TEATRO E EDUCAÇÃO: UMA RELAÇÃO A SER REDESENHADA
BENTO, Franciele1 - UEM-PR
[email protected]
MEN, Liliana2 – UEM – PR
[email protected]
Eixo Temático: Didática: Teorias, Metodologias e Práticas
Resumo
O presente texto é resultado parcial de pesquisas sobre a relação entre teatro e educação
escolar. Tem como objetivo inventariar a produção historiográfica que vem problematizando
o teatro na escola, levando em conta que a prática que envolve a arte teatral e se relaciona ao
exercício docente é algo presente no ambiente educacional. A problemática norteadora do
nosso estudo se configura nos seguintes questionamentos: Como a prática do teatro é
concebida na escola? Os educadores possuem conhecimentos da arte teatral para utilizá-la de
maneira adequada em sala de aula? Os procedimentos teórico-metodológicos embasam-se em
autores que desenvolvem pesquisas no campo educacional, bem como em estudiosos que
tratam sobre a relação teatro e educação. Dentre os resultados obtidos, encontra-se certa
banalização da arte teatral no cenário escolar, já que os educadores nem sempre estão
preparados para desenvolver tal linguagem artística de maneira coesa.
Com base no exposto, nas considerações finais, aborda-se o papel dos profissionais da
educação nesse contexto, estes, a nosso ver, precisam compreender que o teatro é uma arte
que permite o auto-conhecimento, possibilita uma transformação individual e, por
conseguinte, social, porque, ao atuar, o educando, necessariamente, estará relacionando e
vivenciando experiências coletivas. Além disso, a arte pode contribuir para uma educação
estética do gesto e do olhar.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Escolar. Metodologias. Teatro.
Introdução
O lócus de produção deste estudo é a escola, no interior da qual atuamos como
educadoras das séries iniciais do Ensino Fundamental. Desse modo, a presente comunicação
fundamenta-se em nossa experiência e na produção historiográfica que vem problematizando
1
2
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Mestre em educação do Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Estadual de Maringá
(UEM).
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o teatro na escola. Tal iniciativa justifica-se por dois motivos. Em primeiro lugar, observamos
que o ensino de teatro é pouco valorizado no interior da escola e carece de debates entre os
educadores e pesquisadores (SILVEIRA, 2006, p. 3). Segundo, porque acreditamos que ser
educadora em tal cenário é sensibilizar seu aluno para determinados assuntos, é ampliar a
visão do seu educando, é fazê-lo sentir vontade de aprender sobre o mundo, ao relacionar o
aprendizado escolar com as vivências cotidianas.
Essa prática está embasada no conceito de educação pautado no termo educere
originário do latim, que significa “[...] extrair, desabrochar, desenvolver algo no indivíduo”
(ARAÚJO, 1999, p. 8). O termo educere propõe uma ação em que o educador exerça o papel
de guia no processo ensino-aprendizagem e o educando seja agente atuante desse processo.
Sob esse prisma, a atividade educacional é concebida como meio para o desenvolvimento das
potencialidades do indivíduo. Isso implica compreender o conhecimento como algo inserido
no próprio sujeito, entender que cabe ao educador o papel de instigar esse saber para que ele
se revele.
Mas como ensinar dessa forma? Como instigar crianças, tornadas alunos, de maneira
criativa? No decorrer do exercício como educadoras, notamos que várias estratégias
pedagógicas vêm sendo utilizadas por alguns professores, no sentido de “desabrochar” o
conhecimento existente no educando, dentre as mais utilizadas estão: a literatura, os jogos e as
brincadeiras, o cinema e o teatro. De modo geral, todavia, tais estratégias visam envolver o
aluno no processo ensino-aprendizagem, de modo a diminuir a indisciplina, as dificuldades de
relacionamento e a aumentar a apreensão de conteúdos propriamente ditos. Sendo assim,
pode-se registrar “[...] de uma maneira geral na nossa cultura – existe ainda uma espécie de
analfabetismo difuso no que concerne à experiência emocional e às suas modalidades de
comunicação” (GAGLIARDI, 1998, p. 70).
