BIRADS and breast ultrasonography – a critical analysis
Abstract Resumo
A ultra-sonografia vem se consolidando como um importante método diagnóstico das
doenças mamárias. Além de poder diagnosticar algumas lesões suspeitas iniciais não vistas
à mamografia, ajuda na diferenciação de nódulos císticos e sólidos e na diferenciação de
nódulos sólidos benignos e malignos. Com o intuito de padronização e de aprimoramento
dos laudos, em novembro de 2003, foi publicado pelo Colégio Americano de Radiologia o
sistema BIRADS para a ultra-sonografia mamária. Esse sistema consiste de um léxico próprio
e de uma divisão por categorias de avaliação, de acordo com o risco de malignidade. A
partir de então, vários ultra-sonografistas em nosso País têm paulatinamente aderido a esse
sistema. Este trabalho de revisão de literatura traz de forma bastante prática, uma proposta
de tradução para o português do sistema BIRADS para ultra-sonografia. Aproveitamos a
oportunidade para discutir vários pontos polêmicos a respeito dessa classificação.
at u a l i z a ç ã o
BIRADS e ultra-sonografia mamária –
uma análise crítica
Régis Resende Paulinelli1
Maria Júlia Gregório Calas2
Ruffo de Freitas Júnior1
Palavras-chave
Câncer de mama
BIRADS
Ultra-sonografia
Keywords
Breast cancer
BIRADS
Ultrasound
The ultrasonography is consolidating itself as an important diagnostic method in breast
diseases. Beyond diagnosing some early suspicious lesions not seen in the mammograms, it
may help in the differentiation between cystic and solid nodules, and in the differentiation
of malign and benign nodules. With the intention of standardization and of improvement
of the reports, in November of 2003, the American College of Radiology published the
BIRADS system for mammary ultrasounds. This system consists of a proper lexicon and
a division for categories of evaluation, in accordance with the malignancy risk. From this
time, some ultrasonographists in our country have gradually adhered to this system, not
always properly. This paper brings in a rather practical way, a proposal for translating into
Portuguese the BIRADS system for ultrasound. We use this occasion also to argue some
controversial points in respect of this classification.
1
2
Programa de Mastologia do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal de Goiás
Setor de Imaginologia Mamária da Clínica Diagnóstico por Imagem (CDPI), Mulher, Rio de Janeiro
FEMINA | Setembro 2007 | vol 35 | nº 9
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BIRADS e ultra-sonografia mamária – uma análise crítica
Introdução
Com o intuito de padronização e de aprimoramento
dos laudos em imaginologia mamária, em novembro de
2003, o Colégio Americano de Radiologia (ACR) publicou a
quarta edição do Breast Imaging and Reporting Data System
(BIRADS) para mamografia, ultra-sonografia e ressonância
magnética. Esse sistema consiste de um léxico próprio e de
uma divisão por categorias de avaliação, de acordo com o
risco de malignidade.
A tentativa de padronização de laudos de ultra-sonografia não é nova. Já foram desenvolvidos vários sistemas
de classificação sonográfica das lesões mamárias, inclusive
com propostas brasileiras (Calas et al., 2002; Pasqualette
et al., 2003). A classificação BIRADS para ultra-sonografia aproveitou-se do prestígio da classificação homônima
para a mamografia, do Colégio Americano de Radiologia.
Em nossa vivência clínica diária, temos percebido que
desde então, paulatinamente os laudos dos exames vêm
procurando seguir essa classificação, porém nem sempre
apropriadamente (ACR, 2003). Ainda é comum receber
laudos de ultra-sonografia mamária que dizem apenas se a
lesão é sólida ou cística e, às vezes, nem isto. Essa classificação estimula os ultra-sonografistas a apresentarem uma
descrição mais detalhada das lesões mamárias. Além disso,
o ultra-sonografista deve dar sua impressão diagnóstica
sobre o risco de malignidade na lesão observada, ou seja,
deve opinar se a imagem é ou não suspeita e qual deve
ser a abordagem para a paciente em questão.
