Evangelho segundo S. Lucas 13,1-9. Nessa ocasião, apareceram alguns a falar-lhe dos galileus, cujo sangue Pilatos tinha misturado com o dos sacrifícios que eles ofereciam. Respondeu-lhes: «Julgais que esses galileus eram mais pecadores que todos os outros galileus, por terem assim sofrido? Não, Eu vo-lo digo; mas, se não vos converterdes, perecereis todos igualmente. E aqueles dezoito sobre os quais caiu a torre de Siloé, matando-os, eram mais culpados que todos os outros habitantes de Jerusalém? Não, Eu vo-lo digo; mas, se não vos converterdes, perecereis todos da mesma forma.» Disse-lhes, também, a seguinte parábola: «Um homem tinha uma figueira plantada na sua vinha e foi lá procurar frutos, mas não os encontrou. Disse ao encarregado da vinha: 'Há três anos que venho procurar fruto nesta figueira e não o encontro. Corta-a; para que está ela a ocupar a terra?' Mas ele respondeu: 'Senhor, deixa-a mais este ano, para que eu possa escavar a terra em volta e deitar-lhe estrume. Se der frutos na próxima estação, ficará; senão, poderás cortá-la.'» São Cipriano (c. 200-258), bispo de Cartago e mártir Sobre os benefícios da paciência, 3-5 Imitar a paciência de Deus Grande paciência a de Deus! […] Ele faz nascer o dia e erguer-se a luz do sol sobre bons e maus (Mt 5, 45). Ele rega a terra com a chuva, e a ninguém exclui dos seus benefícios, concedendo a água indistintamente a justos e a injustos. Vemo-lo agir com igual paciência com culpados e inocentes, fiéis e ímpios, agradecidos e ingratos. Para todos eles, os tempos obedecem às ordens de Deus, os elementos colocam-se ao Seu serviço, sopram os ventos, brota água das fontes, as colheitas crescem em abundância, as uvas amadurecem, as árvores enchem-se de frutos, as florestas cobrem-se de verdes e os prados de flores. […] Embora tenha poder para se vingar, prefere ter paciência por muito tempo, espera e adia com bondade para que, se for possível, a malícia se atenue com o tempo e o homem […] acabe por se voltar para Deus, segundo o que Ele próprio nos diz: “Não tenho prazer na morte do ímpio, mas sim na sua conversão, de maneira que ele tenha a vida” (Ez 33, 11). E ainda: “Convertei-vos ao Senhor, vosso Deus, porque Ele é bom e compassivo, clemente e misericordioso” (Jl 2, 13). […] Ora, Jesus diz-nos: “Sede perfeitos, como é perfeito vosso Pai celeste” (Mt 5, 48). Por meio destas palavras, mostra-nos que, filhos de Deus e regenerados por um nascimento celeste, alcançamos o cume da perfeição quando a paciência de Deus Pai permanece em nós e a semelhança divina, perdida pelo pecado de Adão, se manifesta e brilha nas nossas acções. Que glória assemelharmo-nos a Deus, que grande honra possuirmos esta virtude digna dos louvores divinos! Guilherme de Saint-Thierry (c. 1085-1148), monge beneditino, depois cisterciense Orações meditativas, nº 5 «Se não vos converterdes, perecereis» Pobre de mim, a consciência acusa-me sem cessar, e a verdade não pode desculpar-me dizendo: ele não sabia o que fazia. Perdoa, pois, Senhor, pelo preço do Teu precioso sangue, todos os pecados em que caí, consciente ou inconscientemente. [...] Sim, Senhor, pequei verdadeiramente, pequei por minha vontade, e pequei muito. Depois de ter tido conhecimento da verdade, ofendi o Espírito de graça; e contudo, aquando do meu baptismo, o Espírito tinhame concedido de forma gratuita a remissão dos pecados. Mas eu, depois de ter tido conhecimento da verdade, voltei aos meus pecados, «como o cão volta ao seu vómito» (2Ped 2, 22). Ó Filho de Deus, pisei-Te aos pés, negando-Te? Mas não posso dizer que, ao negar-Te, Pedro Te tenha pisado aos pés, ele que Ele amava tão ardentemente, embora Te tenha negado uma primeira vez, uma segunda e uma terceira vez. [...] Também a mim Satanás me reclamou por vezes a fé, para me joeirar como o trigo; mas a Tua oração desceu sobre mim, de maneira que a minha fé nunca desfaleceu (Lc 22, 31-32), nunca Te abandonou. [...] Bem sabes que sempre quis aderir à fé em Ti; protege-me, pois, nesta vontade, até ao fim. Sempre acreditei em Ti [...], sempre Te amei, mesmo quando pequei contra Ti. Lamento profundamente os meus pecados. Do amor, porém, lamento apenas não ter amado tanto como devia. S. Leão Magno (? – cerca 461), papa e doutor da Igreja 20º sermão sobre a Paixão “Se não vos converterdes” Ao trabalho irmãos! Esforcemo-nos por nos associarmos à ressurreição de Cristo e passarmos da morte à vida enquanto estamos ainda neste corpo. Todos os que passam por uma conversão, seja ela de que natureza for, todos os que passam de um estado a outro, vivem um fim: eles não são mais aquilo que eram. E também vivem um princípio: tornam-se naquilo que não eram. Mas é importante saber para o que morrem e para o que vivem, porque não há senão uma morte que faz viver e uma vida que faz morrer. Algures, neste mundo efémero, ou se procura uma ou outra, de modo que é da qualidade das nossas acções aqui em baixo que dependerá a diferença das retribuições eternas. Morramos pois para o diabo e vivamos para Deus; morramos para o pecado e vivamos para a justiça; que desapareça o velho ser para que apareça o novo ser. Pois que, segundo a palavra da Verdade “Não se pode servir a dois senhores” (Mt 6,24), tomemos por mestre não aquele que faz desequilibrarem-se os que estão de pé para os levar à ruína, mas aquele que ergue os que estão caídos para os conduzir à glória. Bento XVI: Conversão é a reposta mais eficaz perante o mal Intervenção por ocasião da oração mariana do Angelus CIDADE DO VATICANO, domingo, 11 de março de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos a intervenção que Bento XVI pronunciou este domingo ao meio-dia ao rezar a oração mariana do Angelus junto a vários milhares de peregrinos congregados na praça de São Pedro no Vaticano. *** Queridos irmãos e irmãs: A passagem do Evangelho de Lucas, que se proclama neste terceiro domingo de Quaresma, apresenta o comentário de Jesus sobre dois acontecimentos da época. O primeiro: a revolta de alguns galileus, que havia sido reprimida por Pilatos com derramamento de sangue; o segundo: a derrubada de uma torre em Jerusalém, que havia causado dezoito vítimas. Dois acontecimentos trágicos muito diferentes entre si: um causado pelo homem; o outro acidental. Segundo a mentalidade daquela época, as pessoas tendiam a pensar que a desgraça havia recaído sobre as vítimas por causa de sua grave culpa. Jesus, pelo contrário, diz: «Pensais que esses galileus eram mais pecadores