Essa forma de utilização, sobretudo, do teatro na escola, causou-nos certa inquietação.
Partindo desse desconforto, surgiram os seguintes questionamentos: Como o teatro vem sendo
concebido na escola? Qual a importância do teatro na educação escolar? De que forma o
teatro pode contribuir para uma prática pedagógica significativa? Para tanto, estabelecemos
como procedimento téorico-metodológico o levantamento e seleção da produção
historiográfica que problematiza o teatro na escola na atualidade. É oportuno esclarecer, de
antemão, que não é nossa intenção identificar e apresentar um “receituário” pronto e acabado
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de se ensinar teatro na escola, particularmente nas séries iniciais do Ensino Fundamental.
Como afirma Japiassu (1998, p. 22), isso seria, no mínimo
[...] uma pretensão equivocada classificar uma prática educativa, seja ela teatral ou
não como certa ou errada, sem analisar o contexto onde está inserida. Enfadonho
seria todos sermos obrigados a segurar como ‘um só rebanho’ na mesma direção,
num único sentido, definitivamente: Pluralidade de sentido! Diversidade cultural!
Tolerância! Respeito às diferenças! Afinal, nada é definitivo – viver não é definitivo.
Feito este esclarecimento, acrescentamos que, com esta pesquisa de natureza
historiográfica, pretendemos identificar o estado da arte sobre o tema: teatro na escola. Esse
mapeamento do discurso historiográfico pode possibilitar nossa conscientização e contribuir,
também, para conscientizar os demais educadores acerca da utilização coerente da arte teatral
no cenário escolar. A nosso ver, ao compreendê-la, podemos redesenhá-la.
2 O teatro na escola: como é concebido?
A palavra teatro é originária do vocabulário grego théatron, estabelece o lugar físico
do espectador, "lugar onde se vê o outro". Genericamente, defini-se teatro como uma forma
de manifestação artística, no qual uma história real ou não é interpretada, por meio de cenário,
figurino e representação de atores em um palco, para uma plateia. Fomentando-se no discurso
de Vasconcelos, Gagliardi (1998, p. 69), exemplifica que a expressão teatro envolve “[...] toda
atividade teatral, englobando dramaturgia, encenação e produção de espetáculos.
Especificamente, refere-se aos diversos locais onde estão apresentados espetáculos teatrais,
óperas, balé, concertos, entre outras”.
Reportando-nos ao cenário escolar, indagamos: Como o teatro é concebido na escola
atualmente? O que é possível visualizar? Dramatizações almejam ilustrar conteúdos? Uma
brincadeira para tornar a aula mais agradável? Concomitantemente, são essas ideias que
povoam o imaginário popular, em outras palavras, é esse o estereótipo de teatro na escola que
a sociedade se apropriou e vem divulgando.
Instituído como componente obrigatório, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB), no artigo 26º, parágrafo 2º, o teatro ganhou novas dimensões no interior da
escola. Segundo esse documento o ensino da arte tornou-se obrigatório “nos diversos níveis
da Educação Básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos” (1996). É
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oportuno registrar que o desenvolvimento do teatro na escola é subsidiado pelos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PNCs), o qual destaque que a arte engloba quatro modalidades: artes
visuais (fotografia, cinema, artes plásticas, artes gráficas), música, dança e teatro (BRASIL,
1997).
É notório que a criança, antes mesmo de frequentar a escola, possui um potencial para
a arte teatral, já que exercita espontaneamente a teatralidade, praticando o teatro em sua
vivência, por meio de brincadeiras e jogos de faz-de-conta. Para Gagliardi (1998, p. 68), “o
papel da escola com relação ao teatro é fundamental nessa primeira fase” da vida, por isso,
acredita-se que somente a instituição escolar
[...] pode desenvolver um trabalho de alfabetização artística e oferecer a
oportunidade de uma aproximação com a experiência teatral a todas as crianças,
independente de suas diferenças socioculturais e econômicas – diferenças que, como
se sabe, têm uma forte influência no espectador adulto nas salas de teatro
(GAGLIARDI,1998, p. 68).
