Desenvolvimento de um projeto de brinquedo – a relevância de um brinquedo para o desenvolvimento
infantil
Projeto de produto para o desenvolvimento da criança:
um estudo de caso
Product design for the development of the child: a case study
Smania, Elisa Albino; graduada; Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de
Santa Catarina
[email protected]
Biava, Lurdete Cadorin; Ms; Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa
Catarina
[email protected]
Neves, Carla Arcoverde de Aguiar; Ms; Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
de Santa Catarina
[email protected]
Resumo
O presente artigo elucida a contribuição que os produtos podem oferecer ao desenvolvimento
das crianças como indivíduos, bem como etapas julgadas pertinentes à concepção de um
projeto de produto sob o mesmo enfoque. Discorre sobre um estudo realizado numa linha de
produtos proposta no Trabalho de Conclusão de Curso do Curso Superior de Tecnologia em
Design de Produto do Instituto Federal de Santa Catarina, que teve como subsídio a teoria do
desenvolvimento infantil e da aprendizagem e o design de produto para crianças. Os
resultados do estudo mostram que o projeto contribui com o desenvolvimento infantil.
Palavras Chave: desenvolvimento infantil; brinquedo; design de produto.
Abstract
This article aims to show the contribution that products can offer to the development of
children as individuals, as well as relevant steps to the conception process of a product
design under the same focus. In addition to it, the article discusses a study realized in a
product line offered in the Graduation’s Final Work in the course of Product Design of the
Instituto Federal de Santa Catarina, which had focus on the theory of child development and
learning and product design for children. The study results show that the project contributes
to child development.
Keywords: child development; toys; product design.
9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design
Desenvolvimento de um projeto de brinquedo – a relevância de um brinquedo para o desenvolvimento
infantil
1 Introdução
Os produtos infantis encontrados no mercado nem sempre contribuem para o
desenvolvimento dos indivíduos na fase da infância. As crianças possuem carências em nível
fisiológico (como alimentar-se, vestir-se e dormir) e psicológico (como brincar, aprender,
criar, imaginar e sociabilizar). Para que tenham um desenvolvimento saudável, em resumo, é
preciso ter essas necessidades atendidas. Os produtos infantis podem atender muitas dessas
necessidades, desde que sejam pensados com esse fim ao serem projetados. O presente artigo
visa mostrar, assim, como um produto para criança pode ser pensado, atendendo tanto as
necessidades da empresa, quanto as do consumidor e, principalmente, as do usuário,
auxiliando-o no seu desenvolvimento em âmbitos pessoais. Vale-se, para isso, do estudo de
caso da linha de produtos infantis “Amigo”, desenvolvida como Trabalho de Conclusão do
Curso Superior de Tecnologia em Design de Produto do Instituto Federal de Santa Catarina,
desenvolvido em 2009/2.
Contempla na sua estrutura uma breve abordagem teórica que subsidia o estudo, uma
descrição do objeto do estudo de caso, que envolve o estudo do público alvo e a definição dos
requisitos do projeto, e o estudo propriamente dito.
2 O brinquedo e o brincar como necessidades da criança
Rudolf Steiner, criador da pedagogia Waldorf, acreditava que o conteúdo principal da
vida pré-escolar era o brincar, pois, à medida que a criança cresce, os jogos e os passatempos
transformam-se em atividades apenas para horas de lazer. Por isso é fundamental que na
infância exista um tempo exclusivo para as brincadeiras. Para as crianças, brincar é algo sério,
que lhes permite usar da fantasia e imaginação para dar vida a todos os impulsos que elas têm
(tanto físicos quanto psicológicos) (LANZ, 1979). Rudolf Lanz (1979), em seu livro sobre
Steiner e o sistema Waldorf, afirma que a escolha de um bom brinquedo depende da idade de
quem vai usar e do quanto ele vai auxiliar a desenvolver a criatividade e a fantasia. Para tanto,
deve-se recorrer àqueles que incentivam a imaginação da criança e o seu uso de forma livre e
evitar aqueles que já vêm prontos e que limitam a sua participação.
