depoimento reforça principalmente a questão do status econômico dos
militares à época, pois ao comparar o salário recebido por uma enfermeira civil e
uma enfermeira militar à época, observava-se que a enfermeira militar galgava um
soldo muito maior e mais benefícios do que as demais enfermeiras civis, visto que as
enfermeiras militares recebem pelo posto e não pelas atividades exercidas.
[...] O salário delas [enfermeiras civis] não era tão baixo, mas era baixo, bem mais
baixo. (E3)
Bourdieu (1989, p.134) cita que o poder de um determinado agente no
espaço social pode ser definido pela posição que ele ocupa em diferentes campos,
quer dizer, na distribuição dos diversos tipos de capitais: o econômico, o cultural, o
social e também o capital simbólico, geralmente chamado de prestígio, reputação ou
fama, que é a forma percebida e reconhecida como legítima das diferentes espécies
de capital.
Outra depoente ressalta como motivação a progressão da carreira militar,
determinada por promoções periódicas de posto, tornando-a hierarquicamente
superior ao longo da carreira, fato este que proporciona também a progressão
profissional pelo aumento das responsabilidades e da complexidade das atividades
exercidas pelos militares de acordo com o posto alcançado:
52
Eu queria ter um trabalho em que eu tivesse um salário razoável, e conseguisse
fazer o meu trabalho, [...] Colocando em prática aquilo que eu aprendi na Faculdade
[...] eu fiquei mais preocupada em relação ao salário, eu queria ter uma carreira
também, eu queria poder me dedicar, mas ter um retorno financeiro também... (E3)
Apesar dos militares serem considerados “misteriosos” pela pouca informação
divulgada sobre suas atribuições nos quartéis em tempos de paz, a população em
geral tinha conhecimento dos diversos benefícios sociais e econômicos específicos
da profissão militar. Assim, é possível relacionar o status social dos militares à época
como conseqüência não só do seu status de defesa nacional, do poder, da ordem e
da guerra, mas também do seu status econômico.
Os depoimentos das entrevistadas explicam o porquê do concurso ter sido
muito disputado e almejado por diversas candidatas pelo Brasil. Aprovadas nesse
processo seletivo, elas galgariam um alto status profissional e conseqüentemente
social e econômico, idêntico ao status galgado pelos homens militares da época.
Reforçando a aspiração de diversas candidatas a seguirem carreira na
Aeronáutica, a revista Aerovisão de maio de 1982 mostrou que inicialmente foram
disponibilizadas 100 vagas para o Quadro Feminino de Oficiais divididas entre as
seguintes áreas de atuação: Enfermagem (41), Psicologia (16), Fonoaudiologia (04),
Nutrição (06), Assistência social (08), Biblioteconomia (15) e Análise de sistemas
(10). A revista trouxe ainda a relação entre candidatos inscritos e vagas disponíveis
para o concurso. A disputa pelas vagas de enfermagem foi bastante considerável à
época, onde 1.070 candidatas disputaram as 41 vagas disponíveis, equivalendo a
uma relação de 26,09 candidatas/vaga, fato este que reafirma o grande interesse
pelo concurso por parte das enfermeiras à época. (BRASIL, 1982e)
A vivência da aprovação no processo seletivo foi considerada como um fator
de grande felicidade para as candidatas aprovadas, para seus familiares e amigos:
Foi uma coisa assim muito legal... Você fazer um concurso logo recente, recémformada, eu não tinha nem um ano de formada, você fazer o concurso e passar para
um Quadro novo, ser da primeira turma, isso aí foi muito legal! A família todo mundo
muito coruja! Os pais, minha irmã, os outros parentes, todo mundo: “Ah, você é
mulher... Vida militar... Primeira turma da Aeronáutica”... Todo mundo vibrou muito...
Os amigos...! (E1)
Os depoimentos expressam ainda a grande alegria das cadidatas na
iminência de ingressar nas fileiras da FAB, onde aceditavam que teriam
reconhecimento social por estarem numa instituição reconhecida nacionalmente,
53
detentora de poder bélico e com diversos benéficos sociais e econômicos aos seus
integrantes.
Fazer parte de um Quadro inédito e ser da turma das primeiras mulheres a
ingressar na FAB, mesmo não tendo experiência profissional por ser recém-formada,
só aumentou a vibração e o orgulho das candidatas:
Ah eu fiquei muito feliz! Muito feliz! [Meus pais] Ficaram muito felizes, satisfeitos!
Porque eu estava me encaminhando! E muito bem! (E3)
Eu só tenho pai e irmãos, eu já não tinha a minha mãe, então ficaram contentes
também! Ele então deve ter ficado super orgulhoso! (E4)
Os depoimentos supracitados mostram que a vivência positiva da aprovação
foi totalmente compartilhada com seus familiares. Observa-se a importância da
aceitação familiar para a complementação da felicidade das candidatas pela
aprovação. Tal fato é típico da condição feminina, que traz embutida consigo o
encargo de ser “socialmente aceita” e “orgulhar sua família”. Observa-se que o
sentimento de contentamento perante a aprovação no concurso, tanto para as
candidatas quanto para os seus familiares, foi algo imensurável e indescritível.
O ingresso nas Forças Armadas despertou nas enfermeiras o sentimento da
“vitória da mulher na sociedade”, do “reconhecimento” enfermagem como profissão
de relevância social, da vitória pela “igualdade” de direitos entre mulheres e homens,
da “igualdade” de benefícios econômicos e sociais entre os gêneros e da “igualdade”
de treinamentos que necessitassem de vigor físico.
Além de mostrar para toda a sociedade que por serem pioneiras, estariam
construindo a história da FAB e das mulheres na sociedade, as mulheres da primeira
turma da Aeronáutica também tinham de provar a que vieram, tinham o objetivo de
“agradar” tanto para permanecerem quanto para abrirem caminhos para as demais
interessadas, perpetuando e ampliando as conquistas das mulheres na sociedade.
A aprovação no processo seletivo proporcionou às candidatas um lucro
simbólico que demarcou não apenas a transição do mundo civil para o mundo
militar, mas determinou a incorporação de um habitus consoante com as
expectativas sociais ligadas tanto à profissão de enfermagem quanto à posição de
mulher da época. Sabe-se que toda pessoa que é instituída sente-se obrigada a
estar de acordo com aquilo que dela se espera, à altura de sua função, e a esse
respeito, vale ressaltar que:
54
O verdadeiro milagre produzido pelos atos de instituição [consagração] reside no
fato de que eles conseguem fazer crer aos indivíduos consagrados que eles
possuem uma justificação para existir, ou melhor, que sua existência serve para
alguma coisa. (BOURDIEU, 1998, p.99 e 106)
.
A expressão da felicidade das candidatas e de seus familiares pela aprovação
demonstra que as mesmas estavam aceitando todas as regras do jogo,
principalmente a aceitação do habitus militar, movidas pelos diversos fatores
motivacionais já citados, somados às propagandas da mídia e ao status social e
econômico denotado aos militares à época.
Conforme Bourdieu (1999, p.52 e 53): “o poder simbólico não pode se exercer
sem a colaboração dos que lhe são subordinados e que só se subordinam a ele
porque o constroem como poder”. Assim percebe-se que essa construção prática,
longe de ser um ato consciente, livre, deliberado de um “sujeito” isolado, é ela
própria, resultante de um poder, inscrito duradouramente no corpo dos dominados
sob forma de esquemas de percepção e de disposições (a admirar, respeitar,
amar...) que o tornam sensível a certas manifestações simbólicas do poder.
Evidenciamos que as mulheres e enfermeiras estavam dispostas a provar o
seu potencial em toda a sua amplitude.
Ingressando no ambiente militar, as enfermeiras estavam cientes que
estariam prestes a se inserir num ambiente eminentemente masculino, enfrentar
medos, treinamentos militares, conviver com hierarquia e disciplina férrea, participar
de instruções de tiro, ir ao front se necessário, passar horas sob o sol em formaturas
militares, sobreviver em ambientes inóspitos e hostis, voar em diversos tipos de
aeronaves, ter contato com diversos tipos de animais selvagens e peçonhentos,
estar disposta 24 horas para o serviço militar, viajar pelo Brasil a serviço, morar em
qualquer estado do Brasil se for necessário, abrir mão da família, assistir a militares
feridos em situações reais ou de treinamento militar, enfrentar situações difíceis com
coragem perante situações jamais experimentadas e principalmente abrir mão da
própria vida pela Pátria.
55
5 O ESTÁGIO DE ADAPTAÇÃO: A INCULCAÇÃO DO HABITUS MILITAR
Neste capítulo, analiso o processo de incorporação do habitus militar pelas
enfermeiras durante o Estágio de Adaptação, que foi o curso de formação militar,
caracterizado como a última etapa do processo seletivo.
No Estágio de Adaptação foram matriculadas as candidatas aprovadas na
seleção inicial ao QFO que estavam classificadas dentro do número de vagas fixado
e que obtiveram o parecer favorável da Junta Especial de Avaliação. As candidatas
selecionadas foram comunicadas por meio de telegrama.
O Estágio de Adaptação ocorreu no Centro de Instrução Especializada da
Aeronáutica (CIEAR), localizado no Campo dos Afonsos/RJ, durante quatro meses,
em regime de semi-internato, iniciando suas atividades em 02 de agosto de 1982. O
não aproveitamento em qualquer fase do Estágio de Adaptação ao QFO, ou a falta
de conceito favorável, implicaria no desligamento da aluna, cessando direitos,
deveres e prerrogativas concedidas e impedindo a sua convocação para o serviço
ativo. (BRASIL, 1981c)
As figuras a seguir ilustram a chegada das alunas para o início do Estágio de
Adaptação no CIEAR. Na Figura 9, é importante atentar tanto para o sorriso das
candidatas, quanto para as malas cheias, provavelmente de roupas e utensílios
pessoais das alunas, indispensáveis para o regime de semi-internato.
56
Figura 9 – Chegada das
alunas ao CIEAR
Fonte: CYRINO, S.B.F. A história da mulher na Força Aérea Brasileira e as
perspectivas para o futuro In: ENCONTRO DO CORPO FEMININO DA
AERONÁUTICA, n.1, 2007, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: CIAAR,
2007.
Na Figura 10, evidenciamos a entrada das alunas nos alojamentos e a
presença de instrutoras da Marinha, devidamente fardadas, na recepção das alunas.
Figura 10 – Chegada das alunas ao alojamento do
CIEAR
Fonte: CYRINO, S.B.F. A história da mulher na Força Aérea Brasileira e as
perspectivas para o futuro In: ENCONTRO DO CORPO FEMININO DA
AERONÁUTICA, n.1, 2007, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: CIAAR,
2007.
57
Para efeito de remuneração, uso do uniforme e precedência hierárquica
durante todo o Estágio, as alunas foram assemelhadas a Aspirante-a-Oficial. Elas
estavam cientes que no dia da formatura seriam promovidas ao posto de SegundoTenente, e que durante a carreira militar, seriam constantemente avaliadas em
diversos quesitos, podendo ser promovidas aos seguintes postos: Primeiro-Tenente,
Capitão, Major e Tenente-Coronel. (BRASIL, 1981b)
Observa-se que as enfermeiras do QFO poderiam galgar apenas o posto
máximo de Tenente-Coronel, ou seja, não poderiam alcançar o posto máximo da
FAB, que em tempos de paz, é o de Tenente-Brigadeiro, exclusivo até hoje apenas
para oficiais da especialidade Aviação.
No início do Estágio foi distribuído o Manual da Aluna, que era um
importante documento de porte obrigatório, contendo informações relevantes
referentes a todas as determinações e ordens em vigor. As informações contidas no
Manual versavam sobre a legislação básica do CIEAR, o objetivo do estágio, o
período escolar, os horários, a formatura diária, o atendimento médico-dentário, o
uso dos alojamentos, realização de refeições, uso do telefone, uso estacionamento,
freqüência às aulas, condições de exclusão por conveniência do ensino ou da aluna,
uso dos uniformes, escalas de serviço, serviço de Chefe de Turma, uso das
apostilas, deveres da aluna, o uso do traje civil, utilização da piscina, locais de
acesso proibidos e permitidos e as regras para o recebimento de visitas.
(BRASIL,1982a)
As prescrições contidas no Manual eram de conhecimento obrigatório e a
alegação de desconhecimento das mesmas não seria considerada como
justificativa. O Manual ainda deixou bem claro o objetivo do estágio de adaptação
era formar oficiais do QFO que exerceriam funções técnicas e administrativas, em
organizações militares, mediante convocação para o serviço ativo. (BRASIL,1982a)
Uma das principais regras estabelecidas pelo Manual era que todas as alunas
deveriam manter conduta e apresentação pessoal corretas, ser assídua e pontual,
cumprir os regulamentos e normas, cumprir as obrigações escolares, zelar pelo
material e instalações escolares, contribuir com o seu procedimento correto para a
manutenção do prestígio do CIEAR junto às coletividades civil e militar, e assistir às
aulas mesmo quando dispensada da parte prática das mesmas. (BRASIL,1982a)
Conclui-se que o Manual da Aluna foi um instrumento facilitador que visou de
fato inculcar nas alunas um novo habitus, o militar. As prescrições do Manual
58
sintetizavam o novo estilo de vida a ser seguido caracterizadas pela grande
quantidade de regras fundamentadas na responsabilidade, disciplina, hierarquia e
organização, deixando esses princípios evidentes como os pilares do militarismo e
tornando-os, portanto, fundamentais e indispensáveis para conhecimento das alunas
logo no primeiro dia de contato com esse novo habitus.
Para Bourdieu e Passeron (2008, p.29), a seleção de significações que define
objetivamente a cultura de um grupo ou de uma classe como sistema simbólico é
sociologicamente necessária à medida em que essa cultura deve sua existência às
condições sociais da qual ela é produto, e sua inteligibilidade à coerência e às
funções da estrutura das relações significantes que a constituem.
Bourdieu (1998, p.61) afirma que o habitus está expresso nos modos de agir
dos agentes, pois é resultante da incorporação dos conhecimentos adquiridos nas
diversas culturas, no passado e no presente e formam uma parte do capital cultural.
As rotinas das atividades previstas no Estágio ocorriam de segunda a sextafeira de 08h00min às 16h15min, com um total de 07 horas diárias de estudos,
totalizando 35 horas semanais. (BRASIL,1982a)
Dentre as diversas características do Estágio destacava-se o deslocamento
sempre marchando, as rápidas trocas de uniformes, o estudo intensivo, a grande
quantidade de avaliações e as características de semi-internato.
Podemos evidenciar a extensa rotina das atividades previstas, a grande
quantidade de matérias a serem estudadas e a presença constante de atividades
típicas da carreira militar:
Nós passamos os primeiros quinze dias sem poder sair, aí realmente foi algo puxado
[...] Então era um alojamento com mais de sessenta pessoas, aquele falatório! Não
tinha tempo livre! Era uma coisa diferente! Acordava cinco e pouca da manhã, a
Alvorada era 6hs [...] E veste uniforme, e vai para fila... Para o café da manhã tem
que ir marchando, na hora do almoço vai marchando... Foi um período na verdade
curto e agente tinha muita coisa para aprender, muitos regulamentos, várias provas,
muitas coisa para estudar, coisas novas que estavam fora do que agente conhecia
da carreira... Muito estudo, muita prova, muita aula...! (E1)
Então você faz uma aula e eles mandam você colocar outro uniforme [...] Você tinha
que ficar trocando de uniforme o dia todo, com rapidez e deixando tudo arrumado, aí
eu ficava... Sobe escada, desce escada [...] (E2)
Era o dia inteiro! Era puxado! Era bem puxado! Na parte da manhã agente tinha todo
o estudo na sala de aula de instrução militar e matérias mesmo ligadas à parte
militar e à tarde nós tínhamos Educação Física a tarde inteira. Toda tarde! Era para
ficarmos sem sair, mais de sessenta dias, mas a nossa turma... Éramos cento e
cinqüenta e poucas mulheres, a maioria filha de militares, de Brigadeiros, disso e
daquilo, e o pessoal chorou muito lá para agente conseguir sair nos finais de
semana! Com um mês eu acho que agente começou a sair nos finais de semana!