que todos os demais galileus, porque padeceram estas coisas?... Ou aqueles dezoito sobre os que se desmoronou a torre de Siloé, matando-os, pensais que eram mais culpados que os demais homens que habitam Jerusalém?» (Lucas 13, 2.4). Em ambos casos, conclui dizendo; «Não, vos asseguro; e se não vos converterdes, todos perecereis do mesmo modo» (13, 3.5). Este é, portanto, o ponto ao qual Jesus quer levar quem o escutava: a necessidade da conversão. Não a apresenta em termos moralistas, mas realistas, como única resposta adequada para os acontecimentos que põem em crise as certezas humanas. Ante certas desgraças, adverte, não serve de nada jogar a culpa nas vítimas. O verdadeiramente sábio consiste mais em deixar-se interpelar pela precariedade da existência e assumir uma atitude de responsabilidade: fazer penitência e melhorar nossa vida. Esta é a sabedoria, esta é a resposta mais eficaz ao mal, em todos os âmbitos, inter-pessoal, social e internacional. Cristo convida a responder ao mal antes de tudo com um sério exame de consciência e com o compromisso de purificar a própria vida. De outro modo, pereceremos, diz, pereceremos da mesma maneira. De fato, as pessoas e as sociedades que vivem sem pôr-se em discussão têm como único destino final a ruína. A conversão, pelo contrário, apesar de que não preserva dos problemas e adversidades, permite enfrentá-los de «maneira» diferente. Antes de tudo ajuda a prevenir o mal, desativando algumas de suas ameaças. E, em todo caso, permite vencer o mal com o bem, ainda que nem sempre no âmbito dos fatos, que às vezes são independentes de nossa vontade, mas certamente sempre no âmbito espiritual. Definitivamente: a conversão vence o mal em sua raiz, que é o pecado, ainda que nem sempre possa evitar suas conseqüências. Peçamos a Maria Santíssima que nos acompanhe e apóie no caminho quaresmal, que ajude cada cristão a redescobrir a grandeza, diria inclusive a beleza da conversão. Que nos ajude a compreender que fazer penitência e corrigir a própria conduta não é simples moralismo, mas o caminho mais eficaz para melhorar tanto a nós mesmos como a sociedade. Explica-o muito bem uma acertada máxima: é melhor acender um fósforo que maldizer a escuridão. [Traduzido por Zenit © Copyright 2007 - Libreria Editrice Vaticana] ZP07031101 S. Serafim de Sarov (1759-1833), monge russo Conversa com Motovilov “Abba, Pai, esquece outra vez” “Em verdade em verdade vos digo, quem crê em mim não morrerá jamais” (Jo 6,47). Quem, pela sua fé em Cristo possui o Espírito Santo, mesmo se por fraqueza humana cometer um pecado causando a morte da sua alma, não morrerá para sempre, mas será ressuscitado pela graça de Nosso Senhor Jesus Cristo que tomou sobre si os pecados do mundo e que dá gratuitamente graça sobre graça. É falando desta graça manifestada ao mundo inteiro e ao nosso género humano pelo HomemDeus que o evangelho diz: “Desde sempre ele era a vida e a vida era a luz dos homens” e acrescenta: “A luz resplandeceu nas trevas mas as trevas não a admitiram” (Jo 1, 4-5). O que quer dizer que, apesar das quedas, apesar das trevas envolvendo a nossa alma, a graça do Espírito Santo recebido no baptismo continua a brilhar no nosso coração com a sua eterna luz divina, por causa dos méritos sem preço de Cristo. Face a um pecador endurecido, esta luz de Cristo diz ao Pai: “Paizinho, que a tua cólera não se inflame contra este endurecimento”. Em seguida, quando o pecador se tiver arrependido, ela apagará completamente os traços dos crimes cometidos, revestindo o antigo pecador com uma veste de incorruptibilidade tecida da graça deste Espírito Santo de cuja aquisição sempre vos falo. Evangelho segundo S. Lucas 13,10-17. Um dia de sábado, ensinava Jesus numa sinagoga. Estava lá certa mulher doente por causa de um espírito, há dezoito anos: andava curvada e não podia endireitar-se completamente. Ao vêla, Jesus chamou-a e disse-lhe: «Mulher, estás livre da tua enfermidade.» E impôs-lhe as mãos. No mesmo instante, ela endireitou-se e começou a dar glória a Deus. Mas o chefe da sinagoga, indignado por ver que Jesus fazia uma cura ao sábado, disse à multidão: «Seis dias há, durante os quais se deve trabalhar. Vinde, pois, nesses dias, para serdes curados e não em dia de sábado.» Replicou-lhe o Senhor: «Hipócritas, não solta cada um de vós, ao sábado, o seu boi ou o seu jumento da manjedoura e o leva a beber? E esta mulher, que é filha de Abraão, presa por Satanás há dezoito anos, não devia libertar-se desse laço, a um sábado?» Dizendo isto, todos os seus adversários ficaram envergonhados, e a multidão alegrava-se com todas as maravilhas que Ele realizava. Orígenes (cerca de 185 - 253), presbítero e teólogo Homilias sobre S. Lucas, 26, 3-5 "Tem na mão a pá de joeirar" O baptismo pelo qual Jesus baptiza é "no Espírito Santo e no fogo". Se fores santo, serás baptizado no Espírito Santo; se fores pecador, serás mergulhado no fogo. O mesmo baptismo tornar-se-á condenação e fogo para os pecadores indignos; mas os santos, aqueles que se convertem ao Senhor com uma fé verdadeira, receberão a graça do Espírito Santo e a salvação. Portanto, aquele de quem se diz que baptiza "no Espírito Santo e no fogo" "tem na mão a pá de joeirar e vai limpar a sua eira e malhar o trigo; guardará o grão no celeiro; quanto à palha, queimá-la-á no fogo que não se extingue". Gostaria de descobrir por que motivo nosso Senhor tem na mão a pá de joeirar e com que sopro vai a palha leve ser transportada para aqui e para ali, enquanto o trigo, mais pesado, se acumula num único lugar, uma vez que, se o vento não soprar, não se pode separar o trigo da palha. Creio que por vento se devem entender as tentações que, na multidão dos crentes, revelam que uns são palha e outros são trigo. Porque, quando a vossa alma foi dominada por uma tentação, não foi a tentação que a transformou em palha, mas é porque éreis já palha, quer dizer, homens levianos e sem fé, que a tentação revelou a vossa verdadeira natureza. Em contrapartida. quando enfrentais corajosamente as tentações, não é a tentação que vos torna fiéis e constantes; ela revela apenas as virtudes de constância e de coragem que estavam em vós, mas de uma forma escondida... "Afligi-te e fiz-te sentir a fome para manifestar o que tinhas no teu coração" (Dt 8,3-5). Homilia atribuída a Eusébio de Alexandria (fim do sec, V) Sermões sobre o domingo, 16, 1-2; Pg 86, 416-421 O Sábado torna-se o primeiro dia da nova criação A semana