UM MUNDO QUASE IGUAL AO NOSSO Álfio De Vuono CAPITULO I O Comandante Jonas estava particularmente desanimado aquela manhã. Entrou na cabine de comando, cumprimentou os que ali estavam com um sussurrado Bom Dia, e esparramou-se na sua poltrona olhando distraidamente a paisagem estelar no telão de vídeo a sua frente. Clark que estava sentado ao seu lado, levantou os olhos do livro que estava lendo, e perguntou:- O que foi? Está com cara de quem perdeu o último trem do metrô! Jonas sorriu. Alguém falar de metrô naquela distância do Planeta Terra, parecia uma observação bastante irreal. O sorriso porém, durou somente um instante, voltou-se para o seu Subcomandante e respondeu: - Oito anos dentro desta lata, e até agora nada. -Ora! Também não é assim...a última estrela que passamos tinha uns planetas até bonitinhos – Gracejou Clark. -Uma estrela de sexta grandeza, e uns planetas mais áridos que a Lua. -Pois então! Da mesma maneira que achamos esse sistema, podemos localizar outros... -Eu sei...na verdade só estou revelando minha impaciência. Jonas tinha motivos para estar desanimado. Comandava uma avançadíssima espaçonave, com uma tripulação de homens e mulheres altamente treinados, com o objetivo único de localizar um ou mais sistemas estelares com vestígios de vida. A mais de oito anos que viajavam percorrendo bilhões de quilômetros por dia. Já tinham achado várias estrelas, algumas com planetas, mas as analises nada tinham registrado. Todas as informações das sondas eram de planetas em brasa, a maioria inóspitos como asteróides, ou gelados como o espaço. -O.K. – disse Clark, depois do desabafo do Comandante. Levantou da poltrona, e pousando o livro no painel, completou: - Vamos malhar um pouco, assim acaba sua impaciência. -Boa idéia,... Hoje te dou uma surra. O Subcomandante deu uma sonora gargalhada, e sentenciou:- Precisam dois Comandantes para isso! Alguns minutos depois, os dois Comandantes, mediam forças no salão de ginástica da nave, sob os aplausos, e vaias de quatro tripulantes. Clark era um gigante de dois metros de altura, mas não levava muita vantagem com Jonas, um lutador ágil e experiente, campeão de muitas modalidades de luta. O Subcomandante já estava praticamente dominado, quando acima da gritaria dos torcedores, a voz de Agatha fez-se ouvir nos alto-falantes. - Comandante, temos novidades, solicitamos sua presença no Centro. Jonas soltou de imediato o companheiro, lhe deu um tapa na nuca, levantou-se, e comentou: - Será que vai ser desta vez? A tripulação daquela nave era constituída de quatorze casais. Alguns mantinham entre si uma relação matrimonial, outros se consideravam noivos, os restantes não tinham compromissos sérios, e mantinham entre si uma amizade colorida. Viviam juntos naquela espaçonave a oito anos, como uma grande família. Desavenças já tinha havido várias, prisões também, nada porem muito sério, pelo menos até ali. Apesar do Comandante tentar manter com pulso firme a hierarquia, a convivência prolongada tinha relaxado um pouco a disciplina, e o comportamento entre eles. Por isso, naquele momento ambos saíram correndo do salão de ginástica, e sem se preocupar em trocar de roupa, foram direto para o Centro de Análise e Pesquisa. Dois homens, e duas mulheres, no meio de uma parafernália de botões, gráficos, computadores, e vídeos, comandados por Agatha, uma jovem loira, noiva de Jonas, rastreavam no espaço sistemas estelares que pudessem interessar a missão. Clark, e o Comandante, entraram rapidamente no Centro, Jonas logo perguntando: - Alguma novidade? Agatha sorrindo, empunhou uma fina vareta metálica, dirigiu-se a uma enorme tela de vídeo apontou um ponto brilhante no meio de outros, no fundo negro do espaço, e disse: - É uma estrela de quinta grandeza, igual ao Sol... Detectamos seis planetas... Dois pelo menos tem possibilidades. - Ótimo! – disse Jonas. Deu um beijo na testa de Agatha. E concluiu: - Vamos lá. Depois de alguns dias (terrestres) da descoberta da estrela, a nave devorando o espaço a uma velocidade espantosa se aproximou de seu destino. “Esperança”, nome que tinham dado a estrela, que antes era um simples ponto luminoso no vídeo, já tinha o tamanho de uma laranja, e crescia a cada dia na tela. A ansiedade tomou conta da tripulação, e todos os sentidos estavam voltados para o Centro de Análises. Agatha, e sua equipe já tinham iniciado a pesquisa dos dois planetas que mais pareciam ter possibilidades. Os computadores que decodificavam as informações vindas dos equipamentos de pesquisa, forneciam a cada dia dados cada vez mais promissores. Passaram alguns dias, até que as últimas análises apareceram nos vídeos. Nem bem a equipe tomou conhecimento, um “hurra” de satisfação ecoou no Centro de Analise, escutado pelos alto-falantes por toda a tripulação, que em coro vibrou também com a noticia. Agatha, com uma folha de relatório nas mãos correu para a cabine de comando, onde Jonas, Clark, e mais dois pilotos, tendo escutado os gritos de alegria, aguardavam ansiosamente noticias do Centro. A expectativa foi pequena. A astronauta entrou correndo na cabine, e com um largo sorriso, entregou o relatório ao Comandante, com um único comentário: - É uma maravilha! Realmente estavam certos. O planeta parecia ser um irmão gêmeo da Terra. As únicas diferenças reais que existiam, eram os fatos de não ter satélites, e as florestas vistas pelo telescópio terem uma tonalidade verde-amarelada. De resto, um teor de oxigênio um pouco maior que a Terra, uma superfície maior de terra firme, mares de tom esverdeado, eram todas as diferenças que puderam detectar. Jonas, nem bem terminou de ler o relatório, exclamou: - Gente! Se é coberto de vegetação deve ter vida animal também! Não acham? Todos confirmaram ao mesmo