1
Subsídios para a construção da agenda de
transição para uma economia includente,
verde e responsável.
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
2
Apresentação
A Conferência Ethos 2011, que ocorreu nos dias 8 e
9 de agosto, no Centro Fecomércio de Eventos, em
São Paulo, foi certamente uma das mais densas de
todas as 13 edições já realizadas pelo Ethos desde
1999, tanto pela abrangência dos temas quanto pelo
envolvimento dos participantes.
Um total de 926 inscritos revezaram-se entre as
duas grandes plenárias, três mesas-redondas e 14
painéis, dos quais participaram 104 palestrantes.
O evento foi coberto por 182 jornalistas de todo
o Brasil, que puderam publicar em seus veículos
uma visão de mundo e do processo econômico
bem diferente daquela que resultou na crise
financeira e ética em que estão mergulhadas as
principais economias do planeta.
Outro aspecto inovador foi a própria construção
do conteúdo da Conferência, que contou com
a participação de 36 organizações do setor
empresarial, da sociedade civil, dos trabalhadores,
da área acadêmica e de órgãos públicos, de modo a
garantir as diferentes visões de como chegar a uma
sociedade justa e sustentável. Nas mesas de debate,
reuniram-se lideranças da sociedade civil, CEOs de
empresas representativas, membros de órgãos do
governo e especialistas nos temas abordados.
A plenária de abertura discutiu as necessidades,
desafios e oportunidades para o país, sob a
perspectiva de uma economia sustentável. A de
encerramento foi dedicada à Rio+20, a Conferência
sobre desenvolvimento sustentável que será
realizada pela ONU em 2012, pela qual pretendese estabelecer regras para a implementação global
dessa nova economia.
As três mesas-redondas discutiram, respectivamente, governança, produção e consumo e inovação
para a sustentabilidade.
Os assuntos abordados nos painéis foram água,
energia, biodiversidade, florestas, mudanças
climáticas, direitos humanos, erradicação da miséria,
finanças sustentáveis, infraestrutura, integridade,
resíduos, cidades sustentáveis, trabalho e educação.
O objetivo era mostrar experiências e sugerir os
rumos necessários em cada uma dessas áreas, a fim
de constituir uma plataforma de sustentação para a
mudança do modelo econômico do país.
O documento que ora apresentamos traz uma síntese
de tudo o que transcorreu nas 19 atividades da
Conferência, bem como os caminhos sugeridos por
cada uma das mesas. Seu objetivo não é trazer uma
fórmula pronta que nos conduza à nova economia,
mas sim estimular toda a sociedade a continuar
trabalhando os resultados obtidos, para que possamos
propor ao país uma agenda de transição para um
modelo econômico efetivamente sustentável e justo.
Instituto Ethos
Foto: Clóvis Fabiano
Com o tema central Protagonistas de uma
Nova Economia – Rumo à Rio+20, esta
edição debateu as questões de maior impacto
socioambiental na economia brasileira, tendo em
vista sua transição para o modelo sustentável
preconizado pela Plataforma por uma Economia
Inclusiva, Verde e Responsável, documento
lançado pelo Instituto Ethos e parceiros que
resultou das reflexões da Conferência Ethos
2010 e de amplos debates com as empresas
associadas e entidades representativas de todos
os setores da sociedade.
Duas inovações caracterizaram a Conferência deste
ano. Ao contrário das anteriores, que procuravam
discutir o futuro do país e da sociedade, a
Conferência Ethos 2011 buscou debater a situação
atual da economia brasileira, em seus vários
aspectos, a fim de subsidiar a agenda de transição
para a nova economia proposta. Assim, o grande
objetivo do encontro foi identificar, em cada um dos
temas apresentados, as mudanças necessárias para
essa transição, bem como os avanços que já houve
nesse sentido e os gargalos que devemos superar
para continuar avançando.
Da esquerda para a direita: Paulo Itacarambi, Jorge Abrahão e Sergio Mindlin
3
Foto: Fernando Manuel
Nova economia:
includente, verde e responsável
Da esquerda para a direita: Wilson Ferreira Junior, Ricardo Abramovay, Marcelo Cardoso, Ronaldo Motta, Daniela di Fiori e João Batista Menezes
Objetivo:
Discutir as necessidades, desafios e oportunidades para o Brasil sob a perspectiva da transição para
uma economia sustentável, buscando as sínteses que orientem o setor produtivo nesse momento
crucial para a transformação das vantagens comparativas do Brasil em vantagens competitivas.
A plenária foi a atividade oficial de abertura da
Conferência Ethos 2011 e contou no primeiro
momento com os seguintes expositores: Sérgio
Mindlin, presidente do Conselho Deliberativo do
Instituto Ethos; Jorge Abrahão, presidente do
Instituto Ethos; Paulo Itacarambi, vice-presidente do
Instituto Ethos e coordenador-geral da Conferência.
O segundo momento foi um debate com a moderação
de Ricardo Abramovay, professor titular da FEA/
USP, do qual participaram representantes das
empresas parceiras institucionais do Ethos: Daniela
di Fiori, vice-presidente de Assuntos Corporativos e
Sustentabilidade do Walmart Brasil e presidente do
Conselho do Instituto Walmart; Marcelo Cardoso,
vice-presidente de Desenvolvimento Organizacional
e Sustentabilidade da Natura; Wilson Ferreira
Junior, presidente da CPFL Energia; e João Batista
Menezes, diretor de Segurança, Saúde, Meio
Ambiente e Sustentabilidade da Alcoa América
Latina e Caribe1. Também participou do debate
1 - As empresas Suzano e Vale também são empresas parceiras
institucionais do Instituto Ethos, porém devido à incompatibilidade de
agenda de seus executivos não participaram da plenária.
Ronaldo Mota, Secretário de Desenvolvimento
Tecnológico e Inovação do Ministério de Ciência e
Tecnologia (MCT).
No primeiro momento os três expositores, além de
dar as boas-vindas aos participantes, atualizaram
o público sobre algumas das iniciativas em que o
Instituto Ethos está envolvido, como a Comissão
Nacional para a Rio+20, apresentaram suas visões
sobre o tema do evento e a forma como o conteúdo
havia sido preparado, com outras 35 organizações
parceiras, e como os trabalhos continuarão junto a
esses parceiros.
Paulo Itacarambi informou o público sobre
o sistema de consultas desenvolvido para a
contribuição dos participantes, que continuará
disponível após o evento, e sobre os cadernos que
o jornal Valor Econômico estava produzindo antes e
após o evento, abordando os conteúdos debatidos
e outras informações sobre a Conferência. Também
apresentou a Versão Intermediária para AplicaçãoPiloto dos Indicadores Ethos – 3ª Geração, um
amplo processo de revisão da ferramenta, iniciado
em outubro de 2010 e com previsão de lançamento
para outubro de 2012.
O segundo momento teve início com a apresentação
de Paulo Itacarambi sobre os principais elementos
da Plataforma por uma Economia Inclusiva, Verde
e Responsável. Ele começou por esclarecer o
que estamos chamando de economia verde:
uma economia que propõe a redução do uso dos
recursos naturais, seja pela ecoeficiência, seja pela
reutilização de materiais, e a redução dos impactos
negativos dos processos de produção e consumo.
Para isso, precisaríamos reduzir as emissões,
ampliar o uso das fontes limpas e renováveis
de energia, utilizar modais mais eficientes e
internalizar as externalidades desse processo. Mas
não só. Também seria preciso recuperar o que já
foi degradado e preservar os ecossistemas.
Para construir uma sociedade sustentável, porém,
Paulo lembrou que é necessário mais do que
uma economia verde. Precisamos que ela seja
ainda includente e responsável. Includente: que
tenhamos uma distribuição equitativa da riqueza,
que erradiquemos a miséria, que tenhamos uma
diversidade e equidade tanto de gênero quanto de
raça, nas empresas, no mercado e na sociedade,
que se promova o trabalho decente, com respeito
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
4
e ampliação dos direitos humanos – isso
também como responsabilidade das empresas. E
responsável: que combatamos permanentemente
a corrupção e a impunidade, que valorizemos
o comportamento íntegro, que ampliemos a
transparência e nos comportemos valorizando a
transparência, respeitando leis, regras e contratos,
que estimulemos a concorrência leal e principalmente
a cooperação, pois é possível ser competitivo com
cooperação, e não apenas competindo.
“
”
Segundo ele, a sociedade civil, o movimento
dos trabalhadores, o mundo empresarial e as
organizações públicas já estão engajados em
diversas iniciativas nesse campo. O que falta é
um projeto nacional que articule essas iniciativas,
lhes dê escala e possa integrar as três dimensões:
includente, verde e responsável. Mencionou,
assim, a necessidade de um projeto de sociedade
de desenvolvimento sustentável, objetivo a ser
trabalhado na Conferência.
Por fim, trouxe algumas questões para provocar
a reflexão dos palestrantes. Como transitar da
situação atual para uma economia com essas
características? Onde podemos perceber avanços
e valorizar esses avanços, construir sobre o
construído? Quais são os gargalos que precisam
ser removidos?
O debate começou com uma provocação de Ricardo
Abramovay, a partir de algumas informações:
estamos vivendo um momento positivo na economia,
no qual 80 milhões, 90 milhões de pessoas por ano
estão entrando no mercado de consumo e 29% da
população mundial está na faixa de renda entre US$
6 mil e US$ 30 mil, percentual que sobe para 50%
em 2030. Atualmente, cada unidade de produto
oferecida ao mercado tem usado menos energia e
menos materiais e, eventualmente, emitido menos
gases de efeito estufa. No entanto, o consumo global
de energia e de materiais e as emissões não param
de crescer, devido fundamentalmente à desigualdade.
“Atualmente consumimos 60 bilhões de toneladas
anuais de matérias, sem falar no que removemos
para obter esses materiais.” Ricardo perguntou, então,
aos demais palestrantes se o progresso técnico por si
só é capaz de propiciar crescimento tão significativo
que torne irrelevante essa desigualdade. E afirmou,
com relação à responsabilidade socioambiental
corporativa, que tem de se referir aos efeitos
imediatos dos produtos sobre a vida dos indivíduos
das comunidades e dos territórios.
Entre os palestrantes, a reação às provocações
de Ricardo foi inaugurada por Daniela di Fiori,
apresentando a visão do setor de varejo e de comércio
sobre o tema. Para ela, um dos desafios para a atual
economia seria a falta de um “incentivo a mais”,
seja tributário, seja na forma de comercialização e
manufatura dos produtos, deixando de ser para um
nicho de consumidores, de modo que as pessoas
possam democratizar o conceito de sustentabilidade.
“O plano de produção e consumo sustentável, do
Ministério do Meio Ambiente, é um bom exemplo
de uma iniciativa nesse sentido.” Daniela mostrou
que há avanços importantes na construção de
produtos de menor impacto, inclusive com a
participação de empresas globais e marcas líderes
em seus segmentos. No entanto, ainda falta uma
métrica para a sustentabilidade. “É preciso mostrar à
sociedade que as opções de produtos e serviços de
menor impacto estão disponíveis.” E o Brasil, em sua
opinião, precisa ser capaz de transferir conhecimento
para o setor produtivo para melhorar a vida e o bemestar da população.
Foto: Clóvis Fabiano
Para Paulo, o Brasil pode ter uma economia
com essas características: includente, verde e
responsável. O país tem potencial e pode ser uma
liderança nesse processo em termos mundiais,
uma vez que possui um grande capital natural,
rico em biodiversidade, tem uma população
sociodiversificada e conta com organizações
sociais ativas, ou seja, com um capital social rico.
“O Brasil possui uma economia dinâmica e com
uma boa matriz energética, tem um processo
real de mobilidade social recente, caminhando
na redução das desigualdades sociais.” Mas ele
lembra que é preciso acelerar esse processo,
aumentar a distribuição de riquezas.
É necessário aumentar a
capacidade competitiva brasileira em
todo leque de negócio e, para que
isso seja viável, a palavra inovação é
chave nesse processo
Paulo Itacarambi
5
Para Marcelo Cardoso, da Natura, estamos no
momento de questionar quais valores queremos
para uma nova sociedade, precisamos nos
reinventar como sociedade e propor novas
alternativas. Marcelo defende a necessidade de
uma nova economia, uma economia que seja a
base para a formação de uma nova sociedade.
E, nesse contexto, promover a discussão sobre
quais são os valores e culturas em que essa nova
sociedade precisa se fundar. Apresentou também
os esforços da Natura nesse sentido, a partir
de ações nos temas de controle de emissões
e resíduos, redução de massa dos produtos,
consumo de água, inclusão de mulheres na
economia e no bom desempenho da empresa no
tema da biodiversidade.
Em sua apresentação, Wilson Ferreira Júnior abordou
o tema consumo de energia, apresentando dados
como o aumento de 33% no consumo mundial
nos próximos 20 anos e, no mesmo período, a
necessidade de expandir em 142% a oferta de
energia no Brasil, para atender às necessidades
de crescimento do país. Para Marcelo, além da
mitigação dos impactos já contratados para as
próximas décadas, a transição para uma economia
sustentável e verde não é mais uma opção. O
diálogo com o governo é muito importante para
a criação de políticas públicas que viabilizem o
estabelecimento de uma economia sustentável:
“Devemos trabalhar em prol de políticas públicas
que estimulem a criação de energias limpas”.
Segundo João Batista Menezes, é preciso
trabalhar no sentido de as empresas de fato
colocarem a manutenção de ecossistemas,
qualidade do ar e da água como principal
objetivo de sua estratégia de negócio. Para ele,
não basta analisarmos o desempenho individual
de cada uma. É preciso pensar no desempenho
das empresas e da sociedade como um todo,
rumo a uma economia inclusiva, verde e
responsável. Nesse contexto, apresentou a
estratégia corporativa da Alcoa, alinhada com
os valores de uma nova economia.
Ronaldo Mota, do Ministério da Ciência e
Tecnologia, iniciou sua exposição tratando da
questão dos avanços tecnológicos. Na sequencia,
abordou a necessidade de desenvolvimento para
o país, porém desenvolvimento em um modelo
sustentável. Destacou que outros modelos de
desenvolvimento têm sido acompanhados de
incremento de desigualdade social.
Em sua apresentação, não teve dúvidas sobre
o crescimento do Brasil, mas questionou se esse
crescimento será sustentável. Para Ronaldo, “é
necessário aumentar a capacidade competitiva
brasileira em todo leque de negócio e, para que
isso seja viável, a palavra inovação é chave nesse
processo.” O Brasil, segundo ele, deve ser um dos
países que menos têm demonstrado capacidade de
transformar conhecimento em melhor qualidade de
vida, em negócio, afetando efetivamente o mundo
das empresas e o mundo do setor produtivo.
Durante o debate da plenária, o
moderador fez as seguintes perguntas
ao público:
O aumento da taxa de crescimento do PIB deve ser o
objetivo central da política macroeconômica do Brasil.
44%
8%
19%
10%
20%
Concordo Plenamente
Nesse contexto, porém, destacou o agronegócio
como um segmento em que o Brasil exemplarmente
conseguiu transformar conhecimento em setor
produtivo. De maneira otimista, lembrou que
a indústria nacional tem procurado incorporar
conhecimento a seus processos, como um elemento
diferencial, capaz de transformá-la em altamente
competitiva no mercado internacional. Dessa forma,
concluiu sua exposição dizendo que a capacidade
de produzir conhecimento, também fortemente
influenciado pela demanda, é o que poderá garantir
sustentabilidade. Embora não seja o único elemento
desse processo, é um dos mais importantes.
Concordo Parcialmente
Sem opinião
Discordo Parcialmente
Discordo
É possível que as empresas coloquem o uso e a
conservação sustentável dos serviços ecossistêmicos
no centro de suas estratégias?
41%
47%
Você é favorável a que a legislação do comércio seja
mais flexível?
Sim
Não
90%
3%
10%
1%
Devemos ter como objetivo o aumento do consumo
per capita de energia?
Sim
Não
24%
Concordo Plenamente
Concordo Parcialmente
Sem opinião
76%
Discordo Parcialmente
Discordo
A renovação das concessões deve ser feita ou é preciso abrir um novo leilão?
Sim
Não
47%
63%
8%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
6
Foto: Clóvis Fabiano
Governança na nova economia
Da esquerda para a direita: Oded Grajew, Gilberto Carvalho, Gilberto Milfano e Chico Whitaker
Objetivo:
Aprofundar as reflexões sobre a nova economia e a discussão em torno da governança necessária
para o novo modelo econômico.
Como palestrantes foram convidados: Odilon Faccio,
diretor do Instituto Primeiro Plano; Aron Belinky,
consultor especialista em responsabilidade social e
sustentabilidade e coordenador de projetos da Vitae
Civilis; Daniela Mariuzzo, do Banco Rabobank; Carlos
Eduardo Lessa Brandão, vice-presidente do Conselho
de Stakeholders da Global Reporting Initiative. Os
palestrantes abordaram o tema da nova economia
de forma direta e provocante, refletindo sobre os
mecanismos de boa governança, autorregulação
e democracia participativa, entre outros modelos
de governança empresarial. Em seguida, três
debatedores – Gilberto Carvalho, secretário-geral
da Presidência da República; Gilberto Milfano,
presidente do Instituto Brasileiro de Governança
Corporativa; e Chico Whitaker, co-fundador do Fórum
Social Mundial e Prêmio Nobel Alternativo de 2006 –
reagiram às exposições, trazendo as próprias visões,
estabelecendo, assim, um diálogo que contou com a
moderação de Oded Grajew, coordenador-geral da
Rede Nossa São Paulo.
mercados decidem e os governos atuam, para
estimular práticas que definam a nova economia.
É preciso estabelecer diálogos entre os diversos
públicos e trabalhar por pactos e compromissos
de mudança. Estamos falando de governança
nessa nova economia, que deve ser focada em
compromissos e ter como objetivo melhorar o
bem-estar humano e buscar a redução contínua
das desigualdades (Pnuma, 2010). A governança
possui claras implicações sobre pobreza, equidade
e qualidade de vida.
O modelo econômico exige uma nova governança.
Mudar a economia significa, também, mudar
a maneira como as empresas se planejam, os
Debater a governança na nova economia significa
enfrentar o desafio da construção de conceitos e
práticas transformadores, focados em participação,
Para isso, as estratégias empresariais e as políticas
públicas têm de considerar a sustentabilidade
dentro de uma perspectiva de futuro e incorporála a seus planos, controlando, minimizando e
eliminando riscos ambientais, escassez ecológica
e condições precárias para a sobrevivência.
Empresas e governos precisam estabelecer
padrões de controle e aferição de resultados e
impactos socioambientais de suas atividades.
transparência e responsabilidade (Strandenaes,
2011). Esse debate deve ser levado para a Rio+20
pelos países, representados por quase duas centenas
de chefes de Estado e de governo. Deve fortalecer
o diálogo para o estabelecimento da participação,
leis e regras claras, transparência, capacidade
de resposta, consenso orientado (mediação de
diferentes interesses), equidade, efetividade e
eficiência, accountability e visão estratégica.
Governança se refere ao conjunto de iniciativas,
regras, instâncias e processos que permitem às
pessoas, por meio de comunidades e organizações,
exercer o controle social, público e transparente
das estruturas estatais e das políticas públicas,
com vistas a atingir interesses comuns.
Para a instituição de um novo modelo econômico,
frente à atual crise, os debatedores apontaram
a necessidade de promover condições para
que todos os agentes da sociedade possam ter
acesso aos processos de tomada de decisão e
gestão do desenvolvimento, em especial com
base na sustentabilidade. Diante desse cenário,
há mais questionamentos do que respostas. Como
representantes de diversos setores da sociedade,
eles trouxeram aspectos fundamentais inerentes à
governança, como a ampliação da cidadania pelo
7
acesso a direitos básicos, a criação de espaço
para o desempenho do papel de consumidores
com responsabilidade e o desenvolvimento
de instrumentos e espaços de debate com a
sociedade para a fomentação de políticas públicas
e do diálogo social. Foi também destacado o papel
do Estado de induzir e legitimar esse processo para
a consolidação da nova governança.