Nas palavras de Garcia (1998, p. 67) “a criança é espectadora desde seu nascimento,
um espectador que a quantidade de imagens e a qualidade de sua emissão, bem como a
facilidade aparente de sua decodificação induzem a uma atitude de fruição superficial e
desatenta, ou seja, passiva”. Partindo dessa compreensão, podemos afirmar que “a educação
do jovem espectador começa anteriormente a seu encontro efetivo com o espetáculo e que ela
se inscreve em um contexto mais geral” (GARCIA, 1998, p. 68).
Conforme salientam os PCNs, cabe à escola dar continuidade à potencialidade dos
alunos em relação à arte teatral, uma vez que:
o teatro, no processo de formação da criança, cumpre não só função integradora,
mas dá oportunidade para que ela se aproprie crítica e construtivamente dos
conteúdos sociais e culturais de sua comunidade mediante trocas com os seus
grupos. No dinamismo da experimentação, da fluência criativa propiciada pela
liberdade e segurança, a criança pode transitar livremente por todas as emergências
internas integrando imaginação, percepção, emoção, intuição, memória e raciocínio
(BRASIL, 1997, p. 57).
Como podem ser observadas, as leis maiores da educação nacional ditam as diretrizes
e parâmetros aos sistemas de ensino público ou privado no que se refere ao ensino de Artes,
dentre estas, insere-se a arte cênica. A despeito de todo incentivo dos órgãos oficiais de
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ensino, de iniciativas aleatórias de escolas e de professores, o teatro “na educação ainda é um
espaço a ser conquistado”, conforme ressalta Cunha (2009, p. 293). Reforçando essa opinião,
o mesmo relata
apesar de existirem educadores que acreditam na força que a arte de encenar tem
para promover a aprendizagem e o desenvolvimento do aluno, ainda há um grande
número de escolas que não aceitam e não valorizam a atividade teatral no processo
educativo. Isso pode se dar devido a enorme carga transdisciplinar que permeia o
teatro, o qual gera algo novo, causando, assim, o risco da descoberta (CUNHA,
2009, p. 293).
Por outro lado, é oportuno registrar que, quando essa forma artística, o teatro, ganha
espaço no cotidiano escolar, acaba sendo apropriada de maneira, no mínimo, incoerente, seja
por desconhecimento ou puro descuido. Tendencialmente, é visto como possibilidade de
grandes espetáculos ou como terapia em grupo, procurando sanar as dificuldades de
aprendizado e de comportamento de alguns alunos. Conforme entende Cunha (2009, p. 294)
“o ensino das artes no Brasil ainda é contemplado sem a atenção necessária por parte de muitos
professores, funcionários da educação, pais de alunos e estudantes, sendo considerado
supérfluo”.
Assim como Cunha (2009), Silveira (2006, p. 3) ressalta que não devemos encarar a
“presença do teatro na escola como um simples treinamento para o palco”, tendo,
exclusivamente, “um enfoque voltado para a formação de atores e atrizes”. Muito menos com
a tarefa de “promover a desinibição e socialização, procurando motivar os alunos a
participarem das atividades de outras disciplinas” (SILVEIRA, 2006, p. 3).
Entende Silveira (2006, p. 2) que nos dois processos de ensino do teatro, o resultado,
“muitas vezes, reforça os estereótipos e padrões impostos pela cultura de massa,
principalmente, as telenovelas, única referência de dramaturgia para a grande maioria da
população brasileira”. Contrapondo-se a essa visão, a estudiosa defende “[...] a necessidade de
o teatro existir dentro da escola, abrindo um espaço que permita reconhecermos o seu ensino
como um fim em si mesmo, e não de por ser instrumento para fins de outra natureza”
(SILVEIRA 2006, p. 3).
