OFICINAS PEDAGÓGICAS: INSTRUMENTO DE VALORIZAÇÃO DA
DIVERSIDADE NO AMBIENTE ESCOLAR
MARTINS, Francine Netto - UFSM
[email protected]
FREITAS, Deisi Sangoi - UFSM
[email protected]
FELDKERCHER, Nadiane
[email protected]
Área Temática: Diversidade e Inclusão
Agência Financiadora: Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade
Resumo
A presente pesquisa faz parte das investigações realizadas pelo grupo de Pesquisa e Estudos
em Educação - INTERNEXUS, junto ao Projeto “Diversidade Sexual e Igualdade de
Gênero”, realizado junto à 8ª Coordenadoria de Educação e Secretaria Municipal de Educação
de Santa Maria – Rio Grande do Sul. O grupo tem realizado pesquisas que almejam reflexões
e o desenvolvimento de atividades pedagógicas que envolvam o combate ao preconceito e a
violência às pessoas nas quais as identidades não se enquadram ao modelo majoritário em que
estamos inseridos. Apresentamos a oficina “O bom o belo e o verdadeiro no contexto
escolar”, realizada com 36 alunos do Ensino Médio de uma escola Estadual da Região Norte
de Santa Maria/RS, em que a mesma foi inspirada nos três momentos pedagógicos de
Delizoicov a Angotti (2006). A coleta de dados se deu através da observação e análise das
histórias produzidas pelos participantes, ou seja, caracterizando uma abordagem qualitativa de
pesquisa. O estudo delineou os desafios de lidar, na escola, com o diferente do padrão que nos
foi apresentado desde a infância, ou pela não problematização desses assuntos. Nesta
perspectiva problematizamos os temas Sexualidade, Gênero e Etnia, a partir das
dicotomizações como certo/errado, verdade/mentira, apresentadas pelos alunos. A partir da
problematização dessas questões, percebemos que assuntos que geram polêmicas não são
abordados em sala de aula. Conforme Louro (2003), os educadores se sentem pouco à vontade
quando são confrontados com as idéias de incerteza, preferem contar com referencias seguras
e inequívocas. Ao contrário dessas práticas, acreditamos que a valorização da diversidade na
escola assume um papel inquestionável para a construção de um contexto social inclusivo e
que reconhece diferenças. Através deste trabalho também notamos que as metodologias no
ambiente educativo ainda são marcadas, por concepções tradicionais de ensino, onde o
aprendiz que apenas recebe informações e conceitos.
4355
Palavras-chave: Diversidade. Escola inclusiva. Oficinas pedagógicas.
Introdução
A valorização da diversidade assume um papel inquestionável para a construção de um
contexto social que inclui todos, bem como reconhece suas diferenças. Nesta perspectiva, é
assegurado que cada cidadão, de maneira livre e criativa, desenvolva seus talentos, igualdade
de oportunidade e as mesmas possibilidades de expressar seus valores, afetos e desejos
(SECAD/MEC, 2007).
Inspirando-se nessas idéias, o grupo INTERNEXUS – Grupo de Pesquisa e Estudos
em Educação1, através do Projeto “Diversidade Sexual e Igualdade de Gênero”2, tem
realizado ações de pesquisa, ensino e extensão buscando aprofundar reflexões e desenvolver
atividades pedagógicas que envolvam o combate ao preconceito e a violência às pessoas nas
quais as identidades não se enquadram ao modelo majoritário em que a sociedade está
inserida.
O presente trabalho relata a partir de uma intervenção na escola por meio da oficina
pedagógica “O Bom, o Belo e o Verdadeiro no Contexto Escolar”, o desafio e a necessidade
de trabalharmos, com temáticas relativas à sexualidade, gênero e etnias, num formato
diferente do que nos foi apresentado desde a infância, se desejamos modificar o cenário atual
de omissão e perpetuação de injustiças sociais.
Essa oficina foi implementada em uma escola da região norte de Santa Maria com 36 alunos
do Ensino Médio.
Nesta ocasião, mapeamos as representações dos estudantes, frente às questões que
envolvem Gêneros, Sexualidades e Etnias, a partir das noções de Bom, Belo e Verdadeiro no
contexto escolar.
