Universidade Federal de Santa Catarina
Hospital Universitário
LEBm – Laboratório de Engenharia Biomecânica
Florianópolis, 30 de agosto de 2011
Ref: Resposta ao Of. Circular 11/2001 – UTVIG/NUVIG/ANVISA
Dados e informações sobre os riscos da utilização do aço 316L
na fabricação de implantes ortopédicos.
INTRODUÇÃO Qualquer metal embebido em fluidos biológicos sofrerá
corrosão e consequente formação de ions metálicos que causam
efeitos fisiológicos incluindo toxicidade, carcinogenicidade,
genotoxicidade e alergia (Sargeant et al., 2007). Devido às
características
de
resistência
mecânica
e
resistência
à
corrosão, os aços inoxidáveis da família 316L são utilizados
tanto
em
implantes
ortopédicos
temporaries
de
fixação
de
fraturas, quanto em implantes permanentes tais como próteses
para
artroplastia
permanentes
a
de
quadril.
concentração
iônica
No
nos
caso
de
fluidos
implantes
e
tecidos
corporais gerada pela liberação de ions metálicos devida à
corrosão
pode
atingir
níveis
tóxicos
e
causar
cancer,
alterações genéticas e respostas inflamatórias. Portanto, a
análise no presente documento será dedicada ao uso do aço
316L em próteses de quadril (hip implants).
Níveis de referência de ions metálicos em fluidos corpóreos e
tecidos humanos
Os metais são elementos essenciais presentes no corpo humano.
As Tabelas 1 e 2 abaixo apresentam níveis de referência para
a
concentração
corporais.
de
ions
metálicos
em
fluidos
e
tecidos
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Tabela 1- Níveis de referência de ions metálicos em fluidos corpóreos
Extraído de Sargeant et al, 2007
Tabela 2- Níveis de referência de ions metálicos em tecidos corporais
Extraído de Sargeant et al, 2007
Ions liberados por próteses de aço inoxidável
Os
ions
metálicos
liberados
pelo
o
aço
inoxidável
316L
alteram a proliferação e a função das células osteobásticas e
interferem com a deposição mineral normal (apud Sargeant et.,
2007).
De acordo com Sargeant et al. (2007), de modo geral, os ions
originados de próteses fabricadas em aço inoxidável são ions
de Cobalto, Cromo, Molibdênio, Silício, Ferro, Manganês e
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Carbono.
Destes, o Cobalto é um elemento carcinogênico pois inibe o
reparo
de
DNA
lesado,
e
o
Cromo
na
forma
hexavalente
é
classificado como agente carcinogênico classe I pela Agência
Internacional de Pesquisas em Câncer (apud Sargeant et al.,
2007).
Casos
de
tumors
malignos
em
locais
com
implantes
ortopédicos metálicos têm sido registrados para humanos e
animais. A presence de cancer de prostate e cancer nos rims,
linfoma é crescent em pacientes implantados (apud Sargeant et
al., 2007).
A concentração de Cobalto, Cromo e Molibdênio na urina, no
sangue e em tecidos humanos para pacientes com diferentes
modelos de próteses de quadril é apresentada na Tabela 3
abaixo:
Tabela 3: Concentração de Cobalto, Cromo e Molibdênio na urina, no sangue
e em tecidos humanos devido à liberação de ions em diferentes modelos de
prótese de quadril
Extraído de Sargeant et al, 2007
Observa-se na
Tabela que o Cobalto é encontrado em maior
concentração que o Cromo na urina, enquanto o Cromo apresnta
maior
concentricão
que
o
Cobalto
no
sangue.
O
artigo
de
Sargeant e Goswami (2007) apresenta uma abrangente revisão da
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literature
metálicos
sobre
em
consultado
mecanismos
dados
clínicos
pacientes
para
e
com
próteses
maiores
efeitos
de
concentração
metálicas
informações
adversos
com
específicos
e
de
ions
deve
ser
relação
destes
ions
aos
no
corpo humano.
A
evolução
tecnológica
do
aço
inoxidável
inoxidável
utilizado
em
aplicações
biomédicas
O
primeiro
aço
como
material
implantável foi o aço 302 (18-8 na classificação da época).