tempo, e o Comandante virando para a noiva pediu: - Agatha, mostre para nós esse planeta. - Pois não – Afirmou a moça, e se dirigiu para o painel de controle, em frente ao vídeo que agora mostrava a Estrela no centro da tela, quase do tamanho de uma bola de futebol. Chegando lá, acionou alguns botões, e em instantes “Esperança” desapareceu da tela, e no seu lugar se viu uma brilhante meia Lua, se destacando no fundo negro do céu. A visão apesar de ser comum, teve para eles o sabor diferente do desconhecido, da aventura, do inimaginável. Sentiram-se como os desbravadores na Terra, que a custa muitas vezes da própria vida, desvendaram todos os segredos do Planeta. -Clark, - disse Jonas, depois de alguns instantes de contemplação do Planeta – Vamos ver o que tem lá... programe a nave para entrar em órbita na linha do Equador. - Ouviram a ordem – afirmou Clark dirigindo-se aos dois pilotos, e completou: - Vamos trabalhar. Os três dirigiram-se para os painéis de controle, enquanto o Comandante, colocando o braço sobre o ombro de Agatha, e ainda contemplando o Planeta no vídeo, perguntou como que para si mesmo: - O que será que vamos encontrar lá? - Não faço idéia, - respondeu Agatha – mas se houver vida inteligente, espero que sejam amigos. Clark e os dois pilotos, durante dois dias terrestres, revezaram-se nos controles da nave. Auxiliados pelo computador da nave, determinaram a rota, corrigiram pequenos erros de direção, entraram em órbita, corrigiram a velocidade, e quando os propulsores pararam, estavam perfeitamente sincronizados com a rotação do Planeta, a algumas centenas de quilômetros de altura. Tinham “estacionado” entre a Estrela e o Planeta, e na tela no vídeo, ocupando quase toda sua superfície, ele aparecia, num tom verde azulado, mostrando por entre as nuvens brancas de um lindo dia, os contornos tênues de um imenso continente. Clark fez os últimos ajustes nos controles, girou na poltrona, e dirigindo-se para o Comandante, apontou a tela e disse: - Missão cumprida! - Excelente! – exclamou Jonas, ao mesmo tempo que pegou o vídeofone, ligou para a cabine de transmissão, e quando atenderam, perguntou: - John, alguma novidade? John, responsável por todo o sistema de transmissão,e recepção da nave, vinha a dias tentando “escutar” alguma coisa nos potentes equipamentos, sem nenhum resultado. Foi por isso que com voz desalentada, respondeu ao Comandante: - Jonas, parece que o Hertz deles não nasceu ainda por aqui... Não tem nenhum sinal... - Bem, isso não quer dizer nada. Nós também na Terra éramos mudos até bem pouco tempo... Concorda? - É, mas seria bem mais interessante se a gente captasse algum “rock pauleira” vindo lá de baixo... Não acha? - Está bem – confirmou Jonas, rindo da idéia, e encerrando a conversa aconselhou: - Continue tentando. Virou então para Clark que o observava interrogativamente, e disse – WE existem estão se comunicando com pombos correios. - Eu imaginava isso! - Porque? – perguntou Jonas. -Muito verde lá em baixo, muita mata. Civilizações avançadas já teriam destruído toda essa cobertura. - Também não é assim. Você está admitindo que todas as civilizações que por ventura existam no Universo sejam constituídas de vândalos, como na Terra. Clark levantou as mãos em tom de desculpa, e Jonas batendo a mão no seu ombro, disse: - Vamos ver se Agatha tem alguma novidade. Ambos saíram da cabine de comando, e por um largo corredor alcançaram o Centro de Análise e Pesquisa. Os técnicos comandados pela cientista, estavam todos ocupados analisando os dados vindos do Planeta. Clark, e o Comandante se aproximaram de Agatha em pé, encostada numa poltrona, e sem rodeios Jonas perguntou: - Que me diz? -Oh! É desalentador, não achamos nada até agora que indique algum tipo de civilização. - Nem vida? - Sim. Isso é possível. O telescópio mostra lagoas, florestas, campos, mas nada que se pareça com uma cidade ou um aglomerado de casas. Alguns campos são cortados por trilhas tortuosas que só podem ser de animais. - Nada com traçado geométrico? – perguntou Clark - Estradas, você quer dizer? – inquiriu Agatha - Sim! - Nada... Nem retas, nem curvas...Nada. - Bem, se tiver animais, já é alguma coisa. O diabo é se forem dinossauros – gracejou Clark. - Não... disse Agatha – Animais grandes teriam sido detectados... - Bem... Para sabermos com certeza, só descendo lá – disse Jonas, e virando para o Subcomandante, pediu: - Convoque uma reunião de toda a tripulação para daqui uma hora. - Positivo. – disse Clark, saindo do Centro para cumprir sua missão. _______________________________ CAPITULO II No pequeno auditório da espaçonave, toda a tripulação reunida, aguardava a presença do Comandante. Alguns minutos depois, Jonas acompanhado de seu Subcomandante, entraram no salão, e se acomodaram num balcão, em frente a toda a tripulação. Em instantes as conversas cessaram, e no silencio que se seguiu, o Comandante falou: - Meus amigos, finalmente temos lá em baixo, algo de positivo.Espero que seja o primeiro de muitos outros. Não parece ser um planeta habitado por seres inteligentes, mas fornece todas as condições para a vida de seres humanos, portanto devemos efetuar uma exploração mais detalhada. Essa é nossa missão. Amanhã faremos uma primeira expedição a superfície do planeta... Todos bateram palmas, interrompendo a palavra do Comandante, entusiasmados com a noticia. Jonas pediu silencio e continuou: - Antes de falarmos da expedição, queria informar, e deve constar do diário de bordo, que por ser o primeiro planeta que encontramos com características semelhantes a Terra, resolvemos dar-lhe o nome de Pioneiro... - Viva o Pioneiro! – gritou um tripulante no meio do auditório, e toda a tripulação em coro respondeu: - Viva! Em seguida, estrondosas