Entre os principais desafios colocados pelos
debatedores, destacaram-se mudanças estruturais,
ações e políticas públicas que reflitam os
interesses da sociedade. Outros pontos tidos
como indispensáveis em uma economia que
considere os anseios da sociedade foram a
ampliação da transparência, maior equidade,
estabelecimento de processos de prestação de
contas e responsabilidade corporativa. A economia
verde apareceu como oportunidade e desafio
nessa direção, considerando seu potencial de
experimentar a promoção de um sistema que
esteja baseado nas necessidades humanas, e não
no acúmulo de riquezas e lucros.
Para as empresas, espera-se cada vez mais a
divulgação contínua de relatórios de sustentabilidade
com evidências de suas práticas e de modo que
possam ser acompanhados pela sociedade, assim
como a formação de conselhos que reflitam a
diversidade dos públicos com os quais se relacionam.
Um ponto que ainda pode significar um entrave a
avanços nesse sentido é a tirania do curto prazo
sobre as empresas, por conta da atual demanda e
pressão por resultados trimestrais.
“ Mudar a economia significa, também,
mudar a maneira como as empresas se
planejam, os mercados decidem e os
governos atuam, para estimular práticas
que definam a nova economia
”
Além dos desafios, os palestrantes e debatedores
apontaram mudanças essenciais para alcançar
a governança para a nova economia, entre elas
modificar estruturas consolidadas, como maior
participação de outros países na ONU, tornar efetivos
os acordos e mecanismos internacionais, qualificar
e investir nos novos consumidores-cidadãos, a
adoção, pela mídia, de um comportamento ativo na
formação cidadã, qualificar a participação social
nos principais debates, promover uma mudança
radical da economia baseada na produção e
consumo. Vieram propostas a partir dessas
necessidades de mudanças, como o diálogo para
legitimar os diferentes atores, traçar metas e
objetivos realistas e promover o comprometimento,
além de o Estado assumir seu papel de indutor do
diálogo social e da transição.
As perguntas feitas pelo moderador ao
público do painel foram as seguintes:
Vocês se lembra do nome e partido do Deputado
Federal e Estadual em que votaram?
Sim
Não
61%
39%
Vocês acham que os presidentes das empresas devem ser eleitos pelos funcionários?
Sim
Não
46%
54%
O governo deve sugerir às empresas que publiquem
relatórios de sustentabilidade ou expliquem porque
não o fazem?
Sim
Não 3%
97%
Você é favorável à proposta de que eleitos a cargos executivos devem apresentar plano de metas e
prestação de contas?
99%
Sim
Não 1%
Você concorda com Chico Whitaker: é necessária
uma mudança mais radical do que um economia
includente, verde e responsável?
77%
2%
Foto: Clóvis Fabiano
Concordo Plenamente
Concordo Parcialmente
Sem opinião
Discordo Parcialmente
Gilberto Carvalho
17%
3%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
8
Foto: Clóvis Fabiano
Novos padrões de produção e consumo
para a sustentabilidade
Da esquerda para a direita: Clemente Ganz Lucio, Samyra Crespo, Daniela di Fiori, Helio Mattar e Tasso Azevedo
Objetivo:
Aprofundar as discussões sobre a nova economia a partir de reflexões sobre as mudanças
necessárias na cultura e nos hábitos de consumo, no estilo de vida, nos modelos de negócio,
nas relações de trabalho e na qualificação profissional, para aumentar a competitividade da
economia brasileira e melhorar a distribuição da riqueza, ampliando a participação do trabalho e
melhorando a qualidade de vida, enquanto se reduzem os impactos das atividades econômicas
sobre os ecossistemas.
Essa mesa-redonda se iniciou com os seguintes
palestrantes: Clemente Ganz Lucio, diretor técnico
do Dieese, que discorreu sobre as relações de
trabalho e a qualificação profissional; Lisa Gunn,
coordenadora executiva do Idec, sobre o interesse
dos consumidores; Rosa Alegria, vice-presidente
do NEF, da PUC-SP, sobre as questões de
comportamento dos indivíduos; e Sonia Favaretto,
diretora de Sustentabilidade da BM&FBOVESPA,
sobre o papel das empresas.
A partir das exposições, debatedores fizeram suas
intervenções e estabeleceram um diálogo moderado
por Tasso Azevedo, consultor em questões do clima
do Ministério do Meio Ambiente. Os debatedores
presentes foram Daniela di Fiori, vice-presidente
de Assuntos Corporativos e Sustentabilidade do
Walmart Brasil; Helio Mattar, presidente do Instituto
Akatu; Samyra Crespo, secretária de Articulação
Institucional e Cidadania Ambiental do MMA.
Há o entendimento de que as empresas precisam
incluir em seus processos preocupações muito
específicas em relação aos insumos que utilizam
para produzir. Mas a sociedade também tem de
repensar suas decisões de consumo, a partir de
fatores que devem levar em conta questões como
o consumismo e os impactos socioambientais dos
produtos e serviços adquiridos. Há que pensar,
ainda, nos critérios para compras públicas e para a
formação das cadeias de fornecedores das empresas.
No Brasil, o governo elabora o Plano de Ação para
Produção e Consumo Sustentáveis (PPCS), que tem
por objetivo fomentar a ampliação de iniciativas
alinhadas com a promoção da sustentabilidade.
Algumas prioridades eleitas são o varejo e consumo
sustentáveis, a agenda ambiental na administração
pública, a educação para o consumo sustentável, o
aumento da reciclagem de resíduos sólidos, compras
públicas sustentáveis e construção civil sustentável.
Por outro lado, falta uma maior articulação do PPCS com
a principal política de desenvolvimento de longo prazo,
o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O
mesmo ocorre com relação às políticas de curto prazo,
como as medidas adotadas na administração da crise
financeira mundial de 2008 e no fomento às exportações,
que podem sabotar ou anular os esforços do programa.
A discussão sobre mudança dos padrões de
consumo faz parte de um capítulo da Agenda
21, documento lançado na Rio92, que já alertava
os países para a importância de refletir sobre as
questões socioambientais. De acordo com Lisa
Gunn, esse documento afirma que a principal causa
dos problemas sociais e ambientais enfrentados
atualmente decorre dos atuais padrões insustentáveis
de produção e consumo.
9
A questão fundamental discutida durante o painel
foi estabelecer quem seria o responsável por
criar novos padrões de consumo: o governo, as
empresas ou os consumidores?
Para Clemente Ganz Lucio, o modo de produção como
um todo não está estruturado para produzir qualidade
de vida, mas sim para produzir riqueza mensurada
pelo PIB, não significando, necessariamente, uma vida
digna. Segundo ele, esse sistema de produção atual
gera mais pobreza e desigualdade e tem o trabalhador
inserido nele. A mudança para um novo padrão não
virá dos trabalhadores: “Se imaginarmos que o trabalho
pode produzir algo diferente, vamos ter de olhar para o
sistema, inevitavelmente, e os trabalhadores o farão a
depender da condução que o sistema de produção faz”.
Lisa Gunn também acredita que o papel fundamental
nessa mudança de padrão deve ser das empresas, que
deveriam oferecer mais alternativas sustentáveis aos
consumidores. Lisa não vê motivo para comemoração
dos 20 da Agenda 21. “As empresas ainda estão
a dever modelos de negócios para que produtos e
serviços sejam disponibilizados aos consumidores de
forma parcimoniosa, com informação e orientação
sobre o exagero da utilização dos recursos naturais
e como e para onde os resíduos devem ser
encaminhados.” Ela aponta para o desafio de garantir o
acesso a bens e serviços para milhares de pessoas que
estão ascendendo ao mercado com uma consciência
consumidora que ainda não leva em consideração os
impactos sociais e ambientais de produtos. “O que
a gente observa é que existe uma distância bastante
grande entre consciência do problema e mudança do
hábito de consumo.”
tem a força de mudar o rumo da história econômica,
das políticas trabalhistas e até de transformar
conceitos como o que se entende por consumo.”
A requalificação das escolhas individuais, assim,
é a chave para uma mudança de paradigma, que,
segundo ela, pode ser iniciada conectando a palavra
consumidor à sua real definição: destruidor.
Samyra Crespo afirmou que o papel do governo
nesse processo de mudança pode ser incentivado
e deve servir de exemplo para as empresas por
meio de uma política de compras e licitações
sustentáveis. O poder público tem o poder de
induzir a economia nesse sentido, pois compras
governamentais impactam 17,5% do PIB brasileiro.
Mas exigir do governo uma agenda visionária e
antecipatória, em sua opinião, é bobagem, contando
que o governo escuta as demandas da sociedade e
muda suas políticas a partir disso. Helio Mattar
“ A mudança de padrões não ocorre
porque há uma pressuposição,
muitas vezes, de que sustentabilidade
significa sacrifício, significa menor
qualidade de vida
”
acredita que “a mudança de padrões não ocorre
porque há uma pressuposição, muitas vezes, de
que sustentabilidade significa sacrifício, significa
menor qualidade de vida”. Mesmo sabendo que
cada agente – sociedade civil, governo e empresas
– tem seu papel e sua relevância para tornar o
consumo e a produção cada vez mais sustentáveis,
“o crucial é que o consumo deixe de ser um
fim em si mesmo e se torne uma ferramenta de
escolha”, finalizou Tasso Azevedo.
Foto: Clóvis Fabiano
Para exemplificar boas práticas existentes, Daniela
explicou um programa do Walmart que criou
alternativas ambiental e socialmente sustentáveis
aos seus produtos, com pouca ou nenhuma alteração
em preços. Para o Walmart, criar novos padrões
de produção é uma estratégica de sobrevivência
em longo prazo, pois a empresa acredita que o
cenário futuro de consumo será diferente e quer
estar preparada para esse novo modelo, ajudando
a construí-lo.
No painel, a requalificação de escolhas foi o assunto
de Rosa Alegria. “Com sua escolha, o consumidor
Helio Mattar
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
10
As seguintes perguntas foram elaboradas pelo moderador aos participantes:
Num estado democrático e legítimo que os Agentes
Públicos eleitos imponham uma agenda de produção
e Consumo Sustentável
47%
41%
Eu sou o que compro e uso e não há nada de errado
c/ isso?
46%
Os principais sistemas de certificado são voluntários,
mas ainda com abrangência / resultados ainda em
desenvolvimento. Neste contexto, o governo pode ter
um papel (de ajudar a transformar a realidade dos
mercados? Como?
59%
6%
3%
1%
16%
12%
26%
8%
25%
10%
Concordo Plenamente
Concordo Plenamente
Transformando sistemas voluntários em mandatários
Concordo Parcialmente
Concordo Parcialmente
Aumentando fiscalização e criando leis mais rígidas
Sem opinião
Sem opinião
Incentivando economicamente o consumo de
Discordo Parcialmente
Discordo Parcialmente
“produtos sustentáveis”
Discordo
Discordo
Você é favorável à proposta de que eleitos a cargos executivos devem apresentar plano de metas e
prestação de contas?
63%
Os meios de comunicação não contribuem efetivamente para a formação de uma consciência cidadã
Quem é o PRINCIPAL ator capaz de transformar os
padrões atuais de produção e consumo?
24%
50%
30%
34%
19%
18%
18%
4%
0%
11%
1%
22%
6%
Governo
Concordo Plenamente
Precisamos deixar de ser consumidores para ser usuários
Empresas
Concordo Parcialmente
O trabalhador deve ser sujeito nos locais de trabalho se
Consumidores
Sem opinião
quisermos que ele influencie a produção sustentável
ONGs
Discordo Parcialmente
Existe um descompasso entre a crescente preocupação
Discordo
com sustentabilidade expressa nas pesquisas e
comportamento de consumidor
Sustentabilidade ganhará cetralização, seja pelo amor,
pela dor e pela inteligência
Nenhuma das anteriores
11
Foto: Marcio Bulhões+
Inovação para a sustentabilidade
Da esquerda para a direita: Sérgio Mindlin, Carlos Alberto dos Santos, Claudio Boechat, Fernando Reinach e Ricardo Correa Martins
Objetivo:
Discutir os diversos fatores que podem aumentar o investimento público e privado em ciência e
tecnologia para reduzir a intensidade energética e material nos processos produtivos e dar escala
às diversas tecnologias sustentáveis que estão em desenvolvimento.
A mesa-redonda contou com exposições de quatro
palestrantes, que após considerações iniciais
debateram o tema intensamente em um diálogo
moderado por Sérgio Mindlin, presidente do
Conselho do Instituto Ethos. Os debatedores foram
Carlos Alberto dos Santos, diretor técnico do Sebrae,
que falou sobre o papel do empreendedorismo e das
pequenas empresas no desenvolvimento da inovação;
Claudio Boechat, professor da Fundação Dom Cabral,
sobre novos modelos de negócio; Fernando Reinach,
sócio-gestor do Fundo Pitanga, biólogo e colunista do
jornal O Estado de S. Paulo, sobre os novos formatos
de financiamento da inovação; e Ricardo Correa
Martins, diretor executivo da FNQ, sobre o potencial
brasileiro de inovação tecnológica.
Boa parte da competitividade brasileira ainda é
baseada na produção de bens que fazem uso
intensivo de recursos naturais, na forma de energia,
de insumos, no transporte. A crença de que esses
recursos existem em abundância e o modo como se
dá a gestão financeira tradicional dos negócios não
contabilizam os impactos negativos ao meio ambiente
e não entram na formação dos preços de mercado.
Novos caminhos para a inovação podem incluir,
por exemplo, investimento em ciência e tecnologia,
novos modelos de negócio, novos formatos de
financiamento da inovação, o empreendedorismo e
pequenas empresas no desenvolvimento da inovação.
Os financiamentos de atividades de pesquisa
e desenvolvimento são, em sua maior parte,
realizados por empresas (64,5% em 2008),
enquanto os financiamentos do governo
decresceram em relação ao total. O apoio
governamental às atividades de pesquisa é uma
forma de promover o crescimento econômico
sustentável em longo prazo, por meio da inovação.
No Brasil, mesmo com os avanços registrados em
algumas áreas, o setor de ciência e tecnologia
apresenta baixo investimento (equivalente a
1,1% do PIB em 2008), carências em termos de
qualificação dos recursos humanos para a área e
baixo número de registro de patentes (0,3 patente
por milhão de habitantes em 2008), apesar do
aumento na produção científica e do número de
doutores (ph.D.) per capita.
A questão da inovação no Brasil passa pelos usuais
gargalos: falta de infraestrutura, baixa qualificação
da mão de obra, insegurança jurídica, burocracia
excessiva, além da oscilação dos recursos. O principal
foco da inovação no país ainda é a transformação
industrial, mas não deveria se restringir ao campo
da tecnologia. O foco principal do apoio à inovação
deve estar na criação de mercados e de negócios
voltados não apenas a ganhos econômicos, mas
também a ganhos sociais e ambientais. É preciso
instituir novas formas de gestão e novas relações nas
cadeias de produção. O aperfeiçoamento do sistema
de apoio e fomento à inovação também passa pelo
desenvolvimento de novas formas de cooperação
entre os diferentes atores – governos, instituições
de pesquisa, empresas e empreendedores – e pela
criação de sinergias entre os diferentes objetivos.
Em muitos países as políticas de inovação visam à
competitividade no comércio exterior. Políticas de apoio
à exportação são um reduto especial para a inovação.
Para que o Brasil siga essa trilha, em um modelo de
desenvolvimento voltado para uma economia de baixo
carbono, é necessário alinhar a essa visão as políticas
e os instrumentos de incentivo e fomento à pesquisa.
Políticas de comércio exterior, comercial, industrial e
de inovação devem ser articuladas e coordenadas com
objetivos que confluam para o desenvolvimento de
uma economia verde.
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
12
Esse cenário ficou como pano de fundo do debate,
que girou em torno do desafio ao fomento à
inovação para sustentabilidade nas pequenas e
médias empresas brasileiras, que representam
60% da força de trabalho e 99% de todas as
empresas do país. Mas ainda há muito o que fazer
nesse sentido – e com políticas públicas para
valorizar práticas inovadoras.
Pesquisa divulgada no evento pelo Sebrae revelou
que 58% das companhias não têm nenhum
conhecimento sobre sustentabilidade. “A sondagem
evidencia a dimensão do desafio de inovar a
agenda da sustentabilidade na gestão dos pequenos
negócios”, disse Carlos Alberto. Para ele, as pequenas
empresas carregam uma grande responsabilidade
para a formação de uma economia sustentável.
“Combinar desenvolvimento socioeconômico com a
utilização de recursos naturais, sem comprometer
o meio ambiente, é um grande desafio e requer
soluções inovadoras.” Com isso em mente, o Sebrae
está formando um banco de consultores para
atender os empreendedores e ajudá-los a tornar
os negócios cada vez mais sustentáveis. Esses
“ A inovação permite ao homem
escolher que rumo seguir, cada
nova tecnologia abre um leque
de opções
”
capacitadores são responsáveis por levar o tema
para dentro das empresas. Carlos Alberto acredita
que o desenvolvimento sustentável é nada mais que
a competitividade ao longo do tempo. “Empresas que
adotam a sustentabilidade têm maiores chances de se
manter no mercado”, afirmou. Para ele, essa política
tem uma relação direta com a perenidade do negócio.
Cláudio Boechat afirmou que o problema de
inovação vai além das empresas e seria preciso
formar líderes mais capazes para levar inovações
aos negócios. “Para isso, deve-se inovar também
em métodos e conteúdos educacionais que gerem
mentalidades e ideias mais sustentáveis.” A
inovação para a sustentabilidade, assim, depende
de um novo modelo mental, além da inovação
tecnológica. Ele também é de opinião que os países
mais inovadores são aqueles que têm setores
públicos norteando o mercado. “É o governo
que puxa o barco, e não o setor empresarial. O
desempenho da administração pública é essencial
para inovar com sustentabilidade, e nesse sentido
é fundamental ter políticas como a de Resíduos
Sólidos.”. Em sua visão, as empresas carecem de
inovação em setores-chave, como saúde, educação,
habitação etc. “Por isso digo que é preciso mudar
a mentalidade empresarial para o que costumamos
chamar de liderança mentalmente responsável.”
Para Ricardo Correa, além de políticas públicas, é
a excelência da gestão nas empresas que vai fazer
a diferença na hora de inovar. “O grande desafio é
cultural, muito mais que tecnológico”, afirmou. “Mas
será difícil vencermos esse desafio. A educação
básica no país deixa muito a desejar.”
Foto: Fernando Manuel
Fernando Reinach vê a inovação tecnológica como
uma faca de dois gumes. “As coisas que a gente
mais preza são as que nos trouxeram até aqui,
que deram sentido ao que vivemos hoje”, explicou.
Inovar para a sustentabilidade, segundo ele, é
algo que depende muito das opções que fazemos,
depende de nos liberarmos desse instinto animal
de consumo exagerado, e isso, do ponto de vista
biológico, não é normal, mas racionalmente é. A
inovação permite ao homem escolher que rumo
seguir, cada nova tecnologia abre um leque de
opções. “Mas a inovação em si vai continuar sendo
uma faca de dois gumes, o que diferencia são as
escolhas”, finalizou Reinach.
Fernando Reinach
13
Foto: Fernando Manuel
Os impactos de um novo
código florestal
Da esquerda para a direita: Elizabeth de Carvalhaes, André Nassar, Ricardo Ribeiro Rodrigues, Eliziário Toledo e Raul Silva Telles
Objetivo:
Discutir a proposta de alteração do Código Florestal aprovada na Câmara Federal e em
discussão no Senado.
Para discutir o tema foram convidados quatro
expositores, representando os setores empresarial,
acadêmico e da sociedade civil: Elizabeth de
Carvalhaes, presidente executiva da Associação
Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa); Ricardo
Ribeiro Rodrigues, professor titular do Departamento
de Ciências Biológicas da Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade
de São Paulo (USP); André Nassar, diretor-geral do
Instituto de Estudos do Comércio e Negociações
Internacionais (Icone) e coordenador da RedeAgro;
Eliziário Toledo, assessor de meio ambiente da
Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Agricultura (Contag). A moderação do painel foi
conduzida por Raul Silva Telles do Valle, coordenador
adjunto do Programa de Política e Direito
Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA).