comporta evidentemente sete dias: Deus deu-nos seis para trabalharmos, e deu-nos um para rezarmos, repousarmos e para nos libertarmos dos nossos pecados... Vou expor-te as razões pelas quais a tradição de guardarmos o domingo e de nos abstermos de trabalhar nos foi transmitida. Quando o Senhor confiou o sacramento aos discípulos, «tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e deu-o aos seus discípulos, dizendo: “ Tomai e comei, este é o meu corpo entregue por vós em remissão dos pecados”». Da mesma forma, deu-lhes o cálice dizendo: «Bebei todos, este é o meu sangue, o sangue da Nova Aliança, derramado por vós e pela multidão em remissão dos pecados. Fazei isto em memória de mim» ( Mt 26, 26s; 1Co 11,24) O dia santo de domingo é pois aquele em que se faz memória do Senhor. Por isso é que se lhe chama «o dia do Senhor». E ele é como o senhor dos dias. Com efeito, antes da Paixão do Senhor, não era chamado «Dia do Senhor», mas «primeiro dia». Nesse dia, o Senhor estabeleceu o fundamento da ressurreição, quer dizer que empreendeu a criação; nesse dia, deu ao mundo as primícias da ressurreiçao; nesse dia, como dissemos, mandou celebrar os santos mistérios. Esse dia foi, pois, o começo de toda a graça: início da criação do mundo, início da ressurreição, início da semana. Esse dia que comporta em si próprio três começos, prefigura a primazia da Santíssima Trindade. Catecismo da Igreja Católica §1730; 1739-1742 "Esta mulher, uma filha de Abraão que Satanás havia amarrado..., era preciso libertála" Deus criou o homem racional, conferindo-lhe a dignidade de pessoa dotada de iniciativa e do domínio dos seus próprios actos. «Deus quis "deixar o homem entregue à sua própria decisão" (Sir 15, 14), de tal modo que procure por si mesmo o seu Criador e, aderindo livremente a Ele, chegue à total e beatífica perfeição»: «O homem é racional e, por isso, semelhante a Deus, criado livre e senhor dos seus actos» (Santo Ireneu)... A liberdade do homem é finita e falível. E, de facto, o homem falhou. Livremente, pecou. Rejeitando o projecto divino de amor, enganou-se a si mesmo; tornou-se escravo do pecado. Esta primeira alienação gerou uma multidão de outras. A história da humanidade, desde as suas origens, dá testemunho de desgraças e opressões nascidas do coração do homem, como consequência de um mau uso da liberdade... Afastando-se da lei moral, o homem atenta contra a sua própria liberdade, agrilhoa-se a si mesmo, quebra os laços de fraternidade com os seus semelhantes e rebela-se contra a verdade divina. Pela sua cruz gloriosa, Cristo obteve a salvação de todos os homens. Resgatou-os do pecado, que os retinha numa situação de escravatura. «Foi para a liberdade que Cristo nos libertou» (Gl 5, 1). N'Ele, nós comungamos na verdade que nos liberta (Jo 8,32). Foi-nos dado o Espírito Santo e, como ensina o Apóstolo, «onde está o Espírito, aí está a liberdade» (2 Cor 3, 17). Já desde agora nos gloriamos da «liberdade dos filhos de Deus» (Rm 8,21). A graça de Cristo não faz concorrência de modo nenhum, à nossa liberdade, quando esta corresponde ao sentido da verdade e do bem que Deus colocou no coração do homem. Pelo contrário, e como o certifica a experiência cristã sobretudo na oração, quanto mais dóceis formos aos impulsos da graça, tanto mais crescem a nossa liberdade interior e a nossa segurança nas provações, como também perante as pressões e constrangimentos do mundo exterior. Pela acção da graça, o Espírito Santo educa-nos para a liberdade espiritual, para fazer de nós colaboradores livres da sua obra na Igreja e no mundo. João Paulo II Dies Domini Uma cura num sábado, sinal do dia da nova criação O dia da nova criação: a comparação entre o domingo cristão e o sábado próprio do Antigo Testamento suscitou aprofundamentos teológicos de grande interesse. Fizeram luz, nomeadamente, na relação particular que existe entre a ressurreição e a criação. Com efeito, a reflexão cristã associou espontaneamente a ressurreição que sobreveio “o primeiro dia depois de sábado” ao primeiro dia da semana cósmica no livro do Génesis (1,15)... Essa ligação convidava a compreender a ressurreição como o começo de uma nova criação, da qual o Cristo glorioso constitui as primícias, sendo ele próprio “Primogénito de toda a criatura” e também “Primogénito de entre os mortos” (Col 1, 15.18). Com efeito o domingo é o dia em que, mais do que qualquer outro, o cristão é chamado a recordar-se da salvação que lhe foi oferecida no baptismo e que fez dele um homem novo em Cristo. “Sepultados com Ele no baptismo, foi também com Ele que ressuscitastes pela fé no poder de Deus, que O ressuscitou” (Col 2, 12; Rom 6, 4-6). A liturgia sublinha esta dimensão baptismal do domingo convidando a celebrar também os baptismos, mais do que na Vigília pascal, nesse dia da semana “ em que a Igreja comemora a ressurreição do Senhor”, e também ao sugerir, como rito penitencial apropriado ao início da Missa, a aspersão com água benta, que relembra precisamente o acontecimento baptismal do qual nasce toda a existência cristã. S. Cirilo de Jerusalém (313-350), bispo de Jerusalém, doutor da Igreja Catequese baptismal nº 13 Libertos dos laços do pecado pela cruz de Cristo S. Paulo disse: “Que eu nunca me glorifique, senão na cruz de Cristo” (Ga 6,14). Já foi uma coisa espantosa que o cego de nascença recuperasse a vista em Siloé; mas que acrescentava isso a todos os cegos do mundo? Foi qualquer coisa de grandioso e que ultrapassava a natureza a ressurreição de Lázaro, morto há quatro dias; mas essa graça só lhe aproveitou a ele; não trouxe nada a todos os que, no mundo, estavam mortos por causa dos seus pecados. Foi espantoso fazer aparecer alimento para alimentar cinco mil homens a partir de cinco pães; mas isso não foi nada para todos os que, em todo o universo, sofrem a fome da ignorância. Foi espantoso libertar uma mulher dominada por Satanás há dezoito anos; mas que foi isso em relação a nós todos que estamos amarrados pelas cadeias dos nossos pecados? Ora a vitória da cruz conduziu à luz todos aqueles a quem a ignorância tinha tornado cegos, libertou todos os que o pecado tinha feito cativos e resgatou toda a humanidade. Não te surpreenda s que o mundo inteiro tenha sido resgatado. Quem morreu por isso não era apenas um homem, mas o Filho único de Deus. A falta de Adão trouxe a morte ao mundo inteiro; se a queda de um só fez reinar a morte sobre todos, com mais razão não fará reinar a vida a justiça de