Mas o curso durou quatro meses!(E3)
59
Era o dia todo, tinha instrução militar, tinha educação física, era o dia todo e todo
dia, agente ficou presa [...] (E4)
Era horário integral, de formação militar, agente ficava lá e só saía às sextas-feiras.
(E5)
Podemos observar que as alunas passaram por rígidos treinamentos
militares, atividades de condicionamento físico, aulas exaustivas e testes diários de
situações de hierarquia e disciplina, indispensáveis para a inculcação do habitus
militar. De acordo com Bourdieu (1999, p.62), o ponto de honra, que é a forma
peculiar de sentido do jogo que se adquire pela submissão prolongada às
regularidades e às regras da economia de bens simbólicos é o princípio do sistema
de estratégias de reprodução pelas quais os homens, detentores do monopólio dos
instrumentos de produção e reprodução do capital simbólico, visam a assegurar a
conservação ou o aumento desse capital com estratégias orientadas no sentido de
transmissão dos poderes e dos privilégios herdados.
Sobre uma avaliação geral de todo o conteúdo programático do curso, as
entrevistadas enfatizaram:
Na verdade a maioria [das instruções] era realmente sobre a parte de regulamentos
e sem isso não dá para você depois seguir uma carreira sem ter a mínima noção do
que os regulamentos dizem. Tivemos [aulas sobre] correspondência, tivemos
alguma coisa de aula de Português, mas a grande maioria eram mesmo
regulamentos e Educação Física todo dia, o último tempo de aula era de Educação
Física. (E1)
A parte disciplinar, da instrução militar... Eu acho que tem que ser por aí mesmo!
Mas por exemplo a parte teórica eu acho que não! Eu acho que poderiam ter sido
abordadas outras coisas até de interesse da própria profissão de cada uma...
Enfermeiras, nutricionistas... Porque eles deram muita coisa, não da instrução
prática nem algumas coisas de instrução militar... Mas tiveram matérias que agente
viu que não levaram a lugar nenhum! (E3)
Foi bom! Em termos de leis, da coisa militar mesmo, mas eu acho que exatamente
ficou faltando a preparação para tua profissão na área militar! E eu acho que não
tem até hoje! (E4)
Eu acho que o conteúdo eram só matérias militares! Porque agente estava
aprendendo a ser militar na verdade! Só que agente não sabia muito bem encaixar
porque agente era civil! Agente não sabia usar aquilo! Depois de um tempo que
fomos ver o que estávamos aprendendo! Na hora você não tinha muita idéia [...] (E5)
O conteúdo programático do Estágio de Adaptação envolvia basicamente o
condicionamento
físico
e
o
estudo
de
regulamentos
militares,
que
são
indispensáveis para a inculcação do habitus militar, ou seja, para o doutrinamento da
aluna.
60
As aulas de Educação Física ocorriam todos os dias e sempre no último
tempo de aula e com uniforme específico. Todos os regulamentos militares estavam
dispostos em apostilas impressas que eram distribuídas às alunas através da
secretaria do Corpo de Alunas. (BRASIL,1982a)
As alunas que seguissem todas as suas instruções estariam efetivamente
iniciando a incorporação do habitus militar e conseqüentemente tornando-se um
membro de reprodução do capital simbólico.
É importante frisar que a aluna poderia pedir exclusão do Estágio a qualquer
momento, entretanto, as regras não mudariam em nenhuma hipótese, e caso não
houvesse a concordância com qualquer prescrição do Estágio, era preferível que a
própria aluna solicitasse sua exclusão ao invés de ser desligada. (BRASIL,1982a)
Bourdieu e Passeron (2008, p.63 e 64) justificam a questão da exclusão do
aluno quando dizem que a principal força da imposição do reconhecimento da
cultura dominante como cultura legítima e do reconhecimento correlativo da
ilegitimidade do arbitrário cultural dos grupos ou classes dominadas reside na
exclusão que adquire uma força simbólica, que parece àqueles que a ela se
submetem, como a sanção de sua indignidade cultural.
Figura 11 – Alunas do QFO com uniforme de Educação Física e com roupão
de banho
61
As alunas concorreram às escalas de serviço diárias de Aluna-de-Dia ao
Corpo de Alunas e de Chefe de Turma. Os deveres das alunas que estivessem
escaladas eram, dentre outros, retirar as faltas da turma, fazer a apresentação da
turma ao instrutor, deslocar a turma em forma para locais de instrução, fiscalizar a
entrada e saída da turma dos recintos de instrução, notificar e controlar os uniformes
previstos para as aulas, manter a disciplina da turma mesmo nos intervalos de
instrução e zelar para que as alunas não se afastassem demais dos locais de
instrução, mesmo nos intervalos das aulas. Qualquer irregularidade encontrada pela
aluna de serviço, que era a responsável pela supervisão das demais alunas, deveria
ser imediatamente levada ao conhecimento do comandante do Corpo de Alunos.
(BRASIL,1982a)
As visitas eram proibidas durante a semana, entretanto, nos finais de semana
era facultada a entrada de familiares no pátio do prédio do Corpo de Alunos.
(BRASIL,1982a)
Perguntadas sobre a existência de algum curso específico na área de
enfermagem, as depoentes responderam:
Não tinha nada a ver com enfermagem. Era adaptação mesmo para [ser] militar.
(E1)
Ainda sobre a existência de algum tipo de tratamento diferenciado dispensado
às enfermeiras, as depoentes relatam:
Não! Foi igual para todo mundo! (E3)
Assim, observamos que o Estágio focou a preparação do aluno quanto ao
aprendizado de leis, regulamentos, normas e costumes militares e ainda
proporcionar às alunas um bom condicionamento físico, compatível com o desejável
para a carreira militar.
Bourdieu (2001b, p.121) cita que as estratégias escolares dependem não só
do capital cultural e por isso não podem ser isolados do conjunto das estratégias
conscientes ou inconscientes pelas quais os grupos tentam manter ou melhorar sua
posição na estrutura social.
Quanto à remuneração percebida durante o Estágio, as depoentes relatam:
62
O Estágio era remunerado. Era Estágio de Adaptação, então agente ganhava como
aluna! (E1)
Sim, Aspirantes recebiam como Suboficial. (E2)
As informações sobre a remuneração são confirmadas pela reportagem
publicada no Jornal do Brasil de 07 de dezembro de 1982 ao citar a entrevista feita
com a primeira colocada da turma no dia da formatura:
[Cynthia] ainda não sabe quanto vai ganhar, e imagina apenas que será um salário
maior que o soldo de aluna que recebia até agora, de Cr$108 mil. (DÉLIO...,1982,
p.2).
A assiduidade e as regras de uso do alojamento também eram quesitos
muitos cobrados no Estágio. No que tange à assiduidade no curso, era estritamente
obrigatória a presença das alunas em todas as atividades previstas no Estágio. As
faltas às formaturas ou aulas eram lançadas no talão da Chefe de Turma e recolhida
pela aluna de serviço. As faltas às formaturas diárias sem motivo justificado eram
consideradas transgressões disciplinares10. Desta forma, a cada aula que a aluna
não comparecesse ou não assistisse integralmente corresponderia à perda de
01(um) ponto se a falta fosse considerada justificada e 03 (três) pontos se a falta
fosse considerada não justificada. (BRASIL,1982a)
As regras de uso do alojamento também estavam estabelecidas já que era
vedada a utilização do mesmo durante os horários previstos para as aulas, era
proibida a entrada de pessoas estranhas e não era permitido deixar objetos fora do
armário ou pendurar peças do vestiário nas camas e armários. O alojamento das
alunas deveria ser mantido em perfeito estado de limpeza, arrumação e
conservação, inclusive com a manutenção das camas de acordo com o padrão
estabelecido. (BRASIL,1982a)
Questionadas sobre a formação dos instrutores responsáveis pelas diversas
disciplinas durante o Estágio de Adaptação, os sujeitos responderam:
Era o pessoal do CIEAR [...] A grande maioria era de oficias. Só alguns, na parte de
Educação Física, que eram Graduados [Sargentos]. (E1)
Eram intendentes, aviadores, médicos, foram quatro instrutoras da Marinha, eram
duas médicas, uma psicóloga, e uma enfermeira. Elas eram nossas instrutoras e
10
Transgressão disciplinar é toda ação ou omissão contrária ao dever militar e será apreciada para efeito de
punição. (BRASIL, 1975)
63
cada uma ficava com uma esquadrilha [...] Nós éramos quatro esquadrilhas! Alfa,
Bravo, Charlie e Delta. (E2)
De acordo com os depoimentos, podemos observar que uma das estratégias
pedagógicas utilizadas pelo CIEAR foi dividir a turma em grupos, que na FAB são
chamados de esquadrilhas. Já que a turma era composta por mais de cem alunas,
este recurso permitiria que o aprendizado fosse ampliado pelo número reduzido de
alunas por sala.
Outro recurso utilizado foi a participação de instrutores militares FAB com
formação profissional diferenciada, ou seja, médicos, aviadores, intendentes e
sargentos de diversas especialidades.
É importante frisar a presença de quatro instrutoras da primeira turma da
Marinha do Brasil com a finalidade de ministrar instruções diversas e principalmente
de servir de exemplo para que as futuras oficiais pioneiras da FAB pudessem
compreender como ser oficial, como comandar, e principalmente como se comportar
diante de um meio totalmente masculino.
O relacionamento entre os instrutores e a turma também foi descrito pelos
sujeitos:
Era uma coisa nova para eles, mas eles procuravam manter a hierarquia, mas
sempre com alguma coisa mais agradável do que estariam com os homens, porque
era um Quadro novo e o Comandante do CIEAR, ele dizia que não éramos as
meninas dos olhos dele, tanto que ele nem deixou que agente... Queria fazer um
acampamento, queria fazer um negócio de caminhada fora, uma caminhada que os
homens faziam e para nós foi proibido, como chamam “Quadro das florzinhas” (E1)
A nossa turma é pioneira! Então, para todo mundo, tanto para nós quanto para eles
foi tudo muito novo!”(E2)
Ah... Agente foi tratada meio assim como “coisinha de cristal” [...] (E4)
Ah, eles queriam mostrar que eram durões... Aquele negócio de militar, mas só que
eram mesmo paternalistas [...] (E5)
64
Figura 12 – Instrutoras da Marinha do Brasil
acompanhadas pelo Ministro da Aeronáutica, Délio Jardim
de Mattos
Fonte: CYRINO, S.B.F. A história da mulher na Força Aérea Brasileira e as
perspectivas para o futuro In: ENCONTRO DO CORPO FEMININO DA
AERONÁUTICA, n.1, 2007, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: CIAAR, 2007.
Figura 13 – Instrutora da Marinha do Brasil no comando de uma
esquadrilha durante o Estágio de Adaptação ao QFO
Fonte: CYRINO, S.B.F. A história da mulher na Força Aérea Brasileira e as
perspectivas para o futuro In: ENCONTRO DO CORPO FEMININO DA
AERONÁUTICA, n.1, 2007, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: CIAAR, 2007.
De acordo com o Manual da Aluna, poderia ser excluída do corpo discente a
aluna que utilizasse meios ilícitos durante a realização das provas, não obtivesse
aproveitamento mínimo exigido em qualquer fase do Estágio, ultrapassasse o limite
65
máximo permitido de pontos perdidos, fosse considerada incapaz de prosseguir no
estágio por motivo de saúde, dado por parecer médico ou então que cometesse falta
grave. Às alunas que solicitassem por qualquer motivo sua exclusão voluntária, os
trâmites para a exclusão seriam imediatamente viabilizados. (BRASIL, 1982a).
Bourdieu e Passeron (2008, p.29) citam que a ação pedagógica é
objetivamente uma violência simbólica na medida em que a delimitação
objetivamente implicada no fato de impor e de inculcar certas significações,
convencionadas, pela seleção e a exclusão que lhe é correlativa, como dignas de
ser reproduzida por uma ação pedagógica, reproduz a seleção arbitrária de um
grupo ou uma classe opera objetivamente em e por seu arbitrário cultural.
Quanto à vivência pessoal de toda essa experiência do Estágio de
Adaptação, as candidatas comentaram:
[...] Tiveram algumas coisas que me chateavam, por exemplo, tinha que pensar igual
a todo mundo! Isso me chateou profundamente porque eu tive que me controlar
muito porque eu tenho opinião a respeito de tudo e tinha que controlar a opinião [...]
Se [o Estágio] passasse de quatro meses eu não agüentava, eu ia embora! A minha
forma de ser para me adaptar ao militarismo daquela época, como era... Realmente
foi um esforço muito grande! [...] Estudar, decorar... Isso era coisa fácil! [...] (E2)
Ah! Foi uma experiência inédita para mim porque é uma coisa diferente! Mas foi uma
coisa boa, eu encarei bem, não tive dificuldades! (E3)
Foi bom, eu gostei, ficamos presas lá, fazendo coisas diferentes, curti! (E4)
Achei muito chato! Tive enxaqueca todos os dias! Não porque era militar, mas
porque as pessoas são difíceis, então [...] A convivência era difícil! Muitas mulheres,
muitas normas, não poder sair no início, agente ficou em quarentena, não podia falar
com ninguém, não podia telefonar, era assim um terrorismo... Depois não! Depois
liberou aí ficou melhor, mas também tinha muita pressão por causa de nota, para
gente ficar aonde que agente queria! Uma situação difícil [...] Praticamente gente do
Brasil inteiro... Era complicado!(E5)
A análise das informações referidas pelas entrevistadas sobre Estágio de
Adaptação oferecido ao QFO demonstra que este foi um curso específico para a
formação militar dos sujeitos, onde as alunas foram treinadas para comandar e
liderar subordinados nas unidades em que foram designadas. Assim, o Estágio de
Adaptação resumidamente atuou na inculcação do habitus militar enfocando
aspectos relacionados às atribuições de um Oficial da FAB, às prerrogativas
inerentes da ética do cumprimento do dever e do compromisso militar e às bases da
profissão militar que são a hierarquia e disciplina, e que são instrumentos simbólicos
que permitem identificar a profissão de Militar.
66
De acordo com Bourdieu (2007, p.211), a escola, enquanto “força formadora
de hábitos”, propicia aos que se encontram direta ou indiretamente submetidos à
sua influência, não tanto esquemas de pensamentos particularizados, mas uma
disposição geral geradora de esquemas particulares capazes de serem aplicados
em campos diferentes do pensamento e da ação, os quais pode-se dar o nome de
habitus cultivado.
O Oficial, de acordo com o Estatuto dos Militares, é preparado ao longo da
carreira para o exercício de funções de comando, chefia e direção, sendo que o
comando é considerado a soma de autoridade, deveres e responsabilidades de que
o militar é investido legalmente quando conduz homens ou dirige uma organização
militar. O comando é vinculado ao grau hierárquico e constitui uma prerrogativa
impessoal, em cujo exercício o militar se define e se caracteriza como chefe.