Deve ser um incentivo, e não um produto acabado. A criança em idade pré-escolar
quer criar seu pequeno mundo de imitações; seus brinquedos deveriam ser tão
simples que se prestasse à transformação imaginativa: alguns blocos de madeira
que possam ser veículos, casas ou móveis; uma boneca de pano, fofinha, com uns
traços de lápis de cor indicando o rosto; [...] – eis algumas sugestões. (LANZ,
1979, p.129)
Importante, ainda, para a vivência das crianças é o desenvolvimento de aspectos
individuais relativos ao corpo, como o seu domínio, equilíbrio e a habilidade manual.
Brinquedos e atividades que possibilitem tais progressos devem constar no período da
infância, pois é a partir do domínio do seu próprio corpo e gestos que a criança começa a
adquirir autonomia.
Vygotsky, teórico da aprendizagem infantil, também considera os brinquedos
fundamentais para a infância e explica que eles são um meio de expressão das crianças. Por
meio dos brinquedos, elas conseguem mostrar um pouco do que se passa no seu interior, suas
vontades e motivações. Muitas vezes elementos quaisquer passam a desempenhar um papel
diferente de sua função principal como produto, ganhando novas configurações, graças à
imaginação infantil.
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A criança poderá utilizar materiais que servirão para representar uma realidade
ausente, por exemplo, uma vareta de madeira como uma espada, um boneco como
filho no jogo de casinha, papéis cortados como dinheiro para ser usado na
brincadeira de lojinha etc. Nesses casos ela será capaz de imaginar, abstrair as
características dos objetos reais (o boneco, a vareta e os pedaços de papel) e se
deter no significado definido pela brincadeira. (REGO, 1994, p.82)
Ferramentas para lavoura, utensílios domésticos ou outros objetos utilizados para
trabalhos caseiros, por exemplo, são também uma boa opção de brinquedo por referirem-se ao
mundo adulto, gerando, assim, proximidade das crianças com o seu futuro universo,
auxiliando-as a compreendê-lo e sentirem-se seguras quanto a ele.
Vygotsky prepondera que o brinquedo aproxima a criança do mundo que ela sonha.
Quando imagina ser motorista de ônibus, cozinheira, médica, utiliza brinquedos ou materiais
que ela própria transforma em brinquedos (apenas utilizando a criatividade e a imaginação) e
que, caso realizasse de verdade, isso traria uma série de riscos porque ela não domina a
maioria das funções adultas.
A criança quer, ela mesma, guiar o carro; ela quer remar o barco sozinha, mas não
pode agir assim, e não pode principalmente porque ainda não dominou e não pode
dominar as operações exigidas pelas condições objetivas reais da ação dada.
(LEONTIEV, 1998, apud REGO, 1994, p.82)
No campo do design, Bruno Munari (2008) também se manifestou a respeito dos
objetivos de um projeto para crianças, informando que “um outro modo de projetar um jogo
ou brinquedo é pensar em algo que seja útil ao crescimento individual, sem esquecer
naturalmente o justo lucro da empresa” (MUNARI, 2008, p. 236). Ele acreditava que
desenvolver produtos infantis é mais complexo do que se imagina pelo fato de que não há
como desprezar as possíveis consequências que o uso do objeto pode trazer.
A pergunta então é: o que pode ser útil ao crescimento do indivíduo em formação
que é a criança? Algo que lhe dê, através do jogo, informações que lhe possam
servir quando for adulto. Sabemos que aquilo que uma criança de tenra idade
memoriza permanecerá para toda a sua vida. É por isso que podemos ajudar a criar
indivíduos criativos e não repetitivos, indivíduos com uma mentalidade elástica e
pronta a resolver todos os problemas que alguém pode ter na vida: desde encontrar
um emprego até projetar sua própria casa ou educar os filhos. (MUNARI, 2008, p.
236)
Além dos fatores já descritos, existem outros que são fundamentais para o
desenvolvimento de produtos infantis, como o cumprimento de normas específicas (que
evitem riscos para o usuário), a atratividade para o público (que deve condizer à faixa etária
que se quer atrair) e o manuseio fácil.