As oficinas pedagógicas como metodologia de trabalho
1
Grupo de Pesquisa registrado no CNPq
Projeto realizado junto à 8ª Coordenadoria de Educação (8ªCRE) e Secretaria Municipal de Educação de Santa
Maria (SMED), que recebeu apoio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD
/MEC).
2
4356
Para a elaboração de uma oficina, a escolha do tema de estudo é fator determinante.
Corrêa (2000), aponta como estratégias para a realização desta perspectiva de trabalho, as
seguintes etapas: decidir o tema de estudo, que se refere à escolha realizada por pessoas que
se propõe a construir uma oficina, reunir todo o material possível sobre o tema, buscando
subsídios em materiais como revistas, filmes, livros, mas também nas conversas cotidianas; o
entendimento do tema que será abordado, que se dará através do Estudo e Desenvolver
estratégias para poder dizer sobre o tema, podendo referir-se a qualquer meio disponível ou
possível de ser criado. (CORRÊA, 2000, p.150).
As oficinas também trazem como característica, a abertura de espaços de aprendizado
que buscam o diálogo entre os participantes.
Na oficina surge um novo tipo de comunicação entre professores e alunos. É
formada uma equipe de trabalho, onde cada um contribui com sua experiência. O
professor é dirigente, mas também aprendiz. Cabe a ele diagnosticar o que cada
participante sabe e promover o ir além do imediato. (VIEIRA et al, 2002. p.17).
Diante disso, almejamos promover um trabalho que incluí a participação de todos os
envolvidos, não distribuindo as pessoas em funções fixas como coloca Corrêa (2000, p.122)
no livro Pedagogia Libertária. O autor sinaliza que a oficina pode permitir a quebra das
“hierarquias do conhecimento o (...) que se dá muitas vezes, pela detenção de um discurso
especializado que justifica a maior importância de quem profere em relação aos outros”.
Sendo assim, pensamos que a oficina pode estabelecer uma independência das ações
educacionais em relação aos modelos que priorizam mais uma área do saber do que outra, ou
seja, oportuniza estratégias de resistência à qualificação ou desqualificação de saberes pelas
agências oficiais de ensino.
Ainda, cabe ressaltar que as ações do Grupo INTERNEXUS envolvendo oficinas,
contemplam os três momentos de Delizoicov e Angotti que consistem em:
“Primeiro momento ou problematização inicial”: são apresentadas aos alunos
situações reais, para que os mesmos sejam desafiados a expor suas posições ou concepções
prévias sobre o tema.
O ponto culminante dessa problematização é fazer que o aluno sinta a necessidade
da aquisição de outros conhecimentos que ainda não detém, ou seja, procura-se
4357
configurar a situação em discussão como um problema que precisa ser enfrentado.
(DELIZOICOV e ANGOTTI 2002, p. 200).
O objetivo desta primeira etapa é problematizar estes conhecimentos prévios acerca do
tema proposto, bem como compreender o que os educandos percebem diante das questões que
estão sendo colocadas em pauta.
O Segundo momento ou organização do conhecimento: caracteriza-se pelo
desenvolvimento de atividades que auxiliem o aluno a compreender e partilhar os
conhecimentos sistematizados pela Ciência permitindo, a ele construir uma resposta mais
aprofundada para a questão proposta inicialmente.
As mais variadas atividades são então empregadas, de modo que o professor possa
desenvolver a conceituação identificada como fundamental para uma compreensão
científica das situações problematizadas.(DELIZOICOV e ANGOTTI 2002, p. 201).
Nesse momento podem ser desenvolvidas atividades que utilizem recursos como
vídeos, sites de internet, livros, reportagens entre outros.
Finalmente, o Terceiro momento ou aplicação do conhecimento:
Destina-se, sobretudo, a abordar sistematicamente o conhecimento que vem sendo
incorporado pelo aluno, para analisar e interpretar tanto situações iniciais que
determinaram seu estudo como outras situações que, embora não estejam
diretamente ligadas ao motivo inicial, podem ser compreendidas pelo mesmo
conhecimento. (DELIZOICOV e ANGOTTI 2002, p.2002)
É nesse momento que ocorre a retomada das questões iniciais e da proposição de
novos questionamentos ou novas situações-problema que possibilitem ao aluno a utilização
dos novos conhecimentos desenvolvidos.