Para a utilização adequada da classificação de
BIRADS para ultra-sonografia, há a necessidade de um
conhecimento profundo da interpretação mamográfica,
assim como da patologia mamária. Recomenda-se que
antes de realizar a ultra-sonografia, o examinador deve
rever os filmes mamográficos. Isso pode representar uma
barreira aos ultra-sonografistas brasileiros. Nem todos os
ultra-sonografistas têm formação em mamografia. Temos
ultra-sonografistas com diversas formações: clínicos gerais,
ginecologistas, radiologistas, mastologistas. Ou seja, caso
o ultra-sonografista não esteja habilitado a interpretar a
mamografia, a categoria de avaliação deveria ser 0 (avaliação
incompleta), até que algum profissional possa juntar as
informações provenientes dos dois exames, para definir
a categoria final de avaliação: de 1 a 6 (por classificação
crescente de risco de malignidade).
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FEMINA | Setembro 2007 | vol 35 | nº 9
Proposta de tradução do léxico
e das categorias de avaliação
do BIRADS ultra-sonográfico
O laudo ultra-sonográfico proposto pelo sistema BIRADS
deve conter os seguintes itens:
a) massas: ocupa um espaço e deve ser vista em duas diferentes
projeções. No caso da ultra-sonografia devem ser utilizados os
dois cortes (eixo longitudinal e transversal). Deve-se descrever: a forma (oval, redonda, irregular); a orientação (paralela
- ou horizontal - quando o eixo látero-lateral é maior que o
ântero-posterior, ou não paralela - ou vertical, caso contrário);
a margem (circunscrita ou não circunscrita - a margem não
circunscrita pode ser mais detalhadamente especificada como
sendo: indistinta, angular, microlobulada, ou espiculada); os
limites (interface abrupta, quando bem definidos, ou a presença
de halo ecogênico anterior, quando não há definição); o padrão
dos ecos (anecóico, hiperecóico, hipoecóico, isoecóico e complexo – quando contém componentes ecogênicos e anecóicos
associados), para a definição do padrão dos ecos, as massas
devem ser comparadas com o tecido adiposo (isoecóico); as
características acústicas posteriores (sem alteração acústica
posterior, reforço, sombra e padrão combinado); os tecidos
vizinhos (alteração dos ductos, alterações nos ligamentos
de Cooper, edema, distorção arquitetural, espessamento,
irregularidade ou retração de pele);
b)calcificações: descrever como: macrocalcificações e microcalcificações (não associadas à massa ou associadas à
massa). As macrocalcificações devem ser maiores ou iguais
a 0,5mm em tamanho, e as microcalcificações menores que
0,5 mm;
c) casos especiais: microcistos agrupados (pequenas áreas anecóicas, medindo até 2 ou 3 mm, com septos finos, menores
que 0,5 mm), cistos complicados (nódulos com ecos de baixa
intensidade no interior, que podem mudar com alteração na
posição do paciente), massa na pele (cistos de inclusão epidérmica, cistos sebáceos, quelóides, pólipos, neurofibromas),
corpo estranho (qualquer objeto de metal, silicone, plástico ou
vidro), linfonodos intramamários e axilares (imagens riniformes
com hilo ecogênico e córtex hipoecóico);
d) vascularização: não presente ou não avaliada, presente na
lesão, presente imediatamente adjacente à lesão, difusamente
aumentada no tecido vizinho.
Categorias de avaliação
• Categoria 0: incompleta. Necessária avaliação complementar por
outro exame de imagem antes da avaliação final. Por exemplo,
nódulo suspeito à ultra-sonografia em paciente jovem que
necessita de mamografia, diferenciação entre cicatriz cirúrgica
e recorrência da doença em pacientes com cirurgia prévia de
câncer de mama, onde a ressonância magnética poderia definir
melhor a conduta. Após os novos exames a lesão deve ser
classificada em uma dentre as 6 categorias seguintes.
BIRADS e ultra-sonografia mamária – uma análise crítica
encontrada.