um só? (Ro 5,17) Se outrora, pela árvore cujo fruto comeram, os nossos primeiros pais foram expulsos do paraíso, será que agora, pela árvore da cruz de Jesus, os crentes não entrarão muito mais facilmente no paraíso? Se o primeiro homem, moldado com barro, trouxe a morte para todos, será que aquele que o moldou com o barro não lhes trará a vida eterna, uma vez que ele próprio é a Vida? (Jo 14,6) Evangelho segundo S. Lucas 13,18-21. – cf.par. Mt 13,31-33; Mc 4,30-32 Disse, então: «A que é semelhante o Reino de Deus e a que posso compará-lo? É semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e deitou no seu quintal. Cresceu, tornou-se uma árvore e as aves do céu vieram abrigar-se nos seus ramos.» Disse ainda: «A que posso comparar o Reino de Deus? É semelhante ao fermento que certa mulher tomou e misturou com três medidas de farinha, até ficar levedada toda a massa.» S. João Crisóstomo (cerca 345-407), bispo de Antioquia e depois de Constantinopla, doutor da Igreja Homília 20 sobre os Atos dos Apóstolos Ser fermento na massa Há algo mais irrisório do que um cristão que não se preocupa com os outros? Não tomes como pretexto a tua pobreza: a viúva que pôs duas pequenas moedas na arca do tesouro (Mc 12,42) levantar-se-ia contra ti; Pedro também, ele que dizia ao coxo: “Não tenho ouro nem prata” (Ac 3,6), e Paulo, tão pobre que tinha muitas vezes fome. Não uses a tua condição social, pois os apóstolos também eram humildes e de baixa condição. Não invoques a tua ignorância, porque eles eram homens iletrados. Mesmo se tu eras escravo ou fugitivo, tu podias sempre fazer o que dependia de ti. Assim era Onésimo que Paulo elogiou. Serás tu de saúde frágil? Timóteo também o era. Sim, seja o que for que sejamos, não importa quem pode ser útil ao seu próximo, se ele quer verdadeiramente fazer o que ele pode. Vês quantas árvores da floresta são vigorosas, belas, esbeltas? E contudo, nos jardins, preferimos árvores de fruto ou oliveiras cobertas de frutos. Belas árvores estéreis..., assim são os homens que apena s consideram o seu próprio interesse... Se o fermento não levedasse a massa, não seria um verdadeiro fermento. Se um perfume não perfumasse os que estão perto, poderíamos chamá-lo de perfume? Não digas pois que é impossível teres uma boa influência sobre os outros, porque se és verdadeiramente cristão, é impossível que não se passe nada; isso faz parte da essência própria do cristão... Será tão contraditório dizer que um cristão não pode ser útil ao seu próximo como negar ao sol a possibilidade de iluminar e aquecer. S. Máximo de Turim (? - cerca 420), bispo Sermão 25 “Se o grão de trigo, lançado na terra, não morrer, fica só, como é; mas, se morrer, produz abundante fruto” (Jo 12,24) “Um homem tomou um grão de mostarda e lançou-a no seu jardim; ela desenvolveu-se e tornou-se uma árvore, e os pássaros do céu abrigam-se nos seus ramos”. Procuremos a quem se aplica tudo isto…Penso que a comparação se aplica muito justamente a Cristo nosso Senhor que, nascendo na humildade da condição humana, como um grão, sobe finalmente ao céu como uma árvore. Ele é grão, o Cristo esmagado na Paixão; ele torna-se uma árvore na ressurreição. Sim, ele é uma semente quando, esfomeado, ele sofre por faltar o alimento; ele é uma árvore quando, com cinco pães, sacia cinco mil pessoas (Mt 14,13s). Lá ele sofre a carência da sua condição de homem, aqui ele derrama a saciedade pela força da sua divindade. Eu diria que o Senhor é grão assim que ele é batido, desprezado, injuriado; ele é árvore quando dá a vista aos cegos, quando ressuscita os mortos e perdoa os pecados. Ele próprio reconhece que é grão: “Se o grão de trigo lançado na terra não morrer…”(Jo 12,24). S. Simeão o Jovem Teólogo, (Cerca de 949-1022), monge ortodoxo Hino 17 O reino de Deus Vou mostrar-te claramente que é aqui em baixo que tens de acolher o Reino dos céus, todo inteiro, se nele quiseres entrar também após a tua morte. Escuta Deus que te fala em parábolas: “A que compararei então o Reino dos céus? Ele assemelha-se, escuta bem, ao grão de mostarda que um homem tomou e lançou no seu jardim; e ele germinou e, na verdade, tornou-se uma grande árvore”. Esse grão é o Reino dos céus, é a graça do Espírito divino, e o jardim é o coração de cada homem, o sítio onde quem o recebeu esconde o Espírito no fundo de si mesmo, nas pregas das suas entranhas, para que ninguém o possa ver. E guarda-o com todo o cuidado, para que germine, para que se torne uma árvore e se eleve para o céu. Se, então, disseres: “Não é aqui em baixo, mas só após a morte que acederão ao Reino todos os que o tiverem desejado com fervor”, estás a alterar o sentido das parábolas do Salvador nosso Deus. E, se não tomares o grão, esse grão de mostarda, como ele to disse, se não o lançares no teu jardim, ficarás totalmente estéril. Em que outro momento, se não for agora, receberás tu a semente? “Aqui em baixo, recebe o penhor, diz o Mestre; aqui em baixo, recebe o selo. Já aqui, ilumina a tua lâmpada. Se fores sensato, é aqui em baixo que me tornarei para ti a pérola (Mt 13,45), é aqui em baixo que serei o teu trigo, bem como o teu grão de mostarda. É aqui em baixo que serei fermento e farei levedar a massa. É aqui que serei para ti como água e me tornarei fogo abrasador. É aqui que me tornarei a tua veste e o teu alimento e toda a tua bebida, se o desejares”. Eis o que diz o Mestre: “Se assim, pois, já aqui em baixo, me reconheceres como tal, também no céu me possuirás inefavelmente e eu tornar-me-ei tudo para ti”. Evangelho segundo S. Lucas 13,22-30. - cf.par. Mt 7,13-14.2-23;6,11-12 Jesus percorria cidades e aldeias, ensinando e caminhando para Jerusalém. Disse-lhe alguém: «Senhor, são poucos os que se salvam?» Ele respondeu-lhes: «Esforçai-vos por entrar pela porta estreita, porque Eu vos digo que muitos tentarão entrar sem o conseguir. Uma vez que o dono da casa se levante e feche a porta, ficareis fora e batereis, dizendo: 'Abre-nos, Senhor!' Mas ele há-de responder-vos: 'Não sei de onde sois.' Começareis, então, a dizer: 'Comemos e bebemos contigo e Tu ensinaste nas nossas praças.' Responder-vos-á: 'Repito vos que não sei de onde sois. Apartai-vos de mim, todos os que praticais a iniquidade.' Lá haverá pranto e ranger de dentes, quando virdes Abraão, Isaac, Jacob e todos os profetas no Reino de Deus, e vós a serdes postos fora. Hão-de vir do Oriente, do Ocidente, do Norte e do Sul, sentar-se à mesa no Reino de Deus. E há últimos que