palmas, confirmaram a aprovação de todos pelo nome. Jonas levantou as mãos pedindo silêncio, e continuou: - O.K. – Vamos agora organizar a expedição. A nave de exploração deve ser checada, e estar pronta para decolar amanhã cedo. Levarei comigo quatro tripulantes... Um silêncio completo se fez entre todos. Havia ansiedade em saber quais seriam os felizardos que acompanhariam o Comandante na primeira expedição ao planeta. Por isso todas as atenções se voltaram para as indicações. Jonas continuou: - Como piloto o Capitão Gerson. Gerson na primeira fila levantou o braço de punho cerrado, com um largo sorriso no rosto. - Capitão Drumont, e Sargento Joel, na transmissão, e manutenção. Ambos que estavam sentados, um ao lado do outro, levantaram sorrindo, e se abraçaram enquanto todos os homens aplaudiam. - Por último a Doutora Agatha na análise e pesquisa. – completou o Comandante. Algumas vaias se ouviram entre os homens, no meio da gritaria das mulheres, por terem uma representante do sexo feminino na expedição. Jonas pediu silencio novamente, e disse: -A reunião está encerrada, partiremos amanhã as sete horas. Alguém no meio da tripulação perguntou: - Horário terrestre ou local? - Local! – esclareceu Jonas levantando juntamente com Clark, e retirando-se do auditório, acompanhado por todos. No corredor, Clark caminhando ao lado do Comandante, comentou: - Tive esperança de poder ir também! - Você terá oportunidade para isso, mas não agora... Fez uma pausa e continuou: - Não sabemos o que tem lá em baixo, portanto não é conveniente que a nave fique sem comando. - É lógico... Eu compreendo... Falei por falar – afirmou Clark resignadamente, encerrando o assunto. No dia seguinte Jonas, e sua tripulação, usando vestes espaciais, tomaram o elevador que os levaria da periferia da nave, onde por rotação existia uma gravidade artificial, até o centro, onde nem gravidade nem atmosfera havia. A medida que o elevador avançava para o centro da nave, os astronautas foram se sentindo cada vez mais leves, até que chegando ao seu destino, estavam se segurando em alças para não flutuarem. Quando a porta do elevador se abriu, sentiram-se girando lentamente, na lateral de um imenso salão, onde no centro, flutuando no espaço, e presa por amarras, a nave de exploração, feericamente iluminada, aguardava seus ocupantes. Jonas, com um pequeno impulso flutuou no espaço, segurou uma das amarras ao lado do elevador, e usando ela como guia, impulsionou-se na direção da nave de exploração, sendo imediatamente seguido pelos outros. Num último impulso o Comandante alcançou uma alça ao lado da porta da nave, onde se equilibrou. Em seguida abriu um pequeno postigo, onde no fundo se via um teclado luminoso. Digitou a senha conhecida por toda a tripulação, e a porta da nave, impulsionada por comandos silenciosamente. Jonas, e os outros hidráulicos, se abriu entraram flutuando, e se sentaram em poltronas reclináveis, na frente dos painéis de controle, cada um se prendendo com largos cintos de segurança. O Capitão Gerson, autorizado pelo Comandante, acionou alguns botões no painel de controle. A porta atrás deles se fechou, luzes iluminaram toda a cabine, e um sibilar característico, indicou que a nave estava sendo pressurizada. Alguns instantes depois, uma luz vermelha no painel, mudou para verde, indicando a pressurização completa. Com as pressões igualadas, o Comandante, e todos os tripulantes, desgrampearam, e retiraram os capacetes e luvas. Agora, que os sons externos já eram audíveis, Agatha, guardando o capacete, e as luvas, em um compartimento por baixo da poltrona comentou: - Nunca vou me acostumar com esta parafernália. - É! Mas lá fora é mais confortável com ela do que sem... Não é? – gracejou Joel. - Engraçadinho – resmungou Agatha. Gerson tinha ligado os vídeos-transmissores da nave, e enquanto se deitavam nas suas poltronas reclináveis. Jonas em voz clara informou: - Estamos prontos Clark. No vídeo o Subcomandante respondeu: - Certo, aguardem a contagem regressiva. A Exploradora – nome da pequena nave – com sua rota de abordagem do Planeta previamente programada, seria na primeira etapa comandada pelos computadores da nave-mãe. Depois que tivesse entrado na atmosfera do Pioneiro, e reduzido sua velocidade, o piloto da Exploradora assumiria o seu controle. Passaram alguns instantes, e a voz metálica do computador se ouviu, iniciando a contagem regressiva – 4,3,2,1 As amarras se recolheram automaticamente, as seis turbinas a jato brilharam de forma ofuscante, e a maquina subiu lentamente, passando pela imensa escotilha da nave-mãe, em direção ao céu negro de Esperança. A pequena nave fez uma ampla curva, acelerou seus motores, e entrou tangenciando a atmosfera do Planeta. Lá dentro, os tripulantes achatados contra suas poltronas, mãos crispadas, agarrando as próprias vestes, aguardavam ansiosamente a pressão diminuir. Alguns minutos depois, a nave, já próxima a superfície do Planeta, auxiliada por jatos laterais, fez uma curva fechada, dirigindo seus propulsores para a superfície do Pioneiro, e passou a descer lentamente. A trepidação, e a pressão sobre os astronautas diminuíram instantaneamente, e ao mesmo tempo a voz do computador tornou a se ouvir: - Reversão completa. Favor assumir comandos. Jonas, e os outros voltaram suas poltronas a sua posição normal, entre suspiros, e alguns palavrões de alivio. Gerson ligou uma série de aparelhos no painel a sua frente, conferiu a velocidade de descida, regulou os jatos, e em seguida informou: - Controle manual assumido. - Obrigado, e boa viagem. – saudou polidamente o computador. Drumont ligou o vídeo, e apareceu a imagem de uma área do Pioneiro exatamente embaixo da nave. Viam-se nuvens esparsas ligeiramente rosadas, refletindo