[...] o projetista deve ser capaz de projetar um jogo ou brinquedo que seja fácil de
entender e simples de usar, que efetivamente comunique o que se pretende, que
seja divertido e agradavelmente colorido (nunca banal, pois a banalidade não faz
aumentar o conhecimento), que não seja tóxico e que, por fim, os próprios adultos
possam entender. O jogo ou brinquedo deve estimular a imaginação, e não vir
pronto ou acabado (como acontece com algumas miniaturas perfeitas de
automóveis), pois isso limita a participação da criança. (MUNARI, 2008, p.242)
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A última etapa do desenvolvimento de produtos infantis seria “educar” os adultos para
que estimulem a criança a escolher seus brinquedos, em vez de comprarem para elas aquilo
que lhes agrada, bem como deixar que elas brinquem da forma que julgarem certo. Munari
(2008, p. 239) diz que “não é necessário ‘explicar’ às crianças como se brinca. Serão elas
depois que ensinarão isso aos adultos que não o compreenderam devido ao excesso de
cultura.”
Por fim, conclui-se que o brincar é essencial para a criança, uma vez que ela se
envolve com a atividade a ponto de deixar a imaginação fluir, sem limites. Assim, ela
estimula sua fantasia e criatividade, itens tão importantes para um indivíduo adulto que
necessitará buscar em seu repertório recursos para auxiliar e facilitar a sua relação com o
mundo. Um produto pode, portanto, sanar as carências do usuário (fisiológicas e
psicológicas), possuindo uma função (que supra uma necessidade fisiológica) e outra que
estimule aspectos psicológicos, o que o tornaria mais completo e apto a satisfazer a criança.
Em se tratando de crianças, pode-se concluir que o conhecimento de design, da teoria
da aprendizagem e da pedagogia Waldorf permite o desenvolvimento de um produto que
apresente um diferencial, que traga reconhecimento à empresa que irá comercializá-lo e que
entretenha de forma educativa o usuário.
Para o desenvolvimento de um brinquedo, então, compreendendo-se a relevância que
esse produto apresenta para o desenvolvimento de uma criança, torna-se fundamental definir a
faixa etária desse público-alvo, assim como estudar seu comportamento, interesse e
necessidades.
3 O projeto e a linha de produtos “Amigo”
Como Trabalho de Conclusão de Curso do Curso Superior de Tecnologia em Design
de Produto do Instituto Federal de Santa Catarina, desenvolvido em 2009/2 e intitulado
“Linha Fantasia: uma forma amiga de presentear”, foi concebida uma linha de produtos para
atender ao público infantil, ainda pouco explorado pela empresa parceira do projeto.
A linha compõe-se de diferentes produtos, destinados a crianças entre quatro e sete
anos de idade, dentre eles a linha de produtos “Amigo”, objeto deste estudo. Trata-se de um
conceito de travesseiro-brinquedo, que se compõe de duas partes: a fronha e um kit de
personagem à escolha do consumidor ou usuário.
Chegou-se ao conceito fantasia e ao travesseiro “Amigo” a partir de um processo em
que o estudo do público alvo e a definição dos requisitos de projetos foram determinantes.
3.1 O estudo do público-alvo
Dentro do nicho infantil, podem ser abordadas diversas idades. E cada idade possui
estímulos a serem oferecidos e evitados. Quanto menor for a delimitação da faixa etária do
público-alvo, mais viável será a satisfação das carências desses indivíduos. Por isso, foi
importante definir para o projeto “Fantasia” a faixa etária do público-alvo: quatro a sete anos
de idade.
De acordo com Mont’Alvão e Damazio (2008, p. 122), é essencial desenvolver
pesquisas de campo que possam comprovar comportamentos, carências, desejos, suspeitas de
um determinado nicho que se queira atender.
A fim de se estabelecer conhecimento resultante de procedimentos confiáveis e
rigorosos nessa nova área do design, é crucial que os dados sejam coletados a partir
da observação de processos interativos. A identificação da dimensão emocional do
produto deve estar alicerçada na observação de como as pessoas, de fato, interagem
com produtos. (MONT’ALVÃO; DAMAZIO, 2008, p. 122),
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Antonio Carlos Gil (2002) aponta como Estudo de Campo aquele que é caracterizado
pela análise de um grupo de pessoas a partir da observação dos mesmos, podendo ou não
haver registros em vídeo ou imagem. No caso deste estudo, tratando-se do desenvolvimento
de produtos para o público infantil, a pesquisa é ainda mais delicada porque, geralmente, a
comunicação da criança ainda está em processo de desenvolvimento, o que nem sempre torna
simples o entendimento daquilo que ela quer expressar. Estimou-se, então, a técnica da
observação como uma alternativa interessante para se obter respostas mais fidedignas acerca
do público infantil.