A proposta de alteração do Código Florestal, aprovada
na Câmara, chegou ao Senado com os mesmos
dilemas que causaram meses de debates acalorados
principalmente entre ruralistas, ambientalistas
e governo. A expectativa dos debatedores e do
público é de que nos próximos meses se viabilize a
construção de uma proposta que contemple alguns
dos pontos mais polêmicos da lei, como as Áreas
de Reserva Legal (ARLs), as Áreas de Preservação
Permanente (APPs), a anistia das multas aplicadas
até 2008 e a dispensa da reposição florestal de
áreas inferiores a quatro módulos fiscais.
Diante desses dilemas, e considerando a
contraposição de duas visões sobre o crescimento
da produção agropecuária baseada, por um lado, na
incorporação de novos territórios (base do argumento
dos grupos de apoio à nova legislação) e, por outro
lado, na expansão da produtividade agropecuária
com a incorporação de ciência e tecnologia (base
da argumentação de cientistas e ambientalistas), os
participantes desse painel expuseram suas opiniões
e seu conhecimento em relação às propostas de
alteração do PL.
Durante sua apresentação, André Nassar,
coordenador da RedeAgro, defendeu a criação
de incentivos para a preservação de áreas
privadas como primordial para que o Código
seja um instrumento aplicável. A questão
do cadastro e a necessidade de legalizar as
propriedades também foram defendidas por ele.
“O Brasil precisa ter um cadastro de extensão
nacional para controlar o que acontece nas
terras. É preciso oferecer oportunidades para
agricultores entrarem na legalidade.”
Para Elizabeth de Carvalhaes, mudanças no Código
Florestal devem incorporar estímulos a propriedades
que mantêm ARLs e APPs. “Atualmente, os
incentivos econômicos são modestos. A legislação
deve permitir a compensação, seja tributária, seja
de qualquer outra forma, para tornar mais viável a
preservação das áreas de matas.”
O moderador Raul Silva Telles do Valle, por sua vez,
acredita que a legalização implica flexibilidades.
“A anistia gera uma cultura de que não é preciso
cumprir as leis ambientais. Quem desmata vai ficar
confiante de que no futuro sempre haverá uma lei
que o exima dos erros do passado.”
Outro aspecto levantado no painel diz respeito à
produtividade das terras agrícolas. Para Ricardo
Ribeiro Rodrigues, alguns pontos da reforma do
Código Florestal estão ligados também à política
agrícola nacional. “Dos 275 milhões de hectares
utilizados pelo setor produtivo rural brasileiro, 211
milhões são pastagens. E a produtividade geral por
hectare é muito baixa.” Em sua opinião, essas terras
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
14
de alta produtividade poderiam ser revertidas para a
produção de alimentos.
A questão da agricultura familiar, por sua vez, merecia
ter um capítulo à parte no texto, para Elizário Toledo.
No Código Florestal, não existe distinção entre donos
de terra de 50 mil hectares ou 10 mil hectares. “A
agricultura familiar não pode ser tratada da mesma
forma que as grandes propriedades direcionadas
para exportação”, afirmou.
Ponto comum entre os expositores: o pagamento por
serviços ambientais que geram compensações para
aqueles que ajudam a conservar a vegetação é um
instrumento que deveria fazer parte do novo texto.
Os debates também mostraram que ainda está
distante um consenso em relação aos critérios para
uso da terra e aos limites da preservação ambiental
para manutenção dos serviços ambientais e da
resiliência regenerativa dos biomas.
Comitê Paulista em Defesa das Florestas contra o
projeto do Código Florestal, que deverá entrar na
pauta do Senado ainda neste ano.
Durante o painel, foi distribuído o “Manifesto
em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento
Sustentável”, um abaixo-assinado lançado pelo
Entre os posicionamentos constantes nesse
manifesto, está o de que “devemos usar, sim,
nossos recursos naturais, mas de maneira
sustentável, ou seja, com o conhecimento, os
cuidados e técnicas que evitam sua destruição
pura e simples. Portanto, é necessário aproveitar
a discussão do Código Florestal para avançar na
construção do desenvolvimento sustentável”.
“ Atualmente, os incentivos
econômicos são modestos. A legislação
deve permitir a compensação, seja
tributária, seja de qualquer outra forma,
para tornar mais viável a preservação
das áreas de matas
”
O Comitê, que reúne 97 organizações, entre as
quais CNBB, OAB, Instituto Ethos, SOS Florestas
e CUT, e lidera a campanha nacional de
mobilização #Florestafazadiferença, convoca a
sociedade brasileira a se unir a esse desafio,
contribuindo para a promoção do debate e a
apresentação de propostas, de modo que o
Senado tenha a seu alcance elementos para
aprovar uma lei à altura do Brasil.
Durante o debate, o moderador do painel
fez a seguinte consulta ao público:
Sou favorável a usar recursos públicos para apoiar
a proteção de florestas pelos proprietários rurais?
47%
31%
6%
11%
Concordo Plenamente
Concordo Parcialmente
Foto: Marcio Bulhões+
Sem opinião
Discordo Parcialmente
Discordo
Elizabeth de Carvalhaes
5%
15
Foto: Marcio Bulhões+
Empresas e direitos humanos
Da esquerda para a direita: Antonio Jacinto Matias, Juliana Monteiro, Liesel Filgueiras e Caio Magri
Objetivo:
Realizar um debate sobre as responsabilidades e oportunidades do setor empresarial para o
respeito e a promoção dos direitos humanos.
Participaram do debate a advogada da área de
responsabilidade social do escritório Mattos Filho
Advogados, Juliana Monteiro; Liesel Filgueiras,
gerente-geral de responsabilidade social
corporativa da Vale; Caio Magri, gerente executivo
de políticas públicas do Instituto Ethos; e como
moderador Antonio Jacinto Matias, vice-presidente
da Fundação Itaú Social e diretor executivo do
Instituto Itaú Cultural. Também foram convidados
para o debate a ministra dos Direitos Humanos,
Maria do Rosário, e o reitor da Universidade Zumbi
dos Palmares, José Vicente, que infelizmente não
puderam comparecer por problemas no tráfego
aéreo no dia.
No contexto social e político brasileiro de
crescimento econômico e de avanços no campo
social, os desafios para a garantia dos direitos
humanos de boa parte da população ainda são
enormes, e as empresas podem assumir um
papel fundamental e protagonista nessa agenda,
como adotar uma postura preventiva em relação
a possíveis violações de direitos humanos e uma
postura proativa no combate ao trabalho escravo
nas cadeias de valor e na promoção da diversidade
no quadro de funcionários.
A advogada Juliana Monteiro, que esteve
envolvida no desenvolvimento do trabalho do
representante especial das Nações Unidas para
o tema Empresas e Direitos Humanos, John
Ruggie, realizou uma introdução a respeito do
tema, trazendo o histórico das discussões sobre
as responsabilidades e o papel das empresas
sobre os direitos humanos. Esse debate veio à
tona na década de 1990, quando a atuação e
o poder de empresas multinacionais em todo
o mundo ganharam grande dimensão, com o
faturamento de algumas delas maiores que o PIB
de diversos países.
De lá para cá, houve alguns avanços nessa
temática, com o surgimento de iniciativas das
empresas para a promoção da responsabilidade
social e seu envolvimento em agendas importantes
em todo o mundo. No âmbito das Nações Unidas,
as principais ações foram a criação do Pacto Global
e a instituição do mandato de John Ruggie como
representante especial para o tema, originando o
relatório que estabelece padrões internacionais
para o escopo das responsabilidades das empresas
em relação ao respeito aos direitos humanos em
todo o mundo.
Juliana também destacou a importância de
as empresas estarem atentas aos tratados e
convenções internacionais de direitos humanos,
desenvolvendo políticas e práticas para cumpri-los
em sua atuação, monitorando constantemente seus
impactos negativos e riscos, com a garantia do
acesso de eventuais vítimas a mecanismos eficazes
de remediação.
Já a intervenção de Liesel Filgueiras trouxe o olhar do
setor empresarial, em especial o da Vale, para essa
temática. A companhia vem trabalhando ativamente na
promoção dos direitos humanos. Participou, inclusive,
de um grupo-piloto de empresas para aplicação dos
princípios do John Ruggie. Liesel falou a respeito
das políticas e práticas da Vale para o respeito aos
direitos humanos, tendo em vista a necessidade do
envolvimento de todos na empresa, desde a alta
direção até os funcionários na ponta da operação.
Liesel deu destaque para a recém-implementada
política de direitos humanos da Vale, com
desdobramentos na capacitação de todos os
funcionários para que a apliquem no desempenho de
suas funções. Também citou o trabalho desenvolvido
para diminuir o número de seguranças armados da
empresa e a capacitação desses funcionários para
o respeito aos direitos humanos em sua atuação na
proteção do patrimônio. Liesel também apresentou
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
16
as políticas para avaliação prévia dos impactos
negativos e riscos para a instalação de novos
empreendimentos, bem como para a atuação da
empresa em comunidades tradicionais e indígenas.
Caio Magri trouxe um olhar da sociedade civil para
o tema, por meio da agenda com a qual o Instituto
Ethos vem trabalhando desde sua fundação, como
o combate ao trabalho escravo e as iniciativas,
em parceria com a Inter-American Foundation
(IAF), para a promoção da diversidade de raça e
gênero dentro das empresas, com a publicação
de estatísticas e guias para adoção de práticas
empresariais nesses temas.
Também apresentou o Grupo de Trabalho
Empresas e Direitos Humanos, iniciativa que
aglutinará os esforços da organização nesse
tema e será focada no desenvolvimento de
“ As empresas podem assumir um
papel fundamental e protagonista nessa
agenda, como adotar uma postura
preventiva em relação a possíveis
violações de direitos humanos e uma
postura proativa no combate ao trabalho
escravo nas cadeias de valor e na
promoção da diversidade no
quadro de funcionários
”
práticas empresariais e na influência de políticas
públicas para o respeito aos direitos humanos
e, especificamente, na promoção da agenda do
trabalho decente. Participam atualmente do GT
as empresas BP, CPFL Energia, Eletrobras, Itaú
Unibanco, Mattos Filho Advogados, Santander,
Syngenta, Wilson Sons e Vale.
No debate realizado entre os palestrantes, discutiuse a importância de as empresas respeitarem os
direitos humanos mesmo em contextos políticos
em que o estado democrático de direito é falho,
ou mesmo inexistente. Juliana citou o caso da
Toyota em Mianmar (antiga Birmânia). Ao realizar
a avaliação prévia dos impactos negativos e
riscos para a implantação de suas operações no
país, a empresa decidiu suspender o projeto, pelo
alto risco de envolvimento com graves violações
de direitos humanos, já que o país vive sob um
regime ditatorial severo.
Foto: Fernando Manuel
Também se discutiu a necessidade de promoção
da diversidade nas empresas, sobretudo
no Brasil, onde a população negra enfrenta
grande dificuldade de acesso a melhores
cargos e salários no mercado de trabalho.
Os debatedores chegaram ao consenso de
que as empresas podem desempenhar papel
fundamental na promoção da equidade e
inclusão das pessoas negras, combatendo o
preconceito e desenvolvendo ações positivas
nos processos de contratação e de gestão de
pessoas dentro das organizações.
Liesel Mack Filgueiras
17
As perguntas feitas à plateia trouxeram igualmente contribuições quanto ao papel das empresas em relação aos direitos humanos.
A maior parte do público presente ao debate acredita que políticas públicas mais robustas são necessárias para regulamentar a
atuação das empresas, como pode ser observado nas pesquisas a seguir, realizadas com o público:
As empresas brasileiras deveriam ser obrigadas a
prestar contas à sociedade, tornando públicas suas
políticas e práticas de promoção dos direitos humanos nos negócios?
77%
A existência de um estado democrático é précondição para se exigir das empresas políticas e
práticas de respeito dos direitos humanos?
50%
14%
3%
49%
5%
3%
A posição do Brasil em relação aos direitos humanos
comparativamente ao cenário global é:
47%
34%
8%
2%
3%
2%
3%
Concordo Plenamente
Concordo Plenamente
Excelente
Concordo Parcialmente
Concordo Parcialmente
Boa
Sem opinião
Sem opinião
Ruim
Discordo Parcialmente
Discordo Parcialmente
Péssimo
Discordo
Discordo
Quando eu tomo conhecimento da violação de algum
direito, atuo, procurando uma solução?
Qual é o impacto potencial do legislativo em relação
às empresas na questão dos direitos humanos?
38%
22%
47%
Sim
Não
34%
26%
12%
6%
Nossa legislação é suficiente para orientar a atuação
das empresas em relação aos direitos humanos?
13%
2%
Muito grande
Sempre
Grande
As vezes
Moderado
Raramente
Pequeno
Nunca
Nulo
22%
78%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
18
Foto: Clóvis Fabiano
Financiamento da nova economia
Da esquerda para a direita: Luiz Ros, Reginaldo Ferreira Alexandre, Marco Antônio Fujihara e Antônio Moraes Neto
Objetivo:
Debater os tipos de ação com os investidores, os programas de fomento e as políticas de
incentivo e crédito que ampliam a competitividade e os investimentos em novos modelos de
negócio, bem como as tecnologias e produtos de uma economia includente, verde e responsável.
O painel contou com os seguintes palestrantes:
Antônio Moraes Neto, sócio e cofundador da
Vox Capital; Luiz Ros, gerente de oportunidades
para a maioria do Banco Interamericano de
Desenvolvimento; Marco Antônio Fujihara, diretor da
Keyassociados; e moderação de Reginaldo Ferreira
Alexandre, presidente da Apimec São Paulo.
As instituições financeiras têm um papel decisivo
na transição para uma nova economia, criando
serviços financeiros que estimulem a inovação,
a sustentabilidade e a inclusão social. Avanços
importantes já foram dados pelos bancos brasileiros
nessa direção. O mercado financeiro brasileiro é um
dos menos vulneráveis do mundo e já incorpora
padrões internacionais de sustentabilidade. Mas há,
por outro lado, um grande desafio a ser superado:
as elevadas taxas de juros do país. Qual o melhor
caminho para financiar a nova economia foi o tema
desse painel.
O debate ocorreu num contexto de grandes
expectativas quanto ao futuro das economias
globais. A crise econômica dos países europeus e
as dificuldades políticas e econômicas nos Estados
Unidos já colocam a economia brasileira em
dificuldades. Esse cenário reforça a importância
da discussão sobre uma nova economia e sobre o
papel das instituições financeiras.
Para Antônio Moraes, uma das principais conclusões
do debate é que instituições financeiras podem dar
uma grande contribuição para a inclusão social.
Para Luis Ros, um dos maiores desafios é a
busca de novos modelos de negócios para
incluir a população mais vulnerável. O estímulo
a “negócios inclusivos” é um dos caminhos que
estão sendo apoiados pelo Banco Interamericano
de Desenvolvimento (BID).
As instituições financeiras precisam inovar.
Pequenos empreendimentos necessitam de outros
serviços, além de empréstimos. como garantias
parciais de crédito, consultoria, capacitação. Em
Guarulhos, por exemplo, o grupo Tenda Atacado,
com financiamento do BID, oferece crédito e
capacitação para pequenos empreendedores de
produção de alimentos das classes D e E. Outro
exemplo são as Empresas Públicas de Medellín, que
investem em eficiência energética para populações
de baixa renda, o que ajuda a minimizar impactos
ambientais negativos e, ao mesmo tempo, a reduzir
custos para as famílias.
Marco Fujihara mostrou como a abordagem
multistakeholder é essencial na geração de
valor para os negócios e para a sociedade. É
possível alinhar os negócios ao desenvolvimento
de uma nova economia, com inclusão social
e sustentabilidade. Além disso, ele ressaltou
a importância da criatividade, da inovação e do
desenvolvimento de novos produtos.
Pequenos fundos também estão indo nessa direção,
caso do Vox Capital, apresentado por um de seus
fundadores e sócio, Antonio Moraes Neto. O fundo
de impact investing está investindo na rede de lan
houses CDI Lan e transformando-as em centros de
inclusão digital, formação profissional e acessos a
serviços financeiros para baixa renda. A empresa
faz parceria com o Itaú, para as lan houses
atuarem como correspondentes bancárias e ofertar
crédito, microcrédito e crédito consignado; com a
Microsoft, para oferecer pacotes Office com preço
diferenciado, que consegue gerar maior inclusão
digital; e com a Coca-Cola, para fazer qualificação
profissional de jovens das comunidades.
Essa experiência é um exemplo prático do conceito
19
desenvolvido por Antônio Moraes e seus colegas
da FGV, o conceito de setor dois e meio, um novo
segmento que surja da aproximação de empresas
com ONGs, superando a grande dificuldade que
tem o terceiro setor de conseguir escala para
impactos sociais positivos, seja por causa do modelo
econômico, seja pela falta de modelo econômico na
gestão das organizações sociais. Segundo o sócio
da Vox Capital, é possível causar impacto social na
redução da pobreza e ter, ao mesmo tempo, um
modelo de negócio lucrativo.
Esse é um dilema, no entanto, constantemente
presente nos fundos privados. É preciso desenvolver
mecanismos capazes de alinhar o retorno financeiro
ao desempenho social. A Vox Capital criou uma
forma de atrelar a taxa de sucesso como gestora
“ As instituições financeiras têm
um papel decisivo na transição para
uma nova economia, criando serviços
financeiros que estimulem a inovação, a
sustentabilidade e a inclusão social
”
do fundo ao impacto social e ao retorno financeiro.
A taxa de sucesso está relacionada tanto com o
retorno financeiro quanto com o impacto social do
fundo. No caso do Climate Investment Fund, está
ligada às reduções de dióxido de carbono.
Um dos problemas levantados no debate é a baixa
penetração do microcrédito. O Brasil conta com um
dos melhores sistemas bancários do mundo em
termos tecnológicos, de eficiência e de capilaridade,
mas tem 40 milhões de pessoas que estão excluídas
do acesso a uma conta bancária, ao crédito.
Fortalecer parcerias entre setor público, empresas
privadas e comunidades pode ser um caminho para
ampliar os impactos sociais positivos e a escala dos
investimentos em negócios inclusivos e sociais.
Apesar de existirem iniciativas privadas bemsucedidas de investimentos em negócios
inclusivos no Brasil, para a maioria dos
participantes do painel, o governo tem um
papel decisivo.
Durante o debate entre os expositores,
o moderador do painel fez a seguinte
pergunta:
Qual é a influência de subsídios governamentais nos
negócios sociais e inclusivos?
31%
28%
25%
13%
3%
Muito Grande
Grande
Moderado
Foto: Clóvis Fabiano
Pequeno
Nulo
Luiz Ros
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
20
Foto: Clóvis Fabiano
Energia
Da esquerda para a direita: Pedro Bara Neto, Ildo Luis Sauer, Marcelo Furtado, Augusto Rodrigues e Ricardo Abramovay Antônio Moraes Neto
Objetivo:
Refletir sobre a matriz energética que melhor explora o potencial das fontes limpas e renováveis
do Brasil e, ao mesmo tempo, atende à demanda energética necessária para sustentar o
crescimento da economia.
Para discutir o tema foram convidados quatro
debatedores, que apresentaram distintas visões
sobre o tema e participaram de uma discussão
moderada por Pedro Bara Neto, líder da estratégia
de infraestrutura da Iniciativa Amazônia Viva, da rede
WWF. O diálogo iniciou-se com Augusto Rodrigues,
do Grupo CPFL Energia, que expôs o ponto de vista
empresarial na transição para modelos de geração
cada vez menos emissores e mais includentes. Em
seguida, Ildo Luis Sauer, do Instituto de Eletrotécnica
e Energia da USP, discutiu a demanda brasileira
vis-à-vis um modelo de crescimento includente e
verde. Logo após, Marcelo Furtado, do Greenpeace
Brasil, provocou, com o ponto de vista do movimento
ambientalista sobre a matriz e o potencial energético
brasileiro. Por último, o painel de Energia contou com
o esclarecimento de Ricardo Abramovay, da FEA/
USP, que tratou do novo momento da economia,
menos intensivo em energia tanto nos processos
produtivos quanto nos hábitos do consumidor.