Dentro deste contexto, os instrumentos para a coleta de dados partiram da análise das
histórias dos alunos, (realizadas no terceiro momento da oficina) e pelos relatos das
problematizações, que foram inspiradas nos Três momentos, descritos anteriormente.
Para o primeiro momento da oficina selecionamos textos veiculados em jornais e
revistas (figura1), especificamente aqueles que continham situações polêmicas e que
envolvessem noções de Sexualidade, Gênero e Etnia. O motivo pelo qual estes materiais
foram escolhidos foi a tentativa de problematizar em sala de aula, às representações dos
4358
alunos frente às situações que envolvem “o diferente” de um padrão moral majoritário, bem
como refletir sobre dicotomizações como bom-ruim, mau-bom, feio-belo, certo-errado.
Figura 1- Reportagens utilizadas no primeiro momento da oficina
Solicitamos, então, que os alunos, distribuídos em duplas3, lessem as reportagens, e
após cada leitura colocassem para o grupo suas percepções frente ao que foi lido.
Para o segundo momento, selecionamos o conto “Patinho Feio” de Clarissa Pinkola
(1994) em seu livro “Mulheres que correm com os Lobos”. O texto, apresenta o personagem
principal (patinho feio), como inaceitável e rejeitado no ambiente em que vive, por apresentar
uma aparência diferente do desejável.
Além disso, Pinkola, aponta em sua obra que o referido conto, propõe inúmeras
relações com o nosso cotidiano e faz referências à questão de gênero, afirmando que:
Em muitas culturas existe uma expectativa, quando nasce uma filha, de que ela é e
será um certo tipo de pessoa, que haja de um certo modo consagrado pelo tempo,
que siga um certo conjunto de valores, pelo menos os valores da família e que seja
como for não abale os alicerces (1994, p. 219).
Nestas perspectivas, escolhemos este conto, pelas possibilidades de reflexões que
poderiam ser suscitadas a partir dele. Para tanto, nesta etapa do trabalho, pedimos aos alunos
que, em duplas, encontrassem fragmentos no texto que fossem ao encontro do que foi
discutido no primeiro momento com as reportagens de jornal.
3
Os trabalhos das oficinas são realizados em dupla ou grupos pequenos para que haja uma boa troca de
conhecimentos entre os participantes, aqui no caso alunos ; conhecimentos que posteriormente serão
socializados com o grande grupo.
4359
No terceiro momento solicitamos aos alunos que observassem um painel com imagens
de pessoas que contrastam por inúmeras diferenças (como cor de pele, cultura, profissões,
idades), que os alunos colocassem por escrito se eles se identificavam com alguma daquelas
imagens (figura 2) e se estas lhes faziam lembrar de algum momento ou situação vivida,
associada ao primeiro e ao segundo momento da oficina.
Figura 2 - Painel utilizado no 3º momento da oficina
O desafio de problematizar a diversidade no ambiente escolar
As formas de vida propagadas pela globalização e especialmente pelas mídias
reforçam inúmeras peculiaridades de opiniões e culturas, que fazem parte do dia a dia das
sociedades. Segundo Rolinik (1996), tudo leva a crer que a criação individual e coletiva se
encontraria em alta, pois, “(...) muitas são as cartografias de forças que pedem novas maneiras
de viver, numerosos os recursos para criá-las e incontáveis os mundos possíveis” (1996, p.1).
Porém
(...) a mesma globalização que intensifica as misturas e pulveriza as identidades,
implica também na produção de kits de perfis-padrão de acordo com cada órbita do
mercado, para serem consumidos pelas subjetividades, independentemente de
contexto geográfico, nacional, cultural, etc. Identidades locais fixas desaparecem
para dar lugar a identidades globalizadas flexíveis que mudam ao sabor dos
movimentos do mercado e com igual velocidade. Esta nova situação, no entanto,
não implica forçosamente o abandono da referência identitária. (Rolnik, 1996.p.1)
4360
Dentro deste contexto, acreditamos que essa produção de Kits de perfis-padrão pode
ser associada ao espaço escolar, que ao colocar em seus Projetos Políticos Pedagógicos e
currículos, propostas de trabalho que devem contemplar modos de vida diferenciados, se
contradiz ao selecionar de forma fechada, quais os saberes são necessários para a formação de
seus alunos.