Com o objetivo de comprovar a conformidade das situações estudadas, bem como o
comportamento das crianças, seus interesses e necessidades, foram estipulados espaços para
os estudos de campo. Alguns locais, apontados como interessantes para serem extraídas
informações do público infantil, foram lojas da própria empresa parceira, lojas de produtos
infantis e escolas.
No caso do projeto aqui em estudo, a pesquisa nas lojas da empresa, para a qual seria
desenvolvido o produto infantil, foi importante para verificar que já existia, por parte de seus
clientes, a procura por produtos para crianças, tornando, assim, a continuação do projeto mais
palpável. Por outro lado, a pesquisa em lojas de produtos infantis pode contribuir para se
observar de que forma os produtos do mercado visam sanar as carências do público infantil, e
as pesquisas nas escolas mostraram um pouco da realidade enfrentada pela criança, seu
comportamento, suas atitudes, além de contribuírem imensamente para que o projeto
mantivesse o foco no desenvolvimento da criança.
Este estudo foi determinante para a definição dos requisitos de projeto, descritos a
seguir.
3.2 Definição dos requisitos de projeto
Dos dados da pesquisa de campo, foram abstraídos os requisitos de projeto, com os
quais foi elaborado um quadro (Quadro 1) para facilitar a síntese e a visualização dos
mesmos, fundamentais para compreender as características que os produtos devem conter
para garantir a satisfação dos clientes de projeto: empresa, consumidor e usuário e, então,
aplicá-los durante a geração de alternativas na fase de desenvolvimento do produto.
Quadro de requisitos do projeto
ATENDER
À EMPRESA
IMPLICAÇÕES PARA O
PROJETO
REQUISITOS DE PROJETO
Adequar-se à identidade
lúdica e divertida da
empresa.
Aplicar cores variadas, utilizar
formas orgânicas.
Adequar-se aos processos de
fabricação, aos materiais e
aos fornecedores da
empresa.
Desenvolver produtos de baixo
custo e boa qualidade.
Permitir que o produto
AO
aproxime o consumidor
CONSUMIDOR (família da criança) do
usuário (criança).
Adequar os produtos às
necessidades do público infantil,
práticas, estéticas e de
desenvolvimento pessoal.
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Atender às necessidades
fisiológicas do usuário
Auxiliar na alimentação (prato,
talheres, copo, xícara, pires,
babador, fralda e mamadeira) e no
descanso (fronha, lençol e
almofada).
Ser seguro – não apresentar
quinas, pontas, rebarbas.
Apresentar cores, formas e
grafismos lúdicos.
AO USUÁRIO
Atender às necessidades
psicológicas do usuário,
utilizando-se estudos de
design, da teoria da
aprendizagem e da
pedagogia Waldorf.
Auxiliar o desenvolvimento da
imaginação, da criatividade e da
fantasia:
 ser versátil: permitir diversas
configurações;
 ser interativo: estimular a
criatividade e a expressão,
propondo atividades além da
função principal do produto;
 utilizar bonecos (as), histórias
e contos, castelos, fantasias de
vestir, fantoches e dedoches.
Quadro 1- Requisitos de projeto
Para o estudo aqui apresentado, destaca-se do quadro o segundo e o terceiro itens:
consumidor e usuário.
Observou-se nas pesquisas de campo realizadas, que o consumidor, aquele que compra
o produto para a criança, é, geralmente, um membro de sua família. Ele busca um produto que
tenha alguma utilidade para o destinatário, que lhe seja atraente e que tenha um caráter
educativo, de forma a promover, em algum âmbito, o desenvolvimento pessoal da criança, o
que vai ao encontro do estudo teórico.
Por fim, o usuário, aquele que vai utilizar o produto, deverá, primeiramente, sentir-se
atraído pelo mesmo, para que, então, exista a interação entre ambos. A utilização de cores,
formas e grafismos lúdicos são essenciais para garantir a atratividade da criança pelo produto,
cumprindo com os requisitos estéticos. Já, para que o produto possa auxiliar o
desenvolvimento da imaginação, da criatividade e da fantasia do usuário, ele deve ser:
versátil, permitindo diversas configurações em um mesmo objeto, e interativo, estimulando a
criatividade e a expressão, propondo atividades além da função principal do produto.