a cor avermelhada de Esperança, e por entre as nuvens já se percebia o verde amarelado da vegetação do continente sobre o qual estavam . Jonas perguntou ao piloto: - Que altura estamos? Quinze mil metros, descendo a três mil metros por minuto. A nave varou rapidamente a camada de nuvens, e a mata cerrada do Planeta, no seu tom mesclado, apareceu nitidamente. Gerson aumentou a potência dos propulsores, e a exploradora reduziu sensivelmente sua velocidade de descida. - Aumente o campo visual. – pediu Jonas. Drumont acionou alguns botões, e no vídeo a imagem do solo se distanciou, ao mesmo tempo em que se ampliava, mostrando ao longe, a esquerda, além da mata, algumas montanhas baixas. O Comandante disse: - Vamos em direção aquelas montanhas, é possível que encontremos algum campo limpo. Sob o comando do Piloto a nave se estabilizou na altura que estava, sofreu uma ligeira inclinação, e partiu na direção das montanhas, que no vídeo se aproximaram rapidamente. Estavam já bem próximos as primeiras elevações, nuas de vegetação, quando perceberam que a floresta rareava em vários lugares dando lugar a clareiras esparsas, onde manchas escuras denunciavam a existência de terreno pedregoso. - Qualquer uma dessas clareiras serve...Vamos descer – disse Jonas. A nave sob o comando do hábil piloto, fez uma curva suave a medida que mais se aproximava do solo. Passou próximo ao sopé dos montes, sobrevoou um pequeno lago de águas azuis, e dirigiu-se diretamente a uma clareira que apareceu a direta do vídeo. Drumont aproximou novamente a imagem na tela do vídeo. As copas das arvores se tornaram extremamente nítidas e próximas, passando lentamente na tela, dando de repente lugar a um chão de mato ralo, entremeado de pedras de todos os tamanhos. Nessa altura a nave estacionou completamente no ar, a uns cem metros de altura. Em torno dos jatos, a fuselagem se abriu, e longas pernas articuladas se projetaram para fora da nave. Em seguida, aquela estranha máquina aos olhos de um mundo desconhecido, foi abaixando lentamente, até que suas longas pernas tocaram o solo rochoso bastante desigual da clareira. A nave tinha sido projetada para pousar em qualquer terreno. Suas pernas retrateis se adaptaram aos desníveis do solo, travaram-se nas diversas alturas, mantendo a nave perfeitamente nivelada. Gerson desligou todos os propulsores, virou para Jonas, e com um largo sorriso, exclamou: - São e salvos! _____________________________ CAPITULO III Todas as imagens filmadas pelas câmeras estavam sendo transmitidas para a nave mãe, onde toda a tripulação, no auditório estava assistindo com grande interesse. Quando a nave pousou, todos bateram palmas, se congratulando com Gerson pela feliz aterrissagem . Clark, através do vídeo-transmissor reclamou: - Jonas, não esqueça a galera... Liga logo essa TV. O que o Subcomandante queria é que mudassem a imagem, para poderem ver o novo Planeta. Jonas sorrindo fez um sinal a Drumont que imediatamente clicou algumas teclas, e a tela quadrada do vídeo que estavam olhando até ali, se ampliou numa enorme tela curva retangular, abrangendo todo o painel de controle, e fornecendo uma imagem tridimensional de toda a área na frete da nave.. Pedras, arvores descomunais, arbustos, mato, frutas, flores, tudo muito semelhante a qualquer floresta do Planeta Terra. A única diferença consistia nas arvores com folhas amarelas, e troncos muito verdes, que se intercalavam com as outras, de aspecto comum para os terráqueos. - Nenhum sinal de vida! – comentou o Subcomandante pelo transmissor. - Mesmo que tenha, é normal, - esclareceu Jonas – o estardalhaço que fizemos ao pousar, espantaria até dinossauros. Se houver animais neste Planeta eles vão aparecer com certeza. De qualquer maneira nós vamos descer já...vou deixar ligado o vídeo... - Positivo, – afirmou Clark – mas vejam bem... Não quero ensinar Padre-nosso pro vigário, mas não esqueçam que vocês não estão no Central Park! Todos riram da preocupação do Subcomandante, mas era válida. Oito anos de convivência tinha tornado todos grandes amigos, e uns se preocupavam muito com a segurança dos outros. - Esta bem mamãe – brincou Jonas. Nesse ínterim todos retiraram os trajes espaciais, e por baixo já estavam vestidos com roupas bastante leves, próprias para enfrentarem o calor da região. Alguns minutos depois, a porta da nave abriu, uma escada telescópica embutida no pé da porta, se desdobrou até o solo, e os cinco astronautas desceram até o solo daquele planeta tão parecido com o deles. Joel carregava uma grande mochila nas costas com mantimentos, e remédios. Drumont transportava um poderoso transmissor. Agatha levava também uma pequena mochila com vários produtos para análise. Gerson, e todos os outros carregavam uma poderosa arma regulável, capaz de varar um muro de concreto com um minúsculo furo, ou explodir em pedacinhos uma pedra de granito de duas toneladas. No cinturão de cada um, uma longa faca serrilhada de cabo grosso, e lâmina vibratória, que quando ligada poderia torar em pouco tempo uma barra de ferro de uma polegada de diâmetro. Estavam poderosamente armados, mas assim mesmo, parados no pé da escada, se sentiram pequenos, e indefesos, em face de uma terra exuberante, e estranha, apesar da semelhança com seu Planeta natal. O paradoxo era evidente, viajando numa nave interplanetária, a uma fantástica distancia de casa, se sentiram sempre confiantes. Ali, onde mesmo se houvesse uma catástrofe com a nave, poderiam pelo menos garantir a existência, a insegurança tomava conta dos exploradores. Porem, apesar de ser, no intimo de cada um, uma verdade, ninguém demonstrou o que estava sentindo. Jonas abriu um pequeno compartimento no seu cinturão, apertou um botão, e a escada se retraiu, desaparecendo