Os olhos dos profissionais vinculados à escola devem estar focados, no entendimento
de Silveira (2006, p. 3), nas “[...] práticas teatrais que estimulam e desenvolvem o caráter de
produção coletiva dessa atividade artística na escola (jogos em grupos) em detrimento de
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outras, que podem estimular o treinamento técnico e individualista das pessoas que a
praticam”. Para tanto, faz-se necessário que os professores, ministrantes das aulas de teatro,
tenham amplo conhecimento e domínio das teorias e metodologias teatrais e sejam
comprometidos com seu trabalho. Em outras palavras, “o professor de teatro na escola, além
de possuir conhecimento teatral deve estar em permanente contato com as principais
abordagens sobre o ensino do teatro, para que esta prática-pedagógica tenha objetivos claros e
consistentes de aprendizagem” (SILVEIRA, 2006, p. 3).
3 O teatro na escola: uma prática coerente
O fazer teatro na escola, conforme salienta Cabral (1998, p. 2), possibilita a
intersecção de “diversas situações, vivências, circunstâncias”. Oportunizando, o “[...]
desenvolvimento de habilidade e ampliação do conhecimento, o equilíbrio entre o fazer e o
apreciar, entre a formação do ator e do espectador é enfatizado por distintas abordagens
pedagógicas” (CABRAL, 1998, p. 2).
A integração do teatro no currículo escolar pode e deve contribuir, conforme Gagliardi
(1998, p. 68), para a formação da plateia, ou melhor, do espectador. Todavia, a competência
do “jovem espectador” se dará “[...] tanto como conhecimento da histórica do teatro e de seus
códigos expressivos, mas, sobretudo como um savoir-faire, isto é como a soma de habilidades
e aptidões que lhe permitem realizar as diferentes operações receptivas”.
Para Cabral (1998) “a ampliação da percepção crítica”, nesse caso do aluno, “requer
vivências diferenciadas”. Nesse contexto, “a variedade de abordagens, no percurso das
experiências de teatro na escola, como canal para perceber e aceitar a diferença, pode ser uma
meta, além de evitar a reprodução cultural e social de um modelo específico” (CABRAL,
1998, p. 2).
Pautado nas considerações da autora e diretora de teatro Viola Spolin (1906-1994),
Cabral (1998) adverte-nos que “as técnicas estão longe de ser sagradas. Os Estilos em teatro
mudam radicalmente com o passar dos anos, pois as técnicas de teatro são técnicas de
comunicação”. Para esta estudiosa do teatro, “a existência da comunicação é muito mais
importante do que o método usado. Os métodos se alteram para atender às necessidades do
tempo e espaço” (Apud CABRAL, 1998, p. 3).
No entendimento de Cabral (2009, p. 3), “o foco na presença e simultaneidade do
processo-produto e da forma-contéudo”, como foi instituído por Spolin “apontam para uma
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perspectiva pedagógica que não está centrada em ensinar ‘como’ fazer teatro a partir de
técnicas, estratégias e conteúdos específicos. Estes decorrem e se diferenciam de acordo com
o contexto e as circunstâncias em que são propostos”. Lembrando, com essa forma de ensino,
“o conhecimento que se espera é que a imersão do aluno no contexto e na situação proposta o
leva a perceber a complexidade da arte e das relações humanas” (CABRAL, 2009, p. 3)
Aos olhos de Koudela (2004, p. 27) “o teatro poderá, per se, ministrar educação e ser
agente e meio de educação”. O teatro, sob desse ponto de vista, possibilita ao educando o
desenvolvimento integral de todas as suas potencialidades de certo modo inativas. Nas
palavras dessa estudiosa,
[...] o teatro, enquanto proposta de educação, trabalha com o potencial que todas as
pessoas possuem, transformando esse recurso natural em um processo consciente de
expressão e comunicação. A representação ativa e integra os processos individuais,
possibilitando a ampliação do conhecimento da realidade (KOUDELA, 2004, p. 78).