• Categoria 2: achado benigno. Seguimento de rotina ou a
critério clínico. Nenhuma característica maligna. Por exemplo,
cistos simples, linfonodos intra-mamários, próteses, cicatriz
pós-cirúrgica estável e prováveis fibroadenomas sem modificações em estudos ecográficos sucessivos. No entanto, não
há definição de quantos estudos e a periodicidade destes
(Figura 1).
• Categoria 3: provavelmente benigno. Seguimento em curto
prazo é sugerido (controle em 6, 12 e 24 meses). Após 24
ou 36 meses, não havendo modificação da imagem, pode-se
classificar a lesão como categoria 2. Por exemplo, massa sólida
ovalada, não palpável, com margens circunscritas, orientação
horizontal, sugestiva de fibroadenoma, com menos de 2%
de malignidade (dado obtido através da experiência clínica e
mamográfica); cistos complicados e microcistos agrupados
impalpáveis (Figuras 2 e 3).
• Categoria 4: anormalidade suspeita. A biópsia deve ser considerada. Probabilidade intermediária de câncer, de 3 a 94%.
Massa sólida sem apresentar critérios de fibroadenoma ou de
outra lesão provavelmente benigna. Uma opção descrita é
Figura 1 - Imagem nodular, ovalada, hipoecóica, de orientação horizontal,
com discreto reforço acústico posterior, com região central hiperecogênica,
sugestiva de um linfonodo intra-mamário. BIRADS® categoria 2. Achado
benigno. Sugere-se seguimento habitual para a idade.
Figura 3 - Imagem nodular hipoecóica, de forma ovalada, com margens
circunscritas, (ecotextura homogênea), de orientação horizontal, sem alteração
dos ecos posteriores, medindo 11,7 x 6,2 mm, localizada às 9 h, 4 cm
do mamilo, 1 cm da pele, mama direita, não palpável. Conclusão: nódulo
sólido de aspecto provavelmente benigno na união dos quadrantes laterais
da mama direita. BIRADS® categoria 3. Achado provavelmente benigno.
Sugere-se seguimento ultra-sonográfico em 6 meses.
Figura 2 - Imagens anecóicas, de forma ovalada, de margens circunscritas, com
reforço acústico posterior, correspondendo a 2 pequenos cistos agrupados no
quadrante superior lateral da mama direita. Esta paciente apresentava também
múltiplos cistos simples bilaterais. BIRADS® categoria 3. Achado provavelmente
benigno. Sugere-se controle ultra-sonográfico em 6 meses.
Obs.: Os autores deste trabalho acreditam que os cistos agrupados
apresentam significado semelhante aos cistos simples e que deveriam ser
classificados como categoria 2.
Figura 4 - Imagem nodular hipoecóica, palpável, de forma ovalada,
de margens circunscritas, (ecotextura homogênea), sem alteração
dos ecos posteriores, com orientação horizontal, medindo 21,6 x
11,3 mm, localizada às 2 h, 3 cm do mamilo, 1,5 cm da pele,
em mama direita. Conclusão: BIRADS® categoria 4. (lesão palpável).
Sugere-se correlação citológica ou histológica. Histopatologia:
Fibroadenoma.
• Categoria 1: negativa. Seguimento de rotina. Nenhuma lesão
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BIRADS e ultra-sonografia mamária – uma análise crítica
estratificar estas lesões em baixo, intermediário ou moderado
grau de suspeição (Figuras 4, 5 e 6).
• Categoria 5: altamente sugestivo de malignidade. A ação apropriada deve ser tomada. Probabilidade de malignidade > 95%
(Figura 7).
• Categoria 6: malignidade conhecida. A ação apropriada deve
ser tomada. Biópsia anterior à terapia definitiva confirmando
a presença de câncer. Por exemplo, pacientes submetidas a
quimioterapia neoadjuvante, que fazem ultra-sonografia para
avaliar a regressão tumoral.