Como a fase entre quatro e sete anos de idade possui grande interesse pela temática
fantasia, foram utilizados os princípios dos (as) bonecos (as), das histórias e contos, dos
castelos, das fantasias de vestir, dos fantoches e dedoches, de modo que o produto pudesse
partir desses elementos, ao mesmo tempo em que pudesse atender a uma necessidade
fisiológica da criança. Por fim, a segurança é um fator inquestionável e, para que nenhum
produto apresente riscos ao usuário durante o seu manuseio, eles devem ser isentos de quinas,
pontas e rebarbas.
O quadro, assim, resumiu as características que o futuro produto deveria contemplar,
contribuindo substancialmente para a concepção do produto – objeto deste estudo -, a linha de
produtos “Amigo”.
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4 Linha de produtos “Amigo” - estudo de caso
A linha travesseiro “Amigo”, da linha de produtos Fantasia, composto de fronha e kit
de personagem, conforme anteriormente descrito, tem a fronha de tecido meia-malha fio 30
penteado, nas dimensões de quarenta por sessenta centímetros de extensão, atendendo, nas
suas características técnicas, o usuário criança. Acompanham a fronha os braços, itens
comuns a todos os personagens. São do mesmo material da fronha e enchidos com fibra de
silicone.
Como a fronha representa o rosto das personagens, as cores utilizadas para o tecido
são tons similares aos da pele, como pêssego, amarelo, marrom e outros que auxiliam a
compreensão e a percepção de que o travesseiro é, também, um boneco; além das cores, suas
formas e materiais buscam uma similaridade com as de um ser humano, uma vez que um
boneco é sua imitação. Sob esse mesmo propósito, usam-se as mesmas tonalidades para os
braços da personagem. Estes apresentam também costuras nas mãos, as quais promovem
divisórias que, por sua vez, sugerem dedos.
A face do travesseiro é indicada para a criança descansar sua cabeça, e a parte
posterior é a promotora da interação e da brincadeira que o produto permite. Os velcros,
dispostos em sua extensão e nos elementos do personagem, dão à criança a liberdade de
composição, de acordo com a sua imaginação e a sua criatividade, estimulando-as sempre
mais, à medida que usam o objeto.
Partindo da temática fantasia, compõem a linha oito personagens: Sereia, Mamãe,
Fada, Princesa, Pirata, Ninja; Super-Herói e Vampiro. Os quatro primeiros destinam-se a
atender o sexo feminino, e os restantes ao masculino. Os personagens femininos são
referências de contos de fadas, para cumprir com a temática fantasia. Apenas a mamãe não faz
parte desse universo, mas encaixa-se na fantasia por seu caráter de ícone, ou seja, por ser um
travesseiro, objeto, que remete à relação humana de mãe. As personalidades Ninja, Pirata,
Vampiro e Super-herói compõem o universo fantasioso da criança do sexo masculino que
busca como referência personagens que se destaquem pela força, inteligência, bravura,
esperteza e agilidade. Diferente das meninas, que se identificam com o que é meigo, doce,
suave, elegante e cordial.
A linha recebeu o nome “Amigo” pelo caráter simbólico-reflexivo dos produtos que
suprem diversas necessidades psicológicas infantis. Assim, por serem os produtos interativos,
já que permitem a montagem e a desmontagem (Figs. 1 e 2) das peças dos personagens do
jeito que convir ao usuário, o que confere também ludicidade, o produto estimula também a
afetividade, pela expressão dos parâmetros sintáticos, forma, cores, curvas, componibilidade,
mas, principalmente, por causa dos braços, que sugerem um abraço. O travesseiro
proporciona uma relação com seu usuário que vai além da satisfação de suas necessidades
fisiológicas, tornando-se um amigo, para todas as horas: dormir e brincar.
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Figura 1 – Criança montando o travesseiro Amigo
Figura 2 – Criança desmontando o travesseiro Amigo
A personagem sereia (ver Figura 3) possui rabo, cabelo e estrelas. O cabelo é feito de
lã, para proporcionar outra textura à criança (além da malha), que está em fase de
desenvolvimento de seus sentidos. A maleabilidade da lã também permite a proximidade com
o cabelo real, que não é estático, possui volume, movimento, de acordo com o próprio
movimento do indivíduo. O rabo e as estrelas são de cetim charmouse verde, apresentando
ainda outra textura, mais lisa, contribuindo para a percepção tátil do usuário.