O painel aprofundou as discussões sobre a nova
economia a partir de reflexões sobre as mudanças
necessárias nos modelos de produção, consumo e
regulação energética no país, de modo a garantir a
manutenção do equilíbrio da matriz energética total e
a ampliação do potencial renovável da matriz elétrica.
Como o Brasil poderia explorar o potencial das fontes
limpas e, ao mesmo tempo, atender à demanda
energética necessária para sustentar o crescimento da
economia? Para isso, é preciso enfrentar a questão
do diálogo entre os vários atores na discussão e
implementação de estratégias energéticas.
Em um mundo no qual a matriz energética
total é 80% derivada de fontes fósseis, o Brasil
desponta com uma matriz energética total
47% renovável e uma matriz elétrica com 83%
de composição renovável. Além disso, o país
tem um amplo potencial de crescimento nas
principais fontes renováveis (hidrelétrica, eólica,
solar e de bioeletricidade) e tecnologia própria
em biocombustíveis. Nossas matrizes energéticas
total e elétrica representam, portanto, importante
diferencial competitivo, tornando os produtos
brasileiros mais “limpos” e, dessa forma, mais
desejados no mercado internacional.
Expandir a oferta de energia – atendendo ao
crescimento dos mercados interno e externo –,
manter e ampliar o aspecto renovável das matrizes
e assegurar a modicidade tarifária são desafios para
o país. Os viabilizadores desse novo desenho são
a ampliação dos estímulos regulatórios e fiscais à
geração de energias renováveis e o aprofundamento
do diálogo nacional sobre qual matriz energética
queremos e podemos ter.
Interesses e visões das diversas esferas
governamentais, do setor privado e dos movimentos
sociais e ambientalistas precisam ser debatidos
com a frequência e profundidade exigidas por esse
tema, central e decisivo para o país e para o mundo.
Monitorar o carbono na cadeia produtiva, investir
em eficiência energética e no consumo consciente,
conquistar políticas tecnológicas inovadoras,
mobilizar a sociedade e estimular as mudanças
culturais e comportamentais necessárias são alguns
elementos essenciais que só serão atingidos por
meio desse imprescindível diálogo.
As exposições e debates evidenciaram que a
questão que mais preocupa é como manter as
altas porcentagens brasileiras de matriz energética
renovável nas próximas décadas. Augusto Rodrigues
aponta três principais desafios para o tema. O
primeiro considera o preço da energia, que é, em
média, o dobro do preço da energia mundial e pode
prejudicar a vantagem competitiva do Brasil, levando
21
empresas energeticamente intensivas a buscar
outros países para suas operações. O segundo
desafio é suprir a demanda por energia, um bem
que permite acesso a todos os outros, das classes
sociais emergentes, e vem sendo viabilizado, na atual
condição brasileira, por um sistema hídrico-térmico.
Pedro Bara Neto apontou também o avanço que essa
demanda está forçando na Amazônia, onde são feitas
licitações, caso a caso, de hidrelétricas, sem uma
visão integrada. Por conta dessa pressão em relação
às hidrelétricas, empresas de energia como a CPFL
tiveram de “investir em térmicas por segurança. Mas
é bom frisar: há grande capacidade de geração
Na questão da crescente demanda
por energia, Furtado defende uma
diversificação da matriz brasileira,
descentralizando-a e pulverizando-a,
tecnológica e regionalmente, criando um
sistema seguro e confiável
a partir da biomassa de cana, que poderia ser
estimulada pelo governo”, explicou Rodrigues. Isso
o levou a abordar o terceiro desafio: a questão dos
estímulos governamentais às energias renováveis, que
direcionariam o fornecimento de energia brasileiro.
Para Marcelo Furtado, no entanto, esses desafios
representam oportunidades para o país. Ele adiciona
o aspecto cidadania ao debate, lembrando a audiência
de seu papel como consumidor responsável e influente
nas decisões políticas nacionais, que incluem a
discussão do preço da energia. Na questão da
crescente demanda por energia, Furtado defende uma
diversificação da matriz brasileira, descentralizando-a
e pulverizando-a, tecnológica e regionalmente, criando
um sistema seguro e confiável.
Sauer apontou dados do IBGE que preveem a
estabilização da população em cerca de 220
milhões de brasileiros em 2043. Dobrando o
consumo energético atual, o Brasil poderá atender
a essa demanda com 70% do potencial hidráulico
remanescente e 50% do potencial eólico, cujos
custos são decrescentes. “De maneira que,
complementando hidráulica com eólica e com
cogeração de bagaço de cana, de outras fontes
térmicas como gás natural e outros resíduos da
biomassa, poderíamos manter a trajetória de
sustentabilidade”, complementou. Marcelo Furtado
foi além, apresentando relatórios de sua organização
que projetaram uma matriz brasileira para 2050.
Levando em consideração as tecnologias existentes
hoje, essa matriz asseguraria ao país 92% de
energia renovável em meados deste século.
Para Furtado, faltam no Brasil “visão e ambição
energéticas”. Em sua opinião, o país é capaz de
se colocar em uma posição de liderança no tema,
contando, para isso, com políticas públicas que
garantam ao consumidor o poder de escolha de sua
fonte de energia e com indutores estaduais, por meio
do BNDES. “Do mesmo jeito que na década de 70
se falava que a paz era o debate mais importante
para a sobrevivência da raça humana, hoje eu diria
que o meio ambiente é o grande paradigma de
sobrevivência da sociedade”, finalizou Furtado.
Procurando envolver os participantes
no debate, o moderador elaborou as
seguintes perguntas:
Você gostaria de ter liberdade de decidir de quem
comprar sua energia elétrica(fornecedor/fonte)?
Sim
Não 0%
100%
Você acha de o Brasil deve autorizar a exploração de
petróleo em Abrolhos
Sim
Não
10%
90%
Foto: Clóvis Fabiano
Deve-se coordenar o ritmo de produção de petróleo
com os investimentos em educação. saúde e preservação de meio ambiente?
Sim
Não
Marcelo Furtado
92%
8%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
22
Foto: Clóvis Fabiano
Biodiversidade
Da esquerda para a direita: José Luciano Penido, Cláudio Maretti, Helena Pavese, Rodolfo Guttilla e Manoel da Cunha
Objetivo:
Identificar as contribuições que as empresas e as organizações dos trabalhadores e da sociedade
civil podem dar para o aperfeiçoamento das políticas públicas e a implementação no Brasil dos
objetivos e metas para 2020 do Plano Estratégico da Convenção da Biodiversidade (CDB).
Para discutir o tema, estavam presentes a gerente de
política ambiental da Conservação Internacional (CI),
Helena Pavese, e o líder da Iniciativa Amazônica do
WWF, Cláudio Maretti, que fizeram uma apresentação
inicial de contextualização e problematização do
tema. Em seguida, com a moderação de José
Luciano Penido, três convidados debateram
as oportunidades e desafios colocados para a
conservação e o uso sustentável da biodiversidade
e deram contribuições para o aperfeiçoamento das
políticas públicas e a implementação no Brasil das
Metas de Aichi. Foram eles: o secretário nacional
de Florestas e Biodiversidade do Ministério do Meio
Ambiente (MMA), Bráulio Dias; o presidente do
Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), Manoel
da Cunha; e o diretor de assuntos corporativos e
relações governamentais da Natura, Rodolfo Guttilla,
representando o Movimento Empresarial pela
Biodiversidade (MEB) e o setor empresarial.
Nesse sentido, foram previamente encaminhadas aos
palestrantes algumas perguntas. Qual é o impacto do
novo Código Florestal no cumprimento dos objetivos e
metas desse plano? Quais são os avanços das atuais
políticas públicas? Como reduzir os impactos das
atividades tradicionais (agricultura, pecuária, silvicultura
e piscicultura) sobre as florestas e os ecossistemas?
Como aumentar a competitividade das atividades
econômicas que promovam a conservação e o uso
sustentável da biodiversidade? Como dar escala às
iniciativas de pagamento dos serviços ecossistêmicos?
Que boas práticas devem ser disseminadas?
No Brasil, país detentor da maior floresta tropical ainda
preservada, com cerca de 20% de toda a diversidade
de vida da Terra, a valoração da biodiversidade
desponta como um dos principais desafios do modelo
econômico atual. Incorporar a biodiversidade como
valor, inseri-la nos processos econômicos e mediar
os conflitos entre a preservação e os múltiplos usos
do solo são questões estratégicas na transição para
uma nova economia includente, verde e responsável.
Para tanto, é essencial conjugar as políticas
relacionadas à conservação e ao uso sustentável da
biodiversidade com as demandas de crescimento
econômico, por meio da redução de impactos
ambientais negativos, do aumento da competitividade
de atividades sustentáveis e da precificação de
serviços ecossistêmicos. Esse painel dedicado
à Biodiversidade buscou, assim, identificar os
desafios e dilemas a serem equacionados para
o aperfeiçoamento das políticas públicas e a
implantação no Brasil das Metas de Aichi. No debate,
foram considerados dilemas como os impactos do
novo Código Florestal, das atividades tradicionais
(agricultura, pecuária, silvicultura e piscicultura)
e da construção de barragens, para geração de
eletricidade, sobre as florestas e os ecossistemas.
Esse painel consolidou a importância da criação de
metas nacionais sobre biodiversidade, cinco dias após
o encontro de líderes empresariais de todo o país
com representantes do governo na primeira reunião
setorial dos Diálogos sobre Biodiversidade: Construindo
a Estratégia Brasileira para 2020. Essa iniciativa tem
como objetivo a nacionalização das Metas de Aichi,
bem como a necessidade de o setor privado e a
sociedade assumirem compromissos frente ao tema.
Para o secretário do MMA, Bráulio Dias, a sociedade
ainda não possui consciência da gravidade do
processo de colapso da biodiversidade, como a perda
de florestas, do solo, dos recursos pesqueiros ou da
oferta de água. Em suas próprias palavras: “Somos
o ‘G1’ da biodiversidade, mas estamos dilapidando
esse potencial, em vez de darmos centralidade ao
tema, com incentivos econômicos corretos.” As
Metas de Aichi são um importante referencial para o
23
futuro, mas devem ser internalizadas por todos.
Helena Pavesi, da CI, lembra que essa incompreensão
resultou na perda de 35% dos mangues do planeta,
na total extinção das florestas em 25 países e na
completa degradação de 50% das áreas úmidas
da Terra. Do mesmo modo, 30% dos recifes de
corais do mundo chegaram a um ponto em que a
recuperação é impossível.
“ Somos o ‘G1’ da biodiversidade, mas
estamos dilapidando esse potencial, em
vez de darmos centralidade ao tema,
com incentivos econômicos corretos
”
Na opinião de Cláudio Maretti, “o modelo que temos
hoje é contra a biodiversidade, e tanto o governo
como as empresas deveriam olhar a biodiversidade
como uma oportunidade de negócio”. O líder da
Iniciativa Amazônica do WWF enumerou providências
básicas e urgentes: investimento no desenvolvimento
do valor econômico da floresta e dos ecossistemas,
mecanismos de compensação para quem não
desmata (item que o Código Florestal não prevê),
além da valorização dos ativos da floresta. E mostrou-
se otimista em toda a sua participação, afirmando
que o Brasil é o país que mais reduziu emissões de
carbono associadas ao desmatamento, o que nos
leva a prever desmatamento zero até 2020.
Rodolfo Gutilla, representante do MEB, afirmou que
o evidente valor da biodiversidade para o bemestar humano e as vantagens competitivas do
Brasil para o desenvolvimento sustentável não são
acompanhados de mecanismos de incentivo ao
uso dessa biodiversidade no país. Criticou a atual
Medida Provisória (MP) 2.186-16/01, de acesso ao
patrimônio genético, e a morosidade dos processos
de autorização. “Enquanto se estima haver 1,8 milhão
de espécies no Brasil, o Conselho de Gestão do
Patrimônio Genético liberou somente 25 autorizações
de acesso em 2010. Como explicar aos acionistas
que o governo leva 17 meses para aprovar uma
autorização de acesso ao cacau ou à andiroba?”
Após essa análise, Rodolfo ficou entusiasmado com
a manifestação do secretário Bráulio Dias, que disse
reconhecer que a legislação brasileira está a merecer
um item específico que contemple o acesso das
empresas ao patrimônio genético.
A relação entre negócios e biodiversidade vem
sendo internalizada pelas empresas, segundo
Helena Pavese, que citou estudo da consultoria
McKinsey: 53% dos CEOs de grandes empresas se
preocupam com as perdas de biodiversidade. “Mas
essas organizações devem trabalhar no sentido
de identificar seus impactos negativos, gerenciar
riscos e abraçar as oportunidades em conjunto com
outros setores.” E revelou, como bons exemplos, que
empresas como a Coca-Cola já se comprometem a
retornar à natureza a quantidade de água equivalente
à usada em suas bebidas e a Danone pretende
alcançar a neutralização do carbono embutido na
maioria de seus produtos até final de 2011. Apenas
29% das empresas presentes na plateia (gráfico ao
final) sempre consideram a biodiversidade em suas
operações/investimentos, demonstrando que, apesar
dos avanços e da preocupação com as perdas, ainda
há um longo caminho para que a biodiversidade seja
integrada à estratégia de negócios da maior parte
das empresas. O desafio é assegurar que o valor dos
recursos naturais e dos serviços ecossistêmicos seja
considerado na contabilidade nacional e global, bem
como na gestão financeira da produção.
Foto: Clóvis Fabiano
Para Manoel Cunha, do CNS e morador da Resex
Médio Juruá, a manutenção da biodiversidade
é determinante para os povos da floresta, que
dependem dos recursos naturais para sua
sobrevivência. Daí a importância de políticas públicas
voltadas “aos 80% do território amazônico protegidos
pelo Código Florestal, e não aos 20% desmatados
para atividades econômicas convencionais”. Cunha
ressaltou ainda que atividades conservadoras da
floresta mereceriam maior valor na economia e
nas políticas públicas. O desafio é encontrar valores
econômicos que contemplem a sobrevivência das
populações extrativistas e representem vantagem
para investidores. ”O extrativista é um caboclo que
depende não só de políticas públicas, mas precisa de
orientações técnicas diferenciadas sobre como lidar
com as culturas, precisa aprender a tratar com os
mercados e obter compensações para desenvolver
uma atividade em harmonia com o meio ambiente”,
afirmou Cunha.
Braulio Dias
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
24
O moderador fez ainda as seguintes perguntas ao público:
Qual será o impacto do plano estratégico sobre
biodiversidade na competitividade da economia
brasileira?
Devemos ser ambiciosos e propor desmatamento
ZERO para o Brasil?
Você concorda com Chico Whitaker: é necessária
uma mudança mais radical do que um economia
includente, verde e responsável?
0%
31%
43%
46%
56%
17%
2%
38%
34%
0%
6%
7%
0%
Muito grande
Concordo Plenamente
Muito grande
Grande
Concordo Parcialmente
Grande
Moderado
Discordo Parcialmente
Moderado
Pequeno
Sem opinião
Pequeno
Nulo
Discordo
Nulo
Sua empresa / organização considera aspectos de
biodiversidade nas suas operações / investimento
20%
0%
Você ou sua empresa tem interesse em participar
da definição de metas de biodiversidade no Brasil
para 2020?
Você estaria disposto a pagar mais por um produto
que tenha menos impacto no meio ambiente?
34%
Sim
Não
29%
14%
Sempre
As vezes
Raramente
Nunca
23%
91%
9%
Sim
Não
81%
19%
25
Foto: Fernando Manuel
Resíduos sólidos
Da esquerda para a direita: Fernando von Zuben, Henrique Lian, Márcio Quintino, Silvano Silvério, Edison Castro Martins, Roberto Laureano da Rocha, Eugênio Deliberato e Lucien Belmonte
Objetivo:
Tratar dos principais desafios para a implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos
(PNRS) e discutir questões relacionadas à viabilização dos acordos setoriais para estabelecer a
logística reversa e como efetivar a coleta seletiva e a reciclagem nos municípios.
Para discutir esse tema foram, inicialmente,
convidados quatro expositores, que apresentaram
os principais desafios para a implantação da PNRS,
em um debate mediado por Henrique Lian, gerente
executivo de relações institucionais do Instituto
Ethos. Os expositores foram Eugênio Deliberato, da
Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos,
sobre os avanços e dificuldades do setor de pneus;
Fernando von Zuben, da Tetra Pak América Latina,
com a visão da indústria de embalagens; Lucien
Belmonte, da Associação Técnica Brasileira das
Indústrias Automáticas de Vidro, que abordou a
questão do vidro sob a perspectiva da PNRS; e
Márcio Quintino, da Philips do Brasil, com os desafios
à logística reversa de pilhas, baterias e lâmpadas.
Em um segundo momento, quatro debatedores
comentaram as exposições, estabelecendo um
diálogo construtivo e esclarecedor a partir da
experiência em sua área de atuação. Edison Castro
Martins, da Confederação Nacional dos Municípios,
apresentou os desafios para a gestão municipal
de resíduos sólidos; Vitor Bicca, do Compromisso
Empresarial pela Reciclagem, a visão empresarial
sobre as oportunidades e desafios da nova política;
Roberto Laureano da Rocha, do Movimento Nacional
dos Catadores de Materiais Recicláveis, a visão dos
catadores e a importância da colaboração entre as
partes envolvidas no processo; e Silvano Silvério, do
Departamento de Ambiente Urbano do Ministério do
Meio Ambiente, a visão do governo.
Empresas, governos e consumidores têm o
desafio de entender o que significa o termo
“responsabilidade compartilhada”, presente na
nova Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS),
que precisa de um forte empenho coletivo para
sua plena implantação. Para atingir os objetivos
da lei, será necessário que todos os envolvidos
contribuam com ações para estabelecer a logística
reversa para o destinamento correto de todas as
classes de resíduos para a reciclagem.
A nova lei exige que, no prazo de dois anos, sejam
elaborados planos de resíduos sólidos em âmbitos
nacional, estadual e municipal, que erradiquem os
lixões. Esses planos devem apresentar metas de
redução, reutilização e reciclagem. E a logística
reversa deve ser estruturada de forma independente
do serviço de limpeza urbana. Contudo, a nova
legislação prevê acordos setoriais com governos para
ampliação da coleta seletiva e ainda a possibilidade
de remuneração do setor público pelas empresas,
caso o Poder Executivo se disponha a operar o
retorno dos materiais ao ciclo produtivo.
A PNRS também prevê a integração dos catadores
de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações
que envolvam a responsabilidade compartilhada
pelo ciclo de vida dos produtos, assim como
instrumentos de incentivos à criação e ao
desenvolvimento de cooperativas nessa área. Uma
das expectativas é que essa estrutura se converta
em um verdadeiro negócio, capaz de oferecer
ganhos de capital e benefícios trabalhistas,
econômicos e sociais a toda a cadeia.
Durante o debate, os expositores trataram das
principais questões de viabilização do acordo setorial
para implementar a logística reversa nas cidades
brasileiras. O balanço geral sobre a PNRS foi positivo,
a começar pelo caráter participativo de elaboração
dessa legislação.
No entanto, Eugênio Deliberato destacou que “o
comprometimento da sociedade como um todo é
o segredo e, ao mesmo tempo, no caso brasileiro,
o gargalo para implementar a logística reversa
nos municípios”. Roberto Laureano da Rocha vê
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
26
justamente nesse aspecto o grande mérito da
lei, mas garante que a aprovação da política
complicou a situação dos catadores. Apresentou
um dado preocupante: “quase 30% dos
municípios não dispõem de catadores, que são
um ator fundamental para a logística reversa.”