Acreditamos que as escolas têm um importante papel no desenvolvimento de
estratégias que permitam os educandos a refletir, reinventar-se e propor o pensar criativo, sem
imposições. Larrosa, afirma que “um dispositivo pedagógico será, então qualquer lugar no
qual se constitui ou se transforma a experiência de si4. Sendo assim, a educação, além de um
simples ambiente de possibilidades para o desenvolvimento da autoconfiança, pode produzir
“formas de experiência de si nas quais os indivíduos podem se tornar sujeitos de um modo
particular” (LARROSA, 1994, p.57).
Nas oficinas, os alunos associaram a palavra preconceito a tudo aquilo que é
considerado diferente ou fora de um padrão majoritário. Os preconceitos são realidades
historicamente construídas,
(...) são reinventados e reinstalados no imaginário social continuamente. Os
preconceitos atuam como filtros de nossa percepção, fortemente impregnados de
emoções, colorindo nosso olhar, modulando o ouvir, modelando o tocar, fazendo
com que tenhamos uma visão simplificada e enviesada da realidade (Candau, 2002.
p.17)
Dessa maneira, percebe-se o preconceito como a rejeição de tudo aquilo que
acreditamos ser bom, belo e verdadeiro na cultura que estamos inseridos. O mesmo norteia
pontos de vista e atitudes diante de determinadas situações, as quais não identificamos como
absolutas.
Ainda, para considerarem essas diferenças, em muitos discursos foram colocadas as
palavras “bom”, “estranho”, “certo”, como se estivessem tratando com parâmetros e regras
que não poderiam ser quebrados. Dentro deste contexto, os estudos culturais afirmam que
4
“estudar a constituição do sujeito como objeto para si mesmo: a formação de procedimentos pelos quais o
sujeito é induzido a observar-se a si mesmo, analisar-se, decifrar-se, reconhecer-se como um domínio do saber
possível”. (FOUCAULT apud LARROSA 1994. p. 55 )
4361
(...) todo o conhecimento, ao constituir um sistema de significação, é cultural e
vinculado às relações de poder. É dessa perspectiva que os Estudos Culturais
analisam instancias, instituições e processos culturais diversos como a TV, o
cinema, a publicidade, entre outros, abordando-os como produções culturais que
participariam na construção de modos determinados de ser/estar no mundo.
(BICCA, 2007 apud SILVA, 1999 p.332).
As relações de poder estão nitidamente presentes através dos conceitos considerados
como “normais”. Isto pode ser percebido através dos seguintes relatos durante a oficina:
“Eu tinha duas vizinhas que ninguém poderia dizer que elas eram homossexuais
porque elas nunca brigavam, estavam sempre bem, viviam na delas, eram super normais e
uma delas tinha uma filha. Eu confesso para vocês que eu fui preconceituosa, mas depois eu
fiquei pensando: o que eu tenho que ver? Cada um vive a vida que quer. Elas não estavam
fazendo mal a ninguém”.
“(...) as gordinhas não tem vez”, “nunca vi uma protagonista de novela ser gorda nem
preta”.
“(...) bicha também é gente”.
“(...) isso é uma doença”.
“(...) é um desvio que eles têm desde pequeno”.
“(...) as bichas não respeitam a gente”, “tem gay que não respeita”.
“(...) esses dias eu vi dois gays que estavam em plena praça, era quase de noite e
começaram a se beijar”.
“(...) eu respeito desde que fique longe de mim”.
“(...) minha irmã queria tanto uma filha mulher que o meu sobrinho é aviadado”.
“(...) isso depende da criação”.
“(...) é uma opção que eles têm”.
Partindo dessas falas, entendemos que as mesmas partilham do que afirma Foucault,
em seu livro Os anormais onde o “Monstro humano”, “o indivíduo a ser corrigível”, é o ponto
de inflexão da lei, combina com o impossível e com o proibido.