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Figura 3 – Amiga Sereia
A personagem mamãe (ver Fig. 4) possui uma fenda na parte traseira de sua fronha, a
qual pode ser tampada e destampada. Neste compartimento pode-se alocar o filho para, assim,
simular um nascimento. Os velcros costurados nas palmas das mãos dos personagens mãe e
filho permitem que os dois deem as mãos, que é um dos gestos mais característicos da relação
entre mãe e filho e simboliza também afeto. Esses detalhes tornam o produto mais próximo do
real, uma vez que imitam o real, o que é importante para a assimilação da criança quanto ao
mundo, segundo a teoria do desenvolvimento infantil.
Figura 4 – Amiga Mamãe
A fada (ver Fig. 5) possui os acessórios que lhe garantem o título: varinha e asas, para
realizar desejos e voar, respectivamente. Para permitir maior interação da criança com os
elementos do brinquedo, adicionou-se aqui um chapéu para a fada. O chapéu e a varinha
podem ser conectados à fada por meio da sobreposição das partes com velcro, o que pode
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sugerir a transformação de uma menina comum em fada, estimulando ainda mais a fantasia da
criança.
Figura 5 – Amiga Fada
A princesa (ver Fig. 6) adquiriu dois importantes elementos para o seu
reconhecimento, que são o cetro e a coroa, ambos na cor amarela porque esta remete ao ouro,
que é uma característica da realeza. As tranças não são fixadas na franja para permitir ao
usuário maiores configurações do produto, permitindo uma maior interatividade durante o seu
uso.
Figura 6 – Amiga Princesa
A personagem ninja (ver Fig. 7), além da sua roupa característica, possui também uma
estrelinha-ninja para se defender em suas missões. Quanto à roupa, não é necessário costurar
um velcro porque ela pode ser “vestida” na personagem. Assim, a roupa seria aberta em uma
extremidade e, na outra não, para que o travesseiro seja inserido nela. O item superior não
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pode cobrir os olhos, e o inferior deve tampar a boca. Com o intuito de manter em sigilo a sua
identidade, os olhos são a única parte exposta do corpo do ninja, porque existe a necessidade
de enxergar.
Figura 7 – Amigo Ninja
O pirata (ver Fig. 8) possui uma bandana e uma faca, por serem acessórios típicos
desta personagem. A bandana não necessita de velcro, uma vez que pode ser amarrada no
próprio travesseiro, permitindo outra forma de adaptação que não pelo velcro, além de
estimular a criança a aprender (ou praticar) o ato de amarrar, contribuindo, então, para o
desenvolvimento de sua coordenação motora e autonomia. A espada apresenta um pedaço de
velcro para permitir sua aderência à mão do pirata.
Figura 8 – Amigo Pirata
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O super-herói (ver Fig. 9) possui três acessórios, comuns aos super-heróis de desenhos
animados e histórias em quadrinhos: capa, bracelete e máscara. A capa contém dois cordões,
um em cada extremidade superior, que pode ser vestida amarrando-a no personagem. Ela
ainda possui um brasão formado por um losango com braços e um “s” no centro. O losango
serve como moldura, os braços remetem a logo do travesseiro, e o “s” faz alusão a superamigo, título adquirido pelo travesseiro por seu papel de amigo. Aqui são explorados valores
como lealdade, justiça, companheirismo, solidariedade, dignos de um super-herói e de um
amigo, de forma que um personagem complementa o outro. A máscara cobre apenas os olhos
(mas sem impedir a visão) e é feita como uma faixa; uma tira de tecido com as extremidades
costuradas uma na outra, como um anel, de forma que o encaixe seja feito passando o
travesseiro por dentro da faixa (na parte vazada). Os braceletes seguem o mesmo princípio da
máscara.
Figura 9 – Amigo Super-Herói
O vampiro (ver Fig. 10) possui dois elementos extras, que é a capa e o morcego. A
capa possui duas amarras, uma em cada extremidade superior, para que o usuário vista o
vampiro e a amarre na frente. Aqui também a criança é estimulada a aprender a fazer ou a
praticar laços. O morcego acompanha o kit porque, segundo os contos, o vampiro é capaz de
transformar-se nesse animal, quando deseja, para se camuflar, proteger-se e voar. No morcego
e na mão do vampiro há também velcro para permitir a adesão de ambos.