O Ministério do Desenvolvimento Social estima
haver hoje um contingente entre 300 mil e
1 milhão. Mais de 80 mil estão incluídos em
cooperativas ou associações, condição para
fazer parte do processo. A dificuldade está
em organizar o restante. Entendendo que o
catador é o gerenciador oficial da logística
reversa, Rocha declarou que “somos os
atores principais no recolhimento de material
reciclável e atuamos no processo como agentes
ambientais. Recolhemos gratuitamente e
precisamos receber por isso”.
“ Quase 30% dos municípios
não dispõem de catadores, que
são um ator fundamental para a
logística reversa
”
Também o custo de todo o procedimento causa
preocupação. “É preciso pensar em todas as
etapas, como a coleta, a separação do lixo em
sua origem, beneficiando a produção”, afirmou
Lucien Belmonte, chamando a atenção para o
fato de esse processo, além de implicar um
custo alto, não ser algo simples, principalmente
a depender do segmento em que ocorra. “Tem
de haver uma política municipal forte uma
condução mais enérgica e efetiva do Ministério
do Meio Ambiente.”
Foto: Marcio Bulhões
No aspecto próprio da produção final na logística
reversa, Victor Bicca reivindica “competição
igualitária no mercado, com regras aplicadas a todos:
fabricantes, importadores, comércio, varejo”. Ao que
Fernando von Zuben acrescenta a necessidade de
justiça tributária sobre produtos recicláveis: “Se uma
garrafa é jogada no lixo, tem-se impacto ambiental;
se é reciclada, cabe a toda a cadeia pagar, pois há
custos. Não há mágica, mas matemática”.
Roberto Laureano da Rocha
27
Organizar mais de 5 mil municípios, muitos
deles com menos de 40 mil habitantes, é
outro grande desafio. O público presente foi
instado a dizer se concorda com o fato de as
coletas serem assumidas pelos municípios:
21% manifestaram-se favoráveis, 42% apenas
parcialmente e o restante de modo negativo.
Edison Castro Martins foi um dos contrários.
Essa obrigação, a seu ver, seria do setor
industrial, que gerou esses produtos. “Se forem
obrigados a esse custeio, os municípios terão
de realocar recursos de áreas básicas como
educação e saúde”.
Ao ser perguntada sobre a possibilidade de
essa política gerar milhões de empregos
verdes, 87% da plateia concordou plena
ou parcialmente com a perspectiva. Victor
Bicca chamou a atenção para o fato de que
“a lei levou 20 anos para ser gestada e só
estamos com dez anos de discussões sobre
sustentabilidade”. Naturalmente, há muito
que avançar, mas, como declarou, “a própria
presença de todas essas empresas aqui,
comprometidas com o debate, demonstra estar
havendo importantes mudanças de hábitos e
discussões para que não se enverede por
projetos equivocados”.
A qualidade desse debate multissetorial
evidenciou que a sociedade civil encontra-se
em estágio de maturidade para um diálogo
complexo em torno desse tema. Uma evidência
disso foi a mudança de posicionamento da
plateia à pergunta inicial do moderador. Na
abertura do painel Henrique Lian perguntou
aos participantes se acreditam que já temos,
no Brasil, processos estruturados de diálogos
sociais que permitam a negociação dos
acordos setoriais. Apenas 13% das respostas
foram afirmativas. Após as duas horas de
exposições e discussões no painel, a mesma
pergunta foi feita. As respostas afirmativas
subiram para 56%.
As seguintes perguntas foram feitas pelo moderador ao público do painel:
A Política Nacional de Resíduos é uma das legislações mais avançadas e complexas da gestão de
resíduos sólidos do mundo. Sua implementação.
depende. por exemplo, de acordos setoriais para
a logística reversa. Você acredita que já temos, no
Brasil, processos estruturados de diálogos social que
permitam a negociação dos acordos setoriais necessários à implementação da PNRS?
Sim
Não
Como você se posiciona em relação a seguinte afirmação: “a PNRS deverá gerar milhões de empregos
verdes, como os agentes ambientais de reciclagem
e agentes ambientais selecionadores”?
77%
13%
87%
17%
2%
0%
Os municípios devem ficar com os custos para coletar, transportar e armazenar os resíduos que fazem
parte da logística reversa?
3%
Concordo Plenamente
Concordo Parcialmente
Sem opinião
Sim, totalmente
Sim, parcialmente
Não
21%
Discordo Parcialmente
69%
Discordo
10%
Posicione-se quanto à afirmação: “A queima dos
resíduos sólidos (recuperação energética) é um procedimento alternativo à logística reversa”:
35%
Quem faz a separação do lixo em sua casa?
Uma pessoa
Mais de 1 pessoa
Ninguém
23%
61%
16%
25%
34%
4%
Concordo Plenamente
Concordo Parcialmente
Sem opinião
Discordo Parcialmente
Discordo
1%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
28
Foto: Marcio Bulhões
Mudanças climáticas e os impactos na
nova economia
Da esquerda para a direita: Luiz Pinguelli Rosa, Izabella Teixeira, Jorge Abrahão, Paula Bennati e Tasso Azevedo
Objetivo:
Discutir os principais desafios para definir as metas setoriais decorrentes da implantação da Política
Nacional sobre Mudança do Clima e como atingir a meta brasileira de redução de emissões.
Para o painel foram convidados quatro
palestrantes, representando quatro iniciativas
distintas junto às empresas, apresentaram suas
respectivas visões e propostas relativas aos
desafios para a implantação da Política Nacional
sobre Mudanças Climáticas e para atingir a meta
brasileira de redução de emissões. Para esse
momento, foram convidados, David Canassa,
da Votorantim e representante do Fórum Clima;
Paula Bennati, da Confederação Nacional da
Indústria (CNI); Bárbara Oliveira, do Centro de
Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio
Vargas (Gvces); e Marina Grossi, do Conselho
Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento
Sustentável (CEBDS).
Na segunda parte, três debatedores comentaram as
exposições, trazendo suas visões e estabelecendo
um diálogo mediado por Jorge Abrahão, presidente
do Instituto Ethos. Estavam presentes a ministra
do Meio Ambiente, Izabella Teixeira; Luiz Pinguelli
Rosa, representante do Fórum Brasileiro de
Mudanças Climáticas; e Tasso Azevedo, consultor
em questões de clima, florestas e sustentabilidade.
A mudança global do clima está na pauta de
países, empresas e indivíduos como o maior
desafio do século XXI. Além de questão de
sobrevivência de espécies, incluindo a humana,
trata-se de um deflagrador de significativas
mudanças nos modelos de produção e de vida.
Ainda à espera de formas eficazes de governança
– global e local –, o tema já provocou o
surgimento de milhares de iniciativas, dispersas,
mas com alto poder de inovação e transformação,
que caminham para a consolidação de uma nova
fase da economia.
Países como o Brasil e a África do Sul representam
importante contraponto. Com sua matriz elétrica
80% renovável, e contando também com uma
das mais equilibradas matrizes energéticas totais,
o Brasil vem despontando como possível liderança
climática, especialmente após a significativa
redução de emissões por desmatamento e a
adoção de compromissos voluntários de redução
de emissões durante a COP-15 (média de 38%
até 2020). Esses avanços estão consubstanciados
na Política Nacional sobre Mudança do Clima
(PNMC), sancionada em dezembro de 2009, e
nos mecanismos de redução (NAMAS) que o país
enviou à ONU em janeiro do ano seguinte.
Para a ministra Izabella Teixeira, é preciso ter ousadia
para tratar do tema. Ela citou “três grandes desafios:
o controle do desmatamento; a definição de planos
setoriais com uma agenda convergente entre as
propostas estaduais e federal; e o mercado de
carbono.” Tasso Azevedo acrescentou aos desafios
citados pela ministra a necessidade de criação de
“um sistema robusto de monitoramento anual das
emissões e um modelo de governança que funcione”.
“Ao contrário da nossa autoimagem, não somos um
país próximo à economia de baixo carbono. Estamos
muito longe”, comentou Azevedo. Ele lembra que,
das 50 gigatoneladas de gases de efeito estufa
emitidas mundialmente, o Brasil é responsável por 2
gigatoneladas, mas precisa baixar esse total para 0,4
gigatonelada até 2050. Para ele, o desafio é dividir
a conta entre vários setores e, sobretudo, reduzir
drasticamente as taxas de desmatamento.
“Mudar profundamente os padrões de produção
e consumo talvez seja a solução. As mudanças
climáticas colocam ricos e pobres no mesmo
29
barco e, por isso, cooperar é preciso”, afirmou
Luiz Pinguelli Rosa.
“ Três grandes desafios: o controle
do desmatamento; a definição de
planos setoriais com uma agenda
convergente entre as propostas
estaduais e federal;
e o mercado de carbono
”
Marina Grossi vê com otimismo o cenário atual:
“Avançamos muito desde a COP-15. Mitos foram
quebrados e hoje o Brasil já tem uma série de
iniciativas, como empregos verdes”.
“O que é mensurável pode ser mitigado,
mas não haverá mitigação de emissões
sem gestão, sem diálogo e sem inovação”,
ponderou Bárbara Oliveira. Em sua opinião,
é preciso pensar além do clima, além das
emissões. “Precisamos falar sobre o modelo
de desenvolvimento que queremos.”
Como desdobramento das discussões do painel,
o Ethos, que realiza a Secretaria Executiva do
Fórum Clima – iniciativa empresarial de combate
às mudanças climáticas –, organiza em outubro
uma reunião de trabalho com o Ministério do
Meio Ambiente, com a presença da ministra
Izabella Teixeira, do secretário Eduardo Assad
e de secretários de Estado de Meio Ambiente.
O propósito do encontro é trazer uma análise
sobre as atuais legislações estaduais e federal
sobre mudanças climáticas, ressaltando suas
divergências e convergências, e criar um fio
condutor entre elas, de forma a viabilizar a
implementação da PNMC e o alcance da meta
brasileira de redução de emissões.
Foto: Fernando Manuel
Paula Bennati acredita que o Brasil pode vir
a ser um protagonista internacional. “Não
estamos num momento de elevar custos nem
tributos. Precisamos de mecanismos mais
eficazes para avançar na agenda das mudanças
climáticas”, avaliou a analista.
O painel contou também com a apresentação
de importantes iniciativas para a mitigação das
mudanças climáticas. Davi Canassa citou as
reuniões mensais realizadas pelas empresas
que assinaram a Carta Aberta ao Brasil sobre
Mudanças Climáticas. Segundo ele, o objetivo
do fórum é debater, buscar propostas e elevar
o tema a um novo patamar. “As empresas
participantes acreditam que o setor empresarial
pode contribuir para a transição para uma
economia de baixo carbono.”
Izabella Teixeira, Jorge Abrahão e Tasso Azevedo
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
30
Foto: Fernando Manuel
Infraestrutura para a nova economia
Da esquerda para a direita: Roberto Garibe, Celina Borges Torrealba Carpi e Marcio Wohlers de Almeida
Objetivo:
Debater o estado da infraestrutura brasileira do ponto de vista da transição para uma economia
includente, verde e responsável.
Para discutir esse tema estratégico foram
convidados dois expositores, representando
por um lado o setor público e, por outro, uma
instituição de pesquisa: Roberto Garibe, diretor
de infraestrutura do PAC, e Marcio Wohlers de
Almeida, diretor de estudos e políticas setoriais
de inovação, regulação e infraestrutura do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
A moderação do painel foi conduzida por Celina
Borges Torrealba Carpi, membro do conselho de
administração da Libra Holding.
de infraestrutura, uma vez que apenas 17%
advém desse segmento.
De maneira geral, a discussão foi em torno de
quais seriam as mudanças inerentes à nova
economia necessárias para ampliar os benefícios
pretendidos pelos investimentos em infraestrutura
já previstos no país, como o Plano de Aceleração
do Crescimento (PAC), entre outros.
Com o agravante da dominância dos automóveis
no modal de transportes urbanos, também
salientado, o que agrava a emissão de poluentes e o
deslocamento de pessoas e produtos. O crescimento
do número de veículos nas grandes cidades é muito
superior à expansão da infraestrutura, em função do
acesso mais abundante ao crédito e da ascensão
das classes sociais mais baixas. O transporte
público continua precário e a frota de veículos de
passeio convive com caminhões trafegando pelas
principais vias para chegar aos portos e escoar
mercadorias, uma vez que, no Brasil, 60% delas
são movimentadas por rodovias.
O painel iniciou-se com uma provocação da
moderadora Celina Carpi, quanto à nossa
infraestrutura atual ser um fator limitante
ao desenvolvimento, afirmação corroborada
pela plateia. Além disso, clamou pela maior
participação do setor privado nos investimentos
Em seguida, Marcio reafirmou que de fato a
infraestrutura pode, sim, dificultar a velocidade
de transição para a nova economia. Segundo
ele, isso se deve principalmente à matriz de
transportes, que, diferentemente da matriz
energética, na qual o predomínio é de fontes
renováveis, possui somente 15% das fontes de
energia provenientes de fontes limpas.
Na opinião de Marcio, para superar os gargalos
atuais, o Brasil terá de alterar alguns princípios
em relação à sua matriz de transportes:
encurtar viagens, integrar modais, planejar
o uso do solo, ampliar o uso da bicicleta
como meio de deslocamento e melhorar a
competitividade dos combustíveis renováveis.
Para isso, será fundamental investir no sistema
de transporte público, com a construção de
corredores de ônibus, metrôs, veículos leves
sobre trilhos (VLTs), além de obras viárias
para retirar caminhões de ruas e avenidas nos
centros das cidades. É necessário, entretanto,
buscar soluções integradas: “Como aumentar
a infraestrutura sem aumentar as emissões?
Como reduzir as emissões e ampliar a inclusão
social?”, questionou.
“Ficamos cerca de 20 anos sem ter um
plano claro de direcionamento do que fazer
na infraestrutura nacional”, pontuou Roberto
Garibe, à luz das questões colocadas pela
moderação e pela exposição anterior. Segundo
ele, a constante média de crescimento do país
nos últimos anos dialoga com os investimentos
do PAC e do setor privado, estimulados
pelo plano. Em 2010, a participação dos
investimentos totais no PIB chegou a 18,4%,
31
“
Como aumentar a infraestrutura
sem aumentar as emissões?
Como reduzir as emissões e
ampliar a inclusão social?
”
alta em relação aos 16,4% apurados quatro
anos antes. O PAC 2 prevê a aplicação de R$
955 bilhões em recursos, dos quais R$ 247
bilhões após 2014.
Em relação à movimentação de cargas, por
exemplo, o Plano Nacional de Logística de
Transportes, elaborado pelo governo federal,
estabelece aumento da participação das
ferrovias, de 25% para 35%, e redução no
transporte rodoviário, de 58% para 30%,
até 2025. Roberto confirmou que se trata
de um plano ousado, mas crê que isso faz
parte do papel do Estado como indutor do
crescimento. “O papel do setor público é ser
um incentivador. Nós debatemos e buscamos
formas de incentivo para ter o setor privado
como parceiro”, disse. “O PAC ampliou essas
parcerias, mas ainda não é o suficiente. Esse
é um desafio para a segunda fase.”
Ainda segundo Roberto, uma questão que
dificulta esse direcionamento dos investimentos
em infraestrutura é o planejamento. O ideal
seria que a infraestrutura fosse pensada como
incentivadora do crescimento. Entretanto,
em países periféricos, o histórico mostra
o contrário: “Sempre corremos atrás do
crescimento econômico. E, de alguma forma,
é isso que estamos tentando fazer, agora de
uma maneira organizada”.
Roberto chamou a atenção também para
a importância do PAC para projetos
apresentados por Estados e municípios.
As linhas de financiamento estáveis e os
recursos disponíveis vêm atraindo cada vez
mais os governos locais a pleitear projetos de
infraestrutura. “Se estão bem feitos, é quase
100% a chance de tê-los aprovados. É essa
a nossa luta nas discussões com Estados e
municípios: apostem em projetos.”
Foto: Fernando Manuel
A urgência de uma maior articulação entre a
esfera privada e o Estado, portanto, foi uma
das principais conclusões do painel para
superar os gargalos atuais da infraestrutura
nacional e adequá-la à transição para uma
nova economia.
Marcio Wohlers
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
32
Foto: Marcio Bulhões
Erradicação da miséria
Da esquerda para a direita: Tereza Campello, Andreia Rabetim, Jorge Streit, Jorge Abrahão, Carlos Alberto dos Santos, Daniela di Fiori, Lucilene Silva Prado e Vinicius Precioso
Objetivo:
Refletir sobre como as empresas poderão estimular o empreendedorismo e ampliar as
oportunidades de trabalho e emprego para o público do Programa Brasil sem Miséria, sob a
perspectiva do desenvolvimento territorial sustentável.
O painel contou com a moderação de Jorge
Abrahão, presidente do Instituto Ethos, e foi
estruturado em dois momentos. Inicialmente, a
ministra do Desenvolvimento Social e Combate
à Fome, Tereza Campello, apresentou o Programa
Brasil sem Miséria, salientando formas de maior
participação empresarial e da sociedade civil nessa
iniciativa. Em seguida, Andreia Rabetim, gerente
de relações intersetoriais de desenvolvimento da
Vale; Carlos Alberto dos Santos, diretor técnico do
Sebrae; Daniela di Fiori, vice-presidente de assuntos
corporativos e sustentabilidade do Walmart Brasil;
Jorge Streit, presidente da Fundação do Banco do
Brasil; Lucilene Silva Prado, diretora jurídica da
Natura; e Vinicius Precioso, gerente socioambiental
da Suzano Papel e Celulose, apresentaram visões
sobre como as empresas e as fundações poderiam
participar e contribuir para os objetivos do programa,
a partir da atuação de cada uma.
Erradicar a miséria é um compromisso assumido
pelo governo federal que deveria ter prioridade na
agenda global e ser abraçado por todos os setores
da sociedade brasileira. O governo brasileiro lançou,
no primeiro semestre deste ano, o Plano Nacional de
Erradicação da Miséria, que tem como alvo principal
os 16,2 milhões de brasileiros identificados pelo
Censo 2010 do IBGE como aqueles que vivem em
lares cuja renda familiar é de até R$ 70 mensais por
pessoa. Entenda-se a miséria ou pobreza extrema,
definida pelo Banco Mundial, como a privação
do bem-estar que compreende uma série de
dimensões, incluindo-se nessa equação rendimentos
insuficientes, acesso limitado à aquisição de
produtos básicos e aos serviços necessários para
a sobrevivência digna, como alimentação, vestuário,
educação, habitação e saúde. Em consequência
dessas carências, as pessoas possuem capacidades
e oportunidades muito limitadas para melhorar sua
vida e a da família.
Para obter os resultados almejados, o plano pretende
estabelecer parcerias com Estados, municípios,
empresas públicas e privadas, organizações da
sociedade civil, para, assim, incluir a população mais
pobre nas oportunidades geradas pelo crescimento
econômico do país.
Ao lado das propostas apresentadas no plano de
combate à miséria do governo, as organizações
do terceiro setor, empresas e entidades de
classe privadas podem exercer papel de extrema
relevância, contribuindo na orientação e capacitação
profissional, no apoio a ações de empreendedorismo
e de comércio justo e solidário, além de colaborar
para a geração de empregos, inclusive os chamados
empregos verdes.
É consenso a importância da maior inserção de
pessoas no mercado de trabalho para o crescimento
econômico, a produção, a geração de riquezas. A
renda propiciada pelo trabalho garante estabilidade
e desenvolvimento social. Por meio do trabalho, as
pessoas são capazes de construir sua identidade
e fazer valer seus direitos de cidadania plena. As
empresas também têm uma forte influência nos
territórios-sede de suas unidades. Por conhecer as
demandas das comunidades do entorno, podem
integrar suas ações aos projetos de políticas públicas
nas diversas esferas de governo.