Para aumentar a resistência deste material em meio salino,
foi adicionado Molibdênio na liga, dando origem ao aço 188sMo, o qual ficou conhecido como aço inoxidável 316 (Park
and
Lakes,
‘Biomaterials:
an
introduction’,
Ed.
Springer,
2007). O emprego do aço inoxidável na fabricação de implantes
cirúrgicos
foi
considerado
um
sucesso
devido
a
sua
resistência, biocompatibilidade e usinabilidade.
Na década de 1950 o conteúdo máximo de carbono do aço
316 foi reduzido de 0,08% para 0,03% (percentagem em peso)
para melhorar a resistência a corrosão em solução clorídrica
e minimizar a sensitização, e este aço ficou conhecido como
aço inoxidável AISI 316L (AISI – American Iron and Steel
Institute).
A
letra
‘L’
no
característica
‘Low
carbon
final
do
content’
que
nome
o
indica
a
diferencia
da
série 316 original. Os aços da série 316L são classificados
como
aços
inoxidáveis
austeníticos
e
são
amplamente
utilizados para implantes (Park and Lakes, ‘Biomaterials: an
introduction’, Ed. Springer, 2007).
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A produção do aço inoxidável compreende a fundição da
quantidade
exata
dos
componentes
individuais
da
liga
metálica. Se esta fundição é realizada em ambiente aberto
(open air), como no caso do tipo 316L, haverá menor controle
sobre os contaminantes potenciais presentes na atmosfera, e
há a possibilidade do ar reagir com a liga, alterando a
composição química final desta.
A evolução tecnológica dada pelo controle do ambiente
durante a fundição realizada sob vácuo deu origem a outro aço
da série 316L, o aço inoxidável 316LVM (vacuum melted). A
fundição sob vácuo auxilia a controlar contaminações no lote
do aço produzido.
Ao par da evolução tecnológica alcançada e a necessidade
de regulamentação na fabricação de produtos para a saúde, em
1987 a ISO (International Standard Normalization) publicou a
Norma Técnica ISO 5832-1 que define os requisitos consensuais
de composição química, características microestruturais e de
teor
de
inclusões
que
devem
ser
atendidos
por
aços
inoxidáveis utilizados na fabricação de implantes cirúrgicos.
EM
1992
a
equivalente
inoxidável
produzido
ASTM
à
ISO
ASTM
sob
publicou
a
5832-1,
com
F138
é
um
condições
Norma
a
aço
mais
Técnica
mesma
da
ASTM
finalidade.
série
rígidas
de
F138,
O
316LVM,
aço
porém
controle
que
asseguram características metalúrgicas, micro-estruturais e
limites de composição química considerados mais apropriados
para implantes cirúrgicos.
Observa-se
composição
química
integralmente
definidos
que
na
os
a
falta
do
aço
requisitos
ASTM
F138.
de
controle
dificulta
inoxidável
normativos
Entretanto,
do
316L
aço
que
a
atenda
inoxidável
ocasionalmente
a
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composição química do 316L pode atender a especificação ASTM
F138. Por outro lado, o tipo 316LVM seguidamente atende os
requisitos
normativos
do
aço
inoxidável
ASTM
F138.
Entretanto, é importante notar que com ambos 316L e 316LVM
existe variação de características e composição química de
lote a lote. Ou seja, mesmo que o fabricante do aço
sempre inicie a fundição com as quantidades exatas de cada um
dos elementos para a liga, ao final de cada lote existirão
pequenas diferenças entre os lotes de modo que alguns podem
atender aos requisitos da ASTM F138 e outros não. Deste modo,
se a especificação do aço 316L utilizado apresentar exigência
para os teores de inclusões não metálicas, este aço pode sim
enquadrar-se nos requisitos normativos da ASTM F138.
O
emprego
do
aço
inoxidável
na
fabricação
de
implantes
ortopédicos
Está
bem
estabelecido
que
sob
certas
circunstâncias,
tais como regiões submetidas a altas tensões mecânicas, o aço
inoxidável 316L pode sofrer corrosão dentro do corpo.