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Figura 7 - Imagem nodular, de forma irregular, com margens microlobuladas,
(ecotextura heterogênea), com sombra acústica posterior, orientação
paralela à pele (horizontal), com halo ecogênico anterior, com espessamento
dos ligamentos de Cooper (setas), medindo no maior diâmetro 82 mm,
ocupando os quadrantes laterais da mama esquerda. BIRADS® categoria
5. Achado altamente sugestivo de malignidade. Sugere-se correlação
citológica ou histológica e conduta apropriada. Histopatológico: carcinoma
lobular infiltrante.
Figura 5 - Imagem nodular ovalada, de margens circunscritas, (ecotextura
discretamente heterogênea), com orientação vertical (não-paralela à pele),
sem alteração dos ecos posteriores, medindo 9,0 x 12,2 mm, localizada
às 4 h, 5 cm do mamilo, 1,3 cm da pele, em mama esquerda. Conclusão:
Nódulo sólido suspeito em quadrante superior lateral da mama esquerda.
BIRADS® categoria 4. Histopatologia: fibroadenoma.
Discussão
Figura 6 - Imagem nodular hipoecóica, de forma irregular, de margens não
circunscritas, (ecotextura heterogênea), orientação não paralela à pele
(vertical), sem alteração dos ecos posteriores, medindo 8,3 x 10,6mm,
localizada às 12 h, 3,5 cm do mamilo, 2 cm da pele, em mama esquerda.
Conclusão: Nódulo sólido suspeito na união dos quadrantes superiores da
mama esquerda. BIRADS® categoria 4. Sugere-se correlação citológica ou
histológica. Histopatologia: carcinoma ductal infiltrante.
Na maioria das vezes, é possível avaliar pela ultrasonografia a probabilidade de uma lesão ser um cisto simples
ou uma lesão sólida. Durante muito tempo, várias equipes
limitaram a utilização da ultra-sonografia a essa distinção,
indicando biópsias em todos os casos de nódulos sólidos.
Essa estratégia permite obter uma excelente sensibilidade,
à custa de uma especificidade muito baixa, gerando várias
biópsias cirúrgicas desnecessárias, com prejuízos econômicos, psicológicos e estéticos para as pacientes. Ainda hoje,
é comum encontrar laudos como esses. Para o médico que
recebe o exame, isso representa muito pouco e não é mais
aceitável. A ultra-sonografia pode trazer informações importantes na diferenciação de nódulos malignos e benignos, com
implicações práticas no manejo das lesões mamárias.
Uma das principais vantagens da utilização de um sistema
de classificação como o BIRADS é a possibilidade de uma
padronização dos laudos de ultra-sonografia (Camargo-Júnior,
2005). Os termos utilizados pelos ultra-sonografistas em
nosso meio têm sido os mais variados possíveis.
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BIRADS e ultra-sonografia mamária – uma análise crítica
Diagnosticar tumores malignos mamários com a ultra-sonografia tem sido uma preocupação antiga. Desde 1950, vários
autores apontaram características que pudessem estabelecer
o diagnóstico diferencial entre tumores benignos e malignos
(Kobayashi et al., 1974; Marussi, 2001). As primeiras características apontadas foram as paredes com margens não circunscritas,
os ecos internos heterogêneos, e a sombra posterior (Kobayashi
et al., 1974). Posteriormente surgiram outras características como:
um elevado contraste entre o nódulo e o parênquima mamário,
a presença de halo ecogênico anterior, o aumento do diâmetro
ântero-posteiror (Fornage et al., 1989; Guyer et al., 1992; Skaane
& Engedal, 1998; Stavros et al., 1995). Outras características
suspeitas ainda foram sugeridas: o espessamento dos ligamentos
de Cooper, o espessamento da pele e mudanças na textura do
parênquima adjacente (McSweeney & Murphy, 1985).
No entanto, a definição de quais são as características
mais importantes para a suspeição do câncer à ultra-sonografia ainda é motivo de pesquisas.