O papel de empresas e governo foi bastante
debatido no encontro. O programa Brasil sem
Miséria assinalou os progressos do Estado brasileiro
em busca do fim da pobreza extrema, ressaltando
o trabalho em três eixos principais: a renda, em
primeiro lugar, como recorte para identificar essa
população; em segundo, a inclusão produtiva, com
ações diferenciadas para capacitar esses cidadãos
33
nas áreas urbanas e rurais; e, em terceiro, a oferta
de serviços públicos a essas pessoas – as que
mais precisam e, em geral, nem sequer conhecem
seus direitos. Essas ações do governo federal, no
entanto, devem ser complementadas por empresas
O governo brasileiro lançou, no primeiro
semestre deste ano, o Plano Nacional
de Erradicação da Miséria, que tem
como alvo principal os 16,2 milhões de
brasileiros identificados pelo Censo 2010
do IBGE como aqueles que vivem em
lares cuja renda familiar é de até R$ 70
mensais por pessoa
e investidores, têm peso decisivo na melhora de
vida da população considerada de extrema pobreza.
Esse público ao qual se destina o programa, porém,
não está dentro de organizações sociais, como
cooperativas e sindicatos. É necessário encontrar
uma maneira de apoiar sua organização, conforme
ressaltado pela Fundação Banco do Brasil, que
aumentou seus investimentos no semiárido,
concentrando hoje 38% do montante. E esse
fomento não se dá apenas com transferência
de renda. Envolve tecnologia social, saneamento
básico rural, programas de inclusão digital e de
alfabetização de jovens e adultos.
O Sebrae apontou números expressivos sobre a
formalização desse público. Atualmente há mais
de 1,4 milhão de empreendedores individuais
no país enquadrados no Supersimples. O
microempreendedorismo também é estimulado pelo
governo federal, que tem incentivado as prefeituras a
comprar merenda escolar de microprodutores locais,
adquirindo assim uma mercadoria fresca, mais
barata e com menor impacto ambiental.
Criar portas de saída dos programas de transferência
de renda governamentais foi outra necessidade
debatida. Para isso, é indispensável um esforço
coletivo, com o engajamento das empresas, como
setor muito produtivo e gerador de emprego e
de oportunidades em torno de sua cadeia de
valor, e dos demais setores da sociedade na
articulação dos apoios fundamentais. As empresas
apresentaram suas ações de inclusão social nas
atividades econômicas, demonstrando a viabilidade
de avançar na construção das parcerias públicoprivadas para erradicar a miséria e evidenciando
o longo caminho que ainda se pode percorrer na
construção de arranjos intersetoriais que promovam
o desenvolvimento territorial, em especial nas regiões
atendidas pelo programa Brasil sem Miséria.
Como lição de casa, ficou a construção
de um plano que ponha em marcha essas
parcerias. Procurando envolver o público
do painel nas reflexões do debate, o
moderador fez a seguinte pergunta:
Comente a afirmação: “está ao alcance das empresas promover a inclusão social em suas áreas
de atuação, com ou sem a parceria dos governos
locais”?
49%
2%
2%
5%
Foto: Fernando Manuel
Concordo Plenamente
Concordo Parcialmente
Sem opinião
Discordo Parcialmente
Discordo
Tereza Campello
42%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
34
Trabalho decente e empregos verdes
Da esquerda para a direita: Paulo Sergio Muçouçah, Manuel Messias, Mario Barbosa, Sue Wolter Viana, Marcio Pochmann e Caio Magri
Objetivo:
Debater os avanços alcançados até o momento para concretizar o trabalho decente como
parâmetro no país e os principais entraves nesse aspecto para chegar a uma economia
includente, verde e responsável. A partir dessa discussão, tratar também dos desafios para
viabilizar empregos verdes e decentes, da jornada de trabalho e qualidade de vida e das relações
da empresa com o público interno e com os sindicatos.
O painel contou com a presença do presidente do
IPEA, Marcio Pochmann; de Mario Barbosa, assessor
especial do Ministério do Trabalho e Emprego;
do secretário de relações de trabalho da Central
Única dos Trabalhadores (CUT), Manuel Messias;
da gerente de orientação e práticas de RSE da
Petrobras, Sue Wolter Viana; do coordenador dos
programas de trabalho decente e empregos verdes
da Organização Internacional do Trabalho (OIT),
Paulo Sergio Muçouçah; e do assessor especial do
Ministério do Trabalho e Emprego, Mario Barbosa.
Na perspectiva da transição para uma economia
includente, verde e responsável, a agenda do
trabalho decente assume uma prioridade estratégica.
A necessidade histórica de alterar os padrões de
produção e consumo está acompanhada do enorme
desafio de melhorar substancialmente a qualidade e
oferta de trabalho.
Esse painel se desenvolveu a partir da intervenção
inicial do presidente do IPEA, que trouxe para a
discussão sua análise sobre a crise que vivemos.
Descrente de que a crise, profunda e estrutural, terá
solução imediata, Pochmann pontuou cinco questões
para definir elementos que ajudariam no modo de
ver e entender o trabalho decente nos dias de hoje.
Em primeiro lugar, ressaltou que estamos diante
da consolidação de novas centralidades no mundo.
A economia atual, que gira em torno dos Estados
Unidos, está transitando muito rapidamente para um
mundo novo, certamente para a Ásia e também para
a América Latina, com forte protagonismo brasileiro.
Traçando um paralelo com outros momentos da
história da humanidade, em que velhas centralidades
foram abandonadas, afirmou que os Estados
Unidos têm hoje uma economia oca, doente, que
continuará certamente importante, do ponto de vista
do dinamismo mundial, mas não será como foi até
então. E, desse contexto de novas centralidades,
emerge a oportunidade de pensar uma relação de
trabalho diferente da atual.
O segundo ponto tratado por ele foi a urgência
de transitarmos para outro padrão de produção
e distribuição de bens e serviços, ilustrando sua
insustentabilidade ao relembrar que necessitaríamos
de cinco planetas para sua universalização. “Não há
condições, nesse sentido, de difundir um padrão de
consumo norte-americano para o mundo. Casarões
com três carros na garagem, não é possível.”
Como terceiro ponto, apresentou a capacidade dos
governos de criar políticas públicas que alterem
esses padrões, superando os interesses sustentados
até o momento, através de uma nova governança que
oriente a transição. O padrão de governança global
constituído a partir do encerramento da Segunda
Guerra Mundial, com a criação das Nações Unidas,
mostra uma ineficácia brutal nos dias de hoje: “A
crise de 2008 revelou uma série de problemas na
ordem da governança mundial, e essa governança
se torna ainda mais frágil diante do poder das
grandes corporações transnacionais.” Hoje, 500
multinacionais concentram 47% do PIB mundial.
Para exemplificar, Pochmann apontou o faturamento
da Petrobras, que já chega a ser maior que o PIB da
Argentina. Ele pergunta: “A Petrobras é do Brasil ou o
Brasil é da Petrobras?” Hoje a empresa responde por
12% do PIB brasileiro e, com as explorações do présal, pode chegar a 40%. “Dos engenheiros brasileiros
com carteira assinada, 40% estão vinculados às
atividades desenvolvidas pela empresa.”
35
O quarto ponto de Pochmann está relacionado à
brutal transição demográfica que estamos vivendo.
Em duas décadas, o Brasil, por exemplo, terá mais
17 milhões de habitantes. A partir de 2030, porém,
entraremos em uma fase de redução absoluta do
número de brasileiros, porque a taxa de fecundidade
vem se reduzindo, o que fará com que passe a ser
menor que a de mortalidade. Teremos não apenas
mais idosos como menos jovens. Haverá também
uma mudança substancial quanto à etnia. Hoje,
52% dos brasileiros se declaram não brancos. Mas,
tendo em vista que a taxa de fecundidade feminina
das mulheres não brancas é até três vezes maior
que a das mulheres brancas, haverá cerca de 70%
de brasileiros não brancos em 2030. Pochmann
retomou a relação com o tema lembrando que essa
futura população brasileira terá maior dificuldade de
acesso a boa educação e bons empregos.
2008 deixou clara a insustentabilidade desse modelo
em longo prazo também do ponto de vista ambiental.
As conclusões do Painel Intergovernamental de
Mudanças Climáticas da ONU, divulgadas em
2007, corroboram esse fato, na medida em que as
emissões de carbono provocadas e aceleradas por
esse modelo, nos últimos tempos, levariam a uma
situação de insustentabilidade total em função do
fenômeno das mudanças climáticas.
O quinto elemento que Pochmann abordou é bastante
desafiador, pois está associado justamente à transição
do trabalho material para o trabalho imaterial. “O
material é aquele cujo resultado físico e mental do
homem é um produto concreto, um alimento, uma
vestimenta, um automóvel etc. Está na indústria, na
agricultura, na construção civil. Mas, estamos cada vez
mais assumindo o imaterial. É o que eu estou fazendo
aqui – pode não parecer, mas é trabalho”, explicou.
A regulação existente hoje, no entanto, é associada
ao trabalho material, pois é exercido em um local
específico e facilmente reconhecido. Outros tipos
são mais dificilmente identificados, como o trabalho
doméstico, por exemplo. O que cresce hoje são os
serviços, que somam 70% dos postos de trabalho
criados no Brasil – e cada vez mais associados à
tecnologia da informação.
Não basta que se intensifique a nova economia
pensando que isso, por si só, terá um efeito positivo
do ponto de vista dos seus impactos sociais.
É fundamental que esses investimentos sejam
também intensivos em emprego e, estes, por sua
vez, garantam proteção social, direitos do trabalho
e diálogo social.
Muçouçah, por sua vez, expôs o conceito de trabalho
decente, criado pela OIT e adotado formalmente em
1999 para reagir a uma situação criada pelo modelo
econômico em crise, que produziu cerca de 200
milhões de desempregados no mundo, como resultado
do fenômeno da “financeirização” da economia.
O trabalho decente tem uma atualidade inquestionável.
Suas quatro dimensões – oferta de emprego, direitos
do trabalho, proteção social e diálogo social –
apresentam uma agenda que emergiu para o mundo
no século XIX. Para Paulo Sergio, a crise financeira de
No contexto das Nações Unidas, Muçouçah lembrou
que o desenvolvimento sustentável está pautado
como economia verde e erradicação da pobreza.
Entretanto, destacou a ausência de um elemento
entre esses dois termos: “Por enquanto, infelizmente
não vamos erradicar a pobreza, seja por meio da
economia verde, seja por qualquer outro tipo de
economia, senão através do trabalho”.
Manuel Messias trouxe ao debate ações desenvolvidas
pelo governo para promover o trabalho decente. Na
indústria da cana, por exemplo, os objetivos de
uma iniciativa governamental integram os aspectos
da economia verde, ao garantir condições de
produção ao etanol brasileiro, assim como aspectos
trabalhistas por meio de melhores condições de
trabalho no campo e na indústria.
Foram dois anos de discussão entre representantes
dos trabalhadores, do governo e da indústria da
cana. O compromisso, firmado voluntariamente por
empresas sobretudo da Região Sudeste, vem sendo
monitorado e auditado para verificar seus resultados.
As consequências são novas relações de trabalho que
questionam a precariedade daquelas persistentes
na indústria de cana do Nordeste, marcada pela
informalidade e por baixas condições de vida, graças
ao uso intensivo de agrotóxico em canaviais.
Tanto na indústria da cana-de-açúcar ou de energia
renovável, como no teleatendimento, que representa
uma economia do conhecimento, não há mudanças
significativas para a melhora das relações de
trabalho. Na opinião de Manoel Messias, precisamos
reconhecer que as indústrias que podem gerar
empregos verdes ainda não geram trabalho decente.
A quarta intervenção no painel foi de Sue Wolner
Viana com a reflexão sobre o enfrentamento do
trabalho escravo na perspectiva da promoção do
trabalho decente. “A Petrobras é signatária do
Pacto Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo
desde o início, em 2005, com o compromisso de
desenvolver ações assertivas dentro da cadeia
produtiva”, pontuou. Ou seja, para mitigar e prevenir
a ocorrência de trabalho escravo, as empresas têm
a responsabilidade de estabelecer relações nos
mais distantes elos da sua cadeia, o que gera
corresponsabilidade com todos os fornecedores.
Segundo ela, é preciso um exercício permanente
de controle interno e de dialogo, com cláusulas
em contratos, ações de fiscalização e mecanismos
de ação setorial. Os desafios são para todos –
empresas, sociedade, governos e trabalhadores.
Para Mario Barbosa, os países emergentes viram com
muita desconfiança a economia verde, uma iniciativa
inaugurada pelos países desenvolvidos. Entretanto,
a Assembleia-Geral das Nações Unidas, ao colocar
a erradicação da pobreza em relação direta com a
transição para a economia verde, demonstra uma
inflexão muito importante em relação a esse tema e
como passa a ser percebido como uma oportunidade
para os países em desenvolvimento.
O Brasil começa a ter uma percepção nessa
direção, na opinião de Mario Barbosa, que reforça
alguns dos elementos que Pochmman introduziu
em sua intervenção: o esgotamento do padrão
de desenvolvimento, a necessidade de um novo
padrão e a governança do ponto de vista do sistema
multilateral e nacional.
Para Barbosa, um ponto de partida importante são as
condições que hoje estão colocadas para a inserção
do Brasil no contexto da globalização e como nossos
problemas estruturais poderão ser superados.
É nesse contexto que se expressa a agenda do
trabalho decente. Surge justamente como resposta a
um modelo injusto de desenvolvimento, que precisa
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
36
Descrente de que a crise, profunda
e estrutural, terá solução imediata,
Pochmann pontuou cinco questões
para definir elementos que ajudariam
no modo de ver e entender o trabalho
decente nos dias de hoje
ser enfrentado com novas ferramentas, capazes de
incluir as populações e gerar postos de trabalho
suficientes para todos. E reconheceu também a
importância das organizações da sociedade civil no
enfrentamento desse desafio.
A referência política é o Plano Nacional de Emprego
e Trabalho Decente, construído a partir de um
compromisso firmado entre o Brasil e a OIT em
2003, que estabelece três prioridades para a agenda
nacional de trabalho decente: a promoção de mais
e melhores empregos, a prevenção e erradicação
do trabalho escravo e o fortalecimento dos
atores sociais para o exercício da governabilidade
democrática. Mario Barbosa colocou para o debate
possibilidades reais para o aperfeiçoamento e a
construção de políticas públicas que implementem
a agenda do trabalho decente também na forma de
empregos verdes.
Para encerrar o painel, o mediador afirmou que o
diálogo provocado pelas reflexões apresentadas
no painel avança sobre os desafios para uma
nova economia verde, includente, responsável, na
perspectiva da agenda do trabalho decente, deixando
a todos o convite para participação ativa nos mais
diferentes espaços de diálogo em construção.
O moderador elaborou as seguintes
perguntas ao público:
A legislação brasileira está adequada para que o país
cumpra com seus compromissos internacionais nas
convenções da OIT?
Sim
Não
25%
75%
Você acredita que com as recentes medidas
do governo federal para desordenar a folha de
pagamentos deveria ser acompanhada de metas
para as empresas na geração de oportunidades de
trabalho decente e empregos verdes?
Sim
Não
94%
6%
Você é a favor da aprovação da Emenda Constitucional que confisca as propriedades onde se constata o
trabalho escravo?
Sim
Não
91%
9%
Qual a sua posição sobre a afirmação: “Criar
oportunidade de trabalho decente e empregos
verdes é condição dundamental para o desenvolvimento sustentável”
81%
0%
0%
3%
Concordo Plenamente
Foto: Clóvis Fabiano
Concordo Parcialmente
Sem opinião
Discordo Parcialmente
Discordo
Marcio Pochman
16%
37
Foto: Clóvis Fabiano
Educação para a sustentabilidade
Da esquerda para a direita: Ricardo Young, Bernardo Toro, Antonio Ronca, Vera Masagão, Rangel Mohedano, Roberto Leão e Fernando Rossetti
Objetivo:
Identificar os avanços na integração dos conhecimentos, valores e habilidades necessários para
uma sociedade sustentável, nos processos de educação formal e informal.
Participaram do painel Bernardo Toro, filósofo
e educador Colombiano; Antonio Carlos Caruso
Ronca, representante do MEC e presidente do
Conselho Nacional da Educação (CNE); Fernando
Rossetti, secretário-geral do GIFE; Rangel Mohedano,
consultor em políticas públicas da Rede de
Juventude pelo Meio Ambiente; Vera Masagão
Ribeiro, diretora executiva da Associação Brasileira
de Organizações Não Governamentais (ABONG);
Roberto Leão, presidente da Confederação Nacional
dos Trabalhadores em Educação (CNTE); com a
moderação de Ricardo Young, membro do Conselho
Deliberativo do Instituto Ethos.
Antônio Carlos Ronca apresentou os avanços e
desafios do Brasil no campo da educação. Trouxe
dados importantes sobre a universalização da
educação no país nos últimos anos, bem como
o aumento da escolaridade média da população
brasileira e conquistas para incluir questões
relacionadas ao meio ambiente e à sustentabilidade
na estrutura curricular das escolas brasileiras. Os
principais desafios colocados por ele estão no campo
da garantia da qualidade da educação, em todos os
cantos do país.
Bernardo Toro apresentou questões fundamentais
a respeito da educação e seu papel para que
a humanidade possa encontrar saídas para as
atuais crises pelas quais estamos passando.
Salientou que vivemos atualmente um paradoxo:
“ao mesmo tempo em que criamos condições
que podem levar ao desaparecimento da espécie
humana, desenvolvemos o conhecimento e os
meios que podem possibilitar uma convivência
harmônica com a natureza e uns com os outros,
com a comunicação e interligação entre todos os
povos do planeta.”
Para que esse paradoxo seja solucionado,
necessitamos de uma educação humana que
tenha como fundamentos a ética do cuidado – o
cuidado com o próximo, com a natureza e as
gerações futuras –, e não a lógica de competição
que prepondera em nossa educação atualmente,
preparando os indivíduos para um mercado em
que o objetivo maior é vencer o concorrente
e conseguir uma posição vantajosa. O modelo
atual, ao invés de promover a ética do cuidado
e da responsabilidade, promove uma verdadeira
rachadura no tecido social. Aparta diferentes
grupos sociais e cria relações de desigualdade
e desconfiança. Por esse motivo, precisamos
de uma educação que contemple o respeito, a
solidariedade e a hospitalidade, tanto entre as
pessoas quanto na sua relação com a natureza.
Também foi debatido o papel das empresas para
a promoção da educação no Brasil, em ações
de responsabilidade social e investimento social
privado. Fernando Rossetti apresentou dados
relativos aos investimentos do setor privado em
educação no Brasil. A maior parte das organizações
associadas ao GIFE investe na área, sobretudo no
ensino fundamental e médio. Há o movimento
“Educação para Todos”, em sua opinião um dos
grandes exemplos de ação de empresas nesse
campo, que propõe que todos tenham acesso
à educação de qualidade. E há ainda um bom
número de empresas que investem em capacitação
de professores, embora a precarização da situação
trabalhista desses profissionais deixe-lhes pouco
tempo para se dedicar a atividades e projetos de
aperfeiçoamento.
Roberto Leão trouxe o ponto de vista dos
trabalhadores da área de educação salientando
esse aspecto. A capacitação e a reciclagem
para o bom desempenho de um trabalho tão
determinante como o dos professores são
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
38
prejudicadas pelas extensas jornadas de trabalho
que eles precisam cumprir para engordar os
baixos salários. Mas destacou, por outro lado,
o envolvimento das organizações de professores
com a luta pela qualidade da educação, tendo
em vista a necessidade de incluir as pautas da
sustentabilidade nas atividades escolares.
“
”
uma alternativa para a inclusão dos jovens no
mercado de trabalho, como um dos grandes
desafios dessa agenda.
Vera Masagão Ribeiro ressaltou a importância
de as organizações e movimentos ocuparem o
debate e o processo de decisão políticos para
colocar a pauta da educação como prioridade,
assim como o papel fundamental dos jovens
nesse sentido, exercendo sua cidadania para
reivindicar seu direito à educação.