O contexto de referência do monstro humano é a lei, é claro. A noção de monstro é
essencialmente uma noção jurídica – jurídica, claro, no sentido lato do termo pois o
que define o monstro é o fato de que ele constitui, em sua existência mesma e em
sua forma, não apenas uma violação das leis da natureza. Ele é um registro duplo,
infração às leis em sua existência mesma. O campo de aparecimento do monstro é,
portanto, um domínio que podemos dizer “jurídico biológico” Por outro lado, nesse
espaço, o monstro aparece como um fenômeno e ao mesmo tempo extremo e
extremamente raro (2002, p.71)
4362
Notou-se ainda, que a questão associada ao “monstro humano”, da “violação as leis da
natureza” é especialmente voltadas à questão da homossexualidade, que na maioria das falas
dos alunos é colocada como uma doença, uma falta de respeito à moralidade. Além disso,
pensamos que estas representações e significados, se dão pelo fato de estarmos inseridos em
uma sociedade historicamente marcada por exclusões e delimitações.
(...) existe uma extraordinária continuidade entre as diferentes formas através das
quais os conhecimentos dos países centrais legitimaram a missão civilizadora ou
normatizadora a partir das deficiências – desvios em relação ao padrão normal
civilizado – de outras sociedades. Os diferentes recursos históricos (evangelização,
civilização, o fardo do homem branco, modernização, desenvolvimento,
globalização) têm todos como sustentáculo a concepção de que há um padrão
civilizatório que é, simultaneamente, superior e normal. (WIELEWICKI e
OLIVEIRA apud LANDER, 2005).
No contexto desse “padrão civilizatório”, nas oficinas, a mulher quando não está
incluída em um papel recatado de esposa e dona do lar, também é considerada indivíduo
anormal.
A posição social inferior da mulher na sociedade mantém fortes nexos com a
divisão sexual do trabalho. Essa divisão resulta de uma correlação de formas
antagônicas entre homens e mulheres e dos valores diferentemente atribuídos ao
trabalho feminino e masculino. (SECAD, 2007. P. 17)
Estas questões são sinalizadas pelas seguintes falas:
“(...) um absurdo um amigo casar com uma mulher que não sabe nem fritar um ovo”.
”(...) é que nem aquele ditado: mulher esquenta a barriga no fogão e esfria no tanque”.
“(...) as pessoas não casam mais no religioso como antigamente, hoje há divisão de
tarefas, porém ainda existem mulheres que ganham menos que os homens para exercer a
mesma função”.
Para Meyer
De vários modos, os estudos contemporâneos sobre o espaço escolar, as práticas
pedagógicas que nele se desenvolvem, bem como os estudos que se tem envolvido
com as pedagogias culturais têm mostrado como estamos, em nossa sociedade
4363
sempre operando a partir de uma identidade que é norma, que é aceita e legitimada
e que se torna por isso mesmo, quase invisível (...) (MEYER, 2003. p. 24)
Em relação à questão da diversidade Étnica, foi percebido através dos discursos dos
alunos como algo “fora do padrão majoritário”, pois fazemos parte de uma sociedade regida
esteticamente por um paradigma branco, onde a clareza da pele persiste como uma marca
simbólica de uma superioridade imaginária (CANDAU, 2003.p.22). Concordamos com a
mesma autora, que afirma ser muito presente em nossas vidas, a questão histórica, onde a
escravidão marcou território e marca ainda hoje as relações sociais.
Diante do que foi exposto, pensamos que o ambiente escolar, ao negar ou imunizar-se,
por exemplo, dos temas que foram problematizados nas oficinas, confirma e contribui para a
efetivação de uma educação carregada de verdades absolutas, discriminações e relações de
poder. Segundo Tomaz Tadeu da Silva
O poder está inscrito no currículo através das divisões entre saberes e narrativas
inerentes ao processo de seleção do conhecimento e das resultantes divisões entre
os diferentes grupos sociais. Aquilo que divide e, portanto, aquilo que inclui/exclui,
isso é o poder. Aquilo que divide o currículo-que diz o que é conhecimento, e o que
não é - e aquilo que essa divisão divide -que estabelece desigualdades entre os
indivíduos e grupos sociais - isso é precisamente o poder (SILVA, 1995.p.197).
Neste sentido, coloca-se a oficina como além de um espaço autônomo de investigação
para o pesquisador, uma maneira de levar para sala de aula, assuntos que comumente não são
explorados dentro da escola. Isso se fez evidente quando pedimos aos alunos que escrevessem
sugestões a respeito do trabalho realizado. Dessa maneira, algumas questões apontadas por
eles foram:
“(...) gostei muito da oficina, afinal de contas não é toda a hora que temos a
oportunidade de discutir certos assuntos”.
“(...) as oficinas são diferentes das aulas normais”.