serão dos primeiros e primeiros que serão dos últimos.» Santo Ireneu de Lyon (c.130 - c.208), bispo, teólogo e mártir Contra as heresias, V, 32, 2 «Hão-de vir do Oriente, do Ocidente, do Norte e do Sul, sentar-se à mesa no Reino de Deus» A promessa feita anteriormente por Deus a Abraão manteve-se estável. Deus tinha-lhe dito, com efeito: «Ergue os teus olhos e, do sítio em que estás, contempla o norte, o sul, o oriente e o ocidente. Toda a terra que estás a ver, dar-ta-ei, a ti e aos teus descendentes, para sempre» (Gn 13,14-15). [...] No entanto, Abraão não recebeu herança alguma durante a sua vida terrena, «nem mesmo um palmo de terra»; foi sempre um «estrangeiro e hóspede» de passagem (Act 7,5; Gn 23,4) [...] Portanto, se Deus lhe prometeu a herança da terra, e se não a recebeu durante a sua estadia terrena, terá de recebê-la na posteridade, isto é, com aqueles que temem a Deus e n'Ele crêem, aquando da ressurreição dos justos. Ora a sua posteridade é a Igreja, que, pelo Senhor, recebe a filiação adoptiva em relação a Abraão, como diz João Baptista: «Deus pode suscitar, destas pedras, filhos de Abraão» (Mt 3,9). Também o apóstolo Paulo diz na sua Epístola aos Gálatas: «E vós, irmãos, à semelhança de Isaac, sois filhos da promessa» (Gl, 4,28). Diz claramente ainda, na mesma epístola, que os que acreditaram em Cristo recebem, de Cristo, a promessa feita a Abraão: «Ora, as promessas foram feitas a Abraão e à sua descendência. Não se diz: «e às descendências», como se de muitas se tratasse; trata-se, sim, de uma só: E à tua descendência, que é Cristo» (Gl 3,16). E, para confirmar tudo isto, diz ainda «Assim foi com Abraão: teve fé em Deus e isso foi-lhe atribuído à conta de justiça. Ficai, por isso, a saber: os que dependem da fé é que são filhos de Abraão. E como a Escritura previu que é pela fé que Deus justifica os gentios, anunciou previamente como evangelho a Abraão: Serão abençoados em ti todos os povos» (Gl 3,6-8) [...] Se portanto nem Abraão nem a sua descendência, isto é, todos os que são justificados na fé, não recebem agora herança alguma na terra, recebê-la-ão no momento da ressurreição dos justos, porque Deus é verídico e estável em todas as coisas. E é por este motivo que o Senhor dizia «Felizes os mansos, porque possuirão a terra.» (Mt 5,5). São Leão Magno (? – c. 461), papa e doutor da Igreja 3ª Homilia para a Epifania “Hão-de vir do Nascente e do Poente, do Norte e do Sul tomar lugar à mesa do Reino de Deus” Nos últimos tempos (1 Pe 1, 20), Deus, na sua bondade misericordiosa, quis vir em socorro do mundo que perecia. Decidiu que a salvação de todas as nações se faria em Cristo… Foi por elas que Abraão recebeu outrora a promessa de uma descendência inumerável, gerada não pela carne, mas pela fé. É também comparada à multidão das estrelas do céu (Gn 15, 5), porque do pai de todas as nações é esperada uma posteridade não terrestre mas celeste… Portanto, que “a totalidade das nações entre” (Rm 11, 25), que todos os povos entrem na família dos patriarcas. Que os filhos da promessa recebam a bênção da raça de Abraão (Rm 9,8) … Que todas as nações da terra venham adorar o Criador do universo. Que Deus já não seja unicamente “conhecido na Judeia”, mas em todo o mundo, e que, em toda a parte, “o seu nome seja grande como em Israel” (Sl 75, 2) … Irmãos, instruídos nestes mistérios da graça divina, em espírito de alegria, celebremos o chamamento das nações. Demos graças ao Deus da misericórdia “que nos chama a tomar parte na herança dos santos, na luz divina. Ele nos libertou do poder das trevas e nos transferiu para o reino do seu amado Filho” (Cl 1, 12-13). Como anuncia o profeta Isaías…: “Hão-de invocar-te nações que não te conheciam; povos que te ignoravam acorrerão a ti” (55, 5). Abraão viu esse dia e alegrou-se (Jo 8, 56), quando soube que os seus filhos segundo a fé seriam abençoados na sua descendência, isto é, em Cristo. Na fé, ele viu-se “pai de uma multidão de povos” e “deu glória a Deus, plenamente convencido de que Ele tinha poder para realizar o que tinha prometido” (Rm 4, 18-21). S. Cesário de Arles (470-543), monge e bispo Sermão 7 «Jesus passava pelas cidades e pelas aldeias ensinando» Prestai atenção, caríssimos irmãos : as sagradas Escrituras foram-nos transmitidas por assim dizer como cartas vindas da nossa pátria. Com efeito, a nossa pátria é o paraíso ; os nossos pais são os patriarcas, os profetas, os apóstolos e os mártires; os nossos concidadãos são os anjos; o nosso rei é Cristo. Quando Adão pecou, fomos por assim dizer lançados no exílio deste mundo. Mas, porque o nosso rei é fiel e misericordioso mais do que se possa imaginar ou dizer, dignou-se enviar-nos, por intermédio dos patriarcas e dos profetas, as sagradas Escrituras, como cartas de convite, pelas quais nos convidava para a nossa eterna e primeira pátria… Em razão da sua inefável bondade, convidou-nos a reinar come ele. Nessas condições, que ideia farão de si mesmos os servos que… não se dignam a ler as cartas que nos convidam à bem-aventurança do Reino ?... “Aquele que ignora será ignorado » (1 Co 14,38). Na verdade, aquele que negligencia procurar Deus neste mundo pela leitura dos textos sagrados, Deus, por seu lado, recusar-se-á a admiti-lo à bem-aventurança eterna. Ele deve temer que lhe fechem as portas, que o deixem fora com as virgens loucas (Mt 25,10) e que mereça ouvir : « Não sei quem vós sois ; não vos conheço ; afastai-vos de mim, vós todos que fizestes o mal”… Aquele que quiser ser escutado favoravelmente por Deus deve começar por escutar Deus. Como teria a veleidade de querer que Deus o escute favoravelmente, se prestou tão pouca atenção que até negligenciou ler os seus preceitos? Concílio Vaticano II Lumen Gentium «Hão-de vir do Oriente e do Ocidente e sentar-se-ão à mesa do Reino de Deus» A luz dos povos é Cristo: por isso, este sagrado Concílio, reunido no Espírito Santo, deseja ardentemente iluminar com a sua luz, que resplandece no rosto da Igreja, todos os homens, anunciando o Evangelho a toda a criatura (Mc 16, 15). O Eterno Pai, pelo libérrimo e insondável desígnio da Sua sabedoria e bondade, criou o universo, decidiu elevar os homens à participação da vida divina e não os abandonou, uma vez caídos em Adão, antes, em atenção a Cristo Redentor «que é a imagem de Deus invisível, primogénito de toda a criação» (Col 1, 15) sempre lhes concedeu os auxílios para se salvarem. Aos eleitos, o Pai, antes de todos os séculos os «discerniu