O moderador Ricardo Young ressaltou a
importância de os educadores possuírem
papel protagonista na Conferência Rio+20,
tendo em vista ser a educação um tema
fundamental para seu objetivo – debater a
construção de uma nova sociedade planetária,
mais justa e sustentável.
Foto: Clóvis Fabiano
Rangel Mohedano abordou o ponto de vista da
juventude: a atual geração de jovens tem um
papel crucial no enfrentamento da presente
crise econômica, social e ambiental, que põe
em risco a vida no planeta. Falou a respeito
das conferências infanto-juvenis sobre meio
ambiente, realizadas em âmbito nacional e
internacional, e outras iniciativas que buscaram
pautar a importância dos temas meio ambiente
e juventude. Pontuou a falta de uma política
de promoção de empregos verdes, que seria
Ao mesmo tempo em que
criamos condições que podem
levar ao desaparecimento da
espécie humana, desenvolvemos
o conhecimento e os meios
que podem possibilitar uma
convivência harmônica com
a natureza e uns com os
outros, com a comunicação e
interligação entre todos os povos
do planeta
Bernardo Toro
39
Os resultados das pesquisas realizadas com a plateia presente confirmaram alguns pontos discutidos no painel:
Na discussão sobre a Rio+20, os educadores estão
tendo o papel que deveriam ter na formulação das
propostas para a conferência?
Sim
Não
4%
A crise civilizatória que vivemos é uma oportunidade
para aglutinar os jovens em torno de novas formas
de participação política
58%
Os conteúdos curriculares do ensino fundamental e
médio não atendem às necessidades de uma sociedade sustentável.
77%
96%
Para uma sociedade sustentável deveríamos ter,
transversalmente nis currículos educação ambiental?
33%
Sim
Não
89%
98%
2%
75%
25%
A sociedade brasileira está preparada para pagar aos
professores salários condizentes ao que a sociedade
exige deles?
Sim
Não
54%
46%
1%
3%
0%
O melhor investimento para melhorar a educação
deve envolver ainda mais o setor privado nas
políticas públicas?
Sim
Não
4%
1%
11%
Para uma sociedade sustentável deveríamos ter,
transversalmente nis currículos educação política?
Sim
Não
7%
Concordo Plenamente
Concordo Plenamente
Concordo Parcialmente
Concordo Parcialmente
Sem opinião
Sem opinião
Discordo Parcialmente
Discordo Parcialmente
Discordo
Discordo
15%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
40
Foto: Fernando Manuel
Gestão da água
Da esquerda para a direita: Lupércio Ziroldo, Benedito Braga, Vicente Andreu, Adalgiso Telles e José Otávio Franco
Objetivo:
Discutir, a partir de um panorama apresentado pela Agência Nacional de Águas (ANA), as
implicações do tema nos processos produtivos, nos padrões de consumo e no próprio
enfrentamento das mudanças climáticas.
O painel contou com uma exposição inicial
de Vicente Andreu Guillo, diretor-presidente
da Agência Nacional de Águas (ANA), que
contextualizou os dilemas atuais dos avanços
e gargalos da gestão hídrica no Brasil e seus
desafios infraestruturais clássicos.
Mediado por Benedito Braga, professor titular da
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo,
o debate contou com Adalgiso Telles, diretor
corporativo da Bunge no Brasil, que apresentou
a visão do setor de agronegócio sobre o tema;
Lupércio Ziroldo, presidente do Fórum Nacional
de Comitês de Bacias Hidrográficas, com sua
visão sobre o atual modelo de governança e
os aprimoramentos regulatórios que se fazem
necessários na gestão hídrica brasileira; e
José Otávio Andrade Franco, gerente de meio
ambiente da ArcelorMittal Brasil.
Insumo econômico e, ao mesmo tempo, um
direito social, a água tem de ser urgentemente
incorporada ao debate geral da sustentabilidade,
de infraestrutura. “Isso mostra que a questão
da água continua grave, não está apenas no
tratamento de resíduos ou no saneamento,
embora estes causem sérios danos à saúde
pública”, disse Vicente Andreu Guillo.
desde os processos produtivos até os hábitos
de consumo, contemplando, evidentemente, a
relação com a questão das mudanças climáticas.
É preciso despertar para o fato de que, embora
renovável, a água não é um recurso inesgotável.
Especialistas apontam a questão da água,
pelo menos no caso brasileiro, mais ligada a
problemas relacionados à governança do que
à escassez propriamente dita. Embora detenha
12% da água doce encontrada no planeta, o
Brasil não está livre de enfrentar desafios
para assegurar o abastecimento contínuo nos
próximos anos.
De fato, o setor de saneamento básico é um dos
maiores poluidores da água brasileira. O país
está muito longe de chegar à universalização
dos serviços de coleta e tratamento de esgoto.
Em pleno século XXI, cerca de 13% da
população ainda não tem banheiro em casa e
mais de 700 mil pessoas recorrem aos serviços
de saúde a cada ano em virtude de doenças
provocadas pelo contato com água contaminada
por esgotos. De acordo com o estudo da ANA,
terão de ser investidos nessa área cerca de R$
48 bilhões.
Além da distribuição desigual pelo território,
principalmente quando comparada à
concentração da população, o abastecimento
contínuo de água é um problema generalizado
no país. E, segundo levantamento divulgado este
ano pela ANA, até 2015 deve atingir mais da
metade dos 5.565 municípios brasileiros. Para
tentar adiá-lo por pelo menos uma década, será
preciso desembolsar R$ 22 bilhões em obras
Outros pontos que tornam o assunto urgente
são a falta de regulamentação e a mentalidade
errônea de abundância do insumo por parte da
maioria das empresas. O desperdício chega a
50% do total de uso de água, por vazamentos,
redes de distribuição e reservatórios, e por erros
na medição, fraudes, ligações clandestinas e
falhas no cadastro comercial. Isso corrobora
uma das principais bandeiras levantadas
41
“ Além da distribuição desigual
pelo território, principalmente
quando comparada à concentração
da população, o abastecimento
contínuo de água é um problema
generalizado no país
”
por Guillo para uma gestão mais efetiva dos
recursos hídricos brasileiros: a cobrança
das indústrias pelo uso da água. “O setor
produtivo tem resistido a esse pagamento, que
é fundamental”, afirmou. “Apesar de sua óbvia
importância, a água tem muito pouca relevância
política na tomada de decisões.”
Muitas empresas, no entanto, já estão adiantadas
na gestão do uso da água no processo produtivo.
A indústria de celulose, por exemplo, reduziu
pela metade suas necessidades de água por
tonelada de produto, desde a década de 1970.
Segundo a associação do setor, a média caiu
de 100 para os atuais 47 metros cúbicos de
água por tonelada de celulose. Outros setores
seguiram a mesma linha, não apenas ao reduzir
a quantidade de água necessária por unidade de
produto, mas também ao implantar sistemas de
tratamento de águas industriais que permitem
fechar o ciclo entre o uso e o reúso.
Foto: Marcio Bulhões
Dois outros desafios para a boa governança
da água são sua valoração nos processos
produtivos e o estabelecimento de padrões para
mensuração da quantidade implicada em cada
etapa, ou seja, aquilo que se tem chamado
de “pegada hídrica”. Avanços nessa agenda
poderiam resultar em novos critérios para a
concessão de empréstimos a empresas e obras
de infraestrutura.
A ANA firmará um acordo de cooperação com
o Instituto Ethos para o desenvolvimento de
indicadores de recursos hídricos que possam
servir de parâmetros para as empresas. “Assim
Vicente Andreu
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
42
poderemos estabelecer metas, porque é
fundamental que possamos comparar índices e
melhorar”, disse Guillo.
Uma das alternativas para aumentar o controle
e melhorar a gestão dos recursos hídricos
atualmente são os comitês gestores de bacias
hidrográficas, que estimulam o debate entre
todos os atores envolvidos – poder público,
sociedade civil organizada e indústrias.
Atualmente, há 180 comitês desse tipo e
mais 20 organizações de bacias hidrográficas
espalhados pelo país, compartilhando
informações sobre o uso correto dos corpos
de água. “Onde há conflito, degradação e
escassez de água, os comitês discutem a
melhor forma de gestão”, afirmou Lupércio
Ziroldo. “Sem gestão das bacias hidrográficas,
pode haver cidades fantasmas no mundo nas
próximas décadas.”
“A questão da água é um assunto também de
segurança alimentar”, apontou o moderador
do debate, Benedito Braga. Para Adalgiso
Telles as perspectivas futuras para o mundo
e para a indústria de alimentos não serão
fáceis. Estima-se que a população mundial
passará de 6,8 bilhões de pessoas para mais
de 9 bilhões nos próximos 40 anos, 70%
delas nas cidades.
Os efeitos do aquecimento global serão
bastantes sentidos pelo setor de recursos
hídricos, apontou Benedito Braga. “O
segmento será um dos mais afetados, seja
com enchentes, seja com secas, o que
poderá criar a exigência de investimentos
em infraestrutura, como barragens, para
nos proteger dessas situações extremas. E
isso coloca a gestão de recursos hídricos na
agenda de todos.”
Durante o debate o moderador fez as seguintes enquetes ao público do painel:
Sendo evidente a necessidade do debate social sobre
a gestão hidrica, qual o grau de maturidade atual da
sociedade brasileira para enfrentá-lo?
A água tem sido considerada como insumo estratégico e relevante nas decisões do setor produtivo?
A gestão dos recursos hidricos no setor produtivo
deveria ser objeto de políticos baseados em metas,
individuais e/ou setoriais?
70%
65%
69%
18%
23%
6%
20%
0%
10%
0%
0%
0%
12%
0%
8%
Muito grande
Concordo Plenamente
Concordo Plenamente
Grande
Concordo Parcialmente
Concordo Parcialmente
Moderado
Sem opinião
Sem opinião
Pequeno
Discordo Parcialmente
Discordo Parcialmente
Nulo
Discordo
Discordo
43
Foto: Julio Endo
Cidades sustentáveis
Da esquerda para a direita: Valdemar de Oliveira Neto, Denise Hills, Tião Soares, Jorge Miguel Samek, Ana Lúcia Ancona, José Police Neto e Oded Grajew
Objetivo:
Abordar as ações de natureza política, social, econômica, ambiental e cultural para que as cidades
brasileiras se organizem e se desenvolvam de forma sustentável, identificando indicadores, os
gargalos que devem ser transpostos, metas, boas práticas de sustentabilidade urbana em várias
cidades do mundo, experiências empresariais e medidas governamentais, assim como apresentar
propostas e sugestões para a construção de uma agenda de transição para uma economia
inclusiva, verde e responsável.
Para discutir a temática Cidades Sustentáveis, o
painel 13 da Conferência Ethos de 2011 contou com
a colaboração de Oded Grajew, coordenador-geral da
Rede Nossa São Paulo; Ana Lúcia Ancona, diretora
de gestão ambiental urbana do Ministério do Meio
Ambiente (MMA); Denise T. Hills, superintendente
de sustentabilidade do Itaú-Unibanco; Jorge Miguel
Samek, diretor-geral Brasileiro da Itaipu Binacional;
José Police Neto, presidente da Câmara Municipal
de São Paulo; e Tião Soares, coordenador de cultura
e relações institucionais da Fundação TIDE Setubal;
com a moderação de Valdemar de Oliveira Neto, da
Fundação Avina.
O crescimento descontrolado dos núcleos urbanos,
com a degradação da qualidade ambiental
e o aumento dos problemas sociais, requer
urgentemente a atenção de gestores públicos,
empresas, organizações sociais e da sociedade
em geral. Atualmente, mais de 75% da população
brasileira e metade da população mundial vive em
áreas urbanas, e a tendência é de ampliação. Nesse
cenário, fica evidente o papel-chave das cidades
na transição para uma economia includente, verde
e responsável, visando ao desenvolvimento de uma
sociedade justa e sustentável.
Mas o que seria exatamente uma cidade sustentável?
Como estaria organizada? É preciso reconstruir as
cidades ou existem alternativas para colocá-las na
lógica da sustentabilidade?
Oded Grajew relatou os esforços da Rede Nossa São
Paulo para implantar a Lei Orgânica do Município, que
obriga o prefeito a apresentar, em 90 dias a partir
da posse, um plano de metas, quebrando a perversa
lógica das promessas de campanha que caem no
esquecimento após a eleição. “Hoje, São Paulo tem
223 metas, fruto de um processo participativo que
se incorporou à cultura paulistana. Outros municípios
brasileiros já seguem o exemplo, além de uma rede
de 20 cidades latino-americanas que adotam uma
plataforma apartidária balizada por indicadores que
conduzem à sustentabilidade.”
José Police Neto explicou que o Legislativo municipal
tem feito esforços para reorganizar o município e
“estabelecer o pleno direito à cidade”. Mas a tarefa
não é fácil. A capital tem 31 planos diretores regionais
e há pouco diálogo entre eles. Uma das sugestões
de Police é descentralizar a instalação de indústrias
e grandes empresas para reduzir os deslocamentos
de cerca de 3,5 milhões de pessoas, que perdem
em média três horas por dia no trânsito, para
trabalhar, estudar, cuidar da saúde, fazer compras.
Sua proposta é que os planejadores trabalhem com
planos regionais para as 31 subprefeituras, em vez
de focar um único plano para a cidade.
Ana Lúcia Ancona destacou os grandes prejuízos
nas condições de moradia e no meio ambiente
das metrópoles decorrentes da acelerada transição
do ambiente rural para o urbano, nos últimos 50
anos. Assinalou também os problemas ambientais
associados às mudanças climáticas, que criaram
novas e urgentes demandas. Segundo ela, porém,
já estão em estudo algumas propostas para
conduzir o planejamento urbano a uma condição
de sustentabilidade, como o pagamento de serviços
ambientais, o controle da expansão urbana, a
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
44
melhor análise dos grandes empreendimentos para
licenciamento, a gestão das águas, com medidas de
proteção dos mananciais e qualificação dos projetos
de drenagem, para reduzir o impacto das enchentes.
O aspecto financeiro da questão da urbanização
em escala global foi tema de Denise Hills,
superintendente de sustentabilidade do ItaúUnibanco. “Como as cidades consomem 70%
da energia e originam 75% das emissões de
gases de efeito estufa, as soluções também
devem ter escala”, comparou. Ela acredita que o
financiamento da nova economia nesse cenário
exige novos sistemas de métrica e implica
o desafio de fazer escolhas considerando
elementos que transcendem a expectativa de
resultado financeiro.
Jorge Samek, presidente da Itaipu Binacional,
contou que a empresa atua em diversas cidades
do Paraná com projetos de sustentabilidade,
como a promoção da agricultura orgânica, da
produção local de energia pelos produtores
rurais a partir do biogás, da recuperação da
mata ciliar, entre outros. O objetivo é fomentar
a sustentabilidade nas cidades do interior a
partir do aproveitamento dos recursos naturais.
Nesse processo de construção de cidades mais
justas, democráticas e sustentáveis no Brasil,
o Programa Cidades Sustentáveis, desenvolvido
pelo Instituto Ethos, pela Rede Nossa São
Paulo e pela Rede Social Brasileira por Cidades
Justas e Sustentáveis, representa um passo
importantíssimo. Engloba uma plataforma
de princípios desenvolvida ao longo de 2010
“ Hoje, São Paulo tem 223 metas,
fruto de um processo participativo
que se incorporou à cultura
paulistana. Outros municípios
brasileiros já seguem o exemplo,
além de uma rede de 20 cidades
latino-americanas que adotam uma
plataforma apartidária balizada
por indicadores que conduzem à
sustentabilidade
”
que apresenta indicadores de sustentabilidade
urbana em 12 eixos temáticos, boas práticas
de sustentabilidade urbana em várias cidades
do mundo, experiências empresariais e medidas
governamentais exemplares. Esses dados
servem de referencial para ações públicas
e privadas no Brasil e contribuem com os
processos eleitorais e os programas dos
candidatos, a fim de promover melhor qualidade
de vida nas regiões urbanas.
Foto: Clóvis Fabiano
Outro parâmetro primordial que não se pode
perder de vista foi sintetizado pelo coordenador
de cultura e relações institucionais da Fundação
Tide Setubal, Tião Soares: “A dimensão cultural
da experiência humana é essencial em um
amplo diálogo para definir a cidade sustentável
que queremos”.
Oded Grajew
45
Foto: Clovis Fabiano
Integridade e transparência
Da esquerda para a direita: Luiz Fernando Nery, Vânia Vieira, Paulo Itacarambi, Josmar Verillo, Marcos Túlio de Melo e Fábio Cavalcanti
Objetivo:
Discutir as medidas de políticas públicas e os principais mecanismos utilizados pela sociedade civil
para aumentar a integridade e a transparência nas práticas empresariais e o combate à corrupção.
O painel moderado por Paulo Itacarambi, vicepresidente do Instituto Ethos, contou com a expositora
Vânia Vieira, diretora de Prevenção da Corrupção da
Controladoria-Geral da União (CGU). Os debatedores
foram Josmar Verillo, conselheiro da Amarribo Brasil;
Luiz Fernando Nery, presidente do Comitê Brasileiro
do Pacto Global; Marcos Túlio de Melo, presidente
do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e
Agronomia (CONFEA); e Fábio Cavalcanti, gerente de
relações corporativas da Shell.
Se de um lado esses eventos exigem grande volume
de investimentos no país, de outro a transparência
deve ser proporcional.
Paulo Itacarambi abriu a mesa sobre Integridade
e Transparência na Conferência do Ethos de 2011
afirmando que sem ética e sem integridade não é
possível ter uma economia verde e includente. “Ou
nós elevamos o padrão ético de funcionamento do
mercado, tanto nas relações privadas quanto nas
relações públicas, ou não vai funcionar.”
A diretora do CGU relatou ao público a evolução
das políticas de transparência no Brasil. Em 2000
foi aprovada a Lei de Responsabilidade Fiscal, que
estabelece limites-teto de gastos da União, dos
Estados e dos municípios. Em 2004, o Portal da
Transparência representou outro marco, ao passar
a publicar informações atualizadas sobre execução
orçamentária, licitações, contratos, convênios, diárias
e passagens de qualquer órgão ou entidade do Poder
Executivo Federal.
Quais seriam os principais desafios, avanços e
gargalos quanto à integridade e à transparência no
Brasil? Essa foi a questão colocada aos participantes
do painel, em especial sob a perspectiva da realização
dos Jogos Olímpicos e da Copa do Mundo no Brasil.
A primeira expositora foi Vânia Vieira, que teve
a incumbência de apresentar, à luz da visão
governamental, mecanismos já existentes
e aqueles que devem ser construídos para
combater a corrupção nas relações entre os
setores privado e público.
Destacam-se ainda outros três avanços. A criação do
Cadastro de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS)
lista empresas punidas pela administração pública em
todo o Brasil. O projeto de lei de acesso à informação,
enviado em 2009 ao Parlamento, já aguarda votação
no Senado. E, em 2010, uma iniciativa pioneira: o
lançamento do Cadastro Empresa Pró-Ética, em
parceria com o Instituto Ethos, para avaliar e divulgar
empresas voluntariamente engajadas na construção
de um ambiente de integridade e confiança nas
relações comerciais.
Sobre Copa e Olimpíadas, há os portais da Copa 2014
e das Olimpíadas 2016, que trazem informações
sobre projetos, orçamentos, contratos, licitações,
financiamentos, convênios, cronogramas, legislação
sobre os responsáveis por essas obras. Vânia Vieira
reconhece, no entanto, que o Brasil ainda carrega o
desafio crucial da impunidade.
Sobre o canal de denúncias disponível no site da
CGU, Vânia apontou haver uma lacuna quanto
à participação das empresas. Desde 2003, das
42 mil denúncias recebidas pela CGU, apenas
0,32% provém de empresas. Sem informações de
irregularidades, será difícil combater a corrupção.
Em um segundo momento os quatro debatedores
se posicionaram com distintas visões sobre
controle social e promoção de integridade no Brasil,
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
46
complementando o cenário traçado por Vania Vieira.