por baixo da porta, que por sua vez num baque surdo, lacrou a entrada da nave. Agatha, ao lado do Comandante, segurou levemente seu braço, e perguntou: - E agora? Alienígenas em um mundo desconhecido, momentaneamente estavam paralisados pela súbita consciência da gravidade da espantosa aventura de que estavam sendo protagonistas. Jonas olhou rapidamente para a luz forte e avermelhada da Estrela a sua direita, a meia altura do belíssimo céu do Planeta. Virou para a linha de montanhas baixas a esquerda, pensou mais um instante, e disse: - Vamos para o Norte, é uma direção tão boa quanto as outras, e essas montanhas são uma excelente referência. Ninguém comentou nada. Iniciaram a caminhada, e Drumont apontando em frente, chamou a atenção dos companheiros. Sobre as arvores da mata, ao longe, vários pontos pretos evoluíam graciosamente no céu. - Pássaros! – exclamou Joel. - Tem vida no Planeta! – afirmou Jonas – Precisamos ter muito cuidado, não temos a mínima idéia do que vamos encontrar! Ninguém disse nada. Drumont apertou fortemente a arma que carregava, como que para se certificar que ela estava ali, na sua posse. Caminhando por entre as pedras, pisando em mato rasteiro, chegaram a borda da floresta. Não era emaranhada, nem muito densa. Os raios de luz de Esperança varavam a copa das frondosas árvores, e iluminavam claramente o chão coberto de folhas mortas. Penetraram na mata em fila indiana, Jonas na frente, cortando com sua faca um ou outro galho atravessado no caminho. Sem nenhum esforço maior, a lâmina cortava os galhos como se fossem feitos de manteiga, e assim avançavam sem interrupção. Em pouco tempo os sinais de vida começaram a aparecer. Canto de pássaros, pios, grunhidos, pequenos vultos voando na copa das árvores. Um enorme pássaro preto passou voando sobre a cabeça dos astronautas. Muitas aves multicoloridas se viam pousadas nos galhos. Tudo ali muito Terrestre, até que um súbito tropel na mata, e saindo de uma trilha por entre as árvores, um cavalo baixo, e atarracado, com longa crina, e dois pontudos, e ameaçadores chifres, estancou abruptamente na frente dos navegantes do espaço. Cinco armas se engatilharam instantaneamente, e o animal com um relincho surdo, virou nos cascos, e a galope sumiu na mata. - Na Terra tem disso? – perguntou Gerson. - Chifrudo, só em conto de fadas! – comentou Joel. Nisso um esturro arrepiante se ouviu dentro da mata. Jonas aconselhou: - Vamos ficar atentos... Pelo jeito, não é só cavalos com chifres que tem por aqui! Continuaram andando rumo ao Norte, cautelosamente. Pararam na borda de uma pequena clareira, onde um bando de animais parecidos com porcos, mas com longas orelhas, assustaram, saíram correndo, e desapareceram na mata. Aproveitaram o lugar para descansar um pouco. Sentaram num tronco de arvore caída, na beira da clareira, e Joel retirando alguns tabletes de ração concentrada da mochila ofereceu aos companheiros. - Precisamos achar água logo – comentou Drumont, chacoalhando o cantil. - Não é difícil que a gente encontre algum córrego vindo das montanhas – sugeriu o Capitão Gerson. - Com certeza, – afirmou Agatha – mas a água da para mais dois dias. Passado algum tempo, todos se levantaram, atravessaram a pequena clareira, e entraram novamente na mata. Algumas horas depois desceram por uma meia encosta, onde a mata se adensava, e no fundo acharam um pequeno córrego de água transparente. Enquanto Agatha examinava a água, Jonas apontou algo beirando o córrego, que vinha rastejando logo acima de onde estavam. Todos olharam curiosos o bicho, que mais parecia uma minhoca. Se movia da mesma maneira, mas tinha mais de quatro metros de comprimento, e uns quinze centímetros de grossura. - Se as minhocas aqui são assim, de que tamanho vão ser os insetos? – perguntou Drumont. Joel riu sem graça, meio impressionado com o tamanho do verme, e a minhoca nesse ínterim desapareceu num buraco na beira do córrego. Agatha, que tinha se distraído com a minhocaçu, retornou a análise da água, e depois de alguns instantes afirmou: - Pura, com alto teor de oxigênio. De sede não morremos. - Ótimo disse Jonas – despejando o resto da água do cantil, e agachando, tornou a enche-lo na correnteza do córrego. Todos repetiram seu gesto, e alguns minutos depois, continuaram pela mata, subindo a encosta, do outro lado do pequeno rio. Tinham mantido o tempo todo o rumo Norte, e essa direção os tinha aproximado das montanhas que vez ou outra apareciam por entre os claros da mata. No fim da tarde, quando já tinham andado bastante sem nada encontrar de extraordinário, resolveram parar para passar a noite. Afinal o dia daquele planeta tinha trinta e duas horas Terrestres, e pelos cálculos de Drumont já estavam andando a mais de quatorze. Pararam numa pequena clareira coberta de folhas secas. Já escurecia, quando, sentados no chão, Joel distribuiu um tablete de ração para cada um, a titulo de “jantar”. Um único tablete daqueles parecia muito pouco para alimentar uma pessoa, mas era engano. Além do alto teor alimentício, possuía também fibras liofilizadas, que se avolumavam no estomago, deixando uma impressão de total plenitude. Para o paladar porem, apesar dos sabores diversos, era uma total negação. Por isso Joel, sacudindo a barra que estava comendo, disse: - Amanhã vou dar uma volta por ai, pra ver se acho algo que se coma no lugar disto! - Um daqueles orelhudos que vimos hoje, deve dar um bom assado, não acham? – perguntou Gerson. - Trouxe o sal? – perguntou Agatha para Joel. - Um quilo, pelo menos! – respondeu Joel, sorrindo. Enquanto os companheiros conversavam, Jonas transmitia pelo radio para Clark, na nave mãe, os acontecimentos daquele dia. Quando terminou, voltou a se reunir com os outros e, deitando nas folhas