(BRASIL, 1980)
Quanto à ética militar, o Estatuto dos Militares ressalta que o sentimento do
dever, o pundonor militar e o decoro da classe impõem, a cada um dos integrantes
das Forças Armadas, conduta moral e profissional irrepreensíveis, com a
observância dos seguintes preceitos de ética militar, a saber: amar a verdade e a
responsabilidade como fundamento de dignidade pessoal; exercer, com autoridade,
eficiência e probidade, as funções que lhe couberem em decorrência do cargo;
respeitar a dignidade da pessoa humana; cumprir e fazer cumprir as leis, os
regulamentos, as instruções e as ordens das autoridades competentes; ser justo e
imparcial no julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados; zelar
pelo preparo próprio, moral, intelectual e físico e, também, pelo dos subordinados,
tendo em vista o cumprimento da missão comum; empregar todas as suas energias
em benefício do serviço; praticar a camaradagem e desenvolver, permanentemente,
o espírito de cooperação; ser discreto em suas atitudes, maneiras e em sua
linguagem escrita e falada; abster-se de tratar, fora do âmbito apropriado, de matéria
sigilosa de qualquer natureza; acatar as autoridades civis; cumprir seus deveres de
cidadão; proceder de maneira ilibada na vida pública e na particular; observar as
normas da boa educação; garantir assistência moral e material ao seu lar e
conduzir-se como chefe de família modelar; conduzir-se, mesmo fora do serviço ou
quando já na inatividade, de modo que não sejam prejudicados os princípios da
disciplina, do respeito e do decoro militar; abster-se de fazer uso do posto ou da
graduação para obter facilidades pessoais de qualquer natureza ou para encaminhar
67
negócios particulares ou de terceiros e zelar pelo bom nome das Forças Armadas e
de cada um de seus integrantes, obedecendo e fazendo obedecer aos preceitos da
ética militar. (BRASIL, 1980)
Quanto ao dever do militar, o Estatuto dos Militares cita que os deveres
militares emanam de um conjunto de vínculos racionais, bem como morais, que
ligam o militar à Pátria e ao seu serviço, e compreendem essencialmente a
dedicação e a fidelidade à Pátria, cuja honra, integridade e instituições devem ser
defendidas mesmo com o sacrifício da própria vida; o culto aos Símbolos Nacionais;
a probidade e a lealdade em todas as circunstâncias; a disciplina e o respeito à
hierarquia; o rigoroso cumprimento das obrigações e das ordens; e a obrigação de
tratar o subordinado dignamente e com urbanidade. (BRASIL, 1980)
É importante frisar que, apesar da importância de todos os preceitos citados,
a vida militar não se sustenta sem seus pilares, que são a disciplina e a hierarquia, e
que foram devidamente inculcados durante a formação militar:
Nós éramos tratadas como alunas e saímos como Segundo-Tenente e agente
sempre tinha aquela coisa! Sempre tinha uma que queria ser... Não levar a coisa do
jeito que era, mas eles tratavam agente assim e agente tinha que corresponder com
hierarquia e disciplina. (E1)
A hierarquia e a disciplina são as bases das Forças Armadas, sendo que a
disciplina é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos,
normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu
funcionamento regular e harmônico, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do
dever por parte de todos e de cada um dos componentes desse organismo, e a
hierarquia militar é a ordenação da autoridade, em níveis diferentes, dentro da
estrutura das Forças Armadas. A disciplina e o respeito à hierarquia devem ser
mantidos em todas as circunstâncias da vida entre militares da ativa, da reserva
remunerada, e reformados. (BRASIL, 1980)
Perguntadas sobre a adaptação com a disciplina e hierarquia militar, as
entrevistadas responderam:
A Escola Anna Nery já era bem militarizada. Aquela coisa do uniforme sempre
correto, sempre arrumado! Eu também não tive dificuldade nenhuma. Quem foi da
Escola Anna Nery sabe que já era meio militarizada, então eu não tive dificuldade
nenhuma. Eu acho que quando agente entra numa coisa agente tem que seguir as
regras, então tem que procurar cumprir. (E1)
68
Para mim não houve tanto problema [...] Aliás a enfermagem da [Escola] Anna Nery
tinha muito a ver com isso! Era um sistema meio militar na época. Eram umas coisas
que...Umas ordens que [...] eu vinha de uma Universidade Federal, agente estava
tendo abertura política, agente estava lutando pelos direitos e de repente eu estou
no militarismo. Minhas amigas que me conhecem não aceitavam. Elas ficavam:
“Como é que você conseguiu?” Você tem que ter objetivos na vida... pessoais... E
isso aí é o modelo! Você não pode sair da disciplina e da hierarquia militar! É o
modelo militar que se você acabar com isso no militarismo, acabou o militarismo!
Acaba com tudo! Você é civil! (E2)
Muito bem! Eu sou disciplinada, eu era da [Escola] Anna Nery, que também já era
um quartel [...] (E5)
Bourdieu e Passeron (2008, p.65) enfatizam que o sucesso de toda educação
escolar depende fundamentalmente da primeira educação que a percebeu, mesmo e
sobretudo quando a Escola recusa essa prioridade em sua ideologia, pois sabe-se
que através do conjunto de aprendizagens ligadas à conduta cotidiana da vida e em
particular através da aquisição da língua, criam-se disposições lógicas que são
dominada pelo estado prático.
Nestes casos observa-se que as alunas já estavam habituadas com um estilo
de vida regrado por terem vivido experiências anteriores tanto familiares quanto na
EAN. À época, a EAN era considerada altamente rígida na formação de suas alunas
tanto no ensino da enfermagem quanto na formação ética e moral das alunas.
Barreira (1999a, p.177) relata que o produto educacional saído da EAN era
conforme a tradição da profissão, com seu caráter paramilitar, onde a aparência da
aluna, principalmente quando uniformizada, era um ponto de extrema relevância
assim como a pontualidade, a assiduidade, as recompensas e punições de natureza
moral, dentre outros.
Esse fato justifica o porquê das alunas em questão não terem tido
dificuldades durante a incorporação do habitus militar, visto que o processo de
formação do seu habitus profissional de enfermeira foi muito parecido com os
moldes do militarismo.
Bourdieu (2007, p.206) comenta que:
[...] os homens formados em uma dada disciplina ou em uma determinada escola,
partilham um certo “espírito”, literário ou científico [...] Tendo sido moldados dos num
certo modelo [...], os espíritos assim modelados [...] Encontram-se dispostos a
manter com seus pares uma relação de cumplicidade e comunicação imediatas.
Logo após o início do Estágio de Adaptação, aproximava-se o desfile cívico
militar de 07 de setembro, que seria realizado no centro da cidade do Rio de Janeiro,
em comemoração ao dia da Independência do Brasil. Como pela primeira vez a
69
Aeronáutica estava formando mulheres militares, foi decidido pela instituição que as
alunas, apesar de estarem há pouco tempo no Estágio, participariam do desfile de
07 de setembro daquele ano, 1982. As candidatas revelaram detalhes do evento:
[...] E com pouco tempo que agente estava lá, nós entramos 02 de agosto, em
poucas semanas, acho que duas, eles acharam que seria interessante agente
marchar no dia 07 de setembro, então com menos de um mês agente começou um
treinamento para desfilar 07 de setembro... Era Ordem Unida quase que até de
noite! Além das aulas teóricas... Muita Ordem Unida! “Para mim foi uma coisa
inusitada! Realmente a turma correspondeu, porque treinar para desfilar... Nós
saímos lá do início da Avenida Rio Branco, lá perto do aterro do Flamengo, e agente
foi desfilando até a [Avenida] Presidente Vargas, na altura da entrada do
Sambódromo! [...] Foi cansativo! Para gente chegar lá, agente acordou de
madrugada, fomos de ônibus até a estação de Marechal Hermes, então agente
pegou o trem até a Central do Brasil e da Central do Brasil agente pegou o metrô
para saltar na Avenida Rio Branco... Fardada e de forma especial porque agente
usou a camisa de manga comprida, luvas brancas, gravatinha... E a família de todo
mundo foi lá para a concentração, para o desfile... E para nós foi uma coisa! Um
mundo novo! E o desfile realmente é uma coisa emocionante! A primeira vez! E o
público aplaudindo, gritando... As mulheres desfilando... Dizendo que agente
desfilava melhor do que os homens... Foi muito interessante! (E1)
Parecia uma apresentação! Parecia festa de debutante, quando você é apresentada
à sociedade! (E2)
Ah! Foi emocionante porque naquela época também o desfile era uma coisa mais
valorizada! Hoje em dia eu acho que isso acabou! Mas naquela época era uma coisa
importante que a própria população, o povo em geral... Eles valorizavam mais e para
nós foi emocionante! (E3)
Ah, foi fantástico! Emocionante! Porque as mulheres ficavam gritando: “Eh! Viva as
mulheres! Vocês conseguiram!” Então foi muito legal! (E4)
Foi muito legal! Estava todo mundo muito motivado, as famílias foram ver, foi muito
gratificante, muito legal, agente foi de trem, uma experiência diferenciada [...] (E5)
Figura 14– Grupamento de Alunas do QFO no desfile cívicomilitar de 07 de setembro de 1982 no Rio de Janeiro
Fonte: CYRINO, S.B.F. A história da mulher na Força Aérea Brasileira e as
perspectivas para o futuro In: ENCONTRO DO CORPO FEMININO DA
AERONÁUTICA, n.1, 2007, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: CIAAR, 2007.
70
Assim, o desfile cívico-militar de 07 de setembro de 1982, contou, pela
primeira vez , com as primeiras mulheres militares da Aeronáutica, caracterizando-o
portanto, como um evento importante na história da primeira turma de oficiais,
principalmente por ser o primeiro evento dotado de grande força simbólica, visto que
as mesmas estavam sendo, de certa forma, “apresentadas” à sociedade.
Durante o Estágio de Adaptação, o uniforme era um importante objeto de
fiscalização, sendo proibida qualquer modificação do mesmo por parte das alunas. A
ordem era que as alunas sempre observassem a correta constituição do uniforme
para o dia. As alunas possuíam vários tipos de uniformes, que eram identificados por
números e letras e para cada ocasião cabia um uniforme específico sendo na
maioria das vezes, acompanhado pelo distintivo do CFRA, que foi aprovado pela
Portaria n°550/GM6, de 13 de maio de 1982. (BRASIL, 1982b)
Figura 15 – Distintivo do Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica (CFRA)
Fonte: BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Portaria n° 550/GM6, de 13 de maio de 1982. Aprova o
distintivo de curso do Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica - CFRA. Boletim do
Ministério da Aeronáutica. Brasília, DF, n.113-5, 31 maio. p.79-80. 1982b.
O uso do traje civil era permitido apenas para a entrada e saída do quartel,
nos dias não úteis, atentando-se para a proibição do uso de shorts, minissaias,
bermudas, mini-blusas e “collants excessivamente decotados”. (BRASIL, 1982a)
Quanto ao recebimento do uniforme previsto para o Estágio de Adaptação, a
maioria da turma recebeu todo o uniforme previsto, somente algumas peças faltaram
para algumas alunas, que receberam tecido correspondente.
Nós recebíamos fardamento! [Mas] faltou! Deram tecido e eu me lembro que a
minha mãe é costureira e eu levei umas quatro mulheres para a minha casa, minha
mãe cortou, cada uma ia para um canto, alinhavava e depois passava na máquina...
As saias [...] (E2)
71
Apesar da apresentação pessoal ser um quesito muito cobrado na vida militar,
observou-se a necessidade de oficializar uma documentação que versasse apenas
sobre as normas de apresentação pessoal e de utilização de adornos por parte das
mulheres militares, englobando o comportamento das mesmas em diversas
situações possíveis que ocorressem após o término do Estágio de Adaptação.
Assim, no dia 04 de outubro de 1982 foi disponibilizada a Portaria n° 1.114/GM6,
que aprovou as normas complementares de conduta ético-militar, de apresentação
pessoal em atividades sociais e do uso de adornos por parte das militares do CFRA.
(BRASIL, 1982c)
Essa Portaria enfocou que, embora a conduta ético-militar do pessoal da
Aeronáutica já estivesse de modo geral prevista nas leis, regulamentos e normas em
vigor, a criação do CFRA trouxe novos direcionamentos que exigiram adaptações e
conceituações próprias, e que desta forma, esta portaria destacaria os aspectos de
maior relevância que necessitavam de interpretações precisas e de procedimentos
uniformes, de modo a que se evitassem distorções ou discrepâncias de
comportamento e que evitassem ferir os usos e costumes da boa conduta militar da
Aeronáutica. (BRASIL, 1982c)
Quanto à conduta ético-militar, a Portaria n°1.114/GM6 cita que a conduta
ético-militar deverá em todas as circunstâncias, ser orientada de acordo com as
prescrições do Estatuto dos Militares, Regulamento Disciplinar da Aeronáutica, e dos
demais regulamentos, mas que também deveria atender os seguintes preceitos: “o
respeito à sua condição de mulher, à dignidade de seu papel em família, bem como
às tradições de disciplina e decoro da Aeronáutica.” (BRASIL, 1982c)
Desse modo, era especialmente recomendado à integrante do CFRA: ser
discreta em suas atitudes, maneiras e em sua linguagem escrita e falada; abster-se
de tratar, fora do âmbito apropriado, de assuntos sigilosos; proceder de maneira
ilibada na vida pública e particular; conduzir-se dentro e fora do âmbito militar, de
modo que não fossem prejudicados os princípios de disciplina de nivelamento
hierárquico e decoro militar; abster-se de fazer uso do posto ou graduação para
obter facilidades pessoais de qualquer natureza, ou para encaminhar negócios
particulares ou de terceiros; evitar, em público e quando uniformizada, a
demonstração de familiaridade; evitar gestos e atitudes consagradas como
manifestações de gentileza e apreço no relacionamento social, mas que se tornam
incompatíveis, quando envolvendo militar uniformizado; cultivar o “espírito de corpo”
72
e projetar uma imagem favorável do papel da mulher na Aeronáutica; empregar
todas as energias em benefícios do serviço, cumprindo rigorosamente suas
obrigações; não se comprometer irregularmente com encargos de família,
principalmente se solteira; evitar relacionamento íntimo ou socialmente reprovável
com superiores, pares e subordinados hierárquicos; evitar relacionamentos de
amizade ou de intimidade com pessoas de reputação duvidosa; não demonstrar
intimidade com outrem mediante atitudes ou gestos comprometedores; não invocar
circunstâncias de matrimônio ou encargos de família para eximir-se de obrigações
funcionais; não freqüentar, quando uniformizada, bares ou ambientes pouco
recomendáveis; e ainda não usar gírias, expressões ou gestos incompatíveis com a
conduta militar e não transitar em público conduzindo, quando uniformizada, objetos
estranhos ao uniforme. (BRASIL, 1982c)
No que tange à apresentação pessoal, a referida Portaria ressalta que,
visando manter a boa apresentação pessoal, a militar deveria ter especial atenção
no esmerado uso do uniforme, procurando ser discreta no uso da maquiagem e uso
de adornos; abster-se do uso de penteados exagerados como alto e cheio, ou
cobrindo a testa, ainda que parcialmente, bem como o uso de quaisquer postiços e
quanto às unhas, estas poderiam ser tratadas e pintadas apenas com esmalte
transparente. (BRASIL, 1982c)
Quanto à apresentação pessoal em atividades sociais, era previsto que a
militar só poderia freqüentar clubes e cassinos militares do círculo que lhe
correspondesse, mesmo quando existisse vínculo matrimonial entre militares de
diferentes círculos, e o comparecimento da militar a eventos sociais decorrentes da
atividade militar que se realizasse no âmbito da Organização Militar, deveria ser feito
exclusivamente em seu círculo e quando convidada a participar de eventos de outro
círculo, a militar poderia comparecer, fazendo-o obrigatoriamente em traje civil.
(BRASIL, 1982c)
Nos assuntos relacionados ao uso de adornos, foi determinado que não seria
permitido o uso de colar que ficasse à mostra, seria permitido apenas o uso de uma
única pulseira desde que formada de uma única volta simples e com espessura
máxima de um centímetro. O uso de brinco era permitido, sendo que o referido
adorno deveria ser pequeno e discreto não podendo ter argola nem pingente. O uso
de anel, aliança e relógio era permitido. (BRASIL, 1982c)
73
Sobre o casamento, aplicava-se às alunas o prescrito no Estatuto dos
Militares, onde o militar da ativa poderia contrair matrimônio, desde que fosse
observada a legislação civil específica, todavia, era vedado o casamento às Praças
especiais, com qualquer idade, enquanto estivessem sujeitas aos regulamentos dos
órgãos de formação de Oficiais, de Graduados e de Praças, cujos requisitos para
admissão exigissem a condição de solteiro, salvo em casos excepcionais, a critério
do Ministro da respectiva Força Armada. As Praças especiais que contraíssem
matrimônio em desacordo com o previsto seriam excluídas do serviço ativo, sem
direito a qualquer remuneração ou indenização. No caso das militares do CFRA já
formadas, o casamento com homem estrangeiro somente poderia ser realizado após
autorização do então Ministro da Aeronáutica. (BRASIL, 1980)
Quanto ao real cumprimento das prescrições da Portaria n° 1.114/GM6, de 04
de outubro de 1982, as candidatas informam:
Era o que está escrito: jóias, anéis unhas, esmalte claro... Isso era seguido à risca!
(E1)
Funcionava! No início quando nós chegamos aqui, todas nós... Era o coque... Mas é
uma coisa assim até boa, não só o coque, mas você ter uma apresentação melhor!