Embasando-se no discurso de Koudela (2004), identificam-se as considerações de
Cunha (2009). Para esse intelectual, “a época atual exige um recriar, um repensar da
educação, com vistas a atingir uma prática pedagógica que propicie um ator social, livre,
crítico, criativo e responsável pela criação de seu próprio mundo de vida e de trabalho”
(CUNHA, 2009, p. 294-295). Sendo assim, o teatro deve ser utilizado “a serviço da prática
educacional”, segundo esse autor.
Em defesa da integração efetiva do teatro na escola, Cunha (2009, p. 295) argumenta:
o teatro “[...] deve surgir como um mecanismo para expelir toda a capacidade individual,
desenvolvê-la e transformar a realidade sócio-cultural dos alunos [...]”. Para ele, isso é
possível “[...] pois, a arte de dramatizar propicia a busca de si mesmo, onde se pode
mergulhar em sonhos e buscar superar os desafios da vida, modificando comportamentos
cotidianos” (CUNHA, 2009, p. 295).
O teatro, por esse prisma, é um instrumento ou metodologia capaz de transformar o
comportamento individual, uma vez que o leva “[...] a buscar dentro de si o que há de melhor
a fim de estimular sua auto-estima” (CUNHA, 2009, p. 295). Em defesa do teatro aliado à
educação, Cunha (2009) expõe as vantagens dessa integração, como podem ser observadas na
citação que se segue
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[...] utilizar o teatro aliado à educação, oportuniza-se aos educandos um
conhecimento diversificado e lúdico, existindo um clima de liberdade onde o aluno
libera as suas potencialidades, expressando seus sentimentos, emoções, aflições e
sensações, pois é um meio de expressão para o aluno. Quando o educando
interpreta um personagem ou dramatiza uma situação, revela uma parte de si
mesmo, mostrando como sente, pensa e vê o mundo. É uma atividade artística que
permite ao aluno expressar-se, explorando todas as formas de comunicação humana.
A atividade teatral amplia o horizonte dos alunos, melhora sua auto-imagem e
colabora para torná-los mais críticos e abertos ao mundo em que vive (CUNHA,
2009, p. 295).
O teatro, no entendimento de Silveira (2009, p. 2), permite que o aluno “se reconheça
no outro”. Isso ocorre, normalmente quando o ator-aluno constrói seu personagem com
características físicas e psicológicas. Ao se colocar no lugar do outro ou de alguma coisa, “o
sujeito que joga em grupo, assume-se enquanto agente que pratica uma ação, se colocando
diante do outro, expondo o que pensa”. Nesta experiência as trocas “de idéias, pensamentos e
emoções são o que move a cena, o colocar-se no ‘papel’ do outro é o que faz a atividade
acontecer, desencadeando uma ação, que logo em seguida deve ser problematizada por cada
um” (SILVEIRA, 2009, p. 2).
E ainda, o teatro na escola é defendido porque “[...] pode promover processos de
interação entre os sujeitos que se envolvem com essa linguagem artística”, como lembra-nos
Silveira (2009, p. 2). Para essa autora, ao praticar a linguagem artística, o educando estabelece
“[...] um diálogo físico sensível, uma prática que permite o encontro entre homens e mulheres
em busca de uma forma de expressão” (SILVEIRA, 2009, p. 2)
À luz dessa perspectiva, “a escola não pode ter um papel hegemônico: é preciso
ampliar o espaço da iniciativa infantil, permitindo às crianças a possibilidade de ter acesso
direto ao teatro e escolher os espetáculos aos quais desejam assistir”, conforme entende
Gagliardi (1998, p. 68).