Pode-se encontrar registros na literatura indicando que
o
aço
AISI
316L
foi
utilizado
na
fabricação
de
hastes
femorais de prótese de quadril nas décadas de 1980 e 1990, e
afirmações de que este aço era utilizado
mesmo até meados da
década de 2000.
Walczak et al., 1998, reportaram a análise de onze (11)
hastes femorais retiradas de pacientes sendo que destas, sete
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(7) hastes são do modelo Protek Müller fabricadas em aço AISI
316L.
Título do artigo científico de Walczak et al., publicado em 1998 e
indicando
que o aço AISI 316L foi usado em hastes femorais no Reino
Unido (UK)
alczak
e
col.
(1998)
observaram
graus
de
corrosão
variados em próteses de aço inox 316L retiradas em cirurgias
de revisão. Em dois casos a corrosão do material foi extensa,
liberando
grande
quantidade
de
cromo
(Cr)
na
manta
de
cimento.
Demonstração de pitting em prótese de aço inox 316L do tipo Müller.
Retirado de Walckzak e col. (1998)
Com a corrosão, as partículas liberadas atingem tecidos
adjacentes e distantes, em virtude do pequeno tamanho dos
íons metálicos liberados e da capacidade do Cr6+, Cr3+ e Ni em
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se ligarem a células vermelhas e brancas do sangue, podendo
provocar
citotoxidade,
genetoxidade
e
carcinogenicidade
em
tecidos diversos.
Padrão de lesão do DNA provocado por Cr6+, Cr3+. Retirado de Sargeant
e Goswani (2007).
Outro
implante
possível
provocada
efeito
pelo
Cr6+
adverso
e
Ni.
é
a
Estes
osteólise
íons
peri-
alteram
a
proliferação o funcionamento dos osteoblastos, diminuindo o
depósito de minerais na matriz óssea (Morais e col., 1998).
Apesar de Walckzak e col. (1998) observarem a liberação
de Cr o efeito que tal quantidade liberada ainda é incerto.
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Godec
et
al.,2010,
também
publicaram
um
estudo
que
evidencia que o aço AISI 316L foi usado na fabricação de
prótese de quadril.
Título do artigo científico de Goldec et al., publicado em 2010 e
confirmando a utilização do aço AISI 316L em hastes femorais de prótese
de quadril
Deve-se notar que apesar dos textos científicos acima
classificarem o aço utilizado como AISI 316L, a partir da
análise
destes
identificar
quais
artigos
outros
científicos
requisitos
não
há
metalúrgicos
forma
e
de
micro-
estruturais que estes aços atendiam.
Haley e Glassman (2003) avaliaram radiograficamente 58
artroplastias totais de quadril com próteses do tipo Chanrley
realizadas de 1975 a 1981. Em dois casos houve a necessidade
de revisão por fratura da haste femoral em próteses de aço
inox 316L.
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No Brasil, no ano de 2005, Fonseca et al. afirmaram que
“um dos materiais mais utilizado para a fabricação de próteses
metálicas
no
Brasil
é
o
aço
AISI
316L,
pois
apresenta
bom
desempenho mecânico e um custo relativamente menor se comparado a
outros biomateriais destinados ao mesmo fim”.
Título do artigo científico de Fonseca et al., publicado em 2005 e
afirmando a utilização difundida do aço AISI 316L na fabricação de
próteses ortopédicas no Brasil
Deve-se notar que apesar da afirmação do artigo científico
acima sobre o uso do aço 316L no Brasil, na década de 2000 já
estava consolidado que os aços admissíveis para implantes
deveriam atender a ISO 5832-1 ou a
ASTM F138.
CONCLUSÕES:
O aço 316L foi historicamente empregado na fabricação de
hastes femorais de prótese de quadril no Brasil e no mundo. Um grande intervalo de propriedades mecânicas pode ser
obtido para a série 316L dependendo do processamento que lhe
é fornecido. Como forma de melhorar o desempenho dos aços
inoxidáveis
utilizados
em
implantes
cirúrgicos,
o
processamento dos mesmos têm sido constantemente pesquisado.