Se cuidar mais, estar sempre arrumada. A apresentação pessoal aqui no meio
militar sempre foi muito valorizada. Foi mais no passado quando nós ingressamos
aqui do que hoje em dia, mas eu considerei até uma coisa positiva! Seguíamos à
risca! (E3)
Isso realmente existia! E até hoje tem! Você não pode usar batom muito vermelho,
esmalte muito vermelho, às vezes até hoje você vê, mas na lei não pode... Brincos
pendurados [...] (E4)
Eu acho que quando agente entrou era muito seguido. Agente usava só brinco
pequeno, coque, unha nunca usamos vermelha, essas coisas todas... e era
emblemático isso, a minha colega pintou o cabelo de loiro [...] e mandaram ela pintar
o cabelo novamente. Era da primeira turma. Até porque chegou muita mulher e
perdeu um pouco daquele foco, porque nove pessoas é mais fácil, agora um
montão... Hoje até o comprimento da saia é diferente, antes era saia abaixo do
joelho, era mais cobrado! (E5)
O ciclo de formação militar das alunas do QFO se encerrou com o segundo
evento do curso dotado de grande força simbólica, que foi a solenidade de formatura
da turma. A solenidade ocorreu em 06 de dezembro de 1982, no CIEAR, contou com
a presença de várias autoridades civis e militares e foi marcada por diversos rituais
como missa de ação de graças, honras militares ao Ministro da Aeronáutica, entrega
de insígnias, compromisso das Tenentes e por fim o desfile militar. (BARROS, 2007)
74
De acordo com Mc Laren apud Santos (2004, p. 83) “o ritual é uma forma de
ação simbólica, composta primariamente por gestos (atos simbólicos dinâmicos) e
posturas (uma parada simbólica da ação)”.
Os Estatuto dos Militares enfoca que todo cidadão, após ingressar em uma
das Forças Armadas mediante incorporação, matrícula ou nomeação, prestará
compromisso de honra, no qual afirmará a sua aceitação consciente das obrigações
e dos deveres militares e manifestará a sua firme disposição de bem cumprí-los. O
compromisso do incorporado, do matriculado e do nomeado, a que se refere o artigo
anterior, terá caráter solene e será sempre prestado sob a forma de juramento à
Bandeira Nacional na presença de tropa ou guarnição formada, conforme os dizeres
estabelecidos nos regulamentos específicos das Forças Armadas, e tão logo o
militar tenha adquirido um grau de instrução compatível com o perfeito entendimento
de seus deveres como integrante das Forças Armadas. (BRASIL, 1980)
Vale citar o compromisso firmado pelas formandas na solenidade de
formatura, também transcrito no convite:
Ao ser declarada Segundo-Tenente da Força Aérea Brasileira, prometo cumprir
rigorosamente as ordens das autoridades a que estiver subordinada, respeitar
superiores hierárquicos, tratar com afeição os irmãos de Armas e com bondade os
subordinados e dedicar-me inteiramente ao serviço da Pátria, cuja honra, integridade
e instituições defenderei com o sacrifício da própria vida.
A formatura foi um evento dotado de grande força simbólica que representou
o término do processo seletivo, e marcou o início da trajetória das primeiras oficiais
enfermeiras a ingressarem na FAB por meio de concurso público federal.
75
Figura 16 - 2◦ Tenente Enfermeira Neyde da
Costa Carpinteira logo após a formatura
Figura 17 – Cópia do diploma de conclusão do Estágio de Adaptação
ao QFO
76
Figura 18 – Adesivo comemorativo à formatura da 1ª turma do
QFO nomeada “Demoiselle11” pelas formandas
Figura 19 – Capa do convite de formatura da 1ª turma do QFO
11
“Demoiselle” foi um invento de Alberto Santos Dumont. Foi o primeiro avião produzido em série e influenciou
definitivamente a indústria da aviação, especialmente a indústria européia, no começo do século XX. (VICTOR,
2007b, p.20)
77
Figura 20 – Cópia da Carta-Patente do posto de 2º Tenente do QFO
Após a formatura, as Oficiais Enfermeiras do QFO foram designadas a
desempenhar
funções
compatíveis
com
suas
habilitações
e
qualificações
profissionais em diversos hospitais pelo Brasil. As alunas aprovadas foram
relacionadas em ordem decrescente das médias finas obtidas, o que serviu de base
para a determinação das respectivas antiguidades12, ou seja, ordenação hierárquica
pela pontuação geral obtida no curso de formação militar, conforme o depoimento a
seguir:
Foi por antiguidade! Durante o curso! No final do curso nós fomos classificadas.
Classificação geral! De acordo com essa classificação cada uma de nós era
chamada e: “Olha, você está nessa classificação, você pode escolher tal e tal lugar!”
(E3)
12
A precedência entre militares da ativa do mesmo grau hierárquico, ou correspondente, é assegurada pela
antigüidade no posto ou graduação, salvo nos casos de precedência funcional estabelecida em lei. A antigüidade
em cada posto ou graduação é contada a partir da data da assinatura do ato da respectiva promoção,
nomeação, declaração ou incorporação, salvo quando estiver taxativamente fixada outra data. Havendo empate,
outros critérios serão estabelecidos, dentre eles, a antigüidade será estabelecida entre militares do mesmo
Corpo, Quadro, Arma ou Serviço, pela posição nas respectivas escalas numéricas ou registros existentes em
cada Força. (BRASIL, 1980)
78
A nomeação das oficiais da primeira turma do QFO foi divulgada pela Portaria
n° 1.430/GM1, de 06 de dezembro de 1982, que além de nomeá-las, também as
convoca para o serviço ativo pelo prazo de dois anos obrigatórios e as relaciona por
ordem de antiguidade. As militares convocadas para o serviço ativo, tornaram-se
titulares
de
deveres,
responsabilidades,
direitos,
honras,
prerrogativas
e
remuneração previstos na legislação em vigor e nas disposições previstas em leis e
regulamentos. (BRASIL, 1982d)
79
6 A INSERÇÃO DAS ENFERMEIRAS MILITARES NOS HOSPITAIS DA FORÇA
AÉREA BRASILEIRA: AS LUTAS SIMBÓLICAS NO CAMPO MILITAR
Neste capítulo, discuto as estratégias de luta das enfermeiras militares para
ocuparem seus lugares devidos nos hospitais da Força Aérea Brasileira.
As alunas que concluíram com aproveitamento o Estágio de Adaptação foram
nomeadas Segundo-Tenente da Reserva da Aeronáutica e convocadas para o
serviço ativo por um período inicial de dois anos obrigatórios, quando então seriam
promovidas ao posto de Primeiro-Tenente. (BRASIL, 1981b)
De acordo com o Decreto n◦ 86.325, de 01 de setembro de 1981, a
convocação e as prorrogações para o serviço ativo não implicavam em compromisso
de tempo mínimo de permanência na FAB, ou seja, as integrantes do QFO poderiam
ser licenciadas a qualquer tempo, a bem da disciplina ou a pedido, sendo que o
licenciamento a pedido somente seria concedido ao militar que tivesse cumprido o
tempo inicial a que se obrigou a servir de dois anos. (BRASIL, 1981a)
Após o período inicial de dois anos, a permanência definitiva no serviço ativo
só seria assegurada às integrantes do QFO, de acordo com as necessidades da
Aeronáutica e por ato do respectivo Ministro, após 08 (oito) anos de serviço em
atividade militar. (BRASIL, 1981a)
Às integrantes do QFO em serviço ativo seriam aplicadas as disposições da
Lei de Promoções de Oficiais da Ativa das Forças Armadas e de seu regulamento
para a Aeronáutica. À época, a referida Lei previa que as vagas de Primeiro-Tenente
seriam preenchidas por Segundos-Tenentes que completassem no mínimo 02 (dois)
anos de interstício. Já as vagas de Capitão seriam preenchidas por PrimeirosTenentes, as vagas de Major por Capitães e as vagas de Tenente-Coronel por
Majores sendo que para cada promoção, o Oficial deveria completar no mínimo 06
(seis) anos de interstício. (BRASIL, 1981a)
As integrantes do QFO que galgassem a permanência definitiva no serviço
ativo
reverteriam
Reserva
Remunerada
da
Aeronáutica
(inatividade
ou
aposentadoria), ao atingirem as seguintes idades-limite: Tenente-Coronel (56 anos);
Major (52 anos); Capitão, Primeiro-Tenente ou Segundo-Tenente (48 anos).
(BRASIL, 1981a)
80
Ao ingressarem nas unidades para as quais foram destinadas, as enfermeiras
do QFO, primeiras oficiais de enfermagem dos hospitais da FAB por meio de
concurso público federal, receberam imediatamente um cargo militar e depararamse, em sua maioria, com um campo configurado por uma equipe de enfermagem
composta por enfermeiras civis, sargentos com formação de técnico em enfermagem
(sexo masculino), auxiliares de enfermagem civis, além de Soldados e Cabos com
pouca qualificação em enfermagem.
[...] Tinham poucos homens Graduados, dos civis também eram poucos homens,
tinha no centro-cirúrgico e os andares agente tinha alguns Cabos que fizeram o
curso e entraram para a enfermagem. Tinha uma escola de [formação para] auxiliar
de enfermagem aqui dentro do hospital, então eles fizeram o curso e os mais antigos
hoje são Sargentos, mas quando nós chegamos aqui eles eram cabos da
enfermagem. Não havia Sargentos [do sexo masculino] de enfermagem. (E1)
[...] As outras [enfermeiras] que tinham lá eram realmente civis antigas, de
concursos federais e os outros eram sargentos da enfermagem, homens, Cabos,
Soldados [...] (E2)
Quase que junto às oficiais enfermeiras, chegam também aos hospitais da
FAB os sargentos (do sexo feminino) do QFG que possuíam curso técnico de
enfermagem e que concluíram o curso de formação militar com aproveitamento.
Os Sargentos [do sexo feminino] tinham entrado pouco antes da gente, foi quase
junto! [...] (E1)
E foi nesse campo que as enfermeiras militares se inseriram, ocupando
imediatamente o cargo de chefe de toda a equipe de enfermagem e de tudo o que
estivesse relacionado às atividades regulamentadas pela profissão, já que, apesar
de recém-chegadas às unidades de destino, e em sua maioria recém-formadas,
possuíam o maior grau hierárquico da especialidade.
Vale ressaltar que no meio militar o único fator que determina a posição dos
agentes num determinado serviço é a antiguidade, ou seja, o militar que detêm o
maior grau hierárquico sempre será o chefe, e assim sucessivamente.
As serem questionadas sobre os cargos e as funções que receberam ao
ingressarem nos hospitais, as depoentes responderam:
Quando cheguei eu recebi a chefia da UI-5 [Unidade de Internação nº5] que é
maternidade/ginecologia e obstetrícia [...] Ou seja, recebi a chefia de uma
maternidade, obstetrícia, ginecologia e berçário! (E1)
81
Eu era enfermeira-chefe! Fazia tudo o que uma enfermeira-chefe faz! Coordenar,
planejar, participar das reuniões... Era a subseção de enfermagem [que era
subordinada] à seção de atividades complementares. Então agente era vinculada a
um médico, um Major-Médico psiquiatra. Se você olhar minhas alterações [histórico
profissional do militar] você vai ver... Eu era chefe da subseção de enfermagem,
chefe do Centro-cirúrgico, chefe do Ambulatório... Era chefe de todo mundo! Eu era
a única enfermeira! Apareceu o meu nome em tudo! [...] Por incrível que pareça,
apesar de ser enfermeira, eles me colocavam em tudo o que era formação... A
coordenação de formação de Soldados [...] então eu fui elaborar, eu comecei a
elaborar tudo, dentro da enfermagem, rotinas, livros, tudo eu fui elaborando com
aquilo que eu conhecia da faculdade... Até parede eu consegui derrubar para fazer
uma passagem específica para o paciente [...] Essa parte de gestoria... Colocaram
tudo para cima de mim! (E2) (grifo nosso)
Num primeiro momento eu fiquei até meio perdida porque eu recebi muitas
atribuições! Eles nunca tinha tido uma enfermeira! Então eu recebi logo duas
chefias! Uma chefia da Emergência! Eu nunca tinha sido chefe! Minha experiência
era muito pouca! Aliás, de todas nós aqui! Então eu fui logo sendo chefe da
emergência, chefe da central de material e no decorrer de todos os anos acabei
sendo chefe de todos os lugares aqui do hospital, até chegar à chefia geral [de
enfermagem]! (E3)
Eu fui ser chefe da subdivisão de enfermagem, por causa da antiguidade, não por
experiência profissional, porque eu não tinha! (E5)
O cargo militar é um conjunto de atribuições, deveres e responsabilidades
cometidos a um militar em serviço ativo. As obrigações inerentes ao cargo militar
devem ser compatíveis com o correspondente grau hierárquico e são definidas em
legislação ou regulamentação específicas. Os cargos militares são providos com
pessoal que satisfaça aos requisitos de grau hierárquico e de qualificação exigidos
para o seu desempenho, e o seu provimento deverá ser feito por ato de nomeação
ou determinação expressa da autoridade competente. (BRASIL, 1980)
Um fato interessante observado pelas depoentes foi o recebimento de
chefias e funções que antes pertenciam a outros profissionais de saúde do hospital:
A chefia da UI-5 [Unidade de Internação n° 5], que eu assumi, era de uma
enfermeira civil e a carga [material permanente do setor] do andar que era de um
médico, ele passou para mim!(E1)
O mais antigo era um Suboficial [...] e aí ele passou para mim o serviço. (E2)
O cargo militar anda em conjunto com a função militar, e de acordo com o
Estatuto dos Militares, função militar é o exercício das obrigações inerentes ao cargo
militar. Dentro de uma mesma Organização Militar, quando houver a necessidade de
substituições para assumir cargo ou responder por funções, bem como as normas,
atribuições e responsabilidades relativas, devem ser respeitadas a precedência
hierárquica e a qualificação profissional do militar. (BRASIL, 1980)
82
A grande quantidade de cargos e funções que foram direcionados às
enfermeiras recém-chegadas é um fator que nos remete à idéia geral que percorre a
administração dos hospitais de que a enfermeira é capaz de desempenhar diversas
funções ao mesmo tempo, principalmente nas áreas de chefia, administração,
supervisão e formação profissional, que por um lado causa uma sobrecarga do
trabalho da enfermeira, mas que por outro lado lhe proporciona poder no campo
hospitalar, caracterizado por um lucro simbólico e conseqüentemente por uma
posição privilegiada nesse campo.
Outro fator importante para a grande quantidade de cargos e funções
direcionados às enfermeiras é justificado por Bourdieu (1999, p. 44) como uma visão
androcêntrica, que é continuamente legitimada pelas próprias práticas que ela
determina e pelo fato de suas disposições resultarem da incorporação do
preconceito desfavorável contra o feminino instituído na ordem das coisas. Esse
preconceito desfavorável ocorre quotidianamente em inúmeras trocas entre os sexos
e são as mesmas disposições que levam os homens a deixar às mulheres as tarefas
inferiores e as providências “ingratas e mesquinhas”, visto que as enfermeiras em
questão não receberam cargos de grande relevância na administração central do
hospital.
O foco central do preconceito é que as mesmas tarefas podem ser
consideradas nobres e difíceis quando realizadas por homens, ou insignificantes e
imperceptíveis, fáceis e fúteis quando são realizadas por mulheres. Os trabalhos
atribuídos às mulheres são sempre sem qualificação e é porque toda a profissão,
seja ela qual for, vê-se de certo modo qualificada pelo fato de ser realizada por
homens, e mesmo diante de todas as lutas das mulheres para fazer reconhecer
suas qualificações, as tarefas a elas impostas sempre visarão empobrecer o
trabalho feminino, mantendo decisoriamente o valor do trabalho masculino.
BOURDIEU (1999, p.75-76)
E assim, como agentes autorizados a exercerem diversas funções, as
enfermeiras iniciaram suas atividades como oficiais pioneiras nos ambientes
hospitalares da FAB.