Acreditamos que, como Gagliardi (1998, p. 68), “jamais deveríamos exigir do teatro
que ele se faça didático, portador de noções ou de ensinamentos moralizantes”. Pior ainda, é
querer que o teatro “se torne o objeto de exercícios escolares propostos como verificação da
eficiência de sua recepção”. Ao conceber o teatro na escola dessa maneira, “a experiência
teatral se esvazia de toda a significação e de todo o prazer” (GAGLIARDI, 1998, p. 68).
A nosso ver, a partir do momento EM que a instituição escolar pública ou privada
inclua em seu currículo “arte teatral como fonte de formação e de educação estética”,
consequentemente, “ela deve oferecer as condições necessárias para também tornar-se ateliê,
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no qual seja possível experimentar a alternância entre ver e fazer, numa tensão dinâmica
contínua entre os dois pólos” (GAGLIARDI, 1998, p. 68)
Partindo do exposto, pode-se considerar que o teatro possibilita a transformação
individual e, por conseguinte, social, porque, ao atuar, o educando, necessariamente, estará
relacionando e vivenciando experiências coletivas. Essa relação de certo modo “forçada” com
o outro possibilita, além da socialização, o florescimento de potencialidades até então inatas.
Em resumo, constata-se que “a participação do processo criativo do teatro na escola
representa condições de ampliar a visão e o conhecimento o que contribuirá para realização da
obra como um todo e para o reconhecimento individual do aluno na produção coletiva”
(ÔCHOA; MESTI, 2009, p. 9). Para esses autores, “ao participar de um processo coletivo,
mesmo não estando no palco como ator, o aluno reconhece sua obra: no cenário, na
iluminação etc.” (ÔCHOA; MESTI, 2009, p. 9). Sob esse ponto de vista, podemos concluir:
que o teatro não é uma arte individual e sim coletiva, portanto, enquanto se transforma o
aluno a sociedade também é modificada.
4 Considerações finais
Ao término desta pesquisa de cunho historiográfico, pode-se elencar alguns resultados
preliminares, no tocante à integração do teatro na escola. Primeiramente, constatamos que
existem iniciativas oficiais e não-oficiais em promoção das Artes, especificamente do teatro
na escola. Contudo, na realidade, a arte cênica vem sendo explorada pelas escolas e
professores de maneira superficial e, por muitas vezes, displicente. Uma das razões dessa
postura, pode estar na própria história de criação da instituição escolar. Para Silveira (2009, p.
5) a escola que conhecemos hoje foi instituída e sedimentada “[...] sobre os alicerces de um
paradigma positivista, onde a arte, na maioria das escolas, é relegada ao preenchimento de
‘um tempo’ com ‘atividades de expressão’ de caráter livre, visto como uma válvula de escape
para os/as alunos/as descontraírem um pouco ou mostrarem, seu ‘talento’”. Conceber o teatro
dessa forma, a nosso ver, é menosprezar as infinitas possibilidades de aprendizado que ele
proporciona aos educandos.
No entendimento de Silveira (2009, p. 5), “[...] a arte é uma área de conhecimento tão
importante quanto qualquer outra, se comprometendo em muitas práticas-pedagógicas com a
formação do sujeito crítico-reflexivo”. Embasando-se no conhecimento educacional teorizado
pelo educador Paulo Freire (1921-1997), a autora destaca que ele
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[...] pontua a necessidade de olharmos para a prática com o teatro na escola como
um espaço de pronúncia das palavras, a partir do lugar de onde viemos, do que
sabemos e somos. Um momento de aprendizado e construção coletiva de
conhecimentos, onde sujeitos se assumem como agentes críticos e históricos,
possíveis construtores dos novos “papéis” que precisamos assumir para a
transformação desta sociedade (SILVEIRA, 2009, p. 5).
Na concepção do estudioso Paulo Freire, o educador contribui para a edificação do
conhecimento dos educandos na relação pedagógica estabelecida entre esses atores do
processo ensino-aprendizagem. Contudo, o professor não deve aniquilar a criatividade desses
educandos, que possuem responsabilidade na construção de seu conhecimento (FREIRE,
2003, p. 19).