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Figura 10 – Amigo Vampiro
O produto travesseiro, pela sua requisição por parte da maioria das pessoas quando vai
dormir, torna-se interessante para ser comercializado. Observando-se a imagem a seguir (Fig.
11), é possível verificar de que forma os requisitos de projeto satisfazem as necessidades do
usuário criança.
Figura 11 – Satisfação das necessidades do usuário
Assim, percebe-se que o produto “Amigo” satisfaz as necessidades tanto físicas
quando psicológicas da criança, pelo fato de atender a critérios importantes, fazendo dele,
então, um produto mais completo. O aspecto psicológico permite uma personalidade mais
estruturada (referente à afetividade, autonomia, expressão pessoal, criatividade,
companheirismo, individualidade, solidariedade), e o físico lida com aspectos de consciência
do corpo físico (coordenação, percepção dos sentidos, movimentação). Todos esses são
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elementos contribuintes do autoconhecimento, que torna as pessoas mais felizes e satisfeitas
consigo mesmas, bem como aptas a ajudar os outros e concretizar coisas boas para a
sociedade.
Em se tratando dos aspectos físicos que o produto atende, a coordenação motora é
estimulada por meio da brincadeira de conectar e desconectar os elementos das personagens
na fronha. É habilidade importante para se exercer na infância, uma vez que um indivíduo
adulto necessita dela para realizar as suas atividades cotidianas (trabalho, alimentação, higiene
pessoal, entre outros). Atendendo ainda aos aspectos físicos, o manejo do produto não requer
força ou tarefas que a própria criança não possa realizar sozinha, bem como é desprovido de
quinas ou materiais cortantes, o que o torna seguro para ela. A necessidade fisiológica, por
sua vez, que é dormir, é resolvida pelo fato de o produto ser também um travesseiro.
Os aspectos psicológicos atendidos pelo “Amigo” dão-se pelas cores e formas lúdicas,
o que o torna atraente para a criança, atendendo às suas carências estéticas; pela sua
versatilidade e interatividade, o que lhe dá subsídios para auxiliar o desenvolvimento
psicológico, criativo, imaginativo e expressivo da criança. São atributos que estimulam a
fantasia, a autonomia e o crescimento pessoal.
Cabe aqui retomar as considerações de Rudolf Lanz (1979), sobre Steiner e o sistema
Waldorf, que diz que os brinquedos devem ser um incentivo, e não um produto acabado, de
modo que sejam tão simples e que se prestem à transformação imaginativa. De acordo com a
referida abordagem, a teoria da aprendizagem, o design de produtos infantis, descrito por
Munari, e os requisitos apontados como fundamentais para a concepção de um produto para
crianças, conclui-se que a linha de produtos “Amigo”, desenvolvida para crianças entre quatro
e sete anos de idade, cumpriu com o seu propósito de contribuir com o desenvolvimento
infantil.
5 Considerações finais
O estudo contribuiu para confirmar que é possível desenvolver produtos para crianças
que sejam coerentes com as necessidades que elas têm em relação ao seu desenvolvimento
não só físico, como também psicológico.
Com o projeto “Amigo”, espera-se fomentar o interesse de designers e empresas por
projetos que contribuam para o desenvolvimento da sociedade e de seus indivíduos, já que se
comprovou a viabilidade de atender, simultaneamente, empresa, consumidor e usuário,
conferindo ao primeiro cliente de projeto o seu lucro, e aos outros dois, a sua satisfação por
meio da utilidade do produto.
Referências
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar Projetos de Pesquisa. 4.ed. São Paulo: Editora Atlas,
2002.
LANZ, Rudolf. A pedagogia Waldorf: caminho para um ensino mais humano. São Paulo:
Antroposófica, 1979.
LÖBACH, Bernd. Design industrial: bases para a configuração dos produtos industriais.
Tradução de Freddy Van Camp. São Paulo: Editora Blucher, 2001.
MONT’ALVÃO, Claudia. DAMAZIO, Vera. Design Ergonomia Emoção. Rio de Janeiro:
Mauad, 2008.
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Desenvolvimento de um projeto de brinquedo – a relevância de um brinquedo para o desenvolvimento
infantil
MUNARI, Bruno. Das coisas nascem coisas. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: Uma perspectiva histórico-cultural da educação. 17. ed.
Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1994.
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