A série 316L evoluiu com estas pesquisas. Requisitos químicos
(ver
ANEXO),
metalúrgicos
e
micro-estruturais
específicos,
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tais como tamanho de grão e teor de inclusões, dão origem ao
aço ASTM F138 que é um aço que deriva da série 316L.
Os aços 316L, 316LVM, ASTM F138 (ISO 5832-1) e ISO 58329 (aço inoxidável com alto teor de Nitrogênio) representam
nesta
sequência
utilizados
a
ordem
evolutiva
tradicionalmente
na
dos
aços
fabricação
de
inoxidáveis
implantes
cirúrgicos, onde se salienta que o teor dos elementos Cr, Mo,
Mn e de Si tende a aumentar, enquanto que o teor de C tende a
diminuir (Villamil et al., 2002).
Atualmente, a principal questão para garantir se o aço
inoxidável
possui
biocompatibilidade
adequada
é
o
aço
inoxidável estar em conformidade com os requisitos das Normas
Técnicas ASTM F138, ISO 5832-1 ou ISO 5832-9.
Ainda que os estudos demonstrem os efeitos adversos dos
metais que compõem a liga 316L, 316LVM e ASTM F138, são
desconhecidos estudos que utilizaram estas ligas de inox em
próteses e observaram a associação com carcinogenese, lesões
e mutações no DNA, e processos infecciosos.
Apesar
dos
metais
serem
elementos
essenciais
para
o
corpo humano, concentrações iônicas que superam os níveis
normais
tornam-se
tóxicas.
A
distinção
entre
os
níveis
normais e tóxicos ainda não está clara e é tema de pesquisa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
[1] Park, J., Lakes, R.S.,
Ed. Springer, 2007.
[2]
Walczak,
J.,
‘Biomaterials: an introduction’,
Shangaldi,
F.,
Heatley,
F.,
“In
vivo
corrosion of 316L stainless-steel hip implants: morphology
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and
elemental
compositions
of
corrosion
products”,
Biomaterials, 2008.
[3] Fonseca, K.B., Pereira, H.H., Silva, S.N., “Avaliação de
Falhas em Implantes Metálicos Coxo-femoral e Joelho Retirados
de pacientes”, Revista Matéria, v.10, 2005.
[4] Godec, M., Kocijan, A., Dolinar, D., Mandrino, D., Jenko,
M., Antolic, V., “ An investigation of the asceptic loosening
of an AISI 316L stainless steel hip prosthesis”, Biomedical
Materials, 2010.
[5]
Villamil,
R.F.V.,
Aranha,
H.,
Afonso,
M.L.C.A.,
Mercadante, M.T., Agostinho, S.M.L., “Aços inoxidáveis em
implantes ortopédicos: fundamentos e resistência à corrosão”,
Revista Brasileira de Ortopedia, v.37, 2002.
[6] Sargeant, A., Goswami, T., “Hip Implants –paper VI- Ion
Concentration”, Materials and Design, v.28, 2007.
[7] Halley, D., K., Andrew, H., Glassman, M.D., Twenty- to
Twenty-Six–Year Radiographic Review in Patients 50 Years of
Age
or
Younger
With
Cemented
Charnley
Low-Friction
Arthroplasty” The Journal of Arthroplasty, 18, 2003.
Prof.
Carlos Rodrigo de Mello Roesler, Dr. Eng.
Coordenador / LEBm – HU – UFSC
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ANEXO
Composição Química ASTM F138
Fonte: Norma Técnica ASTM F138
Composição Química AISI 316 e AISI 316L
ABNT/SAE/AISI
C
máx.
Mn
máx.
P máx.
S máx.
Si
máx.
316
0,08
316 L
0,03
Ni
Cr
Mo
2,00
0,045
0,030
0,75
10,00 14,00
16,00 18,00
2,00 3,00
2,00
0,045
0,030
0,75
10,00 14,00
16,00 18,00
2,00 3,00
Fonte: http://www.favorit.com.br/produtos/categoria/acos-inoxidaveis/aco-aisi-316aisi-316-l
W
˜
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2. Dados e informações sobre os riscos da utilização do