UNIVERSIDADE LUSÍADA DE LISBOA Faculdade de Arquitetura e Artes Mestrado Integrado em Arquitetura Alentejo e casa pátio em Aires Mateus Realizado por: Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Orientado por: Prof. Doutor Arqt. Bernardo d'Orey Manoel Constituição do Júri: Presidente: Orientador: Arguente: Prof. Doutor Arqt. Joaquim José Ferrão de Oliveira Braizinha Prof. Doutor Arqt. Bernardo d'Orey Manoel Prof. Doutor Arqt. Rui Manuel Reis Alves Dissertação aprovada em: 22 de Abril de 2015 Lisboa 2014 U N I V E R S I D A D E L U S Í A D A D E L I S B O A Faculdade de Arquitectura e Artes Mestrado Integrado em Arquitectura Alentejo e casa pátio em Aires Mateus Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Lisboa Dezembro 2014 U N I V E R S I D A D E L U S Í A D A D E L I S B O A Faculdade de Arquitectura e Artes Mestrado Integrado em Arquitectura Alentejo e casa pátio em Aires Mateus Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Lisboa Dezembro 2014 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Alentejo e casa pátio em Aires Mateus Dissertação apresentada à Faculdade de Arquitectura e Artes da Universidade Lusíada de Lisboa para a obtenção do grau de Mestre em Arquitectura. Orientador: Prof. Doutor Arqt. Bernardo d'Orey Manoel Lisboa Dezembro 2014 Ficha Técnica Autor Orientador Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Prof. Doutor Arqt. Bernardo d'Orey Manoel Título Alentejo e casa pátio em Aires Mateus Local Lisboa Ano 2014 Mediateca da Universidade Lusíada de Lisboa - Catalogação na Publicação CACHOLA, Luís Manuel Moreira Godinho, 1986Alentejo e casa pátio em Aires Mateus / Luís Manuel Moreira Godinho Cachola ; orientado por Bernardo d'Orey Manoel. - Lisboa : [s.n.], 2014. - Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitectura, Faculdade de Arquitectura e Artes da Universidade Lusíada de Lisboa. I - MANOEL, Bernardo de Orey, 1969LCSH 1. Casas com pátio - Portugal - Alentejo 2. Pátios - Portugal - Alentejo 3. Arquitectura de habitação - Portugal - Alentejo 4. Aires Mateus (Firma) - Crítica e interpretação 5. Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Teses 6. Teses - Portugal - Lisboa 1. 2. 3. 4. 5. 6. Courtyard houses - Portugal - Alentejo Courtyards - Portugal - Alentejo Architecture, Domestic - Portugal - Alentejo Aires Mateus (Firm) - Criticism and interpretation Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Dissertations Dissertations, Academic - Portugal - Lisbon LCC 1. NA7523.C33 2014 AGRADECIMENTOS Quero agradecer a todos os que tornaram possível, direta ou indiretamente, a realização desta Dissertação de Mestrado. Desta forma, passo a citar os nomes das pessoas que contribuíram para a realização de todo o processo: A todos os meus colegas e amigos, com quem partilhei bons momentos, mas também preocupações e dificuldades. Aos meus familiares, que me incentivaram, aconselharam e compreenderam todas as minhas dificuldades. Ao atelier Aires Mateus pela disponibilidade demonstrada. Ao orientador Prof. Doutor Arqt. Bernardo d’Orey Manoel, pelo acompanhamento e orientação que teve ao longo deste processo. Enfim, a estes e outros mais, quero agradecer o simples facto de me terem proporcionado a realização desta dissertação, que se revelou um momento importante para a minha formação. A todos um muito obrigado! APRESENTAÇÃO Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Luís Manuel Moreira Godinho Cachola A presente dissertação tem como tema a Casa Pátio. O pátio entendido como modo de construir, de habitar. Este modo de viver com origem em civilizações primitivas, vai neste trabalho focar-se nas culturas e tradições que deixaram marcas na Península Ibérica, e concretamente na região a Sul de Portugal - o Alentejo. Pretende, também mostrar as marcas que ainda hoje testemunham essas presenças, verificáveis através das inúmeras características que ainda hoje são referências na composição arquitetónica desta região. O trabalho pretende ainda centrar-se no modo como a arquitetura contemporânea do atelier Aires Mateus, foi influenciada por este modo de construir da casa pátio e do modo de ser que constrói a arquitetura alentejana Seleciona-mos este atelier devido à sua produção arquitetónica, mais precisamente aquela que se desenvolve na região alentejana. Neste contexto foram evidenciadas três habitações unifamiliares de exemplo de Casa Pátio – A casa em Alvalade do Sado; a casa Barreira Antunes em Melides e a casa na Quinta da Fontinha, também em Melides. Por último, apresenta-se o trabalho que desenvolvemos ao longo do ano letivo 2010/2011. Trabalho esse que é o resultado da investigação efetuada. Projetamos tendo em conta a Casa-Pátio, o pátio na arquitetura alentejana visto através daqueles criadores e da observação in loco que fomos fazendo a par da investigação. Demos forma ao projeto final, certos de que fomos fortemente influenciados por todos os aspetos já enumerados. Palavras-Chave: Pátio, Casa-Pátio, Alentejo, Aires Mateus, Privacidade, Intimidade, Luz. ABSTRACT Alentejo and Courtyard-House in Aires Mateus Luís Manuel Moreira Godinho Cachola The present dissertation has as theme the courtyard house. The courtyard understood as a way to build, dwelling. This way of life originating from primitive civilizations, in this work will focus on the cultures and traditions that have left marks on the Iberian Peninsula, and specifically in the region south of Portugal - Alentejo. The work also aims to focus on how the firm of contemporary architecture Aires Mateus, was influenced by this way of building the courtyard house and on the manner of being that builds Alentejo architecture. We have selected this firm because of its architectural production, more precisely the one that is developed in the Alentejo region. In this context were shown three single family houses as an example of Patio House - The house in Alvalade Sado; house Barreira Antunes in Melides and the house at Quinta da Fontinha also in Melides. Finally, we present the work we have done throughout the school year 2010/2011. Work that is the outcome of the research performed. The Design have taking into account the Courtyard House, the courtyard in the Alentejo architecture seen through those creators and on-site observation that we were doing alongside the research. We gave way to the final design, certain that we were strongly influenced by all aspects already listed. Keywords: Courtyard, Courtyard House, Alentejo, Aires Mateus, Privacy, Intimacy, Light. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Ilustração 1 - Praça, Templo Romano em Évora e construções contiguas, exemplo de Humanização da paisagem e sobreposição de culturas, fotografia nossa, 2013......... 25 Ilustração 2 - Templo e Casas, Arquitetura Mesopotâmica. (Daniel, 2014)................ 27 Ilustração 3 - Exemplo de Domus Pompeiana, neste exemplo com peristilo (Wikipedia, 2014) .......................................................................................................................... 28 Ilustração 4 - Exemplo de ínsula em Óstia, evidência da utilização do pátio para a composição das mesmas (Wiene, 2013) .................................................................... 29 Ilustração 5 - Pátio dos Leões, Palácio de Alhambra (Wikipedia, 2014) .................... 31 Ilustração 6 - Casas pátio do bairro de alcáçova, Mértola (Macias, 1996,p.71) ......... 32 Ilustração 7 - Casas pátio do bairro de alcáçova, Mértola (in Macias, 1996, P. 70) ... 33 Ilustração 8 - Casas pátio do bairro de alcáçova, Mértola, Pátio (Macias,1996, p.84) 35 Ilustração 9 - Claustro do Mosteiro dos Jerónimos (Wikimedia, 2012). ...................... 36 Ilustração 10 - Domus Romana (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.7) ....................... 38 Ilustração 11 - Casa unifamiliar muçulmana. (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.7) ... 39 Ilustração 12 - Casa com Pátio, Mies Van der Rohe (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.11) ........................................................................................................................... 39 Ilustração 13 - Casa com Pátio, Mies Van der Rohe (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.11) ........................................................................................................................... 39 Ilustração 14 - Pavilhão Chines com Pátio (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.7) ...... 40 Ilustração 15 - Paisagem Alentejana, Terra e Água, suaves ondulações no território ( Mattos, 2012) .............................................................................................................. 41 Ilustração 16 - Alentejo, Plano de rua, onde se evidência a importância da chaminé, e os poucos vãos das fachadas (Oliveira, Galhano, 1992, P. 161) ................................ 43 Ilustração 17 - Casa Alentejana, onde se evidencia a utilização de duas águas, no telhado, e onde se verifica a importância da cozinha e da chaminé na composição da casa (Associação dos Arquitetos Portuueses, p.98) ................................................... 44 Ilustração 18 - Serpa, Monte da Cascalheira, onde se evidencia a estrutura composta em volta do pátio central (Oliveira, Galhano, 1992, P. 154) ........................................ 45 Ilustração 19 - Monte, Herdade da Terrosa, Estremoz, exemplo da disposição dos equipamentos do monte em torno do pátio central, centro de todo o equipamento (Oliveira, Galhano, 1992, p. 168) ................................................................................ 46 Ilustração 20 - Alentejo, plano de rua, exemplo da expressividade dos materiais utilizados, com ou sem a cal a revestir ....................................................................... 47 Ilustração 21 – “A Cidade dos Príncipes”, pintura de Nadir Afonso, Arquiteto, Pintor, Artista abstrato, importância da arquitetura na pintura do autor (Afonsor, 2014) ......... 49 Ilustração 22 - RADIX, Bienal de Veneza 2012, Escultura dos Arquitetos Aires Mateus, fotografia por Saleh, 2012 (Basulto, 2012) .................................................................. 49 Ilustração 23 - Cabanas do Rio, Aires Mateus, fotografia por Garrido, 2013 (Frearsoon, 2013) .......................................................................................................................... 50 Ilustração 24 - - Reitoria da Universidade Nova de Lisboa (1998-01), (Wikipedia, 2014) ................................................................................................................................... 50 Ilustração 25 - Residência de Estudantes do Campus II da Universidade de Coimbra (1996-99), (Loko, 2012) .............................................................................................. 50 Ilustração 26 - Maqueta, Casa em Alenquer (Otxotorena, 2003, p. 13) ..................... 51 Ilustração 27 - Maqueta, Casa em Coruche, (in Baptista; Ventosa,2007, P.50) ......... 52 Ilustração 28 - Plantas e Cortes, Casa em Coruche (in Baptista; Ventosa,2007, P.50) ................................................................................................................................... 53 Ilustração 29 - Casa na Aroeira, vista do acesso á moradia (in Vita, 2013, p.75) ...... 53 Ilustração 30 - Casa na Aroeira, vista para o pátio (in Vita, 2013, p.75) .................... 54 Ilustração 31 - Casa na Aroeira, Planta e corte (in Vita, 2013, p.77) .......................... 55 Ilustração 32 - Casa em Leiria, vista onde se evidencia a importância dos pátios (in Vita, 2013, p.70) ......................................................................................................... 55 Ilustração 33 - Casa em Leiria, Maqueta onde se verifica que a casa nasce no subsolo e a importância do pátio para a iluminação, (Figueiredo, 2012) .................................. 56 Ilustração 34 - Casa em Leiria, Cortes, onde se verifica a importância dos pátios e a alteração da forma do mesmo ao longo do edifício, (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ............................................. 56 Ilustração 35 - Casa em Leiria, Vista do pátio central, do piso inferior para o térreo, onde se verifica a relação visual entre os espaços (in Vita, 2013, p.73) .............................. 57 Ilustração 36 - Alvalade do Sado, Paisagem Alentejana onde se verificam as suaves ondulações do terreno e o pontilhar dos carvalhos (in Otxotorena. 2003, p. 16)) ........ 59 Ilustração 37 - Espaços principais inseridos no quadrado que compõem o projeto (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) ........... 60 Ilustração 38 - espaços de serviço, pensados e dispostos como se tratassem de um muro escavado (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) ...................................................................................................................... 61 Ilustração 39 - O pátio como objeto principal da casa. (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) .......................................................... 62 Ilustração 40 - Fotografia de maqueta onde se pode verificar os vão inseridos na fachada (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) ................................................................................................................................... 63 Ilustração 41 - - Fotografia de maqueta onde se pode verificar os vão inseridos na fachada (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) ................................................................................................................................... 63 Ilustração 42 - Corte que evidencia as diferentes alturas dos tetos dos espaços secundários e principais, assim como a claraboia da cozinha (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014)......................................... 63 Ilustração 43 - Planta da casa em Alvalade do Sado (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ............................................. 64 Ilustração 44 - Planta da casa em Alvalade do Sado, Pátios (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ............................................. 64 Ilustração 45 - Planta da casa em Alvalade do Sado, onde se verifica o modo de compor o projeto, espaços principais a branco e secundários a preto (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ............................................. 64 Ilustração 46 - Casa Barreira Antunes, Vista da Piscina (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ...... 65 Ilustração 47 - Casa Barreira Antunes, Casa como um ponto branco (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) .......................................................................................................................... 66 Ilustração 48 - Casa Barreira Antunes, Vista de uma das aberturas situadas a Nascente e a Poente (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ................................................................................ 67 Ilustração 49 - Casa Barreira Antunes, Pátio central que serve para impedir o atravessamento da visualização da casa (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ............................ 67 Ilustração 50 - Casa Barreira Antunes, Cortes, onde se verifica a diferenciação das alturas entre os espaços principais e secundários para se obter a sensação de muro escavado (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) .......................................................................................................................... 68 Ilustração 51 - Vista de uma das entradas de luz que reflete bem o ambiente calmo e tranquilo pretendido. (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ................................................................... 69 Ilustração 52 - Vista para um dos espaços secundários escavados nas grossas paredes (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) .................................................................................................... 70 Ilustração 53 - Vista para dois espaços secundários escavados nas grossas paredes, onde se evidencia a subida de um degrau e a descida do teto em relação ao espaço principal (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ................................................................................ 70 Ilustração 54 - Pormenor da planta na zona de um dos quartos, onde se evidencia a importância dos pequenos pátios para a iluminação destes espaços (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ............................ 70 Ilustração 55 - Casa Barreira Antunes, Planta onde se verifica a preto os espaços secundários e a branco o espaço principal, a sala, e também a relação entre cheios e vazios, descrita por Manuel Aires Mateus (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ................................................................... 71 Ilustração 56 - Casa na Quinta da Fontinha, Vista, fotografia por GUERRA (2013) (in SPIROU, 2014) ........................................................................................................... 72 Ilustração 57 - Casa na Quinta da Fontinha, Vista de Cima, onde se verifica que a casa se fecha do lado da estrada e se abre para a encosta e que se desenvolve torno do pátio, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) ................................................... 73 Ilustração 58 - Casa na Fontinha, principais volumes do edifício têm uma forma trapezoidal que subtilmente distorce a sua proporção, Fotografia por Guerra (2013) (FREARSOON, 2013) ................................................................................................. 74 Ilustração 59 - Canto cortado de forma curva, Fotografia por Guerra (2013) (in FREARSOON, 2013) .................................................................................................. 74 Ilustração 60 - Entrada para a sala do piso inferior, Fotografia por Guerra (2013) (in FREARSOON, 2013) .................................................................................................. 74 Ilustração 61 - Teto de forma curva, Fotografia por Guerra (2013) (FREARSOON, 2013) ................................................................................................................................... 74 Ilustração 62 - Casa na Quinta da Fontinha, Vista, aspeto austero da do edifício, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) ............................................................. 75 Ilustração 63 - Casa na Quinta da Fontinha, Vista, aspeto austero da do edifício compensado pela subtileza das formas curvas, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) .......................................................................................................................... 75 Ilustração 64 - Casa na Quinta da Fontinha, vista do pátio para o plano de água e para a envolvente, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) ....................................... 75 Ilustração 65 - Casa na Quinta da Fontinha, vista do pátio para o plano de água e para a envolvente, fotografia por GUERRA (2013) (SPIROU, 2014)................................... 75 Ilustração 66 - Lareira triangular, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU,2014) ........ 76 Ilustração 67 - Balcão, armário e clarabóia da cozinha, Fotografia por Guerra (2013) (FREARSOON, 2013) ................................................................................................. 76 Ilustração 68 - Casa de banho do quarto principal, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014).......................................................................................................... 76 Ilustração 69 - Porta curva dos quartos secundários, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014).......................................................................................................... 76 Ilustração 70 - Planta da zona da entrada, onde se verificam os dois espaços para armazenamento, e a sala secundária (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) ................................................................................ 77 Ilustração 71 - Planta do piso principal, onde se localizam os quartos, cozinha e pátio. (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) .. 78 Ilustração 72 - Corte pelas escadas, evidência da forma curva como elemento da composição (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) .................................................................................................................. 78 Ilustração 73 - O Sítio de Lisboa, a sua morfologia em planta, desenho nosso, 2011 82 Ilustração 74 - O Sítio de Lisboa, a sua morfologia Alçado, desenho nosso, 2011 .... 82 Ilustração 75 - Lisboa, Plantas Ilustrativas da sua evolução Histórica (Romana, Muçulmana e Atual), Desenhos nossos, 2011 ............................................................ 83 Ilustração 76 - Lisboa; Área de estudo (intervenção), Alfama, Fotomontagem sobre fotografia de Lisboa retirada de Google Maps ............................................................ 83 Ilustração 77 - Morfologia do Bairro de Alfama, alçado (desenho nosso, 2011)......... 84 Ilustração 78 - Morfologia do Bairro de Alfama, corte transversal (desenho nosso, 2011) ................................................................................................................................... 84 Ilustração 79 - Morfologia do Bairro de Alfama, corte longitudinal (desenho nosso, 2011) ................................................................................................................................... 84 Ilustração 80 - Pátio dos Quintalinhos (Silva, 2004)................................................... 84 Ilustração 81 - Pátio do Curvo (Silva, 2004) .............................................................. 85 Ilustração 82 - Pátio da Cruz (Silva, 2004) ................................................................ 86 Ilustração 83 - Pátio da Cruz (Silva, 2004) ................................................................ 86 Ilustração 84 - Pátio da Pascácia (Silva, 2004).......................................................... 86 Ilustração 85 - Pátio da Pascácia (Silva, 2004).......................................................... 86 Ilustração 86 - Pátio do Carrasco (Silva, 2004).......................................................... 87 Ilustração 87 - Pátio do Carrasco (Silva, 2004).......................................................... 87 Ilustração 88 - Pátio Dom Fradique (Silva, 2004) ...................................................... 87 Ilustração 89 - Pátio Dom Fradique (Silva, 2004) ...................................................... 87 Ilustração 90 - Pátio das Cozinhas (Silva, 2004) ....................................................... 88 Ilustração 91 - Pátio das Cozinhas (Silva, 2004) ....................................................... 88 Ilustração 92 - - Calçada do Marquês de Tancos, pintura de Carlos Botelho (1949).. 88 Ilustração 93 - Chão do Loureiro, pintura de Carlos Botelho (1949) .......................... 88 Ilustração 94 - Fotomontagem, Mercado do chão de Loureiro, edifício como charneira entre o largo da atafona, a calçada do Marquês de Tancos e o Largo do chão do Loureiro. Entre Alfama e a Baixa Pombalina (fotomontagem nossa sobre fotografias nossas, 2011) ............................................................................................................. 89 Ilustração 95 - Mercado do Chão de Loureiro, visto do Largo do Chão de Loureiro (fotografia nossa, 2011) .............................................................................................. 89 Ilustração 96 – Mercado do Chão de Loureiro, visto do Beco da Atafona (fotografia nossa, 2011) ............................................................................................................... 89 Ilustração 97 - Mercado do Chão de Loureiro, vista da calçada do Marques de Tancos (fotografia nossa, 2011) .............................................................................................. 