Questionadas sobre como se sentiam no desenvolvimento de suas atividades,
as enfermeiras manifestaram necessidade de se adaptar, de aprender, e também
expressaram desespero e sentimento de estarem perdidas:
83
Ah, era tudo novo [...] Dificuldades todo mundo tem, e eu resolvi ser militar então eu
acho que eu tenho que me enquadrar! Às vezes agente vê as coisas, não concorda,
acha que deveria ser de maneira diferente... É militar, mas é ser humano! Agente
tem que ter amor e respeito pelo nosso nome, então quando você assina o nome,
você tem que saber o que você está fazendo! (E1) (grifo nosso)
[...] Para mim foi um aprendizado porque [...] você não é só enfermeira, você é
enfermeira, você é instrutora, você é Oficial, você tem que dar aulas, corrigir provas,
fazer cursos na área de ensino [...] (E2)
Eu fiquei perdida! Tive que aprender muita coisa até com os Graduados [Suboficiais
e Sargentos] com os civis... E eles foram me ajudando e eu comecei a ver como é
que eu tinha que desenvolver a minha chefia! Depois com o talento mesmo agente
vai! No início foi difícil para mim! Até porque não recebi grandes informações! Não
tinha quem passasse nada para mim! (E3)
Perdida! Desesperada! Depois foi melhorando... Porque eu era recém-formada [...]
(E5)
Assim, considero que a determinação de um grande volume de trabalho às
enfermeiras foi a primeira estratégia de violência simbólica exercida sobre elas nos
ambientes hospitalares.
É possível observar que as enfermeiras acreditavam que estavam recebendo
um excesso de funções simplesmente por serem enfermeiras e chefes, e por isso
aceitavam todas as atribuições que lhes eram impostam, mesmo cientes de que não
possuíam experiência ou conhecimento suficiente para o desenvolvimento de tais
atividades, e ainda justificam o aceite às regras impostas por acharem que têm que
se enquadrar por serem militares. Esse fato é justificado por Bourdieu (1999, p.47),
quando diz que a violência simbólica só se institui por intermédio da adesão que o
dominado não pode deixar de conceder ao dominante e, portanto, à dominação, e
quando esta relação é incorporada e vista como natural.
Durante o desenvolvimento das diversas funções e atribuições que
receberam, as enfermeiras começaram a aprender as especificidades de atuação de
uma enfermeira militar, adequando seus conhecimentos profissionais e militares
prévios nas atividades diárias, de acordo com as especificidades exigidas pelo
campo militar, visto que o habitus profissional de uma enfermeira militar é
indissociável do seu habitus militar.
O horário de trabalho nos hospitais da FAB variava de acordo com a rotina da
instituição, mostrando que, de uma maneira geral, todos os profissionais cumpriam
praticamente as mesmas horas de trabalho semanais previstas:
O expediente aqui na época era de 07hs às 15hs todo dia. Na verdade a
enfermagem entrava mais cedo por conta da hora da passagem de serviço e as
outras pessoas, o pessoal na verdade chegava 08hs [...] (E1)
84
O horário normalmente era de 07hs às 13hs, eu ficava mais na chefia de
enfermagem, meio período! Eu era a única enfermeira! (E2)
Inicialmente o horário era de 08 às 16hs. Nós tirávamos serviço, porque todo militar
tem uma escala de serviço e o nosso, nesse caso, era voltado para supervisão de
enfermagem! O nosso horário de serviço era diferente do horário das enfermeiras
civis porque a maioria das enfermeiras civis [...] Eram plantonistas. De uma maneira
geral era de acordo com o posto mesmo! [...] (E3)
Eram dois turnos, era de 08hs às 15hs e mais plantão [de enfermagem]. (E5)
Para o exercício da profissão nos hospitais da FAB, as enfermeiras deveriam
utilizar obrigatoriamente uma farda específica de cor branca, chamada de uniforme
hospitalar, e em outros eventos militares, as enfermeiras geralmente eram
solicitadas a trajarem o uniforme azul, intitulado de 7º (sétimo) uniforme.
O branco para o hospital e o 7° [uniforme azul] para representações. (E3)
No hospital era sempre branco. (E5)
De acordo com a Portaria nº 1.550/GM3 de 07 de dezembro de 1981, os
uniformes de uso interno da área de especialização de saúde do QFO teriam a
seguinte numeração e composição: o uniforme hospitalar nº 1 era composto por
vestido branco com cinto, meia branca social e sapato branco de salto baixo, e o
uniforme hospitalar nº 2 era composto por abrigo branco, jaleco branco com cinto,
calça branca, cinto branco, sapato branco de salto baixo e meia branca social. No
bolso superior direito dos uniformes hospitalares ainda estariam visíveis o nome da
Oficial, o posto e a especialidade.
85
Figura 21 – Uniforme hospitalar n°1 e n°2 para o QFO
Fonte: BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Portaria n◦1.550/ GM3 de 07 de
dezembro de 1981. Aprova as instruções reguladoras para recrutamento,
seleção inicial, matrícula no Estágio de Adaptação e ingresso no Quadro
Feminino de Oficiais da Reserva da Aeronáutica e dá outras providências.
Brasília, DF. Boletim do Ministério da Aeronáutica. n.113-12, 31 dez. p.87-91.1981c.
.
Figura 22 – Enfermeira do QFO trajando o
uniforme hospitalar n°2
86
Questionadas sobre a representatividade do uso de uma farda num ambiente
hospitalar, devidamente identificada pelo nome, posto e especialidade, as
enfermeiras, relataram:
Com grandes responsabilidades, não é? A responsabilidade do azul, do militar e a
responsabilidade do branco, ou seja, você tem que honrar os dois uniformes [...]
Você está numa [...] Instituição séria! [...] Mas existe uma coisa chamada tradição!
Tradição você não quebra! Para mim é uma honra fazer parte das duas coisas, tanto
da tradição do azul quanto do branco! (E2)
Eu sentia orgulho de ser militar. A questão do uniforme eu sempre gostei porque eu
era da [Escola] Anna Nery [...] e lá agente usava um uniforme que ninguém gostava,
mas eu adorava! Era aquela touca... Porque eu achava que representava o que eu
era! Então hoje ficou uma bagunça, cada um faz o que quer e ninguém mais sabe
quem é quem! (E5)
No ambiente militar, o uniforme é caracterizado pelo principal emblema que é
composto por outros pequenos emblemas como insígnias, distintivos, tarjetas,
coberturas e platinas. O uniforme do militar é dotado de forte valor simbólico, pois
não se caracteriza somente por uma estratégia que proporciona igualdade no grupo
e sim por proporcionar a representação da profissão e principalmente a distinção de
postos hierárquicos, permitindo a demarcação dos espaços ocupados pelos agentes
situados num mesmo campo. Santos (1998, p.38) cita que os militares se usam de
artefatos, que são os uniformes e seus complementos, que correspondem ao
vestuário e acessórios, que ajudam a compor a representação do indivíduo, ou seja,
sua posição social.
Durante o desenvolvimento de suas atividades diárias, as enfermeiras não
exerciam exclusivamente as funções próprias da enfermagem. Por várias vezes,
como todos os outros profissionais do hospital, elas eram recrutadas para cumprirem
escalas de comparecimento em eventos sociais, como representações, aplicação de
provas em concursos públicos, recepções e desfiles militares, que são eventos muito
comuns na vida militar, reforçando sempre a idéia de que primeiramente, as
Tenentes eram militares, e em segundo lugar, eram enfermeiras:
Aqui eu ainda participei de desfile [militar] umas duas vezes de 07 de setembro [...]
(E1)
Eu era instrutora, [cumpria] representações militares [...] aplicava as provas de
escola no concurso nacional. (E2)
Militar e enfermeira! Era chefe, enfermeira, dava plantão, formatura, escala de
serviço, representação, jantar [...] (E4)
87
Aos poucos, as enfermeiras militares foram aprimorando suas habilidades nas
relevantes chefias que exerciam e foram conseguindo um evidente controle de todas
as atividades que eram desenvolvidas no hospital. As enfermeiras agregaram um
capital e conseguiram evidentemente um poder de decisão sobre a maioria dos
agentes da equipe da enfermagem. Bourdieu (1989, p.136) comenta que “o
conhecimento da posição ocupada no espaço comporta uma informação sobre as
propriedades intrínsecas (condição) e relacionais (posição) dos agentes”, sendo este
fato bem evidenciado no caso dos ocupantes das posições intermédias ou médias
que além dos valores médios ou medianos das suas propriedades, devem um certo
número das suas características mais típicas ao fato de estarem situadas entre os
dois pólos do campo, no ponto neutro do espaço, e de oscilarem entre as duas
posições extremas.
As lutas simbólicas
Como era de se esperar, o poder galgado pelas enfermeiras no ambiente
hospitalar começou a incomodar os demais agentes do campo. A figura da mulher,
chefe, militar e enfermeira nesse campo deu inicio às lutas simbólicas desses
agentes com os médicos, com a equipe de enfermagem, com as enfermeiras civis, e
com a própria administração da instituição.
As lutas das enfermeiras visavam simplesmente a manutenção do lucro
simbólico e do espaço galgado por elas no campo através do trabalho que
desempenhavam.
Vale ressaltar que, à época, a FAB só incorporava médicos militares do sexo
masculino e que, quando as enfermeiras se apresentaram nos hospitais, a maioria
dos médicos já galgava um grau hierárquico superior ao delas.
No campo militar, o relacionamento entre médicos e enfermeiras era
considerado difícil:
A relação com os médicos sempre foi uma relação difícil! Enfermeiro com médico é
sempre uma relação difícil! (E3)
As enfermeiras relataram que, ao ingressarem nos hospitais militares tiveram
que se impor, mesmo sendo bem recebidas pelos médicos militares, que
demonstraram boa educação e conduta ética com as novas colegas de trabalho.
88
Mas nós fomos muito bem acolhidas [pelos médicos militares] (E2)
A grande maioria aqui era masculina e eles tratavam a gente muito bem, tratavam
agente de uma maneira respeitosa, embora muita gente fosse hierarquicamente
superior, mas tratavam agente de uma forma cordata. (E1)
De acordo com Bourdieu (1999, p.98), o carisma masculino é, por um lado, o
charme do poder, a sedução que a posse exerce, por si mesma, sobre os corpos, e
este fato é justificado, pois a dominação masculina encontra, no desconhecimento
do dominado, um dos seus melhores suportes.
Entretanto, apesar da boa receptividade, evidencia-se que a presença das
mulheres ocupando o mesmo campo impôs aos agentes masculinos uma mudança
de atitudes no cotidiano hospitalar. A presença das mulheres forçou os médicos
militares mudarem o modo de falar, de se comportar e até mesmo de pensar, visto
que agora eles deveriam conviver diariamente, no mesmo ambiente de trabalho,
com mulheres enfermeiras do mesmo círculo hierárquico13 e conseqüentemente com
o mesmo status militar de Oficial:
No primeiro momento foi muito engraçado porque como os homens falam de
mulheres normalmente, futebol, palavrão... Porque eles ainda não tinham percebido
que havia mulheres, quando eles começaram a perceber que não podiam falar as
mesmas coisas, eles foram mudando! (E2)
Percebemos que diante dessa disputa, os médicos deixando claro às
enfermeiras sua posição, utilizando os próprios princípios da hierarquia militar e
impondo a elas o silêncio:
[...] Disciplina, hierarquia... Tenente fala pouco e procura ouvir mais. (E1) (grifo
nosso)
Pela análise de Bourdieu (1999, p.71) as injunções continuadas, silenciosas e
invisíveis, que ocorrem no mundo sexualmente hierarquizado no qual são lançadas,
preparam as mulheres, ao menos tanto quanto os explícitos apelos à ordem, a
aceitar como evidentes, naturais e inquestionáveis prescrições e procriações
arbitrárias que, inscritas na ordem das coisas, imprimem-se insensivelmente na
ordem dos corpos.
13
Círculos hierárquicos são âmbitos de convivência entre os militares da mesma categoria e têm a finalidade de
desenvolver o espírito de camaradagem, em ambiente de estima e confiança, sem prejuízo do respeito mútuo.
(BRASIL, 1980)
89
As enfermeiras reconheciam suavemente que os médicos militares eram
machistas e lhes davam ordens que não davam aos homens com o mesmo nível
hierárquico delas:
Os Coronéis... Na época tinha uns aqui mais machistas! Você via que para o homem
ele não mandava, mas para nós mandava. (E4) (grifo nosso)
Eu acho que encima de outros oficiais homens eles não cobravam algumas coisas
que cobravam das oficiais mulheres tipo uniforme... Cabelo preso [...] Por sinal não
[nos] deixavam fazer [algumas] coisas. (E5)
Mesmo os homens bem intencionados, visto que a violência simbólica não
opera na ordem das intenções conscientes, realizam atos discriminatórios excluindo
as mulheres, reduzindo suas reivindicações a caprichos, tornando-as merecedoras
apenas de uma palavra de apaziguamentos, dirigindo-se a elas com termos
familiares, ou então, chamando-as e reduzindo-as de algum modo à sua feminilidade
pelo fato de desviar a atenção para seu penteado ou para algum traço corporal.
Estas atitudes contribuem para constituir a situação diminuída das mulheres e cujos
efeitos cumulativos estão registrados nas estatísticas da diminuta representação das
mulheres nas posições de poder, sobretudo econômico e político. (BOURDIEU,
1999, p.74-75)
O fato de exigirem obediência foi reconhecido pela enfermeira como
discriminação de gênero:
Discriminação eu acho que sempre tem porque os homens acham que agente tem
mais é que obedecer! [...] (E5)
Bourdieu (1999, p.55) enfatiza que uma relação de dominação só funciona
por meio da cumplicidade de tendências e depende, para sua perpetuação ou
transformação, da estrutura de um mercado de bens simbólicos, cuja lei fundamental
é que as mulheres nele são tratadas como objetos que circulam de baixo para cima.
Entretanto,
apesar
das
evidentes
formas
de
violência
simbólica
desencadeada por questões de gêneros, os desencontros entre médicos e
enfermeiras também deve ser considerado, já que é um tema amplamente estudado
e historicamente conhecido decorrente das relações de poder existentes nos
ambientes hospitalares.
Mintzberg apud Lima e Binsfeld (2003, p.100 e 101) identifica o hospital
moderno como um duplo sistema de autoridade, onde uma linha descenderia da
90
administração até o pessoal hospitalar, obedecendo a um rígido esquema
hierárquico, autoritário e centralizado e a segunda linha é decorrente do poder de
saber dos médicos que lhes permite confrontar a administração na luta pela defesa
de seus interesses profissionais. Assim, esse sistema duplo acarreta uma
permanente disputa de poder e conseqüentemente desencadeamento de conflitos
pela tentativa de manutenção da posição no campo:
Eu tive realmente que me impor! Com os homens também em alguns momentos [...]
Eu era a única e eles eram mais do que eu e eu tinha que me impor e me impus!
(E2)
Cecílio (1999, p.321 e 322) traz o tema “poder no hospital” pelos seguintes
itens: os médicos são os únicos profissionais realmente autônomos no hospital; a
natureza do saber médico é um saber-poder; é a indeterminação que separa o saber
médico dos saberes periféricos e dos saberes profanos; são as formas de
funcionamento e de circulação do saber médico que constituem o saber dos
profissionais de enfermagem como um saber periférico e o saber do doente como
um saber profano; e por último, o pessoal de enfermagem pode ser considerado
uma plataforma de mediação entre os doentes e o poder médico.
O poder masculino agregado ao poder médico foi decisivo para que as
enfermeiras militares aceitassem o princípio da inferioridade e da exclusão da
mulher. Tal fato foi manifestado pelas agentes desse estudo, quando hoje,
reconheceram que tinham regras mais rígidas em seu processo de trabalho:
[...] Os clínicos, os médicos, o pessoal das outras profissões na verdade começam
sempre mais tarde que a enfermagem, porque tinha a passagem de serviço, então
agente chegava mais cedo. (E1)
O médico sempre teve algum... Tipo assim... Folga num dia e no outro dia dobra [...]
(E3)
Ainda hoje, as enfermeiras não compreendem a dominação imposta pelos
homens:
Eu acho que não é porque eu era mulher, eu acho que era mais por eu ser
enfermeira! (E5)
91
E apesar de tudo, a invasão de suas consciências pelo poder onipresente dos
homens, as fazem pensar que a opressora é a própria mulher, possivelmente por
diferenças da patente militar:
Então não foi entre os homens que eu senti discriminação, foi entre “as Sargentos
femininas” com as oficiais femininas! [...] (E2)
Tal desconhecimento é um das características da vítima de violência
simbólica. A violência simbólica se processa através de um ato que se efetiva
aquém da consciência e da vontade e confere um “poder hipnótico” no qual o agente
desconhece a vivência da mesma. (BOURDIEU, 1999, p.53 e 54)
Vale lembrar que quando chegaram nos hospitais, as enfermeiras
encontraram uma equipe de enfermagem composta por enfermeiras civis, Sargentos
(sexo masculino) com formação técnica em enfermagem, auxiliares de enfermagem
civis, além de Soldados e Cabos. Juntamente com as enfermeiras, chegaram
também os Sargentos (do sexo feminino) do QFG que possuíam curso técnico de
enfermagem.