No Programa de Mastologia do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal de Goiás, avaliamos
prospectivamente 304 lesões mamárias sólidas, das quais 25%
eram malignas e comparamos os resultados ao exame histopatológico (Paulinelli et al., 2005). Na análise multivariada, as
características que estavam significativamente relacionadas ao
diagnóstico de malignidade foram, em ordem decrescente de
risco: margens não circunscritas, espessamento nos ligamentos
de Cooper (característica essa observada apenas em grandes
tumores), ecotextura heterogênea e orientação vertical. A
presença de halo ecogênico anterior e de sombra posterior
esteve relacionada aos tumores malignos, mas não foram
independentemente significantes, aumentando o número de
falso-positivos, sem diminuir o número de falso-negativos.
A classificação de BIRADS é um passo importante na
padronização da nomenclatura ultra-sonográfica, embora
não inclua todas as características apontadas anteriormente.
Além disso, a classificação de BIRADS não estabelece qual
a importância de cada característica em especial.
Controvérsias e dificuldades no uso do léxico
Alguns detalhes do léxico utilizado na classificação BIRADS
podem confundir o ultra-sonografista. Alguns termos são próprios
da ultra-sonografia como orientação e ecogenicidade. Porém, sempre que possível e apropriado, foram utilizados termos já usuais
no léxico da mamografia. Por exemplo, na descrição de forma e
margens, os termos são idênticos para a mamografia. A forma diz
respeito ao aspecto arredondado, ovalado ou irregular da lesão.
Apesar de não estar no texto original, o termo forma lobulada
poderia também ser incluído aqui, pois é utilizado na mamografia.
Segundo Stavros, até 3 lobulações poderiam ser consideradas
como uma forma “regular” (Stavros et al., 1995). Na tentativa
de não confudir os usuários dessa classificação, evitou-se usar o
termo irregular duas vezes. Assim, o termo irregular é utilizado
para descrever a forma e nunca as margens. A margem pode ser
circunscrita e não circunscrita, esta pode ainda ser subdividida
em indistinta, angular, microlobulada, ou espiculada.
No léxico do BIRADS existe o termo ecos internos complexos,
mas está relacionado a lesões sólido-císticas suspeitas. O termo
ecotextura heterogênea não existe, mas em nossa experiência, e
na de alguns outros autores, este foi uma dos elementos mais
importantes para a suspeição do câncer de mama (Marussi,
2001; Michelin & Levy, 2001; Paulinelli et al., 2005; Rahbar et al.,
1999). Portanto sugerimos que o mesmo seja acrescentado nos
laudos. Chamamos atenção também para a dificuldade técnica
da avaliação das microcalcificações na ultra-sonografia, visto que
as características morfológicas destas imagens são facilmente e
melhor analisadas no estudo radiológico.
Outros termos que podem gerar confusão são: “complicated
cyst” e “complex cyst”. O cisto complicado é descrito como uma
lesão oval, redonda ou lobulada, com margens circunscritas, com
reforço acústico posterior e que apresente ecos internos homogêneos.
Nesses casos, fica difícil saber a natureza do conteúdo da lesão,
pois alguns tipos de nódulos sólidos e de cistos com conteúdo
espesso são indistinguíveis à ultra-sonografia. Esses nódulos são
classificados como provavelmente benignos (BIRADS categoria
3). Entretanto, fica um questionamento, se não é possível dizer
ao certo se o nódulo é sólido ou cístico, porque chamá-lo de
“cisto complicado”? O próprio termo em si: “complicado”, tem
uma conotação negativa forte no português, de algo “enredado”,
“difícil” (Ferreira, 2002). Isso pode gerar apreensão desnecessária em uma paciente que apresenta uma lesão provavelmente
benigna. Especificamente para esses casos, preferimos descrever
nos laudos a lesão e dizer que o conteúdo do cisto é espesso e,
em outros casos, que não é possível fazer a diferenciação entre
a natureza sólida ou cística, permitindo ao clínico e à paciente
um melhor entendimento sobre o problema.
Embora os microcistos agrupados sejam classificados
como categoria 3, não há evidência adequada de que esse
tipo de lesão apresente 2 ou 3% de malignidade, como o
previsto nesta categoria. Estudos posteriores, prospectivos e
adequadamente analisados deverão ser feitos a esse respeito,
mas acreditamos que os microcistos agrupados provavelmente deverão apresentar risco semelhante aos cistos simples,
devendo pertencer, portanto, à categoria 2.