90 Ilustração 98 - Mercado do Chão do Loureiro, vista das escadas de acesso á calçada do Marquês de Tancos (fotografia nossa, 2011) ......................................................... 90 Ilustração 99 - Largo da Atafona (fotografia nossa, 2011) ......................................... 90 Ilustração 100 - Mercado do Chão do Loureiro Vista para o miradouro (fotografia nossa, 2011) .......................................................................................................................... 90 Ilustração 101 - Planta atual da Zona da Intervenção (desenho nosso, sobre planta de Lisboa, 2011) .............................................................................................................. 91 Ilustração 102 - "Das Cabinet des Dr. Caligari", filme expressionista alemão realizado por Robert Wiene, 1920 .............................................................................................. 92 Ilustração 103 - "Das Cabinet des Dr. Caligari", filme expressionista alemão realizado por Robert Wiene, 1920 .............................................................................................. 92 Ilustração 104 - Sala de concertos da Filarmónica de Berlim fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) ....................................................................................... 92 Ilustração 105 - Entrada Principal da Filarmónica de Berlim, fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) ....................................................................................... 92 Ilustração 106 - Maqueta da Filarmónica de Berlim, fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) ........................................................................................................ 93 Ilustração 107 - Planta da Sala de concertos da Filarmónica de Berlim, desenho cedido por de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011 ............................................................ 93 Ilustração 108 - Planta de acessos da Filarmónica de Berlim, desenho cedido por de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011 ....................................................................... 93 Ilustração 109 - Corte Transversal da Filarmónica de Berlim, desenho cedido por Wikimedia Commons (in KROLL, 2011)...................................................................... 94 Ilustração 110 - Vista da Filarmónica de Berlim, fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) ............................................................................................................. 95 Ilustração 111 - Vista da Filarmónica de Berlim, fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011 .............................................................................................................. 95 Ilustração 112 - zona interior/exterior do edifício Franjinhas (fotografia nossa, 2011) 96 Ilustração 113 - zona interior/exterior do edifício Franjinhas (fotografia nossa, 2011) 96 Ilustração 114 - Planta corte e vista do Edifício Franjinhas (CML, 2014) ................... 97 Ilustração 115 - Fotomontagem nossa sobre fotografia de Guerra, 2014 .................. 98 Ilustração 116 - Fotomontagem nossa, sobre fotografia de Silva., 2000 .................... 98 Ilustração 117 - Desenho Referencia, expressionismo alemão, desenho de Mendelsohn (in ZEVI, 2002) " ......................................................................................................... 99 Ilustração 118 - Edifício como uma Montanha, Desenho conceptual nosso, 2011 ..... 99 Ilustração 119 - Edifício como uma montanha escavada, Desenho conceptual nosso, 2011 ........................................................................................................................... 99 Ilustração 120 - Anjo do "Wings of Desire" olhando Lisboa, Fotomontagem nossa, sobre fotografia nossa e imagem do filme "Wings of Desire" de Wim Wenders, 1987 .......... 99 Ilustração 121 - O anjo ouvindo os pensamentos do humano, a relação visual entre pisos, Imagem retirada do filme "Wings of Desire" de Wim Wenders, 1987 .............. 100 Ilustração 122 - Desenho sobre referência, pátio central e muros a rodeá-lo, Desenho nosso, 2011 .............................................................................................................. 100 Ilustração 123 - Desenho sobre referência, muros ao redor do pátio, Desenho nosso, 2011 ......................................................................................................................... 100 Ilustração 124 - Desenho sobre referência, muros escavados ao redor de um pátio, Desenho nosso, 2011 ............................................................................................... 100 Ilustração 125 - Tensões e acessos dentro de um pátio, Desenho nosso, 2011...... 100 Ilustração 126 - Desenho sobre referência, muros ao redor de um pátio, Desenho nosso, 2011 .............................................................................................................. 100 Ilustração 127 - Maqueta conceptual, solido compacto, com cobertura separada tipo tenda aberta, Fotografia nossa, 2011 ....................................................................... 101 Ilustração 128 - Maqueta conceptual, solido decomposto por níveis, tipo topografia, como uma montanha, Fotografia nossa, 2011 .......................................................... 101 Ilustração 129- Maqueta conceptual, solido decomposto por níveis, tipo topografia, como uma montanha escavada no centro, Pátio, Fotografia nossa, 2011 ................ 101 Ilustração 130 - Diagrama do Programa, Desenho nosso, 2011 .............................. 103 Ilustração 131 - relações com a envolvente próxima, Desenho nosso, 2011 ........... 104 Ilustração 132 - relações com a envolvente próxima, sistema viário, largos, praças e momentos, desenho nosso, 2011 ............................................................................. 104 Ilustração 133 - relação com o Rio Tejo e Praça do Comercio, Desenho nosso, 2011 ................................................................................................................................. 104 Ilustração 134 - Planta do Ingresso 1, cota -00,60 m ............................................... 105 Ilustração 135 - Planta do ingresso 1, cota de projeto 0,00 m, Desenho nosso, 2011 ................................................................................................................................. 105 Ilustração 136 - Planta do Ingresso 2, cota 05,50 m, Desenho nosso, 2011 ............ 106 Ilustração 137 - Planta do Ingresso 3, cota 21,38 m, Desenho nosso, 2011 ............ 106 Ilustração 138 - Sistema Distributivo da zona do ingresso 1, Desenho nosso, 2011 107 Ilustração 139 - Sistema Distributivo da zona do ingresso 2, Desenho nosso, 2011 107 Ilustração 140 - Sistema distributivo do piso tipo, Desenho nosso, 2011 ................. 108 Ilustração 141 - Sistema distributivo da zona do ingresso 3, desenho nosso, 2011 . 108 Ilustração 142 - Sistema estrutural do Edifício, desenho nosso, 2011 ..................... 108 Ilustração 143 - Sistema Estrutural do Edifício, desenho nosso, 2011 ..................... 109 Ilustração 144 - Planta nível - 1 (Estacionamento e cargas e descargas do mini mercado), cota -03,6 m, Desenho nosso, 2011......................................................... 110 Ilustração 145 - Planta nível 1 (ingresso para as residências, para a biblioteca, e para o mini mercado Pingo Doce) cota -00,6m, Desenho nosso, 2011 ............................. 110 Ilustração 146 - Fotomontagem, Atmosfera Expressionista, ingresso 1, sobre fotografias nossas, imagem do filme "Das Cabinet des Dr. Caligari", realizado por Robert Wiene, 1920 e fotografia da filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) ........................................................................................................................ 111 Ilustração 147 - Fotomontagem, Atmosfera Expressionista, ingresso 1, sobre fotografias nossas, e fotografia da Filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) ........................................................................................................... 111 Ilustração 148 - Fotomontagem, Atmosfera Expressionista, ingresso 1, sobre imagem do filme "Das Cabinet des Dr. Caligari", realizado por Robert Wiene, 1920 e fotografia da Filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) ....................... 112 Ilustração 149 - Planta nível 2 (plataforma para apresentação de espetáculos / pátio central visível de todo o edifício que o circunda) cota 02,4m, desenho nosso, 2011 . 112 Ilustração 150 – Fotomontagem género, Atmosfera Expressionista da plataforma, sobre fotografia da Filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011), Fotografia nossa e imagem do filme "Das Cabinet des Dr. Caligari", realizado por Robert Wiene, 1920 ............................................................................................................. 113 Ilustração 151 - Planta nível 3 (zona do ingresso 2 - em frente ao pátio da atafona onde se localizam os serviços da escola de artes circenses, o refeitório, cozinha e os primeiro quartos da residencial) cota 05,0m, desenho nosso, 2011 .......................... 113 Ilustração 152 - Fotomontagem, ingresso 2, sobre fotografia nossa, e fotografia da Filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011)............................ 114 Ilustração 153 - Planta do nível 4 (localização do auditório e respetivo Back Stage do mesmo, sala de estar dos professores, mais 5 quartos da residencial assim como uma plataforma em mezanine que funciona como complemento do refeitório) cota 09,35 e de 7,75 m, Desenho nosso, 2011 .................................................................................. 114 Ilustração 154 - Planta do Nível 5 (contem 5 quartos da residencial, 4 salas de aulas teóricas e um bar) cota 12,65 m, Desenho nosso, 2011 ........................................... 115 Ilustração 155 - Fotomontagem, sobre fotografias nossas de Lisboa e do Circe du Soleil (2011) e imagens do filme "Das Cabinet des Dr. Caligari", realizado por Robert Wiene, 1920 ......................................................................................................................... 116 Ilustração 156 - Planta nível 6 á cota 15,00 m, desenho nosso, 2011 ..................... 117 Ilustração 157 - Planta nível 7 á cota 17,75 m, desenho nosso, 2011 ..................... 117 Ilustração 158 - Planta de Nível 8, Ingresso 3, sala de espetáculos, cota 21,38m, desenho nosso, 2011................................................................................................ 118 Ilustração 159 - Planta de Cobertura, Desenho nosso, 2011 ................................... 118 Ilustração 160 - Fotomontagem do Ingresso 3, Cobertura, Sobre fotografias nossas de Lisboa e de Maquetas, 2011 ..................................................................................... 119 Ilustração 161 - Fotomontagem, atmosfera da sala de espetáculos ........................ 119 Ilustração 162 - Alçado do Largo do chão do Loureiro, desenho nosso, 2011 ......... 120 Ilustração 163 - Fotomontagem, Vista do Largo do Chão do Loureiro, sobre fotografia e desenho nosso, 2011............................................................................................. 121 Ilustração 164 - Alçado do lago da Atafona, desenho nosso, 2011.......................... 121 Ilustração 165 - Fotomontagem, vista do largo da atafona, Sobre fotografia e desenho nossos, 2011 ............................................................................................................ 122 Ilustração 166 - Alçado da Calçada do Marquês de Tancos, desenho nosso, 2011 122 Ilustração 167 - Vista sobre a cobertura e para o Alçado da calçada do Marquês de Tancos, fotomontagem sobre fotografia e desenho nossos, 2011 ............................ 123 Ilustração 168 - Corte Longitudinal, desenho nosso, 2011 ...................................... 123 Ilustração 169 - Corte Transversal, desenho nosso, 2011 ....................................... 124 Ilustração 170 - Imagem da Biblioteca de Berlim, retiradas do Filme "Wings of Desire" de Wim Wenders, 1987 ............................................................................................ 124 Ilustração 171 - Imagem da Biblioteca de Berlim, retiradas do Filme "Wings of Desire" de Wim Wenders, 1987 ............................................................................................ 124 Ilustração 172 - Corte Longitudinais da Biblioteca, desenho nosso, 2011 ............... 125 Ilustração 173 - Corte Longitudinais da Biblioteca, desenho nosso, 2011 ............... 125 Ilustração 174 - Corte Transversal da Biblioteca, desenho nosso, 2011 .................. 126 Ilustração 175 - Corte Transversal da Biblioteca, desenho nosso, 2011 .................. 126 Ilustração 176 - Pormenor construtivo da cobertura, desenho nosso, 2011 ............. 127 Ilustração 177 - Pormenor construtivo tipo da laje e parede, desenho nosso, 2011 127 SUMÁRIO 1. Introdução .................................................................................................... 21 2. Território e cultura ........................................................................................ 25 2.1. Pátio e evolução .................................................................................... 25 2.2. Pátio e Território .................................................................................... 40 2.3. Pátio e Aires Mateus .............................................................................. 47 3. Pátio e Referência........................................................................................ 59 3.1. Casa em Alvalade do Sado ................................................................... 59 3.2. Casa Barreira Antunes, Melides ............................................................ 65 3.3. Casa na Quinta da Fontinha, Melides .................................................... 72 4. Pátio e Projeto.............................................................................................. 81 4.1. Sítio e Lugar .......................................................................................... 82 4.2. Relações e Programa ............................................................................ 91 4.2.1. Arquétipos ....................................................................................... 91 4.2.2. Conceito .......................................................................................... 98 4.2.3. Programa ....................................................................................... 101 4.2.4. Relações - Os edifícios e zonas envolventes e o Rio Tejo ............ 103 4.3. Espaço e Articulações ......................................................................... 105 4.3.1. Ingressos ....................................................................................... 105 4.3.2. Sistema Distributivo ....................................................................... 107 4.3.3. Sistema Estrutural ......................................................................... 108 4.3.4. Plantas do Projeto e Atmosferas ................................................... 109 4.3.5. Alçados, Cortes e Vistas do Projeto .............................................. 120 5. Considerações Finais ................................................................................. 129 Referências .................................................................................................... 133 Bibliografia...................................................................................................... 137 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 1. INTRODUÇÃO O assunto da presente dissertação prende-se com a influência da casa pátio e da cultura alentejana na arquitetura de Manuel e Francisco Aires Mateus. Neste sentido, surgenos o paradigma – de que modo poderá, este modo de habitar a casa, ser reinterpretado ou adaptado a diferentes locais e a diferentes programas, assim como diferentes culturas? De que maneira foram estes arquitetos influenciados e vieram, igualmente, a influenciar/desenvolver aquela cultura (alentejana) através do seu modo de arquitetar/conceber projetos? E de que modo, estas duas questões, influenciaram a conceção do projeto final de curso realizado pelo aluno? Estas serão as questões que conduzirão esta dissertação e que pretendemos desenvolver ao longo do trabalho através do tema “ Alentejo e Casa-Pátio em Aires Mateus”. Tivemos, como orientador, o Prof. Doutor Arqt. Bernardo d’Orey Manoel, docente na Universidade Lusíada de Lisboa, Faculdade de Arquitetura e Artes. A presente dissertação encontra-se dividida em três capítulos que, por sua vez, serão subdivididos em subcapítulos, sendo cada um deles correspondente a uma fase de investigação. O primeiro capítulo tem como tema Território e Cultura, onde são apresentados alguns conceitos, tendo em conta a opinião de diferentes autores sobre o Pátio e Evolução, o Pátio e Território e o Pátio em Aires Mateus. Neste capítulo pretende-se, em primeiro lugar, dar a conhecer a evolução da casa-pátio ao longo dos séculos, conhecer a sua origem, relação com as diferentes civilizações que habitaram o nosso território, nomeadamente o Sul do país, tendo em conta que nos focamos, principalmente, no Alentejo, de modo a entendermos as diferenças das casas pátio, criadas pelos diferentes modos de habitar, pelas diferentes culturas e religiões, pelas diferentes Sociedades que habitaram esta zona do mediterrâneo. Assim, tivemos em conta fatores como o clima mediterrânico, característico do nosso território, a cultura, a religião e costumes de várias civilizações e as principais marcas habitacionais deixadas por estas, no Alentejo. Pretende-se, também, relacionar a casa habitacional do aglomerado urbano com a do meio rural, ou seja do monte no Alentejo, com as das diferentes civilizações e Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 21 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus compreender de que forma o pátio tem evoluído ao longo dos séculos até à atualidade, ou seja, como a aculturação ao longo dos tempos, contribuiu para a utilização deste elemento habitacional pátio. Por fim, ainda neste capítulo, será realizada uma apresentação dos arquitetos Aires Mateus de forma a entendermos a origem da sua escola arquitetónica, como se caracteriza o seu modo de projetar e de que modo a casa pátio e a importância que lhe é conferida enquanto espaço/elemento habitacional, assim como de que modo a arquitetura alentejana, influenciam no seu modo de arquitetar. No segundo capítulo concentrar-nos-emos em Pátio e Referência. Neste serão apresentadas, como objeto de estudo, três obras, casas pátio importantes, obras dos arquitetos Aires Mateus no Alentejo, como forma de conhecermos, mais em pormenor, o seu estilo de arquitetar e percebermos como a integração do elemento pátio na habitação funciona nestes casos. As três obras apresentadas neste capítulo são: a Casa em Alvalade do Sado, uma das suas primeiras experiências projetais conhecidas em termos de casa pátio no Alentejo, a Casa Barreira Antunes em Melides, considerada a casa pátio por excelência e onde surge uma reinterpretação bastante interessante do modo de atuar do pátio na habitação e a Casa na quinta da Fontinha, também esta situada em Melides, que evidencia claras influências do modo de arquitetar da região do Alentejo, não querendo com isto dizer que os outros dois projetos referidos não o evidenciem igualmente. O terceiro, e último capítulo, corresponde à relação Pátio e Projeto. O pátio como elemento base de toda a investigação da presente dissertação e o Projeto final de curso, que realizámos. Projeto este que tem como lugar de intervenção o Mercado do Chão do Loureiro e que consistiu na reinterpretação da casa pátio, tanto a popular alentejana como a casa pátio dos arquitetos Aires Mateus, mas também do arquétipo Filarmónica de Berlim. Como tal, tentou-se uma adaptação dos paradigmas da mesma ao sítio e lugar de Lisboa e ao contexto de um complexo edificado com um programa mais variado do que a própria casa. Este último capítulo encontra-se dividido em subcapítulos - sendo estes correspondentes ao Sítio e Lugar, onde será apresentada uma breve descrição sobre o sítio de Lisboa, mais em particular do Bairro de Alfama, nomeadamente a sua geomorfologia, onde fica situado o lugar de intervenção do projeto, as Relações que o complexo edificado estabelece tanto com a sua envolvente mais próxima como com a Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 22 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus sua envolvente visual, mais longínqua, o programa inserido neste edifício e, por fim, Espaços e Articulações, onde são apresentadas em pormenor as plantas, vistas, cortes, atmosferas e pormenores da referida intervenção. Será, deste modo, apresentado, ao longo de todo este capítulo, uma reflexão que permite dar a conhecer o projeto desenvolvido e estabelecer a relação com o elemento chave desta dissertação, isto é, a casa pátio e a arquitetura dos arquitetos Aires Mateus. Por fim, poderão ser consultadas as referências e bibliografia utilizada na redação do presente documento e os apêndices e anexos referentes a todo o corpus do trabalho. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 23 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 24 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 2. TERRITÓRIO E CULTURA 2.1. PÁTIO E EVOLUÇÃO Uma paisagem, um local, um monumento, uma simples habitação, tem história, uma identidade própria, cujos traços, pistas e marcas resultam, muitas vezes, da Acão do Homem [...] a humanização das paisagens é um fenómeno quase generalizado e que, frequentemente é essa Acão que confere personalidade, comunicação, significado a determinadas zonas.” (Correia, 1995, p. 9) No que respeita à ocupação do nosso território, conhece-se a sucessão de culturas que cronologicamente passaram pela região deixando marcas na arquitetura do Alentejo, isto pode-se verificar na sobreposição homogénea de culturas que resulta numa paisagem muito peculiar (ilustração 1). Ilustração 1 - Praça, Templo Romano em Évora e construções contiguas, exemplo de Humanização da paisagem e sobreposição de culturas, fotografia nossa, 2013 (...) estamos em crer que o seu tipo de construção é o resultado de uma longa evolução, que os séculos foram modelando, cheia de contradições e anacronismos, mas talvez mais condicionada pelas circunstâncias em que se processam a exploração de terra, a transacção de produtos e gados, o mercado em que se fez a sua colocação, os rendimentos que estes proporcionaram e a forma como se repartiam, do que por influencias de carácter erudito, advindas directamente de teorias arquitetónicas ou técnicas particulares de construir” (Associação dos Arquitectos Portugueses, 1988, p. 22) Importa focar neste ponto, as principais características da arquitetura dessas diferentes culturas para podermos entender a forma como elas intervêm na arquitetura desta Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 25 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus região, dando principal destaque à habitação – à casa pátio, à sua definição e evolução uma vez que é ai que incide o presente trabalho/ dissertação. Antes de mais apresentaremos a definição de pátio. Este pode ser definido como “ […] recinto descoberto, no interior de um edifício, ou rodeado por outros edifícios; terreno murado contíguo a um edifício; vestíbulo; átrio […]” (Infopédia, 2014) E como: Pátio – Espaço aberto frente a um edifício (pátio de honra) ou compreendido no interior do edifício. Este é ladeado, geralmente rodeado de arcadas, servindo de passeio. Parte de terreno descoberto que, situado no centro de um complexo arquitetónico, serve para iluminar e arejar os recintos internos […] ” (Calado; Silva, 2005) Através destas definições, podemos descrever o pátio como sendo um espaço onde ocorre o relacionamento com a natureza, com o ar livre, suscetível à chuva, ao sol, ao vento, ao movimento das pessoas. Capitel “ […] define o pátio como um tipo, quando encarado como um modo de habitar, como um sistema. Assim sendo, este arquétipo é sistemático e versátil, sendo capaz de abarcar uma grande diversidade de usos, formas, dimensões e características […]” (Neves, 2012, p.6). Sendo que Peters defende que: A defesa aos intrusos e o abrigo contra o clima são os aspetos que estão na origem da casa-pátio, foram estes os fatores que levaram as primitivas colónias humanas a fazerem foras de casas introvertidas, nas quais os diferentes espaços se agrupavam ao redor de um pequeno pátio que era simultaneamente zona de distribuição, lugar de permanência e muitas vezes incluía a cozinha. (Neves,2012, p.7) A origem da tipologia pátio remonta ao começo da história da Humanidade, estendendose desde as habitações de antigas comunidades, nas grandes civilizações préclássicas, transpondo-se também para as clássicas até à atualidade. A Mesopotâmia, uma região fechada pelos seus dois rios – Tigre e Eufrates - por montanhas, mar, e pelo mundo árabe, foi marcada por uma sucessão de povos: os Sumérios, os Acadianos, de língua semita, divididos em Assírios, ao Norte, e em Babilónios, ao Sul. A produção artística ao serviço da sociedade desenvolve-se, inspirada pela fé e pela religiosidade dos povos. Todo este cenário levou à construção Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 26 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus dos templos1 em honra dos deuses (Ilustração 2), através da qual podemos verificar a utilização do pátio nas casas e no templo. No Sul, as construções desses templos eram feitas com tijolos de argila, modelados e secos ao sol. Como refere Moscati “ […] eram sobrepostos de maneira tão compacta e maciça que raramente o muro aparece rasgado de janelas, que lhe comprometeriam a compactidade […] ” (Moscati,1985, p.10). Neles, não existiam colunas com uma função estrutural, apenas tinham funções ornamentais. As suas paredes apresentavam se articuladas com saliências e concavidades e a luz dos espaços era obtida por meio de aberturas no sofito. As portas de entrada eram de grandes dimensões, sendo a única interrupção na continuidade das paredes. Ilustração 2 - Templo e Casas, Arquitetura Mesopotâmica. (Daniel, 2014) No que respeita à planta dos Templos: O templo mesopotâmico começa por ser um único espaço retangular, que apresenta o altar no lado mais pequeno e a mesa das oferendas diante dele (...) A entrada está habitualmente num dos lados mais compridos, ou em ambos, na parte oposta ao altar. No desenvolvimento posterior do santuário – que se inicia já no período pré-histórico -, ao vão único são acrescentados ulteriores vãos e intervém o uso do pátio interior, regra geral sobre um dos lados mais compridos da sala sagrada. (Moscati,1985, p.10) O Pátio surge, então, integrado no meio de vãos de vãos dispostos à sua volta, sendo o ponto de referência de um conjunto de habitações/salas. Este é completado por uma “Local de culto, para que o deus possa comprazer-se e assegurar, em troca, o grande recurso necessário á vida da região, ou seja, a água” (Moscati,1978:9) 1 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 27 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus cintura de muralhas, ficando isolado do resto da área citadina, sendo assumido como um témenos 2. Relativamente à arquitetura Romana, esta, esteve ligada, essencialmente, às instalações urbanas e às exigências dos cidadãos. As suas construções caraterizamse, fundamentalmente, pela utilização correta dos materiais de construção, isto é, “ […] de maneira a pôr em plena luz a evidência das relações de força entre os diversos membros da estrutura.” (Tarella,1985, p.20) Entenda-se por casa tipicamente romana, a domus Pompeiana (ilustração 3), a casa com átrio. Esse átrio consistia num pátio central, onde se realizava o fogo doméstico e eram dispostas à sua volta as restantes salas, quase sempre com uma rigorosa simetria. Ilustração 3 - Exemplo de Domus Pompeiana, neste exemplo com peristilo (Wikipedia, 2014) Após escavações em Herculano, Óstia e na própria Roma, surgiu uma variedade de tipos de habitações. Sendo que a domus pompeiana continuou a ser fundamental numa boa parte da civilização latina. […] pelo facto de ser encerrada em si própria por meio de altas paredes exteriores e de se encontrar alinhada – na maioria dos casos – segundo uma orientação precisa, que respeitava as exigências urbanísticas. Pela porta (ostium), rasgada para a rua, passa-se por um curto pátio, ou seja, para o atrium, impropriamente traduzido por «átrio», com uma abertura rectangular (impluvium) no alto, para o qual abriam as outras divisões. (Tarella,1985, p. 23) 2 Palavra grega que designa a área sagrada, ou seja, pertencente a uma divindade. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 28 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Nesta casa a sala mais importante, destinada às principais funções da família, era o tablinum. Esta sala estava disposta de modo a ficar alinhada com o corredor de acesso, para lá do atrium. Contudo, da Grécia veio uma modificação à planta da domus tradicional, um pátio com colunas, o peristilo, que permitia um desenvolvimento articulado das divisões. A casa podia compreender mais de um piso, aumentando, assim, o número de salas que se abriam para o pátio/átrio e para a rua. No contexto da Grécia Antiga, as casas mais primitivas, possuem estruturas domésticas muito simples, de origem popular, onde a única abertura nos seus muros exteriores se traduz ao vão da porta. Desta forma, toda a luz reservada à habitação era proveniente do pátio, que surgia, assim, como o lugar ao ar livre completamente próprio, privado, interior e é esta a sua essência. Na época imperial, o aumento da população limitou a domus, a morada unifamiliar, às classes privilegiadas. A resposta dos especuladores à necessidade de casas foram as altíssimas insulae, edifícios com numerosíssimos apartamentos [...] origem da insula continua a ser incerta. Pensa-se no Próximo Oriente, em particular na Síria. (Tarella 1985, p. 24). Ilustração 4 - Exemplo de ínsula em Óstia, evidência da utilização do pátio para a composição das mesmas (Wiene, 2013) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 29 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus A insula (ilustração 4) tem os seus exemplos mais típicos em Óstia.3. Neste tipo de habitação multifamiliar, o pátio servia de traço de união entre os diversos corpos da edificação. Em Herculano, a casa das Taipas assinala a passagem da habitação unifamiliar para multifamiliar, esta faz parte da evolução da domus com átrio e peristilo, que usava uma armação de madeira formando a alvenaria das paredes com bastante cal. Nas duas superiores civilizações, no vale do Rio Nilo ou dos Rios Tigre e Eufrates, nasce o meio que o muçulmano irá usar na área do Magreb. Pensa-se que a casa muçulmana nasce aqui muito influenciada pela casa Egípcia que por sua vez é a transformação da casa da civilização Caldaica, uma vez que o seu pátio não é mais do que um quintal, logradouro ou conjunto de espaços descobertos, de utilidade lúdica ou de interesse rural. A casa caldaica dá uma resposta, talvez mais imediata, mais natural, às características climáticas da região e, por isso, talvez seja a origem desta casa pátio. O muçulmano conheceu-a quando dominou a Mesopotâmia. Entendemos poder ter sido o muçulmano, o berbere e o africano que terão trazido esta estrutura de habitação para a Península Ibérica, nomeadamente para Portugal, estabelecendo-se a Sul do Tejo. A composição da casa muçulmana é diferente da casa romana, já apresentada neste capítulo, isto por por razões culturais e religiosas. Enquanto que o Romano abre a sua casa, quando abre a porta que o separa da rua, a casa muçulmana apresenta a mesma forma retangular e tem o mesmo pátio mas o efeito perspético da entrada não existe, isto de modo a resguardar o centro da vida na casa, o seio familiar, da rua. “Óstia talvez seja um dos mais preciosos testemunhos das insula. [...] onde as encontramos com sete, oito andares de habitações independentes, atrás de fachadas com numerosas janelas rasgadas. As divisões dos pisos térreos serviam para lojas, oficinas de artesãos e tabernas. As entradas davam para a rua, os diversos edifícios eram ligados por um pátio interior.” (Tarella,1985,p.24) 3 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 30 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus No mundo árabe, na arquitetura islâmica, os dois elementos construtivos a destacar são o arco4 e a cúpula, e os dois elementos construtivo-decorativos: iwan5 e as muqarnas6, que as construções islâmicas, tanto religiosas como civis tinham em comum. Na arquitetura civil islâmica, os palácios dos soberanos foram construídos, inicialmente, na época Omeiade, no deserto, segundo uma planta com pátio interior (ilustração 5). Com os Abássidas, vieram a ser construídos nas cidades e foram, muitas vezes, agregados às mesquitas, mantendo, geralmente, a planta com pátio interior. Ilustração 5 - Pátio dos Leões, Palácio de Alhambra (Wikipedia, 2014) A casa de habitação islâmica variou em conformidade com as épocas e as regiões. Nas ricas residências das dinastias Omeiade e Abássida subsistiram elementos deveras reconhecíveis do período Sassânida, os quais, por sua vez, repetem para a estrutura dos grandes palácios Partas. A residência senhorial Omeiade previa a existência de três salas abertas para um dos lados do pátio. As casas abássidas, pelo menos em “A arte islâmica desenvolveu muito dos arcos, que no decorrer dos tempos conheceu uma multiplicidade de formas e de estruturas cada vez mais requintadas e fantasiosas.” (Mandel,1975,p.12) 4 O iwan […] era uma sala coberta com uma abóbada de berço, completamente aberta para um lado, no qual o imperador administrava a justiça. (Mandel,1975.p.12) 5 […] inicialmente serviam para ligar a calote da cúpula ao quadrado que a sustentava, através de nichos angulares ou de aberturas. Estas foram depois transformadas numa serie de nichos com alvéolos e estalactites, obtendo-se um efeito muito decorativo. (Mandel,1975.p.12) 6 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 31 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus determinadas zonas, eram muito mais amplas, com vários pátios interiores para os quais abriam numerosíssimas salas, sendo uma delas um grande salão. Como exemplo de casa do período islâmico podemos aqui destacar a cidade de Mértola, localizada no Alentejo, nomeadamente a alcáçova de Mértola (Ilustração 6). Ilustração 6 - Casas pátio do bairro de alcáçova, Mértola (Macias, 1996,p.71) […] com aproximadamente 4000m2 para a zona do antigo fórum romano e área adjacente, albergava no seu interior um pequeno bairro que não deveria, no total, exceder as três dezenas de habitações (...) As casas deste bairro desenvolvem-se em torno de um pátio central, de indiscutível utilidade como fonte de iluminação e ventilação. É em volta desse espaço que se organizavam os restantes compartimentos (átrio, salões, cozinha, latrina e áreas de trabalho). (Macias,1996, p.69) Todas essas casas se organizavam em torno de um pátio central descoberto, que marcava de forma indiscutível, tanto um modo de conceção espacial como identificava os hábitos culturais dos seus moradores. “Torna-se quase ocioso e desnecessário referir a paternidade greco-romana […] destas casas, que estão presentes em qualquer bairro das urbes helenísticas, vários séculos antes de Cristo”. (Macias,1996, p.73) Esta tipologia é comum em inúmeras cidades islâmicas da mesma época, de forma generalizada ao longo da Península Ibérica no séc. XII e XIII. As casas do bairro islâmico de Mértola situam-se, por norma, ao fundo de becos sem saída, em vias que teriam certamente carácter semiprivado ou, pelo menos, em áreas onde não seria vulgar encontrar gente que ali não vivesse. Estas habitações de um só piso eram por norma, Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 32 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus casas encerradas em si, viradas para dentro, tendo raras aberturas ao exterior para além da porta. A área da casa variava em função do espaço disponível e do estatuto do proprietário. Organizadas em torno de um pátio central, as casas da alcáçova de Mértola (Ilustração 7) dispunham, com pequenas variações, de idênticos compartimentos. Ilustração 7 - Casas pátio do bairro de alcáçova, Mértola (in Macias, 1996, P. 70) A entrada das casas era um local que merecia cuidado, nomeadamente a colocação de portas da rua. Estas entradas estavam exatamente em frente às dos vizinhos, organizando-se em dois pares. Umas das características mais marcantes destas entradas relaciona-se com o reaproveitamento de materiais pertencentes aos antigos edifícios de época romana do fórum, fragmentos de colunas e frisos em mármores foram reutilizados como soleiras e marcavam o local de entrada. A porta dava acesso a um pequeno átrio (satwan), antecâmara de entrada na habitação e local destinado a proteger a intimidade dos moradores de olhares mais indiscretos da rua. Este corredor de entrada, por vezes com duas ou três portas organizadas em ziguezague e com diversos pontos em cotovelo, teve origem na arquitetura do mundo clássico, era o local de receção da casa e para se tratar de negócios. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 33 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Os átrios ligavam sempre e somente ao pátio. As portas de acesso ao pátio tinham dimensões maiores do que as portas da rua, o que mostra a importância que tinham estes espaços no interior da casa. Estes eram peça fundamental da casa, fornecendo a iluminação e a ventilação - o mais favorável às características climatéricas da região, que favoreciam a reunião das pessoas nesse espaço. O pátio desempenhava grande relevo no quotidiano da população, sendo o local de trabalho das mulheres da casa e onde se confecionavam algumas refeições. A zona central dos pátios pode ter sido, em certos casos, utilizada para cultivo de ervas aromáticas. Quando o espaço central era ocupado por um tanque, destacava-se, com frequência, um pequeno canal envolvente, delimitado por tijoleiras e ligado aos sistemas de esgoto das casas. “A necessidade de escoar eventuais excedentes de água causados pela chuva ou, com maior probabilidade, resultantes da limpeza do pátio, apresenta-se como hipótese de funcionalidade mais logica para este sistema […]”. (Macias,1996, p.86). Os pátios tinham um sistema complementar para resolver este problema, pois nenhum deles estava completamente nivelado, de modo a que as águas pluviais pudessem ser escoadas. Eram normalmente ladrilhados, sendo também características comuns o facto de nunca confinarem diretamente com a rua, podendo fazê-lo com outras casas, ou com outros pátios. Estes desempenhavam um lugar de destaque no âmbito das habitações, pelo seu posicionamento central, pelo facto de desembocarem a praticamente todos os compartimentos da casa, por serem ponto de iluminação, local de trabalho e lazer, e por ser à sua volta e no seu interior que a vida se desenrolava. Estes eram também os compartimentos de maiores dimensões da casa. Por desempenharem um papel de maior importância (como núcleo fundamental da atividade domestica) no contexto da casa, os pátios foram as zonas que mais remodelações sofreram ao longo dos tempos, o que é visível em particular nas repavimentações e reparações identificadas pela arqueologia (Ilustração 8). Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 34 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 8 - Casas pátio do bairro de alcáçova, Mértola, Pátio (Macias,1996, p.84) Ao longo do tempo, o conceito tradicional de casa-pátio da antiguidade continuou a usarse, nascendo, na Idade Média, um novo elemento estruturante dos edifícios, o Claustro, que surge associado às catedrais e, principalmente, aos mosteiros. O pátio deu lugar ao claustro (Ilustração 9), uma galeria abobadada em torno do pátio que integra os mosteiros (no centro), sendo frequentemente ajardinados, possuindo, muitas das vezes, um lago ou uma fonte. Protegem ainda os seus habitantes do encontro e do ruído do mundo exterior. A claridade e a obscuridade da zona aberta e da zona coberta convidam ao silêncio e à meditação. Contudo, é no período do Renascimento que o pátio parece atingir o seu máximo protagonismo na organização da casa, produzindo arquiteturas espacialmente intensas, como é o caso dos palácios, que eram ordenados em torno de um pátio central. Na sua maioria, foram concebidos tendo como base o quadrado, cubos sólidos, de tendência horizontal e com não mais de três pisos. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 35 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 9 - Claustro do Mosteiro dos Jerónimos (Wikimedia, 2012). A partir do século XVIII, e até mesmo no século XIX, produziu-se a substituição dessa organização em torno do pátio ou claustral. Durante a evolução da arquitetura moderna, o pátio foi-se libertando das suas condições originárias através de novas tecnologias de construção, novos materiais, novos usos e hábitos culturais. Esse pátio possuí características modernas que se baseiam nas condições e premissas tipológicas de uma mudança da unidade arquitetónica básica que deixa de consistir apenas num edifício isolado e passa a ser parte de um conjunto construtivo, não esquecendo, contudo, que as premissas originárias do pátio se mantêm e adaptam à época moderna, numa representação de uma qualidade espacial e na relação com o mundo exterior, aumentando a qualidade de vida em zonas urbanas, tanto no espaço íntimo da casa pela captação de luz, como numa visão mais urbana, proporcionando uma forma de habitação mais natural na densidade de construção da cidade. Podemos, assim, dizer que sob uma perspetiva histórica, o pátio albergava as mais diversas atividades. Tipologicamente, as casas-pátio divergem no que respeita à comunicação (luz e acesso) entre o pátio e os espaços ou divisões contíguas. No que respeita à configuração física, segundo Alves, citado por Neves (2012) é possível classificar, de uma forma geral, dois tipos distintos de pátios: O pátio externo, espaço externo e descoberto, anexo a um edifício e o pátio interno, espaço interno e descoberto, envolvido pelo corpo de um ou vários edifícios (...) possui fechamentos laterais, limites físicos, seja o próprio corpo edificado e/ou muros. Mas, Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 36 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus sempre descoberto, desnudo, relacionando-se directamente com a abóbada celeste e, consequentemente, com todas as manifestações climáticas. (apud Alves, 2005, citado por Neves, 2012, p. 22) Na casa-pátio, o pátio surge como elemento unificador e ordenador conferindo a ordenação estrutural e o aspeto visual, da mesma. O edifício torna-se indissociável do pátio e vice-versa, situação que, como verificámos neste capítulo, se repete desde o conhecimento da utilização deste tipo de casa, até á modernidade. Tanto a casa grega como a casa romana caracterizavam-se pela organização em torno de um pátio sobre o qual se abriam os aposentos, o que, simultaneamente, permitia que se restringissem as aberturas para o exterior, conferindo deste modo, segurança e privacidade. Razão que levou a que no nosso século, particularmente no período entre as grandes guerras, a tipologia viesse a surgir, novamente, como a melhor resposta para a segurança e privacidade, surgindo como um elemento de defesa. Segundo os autores Cambi, Di Sivo e Steiner (1992), as casas com pátio distinguemse, das casas geminadas e das casas unifamiliares isoladas, pela disposição em volta de espaços descobertos privados e por falta de aberturas ao exterior, o que permite formar tecidos compactos. Também têm algumas semelhanças com distintas formas de casa individual, utilizadas nas várias épocas históricas, sendo, de facto, as mais conhecidas - as casas com átrio da época romana e as domus de Pompeia e Herculano. A análise do processo tipológico e dos estudos da história da construção demonstraram a continuidade entre os tipos residenciais tardo-romanos e as distintas formas de edificação com pátio, difundida até finais do Séc. XVI, em algumas regiões italianas que apresentam traços característicos. Encontram-se também tipos de construções semelhantes nos países mediterrânicos (Ilustração.10 e 11), onde as condições climatéricas e o contexto social e religioso asseguraram a sua sobrevivência até influências europeias terem quebrado o seu isolamento cultural. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 37 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 10 - Domus Romana (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.7) Os autores referem, ainda, que nos textos publicados desde os anos cinquenta e que mostram a divulgação da investigação racional sobre a casa, em toda a Europa, a casa com pátio apresenta-se, por vezes, junto dos seus antecedentes históricos da seguinte forma: casa com átrio da Antiguidade clássica (ilustração 10) e casas com pátio de diversas culturas (ilustração 11). Isso produziu uma superposição de termos que, expressam a intenção de adaptar aos diferentes contextos culturais os protótipos estudados entre as duas guerras, no sentido que “ […] el mismo tipo de casa se llama de maneras diversas según los precedents y los oríges a los que se quiere hacer referencia.”7 (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p. 7). 7 o mesmo tipo de casa é chamado de maneiras diferentes segundo os precedentes e origens a que se queira fazer referencia (tradução nossa) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 38 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 11 - Casa unifamiliar muçulmana. (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.7) Desde as edificações civis e templos mesopotâmicos, das casas de Pompeia, e Herculano às insulae de Óstia, dos palácios das grandes dinastias árabes, aos pequenos aglomerados urbanos árabes como o conhecido em Mértola, desde os grandes claustros dos mosteiros até às casas unifamiliares do séc. XX, todos eles têm um denominador comum, o pátio como gerador e organizador dos espaços que o rodeiam e que para ele se abrem, o pátio como centro da casa, como centro da vida na casa (Ilustração12, 13,14). Ilustração 12 - Casa com Pátio, Mies Van der Rohe (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.11) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 13 - Casa com Pátio, Mies Van der Rohe (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.11) 39 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 14 - Pavilhão Chines com Pátio (Cambi, Di Sivo e Steiner, 1992, p.7) 2.2. PÁTIO E TERRITÓRIO Após esta investigação, podemos dizer que a região do Alentejo, assim como a sua cultura, absorveu bastantes referências das civilizações primitivas que por ali passaram e se fixaram. Desde as tribos primitivas, à cultura romana, muçulmana e, mais tarde, cristã, todas elas deixaram o seu cunho que, como poderemos verificar ao longo deste subcapítulo, influenciaram tanto a arquitetura nas suas aldeias, nas casas na urbe, como no monte no cabeço, no meio rural, assim como vários costumes e tradições desta região do Sul de Portugal. Neste subcapítulo vamos, então, descrever a arquitetura popular alentejana tanto da casa, situada nas aldeias, vilas e cidades, como do monte, situado no cabeço rural, na colina do território agrícola, e de que modo o pátio, como maneira de arquitetar, influenciou a arquitetura desta região. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 40 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 15 - Paisagem Alentejana, Terra e Água, suaves ondulações no território ( Mattos, 2012) Pertence a zona a um gigantesco anfiteatro de face voltada para o Atlântico, até onde desce em largos plainos, num jogo subtil, de vastas e suaves ondulações, que lhe dá horizontes recuados. Não lhe falta, aqui e ali, a cortina brusca, mas sempre modesta, de alguma serra que acrescenta à sua beleza própria a nota de imprevisto e à sensação de planura o instrumento de contraste (GEORGE; GOMES; ANTUNES, 1988, p. 3) (ilustração 15) O Alentejo ocupa cerca de um terço do território Português e é constituído por extensas planícies secas, sendo uma região de pouco relevo orográfico e de pouca densidade populacional. Importa aqui focar as principais características desta região e todas as influências naturais que incidem na sua estrutura habitacional, uma vez que a casa popular é expressão do clima, natureza e cultura da região em que se insere, apresentando características claras que a definem. O clima mediterrânico-continental é caracterizado por um estio bastante regular, quente e seco e o resto do ano instável, com predominância de chuvas fortes no inverno. Tem importância direta sobre as habitações, onde é utilizado o emprego da cal branca, exterior e interiormente, e a quase ausência de aberturas para o exterior, como meio de defesa contra a luz e o calor. Os terrenos são, sobretudo, de constituição paleozoica e granítica. (…) sempre mais aberto a influências exteriores que penetravam normalmente pela planície, mostrou maior receptividade ao invasor (...) A especificidade civilizacional do Sul tem sido desde sempre acentuada e sublinhada e a região constitui o cadinho onde se caldearam as referencias mais díspares: fenícios e cartaginenses, que já antes dos romanos influenciaram a caracterização urbanística das povoações meridionais; Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 41 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Túrdulos e celtas, que também potenciaram o desenvolvimento urbano.” (Correia,1994, p. 32,33) A conquista Romana, com início a 218 A.C., foi um dos fatores de civilização mais poderosos na Península Ibérica e, de entre os outros povos que aqui deixaram marcas do seu viver, foram os romanos que mais radicalmente influíram na formação e caracterização do espaço português. O povo romano deixou nesta região inúmeros vestígios, mas o domínio árabe veio alterar o povoamento primitivo. No entanto, no seio das aldeias alentejanas, o modo de urbanizar ainda se mantem como as origens romanas, apesar de existirem tanto na construção como na própria arquitetura, vestígios da herança muçulmana. A casa tradicional alentejana possui poucas janelas e de dimensões reduzidas, não havendo aberturas frontais, além da porta de entrada. Não possui varandas, alpendres e escadas exteriores (embora em muitas casas existam 3 ou 4 degraus nas entradas). O pavimento é normalmente de tijoleira, ou de lajes de xisto e o telhado, de pouca inclinação, é normalmente de uma só água (ilustração 16). Sendo, porém, muito frequentes também, os telhados de duas águas de um único cume assente sobre a trave mestra, as casas são constituídas, em muitos casos, por dois telhados de uma só água encostados um ao outro, a partir de uma parede alta, situada a meio do edifício. Isto é particularmente evidente em certos casos, de resto muito frequentes, em que esses dois telhados se apoiam em paredes contíguas mas de alturas diferentes. Esta casa é normalmente plana, de planta retangular simples, de um só piso térreo. Facto que se explica pela natureza do material corrente de que ela é feita, cuja fragilidade não consentiria uma edificação elevada, mas relaciona-se, certamente, com a sua especialização funcional caraterística, uma vez que serve “[...] exclusivamente à habitação das pessoas, que a ocupam inteiramente, ficando os celeiros, palheiros, currais e outras dependências de lavoura em edifícios próprios e independentes”. (Oliveira; Galhano,1992, p. 152) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 42 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 16 - Alentejo, Plano de rua, onde se evidência a importância da chaminé, e os poucos vãos das fachadas (Oliveira, Galhano, 1992, P. 161) No interior da casa, podemos dar destaque à cozinha, podendo ser considerada a divisão principal (ilustração 17), pois esta assume uma função de destaque nesta região. Nesta divisão, encontramos ” […] um tempo cozinha, sala de estar, de trabalhar, onde se recebe quem chega de fora, etc.“ (Oliveira; Galhano,1992, p.153) Segundo Pinheiro, o pátio que sempre fez parte da arquitetura da região,”[…] não se manteve como característico da arquitectura da casa Alentejana […] A cozinha passou a ser “o pátio muçulmano” […] é ali que o alentejano vive quando está em família”. (Pinheiro, 1997, p.282) A cozinha é a principal e maior divisão da casa, é nessa divisão que a família convive, que passa o serão, onde se recebem as visitas e onde se situa a lareira que aquece a casa e que serve para cozinhar e aquecer os pratos, cafés nas chocolateiras, onde se colocam os enchidos em fumeiro, isto no sentido mais caseiro desta produção de alimentos. A lareira e respetiva chaminé são elementos arquitetónicos muito importantes, visto que além da sua importância para o interior da habitação, a chaminé é, também, um dos elementos, ou talvez o único, da ornamentação exterior da fachada e do volume do edifício, compondo não só o edifício em si, mas também as ruas compostas de várias casas, com as grandes e vistosas chaminés, ou seja, é o elemento que dá caráter a este volume quase em tudo semelhante ao muçulmano, que surge como elemento unificador, criador da harmonia do edifício e dos conjuntos de edifícios que definem a rua. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 43 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 17 - Casa Alentejana, onde se evidencia a utilização de duas águas, no telhado, e onde se verifica a importância da cozinha e da chaminé na composição da casa (Associação dos Arquitetos Portuueses, p.98) Esta casa mantém segundo Pinheiro, “ […]a combinação de volumes puros da arquitetura muçulmana e […] traz para a sua fachada, com pequenas fenestrações, a interpretação singela do “muro muçulmano”[…] ”. (Pinheiro, 1997, p.282) Contudo, ao falarmos de casa alentejana, devemos distinguir dois grupos de construções, a que predomina nos aglomerados populacionais cujo objetivo é a habitação, a casa urbana já referida neste capitulo e a que existe nos montes, a casa rural, isolada, e que está destinada à exploração agrícola (ilustração 18). O monte é formado pelas edificações de apoio agrícola e a casa do lavrador. A construção é de um só piso térreo, de planta retangular, com paredes bastante grossas, em alvenaria de tijolo maciço ou taipa, o chão de xisto ou tijoleira, com uma grande cozinha, grande lareira e respetiva chaminé, com forno e poço exterior. A casa do lavrador é também de um só piso térreo, planta retangular ou quadrada, apresentando várias divisões (sala de fora, cozinha interior e cozinha exterior, vários quartos, dispensa, arrumos, amassaria, etc.), isto no monte do grande senhorio. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 44 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 18 - Serpa, Monte da Cascalheira, onde se evidencia a estrutura composta em volta do pátio central (Oliveira, Galhano, 1992, P. 154) A estrutura do monte alentejano nada tem a ver com a civilização muçulmana, “ […] na realidade, o monte alentejano aparece com a ruralização do Alentejo, palavra que o muçulmano “pretendia” não conhecer, dadas as suas características urbanas.” (Pinheiro,1997, p.282) Uma vez que, como se entende pelo desenvolvimento do subcapítulo anterior, o pátio é um denominador comum a todas as civilizações ligadas ao mediterrâneo, no entanto, a sua função, dentro da composição arquitetónica, tem muito a ver com questões sociais e culturais. Nesse sentido, entende-se este monte alentejano como intimamente ligado ao complexo rural romano, politeísta e cristão, que, como referido no capítulo anterior, utilizava, na composição das suas villas, o pátio como elemento central e unificador do edifício e seus espaços. O monte Alentejano tem como local de implantação o sítio mais alto do terreno, da colina, isto pelo facto de nessa localização se poder visualizar todo o terreno ou toda a envolvente. Tendo como forma o quadrado, a sua organização espacial é em torno do pátio central. Essa forma quadrada simboliza, o perfeito ordenamento, com o pátio interior absorvendo a filosofia de uma estrutura rural que, como acima referido, é bastante usual na cultura romana, e é sobretudo o reflexo da vida e paisagem humanas. O monte compreende as habitações, cavalarias e palheiros, armazéns para recolha de gado, produtos e material agrícola, normalmente de formas geométricas simples e de carácter térreo (ilustração 18) e que “ […] aberto à vastidão das searas, é um exemplo muito certo do tipo complexo de casa pátio aberto, que traduz a vida da terra e se ajusta perfeitamente às condições da grande propriedade […] “ (Oliveira; Galhano,1992, p.169) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 45 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 19 - Monte, Herdade da Terrosa, Estremoz, exemplo da disposição dos equipamentos do monte em torno do pátio central, centro de todo o equipamento (Oliveira, Galhano, 1992, p. 168) Relativamente à decoração, no Baixo Alentejo, a sua origem provém de várias vertentes, no entanto, o carácter fundamental é a continuidade branca da fachada. Os volumes são geometricamente simples, com formas básicas, com aspeto sólido e compacto. Definem-se pelos grandes contrafortes construtivamente necessários que criam ritmo e cortam a monotonia do grande plano de parede. Arcos cegos emolduram portas ou janelas e nichos toscos, na sua execução, emolduram as paredes. (Pinheiro, 1997, p.287) As paredes são, normalmente, bastante grossas, com uma espessura mínima de 45 cm, isto, fundamentalmente, devido à utilização da taipa 8, ou do tijolo de burro, maciço, feito em argila, ou seja, com materiais da região. 8 “A taipa era enformada entre “taipais” de madeira com uma dimensão de aproximadamente 2m, entre os quais a massa é posta e batida com “malhos”. Os troços são executados horizontalmente e as paredes têm uma espessura mínima de 45 cm.” In Pinheiro (1997,p.292) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 46 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus A brancura das paredes é obtida através do uso da cal branca, material de revestimento que, de certa forma, uniformiza toda a construção (ilustração 20). Mas o Alentejo não é só brancura e cal nas paredes, há texturas bem mais expressivas, mas mais difíceis de descobrir, pois, geralmente, os materiais são rebocados a argamassa de cal e perdem as texturas. Seja como for, a verdade é que uma parede de um material tradicional, caiado ou não, tem personalidade, tem expressividade, tem a força da arquitetura alentejana.” (Correia,1994, p.58) Ilustração 20 - Alentejo, plano de rua, exemplo da expressividade dos materiais utilizados, com ou sem a cal a revestir 2.3. PÁTIO E AIRES MATEUS Ao percebermos o conteúdo da arquitetura popular alentejana, vamos passar a descrever, sucintamente, as influências dos arquitetos Aires Mateus de forma a entendermos a origem da sua escola arquitetónica, bem como se caracteriza o seu modo de projetar. Salienta-se, assim, a casa pátio e a importância que lhe é conferida enquanto espaço/elemento habitacional, revelando de que modo a arquitetura alentejana influenciam, claramente, no seu modo de arquitetar/projetar. No início do milénio em que, segundo Fernandes e Cannotá, (2001, p.15) a “[…] velocidade, aceleração, decomposição, choque, fragmentação, sectorização e diversidade[…] “ são conceitos que demonstram uma sociedade agarrada às novas tecnologias de comunicação, que permitem uma globalização da informação tanto eletrónica como visual, o que cria uma imagem de, de acordo com os autores referidos neste parágrafo, um mundo sem forma e decomposto que se verifica tanto na produção de obras arte como na própria arquitetura. Interpretada segundo Fernandes e Cannotá (2001, p.15) como a “[…] arte que serve o homem[…]”. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 47 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus É neste contexto, aqui muito simplificado, que surge o atelier dos arquitetos Aires Mateus; a sua escola e influências; o seu tipo arquitetónico, tanto a nível conceptual como na formação do projeto final, assim como a importância do Pátio na formação do projeto, tanto de equipamentos como da casa. Pertencentes à terceira geração de arquitetos do século XX, introduziram “ […] na cultura arquitetónica portuguesa, durante a década de 90, temas, de certo modo, estranhos à pesquisa unitária que Fernando Távora, Álvaro Siza e Eduardo Souto Moura vinham a desenvolver.” (Castro,2008, p.179) Geração que “[…]fecha o último século e que está marcada pelo rompimento inexorável das fronteiras culturais e disciplinares [...] onde talvez só os princípios e os fins permanecem imutáveis no legado recebido de gerações anteriores” (Fernandes; Cannotá, 2001, p.241). Percebe-se perfeitamente, na maioria dos seus projetos realizados, as influências das figuras conceituadas da arquitetura portuguesa, pelos conceitos neomodernistas e minimalistas presentes na sua obra, no agarrar dos seu projetos ao território e á cultura local do mesmo, no entanto o seu cunho pessoal, o seu modo de pensar a arquitetura é bem visível em cada uma das suas obras, criando quase um estilo próprio só seu. Na verdade, os ateliers de Fernando Távora, Álvaro Siza, Eduardo Souto Moura, Gonçalo Byrne ou carrilho da Graça têm servido de autênticas “escolas de formação” para a maioria dos arquitetos novos arquitetos que seguiram carreiras próprias na última década, isoladamente ou em dupla. Assim aconteceu, entre outros, com Elisiário Miranda e Carlos Martins, Cristina Guedes e Francisco Campos, Paulo Providência e José Fernando Gonçalves, Manuel e Francisco Aires Mateus, Inês Lobo ou Ricardo Back Gordon“ (Fernandes; Cannotá, 2001, p.24). Para os arquitetos Aires Mateus, o ponto de maior interesse é, precisamente, a atividade de caracter conceptual, da investigação e da experimentação, onde “ […] cada projeto é entendido como uma nova possibilidade o qual nos interessa a maneira como o projeto pode ser potenciado num limite qualquer ” (Baptista; Ventosa, 2007, p23). Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 48 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 21 – “A Cidade dos Príncipes”, pintura de Nadir Afonso, Arquiteto, Pintor, Artista abstrato, importância da arquitetura na pintura do autor (Afonsor, 2014) Ou seja, onde a experimentação ocupa um carácter central, onde o erro é bem-vindo, onde a investigação é o centro, uma ideia de arquitetura aproximada do campo da experimentação artística, da obra de arte, onde a arquitetura, a escultura, pintura, etc. se unem para a criação do projeto (ilustração 21), como diz o próprio Manuel Aires Mateus “Já não têm utilidade as definições clássicas da diferença entre a arquitetura e a escultura, porque são bastante redutoras.” (Baptista; Ventosa, 2007, p25) (ilustração 22) Ilustração 22 - RADIX, Bienal de Veneza 2012, Escultura dos Arquitetos Aires Mateus, fotografia por Saleh, 2012 (Basulto, 2012) Neste processo de investigação, os Aires Mateus conseguem abstrair-se, de certa forma, dos componentes secundários da arquitetura, isolando uma ideia conceptual que procuram explorar e ultrapassar os seus limites na conceção da obra (ilustração 23). Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 49 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 23 - Cabanas do Rio, Aires Mateus, fotografia por Garrido, 2013 (Frearsoon, 2013) […] para que a arquitectura encontre uma autonomia que está para lá do aspecto programático ou construtivo […] encontrando na abstração o suporte linguístico que lhes permite traduzir com rigor o sentido conceptual que pretendem transportar para objectivos arquitetónicos (Adrião; Carvalho, 2007, p.71) No entanto, segundo o próprio Manuel Aires Mateus, esse carácter de experimentação só foi tomado com consciência do interesse conceptual das propostas a partir do projeto da casa de Alenquer, estando ainda os seus primeiros trabalhos muito conotados, formalmente, com outros arquitetos portugueses como Álvaro Siza, Souto Moura, Carrilho da Graça. Nesta fase, considerada inicial, do seu percurso, as obras mais relevantes, foram a Residência de Estudantes do Campus II da Universidade de Coimbra (1996-99) (ilustração 24) e a Reitoria da Universidade Nova de Lisboa (1998-01) (ilustração 25), que ainda se encontram bastante conotados com a arquitetura de autores como Fernando Távora, Álvaro Siza e Souto Moura. Ilustração 24 - - Reitoria da Universidade Nova de Lisboa (1998-01), (Wikipedia, 2014) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 25 - Residência de Estudantes do Campus II da Universidade de Coimbra (1996-99), (Loko, 2012) 50 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Foi, portanto, um percurso necessário onde a aprendizagem relativa à construção teve um carácter central. Esse percurso conclui-se na reitoria da Universidade Nova de Lisboa, sendo um momento de viragem. “ […] A casa de Alenquer é a primeira a ser construída nessa nova fase. Depois, com a casa de Azeitão, percebemos que esta condição de investigação era possível.” (Baptista; Ventosa, 2007, p23) Ilustração 26 - Maqueta, Casa em Alenquer (Otxotorena, 2003, p. 13) Efectivamente foi um momento de viragem no percurso de maturação desta dupla de arquitectos. O Alenquer foi decisivo, sendo que o seu processo durou muito tempo, ao longo do qual as condições iniciais mudaram, revelando inesperadamente novas circunstâncias de projecto sobre as quais surgiu a necessidade de começar de novo.” (Vita, 2013, p.26) (ilustração 26) Ao entendermos o contexto da sua formação, onde se inserem as diferentes fases conceptuais do percurso, a importância da investigação e da abstração na conceção do projeto, passamos agora a apresentar, sucintamente, algumas obras dos Arquitetos Aires Mateus, obras essas em que a utilização do pátio na evolução do projeto se evidencia e em que a arquitetura se foca na realização de projetos de casas. A casa em Coruche data de 2006 (ilustração 27). O projeto realizado pelo arquiteto Manuel Aires Mateus tem uma forma fascinante de abordar o tema casa, onde a premissa principal é a casa com sabor tradicional com quatro paredes e o respetivo telhado de 4 águas. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 51 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 27 - Maqueta, Casa em Coruche, (in Baptista; Ventosa,2007, P.50) De uma forma clara, o projeto consiste na abstração dessa forma tradicional, desconstruindo-a, onde todas as premissas permanecem imutáveis, as linhas principais são mantidas como uma memória das mesmas. Esta abstração é conseguida através do carácter monomatérico do edifício, paredes e cobertura, todas revestidas de branco, sugerindo um bloco compacto. O elemento principal desta casa, o que dá vida à mesma e o principal responsável pela desconstrução do volume puro, dando-lhe a verdadeira essência da vida na casa, é o pátio (ilustração 28), o centro da casa, rasgando o volume puro e, como referido anteriormente, deixando a memória das principais arestas. Todos os principais espaços, cozinha, sala, quarto principal e sala de crianças, abremse para o pátio, sendo através do mesmo que recebem iluminação, desenvolvendo, desta forma, uma relação íntima com o exterior sem se exporem aos olhares da rua. Os acabamentos são tradicionais, brancos, com o chão em soalho à antiga portuguesa. Os espaços de serviços, ou de transição, que se localizam entre os espaços principais e o muro exterior teriam outro acabamento que iria evoluir na obra.9 In Arq./a, Fevereiro 2007, notas de autor: “Procurava-se nesta casa um “sabor tradicional”. Leu-se nesta ideia um preconceito de forma. Procurou-se encontrar o limite de existência de uma forma. O volume em quatro águas é tornado abstracto, monomatérico, branco, paredes e cobertura. Um pátio é rasgado deixando a memória das arestas. Neste pátio abrem-se também os vãos dos quatro espaços principais: cozinha, sala, quarto principal e uma sala de crianças, para a qual dão as alcovas. A casa tem formas reconhecíveis e acabamentos tradicionais, brancos com chão em soalho à antiga portuguesa. Os espaços 9 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 52 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 28 - Plantas e Cortes, Casa em Coruche (in Baptista; Ventosa,2007, P.50) A “Casa Flor” (ilustração 29) situa-se no interior de um pinhal, perto da Aroeira, onde se abre ao olhar um largo que inesperadamente deixa sobressair um raso muro branco. Ilustração 29 - Casa na Aroeira, vista do acesso á moradia (in Vita, 2013, p.75) Com uma cobertura plana e larga, à primeira vista não se consegue perceber com exatidão a forma, o volume, da casa, como uma obra de arte e, como em toda a obra dos arquitetos, a arquitetura e a escultura unem-se. Como estando em frente a uma escultura, é necessário circundá-la para perceber completamente o seu aspecto e a sua razão de existir. Apenas seguindo o caminho, que lentamente se aproxima da habitação, a forma da casa se torna mais clara: o raso muro de transição desenhados entre os espaços principais e o muro exterior terão outros acabamentos que se descobrirão na obra.” Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 53 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus branco ergue-se até assumir a altura das paredes e, finalmente, o maravilhoso pátio abre-se e revela-nos a essência do volume.” (Vita; 2013; p.74) A forma do volume deriva da morfologia hexagonal dos lotes contíguos e segue os limites da propriedade. O pátio exterior, para onde todos os espaços interiores se abrem, funciona como o elemento central de toda a habitação que o envolve, como um muro, que protege a privacidade da vida na casa, abrindo-a para o bosque dos pinheiros e separando-a das habitações mais próximas. Ilustração 30 - Casa na Aroeira, vista para o pátio (in Vita, 2013, p.75) O pátio é, efectivamente, o centro da vivência da casa […] que assume a característica forma de flor, é resultante de sobreposição de três linhas de confim, que definem o conjunto: o limite interior dos muros perimetrais, o limite da cobertura e o limite da varanda em madeira que une as aberturas dos quartos para o pátio.” (Vita, 2013, P 74) (ilustração 30) Os espaços interiores principais, sala, cozinha, quartos, são separados pelos espaços de serviço, casas de banho, dispostas de forma radial (ilustração 31) em relação ao centro do pátio, compondo e separando os espaços segundo os diferentes níveis de intimidade. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 54 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 31 - Casa na Aroeira, Planta e corte (in Vita, 2013, p.77) A casa em Leiria (ilustração 32) caracteriza-se, à primeira vista, pelo seu volume denso e monomatérico, obtido através do branco empregue quer nas paredes quer na cobertura e nas suas formas geométricas simples, sintetizadas que nos leva “ […] às nossas memórias infantis que temos da casa: desenhada por duas paredes e um telhado inclinado.” (Vita,2013, p. 73) Ilustração 32 - Casa em Leiria, vista onde se evidencia a importância dos pátios (in Vita, 2013, p.70) Aqui, nesta casa, como em quase todos os projetos de casas dos arquitetos Aires Mateus, o pátio atinge um carácter central, sendo que a casa se fecha à sua envolvente, Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 55 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus abrindo-se apenas em alguns pontos estratégicos, de onde se contempla apenas o castelo de Leiria, pontos esses que são preenchidos pelos vazios obtidos pelos pátios (ilustração 33). Ilustração 33 - Casa em Leiria, Maqueta onde se verifica que a casa nasce no subsolo e a importância do pátio para a iluminação, (Figueiredo, 2012) A casa nasce através do subsolo (ilustração 34), por forma a resolver o problema da justa relação entre a extensão do terreno e a dimensão da casa, onde reside a maior parte da habitação, as zonas privadas, os quartos, principal, individual e das visitas, que obtêm iluminação através dos pátios privados, o que lhes permite desenvolver uma relação direta com o ambiente exterior e com o céu. Ilustração 34 - Casa em Leiria, Cortes, onde se verifica a importância dos pátios e a alteração da forma do mesmo ao longo do edifício, (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 56 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Os restantes espaços da casa, sala de estar e de jantar, cozinha e quarto das visitas, desenvolvem-se ao redor do pátio central, que atravessa toda a habitação de uma forma vertical, chegando a todos os pisos, no entanto “ […] assumindo em cada um uma geometria e dimensão diferente. O pátio para além de cumprir a função de poço de luz, garante uma relação visual entre os espaços a níveis diferentes […]” (Vita,2013,p.72), garantindo, assim, uma relação visual entre todos espaços interiores (figura 35). Ilustração 35 - Casa em Leiria, Vista do pátio central, do piso inferior para o térreo, onde se verifica a relação visual entre os espaços (in Vita, 2013, p.73) Podemos então considerar que, no modo de pensar a arquitetura dos Aires Mateus, além das influencias da pesquisa unitária, das grandes referencias dos arquitetos portugueses de renome como Fernando Távora Álvaro Siza, Souto Moura, nos seus conteúdos minimalistas, abstracionistas e de complexa relação com o território, existe também uma grande influência da arquitetura alentejana, isto evidencia-se pelos tipos de formas utilizadas, sempre muito elementares, de formas geométricas simples e tradicionais, pelas fachadas completamente brancas, como se fossem caiadas, pouco ou nada ornamentadas, pelas espessura das paredes, que se assemelham às paredes grossas de taipa ou de tijolo maciço, para além da relação peculiar com a envolvente. No entanto, estes arquitetos não deixam de inovar e melhorar estes instrumentos, que lhes são dados por estas influências, oferecendo-lhe o seu cunho pessoal, inovando e conferindo uma nova qualidade à arquitetura desta região alentejana, que vamos passar a analisar, mais em pormenor, no próximo capítulo “Pátio e Referência”, através da apresentação de três obras, tais como, a casa em Alvalade do Sado, a Casa Barreira Antunes, em Melides, e a Casa na quinta da Fontinha, também em Melides. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 57 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 58 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 3. PÁTIO E REFERÊNCIA 3.1. CASA EM ALVALADE DO SADO Ilustração 36 - Alvalade do Sado, Paisagem Alentejana onde se verificam as suaves ondulações do terreno e o pontilhar dos carvalhos (in Otxotorena. 2003, p. 16)) […]a parcela es infinita, un terreno de suave ondulación punteado por alcornoques. El proyecto surge como un punto en el paisaje, un cuadrado mínimo. El programa extenso obliga a proximidades y distancias como en un labirinto. Los espácios se organizan en dos grupos; espácios de apoyo (despensa, cuartos de baño y circulaciones) y zonas principales (salones, cocina, dormitórios y pátios). Las de apoyo se disponen como un “muro habitado”, entre paredes que contienen un espácio y un macizo total. Las zonas nobles se diseñan una a una, cubiertas o descubiertas, y se relacionan entre sí a través de los muros/caminos que crean largas perspectivas. Caminhando a través de la casa, perspectivas semejantes varían com la acción del espácio y la luz.” 10 (Otxotorena. 2003, p. 16) (ilustração 36) A casa situa-se no Alentejo, mais precisamente em Alvalade do Sado, sendo um projeto que não chegou a ser construído, data de 1999-2000, elaborado pelos arquitetos Manuel Aires Mateus e Francisco Aires Mateus, com a colaboração de Rodolfo Reis Dias, Jorge P Silva, Maria Victoria Diaz Saraiva e Carla Leitão. Num terreno imenso, com características de zonas tipicamente alentejanas, com suaves ondulações, onde surgem aqui e ali árvores (neste caso carvalhos), o projeto do O lote é “infinito”, um terreno de ondulação suave pontuado por sobreiros. O projeto surge como um ponto no território, um mínimo, um quadrado. O programa muito extenso obriga a proximidades e distâncias como um labirinto. Os espaços organizam-se por dois grupos: os espaços de apoio -arrumos, instalações sanitárias e circulações; os espaços principais – salas, cozinha, quartos e pátios. Os espaços de apoio são dispostos como um “muro habitado”, entre paredes que contém um espaço e um maciço total. Os espaços principais desenham-se um a um, cobertos ou descobertos, e relacionam-se entre si através dos muros/percursos, criando longos enfiamentos. No percurso através da casa, perspetivas semelhantes variam pela ação do espaço e da luz. (tradução nossa) 10 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 59 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus arquiteto Manuel Aires Mateus surge, com uma forma abstrata, como um pequeno ponto branco na imensidão da paisagem alentejana. Este projeto é pensado, em primeiro lugar, pela disposição dos espaços principais, que são dispostos, segundo a sua importância, no quadrado que o compõe, sendo esses espaços divididos por grossas paredes, ou muros, onde só são delineadas as aberturas entre esses espaços. Ilustração 37 - Espaços principais inseridos no quadrado que compõem o projeto (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) Com a forma simples e abstrata, de um pequeno e mínimo quadrado, o projeto alberga um programa bastante extenso. Como acima referido, o mesmo surge como um quadrado branco, na paisagem, sendo que essa forma sugere um sólido e compacto muro, um cubo que se apresenta escavado por forma a inserir o programa necessário à arquitetura. A extensão do programa obriga, então, a proximidades e distâncias sugerindo um complexo labiríntico onde os espaços se organizam em dois grupos, os espaços de serviços (apoio) e os espaços principais (nobres). Os espaços principais são pensados isoladamente, como acima referido, segundo a sua importância, um a um, um coberto, um descoberto (pátio), sendo que estabelecem uma relação entre si através dos espaços de serviço, dos muros/percursos, que sugerem Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 60 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus longas perspetivas. Perspetivas essas muito semelhantes que variam consoante a ação da luz e a sua relação com o espaço. Esses espaços principais são dois quartos principais com 15,70 m2 cada, cinco quartos secundários com 11,8 m2 cada, uma sala principal com 55,20 m2, uma outra sala, ou sala secundária com 38 m2, uma cozinha com 24 m2, e quatro pátios principais que vão intermediando os restantes espaços. Ilustração 38 - espaços de serviço, pensados e dispostos como se tratassem de um muro escavado (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) Os espaços de serviço são pensados e dispostos como se tratassem de um muro habitado, de paredes maciças, que são escavadas e habitadas por essas zonas que servem os espaços principais. Essa ideia é reforçada pelo facto de o teto destes espaços de serviço ser rebaixado em relação aos espaços principais. Estes espaços de serviço são compostos pelo sistema distributivo que são os percursos que levam o usuário de um lugar para outro, cinco pequenas casas de banho que servem os cinco quartos secundários, cinco pátios, seis pequenos pátios, que iluminam, indiretamente, os referidos quartos e casas de banho, uma casa de banho maior que serve tanto os dois quartos principais como a sala principal, um pátio junto à cozinha que a ilumina indiretamente e as dispensas para armazenamento. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 61 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 39 - O pátio como objeto principal da casa. (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) Neste projeto, o pátio surge como um objeto principal da casa, surgindo em várias disposições tanto nos espaços principais como nos secundários. Casa pátio por excelência, uma vez que quase toda a relação dos espaços com o exterior se dá através dos referidos pátios, que permitem que a relação dos espaços com a luz os componha e os altere consoante a mesma. Contudo, nem toda a iluminação dos espaços surge através dos pátios, uma vez que os espaços secundários e percursos deste projeto são também iluminados pelas aberturas nas fachadas, aberturas essas que vão alterar as perspetivas e atmosferas dos referidos percursos, tendo mais ou menos aberturas, consoante a fachada e os espaços principais que estão intimamente ligados a ela. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 62 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 40 - Fotografia de maqueta onde se pode verificar os vão inseridos na fachada (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) Ilustração 41 - - Fotografia de maqueta onde se pode verificar os vão inseridos na fachada (fotografia de SILVA; Jorge P 2000; obtida através de comunicação pessoal) Todos os cinco quartos e respetivas casas de banho são iluminados, como já referido, pelos seis pequenos pátios que se encontram nas suas laterais. Isto permite uma iluminação não direta, criando atmosferas sem demasiada iluminação que podem transmitir calma e tranquilidade. O mesmo acontece com o pequeno pátio colocado junto à cozinha, no entanto, este espaço recebe uma iluminação extra através de uma claraboia situada no seu centro, como se pode verificar pelo corte apresentado na ilustração 42. Um dos pátios principais é pensado e desenhado como um peristilo, referência direta ao modo de habitar grego e romano que tanto influenciou a arquitetura, principalmente dos montes desta região (Alentejo). E este distingue-se pelo carácter moderno, minimalista, sem a utilização das colunas que o circundavam, mas que, no entanto, capta a sua essência. Ilustração 42 - Corte que evidencia as diferentes alturas dos tetos dos espaços secundários e principais, assim como a claraboia da cozinha (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Os três restantes pátios, de diferentes dimensões, fortalecem a relação direta com o exterior. Relação essa com o céu, pelo que a privacidade pretendida fica como tal, garantida. O pátio de maiores dimensões ilumina, indiretamente, tanto os dois quartos principais, como a sala principal (55,20 m2), assim como os percursos adjacentes. O Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 63 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus pátio mais pequeno ilumina, indiretamente, tanto um dos quartos principais como dois dos quartos mais pequenos e o pátio de dimensão intermédia serve dois dos quartos secundários bem como os percursos que o envolvem e a sala secundária (38 m2). Ilustração 43 - Planta da casa em Alvalade do Sado (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Ilustração 44 - Planta da casa em Alvalade do Sado, Pátios (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Ilustração 45 - Planta da casa em Alvalade do Sado, onde se verifica o modo de compor o projeto, espaços principais a branco e secundários a preto (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Esta casa, ou este projeto, relembra as antigas habitações romanas e gregas que se compunham em relação direta com os pátios interiores, no entanto, neste caso, podemos falar de uma reinterpretação moderna, com o cunho pessoal e carácter das obras abstratas e minimalistas dos arquitetos Aires Mateus e com estrita relação com o modo de habitar mediterrâneo. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 64 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 3.2. CASA BARREIRA ANTUNES, MELIDES Ilustração 46 - Casa Barreira Antunes, Vista da Piscina (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Nesta parte da Costa Alentejana existem várias casas abandonadas dispersas pela paisagem. Os vestígios de cal ainda resistem em muitas delas, envolvendo as espessas paredes, apoiadas por contrafortes, desproporcionados em relação à modesta dimensão das construções. São volumes elementares com poucas aberturas e que estabeleceram com a paisagem, eventualmente como as pessoas que neles habitaram, uma relação de total reciprocidade. Dir-se-ia que estão, no seu abandono lacônico, o mais distante possível da contemporaneidade, esta última muitas vezes associada a construções diáfanas em vidro, tecnologicamente sofisticadas. A casa concebida pelos arquitetos Manuel e Francisco Aires Mateus, sendo inequivocamente contemporânea, nas suas qualidades e limitações, é o resultado de um olhar atento, e nada nostálgico, sobre essa forma secular de habitar a paisagem. (Carvalho; 2009) O projeto de uma casa unifamiliar foi realizado e construído no ano 2000, localizado no litoral Alentejano, em Melides, foi elaborado pelos arquitetos Manuel e Francisco Aires Mateus em colaboração com Maria Rebelo Pinto e Patrícia Marques e, é tido como uma reinterpretação moderna do modo de habitar daquela região. Nesta casa, a investigação dos arquitetos aires Mateus incide, como na sequência do seu trabalho, na exploração de limites, neste caso o limite explorado pelos arquitetos é um limite físico, composto por massa ou matéria. Uma linha que divide ambientes e atmosferas diferentes, esse limite é o muro que é, efetivamente, uma barreira, algo que separa, ou que aproxima, o público e o privado, o interior e o exterior. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 65 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Neste caso, o projeto pretende superar essa ideia de um limite entre duas realidades, tornando o muro num campo que pode ser trabalhado, conter espaços e infraestruturas, deixando de ser o muro típico, cheio e passando a ser um muro trabalhado, vazado, e preenchido pela arquitetura. Tendo sido a primeira habitação de um programa que incluiria a realização de mais três habitações unifamiliares e de uma piscina, esta é uma habitação que surge como um sólido de forma quadrangular, monolítico, uma vez que não existem quaisquer aberturas e branco, colocado numa colina. Ilustração 47 - Casa Barreira Antunes, Casa como um ponto branco (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Este edifício, como já referido, é uma reinterpretação do modo de habitar desta região, pelo que vai beber muitas das características do monte e casa alentejanas, uma vez que tem o seu carácter simplista e minimalista, sem ornamentação, neste caso com um toque bastante moderno, mas que representa bem essas características, tais como a branquidão da fachada, a centralidade do elemento preponderante que é o pátio nos montes e a cozinha na casa alentejana e, nesta casa, o pátio central, as paredes espessas que eram assim devido ao material utilizado, tal como a taipa ou o tijolo maciço ou de burro e que, neste caso, são o muro vazado e trabalhado onde se inserem os espaços de serviço que acompanham os espaços principais. Com exceção das duas aberturas a poente e a nascente, efetuadas por dois painéis deslizantes em madeira que, quando abertos, permitem uma relação bastante peculiar e até algo acanhada, entre a envolvente e a casa, não existem quaisquer aberturas diretas para o exterior. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 66 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 48 - Casa Barreira Antunes, Vista de uma das aberturas situadas a Nascente e a Poente (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) A casa pode estar totalmente aberta ao exterior, e em simultâneo ser um organismo de espaços escavados na massa “branca”. E nesta dualidade, entre máxima permeabilidade com a paisagem e máxima introspeção, reside a sua riqueza conceptual e espacial. (Carvalho; 2009) Relativamente à organização interior da casa, ela tem como elemento central e preponderante o pátio, elemento em relação ao qual os restantes espaços se disponibilizam. Ao contrário do pátio habitual, completamente aberto à casa, este tem como objetivo “ […] impedir que a casa seja atravessada com olhar, funciona novamente com o sentido de muro e de espessura.” (Carvalho; 2009), ou seja, vai funcionar como um limite para a visão, como um resguardo que não permite que das entradas se visualize o interior da casa, uma vez que as grandes janelas envidraçadas se localizam nas paredes laterais do muro espesso onde se inserem os quartos e sala de jantar. [...] o pátio que costuma representar um vazio na matéria da Arquitectura, neste caso, torna-se um cheio, e o muro que costuma representar um cheio esvazia-se escondendo por de trás espaços inesperados. (…) os ambientes articulam-se a partir dos espaços localizados no perímetro. (Vita; 2013; p.42) Ilustração 49 - Casa Barreira Antunes, Pátio central que serve para impedir o atravessamento da visualização da casa (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 67 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus A casa divide-se em duas áreas, a sala de estar, que ocupa o espaço ao redor do pátio central e o seu perímetro/limite, que é definido a partir da disposição dos restantes compartimentos que se organizam envolvendo a própria sala e o pátio central. O espaço principal da casa é a sala de estar que rodeia ou envolve o pátio central, no entanto, o seu limite é desenhado pelos muros ou paredes espessas que a envolvem e que são definidos pela disposição dos espaços secundários, que criam zonas de maior ou menor privacidade, que podem ser aproveitados como o usuário, ou cliente o pretender. Como um muro muito espesso, estes compartimentos que são os quartos, a cozinha, as casas de banho e os espaços de serviço, desenham o ambiente vácuo e desarticulado da sala que nas reentrâncias e na espessura destes volumes, encontra nichos de privacidade que foram aproveitados como sala de estar, sala de jantar ou espaços de descanso. (Vita; 2013; p. 42) Ilustração 50 - Casa Barreira Antunes, Cortes, onde se verifica a diferenciação das alturas entre os espaços principais e secundários para se obter a sensação de muro escavado (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) O pátio volta a ter papel preponderante na arquitetura, uma vez que o pátio que nos habituamos a ver, e que é praticamente repetido em todas as culturas e épocas apresentadas no capítulo anterior, é o centro da composição, aberto a todas as divisões da casa e para o qual todos os espaços se disponibilizam. Neste caso, funciona também como o centro da composição e tem, até certo ponto, o carácter de um pátio mediterrâneo tradicional, uma vez que é o centro da casa e sendo a mesma fechada ao Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 68 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus exterior, os ambientes são iluminados pelos dois vãos de acesso ao edifício e pela entrada de luz central, criada pelo pátio, manipulada serenamente que entra pelo interior, branco, criando um ambiente quase zenital. Ilustração 51 - Vista de uma das entradas de luz que reflete bem o ambiente calmo e tranquilo pretendido. (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Este estratagema de entrada de luz, ou de iluminação dos espaços mais privados, vai repetir-se numa teia de pequenos pátios que iluminam todos os espaços domésticos, tais como os quartos, casas de banho e cozinha e que permitem relações visuais entre os mesmos. Mais pormenorizadamente vamos passar a descrever a planta desta intervenção. A casa, como já referido, dispõe de duas entradas, a nascente e a poente, para aproveitar e beneficiar da luz direta do sol. Essas duas entradas não têm a porta tradicional, mas são como dois vãos enormes que se abrem, ou fecham, por meio de uma placa de madeira que as cobre na totalidade e que funciona também como único ornamento exterior da fachada. As referidas entradas são ladeadas por duas grandes aberturas envidraçadas, que beneficiam destas entradas de luz, sendo que a Norte se localizam os quartos e a Sul os locais de serviço e cozinha. Estes espaços secundários, quartos e serviços, são o tal muro escavado, sendo que para se dar esta ideia de muro escavado, foram elevados por um degrau, e rebaixados em relação ao teto do espaço principal, que é a sala que rodeia o pátio. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 69 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 52 - Vista para um dos espaços secundários escavados nas grossas paredes (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Ilustração 53 - Vista para dois espaços secundários escavados nas grossas paredes, onde se evidencia a subida de um degrau e a descida do teto em relação ao espaço principal (fotografia de Daniel Malhão (2000) obtida através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Os quartos localizados a norte são iluminados por intermédio dos grandes envidraçados, acima referidos e por intermédio de pequenos pátios que são inseridos entre os quartos e as casas de banho, pelo que também as iluminam. Esta iluminação é sempre obtida indiretamente através do céu que ilumina os pátios de paredes brancas. Como anteriormente referido, esta situação é repetida em toda a habitação unifamiliar, pelo que os espaços secundários localizados a sul, tais como a cozinha e respetivos espaços de serviço são também elevados um degrau em relação ao chão e rebaixados em relação ao teto, do espaço principal. São iluminados indiretamente pelo pequeno pátio que se situa entre a cozinha e a casa de banho e pelos envidraçados laterais que são adjacentes às entradas principais. Ilustração 54 - Pormenor da planta na zona de um dos quartos, onde se evidencia a importância dos pequenos pátios para a iluminação destes espaços (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 70 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus A essência da casa em Melides constrói-se na controversa leitura dos cheios e dos vazios, que no fundo são a mesma coisa não há vazio sem cheio e não há cheio sem vazio. Para desenhar um vazio tem que se desenhar um cheio e para se desenhar um cheio tem que se desenhar também um vazio. ( apud Mateus, Manuel Aires, citado por Vita; 2013; p. 45) Sendo a essência da casa a relação entre a leitura dos cheios e vazios, podem-se considerar cheios os quartos e espaços de serviço, uma vez que, como já referido, se inserem dentro da parede grossa ou muro escavado. Estes cheios vão limitar ou delinear o espaço principal, ou o espaço privilegiado pelo programa, que é a sala que circunda o pátio central, e vão organizar a mesma, criando nichos de privacidade que são aproveitados como sala de estar, de jantar e ou espaços de simples descanso. Ilustração 55 - Casa Barreira Antunes, Planta onde se verifica a preto os espaços secundários e a branco o espaço principal, a sala, e também a relação entre cheios e vazios, descrita por Manuel Aires Mateus (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 71 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 3.3. CASA NA QUINTA DA FONTINHA, MELIDES Ilustração 56 - Casa na Quinta da Fontinha, Vista, fotografia por GUERRA (2013) (in SPIROU, 2014) Na serra de Grândola a casa desenha-se como uma casa pátio que ao mesmo tempo se abre ao mar. O lugar escolhido é o ponto mais alto, procurando o nível com vista direta e clara para o Oceano. O volume protege esta vista e lugar de vida exterior da casa. Um piso inferior resolve as relações com as cotas do terreno e contem os espaços de apoio. O piso principal é desenhado com um limite que pela sua forma define os grandes espaços e as transições entre eles. Os espaços são volumétricos, altos e possíveis de serem habitados por construções no seu interior que acomodam as suas funções e atmosferas. (apud Mateus, Manuel Aires, citado por Silva, 2014, p.9) Localizada na serra de Grândola, mais precisamente em Melides, o projeto denominado de Casa na Fontainha, foi elaborado por Manuel Aires Mateus em colaboração com Ana Cravinho, Inês Cordovil e Ana Rita Martins arquitetas fundadoras do atelier SIA arquitetura. Num terreno que ocupa cerca de 50000 m2 foi escolhido o sítio mais alto do mesmo, por forma à casa estabelecer uma relação visual com um elemento preponderante, o plano de água (figura 48). Perto da pequena vila de Melides, esta residência é situada, como referido acima, no topo de uma colina, de onde se visualiza toda a quinta da Fontinha e foi concebida como um posto de observação, como um miradouro, de tal modo que lembra as antigas casas da época medieval, construídas pelos senhorios na região do mediterrâneo para supervisionar as suas vastas propriedades agrícolas, assim como os montes alentejanos já referidos nesta dissertação, onde a influência do pátio se faz notar. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 72 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Construída em torno de um terraço central olhando para fora, para o Atlântico, a casa possui três quartos, uma cozinha com sala de estar adjacente e uma piscina, além de uma sala de estar adicional, ladeada por duas áreas de armazenamento, que ocupam o andar inferior. A sua essência é a de uma casa-pátio fechada ao exterior, que se desenvolve em torno do elemento central, o pátio que, como mencionado em capítulos anteriores, promove a privacidade da vivência da casa, sendo o elemento exterior e privado em torno do qual todos os espaços se desenvolvem e iluminam. Neste pátio, ou nesta casa pátio, foi inserido um elemento que a abre ao exterior, ao mar, esse elemento é a vista para qual a mesma se abre, vista essa para o Oceano, para o plano de água. Ilustração 57 - Casa na Quinta da Fontinha, Vista de Cima, onde se verifica que a casa se fecha do lado da estrada e se abre para a encosta e que se desenvolve torno do pátio, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) A casa foi projetada como um espaço limite, fechando-se a nascente, do lado da estrada de acesso e abrindo-se em forma de estrela, a partir do pátio central, até aos terraços situados sobre a encosta, com o objetivo, como já referido, de alcançar o mar. O pátio central funciona como uma área comum para onde todos os espaços confluem, se abrem, também uma característica típica das casas pátio tradicionais do Mediterrâneo. Como referido acima, desenha-se como um limite, que por sua vez funciona como um muro espesso, no qual se desenvolvem os espaços e as transições entre eles. A sua forma delimita os volumes, fecha-os ao exterior e por sua vez abre-os ao pátio, elemento central que é envolvido pelos espaços principais, e à vista para o plano território e plano de água. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 73 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Com um toque bastante contemporâneo, uma característica da obra de Aires Mateus, os principais volumes do edifício têm uma forma trapezoidal que subtilmente distorce a sua proporção, tornando-os maiores e mais longos do que realmente são. Ilustração 58 - Casa na Fontinha, principais volumes do edifício têm uma forma trapezoidal que subtilmente distorce a sua proporção, Fotografia por Guerra (2013) (FREARSOON, 2013) No seu exterior, a casa tem um aspeto monolítico, um tanto austero. Esta austeridade é compensada inteligentemente pelo uso subtil de formas curvas, obtidas através do canto cortado no exterior da casa, que cria um arco parcial e integra a entrada para a sala de estar no piso inferior, e, no seu sentido geral, de transparência encontrado no seu interior, minimalista, que acomoda um teto com uma forma curva que se prolonga até á escada. Ilustração 59 - Canto cortado de forma curva, Fotografia por Guerra (2013) (in FREARSOON, 2013) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 60 - Entrada para a sala do piso inferior, Fotografia por Guerra (2013) (in FREARSOON, 2013) Ilustração 61 - Teto de forma curva, Fotografia por Guerra (2013) (FREARSOON, 2013) 74 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 62 - Casa na Quinta da Fontinha, Vista, aspeto austero da do edifício, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) Ilustração 63 - Casa na Quinta da Fontinha, Vista, aspeto austero da do edifício compensado pela subtileza das formas curvas, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) Os espaços interiores são abertos, bastante luminosos, habilmente esboçados pelo arquiteto Aires Mateus no início do processo criativo, têm generosas vistas sobre a circundante natureza e piscina, criando um sensação de tranquilidade quase zenital, uma das qualidades exigidas pelo cliente. A relação com o território e a envolvente é explorada de um modo exímio, uma vez que capta os principais traços da arquitetura tradicional alentejana, as poucas aberturas ao exterior, a disposição dos espaços em torno de um elemento central, que na arquitetura alentejana se fazia representar pela cozinha, tendo como um elemento preponderante a chaminé, as paredes espessas, devido à utilização da taipa e tijolo maciço, e a brancura das paredes obtida pela caiação. Neste caso, as paredes espessas são cheios esvaziados onde se localizam os espaços de apoio aos espaços principais, os tês volumes do piso principal são vazados e são construídos no seu interior elementos que definem as suas funções principais. Ilustração 64 - Casa na Quinta da Fontinha, vista do pátio para o plano de água e para a envolvente, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) Ilustração 65 - Casa na Quinta da Fontinha, vista do pátio para o plano de água e para a envolvente, fotografia por GUERRA (2013) (SPIROU, 2014) Os elementos acima referidos são mais uma característica notável desta casa, o modo como a lareira de forma triangular é camuflada na área da cozinha, a casa de banho Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 75 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus revestida a mármore é escondida atrás da uma parede no quarto principal e a porta curva, dos quartos secundários, que se abre para as colinas extensamente arborizadas. Ilustração 66 - Lareira triangular, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU,2014) Ilustração 67 - Balcão, armário e clarabóia da cozinha, Fotografia por Guerra (2013) (FREARSOON, 2013) Ilustração 68 - Casa de banho do quarto principal, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) Ilustração 69 - Porta curva dos quartos secundários, fotografia por Guerra (2013) (SPIROU, 2014) Após esta introdução sobre o desenvolvimento do projeto, damos conta da leitura realizada em torno dos desenhos da mesma. O edifício desenvolve-se ao longo de uma área útil de 130 + 108 m2 e uma área bruta de 130 + 160 m2. Como referido anteriormente, o edifício desenvolve-se em dois pisos, por forma a resolver a questão da topografia do sítio e, como salientado pelo arquiteto Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 76 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Manuel Aires Mateus, para proteger a habitação da estrada de acesso e de modo a abrir o volume sobre a vista e o seu perímetro delineia os espaços e as suas transições. O primeiro piso, ou piso onde se situa a entrada, como já referido, com uma forma curvada, caracteriza-se pela localização da sala de estar secundária que, para além de funcionar como sala de estar, tem também uma função de hall de entrada, onde em frente à porta de entrada se visualiza a escada de acesso ao piso superior, principal, e é também onde se situam dois espaços de armazenamento que funcionam como espaços escavados num imenso muro grosso. Ilustração 70 - Planta da zona da entrada, onde se verificam os dois espaços para armazenamento, e a sala secundária (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Como casa-pátio por excelência, o segundo piso, ou piso principal, onde se situam todos os principais espaços da mesma, como o quarto principal, cozinha e sala de estar, os dois quartos secundários e o terraço ou pátio, desenvolve-se em torno do referido pátio, circundando-o, no entanto não o fechando para a vista, como as antigas casas mediterrâneas, mas abrindo-o para a sua envolvente. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 77 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 71 - Planta do piso principal, onde se localizam os quartos, cozinha e pátio. (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) Os principais espaços são habitados por construções que definem as funções e atmosferas pretendidas, construções essas como o balcão e armário da cozinha e a claraboia situada por cima do balcão, como a lareira na sala de estar principal, a casa de banho forrada a mármore e escondida atrás de uma parede no quarto principal e as duas casas de banho nos quartos secundários. Os referidos espaços são bastante iluminados e abertos, permitindo uma utilização bastante vasta por parte dos seus usuários, apenas definindo, como já salientado, as suas funções, mas sem delimitar o seu aproveitamento, assim como o carácter de transparência e calma pretendido pelos primeiros esboços do processo criativo. Ilustração 72 - Corte pelas escadas, evidência da forma curva como elemento da composição (desenho obtido através de comunicação pessoal com SILVA; Jorge P, Nov. 2014) As escadas que se visualizam da entrada no piso inferior, terminam em frente a uma das aberturas para o pátio e são ladeadas pelas duas portas de entradas para os quartos secundários, concebidas com uma forma curva, bastante peculiar e certamente com Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 78 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus inspiração nas influências muçulmanas da arquitetura Alentejana, referida no capítulo anterior. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 79 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 80 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 4. PÁTIO E PROJETO Ao finalizarmos esta análise sobre três obras dos arquitetos Aires Mateus, demos conta de várias características e conteúdos, tanto minimalistas e abstracionistas, como da complexa relação com o território, além da grande influência da arquitetura alentejana e da influência bastante percetível do pátio na composição do projeto das suas obras. O pátio é sempre tido como um dos principais espaços da casa e como o elemento gerador da organização do programa. A relação com a arquitetura alentejana evidenciase pelos tipos de formas utilizadas, sempre muito elementares e de formas geométricas simples. Revela-se na maneira inovadora de (re) interpretar o tipo de habitação desta região, pelas fachadas completamente brancas, como se fossem caiadas e pouco ou nada ornamentadas, pelas espessuras das paredes, que se assemelham às paredes grossas de taipa ou de tijolo maciço e que foram reinterpretadas. Como um muro que pode ser escavado, onde só havia matéria pode agora existir arquitetura. Revela-se, ainda, pela relação peculiar com a envolvente, que para além de beber várias características formais da arquitetura da região, já apresentadas, pretende sempre experimentar novas ideias, novos conceitos, oferecendo-lhe o seu cunho pessoal, inovando e, como já anteriormente referido, conferindo uma nova qualidade à arquitetura desta região alentejana e à casa pátio. Este modo de atuar e de pensar a arquitetura foi, obviamente, influência direta na conceção do projeto que apresentamos neste capítulo. Neste caso não tanto as influências da arquitetura alentejana, uma vez que o arquétipo ativo deste é o projeto do arquiteto expressionista alemão Hans Scharoun, a Filarmónica de Berlim, mas a sua influência denota-se a nível formal, pela implementação de uma forma geométrica simplificada, considerada como um sólido puro, elementar e abstrata, forma essa que foi sendo desconstruída no processo de crescimento do projeto, tal como o é nas obras dos arquitetos Aires Mateus, sempre em primeiro lugar pelos espaços principais, neste caso o pátio, e onde todos os outros espaços se desenvolvem nos muros grossos que rodeiam esse objeto abstrato, escavado no seu centro, ou que rodeiam o pátio escavado no objeto primário abstrato. Passamos, agora, a apresentar o referido projeto, onde começamos por apresentar as características do Sítio de Lisboa, as relações e programa e, por fim, os espaços e articulações. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 81 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 4.1. SÍTIO E LUGAR Lisboa pela implantação e desenvolvimento histórico, situada entre montes e vales, entre a barra e o estuário, nasceu como uma cidade naturalmente em diálogo. Diálogo consigo própria e entre as partes que a constituem (do miradouro para as ruas e telhados lá em baixo ou das traseiras envidraçadas, para cúpulas e coberturas de igrejas e monumentos), diálogo com o rio que a envolve, areja e antes penetrava e marginava com areias. Ilustração 73 - O Sítio de Lisboa, a sua morfologia em planta, desenho nosso, 2011 Ilustração 74 - O Sítio de Lisboa, a sua morfologia Alçado, desenho nosso, 2011 As condições morfológicas do sítio de Lisboa (ilustração 69 e 70), a sua localização privilegiada que surge em função da sua estreita relação com o rio Tejo, relação essa reforçada ao longo da sua existência por diversas culturas que ao longo do tempo se foram fixando nesta localização, tudo isto torna Lisboa uma cidade original e arquitetonicamente privilegiada. Há vestígios de tribos primitivas, cultura Romana, Árabe/Muçulmana e outras várias, até aos nossos tempos (ilustração 71). Esta diversificação de Culturas deu azo a várias transformações deste sítio em Lugar, através da intervenção humana na sua intenção de tirar partido das melhores condições que esta localização dispõe. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 82 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 75 - Lisboa, Plantas Ilustrativas da sua evolução Histórica (Romana, Muçulmana e Atual), Desenhos nossos, 2011 Com a ajuda da sua posição geográfica, onde se insere num estuário do Tejo, abrigado das intempéries e de ataques de inimigos, com uma topografia elevada mas suave e de fácil ocupação, composta pelas pequenas colinas, com solos férteis e cheios de recursos naturais, com um clima ameno, com bastante água e de fácil acesso ao mar e com características de luminosidade, originais desta região mediterrânea, o sítio de Lisboa foi sempre bastante atrativo para a implantação de várias civilizações. Foi a partir desta geografia que as sucessivas Lisboas foram sendo construídas. E por isso o actual território da área metropolitana de Lisboa pode ser lido como um palimpsesto. Vestígios vagos, persistências surpreendentes, reconstituições bem sucedidas ou discutidas coexistem lado a lado, por vezes de forma conflitual, com elementos modernos e pós modernos. A história dos sucessivos aproveitamentos humanos da linha de costa exemplifica bem esta complexa estratificação.” (Ferrão, 2004, p 7) Ilustração 76 - Lisboa; Área de estudo (intervenção), Alfama, Fotomontagem sobre fotografia de Lisboa retirada de Google Maps Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 83 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 77 - Morfologia do Bairro de Alfama, alçado (desenho nosso, 2011) Ilustração 78 - Morfologia do Bairro de Alfama, corte transversal (desenho nosso, 2011) Ilustração 79 - Morfologia do Bairro de Alfama, corte longitudinal (desenho nosso, 2011) Alfama é a zona onde se localiza o lugar da intervenção, e o seu nome deriva do árabe al-hamma, que significa banhos ou fontes. Alfama, com as suas ruas estreitas, escadarias, miradouros (ilustrações 73, 74 e 75), becos e pátios antigos (ilustração 77), com as suas casas coloridas (ilustração 76) as suas lojas tradicionais e as marcantes casas de Fado, é um dos bairros mais antigos e genuínos da cidade de Lisboa, que mantém uma peculiar forma de viver que se assemelha à de uma antiga aldeia onde todos se conhecem. Ilustração 80 - Pátio dos Quintalinhos (Silva, 2004) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 84 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 81 - Pátio do Curvo (Silva, 2004) Este bairro tem das vistas mais arrebatadoras sobre a cidade de Lisboa e sobre o rio Tejo, sendo o mesmo envolvido pela colina do Castelo de S. Jorge e pela colina de S. Vicente e os seus principais monumentos são a Igreja de Santo Estevão, a Igreja se São Vicente de Fora, a Sé de Lisboa, o Teatro Romano entre outros. Durante o domínio muçulmano, poder-se-ia falar de uma Alfama do Alto, mais nobre, situada dentro da Cerca Moura, na parte oriental da atual freguesia da Sé, que comunicaria pela Porta de Alfama ou de São Pedro (na atual rua de São João da Praça) com uma Alfama do Mar, arrabalde popular. Com o domínio cristão o bairro de Alfama foi-se alargando mais para nascente, dentro dos limites da Cerca Nova ou Cerca Fernandina, ultrapassando o Chafariz de Dentro. No terramoto de 1755 este bairro e as suas edificações resistiram em na sua grande maioria ao mesmo, e atualmente apesar de já não existirem casas mouriscas, o bairro conserva um pouco do ambiente da cidadela árabe com as suas ruelas, escadarias e roupa a secar nas janelas. As áreas mais arruinadas estão a ser restauradas e a vida desenvolve-se em volta das pequenas mercearias e tabernas, pequenos restaurantes, e miradouros que vão trazendo turistas, e dando uma nova vida a esta bela zona da cidade. Como verificamos no primeiro capítulo desta dissertação, a urbe muçulmana, pelas suas características sociais e religiosas, sempre se pautou pelo uso do pátio como zona de convívio e de reunião, assim como zona agrícola entre vários outros usos. Pelo que se julgamos que este registo tem como origem essa civilização que se fixou nesta colina de Lisboa. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 85 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Não há registo histórico do aparecimento dos primeiros pátios em Lisboa, mas sabe-se terem origem na civilização Árabe. Sendo esta uma sociedade de fortes laços comunitários, os pátios não só permitiam convivência entre vizinhos mas também, ler e ensinar o Corão num ambiente intimista.” (SILVA, 2004) (ilustração 78 e 79) Ilustração 82 - Pátio da Cruz (Silva, 2004) Ilustração 83 - Pátio da Cruz (Silva, 2004) Quando da conquista de Lisboa pelos cristãos, no séc. XII, os pátios muçulmanos são reaproveitados, transformados em pequenas quintas, pequenas hortas (ilustração 80 e 81), uma vez que Lisboa crescia e se dispersava ao longo da colina do castelo e alfama sem um sentido, sem planificação. No entanto, no período medieval são retomados ou reaproveitados os pátios para as mesmas intenções socio comunitárias e mantêm os mesmos traços físico-urbanísticos, sendo, então, novamente, as quintas e hortas transformadas em pátios. Ilustração 84 - Pátio da Pascácia (Silva, 2004) Ilustração 85 - Pátio da Pascácia (Silva, 2004) A partir do séc. XV são vários os factores que levam ao aparecimento de novos espaços. A instalação da Corte no Terreiro do Paço altera o tecido social da colina (…) como consequência os pátios perdem o seu estatuto intimista para fazer parte da grande azáfama das cidades portuárias e comerciais. (SILVA, 2004) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 86 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 86 - Pátio do Carrasco (Silva, 2004) Ilustração 87 - Pátio do Carrasco (Silva, 2004) Esta alteração do tecido social fez com que esta parte mais antiga da cidade sofresse mais alterações, uma vez que a franja mais pobre da população ocupa os pátios existentes, tornando-os menos próprios para habitação e fazendo com que fosse aparecendo um novo tipo de pátios, as vilas, que surgem do aproveitamento/ocupação de antigos pátios de palácios abandonados, pela população que os utilizava como pequenas comunidades em torno do pátio central (ilustrações 82 e 83). Ilustração 88 - Pátio Dom Fradique (Silva, 2004) Ilustração 89 - Pátio Dom Fradique (Silva, 2004) Até ao século XX estes espaços irão funcionar como habitação assim como o próprio edifício, que por sua vez irá dar nome ao pátio. Com o surgimento da industrialização, a cidade de Lisboa recebe uma franja de população de operários. Procurando sítio para se alojarem, estas acomodações, geralmente fornecidas pelos próprios proprietários fabris, adquirem o nome de "vilas", que não são mais que pátios da era contemporânea, normalmente constituídas por dois ou três andares separadas por uma rua e isoladas do exterior por um portão. É neste século que a devida importância é dada aos pátios como espaço social importante no meio arquitectónico português, eles são feitos de figuras reais, de tristezas e alegrias à semelhança de quem os habita, mas é, enfim, na alegria que se potencia todo o valor destes organismos vivos. (SILVA, 2004) (ilustração 84, 85, 86 e 87) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 87 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 90 - Pátio das Cozinhas (Silva, 2004) Ilustração 91 - Pátio das Cozinhas (Silva, 2004) Após esta pequena introdução sobre o bairro de Alfama, as suas origens e os seus pátios, passamos a apresentar o lugar da intervenção. Nas ilustrações abaixo (ilustrações 92 e 93) são apresentadas duas pinturas de João Botelho que introduzem bem as características já descritas do bairro de Alfama e do lugar do chão do Loureiro, uma vez que é uma zona de transição, charneira (ilustração 94), entre a estrutura urbana pombalina, de forma ortogonal com as mesmas cores e mesmos traços entre os edifícios e a área da Alfama e da colina do castelo anteriormente descrita. Apresentamos, também, uma fotomontagem que ilustra como o edifício do Chão do Loureiro funciona como edifico charneira. Ilustração 92 - - Calçada do Marquês de Tancos, pintura de Carlos Botelho (1949) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 93 - Chão do Loureiro, pintura de Carlos Botelho (1949) 88 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 94 - Fotomontagem, Mercado do chão de Loureiro, edifício como charneira entre o largo da atafona, a calçada do Marquês de Tancos e o Largo do chão do Loureiro. Entre Alfama e a Baixa Pombalina (fotomontagem nossa sobre fotografias nossas, 2011) O lugar da intervenção, o Mercado do Chão de Loureiro, fica situado na freguesia de São Cristóvão. O edifício, como acima descrito, funciona como um edifício charneira, entre o largo do Chão de Loureiro (ilustração 95), o largo, ou beco, da Atafona (ilustrações 96 e 99) e a calçada do Marquês de Tancos. (ilustração 97) Ilustração 95 - Mercado do Chão de Loureiro, visto do Largo do Chão de Loureiro (fotografia nossa, 2011) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 96 – Mercado do Chão de Loureiro, visto do Beco da Atafona (fotografia nossa, 2011) 89 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 97 - Mercado do Chão de Loureiro, vista da calçada do Marques de Tancos (fotografia nossa, 2011) Em tempos, e como o nome indica, albergou o mercado da região além de no seu terraço albergar um miradouro artificial (ilustração 100) com uma das melhores vistas da cidade. Atualmente o mesmo alberga um silo automóvel, uma vez que a zona apresenta uma grande carência de lugares de estacionamento, e um supermercado Pingo Doce, no seu terraço, ou no último andar fica o Restaurante Zambeze, que aproveita o magnífico miradouro como esplanada. Ilustração 98 - Mercado do Chão do Loureiro, vista das escadas de acesso á calçada do Marquês de Tancos (fotografia nossa, 2011) Ilustração 99 - Largo da Atafona (fotografia nossa, 2011) Ilustração 100 - Mercado do Chão do Loureiro Vista para o miradouro (fotografia nossa, 2011) O sistema urbano desta freguesia assemelha-se bastante ao sistema do bairro de Alfama. Mantendo a estrutura mourisca e medieval quase intacta, fazendo uso dos largos, praças e pátios como zonas de organização da estrutura urbana. Abaixo na ilustração 101, apresentamos a planta atual do lugar da intervenção, desde a escola Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 90 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus atual do Chapitô até ao mercado do Chão do Loureiro, assim como o sistema viário, e principais locais de encontro, largos, pátios, praças etc.. Ilustração 101 - Planta atual da Zona da Intervenção (desenho nosso, sobre planta de Lisboa, 2011) 4.2. RELAÇÕES E PROGRAMA 4.2.1. ARQUÉTIPOS 4.2.1.1. HANS SCHAROUN E O EXPRESSIONISMO ALEMÃO Podemos, sucintamente, resumir os pressupostos do movimento expressionista, um movimento onde os artistas nos apresentam a sua expressão da realidade, que vem de dentro para fora, do interior para o exterior, onde os conceitos fenomenológicos assumem um caráter central; conceitos internos da nossa mente que nos trazem a emoção, a nossa intuição e a nossa própria maneira de ver a realidade, não afetada por ela. Relativamente à forma como esse conceito se formaliza, podemos dizer, por exemplo, que as formas só assumem o seu valor total quando iluminadas. E assim sendo, o expressionismo hiperboliza o uso da luz, criando uma luz própria, tornando a forma de ver o mundo muito pessoal, onde os contornos das formas, dos planos e dos contrastes claros-escuros assumem um caráter central na expressão pretendida (ilustrações 102 e 103). Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 91 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 102 - "Das Cabinet des Dr. Caligari", filme expressionista alemão realizado por Robert Wiene, 1920 Ilustração 103 - "Das Cabinet des Dr. Caligari", filme expressionista alemão realizado por Robert Wiene, 1920 Após alguns anos do término da Segunda Guerra Mundial é comprovado que a pretendida unidade do movimento moderno não era total. Algumas das tendências marginalizadas pela ortodoxia […] não desaparecem senão que nos anos 50 e 60 se desenvolvem com inusitada força. Uma destas correntes é o expressionismo alemão que, na base da arquitectura dos anos 20 […] mostra a permanência da sua vitalidade na última obra de Hans Scharoun. Especialmente a sala Filarmónica de concertos em Berlim (1956-1963). […] Hans Scharoun (1893-1932) foi um dos arquitectos que melhor soube unir os experimentos da transparência, da luz e da fluidez espacial […] A filarmónica destaca-se exteriormente pela expressividade e organização de paramentos e coberturas; e o interior pela energia e tensão, criadas pelos itinerários de vestíbulos e corredores. Interior e Exterior são a expressão da vitalidade orgânica do edifício.” (Montaner, 2001, p.52,53) Ilustração 104 - Sala de concertos da Filarmónica de Berlim fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 105 - Entrada Principal da Filarmónica de Berlim, fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) 92 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 106 - Maqueta da Filarmónica de Berlim, fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) A Filarmónica compõem-se por três pentágonos torcidos entre si, sob uma casca de betão tipo tenda, que definem a sala de concertos da filarmónica de Berlim. O Homem e a Música encontram-se no centro da obra e o palco envolvido por balcões constitui o centro ideal desta composição arquitetónica. Os 2200 espectadores encontram-se em contacto uns com os outros através dos acessos de ligação, do espaço e da acústica, que tem a mesma qualidade, qualquer que seja o local. (ilustrações 93, 94, 95). Ilustração 107 - Planta da Sala de concertos da Filarmónica de Berlim, desenho cedido por de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 108 - Planta de acessos da Filarmónica de Berlim, desenho cedido por de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011 93 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Como la música misma, se trata de un mundo lleno de secretos, que se van descubriendo mediante el movimento en el spacio y en el tiempo, y conducen al oyente hacia la esclarecedora experiencia que oferece el interior. Al mismo tiempo, que este vestíbulo prepara el encuentro con el agitado mundo urbano del exterior: es como una ciudad, grandiosa e íntima e infinitamente varidada. La Filarmónica demuestra que el entorno del hombre en su totalidad adquiere sentido quando una multitud de elementos se relaciona con un centro significativo. La Filarmónica es la obra maestra de la arquitectura orgánica. Aquí, comprendemos que el concepto de forma orgánica no está limitado al ambiente natural que es el punto de partida de las obras de Aalto, u arquitecto básicamente “rural”. En la Filarmónica, el entorno urbano se ha tornado orgánico, y recuerda la imagen de una ciudad que consta de órganos vivos y de sus prolongaciones. Constitiuye un modelo possible para la edificación urbana; después de ver la Filarmónica, el arquitecto y urbanista holandés Bakema obsrevó: “Así deberíamos edificar nuestras ciudades.”11 (Schulz, p. 217, 218) Ilustração 109 - Corte Transversal da Filarmónica de Berlim, desenho cedido por Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) Após a referência aos pressupostos da arquitetura expressionista do arquiteto Hans Scharoun, verificaremos agora a maneira como a mesma atuou como referência na composição do projeto. 11 Como a música em si mesma, trata-se de um mundo cheio de segredos, que se vão descobrindo mediante o movimento no espaço e no tempo, e conduzem ao ouvinte para a esclarecedora experiência que oferece o interior. Ao mesmo tempo, que este vestíbulo prepara o encontro com o agitado mundo urbano do exterior: é como uma cidade, grandiosa e íntima e infinitamente variada. A Filarmónica demonstra que o meio envolvente do homem, na sua totalidade, adquire sentido quando uma multidão de elementos se relaciona com um centro significativo. A Filarmónica é a obra-mestra da arquitetura orgânica. Aqui, compreendemos que o conceito de forma orgânica não está limitado ao ambiente natural que é o ponto de partida das obras de Aalto, o arquiteto basicamente “rural”. Na Filarmónica, o meio urbano tornou-se orgânico, e recorda a imagem de uma cidade constituída de órgãos vivos e seus prolongamentos. Constitui um modelo possível para a edificação urbana; após ver a Filarmónica, o arquiteto e urbanista holandês Bakema observou: “Assim deveríamos edificar as nossas cidades”. (Tradução nossa) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 94 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Como na Filarmónica a Música é o centro (ilustração 104), é o “pátio” da composição, neste projeto (no Chão do Loureiro) a sala de espetáculos é o centro. No entanto a composição espacial, os circuitos, circulações (ilustração 103), vão beber a esta forma de projetar, visto que a intenção foi criar tensões espaciais criadas pelas formas escavadas no seu interior. Se na Filarmónica os espectadores se encontram em contacto uns com os outros através da posição dos balcões e dos percursos entre os mesmos, neste projeto (no Chão do Loureiro), o ambicionado foi que os usuários, ou intervenientes que o vivem, se encontrem em constante contacto uns com os outros através dos percursos, escadas e circulações que se desenvolvem em torno do pátio central. Neste caso, o pátio e a sala de espetáculos são o centro entre os quais todos os percursos e espaços se desenvolvem, se alargam e se encurtam, se relacionam visualmente entre si. Ilustração 110 - Vista da Filarmónica de Berlim, fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) Ilustração 111 - Vista da Filarmónica de Berlim, fotografia de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 95 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 4.2.1.2. EDIFÍCIO FRANJINHAS – RELAÇÃO ESPACIAL INTERIOR/EXTERIOR Mandado construir por Nuno Franco de Oliveira Falcão, entre 1969 e 1971,foi projectado pelos arquitectos Nuno Teotónio Pereira e João Braula Reis, tendo recebido o Prémio Valmor de 1971. Classificado como Monumento de Interesse Público, trata-se de um edifício com uma funcionalidade mista, pois recupera a galeria de lojas aberta à rua e acolhe escritórios nos pisos superiores. (…) É este diálogo inovador entre a espacialidade interior e exterior, fortemente impressa nas franjas da fachada, que traduz o elemento marcante da sua linguagem arquitectónica, muito influenciada pela arquitectura de Turim do final dos anos 60.”12 (ilustração 109) Este projeto dos arquitetos Nuno Teotónio Pereira e João Braula Reis foi tido como referência, devido à sua relação peculiar e inovadora entre interior e exterior (ilustrações 107 e 108), em particular, a maneira como o interior privado se relaciona com o exterior público, uma vez que o piso térreo é, de certa forma, privado, albergando um centro comercial que funciona, contudo, como um complemento da rua, onde se pode vaguear como em qualquer rua da cidade. Ilustração 112 - zona interior/exterior do edifício Franjinhas (fotografia nossa, 2011) 12 Ilustração 113 - zona interior/exterior do edifício Franjinhas (fotografia nossa, 2011) In http://www.cm-lisboa.pt/en/equipments/equipment/info/edificio-franjinhas Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 96 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 114 - Planta corte e vista do Edifício Franjinhas (CML, 2014) 4.2.1.3. MANUEL E FRANCISCO AIRES MATEUS – O PÁTIO E A CENTRALIDADE DA COMPOSIÇÃO ESPACIAL Aires Mateus e associados, sendo um tema desta dissertação, não poderia deixar de ser considerado uma das referências ativas na composição do projeto. A sua influência denota-se a nível formal, uma vez que todo o estudo da forma do edifício deriva, de certa forma, de uma abstração de uma forma geométrica simples que, por sua vez, foi desconstruída, escavada, trabalhada por forma a inserir um programa. Apesar de ter como base do projeto a Filarmónica de Berlim e a sua música como o centro, neste projeto, e tal como nos projetos referência dos arquitetos Aires Mateus, o centro é a sala de espetáculos, que surge nos pisos superiores da intervenção. No entanto, essa centralidade é reforçada em todo o complexo, criando de certa forma um pátio, aberto ao exterior e para o qual todo o seu interior se disponibiliza. Apesar de ser fechado ao céu é aberto a todos os espaços internos, salas de aulas, biblioteca, refeitório, residências para estudantes e professores, todos beneficiam da centralidade do edifício e do seu pátio central. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 97 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Tal como nos projetos referência dos arquitetos Aires Mateus, o pátio não é tido como um normal pátio, mas sim como uma reinterpretação do mesmo. Na casa Barreira Antunes, o pátio aberto ao céu funciona como uma barreira que impede o atravessamento da casa, no projeto em Alvalade do Sado, o pátio funciona como toda a fonte de iluminação da casa, na casa da Aroeira é tido como o centro da composição. A intervenção no Chão do Loureiro não foge a esta regra, apesar de ser fechado ao céu, é aberto à rua, é o centro da composição e é a fonte da vida de todo o edifício. Além da referência do pátio foi também tido em conta a forma de atuar e de compor o programa, sendo que o mesmo é inserido dentro de muros escavados que rodeiam o espaço central (Ilustrações 110 e 111), assim, o pátio é o centro, e todos os restantes espaços, que o servem e que compõem o programa, são inseridos dentro das paredes grossas, ou muros escavados, que o rodeiam. Ilustração 115 - Fotomontagem nossa sobre fotografia de Guerra, 2014 Ilustração 116 - Fotomontagem nossa, sobre fotografia de Silva., 2000 4.2.2. CONCEITO Após salientarmos as referências conceptuais deste projeto, podemos, então, definir e apresentar o seu conceito. Neste caso, o edifício surge de modo a resolver uma difícil topografia, com três zonas distintas, sendo essas, o largo do Chão do Loureiro, o beco da Atafona e a calçada do Marquês de Tancos. Desenvolve-se, então, como uma montanha, que se comporta como a topografia do sítio de Alfama (ilustrações 73, 74 e 75), escavada no seu interior, escavada em torno de um centro, sendo que nos muros que rodeiam esse centro se iria inserir e compor o programa apresentado (ilustração 125), sendo o seu topo a localização da sala de espetáculos, do circo da cidade, aberta à cidade de Lisboa, por onde a iluminação entra e dá forma ao seu interior. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 98 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 117 - Desenho Referencia, expressionismo alemão, desenho de Mendelsohn (in ZEVI, 2002) " Ilustração 118 - Edifício como uma Montanha, Desenho conceptual nosso, 2011 Ilustração 119 - Edifício como uma montanha escavada, Desenho conceptual nosso, 2011 A ideia era que o edifício se comportasse como uma continuação da rua, como uma cidade em si mesmo, podendo-se vaguear livremente no mesmo, apreciando-o e estabelecendo uma relação visual com todos os seus utilizadores (ilustração 121), seja qual for a sua localização, como na própria cidade de Lisboa, em particular no bairro de Alfama, onde a relação visual descendente (ilustração 120) assume um carácter central. Ilustração 120 - Anjo do "Wings of Desire" olhando Lisboa, Fotomontagem nossa, sobre fotografia nossa e imagem do filme "Wings of Desire" de Wim Wenders, 1987 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 99 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 121 - O anjo ouvindo os pensamentos do humano, a relação visual entre pisos, Imagem retirada do filme "Wings of Desire" de Wim Wenders, 1987 A forma do edifício parte de uma desconstrução da planta da Filarmónica de Berlim, tendo como ponto de partida o seu centro, a sala de espetáculos, pelo que todo o restante programa a rodeia, como se envolvesse um pátio (figura 113). Ilustração 122 - Desenho sobre referência, pátio central e muros a rodeá-lo, Desenho nosso, 2011 Ilustração 123 - Desenho sobre referência, muros ao redor do pátio, Desenho nosso, 2011 Ilustração 125 - Tensões e acessos dentro de um pátio, Desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 124 - Desenho sobre referência, muros escavados ao redor de um pátio, Desenho nosso, 2011 Ilustração 126 - Desenho sobre referência, muros ao redor de um pátio, Desenho nosso, 2011 100 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Essa forma partiu de um sólido compacto (ilustração 122), como se de uma pedra se tratasse, pedra essa que foi desconstruída, como se fosse uma planta topográfica, desconstruída por níveis (ilustração 123). Tendo sempre como ponto de referência o centro, o pátio, que acompanha todo o edifício (ilustração 124). Ilustração 127 - Maqueta conceptual, solido compacto, com cobertura separada tipo tenda aberta, Fotografia nossa, 2011 Ilustração 128 - Maqueta conceptual, solido decomposto por níveis, tipo topografia, como uma montanha, Fotografia nossa, 2011 Ilustração 129- Maqueta conceptual, solido decomposto por níveis, tipo topografia, como uma montanha escavada no centro, Pátio, Fotografia nossa, 2011 4.2.3. PROGRAMA O programa extenso contempla a integração de uma casa de espetáculos completando a escola do Chapitô com uma residencial para estudantes e professores do mesmo, integrando também um complemento da respetiva escola de artes circenses com secretaria, salas de aulas teóricas e práticas, um auditório, uma biblioteca, um refeitório e respetiva cozinha e um mini mercado Pingo Doce, com a respetiva área de cargas e descargas. Como o edifício iria integrar-se no lugar do mercado do Chão do Loureiro, em Alfama, e o mesmo tem uma imensa necessidade de lugares para estacionamento de automóveis, foi também integrado um parque de estacionamento que iria servir tanto a escola de artes circenses como a sala de espetáculos da mesma. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 101 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Como zona primordial do complexo, temos a sala de espetáculos com 356 m2, centro da composição, sendo que se denota a sua presença em todo o edifício. Essa zona de espetáculos tem como complemento toda a zona de foyer que se pode transformar em espaço de exposições temáticas e respetivos bares para o atendimento ao público com 763 m2, a sala de aquecimentos que funciona também como sala de aulas práticas com 156 m2 e o Back Stage com 90 m2. Como ampliação da escola de artes circenses do Chapitô são integradas salas de aulas teóricas (cerca de 315 m2) e sala de aulas práticas (cerca de 156 m2), assim como uma secretaria com 70 m2 biblioteca com 800 m2, um auditório com 90 m2, um refeitório com 270 m2 acompanhado de uma cozinha com 100 m2. No subsolo é integrado um parque de estacionamento com 1000 m2, que serve tanto de apoio à escola, ao mini mercado e à sala de espetáculos, tendo cerca de 38 lugares de estacionamento e acessos verticais a todo o edifício nas duas extremidades do mesmo. Nesta parte do edifício fica também localizada a área de cargas e descargas que serve o mini mercado Pingo Doce, com cerca de 135 m2. Abaixo apresentamos uma imagem tipo diagrama onde se visualiza a localização das áreas apresentadas (figura 125). Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 102 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 130 - Diagrama do Programa, Desenho nosso, 2011 4.2.4. RELAÇÕES - OS EDIFÍCIOS E ZONAS ENVOLVENTES E O RIO TEJO As relações do edifício com a envolvente podem dividir-se em duas, em primeiro plano a relação com a envolvente imediata, que são os edifícios que circundam o edificado, assim como as ruas, largos/praças/pátios com maior proximidade. Abaixo são apresentados dois desenhos (ilustrações 126 e 127) que representam, através da imagem, as relações, assim como as principais ruas, largos/praças/pátios da envolvente imediata, pelo que podemos afirmar que o que influencia direta ou indiretamente é a relação com os edifícios que circundam a intervenção, assim como os largos, praças e pátios e os próprios sistemas aqui apresentados diagramaticamente, que diferenciam as diferentes zonas, tais como a zona com um sistema mais mourisco de Alfama e o sistema ortogonal da área Pombalina. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 103 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 131 - relações com a envolvente próxima, Desenho nosso, 2011 Ilustração 132 - relações com a envolvente próxima, sistema viário, largos, praças e momentos, desenho nosso, 2011 A relação indireta ou mais longínqua, embora não menos importante, é a relação visual com o rio Tejo e Praça do Comercio (ilustração 128), neste caso obtida através da vista do miradouro construído, que se localiza no topo da intervenção, aqui apresentada diagramaticamente. Ilustração 133 - relação com o Rio Tejo e Praça do Comercio, Desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 104 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 4.3. ESPAÇO E ARTICULAÇÕES 4.3.1. INGRESSOS O edifício é composto por vários níveis a diferentes cotas, e como apresentado na definição do lugar onde se insere o Chão do Loureiro, existiam três cotas principais, as quais necessitavam de um cuidado especial, sendo essas a entrada situada no Largo do Chão do Loureiro, a situada frente ao Pátio/Largo da Atafona e a situada na calçada do Marquês de Tancos. Neste caso foram inseridos três ingressos/entradas no edifício, o primeiro abaixo apresentado (ilustração 135), situado no Largo do Chão de Loureiro que tem a cota de 32,5m, considerada a cota de projeto 00,00m, uma vez que o edifício é rebaixado cerca de 60 cm em relação ao terreno, na cota de -00,60 m, onde se insere a entrada para a residencial, para a biblioteca e para o mini mercado Pingo Doce. Ilustração 134 - Planta do Ingresso 1, cota -00,60 m Ilustração 135 - Planta do ingresso 1, cota de projeto 0,00 m, Desenho nosso, 2011 A planta abaixo apresentada (ilustração 136) refere-se ao ingresso 2, localizado frente ao pátio da Atafona, na cota 05,5, onde se situa o ingresso para escola de artes circenses, os serviços administrativos e o balcão de atendimento ao público. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 105 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 136 - Planta do Ingresso 2, cota 05,50 m, Desenho nosso, 2011 Por último, temos o ingresso 3 (ilustração 137), localizado na calçada do Marquês de Tancos, na cota de 21,38 m, onde se situa a entrada para a sala de espetáculos da escola de artes circenses, para o centro de exposições temáticas e para o miradouro construído, sobre a cidade de Lisboa e sobre o Rio Tejo, as grandes relações diretas do edifício. Ilustração 137 - Planta do Ingresso 3, cota 21,38 m, Desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 106 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 4.3.2. SISTEMA DISTRIBUTIVO O sistema distributivo do edifício é bastante simples, demonstra a forma de pensar o edifício no seu todo. O edifício envolve o pátio central, o sistema distributivo também acompanha o seu desenvolvimento circundando o pátio central. Ilustração 138 - Sistema Distributivo da zona do ingresso 1, Desenho nosso, 2011 Ilustração 139 - Sistema Distributivo da zona do ingresso 2, Desenho nosso, 2011 Podemos diferenciar três zonas distintas de acesso no edifício, o do largo do Chão de Loureiro (ilustração 138), o do pátio da Atafona (ilustração 139), e o da calçada do Marquês de Tancos (ilustração 141). No entanto, apesar destes três acessos, o sistema distributivo permanece quase imutável, com algumas diferenças de acesso para acesso, permanece o essencial, ou seja, o seu percurso circunda e envolve o espaço central do Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 107 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus edifício, o que também permanece visível no sistema distributivo do piso tipo do edifício (ilustração 140). Ilustração 140 - Sistema distributivo do piso tipo, Desenho nosso, 2011 Ilustração 141 - Sistema distributivo da zona do ingresso 3, desenho nosso, 2011 4.3.3. SISTEMA ESTRUTURAL O Sistema Estrutural é composto por uma estrutura de 11 pilares que acompanham todo o edifício (ilustrações 142 e 143), desde o parque de estacionamento até à cobertura da sala de espetáculos e que envolvem o pátio central por forma a libertar essa zona específica de qualquer elemento estruturante. Ilustração 142 - Sistema estrutural do Edifício, desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 108 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Além dos referidos pilares, o sistema estrutural baseia-se também num sistema em betão armado reforçado, de maneira a isolar os esforços do sólido decomposto, sem interferir com a maioria dos pilares para que os mesmos se tornem independentes da restante estrutura, isto para reforçar a importância da centralidade em todo o edifício (ilustrações 142 e 143). Ilustração 143 - Sistema Estrutural do Edifício, desenho nosso, 2011 4.3.4. PLANTAS DO PROJETO E ATMOSFERAS Após a apresentação dos sistemas distributivo e estrutural, passamos a apresentar as plantas do edifício e das atmosferas pretendidas. A primeira planta (ilustração 144) será, de nível -1, na cota -03,6 m, onde se localiza a zona de estacionamento e de cargas e descargas referente ao minimercado Pingo Doce. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 109 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 144 - Planta nível - 1 (Estacionamento e cargas e descargas do mini mercado), cota -03,6 m, Desenho nosso, 2011 A planta de nível 1 (ilustração 145), na cota -00,6, onde se desenvolve o acesso para a residencial, para a biblioteca (com pé direito duplo) e para o mini mercado Pingo Doce (com pé direito duplo). Nesta cota começa-se já a sentir a presença do pátio central que, para além de um pátio de rua, pode também ser uma zona de espetáculos circenses, incluídos na escola Chapitô. Ilustração 145 - Planta nível 1 (ingresso para as residências, para a biblioteca, e para o mini mercado Pingo Doce) cota -00,6m, Desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 110 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 146 - Fotomontagem, Atmosfera Expressionista, ingresso 1, sobre fotografias nossas, imagem do filme "Das Cabinet des Dr. Caligari", realizado por Robert Wiene, 1920 e fotografia da filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) Ilustração 147 - Fotomontagem, Atmosfera Expressionista, ingresso 1, sobre fotografias nossas, e fotografia da Filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 111 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 148 - Fotomontagem, Atmosfera Expressionista, ingresso 1, sobre imagem do filme "Das Cabinet des Dr. Caligari", realizado por Robert Wiene, 1920 e fotografia da Filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) As atmosferas acima apresentadas (ilustrações 146, 147 e 148), através de fotomontagens, ilustram o ambiente pretendido, uma vez que todo o edifício circunda o pátio central. Esse pátio deverá ser tido em conta como uma zona de possíveis apresentações de espetáculos, demonstrações circenses ou até mesmo como local de aulas práticas, uma vez que todo o edifício é tido como um circo para a cidade, como um complemento da escola Chapitô. Este acesso ao edifício é como um primeiro impacto, uma primeira entrada no mundo da escola de artes circenses, mas é, também, como um complemento da rua, como uma continuação do largo do Chão do Loureiro. Ilustração 149 - Planta nível 2 (plataforma para apresentação de espetáculos / pátio central visível de todo o edifício que o circunda) cota 02,4m, desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 112 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 150 – Fotomontagem género, Atmosfera Expressionista da plataforma, sobre fotografia da Filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011), Fotografia nossa e imagem do filme "Das Cabinet des Dr. Caligari", realizado por Robert Wiene, 1920 A atmosfera aqui apresentada (ilustração 150) ilustra o que se pretende desta plataforma localizada na cota 2.4m (ilustração 144), sendo visível de todo o edifício, principalmente da biblioteca e dos circuitos que envolvem esta plataforma. Para além de servir como pátio central e como continuação da rua, poderá também ser utilizada como área para a realização de espetáculos de qualquer tipo, ou como uma simples varanda sobre a rua, um pequeno miradouro interior/exterior. Ilustração 151 - Planta nível 3 (zona do ingresso 2 - em frente ao pátio da atafona - onde se localizam os serviços da escola de artes circenses, o refeitório, cozinha e os primeiro quartos da residencial) cota 05,0m, desenho nosso, 2011 Na planta de nível 3 (ilustração 151) onde se localiza o acesso que se situa na rua em frente ao pátio/largo da Atafona, a cota já se situa nos 05,0m e é onde se encontram os Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 113 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus primeiros cinco quartos da residencial, o refeitório (com pé direito duplo) e respetiva cozinha, assim como os serviços da escola de artes circenses, tais como a secretaria, os gabinetes de apoio e o balcão de atendimento ao público. Todos estes serviços, assim como circuitos / sistemas distributivos, circundam o pátio central que é visível em todo o edifício. Ilustração 152 - Fotomontagem, ingresso 2, sobre fotografia nossa, e fotografia da Filarmónica de Berlim de Wikimedia Commons (in KROLL, 2011) A atmosfera exterior aqui apresentada (figura 152) ilustra, de certa forma, o carácter pretendido no acesso pelo largo da Atafona, como uma continuação da rua. Ilustração 153 - Planta do nível 4 (localização do auditório e respetivo Back Stage do mesmo, sala de estar dos professores, mais 5 quartos da residencial assim como uma plataforma em mezanine que funciona como complemento do refeitório) cota 09,35 e de 7,75 m, Desenho nosso, 2011 Na planta do nível 4 acima apresentada (ilustração 153), onde se situam mais 5 quartos pertencentes à residencial, a sala de estar dos professores da escola de artes circenses, Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 114 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus o auditório e respetivo back stage, assim como uma sala de aulas teóricas, e uma plataforma em mezanine que serve o refeitório. Praticamente toda a planta se situa na cota 09,35m com exceção do palco do auditório e da plataforma que serve o refeitório que se situam a na cota de 07,75m. Ilustração 154 - Planta do Nível 5 (contem 5 quartos da residencial, 4 salas de aulas teóricas e um bar) cota 12,65 m, Desenho nosso, 2011 Na planta do nível 5 (ilustração 154), na cota 12,65m, o sistema distributivo mantém-se o mesmo, envolvendo o pátio central. Neste piso incluem-se os últimos 5 quartos pertencentes à residencial, os quartos dos professores, as 4 salas de aulas teóricas e um bar para estudantes e professores. Neste piso foi dada grande importância às zonas de circulação, que funcionam como zonas de estar, enquanto não decorrem aulas e que permitem, como nos outros pisos uma visualização dos pisos descendentes. Essa relação visual obtida através do pátio central é essencial à composição do edifício e a atmosfera pretendida é ilustrada na fotomontagem abaixo apresentada (ilustração 155), sendo essencial à relação entre os pisos. A mesma é obtida não nos espaços mais resguardados, como os quartos pertencentes à residencial, mas sim pelo sistema distributivo, pelas circulações que circundam o pátio central. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 115 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 155 - Fotomontagem, sobre fotografias nossas de Lisboa e do Circe du Soleil (2011) e imagens do filme "Das Cabinet des Dr. Caligari", realizado por Robert Wiene, 1920 Nas plantas de Nível 6 e 7 (ilustrações 156 e 157) já é introduzida a sala de espetáculos. O sistema distributivo mantém-se idêntico, circundando o pátio central, no entanto, neste caso o centro que é envolvido é o pátio aberto ao exterior, a sala de espetáculos aberta à envolvente. O Foyer que envolve a referida sala tem propositadamente uma área maior até que a própria sala, isto porque também serve de centro de exposições temáticas e onde se localizam também bares de apoio a quem usufrui daquele espaço, servindo também de miradouro sobre a cidade e sobre o Tejo. A planta do Nível 6 na cota de 15,00 incluí a sala de aulas práticas/sala de aquecimento, o back stage da sala de espetáculos e um bar para atendimento ao público. Na planta de Nível 7 na cota de 17,75 m, situa-se uma das duas entradas para o circo da cidade, assim como área de foyer e um dos bares para atendimento ao público. Estas duas plantas relacionam-se através das escadas que se situam em duas zonas distintas, em forma de cotovelo, com um patamar intermédio que permite o descanso para quem sobe ou desce e serve também de miradouro para a sala. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 116 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 156 - Planta nível 6 á cota 15,00 m, desenho nosso, 2011 Ilustração 157 - Planta nível 7 á cota 17,75 m, desenho nosso, 2011 Na última planta, do nível 8 (ilustração 158), situa-se o acesso ao circo da cidade/sala de espetáculos, na cota de 21,38 m. Além de entrada principal para a sala de espetáculos, este último piso mantém, também, o seu uso de miradouro sobre cidade de Lisboa e sobre o Tejo. Este miradouro/foyer circunda a sala de espetáculos tida como pátio central. Toda a sala é aberta ao exterior apenas coberta com uma cobertura Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 117 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus inspirada na cobertura da Filarmónica de Berlim e nas tendas de circos, por isso funciona isolada, separada e como se estivesse descolada do edifício. Ilustração 158 - Planta de Nível 8, Ingresso 3, sala de espetáculos, cota 21,38m, desenho nosso, 2011 O objetivo passa por separar essa cobertura do edifício (ilustrações 159 e 160), como se fosse uma tenda sobre o mesmo e essa tenda abre-se para a cidade, para o rio, para a sua envolvente. Ilustração 159 - Planta de Cobertura, Desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 118 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 160 - Fotomontagem do Ingresso 3, Cobertura, Sobre fotografias nossas de Lisboa e de Maquetas, 2011 A atmosfera pretendida é ilustrada através da fotomontagem apresentada (ilustração 161), que sobrepõe artistas do “Cirque Du Soleil”, à cobertura apresentada, que aqui é de um céu estrelado, retirado da pintura “The Queen of the Nigth”, de Friedrich Schinkel, e do auditório da Filarmónica de Berlim. O pretendido aqui como atmosfera é a ligação dos artistas, à envolvente exterior, e ao público, mas também a ligação do público à envolvente exterior, numa relação reforçada com a cidade e com o rio. Ilustração 161 - Fotomontagem, atmosfera da sala de espetáculos Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 119 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 4.3.5. ALÇADOS, CORTES E VISTAS DO PROJETO Como nos projetos referência dos arquitetos Aires Mateus, também este projeto se assemelha a uma escultura, sendo necessário circundá-lo para percebê-lo na sua plenitude. De modo a entender a sua forma, passamos a apresentar os alçados e vistas, assim como dois cortes, longitudinal e transversal do edifício. Ilustração 162 - Alçado do Largo do chão do Loureiro, desenho nosso, 2011 No alçado (ilustração 162) e vista do Chão do Loureiro (ilustração163), percebemos que o edifício dispõe de poucas aberturas ao exterior, tendo alguns vãos nos quartos e nas salas de aulas e biblioteca, para uma melhor iluminação dos espaços, uma vez que o pátio interior dispõe de iluminação artificial. Nesta vista (ilustração 163), percebemos que o acesso funciona como um complemento da rua, aumentando e qualificando o largo do Chão do Loureiro, numa tentativa de integração do edifício com a relação imediata do referido largo. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 120 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 163 - Fotomontagem, Vista do Largo do Chão do Loureiro, sobre fotografia e desenho nosso, 2011 No alçado (ilustração 164) e vista (ilustração 165) abaixo apresentados, o objetivo é demonstrar que o edifício vive com zonas distintas. Se no alçado anterior o mesmo vive do pátio central e complementa o largo do Chão do Loureiro, neste, o edifício continua como uma sequência da rua, em que se pode entrar e seguir a mesma saindo depois pelo largo do Chão do Loureiro sem ter de se contornar o edifício, mas podendo percorrê-lo no seu interior, percebendo-se, aí sim, a importância do seu pátio interior. Sendo a parte mais afastada do centro da composição, a mesma necessita de mais vãos por forma a iluminar as salas de aulas, assim como a sala de aquecimento ou de aulas práticas. Ilustração 164 - Alçado do lago da Atafona, desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 121 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 165 - Fotomontagem, vista do largo da atafona, Sobre fotografia e desenho nossos, 2011 No alçado da calçada do Marquês de Tancos (ilustração 166), o edifício não tem o mesmo impacto, apenas saindo ligeiramente da cota topográfica do local. Começa-se aqui a perceber a sua volumetria, ressaltando o mais importante nesta zona, a cobertura do circo da cidade, da sala de espetáculos da escola de artes circenses. Sendo esta cobertura separada do corpo do edifício, a sua cor difere do restante, aumentando o seu impacto visual, uma vez que nos restantes alçados, à escala humana, percorrendo a rua, não se tem a noção da parte superior do edifício assim como da sua cobertura. Na vista apresentada (ilustração 167), feita através de montagem sobre fotografia de uma cota superior à calçada do Marquês de Tancos, o que sobressai do complexo é a sua cobertura é o circo da cidade e o miradouro artificial no seu topo. Ilustração 166 - Alçado da Calçada do Marquês de Tancos, desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 122 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 167 - Vista sobre a cobertura e para o Alçado da calçada do Marquês de Tancos, fotomontagem sobre fotografia e desenho nossos, 2011 Após a apresentação dos alçados e vistas principais do edifício passamos a apresentar os cortes do mesmo. No corte longitudinal (ilustração 168), percebemos principalmente a estrutura geral do edifício em betão armado que se vai abrindo e circundando o pátio central, assim como os sistemas de distribuição verticais. Este corte longitudinal permite também verificar a cobertura “descolada” do restante edifício, apesar de não ser visível a sua estrutura de suporte. Ilustração 168 - Corte Longitudinal, desenho nosso, 2011 No corte transversal (ilustração169), abaixo apresentado, conseguimos perceber a diferenciação entre a estrutura do edifício, em betão armado e a estrutura que suporta a cobertura. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 123 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Além desta perceção estrutural do edifício e da sua cobertura, verifica-se perfeitamente a presença do pátio central em todo o edifício, em todos os pisos e os sistemas distributivos que o envolvem e circundam. Ilustração 169 - Corte Transversal, desenho nosso, 2011 Em pormenor, apresentamos cortes que permitem uma perceção da atmosfera pretendida para a biblioteca, que se assemelha à do restante edifício, muito à semelhança da biblioteca de Berlim onde a relação visual entre os pisos é determinante. As escadas e áreas de estudo são complementadas por essa mesma relação visual, no caso do filme de Wim Wenders, “Wings of Desire” de 1987 (ilustrações 165 e 166), onde os anjos vão ver e ouvir os pensamentos, e movimentos, dos humanos. Ilustração 170 - Imagem da Biblioteca de Berlim, retiradas do Filme "Wings of Desire" de Wim Wenders, 1987 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola Ilustração 171 - Imagem da Biblioteca de Berlim, retiradas do Filme "Wings of Desire" de Wim Wenders, 1987 124 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus A biblioteca tem pé direito duplo, aproveitado para a inserção de dois pisos em mezanine. Todo o piso principal é onde se situa o ingresso na biblioteca, zonas administrativas. A zona em mezanine que circunda a biblioteca deverá ser utilizada como zona de leitura. A zona principal de leitura situa-se no topo das escadas que se localizam no centro da biblioteca e circundam-na como se de um pátio se tratasse, mantendo o mesmo conceito do edifício, onde o todo o programa envolve o pátio central. Aqui, todo o piso superior circunda o centro da biblioteca, permitindo uma relação visual entre os dois pisos Ilustração 172 - Corte Longitudinais da Biblioteca, desenho nosso, 2011 Ilustração 173 - Corte Longitudinais da Biblioteca, desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 125 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Ilustração 174 - Corte Transversal da Biblioteca, desenho nosso, 2011 Ilustração 175 - Corte Transversal da Biblioteca, desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 126 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Por último, são apresentados os cortes construtivos que permitem exemplificar o sistema de construção utilizado (ilustrações 176 e 177). Ilustração 176 - Pormenor construtivo da cobertura, desenho nosso, 2011 Ilustração 177 - Pormenor construtivo tipo da laje e parede, desenho nosso, 2011 Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 127 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 128 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A presente dissertação teve por base uma investigação, pesquisa e reflexão de conceitos e ideias, considerados relevantes para a elaboração de um projeto de arquitetura, realizado na unidade curricular do Projeto III. A investigação incidiu sobre o objeto de estudo, casa-pátio, sobre a arquitetura popular alentejana e sobre a obra do atelier Aires Mateus. A origem da tipologia pátio remonta ao começo da História da Humanidade, estendendose desde as habitações de antigas comunidades, nas grandes civilizações préclássicas, transpondo-se também para as clássicas até à atualidade. Desenvolveu-se durante todos os séculos da humanidade e em todos os locais do mundo, mostrandose flexível o suficiente para responder a diversas necessidades culturais (dos povos) e físicas (dos locais). Este caráter transversal vem comprovar o facto de este ser um elemento fulcral no modo como o Homem habita o espaço, desde as épocas primitivas até à atualidade. Na sua qualidade de espaço exterior que serve e organiza uma massa edificada envolvente, o Pátio poderá ser descrito, de forma simples, como um espaço que se relaciona com espaços, com movimentos, com pessoas. Um espaço onde ocorre o relacionamento com a natureza, com o ar livre. Um espaço suscetível à chuva, ao sol, ao vento e ao movimento das pessoas, público ou privado, de relações sociais (convívio), de contemplação e intimidade, ou outras tantas atividades que possam ser lá desenvolvidas. Podemos então concluir que na casa-pátio, este surge como elemento unificador e ordenador. Conferindo a ordenação estrutural e o aspeto visual da mesma. A habitação torna-se indissociável do pátio e vice-versa. O denominador comum da casa e da arquitetura da casa é o pátio, tido como um elemento central, sendo a restante estrutura habitacional e o modo como se desenrola, dependente de características sociais, culturais e religiosas. Neste contexto verificarmos que a região do Alentejo, a sua cultura, o seu modo de ser e de habitar tem referências das várias civilizações que por ali passaram e se fixaram. Desde as tribos primitivas, à cultura romana, muçulmana e, mais tarde, cristã, todas elas deixaram o seu cunho, influenciaram tanto a arquitetura nas suas aldeias, como o monte Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 129 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus no cabeço, no meio rural, assim como vários costumes e tradições desta região do Sul de Portugal. Face ao exposto podemos concluir, que apesar de ter os seus traços indissociáveis característicos do modo de ser desta região, tais como a planta regular de uma forma geométrica simples, de um só piso e de paredes grossas (muito devido aos materiais utilizados na construção), o seu aspeto sólido e compacto com utilização de poucos vãos e de dimensões reduzidas, a branquidão das fachadas devido à caiação das paredes, o pátio mantém a mesma influência sobre o seu modo de habitar, como manteve em todas as outras civilizações. Não influencia tanto a casa na urbe, uma vez que a divisão principal da casa mediterrânea das várias culturas que por ali passaram era o pátio. Na casa alentejana este espaço primordial para onde todos os outros se disponibilizam é a cozinha. Esta assume uma função de destaque, como zona de confeção de alimentos, de sala de refeições e de estar, sala de convívio, de receção das visitas, entre outras atividades que lá possam ser desenvolvidas, tal como o pátio sem ter a relação com o exterior que este apresenta. Esta cozinha tem como elemento fulcral a lareira, que é abrigada por uma chaminé, de grandes dimensões, e que faz parte do alçado da casa e que surge como elemento unificador, criador da harmonia do edifício e dos conjuntos de edifício que definem a rua. Esse pátio central, organizador da composição arquitetónica surge no monte, na casa do terreno agrícola, associada ao modo de habitar romano. Nesta os traços característicos do modo de construir mantêm-se, no entanto, a composição dos diferentes edifícios que o compõem dá-se ao redor do pátio, que serve como elemento unificador dos vários espaços envolventes, tais como a casa do agricultor, as cavalariças e abrigos para os animais, armazéns, fornos, entre outras funções necessárias à lavoura diária da agricultura. No modo de pensar a arquitetura do atelier Aires Mateus, além das influências da pesquisa unitária das grandes referências dos arquitetos portugueses de renome como Fernando Távora, Álvaro Siza, Souto Moura, nos seus conteúdos minimalistas, abstracionistas e de complexa relação com o território, existe também uma grande influência da arquitetura alentejana. Isto evidencia-se pelos tipos de formas utilizadas, sempre muito elementares, de formas geométricas simples e tradicionais, pelas fachadas completamente brancas, como se fossem caiadas e pouco ou nada Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 130 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus ornamentadas, pela espessura das paredes, que se assemelham às paredes grossas de taipa ou de tijolo maciço, os poucos vãos utilizados nas fachadas, além da relação peculiar com a envolvente, características do modo de habitar desta região. Além desta relação com o modo de construir e habitar alentejano, o atelier Aires Mateus também se encontra bastante conotado com o modo de habitar a Casa-Pátio, como se pôde verificar nas casas referencia evidenciadas nesta investigação. Todas elas tinham como denominador comum o pátio, como elemento gerador da organização espacial, para onde todos os espaços de disponibilizam, se abrem e se iluminam, onde a casa vai buscar a sua relação com o exterior, mantendo o caracter intimo necessário á vida familiar. Como em toda a evolução da casa pátio, nestes exemplos, a casa e o pátio surgem como elementos indissociáveis, um não pode viver sem o outro. Apesar desta relação intima com o modo de habitar alentejano e da Casa-Pátio, este atelier não deixa de inovar, melhorar, estes instrumentos que lhes são dados por estas influências, ou seja, são deixadas as principais linhas como se tratassem de uma memória daquele tipo de construção. Oferecendo-lhe, desse modo, o seu cunho pessoal, inovando e conferindo uma nova qualidade à arquitetura desta região alentejana. Para além deste carácter experimental e inovador, o elemento principal da casa, o que dá vida à mesma e o principal responsável pela desconstrução do volume puro, dando-lhe a verdadeira essência da vida na casa, é o Pátio, o centro da casa, que também surge reinterpretado, inovando e experimentando várias soluções referenciadas historicamente. Este modo de atuar e de pensar a arquitetura foi obviamente influência direta na conceção do projeto que apresentamos no capítulo final desta dissertação. Mas, mais do que as influências da arquitetura alentejana, a base do projeto final é a Filarmónica de Berlim, uma vez que o arquétipo ativo deste trabalho é o projeto do arquiteto expressionista alemão Hans Scharoun, para aquela sala. No entanto, a influência do modo de atuar e de pensar a arquitetura inerente ao atelier Aires Mateus denota-se a nível formal pela implementação de uma geometria simplificada, considerada como um sólido puro, elementar e abstrata. Obtida através da apropriação da planta da Filarmónica de Berlim que foi tridimensionalmente desconstruída no processo de crescimento do projeto. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 131 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus Tal como o é nas obras do atelier Aires Mateus, a composição espacial foi efetuada em primeiro lugar pelos espaços principais, neste caso o pátio e a sala de espetáculos. Todos os outros espaços desenvolvem-se nos muros grossos deixados no objeto abstrato que rodeiam o seu centro escavado, ou que rodeiam o pátio escavado do objeto primário abstrato. Neste caso, o edifício surge de modo a resolver uma difícil topografia com três zonas distintas, sendo essas o largo do Chão do Loureiro, o beco da Atafona e a calçada do Marquês de Tancos. Desenvolve-se, então, como uma montanha, que se comportaria como a topografia do sítio de Alfama. A ideia era que o edifício se comportasse como uma continuação da rua, assim como a Filarmónica de Berlim, como uma cidade em si mesmo, podendo-se vaguear livremente no mesmo, apreciando-o e estabelecendo uma relação visual com todos os seus usuários seja qual for a sua localização, sem no entanto se perder a intimidade inerente a qualquer um dos espaços. Como na própria cidade de Lisboa através das suas ruelas, largos, praças, miradouros. A metodologia da elaboração do projeto foi concebida tendo em conta a base teórica comprovada num processo de investigação, pesquisa e reflexão, desenvolvendo uma capacidade de crítica e um modo de atuar onde se tenta encontrar soluções, nessa investigação, para os problemas encontrados no desenvolvimento do projeto. Estando muito conscientes de que a arquitetura não contém verdades universais prédefinidas, não como a matemática, a arquitetura é um processo de investigação, reinterpretação, tentativa de inovação, experimentação e aplicação. Ou seja, podemos apoiar-nos numa base tradicional, como por exemplo a Casa-Pátio, que, ao ser reinterpretada, pode levar a soluções capazes de resolver problemas qualquer que seja a época em que eles surjam. Concluindo, consideramos, e tendo em conta o objeto de estudo desta dissertação, o pátio, que a utilização sistemática do mesmo num exercício de reinterpretação e inovação, pode oferecer, assim, várias soluções para problemáticas passadas, atuais e futuras. No entanto, como já referido, nada na arquitetura pode ser tido como uma solução pré-definida, mas sim como objeto de estudo e interpretação. Luís Manuel Moreira Godinho Cachola 132 Alentejo e Casa Pátio em Aires Mateus REFERÊNCIAS ADRIÃO, José ; CARVALHO, Ricardo (2007) - Persona / Aires Mateus – Manuel e Francisco Aires Mateus conversam com José Adrião e Ricardo Carvalho, 6 de Fevereiro de 2007. Jornal dos Arquitectos. Lisboa. 226 (janeiro-março 2007) 66-79. 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