Antes da chegada das enfermeiras militares nos hospitais da FAB, a maioria
das chefias era ocupada por Graduados (Suboficiais ou Sargentos) ou pelas
enfermeiras civis. Assim, a chegada de uma nova chefia, que além de possuir nível
superior
em
enfermagem
ainda
tinha
o
posto
de
Tenente,
transformou
completamente o serviço de enfermagem neste campo:
Quando nós chegamos, nós tivemos que ocupar esses lugares! Tivemos que tomar
algumas atitudes! Às vezes nem muito simpáticas! [...] (E3)
Tal fato gerou uma insatisfação na equipe de enfermagem que já estava
atuando no campo e que se viram perdendo espaço. Esses agentes tentaram
manter a posição no campo “testando” as novas militares recém-formadas:
[...] aí eles queriam dar uma “testada” tipo “Essa novinha vai me mandar?” Teve isso
sim, mas por pouco [tempo]! (E4)
No entanto, o círculo de trabalhadores de enfermagem é bem hierarquizado e
muito similar ao círculo hierárquico do militarismo. Assim como o Oficial será o chefe
dos Graduados (Suboficiais e Sargentos), das Praças (Cabos, Soldados e Taifeiros),
92
e dos civis, o enfermeiro sempre será o chefe da equipe de enfermagem
(atendentes, parteiras, auxiliares e técnicos de enfermagem):
[...] Só que eles [os Sargentos] gostavam de assumir algumas chefias... eles
assumiam... [mas] não podiam, porque agente era enfermeiro, mas faz parte...
hierarquia... é um negócio que não tem muito o que discutir. (E5)
De acordo com as prerrogativas legais da profissão, o enfermeiro será
sempre o líder da equipe de enfermagem. Cecílio (1999, p.317 e 318) ressalta que a
linha do poder na enfermagem é vertical, que vai do enfermeiro ao auxiliar de
Enfermagem. Por isso, o enfermeiro sempre assumirá as funções de chefia da
equipe de Enfermagem nas unidades.
Dentro de um hospital, a equipe de enfermagem caracteriza-se pelo maior
percentual de quadro de pessoal. Surge então a figura do enfermeiro que possui
tarefas diretamente relacionadas com sua atuação junto ao cliente, bem como a
liderança da equipe de enfermagem e o gerenciamento dos recursos – físicos,
materiais, humanos, financeiros, políticos e de informação – para a prestação da
assistência de enfermagem. Do enfermeiro é exigido conhecimento (que conheça o
que faz), habilidades (que faça corretamente) e tenha atitudes adequadas para
desempenhar seu papel objetivando resultados positivos. (CUNHA; NETO, 2006,
p.481)
Apesar dos Sargentos (do sexo feminino) do QFG e das oficias do QFO
integrarem o grupo mulheres militares concursadas pioneiras nos hospitais da FAB e
de possuíam praticamente a mesma idade, as enfermeiras do QFO, possuíam um
maior capital cultural, que era o diploma de graduação em enfermagem, e assim,
uma maior posição hierárquica, permitindo com que galgassem uma posição
privilegiada no campo. Entretanto, este fato inicialmente não foi bem aceito pelas
militares do QFG:
[...] Porque elas [os Sargentos do sexo feminino] também eram as primeiras
[mulheres militares dos hospitais da FAB], só que eu era chefia, então eu tinha que
me impor! (E2)
Se por um lado os homens do serviço de enfermagem não causaram muitas
resistências às oficiais enfermeiras, por outro, os Sargentos (do sexo feminino) do
QFG, também pioneiras, não aceitaram a idéia de serem comandadas por uma
mulher no campo militar masculino:
93
[...] Um dos Sargentos [do sexo feminino] me deu muito problema, porque além dela
ser mais velha que eu na idade, eu tinha 22 e ela devia ter uns 24, e já ter uma
experiência profissional, porque ela já vinha [de um hospital público de grande
porte], então ela colocou a mão na cintura e falou assim mesmo: “O que é que essa
menina vai fazer lá no hospital?” Assim mesmo! Eu morri de rir e disse: “Essa
menina não vai trabalhar sozinha não, eu só sei trabalhar em equipe, e você faz
parte da minha equipe”. Essa foi a minha resposta para ela! [...] (E2)
A atitude de enfrentamento das oficiais enfermeiras perante a equipe de
enfermagem, administrativamente e militarmente subalterna, nos permite observar
que as oficiais enfermeiras já tinham o habitus militar inculcado e reproduziram o
que aprenderam durante o Estágio de Adaptação, ou seja, o conhecimento de que
sem disciplina e hierarquia não há vida militar:
[...] A responsabilidade [pela equipe de enfermagem] era minha, a postura era muito
forte em relação ao uniforme, à apresentação pessoal e à forma de se portar [...]
(E2)
Tal fato garantiu a posição privilegiada das oficiais no campo e, detentoras de
poder hierárquico e capital cultural, conseguiram se firmar no campo da chefia de
enfermagem:
[...] Eu acho que agente conseguiu assumir o nosso lugar, mostrando que agente
não estava querendo brigar com ninguém. (E4)
Cabe ressaltar que antes da chegada das enfermeiras militares nos hospitais
da FAB, as enfermeiras civis já ocupavam a posição de chefe de enfermagem, pois
apesar de serem civis, eram as únicas profissionais que detinham do capital cultural
necessário por possuírem nível superior na especialidade. Assim, com a chegada
das oficiais:
Tinham as civis enfermeiras [...] agente chegou recém-formada, e os lugares que
elas ocupavam [eram as] chefias. Elas estavam quase para se aposentar e ficaram
subalternas a pessoas de vinte e poucos anos, sem experiência... tiveram alguns
problemas dentro do núcleo da enfermagem[...] (E5)
Diante de tal fato, as oficiais defendiam sua posição e em seu discurso
revelavam a forte presença do habitus militar em defesa da instituição:
[...] A enfermeira militar vai ter muito mais obrigações, muito mais funções do que a
enfermeira civil! A enfermeira civil ela não tem um vínculo muito forte com a
instituição porque ela vem aqui, faz o trabalho dela bem feito, mas ela é plantonista,
94
ela acaba o plantão ela vai embora! E agente não! Agente continua... Agente tem
que tomar conhecimento de todos os problemas do hospital, resolver... (E3)
As informações das entrevistadas são confirmadas por Castro (1990, p.46) ao
citar que nos cursos de formação militar, durante a inculcação do habitus militar, os
militares aprendem que são diferentes dos civis, também chamados de “paisanos”, e
não apenas diferente, mas também melhores, principalmente pelos fortes vínculos
que têm entre si e com a instituição.
Observa-se que, nos depoimentos, não existe o reconhecimento de seu poder
simbólico em relação às enfermeiras civis, o que reforça a existência do mesmo:
[...] Agente não veio para ocupar o lugar delas [das enfermeiras civis], ou tirar o lugar
delas! (E1)
No entanto as enfermeiras militares reconheceram a distância existente entre
elas e as enfermeiras civis que foi gerada pela posição privilegiada que ocuparam no
campo por terem adquirido o habitus militar:
Com as enfermeiras civis, algumas tratavam agente bem, mas elas se mantinham
distante da gente... Elas já estavam praticamente no final da carreira [...] (E1)
Verifica-se, portanto, um afastamento entre as enfermeiras civis e as
enfermeiras militares à medida em que as civis foram tendo consciência de classe.
Bourdieu (2007, p.189) cita que não é a condição de classe que determina o
indivíduo, mas o sujeito que se autodetermina a partir da tomada de consciência,
parcial ou total, da verdade objetiva de sua condição de classe.
Apesar das enfermeiras militares não reconheceram que vieram para ocupar
o lugar das enfermeiras civis, elas estavam dotadas de um grande poder simbólico
perante a equipe de enfermagem. Para Bourdieu (1989, p.14), o poder simbólico age
como o poder de construir o dado pela enunciação, de fazer ver e fazer crer, de
confirmar ou de transformar a visão do mundo e a ação sobre este. Trata-se de um
poder capaz de permitir a obtenção daquilo que equivale ao obtido pela força física
ou econômica. O autor também afirma que as relações de comunicação são, na
maioria das vezes, relações de poder, que podem inclusive permitir a acumulação
de poder simbólico.
95
Deste modo, a chegada das enfermeiras militares nos hospitais como chefes
forçou uma realocação das funções das enfermeiras civis, que perderam poder e
foram destinadas a executar funções de enfermeira diarista, atuando juntamente aos
profissionais de nível técnico na assistência direta ao paciente:
[...] Nós assumimos todas as chefias e elas [enfermeiras civis] foram para os
cuidados [de enfermagem]. Porque quando tem [enfermeira] militar, [as militares]
tem que ser as chefias, então [...] Todas [as militares] assumiram uma chefia e as
civis assumiram a assistência. (E5)
Assim, a perda de posição no campo para as enfermeiras militares evidencia
a violência simbólica sofrida pelas enfermeiras civis. Entretanto, essa violência
simbólica não foi iniciada pelas enfermeiras militares e sim desencadeada por um
ato da administração ao determinar a sobreposição de poderes do militar sobre o
civil.
Após alguns anos de convivência, as enfermeiras civis e as enfermeiras
militares conseguiram manter um ambiente harmônico nos ambientes de trabalho,
todavia, as enfermeiras militares jamais perderam sua posição perante a equipe de
enfermagem:
[...] Mas no final todos acabamos nos entrosando e tendo um bom relacionamento
profissional! (E3)
A mais poderosa luta ocorreu entre as enfermeiras e a própria administração
dos hospitais em que se inseriram. Quando chegaram aos hospitais militares, as
enfermeiras militares encontraram muitas dificuldades com a administração geral. Os
chefes gerais, que eram os homens médicos militares, não reconheceram a posição
ocupada pelas mulheres enfermeiras e interditaram a elas qualquer oportunidade de
agregar mais conhecimentos na área de administração hospitalar e da própria
enfermagem:
Tinha um curso que eu queria fazer de Qualidade Total e aí eu era mais antiga
[possuía maior grau hierárquico] que um Intendente, [...] Eu me inscrevi e o Major
que era o Intendente do curso [responsável pelo curso], tirou o meu nome o colocou
o do amigo dele, aí eu fui reclamar com o diretor, aí ele disse: “Não, nesse momento
não vai dar!” e eu fiquei muito chateada! Aquilo ali foi terrível. (E2)
Nós tivemos muitos cursos aqui dentro do hospital porque isso [fazer cursos fora da
unidade] foi até uma falha mesmo! Eu não sei se faltou experiência nossa! O
interesse até existia, mas agente acabou cansando porque agente pedia muito para
participar de congressos, fazer alguma coisa... E agente não tinha um bom retorno!
Sempre os médicos conseguiram ir para congressos, fazer cursos aqui e ali e
96
quando chegava na hora da enfermeira “Ah, não podia porque como é que vai ficar o
setor que você chefia?” E nós nunca fomos um número assim muito significativo, já
por isso aí! Por exemplo, eu nunca participei de um congresso! Participei de
congresso de enfermagem antes de entrar para a FAB! Depois eu não conseguia
mais! Não conseguia fazer nenhum curso assim muito voltado! As poucas colegas
que fizeram foi com muita dificuldade [...] (E3) (grifo nosso)
Uma falta de entendimento da direção [...] Você quer implantar algumas coisas que
não são aceitas, plano de cuidados de enfermagem... Pela Aeronáutica só [fiz]
cursinho de uma semana, mas Especialização, Mestrado... Não! Eu acho que nós
fomos prejudicadas por sermos as primeiras, agente ficou mais em evidência, se
fosse liberada todo mundo sabia onde estava indo, então era muito mais restrito [...]
Eu fui pedir para fazer um curso, uma Pós-graduação, e me disseram “Olha, em
horário de expediente, nem pensar!” Então era mais complicado, estudar à noite,
tudo à noite [...] (E5) (grifo nosso)
O fato da cúpula da administração hospitalar ser eminentemente masculina foi
o fator decisivo para a eclosão de lutas nesse campo. Bourdieu (1999, p.60) enfatiza
que a divisão sexual está inscrita na divisão das atividades produtivas a que nós
associamos a idéia de trabalho, e mais amplamente, na divisão do trabalho de
manutenção do capital social e do capital simbólico, que atribui aos homens o
monopólio de todas as atividades oficiais, públicas, de representação, e em
particular de todas as trocas de honras.
Observa-se que não era interessante para os homens permitir que as
mulheres pudessem galgar maiores lucros simbólicos, pois dessa forma, elas se
tornariam uma ameaça à hegemonia masculina. Bourdieu (1999, p.62) confirma esta
afirmação ao comentar que as mulheres são geralmente excluídas de todos os
lugares públicos em que se realizam jogos comumente considerados os mais sérios
da existência humana, que são os jogos de honra. Elas são excluídas em nome do
princípio da igualdade de honra, que exige que o desafio só seja válido se dirigido
por a um homem e principalmente a um homem “honrado”.
É interessante perceber que os depoimentos mostram que a mesma Força
Aérea Brasileira que inicialmente lançou diversas reportagens nos jornais sobre a
realização de um concurso para o ingresso de mulheres de diversas profissões para
se candidatarem, mostrando que a presença da mulher e da profissional era
importante para a instituição, aos poucos parece que desiste de vê-las ocupando o
mesmo espaço e, de certa forma cria estratégias para que as mesmas não
conseguissem agregar maior capital cultural, perpetuando a violência simbólica e a
sua posição de dominador no campo, detentor de um poder simbólico que o utiliza
principalmente quando se sente ameaçado.
97
Corroborando com a afirmação, Bourdieu (1996, p.29-30) cita que
historicamente, a dominação masculina não deixa de ser uma forma particular e
particularmente acabada de violência simbólica, evidenciando que divisões espaciais
entre espaços masculinos e femininos no trabalho e nos corpos são diferenciados,
permanecendo a dominação do masculino sobre o feminino.
O poder simbólico exercido pelos homens militares trouxe consigo a violência
simbólica que, de acordo com Bourdieu (1989, p.11-12), é caracterizada pelo autor
como a dominação de uma classe sobre a outra, reforçando a sua própria força que
a fundamenta, e contribuindo para a “domesticação dos dominados”.
Um dos fatores desencadeantes dessa violência simbólica também advinha
da questão da progressão hierárquica da carreira militar. Vale ressaltar que a
administração do hospital representava a autoridade máxima presente e era
composta basicamente por médicos militares que estavam em graus hierárquicos
superiores aos das enfermeiras.
No campo militar, os círculos hierárquicos e a distinção entre “liderança e
comando” são elementos que apontam para uma estrutura organizacional altamente
escalonada. Itens como medalhas, diplomas e cursos são expressões de um
elemento da hierarquia tão importante quanto suas patentes, que e o sistema de
classificação. (LEIRNER, 1997, p.84)
O sistema de classificação começa no primeiro dia da carreira do militar e
termina quando ele vai para a Reserva Remunerada, que é a inatividade. Pela
classificação do militar se define o que foi, o que é, e o que vai ser cada indivíduo
dentro da Força, e a partir dela se definem as trajetórias pessoais e como isso vale
para todos, constitui um parâmetro para os militares pensarem sobre si mesmos. A
classificação é uma espécie de pontuação na carreira militar onde são somadas as
notas e conceitos obtidos em cursos, medalhas, elogios e condecorações, assim
como dela se subtraem punições e repreensões, e tudo isso em conjunto forma o
mérito que o militar deve prosseguir na escala hierárquica. Além do mérito, o tempo
de serviço também é um elemento que possibilita a mobilidade na escala
hierárquica. (LEIRNER, 1997, p.84)
Ou seja, impedir o aprimoramento profissional das enfermeiras representava,
além de uma questão de gênero, uma questão de progressão profissional, pois
dessa forma, as mulheres militares não conseguiriam uma melhor posição na
98
carreira militar, já que estavam praticamente impedidas de manifestar um dos seus
principais valores militares, que é o aprimoramento técnico-profissional.