e predestinou para reproduzirem a imagem de Seu Filho, a fim de que Ele seja o primogénito de uma multidão de irmãos» (Rom 8, 29). E, aos que crêem em Cristo, decidiu chamá-los à santa Igreja, a qual, prefigurada já desde o princípio do mundo e admiravelmente preparada na história do povo de Israel e na Antiga Aliança, foi constituída no fim dos tempos e manifestada pela efusão do Espírito, e será gloriosamente consumada no fim dos séculos. Então, como se lê nos Santos Padres, todos os justos depois de Adão, «desde o justo Abel até ao último eleito», se reunirão em Igreja universal junto do Pai. S. Simeão, o Novo teólogo (c. 949 - 1022), monge ortodoxo Hino 53 Reconhecer desde já a porta aberta Vê, ó Cristo, a minha angústia, vê a minha pouca coragem, vê como me faltam as forças, vê também a minha pobreza, vê a minha fraqueza e tem piedade de mim, ó Verbo! Brilha agora sobre mim, como outrora, e esclarece a minha alma, ilumina os meus olhos para que te vejam, ó luz do mundo (Jo 8,12), tu que és a alegria, a felicidade, a vida eterna, as delícias dos anjos, tu que és o Reino dos céus e o Paraíso, a coroa dos justos, o seu Juiz e o seu Rei. Porque escondes o teu rosto? Porque te afastas de mim, tu, que és o meu Deus e que nunca te queres afastar dos que te amam? Porque foges de mim, porque me queimas, porque me feres e ma esmagas? Tu sabes que te amo e te busco com toda a minha alma. Revela-te, como prometeste... Abre-me de par em par a sala do banquete, meu Deus; sim, não feches a porta da tua luz, ó meu Cristo! «Será que imaginas, ó filho dos homens, que me podes forçar com as tuas palavras? Que dizes tu, insensato? Que eu escondo o meu rosto? Será que desconfias, um pouco que seja, que eu te ia fechar as portas e os batentes? Será que suspeitas que alguma vez me afaste de ti? Que dizes tu? Que eu te inflamo, te queimo, te esmago? Verdadeiramente, as tuas palavras não são justas e justo também não é o teu pensamento. Escuta antes as palavras que agora te vou dizer: Eu era luz, mesmo antes de ter criado todas as coisas que tu vês. Estou em toda a parte, estava em toda a parte, e, como como fiz toda a criatura, estou em toda a parte e em tudo... Considera os meus benefícios, observa os meus desígnios, aprende quais são os meus dons! Manifestei-me ao mundo e manifestei o meu Pai, derramei em abundância o meu santíssimo Espírito sobre todo o ser vivo, sem excepção. Revelei o meu nome a todos os homens e disse-lhes, pelas minhas obras, que eu sou o criador, que sou o autor do mundo. Mostrei-o e mostro agora tudo o que era preciso fazer.» Pregador do Papa: São muitos ou poucos os que se salvam? Comentário do Pe. Cantalamessa sobre a liturgia do próximo domingo ROMA, sexta-feira, 24 de agosto de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário do Pe. Raniero Cantalamessa, ofmcap., pregador da Casa Pontifícia, sobre a liturgia do próximo domingo, XXI do tempo comum. *** XXI Domingo do Tempo Comum Isaías 66, 18-21; Hebreus 12, 5-7.11-13; Lucas 13, 22-30 Entrar pela porta estreita Existe um interrogante que sempre marcou os fiéis: são muitos ou poucos os que se salvam? Em certas épocas, este problema se tornou tão agudo que submergiu algumas pessoas em uma angústia terrível. O Evangelho deste domingo nos informa que um dia se propôs a Jesus este problema: «Enquanto caminhava para Jerusalém, alguém lhe disse: ‘Senhor, são poucos os que se salvam?’». A pergunta, como se vê, trata do número, sobre quantos se salvam: muitos ou poucos? Jesus, em sua resposta, traslada o centro de atenção de todos que se salvam a como salvar-se, isto é, entrando «pela porta estreita». É a mesma atitude que observamos com relação ao retorno final de Cristo. Os discípulos perguntam quando acontecerá a volta do Filho do homem, e Jesus responde indicando como preparar-se para essa vinda, o que fazer na espera (Mt 24, 3-4). Esta forma de atuar de Jesus não é estranha ou descortês. Simplesmente é a maneira de atuar de alguém que quer educar seus discípulos para que passem do plano da curiosidade ao da verdadeira sabedoria; das questões ociosas que seduz as pessoas aos verdadeiros problemas que importam na vida. Neste ponto, já podemos entender o absurdo daqueles que, como as Testemunhas de Jeová, crêem saber até o número preciso dos salvos: cento e quarenta e quatro mil. Este número que aparece no Apocalipse, tem um valor puramente simbólico (12 ao quadrado, o número das tribos de Israel, multiplicado por mil) e se explica imediatamente com a expressão que lhe segue: «uma multidão imensa que ninguém poderia contar» (Ap 7, 4.9). Também, se esse fosse de verdade o número dos salvos, então já podemos fechar a porta, nós e eles. Na porta do paraíso deve estar pendurada, há muito tempo, como na entrada dos estacionamentos, a placa de «lotado». Portanto, se para Jesus não interessa tanto revelar-nos o número dos salvos como a forma de salvar-se, vejamos o que nos diz ao respeito. Duas coisas substancialmente: uma negativa, uma positiva; primeiro, o que não é necessário, depois o que sim o é para salvar-se. Não é necessário, ou em todo caso não basta, o fato de pertencer a um determinado povo, a uma determinada raça, tradição ou instituição, ainda que fosse o povo escolhido do qual provém o Salvador. O que situa no caminho da salvação não é um certo título de propriedade («Comemos e bebemos em tua presença...»), mas uma decisão pessoal seguida de uma coerente conduta de vida. Isso está mais claro ainda no texto de Mateus, que contrapõe dois caminhos e duas entradas, uma estreita e outra ampla (Mateus 7, 13-14). Por que estes dois caminhos são chamados respectivamente de caminho «amplo» e «estreito»? Será que, talvez, o caminho do mal seja sempre fácil e agradável de percorrer, e o caminho do bem, sempre duro e fatigoso? Aqui é preciso estar atentos para não cair na freqüente tentação de achar que tudo acontece magnificamente bem, aqui abaixo, aos malvados, e tudo vai sempre mal para os bons. O caminho dos ímpios é amplo, sim, mas só no começo; na medida em que se adentram nele, ele se torna estreito e amargo. E em todo caso é estreitíssimo no final, porque se chega a uma rua sem saída. O desfrute que neste caminho se experimenta tem como característica que diminui na medida em que é provado, até gerar náusea e tristeza. Isso se vê em certos tipos de embriaguez, como a droga, o álcool, o sexo. Precisa-se de uma dose ou um estímulo cada vez maior para conseguir um prazer da