Josmar Verillo levantou importantes gargalos a
ser enfrentados nesse tema. A impunidade foi
um dos principais aspectos apontados como
deficiência pelo Conselho de Administração da
Amarribo Brasil, que avaliou o descumprimento
do país aos princípios da convenção da
Organização dos Estados Americanos (OEA)
sobre corrupção. As críticas se estendem à
não criminalização por enriquecimento ilícito e
passam pelas dualidades do Código Penal, pelos
foros privilegiados e também pela falta de acesso
à informação pública. Foi citada ainda por ele a
prática da partilha política da máquina pública,
ou seja, o loteamento de cargos do Executivo
entre partidos da base aliada.
Marcos Túlio concordou com as críticas feitas
pela Amarribo aos gargalos para a transparência
Ou nós elevamos o padrão
ético de funcionamento do
mercado, tanto nas relações
privadas quanto nas relações
públicas, ou não vai funcionar
“
”
no Brasil, especialmente no que tange ao
aprimoramento da legislação, “que consolide não
só os instrumentos, mas também o conteúdo
de defesa social”. Destacou o Movimento
Anticorrupção da Engenharia, da Arquitetura e da
Agronomia, que reúne mais de cem organizações
comprometidas com o código de ética profissional
e com uma prática efetiva contra situações que
levem à corrupção. “Não há como exigirmos
apenas de governos, apenas de empresas, se
o comportamento social continuar da mesma
forma: buscando privilégios.”
Outra crítica contundente de Marcos Túlio diz
respeito ao Modelo do Regime Diferenciado de
Contratação, aprovado há pouco para os jogos.
Discorda de um dispositivo que permite a
contratação de serviços para um empreendimento
público com base apenas no plano de necessidades,
sem ter sequer um projeto básico referencial que
possa balizar o preço. Nesse ponto, chamou a
atenção para a morosidade da revisão da Lei nº
8.666, de licitações e contratos da administração
pública, para alcançarmos verdadeiros avanços
de transparência, assim como para a aprovação
urgente das leis de acesso à informação e de
responsabilização da pessoa jurídica por atos de
corrupção (PL nº 6.826/2010).
Nery também destacou a falta de punição
como a principal questão para a transparência
no Brasil e fez duas importantes ofertas: o
engajamento das 372 empresas signatárias do
Pacto Global no Brasil no manifesto público pela
aprovação do PL nº 6.826/2010 e na inscrição
do Cadastro Pro-Ética.
O representante da Shell apresentou sua
estrutura de compliance, como uma referência
do que empresas têm feito em direção à
promoção da integridade. A companhia tem
uma orientação global para seus contratantes e
100 mil funcionários, com princípios, manuais
e treinamentos anticorrupção. “O suborno é
inaceitável em nossos negócios, apesar de ser
normal no jogo empresarial de muitos países
onde atuamos”, apontou Fábio Cavalcanti. Outro
iniciativa da corporação foi a disponibilização
de um canal de monitoramento, para que
funcionários possam, sigilosamente, denunciar
favorecimentos, assédios ou qualquer ação ilícita.
Foto: Julio Endo
A discussão foi concluída com uma proposta
concreta: o recolhimento de assinaturas dos
participantes da Conferência Ethos 2011 para
endossar a aprovação do PL nº 6.826/2010. Do
mesmo modo, os avanços e gargalos estruturados
no diálogo promovido na conferência vão embasar
estratégias de participação na Rio + 20.
Vânia Vieira
47
O moderador propôs as seguintes questões ao público:
Qual o impacto do preenchimento dos cargos de
confiança pelos partidos da base do governo para
corrupção no Brasil?
Sem combate à impunidade não teremos sucesso no
combate a corrupção.
Empresas não denunciam porque têm medo da
represália de órgão públicos ou empresas concorrentes ou clientes
84%
60%
31%
20%
31%
0%
31%
0%
15%
0%
16%
0%
0%
6%
Muito grande
Concordo Plenamente
Concordo Plenamente
Grande
Concordo Parcialmente
Concordo Parcialmente
Moderado
Sem opinião
Sem opinião
Pequeno
Discordo Parcialmente
Discordo Parcialmente
Nulo
Discordo
Discordo
A adesão a um cadastro positivo e voluntario de
prevenção e combate a corrupção gera valor para
as empresas?
O comportamento atual da maioria dos cidadãos
favorece o desenvolvimento da corrupção no Brasil?
65%
72%
0%
0%
Você acredita que os cidadãos brasileiros participarão
da mobilização nacional pelo controle social dos
investimentos para os jogos de 2014 e 2016?
Sim
Não
22%
30%
0%
0%
6%
5%
Concordo Plenamente
Concordo Plenamente
Concordo Parcialmente
Concordo Parcialmente
Sem opinião
Sem opinião
Discordo Parcialmente
Discordo Parcialmente
Discordo
Discordo
5%
32%
68%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
48
Foto: Clovis Fabiano
Plenária Rio+20
Organizações parceiras
Objetivo:
Trazer as informações oficiais sobre a Rio+20, as iniciativas da sociedade civil e das empresas
com relação ao evento e apresentar as organizações que planejaram a Conferência Ethos e darão
prosseguimento aos trabalhos de elaboração de uma proposta de agenda para uma economia
includente, verde e responsável.
Participaram da plenária o presidente do Instituto Ethos,
Jorge Abrahão; o vice-presidente do Instituto Ethos e
coordenador-geral da Conferência, Paulo Itacarambi; a
representante do Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente (PNUMA), Elisa Tonda; e o embaixador
André Corrêa do Lago, diretor do Departamento de
Meio Ambiente e Temas Especiais do Ministério das
Relações Exteriores.
A Conferência Rio+20 é uma oportunidade
privilegiada para a discussão de medidas e
mecanismos de implementação das decisões e
acordos já firmados há 20 anos, na Rio(Eco)92. Essa
conferência soube avançar nos temas anteriormente
propostos, sob forma ainda incipiente, na Conferência
de Estocolmo, em 1972, e produzir um conjunto
robusto de compromissos entre as nações, expressos
nos 27 Princípios da Declaração do Rio, na Agenda
21, na Declaração de Princípios sobre as Florestas
e nas Convenções de Biodiversidade Biológica,
Mudanças Climáticas e Combate à Desertificação,
além de abrir caminho para diversos compromissos
posteriores, como a Declaração do Milênio e os
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e o Plano
de Implementação de Johanesburgo, entre outros.
São muito expressivas as diferenças contextuais
entre as grandes conferências anteriores –
Estocolmo (1972), Rio (1992) e Johanesburgo
(2002) – e a cúpula de 2012. As três constituíram,
em suas discussões e decisões, mundos paralelos
em relação ao ambiente econômico em que se
situaram. A Conferência de Estocolmo realizou-se no
final do período de real efetividade das instituições
de Bretton Woods e antecedeu as duas crises do
petróleo (1973 e 1979), que mudaram a economia
global. A Rio92 ocorreu em meio ao processo
de desregulamentação da economia, superação
de barreiras nacionais e redução das redes de
proteção social, na contracorrente de um esforço
de desenvolvimento sustentável. Os acordos por ela
produzidos, fundamentais, não foram implementados
por contrariar a lógica de uma globalização nascente
que também buscava afirmar-se. A cúpula de
Johanesburgo coincidiu com o ápice do movimento
de financeirização da economia global, no qual o
capital mundial foi alocado predominantemente
a serviço da própria reprodução. Em cada um
desses momentos históricos verificou-se um
descolamento entre as propostas e deliberações
das cúpulas e as decisões cotidianas de governos e
empresas. Nas duas últimas predominaram a visão
e a lógica econômica tradicional, em detrimento dos
compromissos políticos.
A Rio+20 terá o desafio e a oportunidade de analisar
a crise mundial – iniciada em 2008 e desdobrada em
2010-2011 –, tendo em vista o esgotamento do modelo
tradicional de desenvolvimento e a reiterada imposição
dos imperativos econômicos de curto prazo sobre as
decisões políticas, e propor uma mudança de rumo
baseada nos princípios e imperativos do crescimento
sustentável. Obviamente, haverá disputas de interesses
e de visões. Às vozes mais avançadas, entre elas o
Brasil, caberá defender uma afirmação da política, em
sua dimensão multilateral, com impactos nas ordens
internas, conduzindo, também, à saída da crise. Para
tanto, deve-se apresentar propostas concretas para
a internalização das decisões na política real e na
economia real, em sua dimensão global e local. Se
a Rio+20 não construir esse caminho, haverá grande
risco de pôr-se a perder todo o acúmulo de decisões
mencionadas, fundamentais para a construção de
uma ordem global mais justa, includente, íntegra e
ambientalmente amigável.
A Conferência Ethos 2011 finalizou suas atividades
com um debate, inaugurado pelo embaixador André
Corrêa do Lago, que contribuiu com dados oficiais
sobre a organização da Rio+20, as expectativas do
governo brasileiro e as oportunidades de participação
49
das empresas e da sociedade civil. O embaixador
destacou os seguintes pontos:
O modelo atual de crescimento, herdado dos países
desenvolvidos, está em xeque, enquanto as economias
emergentes vêm ampliando seu espaço no mundo,
com um crescimento que permite tirar milhões de
pessoas da linha da pobreza. Nesse contexto, “a
Rio+20 deve tratar da questão da inclusão de bilhões
de cidadãos em um novo modelo de desenvolvimento,
construído sobre um novo conceito”;
Ao incluir as dimensões econômica e social à agenda
ambiental, o debate do desenvolvimento sustentável
– no qual, por questões históricas, o Brasil entrou
um pouco atrasado – recupera o diálogo entre países
ricos e pobres;
A Rio+20 poderá ser não apenas mais uma etapa no
processo multilateral, mas um divisor de águas, desde
que deslanche uma agenda para os próximos 20 anos
de um novo modelo de desenvolvimento, que incorpore
a realidade e a dinâmica das economias emergentes;
O Brasil é o mais ocidental, democrático e aberto dos
quatro países do BRIC em seu processo de consulta
para a conferência;
O resultado-chave do encontro em 2012, liderado
pelo Brasil, é integrar o desenvolvimento sustentável
ao planejamento estratégico de todos os países e às
reuniões decisivas do Fundo Monetário Internacional,
Banco Mundial, G20, entre outros.
A Rio+20 deve tratar da
questão da inclusão de bilhões de
cidadãos em um novo modelo de
desenvolvimento, construído sobre
um novo conceito
“
”
Chamou a atenção em especial para o documento de
posicionamento e sugestões às instâncias oficiais de
consulta que foi redigido e se encontra em consulta
pública, bem como os diversos fóruns, nacionais e
internacionais, nos quais o Ethos debaterá propostas
para os atores multilaterais e formas de mobilização
e participação do setor produtivo.
Os resultados esperados, sejam documentos,
sejam convenções ou decisões. Ela aponta os dois
principais resultados da Rio92 – a Convenção de
Mudança do Clima e a Convenção da Biodiversidade
– como as maiores e mais importantes negociações
internacionais em andamento.
No debate, mediado por Paulo Itacarambi, vieram
à tona questões contundentes. A controvérsia em
torno da expressão “economia verde”, considerada
por muitos países em desenvolvimento uma possível
estratégia dos países desenvolvidos para impor
padrões tecnológicos e econômicos. A necessidade
de criação de mecanismos do desenvolvimento
sustentável, bem como de uma reforma urgente
no marco institucional das Nações Unidas para sua
governança. Quanto a esse último tema, destacamse atualmente visões quanto à criação de uma
instância guarda-chuva, no nível do Conselho de
Segurança da ONU:
Jorge Abrahão concordou com o que foi exposto.
“Pode ser utópico, mas eu acredito que o Brasil tem
condições de ser ousado e propor caminhos em
direção ao desenvolvimento sustentável”, afirmou,
destacando o trabalho de preparação e contribuição
para a Rio+20 que vem sendo realizado pelo instituto.
1- Fortalecimento do PNUMA;
2- Fortalecimento do Conselho de Desenvolvimento
Sustentável;
3- Fortalecimento do Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social (ECOSOC);
4- Coordenação das anteriores.
O papel internacional do Brasil, como um país de
vanguarda em várias questões relacionadas ao
desenvolvimento sustentável, que, pressionado pela
sociedade civil e pelo setor privado, legitima seu
mandado para atuar na conferência;
Em seguida, Elisa Tonda expôs as expectativas de
sua organização em relação à Rio+20. A conferência,
segundo ela, é um processo de construção contínuo:
“A Rio+20 não é um fim em si mesmo, mas uma
excelente oportunidade para definir caminhos,
atores e medidas práticas e claras para alcançar o
desenvolvimento sustentável”. Salientou também que a
transição para a economia verde exige investimentos de
curto prazo que vão gerar benefícios sociais, ambientais
e econômicos em um tempo mais alongado. E pontuou
três dimensões relevantes da Rio+20:
Foto: Julio Endo
O processo preparatório brasileiro, que envolve a
Conferência Ethos 2011 e outras diversas ações
multistakeholders de definição e consulta do que
deve ser proposto;
Embaixador André Correa do Lago
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
50
perfil dos participantes
Estatística de participantes por sexo
Estatística de participantes por faixa etária
58%
32,5%
Estatística de participantes por região
29%
12%
20,4%
65%
21,6%
10,4%
0,5%
5,5%
1,5%
15%
0,1%
1,8%
6,4%
5,6%
Masculino
De 18 a 20 anos
Sudeste
Feminino
De 21 a 30 anos
Sul
Não definido
De 31 a 40 anos
Centro-Oeste
De 41 a 50 anos
Nordeste
De 51 a 60 anos
Norte
Acima de 60 anos
Internacional
Não definido
avaliação do evento pelos participantes
Você achou que a Conferência Ethos 2011
b) Trouxe idéias que poderão ser implantadas
na sua empresa?
a) Apresentou temas interessantes para
sua empresa?
Sim
Não
92
10
d) Foi inovadora em medidas de
sustentabilidade?
Sim
Não
53
42
Sim
Não
72
29
e) Propiciou trocas de experiências entre
profissionais?
Sim
Não
68
32
c) Foi inovadora em idéias, práticas,
ferramentas e modelos?
Sim
Não
53
44
f) Ofereceu tempo adequado para os debates?
Sim
Não
52
52
51
Dê uma nota de 1 a 5 (sendo 5 excelente):
NOTAS
1
2
3
4
5
0%
10%
28%
42%
19%
6%
17%
33%
20%
27%
2%
15%
20%
34%
31%
33%
17%
8%
25%
17%
21%
23%
32%
15%
9%
2%
10%
11%
31%
36%
0%
2%
14%
34%
49%
1%
5%
23%
31%
41%
ÍTENS
1) Atividades realizadas
2) Local do evento
3) Atendimento durante o evento
4) Tradução simultânea
5) Alimentação
6) Acessibilidade
7) Recursos audiovisuais
8) Materiais de divulgação
Suas expectativas em relação ao evento deste
ano foram:
Como você soube deste evento?
43%
39%
11%
5%
38%
28%
28%
19%
1%
3%
Superadas
Revista
Atendidas
Jornal
Parcialmente atendidas
Rádio
Não atendidas
Site
Não responderam
Email Marketing
Indicação
Outros
2%
0%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
Rumo à Rio+20
52
Cite três atividades de que você tenha participado e, baseando-se nos aspectos negativos e positivos, dê a elas notas de 1 a 5 (sendo 1 a pior e 5 a melhor nota) nos
quesitos Conteúdo, Compreensão do tema e Discussões sobre o tema.
CONTEÚDO
ATIVIDADE
Nova Economia
Rio+20
Governança
Novos Padrões
Inovação
Código Florestal
Direitos Humanos
Financiamento
Energia
Biodiversidade
Resíduos Sólidos
Mudanças Climáticas
Infraestrutura
Erradicação da Miséria
Trabalho Decente
Educação
Integridade
Gestão da Água
Cidades Sustentáveis
COMPREENSÃO
DISCUSSÕES
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
7%
14%
29%
21%
29%
4%
11%
18%
25%
43%
14%
18%
25%
18%
25%
0%
0%
20%
20%
60%
0%
0%
0%
60%
40%
0%
0%
0%
60%
40%
0%
0%
19%
44%
37%
0%
0%
6%
63%
31%
0%
0%
13%
50%
37%
0%
0%
18%
45%
36%
0%
0%
0%
45%
55%
0%
0%
27%
55%
18%
8%
8%
27%
31%
27%
8%
4%
23%
23%
42%
8%
15%
19%
23%
35%
0%
0%
50%
50%
0%
0%
0%
25%
37%
37%
0%
12%
12%
62%
12%
12%
18%
18%
29%
23%
0%
6%
24%
29%
41%
6%
18%
47%
23%
6%
0%
11%
39%
33%
17%
0%
0%
22%
56%
22%
0%
28%
28%
22%
22%
0%
0%
20%
40%
40%
0%
0%
0%
40%
60%
0%
0%
60%
20%
20%
0%
0%
14%
29%
57%
0%
0%
0%
29%
71%
0%
0%
0%
57%
43%
0%
5%
5%
45%
45%
0%
0%
8%
42%
50%
0%
4%
23%
23%
50%
5%
0%
26%
37%
32%
5%
5%
11%
42%
37%
5%
11%
16%
37%
32%
0%
40%
50%
10%
0%
0%
60%
20%
10%
10%
10%
60%
20%
10%
0%
0%
0%
6%
29%
65%
0%
0%
6%
24%
71%
0%
18%
29%
6%
47%
0%
5%
25%
35%
35%
5%
5%
25%
15%
50%
5%
10%
20%
40%
25%
0%
5%
9%
32%
55%
5%
0%
18%
27%
50%
5%
0%
27%
23%
45%
0%
0%
0%
50%
50%
0%
0%
25%
25%
50%
0%
0%
0%
50%
50%
0%
17%
33%
33%
17%
0%
17%
33%
17%
33%
0%
33%
33%
0%
33%
0%
0%
37%
37%
26%
0%
25%
25%
25%
25%
12%
12%
12%
38%
26%
CONFERÊNCIA ETHOS 2011
54
Rumo à Rio+20
Realização
Patrocinadores Institucionais
Patrocinadores Ouro
Patrocinadores Prata
Parceiro Estratégico
Parceiros
Alcoa • Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) • Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec) • Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) • Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) • BM&FBOVESPA • Central Única dos Trabalhadores (CUT) • Centro de
Estudos em Sustentabilidade (GVces) da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP) • Comitê Brasileiro do Pacto Global da ONU • Conselho Empresarial
Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) • Controladoria-Geral da União (CGU) • CPFL Energia • Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos
(DIEESE) • Fundação Avina • Fundação Dom Cabral (FDC) • Fundação Nacional da Qualidade (FNQ) • Greenpeace Brasil • Grupo de Institutos Fundações e Empresas (GIFE) • Instituto Akatu
pelo Consumo Consciente • Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) • Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) • Instituto Socioambiental (ISA) • Instituto Vitae Civilis
• Natura Cosméticos • Núcleo de Economia Socioambiental da Universidade de São Paulo (Nesa/USP) • Núcleo de Estudos do Futuro da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(NEF/PUC-SP) • Organização Internacional do Trabalho (OIT Brasil) • Rede Nossa São Paulo • Rede Social Brasileira por Cidades Justas e Sustentáveis • Serviço Brasileiro de Apoio às Micro
e Pequenas Empresas (Sebrae Nacional) • Suzano Papel e Celulose • Vale • Walmart Brasil • WWF-Brasil
© Copyright 2011, Instituto Ethos de Responsabilidade Social Empresarial. Todos os direitos reservados. O Instituto Ethos só aceita patrocínio das empresas associadas. Empresas
públicas e mistas são aceitas como empresas associadas e patrocinadoras porque atuam no mercado nas mesmas condições que as empresas privadas. A logomarca do Governo Federal
acompanha a logomarca das empresas públicas e mistas patrocinadoras em função da exigência da Instrução Normativa 31, de 10 de setembro de 2003 da Secretaria de Comunicação
de Social (SECOM), que essas empresas são obrigadas a observar.
Download

Subsídios para a construção da agenda de