De acordo com o Estatuto dos Militares, são manifestações essenciais do
valor militar: o patriotismo, traduzido pela vontade inabalável de cumprir o dever
militar e pelo solene juramento de fidelidade à Pátria até com o sacrifício da própria
vida; o civismo e o culto das tradições históricas; a fé na missão elevada das Forças
Armadas; o espírito de corpo, orgulho do militar pela organização onde serve; o
amor à profissão das armas e o entusiasmo com que é exercida; e o aprimoramento
técnico-profissional. (BRASIL, 1980)
Os resultados das lutas simbólicas
As estratégias de luta das enfermeiras foram determinadas pela sua posição
no campo militar. Percebemos que as estratégias utilizadas por essas agentes foram
eficientes para a reconfiguração do serviço de enfermagem, onde elas passaram a
exercer maior poder.
No entanto, quando se defrontaram com os médicos militares assistenciais e
da administração geral, elas não conseguiram impor sua visão de mundo. Tal fato
culminou com o encerramento do QFO, em 1991 que era caracterizado pela
exclusividade de mulheres, estabilidade assegurada e progressão na carreira militar.
O QFO foi substituído pelo Quadro Complementar de Oficiais da Aeronáutica
(QCOA).
O QCOA tem como principais características a heterogeneidade de sexos,
grande diversidade de especialidades profissionais, o caráter temporário de
contratação não superior a 09 (nove) anos de serviço ativo, e a possibilidade de
galgar o posto máximo de Primeiro-Tenente.
Resumidamente, desde 1991, só há a contratação de enfermeiras
temporárias da FAB, diferente do que ocorre com médicos que possuem um Quadro
específico, o Quadro de Oficiais Médicos, cujas principais características são as
promoções periódicas de posto, heterogeneidade de sexos, estabilidade assegurada
e a possibilidade de galgar o penúltimo posto da FAB, que é o de Major-Brigadeiro.
A contratação temporária de enfermeiras para servirem à FAB e serem
substituídas a cada nove anos por outras enfermeiras justifica, em parte, a
ocorrência de todas as lutas simbólicas já descritas nesse estudo.
99
Hoje, as enfermeiras pioneiras do QFO galgam o posto máximo da carreira
previsto para o Quadro, que é o de Tenente-Coronel, e lamentam que as demais
enfermeiras do QCOA, apesar de realizarem exatamente as mesmas atividades que
as enfermeiras pioneiras realizavam, não poderão chegar ao mesmo posto, nem
usufruir da estabilidade:
Então o que eu espero é que continue a haver concursos para efetivar as
enfermeiras porque a minha tristeza nesse momento é sair como Tenente-Coronel e
deixar só as Tenentes, no caso, temporárias! E eu não acho justo! As Tenentes
[temporárias] têm uma experiência muito boa, têm formação muito boa,
especialização [...] Agente faz tudo muito rápido, agente elabora as coisas muito
rápido e isso é importante! Então a minha tristeza é isso! Eu creio que a FAB vai
mudar isso, vocês vão até Coronel, vai haver o Quadro de Apoio, eu acredito nisso!
Agente que abriu a porta e então agente não pode fechar as portas para nós! Eu abri
pra aviadoras, abri para médicas, dentistas... Todo mundo fica [estabilizado], e nós
[enfermeiras] não resolvemos? Eu já escrevi isso e já mandei por e-mail para as
autoridades. (E2)
[Sendo Oficial de carreira] Você vê mais dedicação, você veste a camisa, então você
se dedica mais, é importante! É uma pena que o [Quadro] da ativa acabou! Porque
não é a mesma coisa, com certeza você chegar achando que vai embora... Você vai
ter que procurar alguma coisa! E agente não! [...] Mas já estão revendo para voltar
isso [o Quadro de carreira], só que para chegar aonde agente chegou... Se entrar
hoje, vai ter um buraco aí [em relação às patentes] que eu não sei como é que vai
ficar, mas eu acho que vai fazer falta! (E4)
E mesmo assim hoje em dia só tem QCOA [Quadro temporário], não têm mais um
Quadro fixo [estabilizado], porque a idéia é que os enfermeiros têm que “dar” plantão
e quando você vai à Tenente-Coronel [você não “dá” plantão]... Então eles querem
resolver o problema de imediato [...] mas não é só na Aeronáutica não [...] (E5)
Bourdieu (1999, p.76) comenta que como conseqüência da dominação
masculina, o trabalho da mulher tende a permanecer invisível, o que é atestado pelo
fato de que as mulheres estão ainda muito comumente privadas do título hierárquico
correspondente à sua função real.
Bourdieu (1999, p.110 e 111) cita ainda que a melhor prova das incertezas
dos estatutos atribuídos às mulheres no mercado de trabalho reside no fato de que
elas são sempre menos remuneradas que os homens e mesmo quando todas as
coisas são em tudo iguais, elas obtêm cargos menos elevados com os mesmos
diplomas e, sobretudo são mais atingidas pelo desemprego, pela precariedade de
empregos e relegada com mais facilidade a cargos de trabalho parcial. Para
Bourdieu, estes fatos permitem prever que as mulheres serão as principais vítimas
da política neoliberal, no que tange a precarização do trabalho.
100
Reavaliando suas trajetórias na Força Aérea Brasileira, as enfermeiras
pioneiras do QFO mostram que apesar de não terem conseguido se firmar no campo
militar, obtiveram lucro na realização pessoal:
[...] Eu sempre gostei do que eu faço e aqui eu acho que agente aprendeu muito! [...]
Agente aprendeu muito! Muitas dificuldades... Eu gosto de ser militar, abracei a
carreira e tive facilidade de me adaptar [...] Eu gosto, estou terminando gostando!
(E1)
Privilégio! Então essa experiência foi boa para a família toda! Mas para os meus
filhos, para o desenvolvimento deles... Foi muito bom! Abre-se um leque de
possibilidades dentro dessa história da vida militar! (E2)
Para mim foi [uma experiência] muito positiva! [...] Então eu saio da Força Aérea
muito realizada. Realmente sem mágoa nenhuma! Estou muito bem! (E3)
Eu acho que a Aeronáutica deu tudo pra mim que eu tenho atualmente, até meu exmarido eu conheci na Aeronáutica, então foi positiva [...] Então eu acho que pra mim
foi bom, foi um sonho realizado! (E5)
Observamos ainda as influências do habitus militar e da dominação masculina
na vida privada dos sujeitos ao caracterizar do estado civil dos sujeitos do estudo na
data da realização da entrevista.
O fato de 80% das entrevistadas possuir o estado civil solteira e 20% ser
divorciada nos permite refletir sobre as inferências da formação militar, no que tange
à formação e do habitus militar na vida privada dos sujeitos do estudo.
Pode-se sugerir que a inculcação do habitus militar e a violência simbólica
sofrida por elas durante a vida militar interferiu na vida familiar dos sujeitos. E só é
possível compreender tal fato à medida que tentamos compreender a homologia
entre as estruturas das posições masculinas e das posições femininas nos
diferentes espaços sociais.
De acordo com Bourdieu (1999, p.126), a verdade das relações estruturais
de dominação sexual se deixa realmente entrever a partir do momento em que
observamos que as mulheres que atingiram os mais altos cargos (chefes,
diretoras...) têm que “pagar”, de certo modo, por este sucesso profissional com um
menor sucesso na ordem doméstica (divórcio, casamento tardio...).
Finalizo esta dissertação com uma justificativa, à luz de Bourdieu, para a
perpetuação das lutas nos hospitais da FAB até os dias de hoje. Segundo o autor,
uma vez instaurada a violência simbólica, é totalmente ilusório crer que ela pode ser
vencida apenas com as armas da consciência da vontade, pois os efeitos e as
101
condições que propiciam a dominação estão duradouramente inscritas nos corpos
sobre as formas de aptidões e inclinações.
Essas tendências se expressam e se vivenciam dentro da lógica do
sentimento ou do dever e mesmo quando as pressões externas são abolidas e as
liberdades formais são adquiridas, a auto-exclusão e a “vocação” vêm substituir a
exclusão expressa e conduz as mulheres a se excluírem. A dominação imprime
traços perduráveis nos corpos e os efeitos que ela exerce consiste em atribuir às
mulheres a responsabilidade de sua própria opressão. (BOURDIEU, 1999 p.51-52)
102
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A criação do Corpo Feminino da Reserva da Aeronáutica (CFRA), composto
pelo Quadro Feminino de Oficiais (QFO) e Quadro Feminino de Graduados (QFG),
proporcionou a oportunidade de mulheres com diversas formações profissionais,
ingressarem na Força Aérea Brasileira, por meio de concurso público federal.
O processo seletivo para ingresso no CFRA foi de âmbito nacional e aberto a
qualquer candidata do sexo feminino que satisfizesse aos requisitos previstos no
edital.
A divulgação do concurso ocorreu em diversos meios de comunicação,
demonstrando a transparência do processo seletivo e reafirmando seu caráter
público de candidatura.
No concurso de admissão com vistas à matrícula no Estágio de Adaptação,
as candidatas foram submetidas aos seguintes exames de caráter eliminatório:
conhecimentos especializados (prova de enfermagem), conhecimentos gerais (prova
de Estudos de Problemas Brasileiros e prova de Língua Portuguesa), exame
médico, exame de aptidão física e teste psicotécnico.
As candidatas enfermeiras selecionadas para a matrícula deveriam
apresentar o diploma da profissão, oficialmente reconhecido pela legislação federal
pertinente e registrado no Ministério da Educação e Cultura, e ainda a carteira do
registro em Conselho Regional. Esses requisitos evidenciam que as candidatas
deveriam ter um capital cultural específico, que era o curso superior em enfermagem
completo cursado em instituição de ensino reconhecida nacionalmente.
Os depoimentos das entrevistadas explicam claramente o porquê do concurso
ter sido muito disputado e almejado por diversas candidatas pelo Brasil. Aprovadas
nesse
processo
seletivo,
elas
galgariam
um
alto
status
profissional
e
conseqüentemente social e econômico, idêntico ao status galgado pelos homens
militares da época, ressaltando o prestígio exercido pelas Forças Armadas na
população em geral.
Além do status profissional, outros diversos fatores contribuíram para as
enfermeiras almejarem seguir a carreira militar, como a possibilidade de conhecer as
diversas regiões do Brasil, a excelente remuneração, a estabilidade financeira, a
clientela diferenciada, a aposentadoria com salário integral e principalmente a
103
possibilidade de progressão da carreira militar, que é determinada por promoções
periódicas de posto e conseqüentemente pela progressão profissional ao longo da
carreira.
O Estágio de Adaptação das enfermeiras, que foi o curso de formação militar,
ocorreu durante quatro meses sob o regime de semi-internato, e ocorreu no Centro
de Instrução Especializada da Aeronáutica (CIEAR), no Rio de Janeiro.
No início do Estágio foi distribuído o Manual da Aluna, que foi um importante
documento de porte obrigatório, contendo informações relevantes referentes a todas
as determinações e ordens em vigor. Uma das principais regras estabelecidas pelo
Manual era que todas as alunas deveriam manter conduta e apresentação pessoal
corretas, ser assídua e pontual, cumprir os regulamentos e normas, e cumprir com
as obrigações escolares.
O Estágio de Adaptação caracterizou-se pela inculcação da habitus militar
nas alunas pelas aulas teóricas e práticas de regulamentos, atividades militares e
instruções de condicionamento físico. O Estágio contou com diversas atividades
fundamentadas na responsabilidade, disciplina, hierarquia e organização, e
principalmente enfocando aspectos imprescindíveis de apresentação pessoal e
conduta das alunas.
Em alguns casos observou-se que algumas alunas já estavam habituadas
com um estilo de vida regrado por terem vivido experiências anteriores, tanto
familiares, quanto durante a formação do habitus profissional na Escola Anna Nery
(EAN). À época, a EAN era considerada altamente rígida na formação de suas
alunas, tanto no ensino da enfermagem quanto na formação ética e moral.
O ciclo de formação militar das alunas da primeira turma do QFO se encerrou
com a solenidade de formatura da turma, que ocorreu em 06 de dezembro de 1982
no CIEAR e foi marcada por diversos rituais como missa de ação de graças, honras
formandas e por fim o desfile militar.
As alunas aprovadas foram relacionadas em ordem decrescente das médias
finas obtidas, o que serviu de base para a determinação das respectivas
antiguidades e conseqüentemente para a escolha das localidades em que
desejassem servir.
Após a formatura, as Oficiais enfermeiras do foram designadas a
desempenhar
funções
compatíveis
com
profissionais em diversos hospitais pelo Brasil.
suas
habilitações
e
qualificações
104
A inserção das enfermeiras nos hospitais na FAB foi caracterizada por
algumas lutas simbólicas.
Durante o desenvolvimento das diversas funções e atribuições que
receberam, as enfermeiras iniciaram o aprendizado das especificidades de atuação
de uma enfermeira militar, adequando seus conhecimentos profissionais e militares
prévios nas atividades diárias.
A primeira luta das enfermeiras no campo hospitalar evidenciada nesse
estudo foi relacionada com os médicos militares, visto que, o relacionamento entre
médicos e enfermeiras no campo militar era considerado difícil. As enfermeiras
relataram que, ao ingressarem nos hospitais militares tiveram que se impor.
Apesar da boa receptividade pelos médicos, evidenciou-se que a presença
das mulheres ocupando o mesmo campo impôs aos agentes masculinos uma
mudança de atitudes no cotidiano hospitalar. A presença das mulheres forçou os
médicos militares a mudarem o modo de falar, de se comportar e até mesmo de
pensar, visto que agora eles deveriam conviver diariamente, no mesmo ambiente de
trabalho, com mulheres enfermeiras do mesmo círculo hierárquico.
As enfermeiras reconheciam suavemente que os médicos militares eram
machistas e lhes davam ordens que não davam aos homens com o mesmo nível
hierárquico delas, e o fato de exigirem obediência foi reconhecido pela enfermeira
como discriminação de gênero.
Entretanto,
apesar
das
evidentes
formas
de
violência
simbólica
desencadeadas por questões de gêneros, os desencontros entre médicos e
enfermeiras também deve ser considerado, já que é um tema amplamente estudado
e historicamente conhecido, decorrente das relações de poder existentes nos
ambientes hospitalares que é decorrente do poder de saber dos médicos, que lhes
permite confrontar a administração na luta pela defesa de seus interesses
profissionais.
O poder masculino agregado ao poder médico foi decisivo para que as
enfermeiras militares aceitassem o princípio da inferioridade e da exclusão da
mulher e, ainda hoje, as enfermeiras não compreendem a dominação imposta, e
apesar de tudo, a invasão de suas consciências pelo poder onipresente dos homens
as fazem pensar que a opressora é a própria mulher, possivelmente por diferenças
da patente militar.
105
A segunda luta no campo militar hospitalar vivenciada pelas enfermeiras
ocorreu entre elas e a equipe de enfermagem. A equipe de enfermagem encontrada
pelas enfermeiras militares ao chegarem nos hospitais, era composta por
enfermeiras civis, Sargentos (sexo masculino) com formação técnica em
Enfermagem, auxiliares de enfermagem civis, além de Soldados e Cabos com pouca
formação em enfermagem. Juntamente com as enfermeiras, chegaram também os
Sargentos (do sexo feminino) do QFG que possuíam curso técnico de enfermagem.
As enfermeiras militares encontraram a maioria das chefias sendo ocupadas
por Graduados ou pelas enfermeiras civis, o que foi imediatamente desfeito pelas
enfermeiras do QFO, pois o círculo de trabalhadores de enfermagem é bem
hierarquizado e o enfermeiro será sempre o líder da equipe de enfermagem e
assumirá as funções de chefia da equipe de enfermagem nas unidades.
Apesar dos Sargentos (do sexo feminino) do QFG e as oficias do QFO
integrarem o grupo mulheres militares concursadas pioneiras nos hospitais da FAB e
de possuírem praticamente a mesma idade, as enfermeiras do QFO, possuíam um
maior capital cultural, que era o diploma de graduação em enfermagem e uma maior
posição hierárquica, de Oficial, permitindo com que galgassem uma posição
privilegiada no campo, e este fato inicialmente não foi bem aceito pelas militares do
QFG que não aceitaram a idéia de serem comandadas por uma mulher no campo
militar masculino.