comentou: - Vamos caminhar mais algumas horas amanhã, se nada mudar, voltamos para a nave, e vamos explorar outra região. - Ótimo... Mas antes me deixa caçar nosso “churrasco”... Concorda? - Não vá levar toda a manhã! – foi o único comentário do Comandante. Tinha já escurecido bastante, e mal se enxergavam uns aos outros. Agatha tirou da mochila um minúsculo globo fixado num pequeno pedestal. Apertou um botão na base do mesmo, e o globo se ascendeu com uma luz forte o suficiente para iluminar a área onde estavam. Dependurou a lanterna num galho de arvore, enquanto Joel retirava da mochila pequenos pacotes escuros, e os distribuiu para os companheiros. Cada um desdobrou seu pacote, que nada mais era que um folgada macacão com capuz, feito de um tecido finíssimo e poroso, mais resistente que uma malha de aço. Agatha juntou algumas folhas no chão, formando um colchão, vestiu o macacão, e olhando através dos óculos do capuz, ligou um pequeno fio que saia da vestimenta a uma bateria minúscula embutida no cinturão, fechou o zíper, e deitou para dormir. Ela estava com frio, e a bateria manteria a veste numa temperatura agradável. Jonas distribuiu os turnos de vigia, e também se acomodou para dormir. Drumont, o primeiro do turno, colocou um volumoso par de óculos, pegou a arma, apagou a lanterna, e sentou encostado num tronco, a alguns metros dos companheiros. Os óculos permitiam a Drumont enxergar até um mosquito no escuro, e a arma seria capaz de acertá-lo sem acordar ninguém. Os exploradores se revezaram na vigília durante toda a noite, que passou tranqüila. Os óculos localizaram alguns animais que se aproximaram do grupo, mas nenhum passou da borda da clareira. _____________________________________ CAPITULO IV Quando clareava o dia, Joel que tinha sido o último na vigília, acordou os companheiros, jogou a arma nas costas, e saiu a procura de sua presa. - Boa caçada – gritou Gerson, para o amigo que desaparecia na mata. - Não vá levar o dia inteiro – relembrou o Comandante em voz alta. Para ocupar o tempo enquanto esperavam a volta do companheiro, Gerson e Drumont se distraiam com um joguinho de dados. Gerson, mais azarado, já estava devendo um bocado de dinheiro, mas teimava em continuar na esperança da sorte mudar. - Não esquenta, que até o fim da viagem eu tomo tudo de volta! - Uma merda que eu vou atrás disso. Você me paga primeiro, depois a gente continua. - Cara, você é maluco, acha que eu trouxe a carteira comigo? Enquanto os dois amigos discutiam, Agatha e Jonas exploravam os arredores. - Jonas – chamou a moça. - Fala! - Você já reparou que nesta mata não tem mosquitos, nem formigas! - Nem borboletas, nem larvas, a natureza parece que se esqueceu de criar pragas por aqui! - Se for tudo assim, é quase um paraíso – disse Agatha maravilhada. De repente, um urro de dor, acompanhado de um rouco estertor, fez-se ouvir ao longe na mata, paralisando os quatro astronautas. - Foi humano! – sussurrou Agatha. - Joel? – gritou Drumont levantando rapidamente. - Calma – disse Jonas se aproximando dos companheiros, acompanhado de Agatha. - Joel! – gritou Gerson com toda força dos pulmões. Nada se ouviu. Até o som dos pássaros tinha silenciado. - Vamos seguir a trilha dele – disse Jonas, jogando nas costas a mochila de Joel, recolhendo suas coisas, imitado pelos companheiros. Correram para a mata no rumo que Joel tinha ido. Em pouco tempo acharam os galhos cortados pela faca do companheiro. Andaram vagarosamente, armas em punho, vigiando todos os cantos da floresta, bem afastados uns dos outros, Jonas seguindo os vestígios da trilha deixada por Joel. Vultos parecendo macacos agitaram os galhos no alto de umas arvores próximas, fugindo assustados com a presença dos intrusos. Já estavam andando a algum tempo quando encontraram uma trilha larga e desimpedida. Era lógico supor que Joel tivesse seguido por aquela trilha para um dos lados. Jonas pediu aos amigos que esperassem, e passou a procurar rastros no capim úmido da trilha. Para a esquerda achou a impressão nítida de uma bota. - Por aqui! – gritou para os companheiros. Jonas mostrou a pegada no solo, e disse: - Ele foi por aqui. Sempre atentos, reiniciaram a marcha no rumo que Joel devia ter seguido. As arvores rarearam, a trilha se alargou, e pelas falhas na mata se via as rochas cinzentas das montanhas próximas. Jonas completou uma curva da trilha, e parou de repente. Agatha que vinha logo atrás, se aproximou, olhou por cima do ombro do noivo, e soltou um grito de terror. Os outros dois aceleraram o passo, se emparelharam com o casal, e os quatro permaneceram estáticos por alguns instantes, sem acreditar no que estavam vendo. No meio da trilha, dependurado pelos pés por uma corda feita de couro, o corpo de Joel balançava levemente, atravessado por meia dúzia de flechas toscas e curtas. No chão, uma poça de sangue que pingava de seu corpo, e no rosto de olhos arregalados uma expressão de susto e pavor. - Meu Deus! – exclamou Agatha a ponto de chorar. - Protejam-se – foi a ordem ríspida do Comandante. Soldados experientes, além de astronautas, treinados para qualquer tipo de situação, sumiram instantaneamente por entre os ramos da floresta. De seus esconderijos, passaram a observar tudo, atentos aos mínimos ruídos, a espera dos malditos seres que tinham preparado aquela armadilha. Passaram horas, e nada aconteceu. Jonas cansou de esperar. Fosse qual fosse as conseqüências, não podia deixar mais tempo o amigo morto, naquela situação. Resolveu dar-lhe sepultura mesmo arriscando qualquer surpresa. Deu um sinal aos companheiros na mata, do outro lado da trilha, apontou o fuzil para a corda que prendia Joel. Um raio branco silencioso e certeiro partiu o couro, e o corpo do infeliz astronauta despencou