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BIRADS e ultra-sonografia mamária – uma análise crítica
Os “cistos complexos” correspondem a lesões anecóicas, com
massa sólida intra-cística, septações grosseiras, espessamento ou
irregularidade do contorno, sendo classificados como suspeitos
(BIRADS categoria 4). Em uma pesquisa com 471 mulheres
com cistos mamários, Kemp et al., 2001, encontraram 20 cistos
complexos e dentre estes em dois casos de carcinoma intra-císticos. O valor preditivo positivo para malignidade foi de 0,4% do
total de cistos e 15% do total de cistos complexos (Kemp et al.,
2001). Entretanto, em outra série com 308 pacientes com cistos
classificados como complexos, encontrou-se 1 caso de carcinoma
in situ (0,3%) (Venta et al., 1999). Assim, nem todos concordam
que deva ser realizada uma intervenção nesse tipo de cisto.
Pode-se observar ainda que, no sistema BIRADS, não existe
um exemplo exato do que seja a categoria 4 e 5. Na categoria
4 são incluídos diversos tipos de lesões que variam de 3 a 94%
segundo o risco de malignidade (ACR, 2003), uma faixa muito
ampla, fato que demanda uma melhor definição desta categoria.
Possivelmente esta definição poderá ser dada pela condução
de estudos, como o que estamos desenvolvendo no momento
no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás, que
proponham um sistema de classificação de acordo com cada
tipo de alteração ultra-sonográfica mamária, estabelecendo
uma probabilidade de malignidade individualizada.
Indicação da conduta
Dopplerfluxometria e BIRADS
Nas edições anteriores do BIRADS, quando existia apenas
a classificação para mamografia, já se incluía a ultra-sonografia
nos casos de mamas densas, nódulos e densidades assimétricas
(atualmente descritas como assimetrias focais e globais). Na
classificação de BIRADS para ultra-som também está prevista
a necessidade da complementação mamográfica (ou mesmo a
ressonância nuclear magnética) em várias situações. Qualquer
mulher que esteja na idade de realizar uma mamografia deve ser
colocada na categoria 0 até que seja realizado o exame mamográfico. A ultra-sonografia não substitui a mamografia, como
querem algumas mulheres receosas pelo desconforto causado
pela compressão mamária. Além disso, algumas lesões podem
ter aspecto suspeito à ultra-sonografia, como os cistos oleosos, a necrose gordurosa e os fibroadenomas calcificados, mas
podem ter aspecto tipicamente benigno à mamografia, sendo
então classificados como categoria 2. Da mesma forma, lesões
provavelmente benignas à ultra-sonografia podem mostrar-se
suspeitas à mamografia, mudando de categoria.
A sensibilidade da mamografia nos programas de rastreamento
está entre 77 e 95%, diminuindo para 51 a 83% nas mulheres
com menos de 50 anos, com mamas densas ou naquelas em
uso de terapia de reposição hormonal. A especificidade do
exame está entre 94 e 97% (New recommendations from the
A classificação de BIRADS abre espaço para o doppler colorido
na avaliação ultra-sonográfica mamária. Esse recurso tem sido
sugerido por alguns autores, porém com pouco ganho adicional
na acurácia da ultra-sonografia convencional, na diferenciação
das lesões mamárias sólidas. As lesões malignas costumam
apresentar maior vascularização que as lesões benignas e, às
vezes, é possível observar neovasos e vasos tortuosos no interior dos tumores malignos. Muito se falou sobre parâmetros
mais objetivos do doppler que pudessem predizer a malignidade
em nódulos mamários, como a velocidade máxima no pico
sistólico e o índice de resistência. Na classificação BIRADS,
vale a impressão subjetiva do examinador e o laudo limita-se a
descrever se a vascularização: não foi avaliada, se presente ou
não na lesão; se presente pode ser imediatamente adjacente à
lesão, ou difusamente aumentada no tecido vizinho.