A atitude de enfrentamento das enfermeiras do QFO perante a equipe de
enfermagem, administrativamente e militarmente subalterna, nos permite observar
que as enfermeiras já tinham o habitus militar inculcado e reproduziram o que
aprenderam durante o Estágio de Adaptação, garantindo sua posição privilegiada no
campo.
A terceira luta vivenciada pelas enfermeiras ocorreu entre as enfermeiras
militares e as enfermeiras civis, que antes da chegada das enfermeiras militares,
eram as chefes dos serviços enfermagem.
Apesar das enfermeiras militares não reconheceram que vieram para ocupar
o lugar das enfermeiras civis, elas estavam dotadas de um grande poder simbólico
perante toda a equipe de enfermagem, forçando a realocação das funções das
enfermeiras civis que perderam poder e posição, ao serem destinadas à execução
de funções de enfermeira diarista, atuando com os profissionais de nível técnico na
106
assistência direta ao paciente, evidenciando uma violência simbólica sobre as
enfermeiras civis.
Após alguns anos de convivência, as enfermeiras do QFO conseguiram
manter um ambiente harmônico nos ambientes de trabalho com a equipe de
enfermagem, e jamais perderam sua posição de chefe.
A quarta e última luta ocorreu entre as enfermeiras e a própria administração
dos hospitais em que se inseriram. Os agentes dominadores, que eram os chefes
gerais, caracterizados pelos médicos militares que galgavam graus hierárquicos
superiores aos das enfermeiras sentiram-se incomodados com a posição ocupada
pelas mulheres, e utilizaram-se do poder simbólico que detinham para negar,
mesmo que inconscientemente, toda e qualquer atividade que promovesse a elas,
qualquer tipo crescimento profissional ou vantagem.
O fato da cúpula da administração hospitalar ser eminentemente masculina foi
o fator decisivo para a eclosão de lutas nesse campo. Observa-se que não era
interessante para os homens permitir que as mulheres pudessem galgar maiores
lucros simbólicos, pois dessa forma, elas se tornariam uma ameaça à hegemonia
masculina.
Ou seja, impedir o aprimoramento profissional das enfermeiras representava,
além de uma questão de gênero, uma questão de progressão profissional.
O QFO foi extinto em 1991 e substituído pelo Quadro Complementar de
Oficiais da Aeronáutica (QCOA), cuja principal características é o caráter temporário
de contratação não superior à 09 (nove) anos de serviço ativo, e a possibilidade de
galgar o posto máximo de Primeiro-Tenente.
A violência simbólica sofrida pela enfermeira, chefe e militar foi um fator
extremamente relevante e decisivo para o término do QFO. Entretanto, fatores
relacionados às próprias enfermeiras, também foram decisivos, pois as enfermeiras
militares pioneiras da FAB não se uniram pela permanência do Quadro para
enfermeiras ou em prol do seu próprio aprimoramento profissional.
Avaliando o cenário da enfermagem militar no Brasil, é possível observar que
a enfermagem militar da FAB não perdeu posição só no campo dos hospitais, mas
também no espaço das Forças Armadas brasileiras.
Hoje, a Força Aérea Brasileira, a maior Força Aérea da América Latina em
contingente, número de aviões e poder de fogo, possuidora da missão de “Manter a
soberania do espaço aéreo nacional com vistas à defesa da Pátria”, é a única Força
107
Armada do Brasil cuja contratação de enfermeiras, desde 1991, é de caráter
exclusivamente temporário, fato este que ratifica o resultado das lutas simbólicas
das enfermeiras do QFO.
108
REFERÊNCIAS
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111
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Adaptação e ingresso no Quadro Feminino de Oficiais da Reserva da Aeronáutica e
dá outras providências. Boletim do Ministério da Aeronáutica, Brasília, DF, n.11312, 31 dez. p.87-91.1981c.
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116
APÊNDICE A- Carta de solicitação de autorização à Diretoria de Saúde da
Aeronáutica
*Obs: O título e os objetivos dessa dissertação foram mudificados pelos pareceristas durante o Exame de Qualificação, que
ocorreu em 16 de novembro de 2009, na Faculdade de Enfermagem da UERJ.
117
APÊNDICE B – Roteiro de entrevista
IDENTIFICAÇÃO
NOME COMPLETO
IDADE
ESTADO CIVIL
NATURALIDADE
ATIVA OU RESERVA (DATA)
FORMAÇÃO PROFISSIONAL
FACULDADE DA GRADUAÇÃO/CIDADE
ANO DE FORMATURA
POR QUE A SENHORA RESOLVEU FAZER ENFERMAGEM?
A SENHORA TEVE ALGUM EMPREGO ANTES DE INGRESSAR NA FAB?
SELEÇÃO INICIAL
COMO FICOU SABENDO DO CONCURSO?
O QUE ERA OBRIGATÓRIO PARA CONCORRER ÀS VAGAS DO QFO?
QUAIS AS PROFISSÕES QUE ESTAVAM PREVISTAS NO EDITAL?
QUANTAS VAGAS FORAM OFERECIDAS NO CONCURSO PARA
ENFERMAGEM?
QUANTAS CANDIDATAS?
QUAIS FORAM AS RAZÕES E MOTIVAÇÕES QUE LEVARAM A SENHORA
A CONCORRER A UMA VAGA PARA ENFERMAGEM NO QUADRO
FEMININO DE OFICIAIS?
COMO A SENHORA VIVENCIOU A APROVAÇÃO NO CONCURSO?
COMO A SUA FAMÍLIA REAGIU A SUA INTENÇÃO DE REALIZAR O
CURSO, A SUA APROVAÇÃO E A SUA DECISÃO DE ENTRAR NESSE
QUADRO?
ESTÁGIO DE ADAPTAÇÃO
ONDE O CURSO FOI REALIZADO?
QUANTO TEMPO DUROU O CURSO?
COMO ERA DESENVOLVIDO O CURSO DE FORMAÇÃO MILITAR
(HORÁRIOS, INSTRUÇÕES, LIBERAÇÕES)?
QUANTAS ENFERMEIRAS FIZERAM O CURSO?
DURANTE O ESTÁGIO DE ADAPTAÇÃO, O FARDAMENTO FOI RECEBIDO
GRATUITAMENTE OU FOI FORNECIDO AUXÍLIO- FARDAMENTO?
QUEM ERAM OS INTRUTORES?
COMO OS INSTRUTORES (CIVIS OU MILITARES, HOMENS OU
MULHERES) SE COMPORTAVAM PERANTE A TURMA?
HAVIA ALGUMA ESPECIFICIDADE NO CURSO COM RELAÇÃO AO
TRATAMENTO DISPENSADO ÀS ENFERMEIRAS?
118
COMO A SENHORA VIVENCIOU A EXPERIÊNCIA DE ESTAR
REALIZANDO UM CURSO PARA SE TORNAR ENFERMEIRA MILITAR?
O CURSO DE FORMAÇÃO MILITAR FOI MUITO DIFERENTE EM
RELAÇÃO
A
OUTRAS
EXPERIÊNCIAS
RELACIONADAS
À
ENFERMAGEM?
HOUVE ALGUM CURSO DA ÁREA DE ENFERMAGEM DURANTE O
CURSO DE FORMAÇÃO?
COMO A SENHORA VIVENCIOU A DISCIPLINA E A HIERARQUIA MILITAR
DURANTE O CURSO?
QUAL A AVALIAÇÃO DO CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DO CURSO?
HAVIA REMUNERAÇÃO DURANTE O CURSO DE FORMAÇÃO? QUAL
ERA O VALOR?
O QUE REPRESENTOU PARA A SENHORA O DESFILE MILITAR NO RIO
DE JANEIRO NO DIA 07 DE SETEMBRO DE 1982?
FORMATURA
QUANTAS ENFERMEIRAS SE FORMARAM (CONCLUIRAM O CURSO)?
O QUE A FORMATURA REPRESENTOU PARA A SENHORA?
COMO SUA FAMÍLIA PERCEBEU A FORMATURA?
A FORMATURA ATINGIU REPERCUSSÃO NACIONAL?
COMO SE DEU A LOTAÇÃO PARA AS ORGANIZAÇÕES MILITARES?
INSERÇÃO NOS HOSPITAIS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA
EM QUAL ORGANIZAÇÃO DE SAÚDE A SENHORA FOI DESIGNADA A
SERVIR?
QUAL ERA O HORÁRIO DE TRABALHO? ELE ERA DIFERENCIADO DE
OUTROS PROFISSIONAIS?
QUAIS FORAM AS FUNÇÕES E ATRIBUIÇÕES QUE FORAM
DESIGNADAS À SENHORA?
A SENHORA ASSUMIU A FUNÇÃO DE ALGUM OUTRO PROFISSIONAL
COM A SUA CHEGADA?
COMO A SENHORA SE SENTIA DESENVOLVENDO ESSAS NOVAS
FUNÇÕES E ATRIBUIÇÕES?
SENDO ENFERMEIRA MILITAR, A SENHORA RECEBEU ATRIBUIÇÕES
DIVERSAS OU ESCALAS RELACIONADAS AO MILITARISMO E À
ENFERMAGEM?
COMO A SENHORA SE VIA COMO UMA DAS POUCAS MULHERES
MILITARES (SENÃO A ÚNICA) NA ORGANIZAÇÃO MILITAR EM QUE FOI
SERVIR?
QUAL FOI A RECEPTIVIDADE NO LOCAL DE TRABALHO (MÉDICOS
MILITARES E EQUIPE DE ENFERMAGEM)?
A SENHORA SOFREU ALGUM TIPO DE DISCRIMINAÇÃO AO INSERIR-SE
NA FAB?
A SENHORA RECEBIA ALGUM TIPO DE BENEFÍCIO POR SER
ENFERMEIRA MILITAR, OU APENAS POR SER MULHER?
119
QUAL ERA O UNIFORME PRINCIPAL DE TRABALHO?
QUANTOS UNIFORMES ERAM UTILIZADOS?
QUAIS ERAM AS SITUAÇÕES QUE PREVIAM O USO DE CADA
UNIFORME?
COMO A SENHORA SE VIA VESTIDA DE UNIFORME?
COMO ERA A PROPORÇÃO ENTRE O VALOR DO SALÁRIO PAGO E O
SALÁRIO MÍNIMO À ÉPOCA?
QUAL ERA A RELAÇÃO ENTRE O SALÁRIO DA ENFERMEIRA MILITAR E
O SALARIO DE UMA ENFERMEIRA CIVIL À ÉPOCA?
QUAL ERA A DIFERENÇA ENTRE AS FUNÇÕES E ATRIBUIÇÕES DE UMA
ENFERMEIRA CIVIL E DE UMA ENFERMEIRA MILITAR À ÉPOCA?
ONDE ERAM FEITAS AS REFEIÇÕES?
QUAIS CURSOS RELEVANTES A SENHORA JÁ FEZ DEPOIS DE SE
TORNAR ENFERMEIRA MILITAR?
A SENHORA APLICOU NA FORÇA AÉREA O CONTEÚDO APRENDIDO
COMO ENFERMEIRA MILITAR NO CURSO DE FORMAÇÃO?
A PORTARIA Nº 1.114/GM6 DE 04 DE OUTUBRO DE 1982, QUE APROVOU
AS NORMAS COMPLEMENTARES DE CONDUTA ÉTICO-MILITAR, DE
APRESENTAÇÃO PESSOAL E EM ATIVIDADES SOCIAIS E O USO DE
ADORNOS POR PARTE DAS MILITARES DO CORPO FEMININO DA
RESERVA DA AERONÁUTICA ERA FIELMENTE SEGUIDA NOS LOCAIS
DE TRABALHO?
EM QUANTAS ORGANIZAÇÕES MILITARES A SENHORA JÁ SERVIU ATÉ
HOJE?
-FAÇA UMA AVALIAÇÃO GERAL DE SUA TRAJETÓRIA COMO ENFERMEIRA
MILITAR DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA
-SE CONSIDERAR NECESSÁRIO, FAÇA QUALQUER OUTRA COLOCAÇÃO
120
APÊNDICE C- Termo de consentimento livre e esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
CENTRO BIOMÉDICO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM-MESTRADO
COMITÊ DE ÉTICA E PESQUISA
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
A senhora está sendo convidada para participar da pesquisa referente ao meu projeto de Mestrado em
Enfermagem pela Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro intitulado “Mulheres,
Chefes e Militares: A inserção da Enfermeira na Força Aérea Brasileira”. Trata-se de um estudo históricosocial com tem como objetivos: descrever as razões e motivações que levaram as candidatas enfermeiras a
participarem do processo seletivo para ingresso no Quadro Feminino de Oficiais da Aeronáutica, analisar
as estratégias utilizadas pelas enfermeiras para cumprirem às exigências do curso de formação militar, e
discutir a inserção das enfermeiras nos hospitais da Força Aérea Brasileira.
A sua participação é voluntária, isto é, a qualquer momento a senhora pode recusar-se a responder
qualquer pergunta ou desistir de participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo
em sua relação com o pesquisador ou com a instituição Comando da Aeronáutica.
Sua participação nesta pesquisa consistirá em responder verbalmente as perguntas que serão feitas.
Seu depoimento será gravado em gravador portátil e armazenado no formato Mp3. Caso seja autorizado pela
senhora, o depoimento será posteriormente doado para do Centro de Documentação da Escola de Enfermagem
Anna Nery (UFRJ), Centro de Memória Nalva Pereira Caldas da Faculdade de Enfermagem da UERJ e ao
Laboratório de Pesquisa em História da Enfermagem da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade
do Rio de Janeiro (UNI-RIO).
Não há riscos relacionados com sua participação. Os benefícios relacionados com a sua participação
são as contribuições para a construção da memória da História da Enfermagem Brasileira.
A senhora receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço da pesquisadora,
podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento.
_________________________
LILIAN SILVA DE FRANÇA
Pesquisadora principal: Lílian Silva de França
1°Ten QCOA Enf / OM: Base Aérea de Santa Cruz / COREN-RJ 125470
Tel: (21)30780376
[email protected]
CEP: 23555-024
Orientadora: Prof ª Dr ª Jane Márcia Progianti
[email protected]
Rio de Janeiro, ___de_____________de 200__.
Declaro estar ciente do inteiro teor deste TERMO DE CONSENTIMENTO e estou de acordo em
participar do estudo proposto, sabendo que dele poderei desistir a qualquer momento, sem sofrer
qualquer tipo de punição ou constrangimento.
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
*Obs: O título e os objetivos dessa dissertação foram modificados pelos pareceristas durante o Exame de Qualificação, que
ocorreu em 16 de novembro de 2009, na Faculdade de Enfermagem da UERJ.
121
APÊNDICE D- Termo de doação de depoimento oral
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO BIOMÉDICO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM-MESTRADO
TERMO DE DOAÇÃO DE DEPOIMENTO
PROJETO DE PESQUISA: “Mulheres, Chefes e Militares: A inserção da
Enfermeira na Força Aérea Brasileira”.
AUTORA: Lílian Silva de França- Mestranda da Faculdade de Enfermagem
da UERJ
Tendo prestado depoimento para esta pesquisa que tem como objeto o
processo de inserção de enfermeiras como oficiais na Força Aérea Brasileira,
autorizo a mestranda da Faculdade de Enfermagem da UERJ, Lilian Silva de
França, a divulgar e arquivar as gravações do meu depoimento no Centro de
Memória Nalva Pereira Caldas da Faculdade de Enfermagem da UERJ.
__________________, _____de_____________de 200__.
_________________________________
Assinatura do Depoente
_________________________________
Assinatura da Pesquisadora
*Obs: O título dessa dissertação foi modificado pelos pareceristas durante o Exame de Qualificação, que ocorreu em 16 de
novembro de 2009, na Faculdade de Enfermagem da UERJ.
122
ANEXO A- Carta de autorização da Diretoria da Saúde da Aeronáutica
123
ANEXO B - Carta de aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa
*Obs: O título dessa dissertação foi modificadoo pelos pareceristas durante o Exame de Qualificação, que ocorreu em 16 de
novembro de 2009, na Faculdade de Enfermagem da UERJ.
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Universidade do Estado do Rio de Janeiro Centro Biomédico