amontoando no chão. Gerson e Drumont correram para o amigo morto, enquanto Jonas e Agatha ficaram na borda da trilha vigiando atentamente a mata. Ambos tinham acabado de endireitar o corpo de Joel, quando Jonas percebeu do outro lado da trilha um vulto escondido na folhagem. No mesmo instante que resolveu contornar o espião para pega-lo de surpresa, se tornou audível ao longo da trilha um furioso tropel, acompanhado de estranhos guinchados. O barulho assustou o vulto escondido na folhagem, que saiu correndo, acompanhado de outros três, que estavam também escondidos, e Jonas percebeu 2que pareciam seres humanos, quase nus. - Venham – gritou para os outros, ao mesmo tempo que saiu correndo, atravessou a trilha, e entrou na mata no encalço dos fugitivos, seguido de perto pela noiva. A necessidade de pegar os indígenas era tão grande que não prestou atenção no barulho que vinha da trilha. Para ele, aqueles miseráveis tinham matado Joel. Naquele momento sua raiva se tornou enorme, e enquanto corria dizia para si mesmo que se depende-se dele pegaria aqueles nativos vivos ou mortos, custasse o que custasse. Esqueceu os companheiros, e na corrida tentou vária vezes atirar mas, os vultos desapareciam constantemente, escondidos pela folhagem, e Jonas não conseguia firmar pontaria. Os indígenas eram bem mais rápidos que ele, conheciam perfeitamente a mata, e estavam de mãos vazias. Por isso quando o Comandante saiu na borda da mata, no sopé da montanha, eles já estavam longe, subindo com grande agilidade a meia encosta bastante íngreme, e cheia de pedras de todos os tamanhos. Jonas apontou sua arma para os fujões, e através da luneta telescópica pode vê-los perfeitamente. O tom dourado da pele queimada pelos raios de Esperança, indicava que eram brancos, sem pelos, nem barba, cabelos corridos longos, vestindo tangas provavelmente de couro. De onde estava poderia abater os quatro um a um, porem não o fez. A corrida tinha arrefecido seu ódio, e a razão começou a falar mais alto. Pensou que mata-los não iria esclarecer nada. Joel tinha sido morto a flechadas, e aqueles nativos não carregavam armas, poderia não ter sido eles. Esses pensamentos salvaram a vida dos indígenas. Levantou o telescópio do fuzil no rumo que os quatro estavam subindo. Num patamar acima deles, cheio de pedras, muitos outros nativos, vigiavam a subida dos companheiros, e por traz deles aparecia na rocha o contorno escuro e irregular da entrada de uma grande caverna. Nesse instante os astronautas alcançaram o Comandante, e Agatha que vinha na frente perguntou; - Onde estão? Jonas apontou a caverna na montanha, onde os quatro tinham acabado de chegar. - Então é ali que moram! – disse Drumont para si mesmo, examinando a encosta da montanha com o telescópio. Abaixou a arma, e disse: - Vamos atrás deles... Mataram Joel. - É preciso provar isso primeiro... Aqueles quatro não tinham armas. – comentou Jonas. - Pode ser, mas algum deles... Eu torceria o pescoço de todos – sussurrou Gerson. - Não é por ai! Não viajamos oito anos no espaço, para vir nos vingar de um bando de nativos, por conta de um descuido nosso... E ainda sem provas – concluiu Jonas. Todos ficaram calados. Sabiam que o Comandante estava certo, por isso engoliram a raiva, assim como ele já tinha feito. Agatha perguntou: - Mas vamos entrar em contato com eles... Não? Sim é claro. Mas hoje não, – argumentou Jonas – a tarde vai no fim, e temos que enterrar o Joel antes que algum animal o ache. Dizendo isso, virou, retornando para a mata, seguido pelos outros. O Comandante foi o primeiro a chegar na trilha onde estava o astronauta morto. Estancou repentinamente, e estendeu o braço barrando a passagem dos amigos. Joel tinha desaparecido. - Porca miséria! – exclamou Gerson, revelando sua origem latina. Jonas, olhando em volta, apontou alguma coisa na folhagem, a sua esquerda. Na direção que Jonas apontava, no meio das folhas se via um grosso galho recurvado, onde se prendia uma espécie de catapulta armada com meia dúzia de flechas curtas, sujas de sangue. - Grandes filhos da puta ... Armaram a coisa outra vez – falou Drumont entre dentes, e concluiu – Vamos destruir aquela montanha, e acabar com aquela raça... Por isso não tinham armas! Nesse instante Gerson virou na trilha, viu qualquer coisa escura aparecendo no meio das folhas secas do outro lado, ameaçou andar, mas foi seguro pelo ombro por Jonas. - Espere – disse Jonas. Abaixou, pegou um pedaço de tronco de arvore, e jogou no meio da trilha, onde antes estava o corpo de Joel. Ouviu-se um estalo seco, depois o barulho sibilante de uma corda sem violentamente esticada, e o pedaço de tronco subiu no ar, preso por um laço, no mesmo instante que a catapulta ao lado deles se desarmou, e uma chuva de flechas ensangüentadas passou zunindo por baixo do tronco, e todas se perderam do outro lado da trilha. Drumont apontou um nó bem dado, acima do laço, no lugar onde Jonas tinha partido a corda com um tiro, e comentou: - Eles emendaram! Foram aqueles índios? – perguntou Agatha. - Por enquanto é difícil de dizer... Mas vamos descobrir – disse o comandante. Gerson tornou a se interessar pelo que tinha atraído antes sua atenção. Atravessou a trilha, seguido pelos outros. Com uma cara transtornada com o que viu, virou rapidamente, e barrou a moça, que vinha na frente,puxou seu braço, e disse: - Não... Não olhe. Os outros dois avançaram curiosos, e ficaram paralisados, olhando sem acreditar. No meio das folhas secas e ensangüentadas, se acumulavam as vísceras, e outros órgãos internos, com certeza do infortunado amigo morto. Ao lado, próximo a mata, estavam as mãos decepadas, e os pés ainda vestindo as botas, amontoados sobre as roupas rasgadas,e sujas de sangue do infeliz Joel. O espetáculo