Em um estudo que incluiu 430 mulheres, Marussi observou,
na análise de regressão logística, algumas variáveis identificadas
como estatisticamente associadas à malignidade do tumor,
mas nenhum critério da colordopplervelocimetria melhorou
o desempenho global do escore incluindo as características
sonográficas usuais (Marussi, 2001).
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FEMINA | Setembro 2007 | vol 35 | nº 9
O principal ponto positivo na classificação BIRADS foi a
divisão das lesões mamárias em categorias de risco e a sugestão
de condutas a serem seguidas para cada caso. Isso serviu para
orientar o médico não especialista em doenças mamárias, na
condução de um grande número de casos de lesões de pouca
importância, como os cistos, os linfonodos intramamários, as
calcificações grosseiras, as áreas típicas de necrose gordurosa,
os fibroadenomas calcificados, as calcificações puntiformes
esparsas e as áreas de tecido mamário assimétrico. Nesses casos, o laudo nos moldes da classificação BIRADS, trouxe mais
tranqüilidade ao médico e à paciente no seguimento clínico da
lesão. Em lesões tipicamente malignas também a clareza do laudo
permite que o tratamento seja realizado com maior prontidão.
Por outro lado, acreditamos que a condução de lesões categoria
3 e 4 não deve ser tão simples como preconiza a classificação
BIRADS. Nesses casos, o médico deve levar em conta a idade
da paciente, os fatores de risco e a opinião da paciente, antes
de definir qual será o procedimento adotado.
Associação do exame físico, da
mamografia e da ultra-sonografia
BIRADS e ultra-sonografia mamária – uma análise crítica
United States Government on breast cancer screening, 2002).
Assim sendo, pode-se deduzir que a grande maioria (de 80 a
90%) das anormalidades detectadas é de resultados falso-positivos, trazendo como inconvenientes, os exames, as biópsias,
a ansiedade e as despesas desnecessárias.
O médico que recebe uma mamografia negativa (categorias
1 e 2 do sistema BIRADS), deve ter sempre em mente que 15 a
25% das lesões de mama não aparecem à mamografia (Haas et
al., 2005). O médico assistente deve integrar a clínica, o exame
físico, a mamografia e a ultra-sonografia, quando indicadas
(Houssami et al., 2004; Houssami et al., 2005) e na dúvida,
ou em caso de suspeita, a investigação deve continuar, mesmo
com exames de imagem normais (Haas et al., 2005).
Em um estudo incluindo 716 pacientes com alterações na
mamografia ou no exame físico, a inclusão da ultra-sonografia,
aumentou a especificidade de 51,4 para 66,4%, com uma prevalência de 31,3% de malignidade. O benefício foi persistente em
todas as idades e para tumores de todos os tamanhos (Taylor
et al., 2002). Esses resultados mostram que a adição da ultrasonografia à mamografia diminui também substancialmente
o número de biópsias por alterações benignas.
Ainda não é um consenso, em nosso país, a prática
da ultra-sonografia em todas as mamas densas vistas à
mamografia. Convencionou-se classificar as mamografias
com mamas densas como categoria 1, acrescentando-se
a informação de que a densidade mamária pode diminuir a
sensibilidade mamográfica.
Calcula-se que a taxa de detecção pela ultra-sonografia de
carcinomas ocultos ao rastreamento mamográfico esteja entre
2 e 7, em cada 1.000 mulheres rastreadas (Gordon, 2002). Kolb
et al. encontraram uma taxa de detecção precoce de tumores
mamários com a ultra-sonografia, semelhante à encontrada na
mamografia (Kolb et al., 1998). É óbvio que a ultra-sonografia
tem pouco a oferecer em mulheres com mamas lipossubstituídas e oferece maior risco de falso-negativos; mas pode ser
de grande utilidade em mamas densas, onde a sensibilidade
da mamografia fica prejudicada (Gordon, 2002).