A teoria pedagógica de Paulo Freire propõe uma educação construída sobre o diálogo
entre educador e educando, em que existem partes de cada um no outro, que não poderia
começar com o educador trazendo pronto, do seu mundo, do seu saber, o seu método, o
material para suas aulas. O legado de Freire pressupõe que existe uma leitura de mundo
anterior à das letras, das palavras, dessa forma, antes de frequentar a escola, o educando já
exercitou o ato de ler, e possui experiências, vivências, que podem se tornar temas geradores
para o processo de ensino-aprendizagem.
Aos olhos de Silveira (2009, p. 3) “[...] se no método de alfabetização proposto por
Paulo Freire, a leitura do mundo precede a leitura das palavras”. Como isso ocorre na
atividade teatral desenvolvida no espaço escolar? De acordo com autora em tela, “a
interpretação cênica que o aluno faz dos problemas relacionadas com o seu cotidiano, em um
primeiro momento, precede a qualidade estética do gesto”, em outras palavras, “o produto
artístico em primeira instância não é o principal, o que deve destacar-se é o canal expressivo
aberto por essa linguagem artística para que o aluno possa expressar-se”. Pautado nesse olhar
freireano
[...] a prática com o teatro na escola pode mobilizar os sujeitos envolvidos nesse
processo, para o encontro com o/a outro/a, onde trocas humanas ocorrerão pautadas
no respeito e na solidariedade, onde os/as professores/as e os/as alunos/as assumem
a responsabilidade do diálogo, para além do confronto de idéias, mas com um
esforço subjetivo, de abertura pessoal, que é pressuposto para a construção do
trabalho coletivo nessa linguagem. O teatro não existe sem a prontidão de todos/as
os /as envolvidos/as para vivenciá-lo (SILVEIRA, 2009, p. 3).
2588
Pensando na mobilização para o diálogo, para a troca de ideias, identificamos que, em
meio às metodologias eficazes para o ensino do teatro no ambiente escolar, pode-se destacar o Jogo
Teatral na escola. Para Japiassu (1998, p.26), o Jogo Teatral tem por finalidade “[...] o
crescimento pessoal e o desenvolvimento e cultural dos jogadores por meio do domínio da
comunicação e do uso interativo da linguagem teatral, numa perspectiva improvisacional ou
lúdica”. Na sua concepção, “o princípio do jogo teatral é o mesmo da improvisação teatral, ou
seja, a comunicação que emerge da espontaneidade das interações entre os sujeitos engajados
na solução cênica de um problema de atuação” (JAPIASSU, 1998, p.26).
No interior da escola, nota-se que os “jogos teatrais é uma metodologia que tem se
revelado eficaz para o ensino do teatro às crianças e adultos” (JAPIASSU, 1998, p. 26). Para
esse estudioso, Jogo Teatral
[...] tem informado uma quantidade expressiva de práticas pedagógicas teatrais na
educação infantil, no ensino fundamental, médio e superior brasileiros e se configura
numa âncora para o trabalho de teatro-educadores tanto no âmbito da educação
escolar, quanto no nível da ação cultural de oficinas e intervenções cênicopedagógicas) em todo o país (JAPIASSU, 1998, p. 26).
A riqueza do trabalho pedagógico, ao utilizar os jogos teatrais, possibilita que os
educandos saboreiem “o fazer teatral (quando jogam) desenvolvam a apreciação e
compreensão estéticas da linguagem cênica (quando assistem a outros jogarem) e
contextualizem historicamente seus enunciados estéticos (durante a avaliação coletiva quando
também se auto-avaliam)” (JAPIASSU, 1998, p. 26).