mesma intensidade. Até que o organismo já não responde e chega à ruína, freqüentemente também física. O caminho dos justos, ao contrário, é estreito no começo, quando se empreende, mas depois se transforma em uma via espaçosa, porque nela se encontra esperança, alegria e paz no coração. [Tradução realizada por Zenit] Pregador do Papa: «São poucos os que se salvam?» Padre Cantalamessa comenta o evangelho deste domingo CIDADE DO VATICANO, sexta-feira, 20 de agosto de 2004 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário que o padre Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia, escreveu sobre a passagem evangélica da liturgia deste domingo, 22 de agosto, Lucas 13, 22-30, na qual uma pessoa perguntou a Jesus: «Senhor, são poucos os que se salvam?». *** Há uma pergunta que desde sempre se propuseram os crentes: São muitos ou poucos os que se salvam? Em certas épocas, este problema se fez tão agudo que levou algumas pessoas a uma angústia terrível. O Evangelho nos informa que um dia este problema foi proposto a Jesus: «Uma pessoa lhe perguntou: “Senhor, é verdade que são poucos os que se salvam?”». A pergunta, como se vê, refere-se ao número: quantos se salvam, muitos ou poucos? Jesus muda o centro da atenção de todos ao como é possível se salvar, ou seja, entrando pela «porta estreita». É a mesma atitude que se constata ao enfrentar o tema do regresso final de Cristo. Os discípulos lhe perguntaram quando regressaria o Filho do Homem e Jesus responde indicando como se preparar para este regresso (Cf. Mateus 24, 3-4). Esta maneira de atuar de Jesus não é estranha nem descortês. É simplesmente a atuação de quem quer educar os discípulos a passar do nível da curiosidade ao da autêntica sabedoria; das questões ociosas que apaixonam o povo aos autênticos problemas da vida. Daí podemos compreender o absurdo daqueles, como os Testemunhas de Jeová, que crêem saber inclusive o número exato dos salvos: 144 mil. Este número, que aparece no Apocalipse, tem um valor meramente simbólico (o quadrado de 12, o número das tribos de Israel, multiplicado por mil) e se explica nesta expressão: «Uma multidão imensa, que ninguém podia contar» (Apocalipse 7, 4.9). Depois de tudo, se esse é realmente o número dos salvos, então poderíamos economizar esforços, nós e eles. Na porta do paraíso deveria estar escrito há tempos o cartaz «Lotado». Se, portanto, a Jesus não interessa nos revelar o número dos salvos, mas sim a maneira de se salvar, vejamos o que é que nos diz neste sentido. Duas coisas essencialmente: uma negativa e uma positiva, a primeira, o que não serve, depois, o que serve para se salvar. Não serve, ou não basta, o fato de pertencer a um determinado povo, a uma determinada raça, tradição ou instituição, ainda que fosse o povo eleito do qual procede o Salvador. O que leva à salvação não é a posse de algum título («Comemos e bebemos contigo»), mas uma decisão pessoal, seguida por uma conduta de vida coerente. Isto fica mais claro ainda no texto de Mateus, que põe em contraste entre si dois caminhos e duas portas, uma estreita e outra ampla (Cf. Mateus 7, 13-14). Por que chama estes dois caminhos respectivamente de o “amplo” e o “estreito”? É sempre fácil e agradável o caminho do mal, e duro e cansativo o do bem? Nisso há que estar atentos para não cair na típica tentação de crer que aos malvados tudo vai magnificamente bem aqui, enquanto que pelo contrário aos bons tudo sai mal. A senda dos ímpios se amplia, sim, mas só ao início. À medida que se adentram nela, faz-se estreita e amarga. Faz-se, em todo caso, sumamente estreita ao final, pois acaba em uma rua sem saída. A alegria que nela se experimenta tem como característica o diminuir segundo se experimenta, até criar náuseas e tristeza. Pode-se constatar em certo tipo de embriaguez, como com a droga, o álcool ou o sexo. Necessita-se de uma dose ou um estímulo cada vez mais forte para produzir um prazer da mesma intensidade. Até que o organismo deixa de responder e então acontece a queda, com freqüência inclusive física. A senda dos justos, pelo contrário, é estreita ao início, mas depois se faz ampla, pois nela há esperança, alegria e paz do coração. Leva à vida e não à morte. [Original italiano publicado por «Famiglia Cristiana». Tradução realizada por Zenit.] ZP04082003 João Paulo II Discurso em Paris no dia 3 de Junho de 1980 "É estreita a porta e apertado o caminho que conduz à vida" Vim encorajar-vos no caminho do Evangelho, um caminho certamente estreito, mas caminho real, seguro, trilhado por gerações de cristãos, ensinado pelos santos. É o caminho pelo qual, exactamente como vós, se esforçam por caminhar os vossos irmãos em toda a Igreja. Este caminho não passa pela resignação, pelas renúncias ou pelos abandonos. Não se coaduna com o enfraquecimento do sentido moral, e desejaria que a própria lei civil ajudasse a elevar o homem. Não aspira a enterrar-se, a ficar inadvertido, mas antes exige a audácia jubilosa dos apóstolos. Por isso, deita fora a pusilanimidade, mostrando-se absolutamente respeitosa para com os que não partilham do mesmo ideal. «Reconhece, ó cristão, a tua dignidade!», dizia o grande papa S. Leão. E eu, seu indigno sucessor, vo-lo digo a vós, meus irmãos e minhas irmãs: Reconhecei a vossa dignidade! Sede ciosos da vossa fé, do dom do Espírito que o Pai vos outorga. Vim para o meio de vós como um pobre, com a única riqueza da fé, peregrino do Evangelho. Dai à Igreja e ao mundo o exemplo da vossa fidelidade sem desfalecimento e do vosso zelo missionário. A minha visita que ser um apelo a um novo impulso perante as numerosas tarefas que se vos oferecem. Bento XVI: A verdadeira amizade com Cristo abre-nos a porta do céu Intervenção por ocasião da oração mariana do Angelus CASTEL GANDOLFO, domingo, 26 de agosto de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos a intervenção que Bento XVI pronunciou este domingo ao rezar a oração mariana do Angelus junto a vários milhares de peregrinos congregados no pátio da residência pontifícia de Castel Gandolfo. *** Queridos irmãos e irmãs: A liturgia de hoje também nos propõe uma palavra de Cristo iluminadora e ao mesmo tempo desconcertante. Durante seu último caminho para Jerusalém, alguém lhe disse: «Senhor, são poucos os que se salvam?. E Jesus respondeu: «Façam tudo para entrar pela porta estreita. Pois eu afirmo a vocês que muitos vão querer entrar, mas não poderão» (Lc 13, 23-24). O que significa esta «porta