O exame físico é valorizado na classificação BIRADS. Na
última edição, fica bem clara a necessidade da palpação das
mamas das pacientes pelo ultra-sonografista. Nem todos os
médicos que laudam mamografias e ultra-sonografias têm o
hábito de fazer o exame físico antes do exame de imagem. Isso
deve ser mudado, pois uma parcela considerável dos tumores
mamários pode passar despercebida nos estudos de imagem
mamária. Nódulos palpáveis, mesmo que apresentem aspecto
sonográfico sugestivo de benignidade são colocados como
suspeitos (categoria 4) e a sugestão é de que seja feito algum
tipo de biópsia, não necessariamente histológica. Pode ser, por
exemplo, uma biópsia aspirativa por agulha fina.
A categoria 3 só existe para lesões não palpáveis. Este tem
sido um ponto de muita controvérsia entre os ultra-sonografistas:
o simples fato de a lesão ser palpável mudaria o risco de tratar-se
de um câncer de mama? Lesões pequenas podem ser palpáveis
e outras maiores podem não o ser. Particularmente, preconizamos a realização da punção biópsia dos nódulos palpáveis, pela
simplicidade do procedimento e pelas informações que o mesmo
pode trazer (Paulinelli et al., 1998). Porém, não nos sentimos à
vontade de chamar um nódulo de aspecto provavelmente benigno
de suspeito. Acreditamos que isso possa aumentar o número de
cirurgias desnecessárias. Para a mamografia isso pode ser mais
aceitável, pois geralmente estas mulheres encontram-se acima
dos 35 anos ou apresentam outros fatores de risco para o câncer
de mama. Na ultra-sonografia, freqüentemente são examinadas
mulheres jovens e adolescentes, onde a chance de malignidade
costuma ser baixa e a conduta poderia ser mais conservadora.
Considerações finais
A ultra-sonografia é um importante exame complementar no
diagnóstico das lesões mamárias. Apresenta algumas limitações
próprias de qualquer método propedêutico, relacionadas à sensibilidade e à especificidade. Somam-se a elas o fato de a ultra-sonografia
ser um método examinador-dependente e aparelho dependente.
Para obtermos um exame confiável são necessários: um aparelho
com boa resolução, muita atenção do examinador, disposição de
tempo, experiência com ultra-sonografia e a associação com outros
métodos de imagem mamária, quando necessária.
Existe uma grande importância didática na classificação de
BIRADS. Ela promoveu uma maior divulgação da ultra-sonografia
e despertou o interesse de vários profissionais. Intensificaram-se as
discussões a respeito dos laudos ultra-sonográficos. Os médicos
que já trabalhavam com a ultra-sonografia mamária, alguns dos
quais com pouca disponibilidade para um embasamento teórico
mais consistente, sentem agora a necessidade de aprofundar seus
conhecimentos e estudar mais. E isso é sempre benéfico.
Somos favoráveis à adoção dessa classificação no nosso
país para a confecção de laudos de ultra-sonografia mamária,
assim como vem sendo feito para os laudos de mamografia.
Existem alguns pontos de polêmica quanto ao léxico e quanto
às categorias de avaliação apontados no decorrer do texto e que
merecem ampla discussão entre os ultra-sonografistas, mas não
impedem a adoção desse sistema de classificação. Sugerimos
inclusive que seja realizada uma reunião de consenso entre os
vários ultra-sonografistas de diversas formações. Acreditamos
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BIRADS e ultra-sonografia mamária – uma análise crítica
ser este o momento de aproximarmos a Sociedade Brasileira
de Mastologia, a Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), a Sociedade Brasileira
de Ultra-sonografia e a Sociedade Brasileira de Radiologia para
um posicionamento oficial sobre o tema.
Acreditamos que novas pesquisas devam ser conduzidas no sentido de avaliar a adequação do sistema BIRADS
para ultra-sonografia e na tentativa de acrescentar outros
elementos que possam influenciar no risco de malignidade,
como, por exemplo, a idade das pacientes.
Leituras suplementares
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Internet <http://www.acr.org/departments/stand_accred/
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