Outro resultado obtido que, de certo modo, justifica a forma como o teatro vem sendo
praticado no ambiente escolar é a má ou até mesmo a falta de formação dos profissionais que
atuam com o teatro na escola e vem sendo considerado um empecilho no processo de
ampliação e sedimentação do teatro como componente curricular. Aos olhos de Cabral (1998)
“há que se ter cuidado, pois a integração teatro e escola não é tarefa simples”. As dificuldades
frequentemente apontadas pelos estudiosos do teatro na escola é o distanciamento entre as
técnicas e métodos que embasam o fazer teatro e o que é ministrado pelos professores de
teatro no interior no ambiente escolar. É possível observar certa vulgarização das
metodologias científicas, como se “tudo” pudesse ser ensinado nas aulas de teatro, desde que
divirta e distraia os alunos. Nas palavras de Cabral (1998, p. 2) o risco aumenta
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consideravelmente “se o professor não se precaver contra rigidez e rotina na adesão a uma
metodologia específica”.
Segundo Japiassu (1998, p. 66), cabe, portanto, a solicitação para que os colegiados
dos cursos de Pedagogia “[...] discutam a contribuição única que o teatro pode oferecer à
formação do professor da educação infantil e das primeiras séries da educação escolar básica,
reconhecendo-lhe o valor pedagógico e a especificidade estética”. Falando no final da década
de 1990, esse autor reinvidicava que esses cursos contemplassem em seus currículos
[...] a especificidade das linguagens artísticas no currículo mínimo necessário à
formação profissional do professor alfabetizador e das séries inicias do ensino
fundamental, atualmente, a maioria dos cursos de pedagogia oferece apenas uma
disciplina obrigatória (geralmente denominada educação artística ou arte e recreação
(JAPIASSU, 1998, p. 67).
A defesa do teatro na escola feita por Japiassu (1998, p. 67) está sedimentada na sua
compreensão de que “[...] crianças, jovens, adultos e pedagogos devem ter também direito a
uma alfabetização estética nas diferentes linguagens artísticas”.
Mediante nossa atuação como educadoras, sabemos que o teatro é encantador aos
olhos das crianças, ele tem a capacidade de despertar a sensibilidade dos alunos por vários
sentidos, no entanto, não pode ser desenvolvido de qualquer forma para não ser banalizado.
Assim como Japiassu (1998, p. 22), temos a convicção de que “não existe apenas um caminho
para o desenvolvimento do trabalho com teatro na escola e, além disso, a firme opinião de
que,
entre
os
caminhos
possíveis,
nenhum
pode
ser
considerado,
absoluto
e
descontextualizadamente, melhor ou superior aos outros”. Como se pode observar, cada
abordagem ou metodologia possui “seus próprios ‘encantos’, ‘habitantes’ e ‘lugares de onde
se vê”, o essencial é que nós, como professores, tenhamos clareza de que caminho seguir e,
sobretudo, ter consciência das implicações dessa escolha.
Ultimando esta apresentação, consideramos oportuno frisar: o teatro é uma arte
produzida coletivamente, por isso, pode ser uma linguagem essencial para redesenharmos os
contornos da escola atual. O teatro na escola, além de propiciar o acesso à cultura e o gosto
pela arte, pode contribuir na formação do aluno de maneira humanizada, apoiando no
aperfeiçoamento de diversos campos do saber, por exemplo: interpretação, leitura, expressão,
socialização, criticidade, imaginação, criatividade, entre outros. Podemos afirmar que ele
redefine os objetivos e esclarece as reais finalidades da instituição escolar na atualidade. Ao
2590
reinventarmos a nossa prática docente, podemos reinventar a escola, tornando-nos atuantes na
proposta de construção de um mundo mais justo para vivermos.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Deuzimar Serra. Uma metodologia dialógica e proativa para alfabetização de
jovens e adultos. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual do Maranhão – Ciência da
Educação: Maranhão, Caxias, 1999. Acesso em: maio de 2009.
BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares
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teatro e educação: uma relação a ser redesenhada