estreita»? Por que muitos não conseguirão entrar por ela? Trata-se talvez de uma passagem reservada só a alguns eleitos? De fato, este modo de raciocinar dos interlocutores de Jesus, olhando bem, é sempre atual: sempre está a tentação de interpretar a prática religiosa como fonte de privilégios ou de seguranças. Na realidade, a mensagem de Cristo vai exatamente na direção oposta: todos podem entrar na vida, mas para todos a porta é «estreita». Não há privilégios. A passagem à vida eterna está aberta a todos, mas é «estreita» porque é exigente, requer empenho, abnegação, mortificação do próprio egoísmo. Uma vez mais, como nos domingos anteriores, o Evangelho convida-nos a considerar o futuro que nos espera e ao qual devemo-nos preparar durante nossa peregrinação terrena. A salvação, que Jesus obrou com sua morte e ressurreição, é universal. Ele é o único Redentor e convida todos ao banquete da vida imortal. Mas com uma única e igual condição: a de esforçar-se em segui-lo e imitá-lo, carregando, como Ele fez, a própria cruz e dedicando a vida ao serviço dos irmãos. Única e universal, portanto, é esta condição para entrar na vida celestial. No último dia – recorda também Jesus no Evangelho – não seremos julgados segundo supostos privilégios, mas segundo nossas obras. Os «agentes de iniqüidade» serão excluídos, enquanto que serão acolhidos todos que tenham realizado o bem e buscado a justiça, à custa de sacrifícios. Não bastará, portanto, declarar-se «amigo» de Cristo, louvando-se de falsos méritos: «comemos e bebemos contigo, e ensinaste em nossas praças» (Lc 13, 26). A verdadeira amizade com Jesus se expressa na forma de viver: se expressa com a bondade do coração, com a humildade, a mansidão e a misericórdia, o amor pela justiça e a verdade, o empenho sincero e honesto pela paz e a reconciliação. Este, poderíamos dizer, é o «documento de identidade» que nos qualifica como seus autênticos «amigos»; este é o «passaporte» que nos permitirá entrar na vida eterna. Queridos irmãos e irmãs: se queremos também nós passar pela porta estreita, devemos empenhar-nos em ser pequenos, isto é, humildes de coração como Jesus. Como Maria, Mãe sua e nossa. Ela, em primeiro lugar, detrás do Filho, percorreu o caminho da Cruz e foi elevada à glória do Céu, como recordamos há alguns dias. O povo cristão a invoca como Ianua Caeli, Porta do Céu. Peçamos-lhe que nos guie, em nossas eleições diárias, pelo caminho que conduz à «porta do Céu». [Traduzido por Zenit © Copyright 2007 - Libreria Editrice Vaticana] Evangelho segundo S. Lucas 13,31-35. – cf.par. cf.Mt 23,37-39 Naquela altura aproximaram-se dele alguns fariseus, que lhe disseram: «Vai-te embora, sai daqui, porque Herodes quer matar-te.» Respondeu-lhes: «Ide dizer a essa raposa: Agora estou a expulsar demónios e a realizar curas, hoje e amanhã; ao terceiro dia, atinjo o meu termo. Mas hoje, amanhã e depois devo seguir o meu caminho, porque não se admite que um profeta morra fora de Jerusalém.» «Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas aqueles que te são enviados! Quantas vezes Eu quis juntar os teus filhos, como a galinha junta a sua ninhada debaixo das asas, e não quiseste! Agora, ficará deserta a vossa casa. Eu vo-lo digo: Não me vereis até chegar o dia em que digais: Bendito seja aquele que vem em nome do Senhor!» Jean Tauler (c. 1300-1361), dominicano em Estrasburgo Sermão 21, 4º para a Ascensão «Quantas vezes quis juntar os teus filhos como a galinha junta os seus pintainhos e vós não quisestes» Jerusalém era uma cidade de paz, e foi também uma cidade de tormento, pois Jesus sofreu lá imensamente e morreu lá muito dolorosamente. É nesta cidade que devemos ser suas testemunhas, e não só em palavras mas em verdade, através da nossa vida, imitando-o tanto quanto possamos. Muitos homens seriam de boa vontade as testemunhas de Deus na paz, na condição de tudo correr ao seu jeito. De boa vontade seriam santos, na condição de nada acharem de amargo nos exercícios e no trabalho da santidade. Gostariam de saborear, desejar e conhecer as doçuras divinas, sem terem de passar por qualquer contrariedade, pena ou desolação. Quando lhes surgem fortes tentações, trevas, quando já não têm o sentimento e a consciência de Deus, quando se sentem abatidos interior e exteriormente, então revoltam-se e não são, como tal, verdadeiras testemunhas. Todos os homens buscam a paz. Por todo o lado, nas suas obras e de todas as maneiras, procuram a paz. Ah! Pudéssemos nós libertar-nos dessa busca e procurarmos, nós, a paz, no tormento. Só aí nasce a verdadeira paz, aquela que permanece e dura... Procuremos a paz na angústia, a alegria na triteza, a simplicidade na multiplicidade, a consolação na contrariedade; é assim que nos tornaremos verdadeiras testemunhas de Deus. João Paulo II Carta Apostólica “Redemptionis anno”, Abril de 1984 “Jerusalém, … quantas vezes Eu quis reunir os teus filhos” Além de monumentos célebres e esplêndidos, Jerusalém encerra comunidades vivas de cristãos crentes, judeus e muçulmanos, cuja presença é um garante e uma fonte de esperança para as nações que, de todas as partes do mundo, olham para a Cidade santa como um património espiritual e um sinal de paz e de concórdia. Sim, enquanto pátria do coração de todos os descendentes de Abraão, que lhe tributam um profundo amor, e enquanto lugar onde se encontram, aos olhos da fé, a infinita transcendência de Deus e as coisas criadas, Jerusalém é um símbolo de encontro, de união e de paz para toda a família humana. A Cidade santa encerra, portanto, um firme apelo à paz para toda a humanidade, e especialmente para os adoradores do Deus único e grande, Pai misericordioso dos povos. Infelizmente, temos de afirmar que Jerusalém continua a se palco de contínuas rivalidades, de violência e reivindicações. Esta situação e estas reflexões trazem aos nossos lábios as palavras do profeta: “Por amor de Si ão não Me hei-de calar, por causa de Jerusalém não terei repouso, enquanto a sua justiça não despontar como a aurora e a sua salvação não resplandecer com facho ardente” (Is 62, 1). Pensamos no dia e esperamo-lo com impaciência, em que todos serão verdadeiramente “ensinados por Deus” (Jo 6, 45) a fim de que escutemos a sua mensagem de reconciliação e de paz. Pensamos no dia em que judeus, cristãos e muçulmanos possam trocar entre eles, em Jerusalém, a saudação de paz que Jesus dirigiu aos seus discípulos depois de ressuscitar: “A paz esteja convosco!” (Jo 20, 19).