“(...) esta oficina serviu muito como aprendizado, e deu abertura para todos se
expressarem, um modo diferente de dar aula”.
Diante dessas colocações, entendemos que as práticas educativas ainda são marcadas,
por métodos tradicionais de ensino, configurando uma educação que determina o aprendiz
como um indivíduo que recebe informações e conceitos. O Ensino Tradicional é marcado pela
4364
memorização mecânica dos conteúdos narrados, ou seja, a narração transforma os alunos em
“vasilhas”, em recipientes a serem enchidos pelo educador. Quanto mais se deixem
docilmente “encher”, tanto melhores educandos serão. (FREIRE, 1987, p. 58).
Ao contrário destas perspectivas, as características da oficina atuaram como um
importante instrumento para que os alunos “tivessem voz” dentro daquele contexto. A mesma
colaborou para que tivéssemos um espaço onde todos puderam participar, percebendo esta
característica fundamental para o rompimento de estratégias de ensino que contemplam o
professor como detentor do saber.
Vale ressaltar que a problemática das relações entre diversidade no cotidiano escolar
constitui um tema de especial relevância para construção de uma escola democrática. Dessa
maneira, consideramos a mesma como um espaço privilegiado para trabalhar a diversidade da
cultura humana e os valores éticos de respeito ao outro.
Ainda, por intermédio deste estudo, percebemos a importância do professor avaliar sua
prática, ser crítico em relação a ela, e a todo o momento abordar se o que se propõe em sala de
aula, terá algum significado na vida do educando. Apesar das escolas terem um currículo a
seguir, é indispensável que o educador destine espaços para conversar e problematizar sobre
assuntos que freqüentemente ficam de lado, pela preocupação em “vencer” os conteúdos do
ano letivo.
Acreditamos também, que não é apenas a escola, o único local no qual as pessoas
podem problematizar os pontos centrais deste trabalho, mas que isto possa ocorrer também
em outros espaços, bem como em cursos de formação de professores para que haja a
possibilidade da “experiência de si”.
Com este trabalho, esperamos contribuir para provocar inquietações dentro do espaço
escolar, assim como reflexões acerca de assuntos que fazem parte de nosso cotidiano e sobre
os quais pouco refletimos. Acreditamos ainda, que este estudo serve como base para novas
perspectivas de trabalho, bem como um estudo mais aprofundado das questões que foram
problematizadas.
REFERÊNCIAS
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Diversidade Sexual na Escola: reconhecer diferenças e superar preconceitos”. Brasília:
Ministério da Educação, 2007.
4365
CANDAU, Vera Maria. “Somos Todos Iguais?” CANDAU, Vera Maria et al (coord). Rio de
Janeiro: DP&A, 2003.
CORRÊA, Guilherme et al. Pedagogia Libertária: Experiências Hoje. Editora Imaginário,
2000.
DELIZOICOV, D; ANGOTTI, José André, PERNAMBUCO, Marta Maria. “Ensino de
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correm como os lobos. 2ª ed. Editora Rocco, 1994.
FOUCALT, Michael. “Os anormais”. Tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins
Fontes, 2001.
FREIRE, Paulo. “A importância do ato de ler: em três artigos que se completam”. 41ª
ed. São Paulo: Cortez, 2001.
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LARROSA, Jorge. “Tecnologias do Eu na Educação”. IN: SILVA, Tomaz (org). Estudos
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LOURO, Guacira Lopes. Currículo, gênero e sexualidade. IN: LOURO, Guacira Lopes et
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MEYER, Dagmar Estermann. Gênero e educação: teoria e política. IN: LOURO, Guacira
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ROLNIK, Suely. Toxicômanos de identidade subjetividade em tempo de globalização
Reelaboração de artigo publicado no caderno “Mais!” da Folha de São Paulo. São Paulo,
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SILVA, Tomaz Tadeu da. Currículo e Identidade Social: Territórios Contestados
Currículo e Identidade Social: Territórios Contestados. In: Alienígenas na Sala de Aula: Uma
Introdução aos Estudos Culturais em Educação. Petrópolis: Vozes, 1995.
VIEIRA, Elaine, VALQUIND, Lea. “Oficinas de Ensino: O quê? Por quê? Como?”. 4º ed.
Porto Alegre. EDIPUCRS, 2002.
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