macabro porem, não parou ai. Drumont viu um rastro de pingos de sangue para dentro da floresta, seguiu a trilha, afastou com o cano da arma algumas folhas, e horrorizado encontrou a cabeça decepada do amigo. - Esquartejado como um frango! – sussurrou. Sem dizer nada, Jonas que também tinha visto a cabeça se afastou seguido de Drumont. Segurou Agatha pelo ombro, ao lado de Gerson, e disse: - Não vá ... São os restos de Joel, é trágico demais. - Quem fez isso – afirmou Drumont apontando para trás – é canibal. Ninguém tinha ânimo para comentar nada. Ficaram ali parados alguns instantes sem saber o que fazer. Jonas rompeu o silencio – Já esta anoitecendo, não é conveniente ficarmos aqui... Vamos cobrir aqueles retos com folhas, e vamos embora – e completou: - Agatha fique aqui. Os três astronautas cumpriram sua nefasta missão, e junto com a moça retornaram pelo caminho onde tinham perseguido os nativos. _______________________ CAPITULO V Já tinha escurecido quando os astronautas chegaram na borda da mata, no sopé da montanha. Lá em cima, no patamar em frente a caverna, brilhava uma fogueira, e em volta se moviam os vultos dos indígenas. - Será que são realmente canibais? – perguntou Agatha em tom assustado. - É possível, - afirmou Jonas – amanhã vamos descobrir. Enquanto Agatha, Gerson, e Drumont continuaram em pé vigiando os nativos, Jonas ligou o transmissor, e relatou para Clark na Nave mãe os acontecimentos daquele dia. Entre exclamações, e interjeições de espanto, Clark escutou sem interromper o relato de seu Comandante. Quando ele terminou, se ouviu a voz abalada de Clark no rádio. - Jonas vocês são poucos ai... Correm perigo. Joel morreu... Pense em Agatha... Volte... Você pode retornar depois, com um numero maior de homens... O Comandante interrompeu o pedido de Clark – Joel se descuidou... Não sabia. Estas armas seguram um exército de índios... Não se preocupe, ninguém mais vai se machucar. Eram soldados, e a cega obediência aos superiores tinha sido fundamental para manter a ordem na nave durante os oito anos que viajavam juntos, por isso, sem replicar, Clark afirmou em tom resignado: - Certo... Mas nos mantenha informado. - Fique tranqüilo. – afirmou o Comandante, e concluiu – Vou desligar agora, precisamos dormir. - Boa sorte, e de noticias apenas puder. – reiterou o amigo. - Obrigado – disse Jonas desligando o rádio, e chamando os companheiros. - Devem ter ido dormir, – disse Drumont se aproximando – só tem dois na borda do patamar. - Vamos dormir também, amanhã faremos uma visita aos nossos vizinhos. Os astronautas, sem acender nenhuma luz, vestiram os macacões, e se acomodaram no chão da mata. Jonas, o primeiro no turno de vigia, colocou os óculos de visão noturna, percorreu o olhar em torno, e se fixou na fogueira lá em cima na montanha. Os vultos dos dois índios refletidos pela luz da fogueira, permaneciam na beira da encosta. Jonas pensou – Qual seria o motivo dos nativos manterem uma fogueira acesa, e vigias, a noite inteira? Medo de que? Animais não poderiam chegar lá! - Desistiu de se preocupar, as respostas viriam no dia seguinte. Agatha, a última na vigia, acordou os companheiros na primeira luz do dia de Pioneiro. Em silêncio, sem fazer muitos movimentos, para não despertar a atenção dos índios lá em cima, os astronautas se prepararam para a investida. - Como vai ser? – perguntou Drumont. - Não temos muitas alternativas, - disse Jonas – vamos nos espalhar, e subir o mais rapidamente possível... E vejam... Sem contemplações... Se houver resistência, usem as armas. - Isso você pode ter certeza. – confirmou Gerson, apertando as mãos no fuzil. Alguns minutos depois, com as armas a tiracolo, os astronautas saíram da mata, e iniciaram a escalada da montanha por entre rochas de todos os tamanhos. O caminho era difícil e muito íngreme, exigindo de todos um grande esforço físico, e muita atenção para não despencar pela escarpa abaixo. Já estavam a meia altura da escalada, quando uma saraiva de pedras de todos os tamanhos, caiu sobre os alienígenas. Uma das pedras atingiu o ombro de Drumont que com um gemido abafado se jogou atrás de uma rocha. Os outros também se protegeram rapidamente enquanto as pedras continuaram a zunir em volta deles. Gerson por entre duas grandes pedras apontou o fuzil para o patamar de onde os nativos jogavam as pedras, e com os dentes cerrados disse: - Vou transformar esses animais em poeira cósmica! - Não atire – gritou Jonas, quando percebeu a intenção do companheiro. -Por quê? – perguntou o amigo com raiva – Vão nos matar a pedradas! - Se você atirar, nós é que vamos morrer enterrados... Não percebe? Gerson se deu conta da besteira que ia fazer. - Droga. – resmungou dando um murro na pedra. Os índios tinham parado de atirar pedras, e Jonas perguntou a Drumont - Como está? - Dói bastante, mas acho que não quebrou nada. – respondeu o astronauta. - O.K., vamos descer de vagar, com cuidado chegaremos lá em baixo inteiros. Drumont resmungando uns palavrões de raiva acompanhou os outros que rapidamente se locomoveram para posições mais baixas atrás das rochas. Um alarido alegre se escutou lá em cima. Os nativos estavam comemorando a retirada do inimigo. Enquanto os astronautas de3sciam furtivamente, os índios pararam de atirar pedras. -Estão economizando munição – pensou Jonas enquanto ajudava Agatha a vencer as últimas rochas no sopé da montanha. Retornaram para a mata, e Drumont coçando a cabeça, comentou: - Não entendo? - O que? – interrogou Gerson. - Não fizemos nenhuma demonstração de força... Somos que nem eles... São canibais, e em grande numero... Porque não esperaram a gente chegar lá em cima, para nos massacrar? -São covardes. – sentenciou Gerson. - Covardes não sobrevivem – afirmou Drumont. - Mais cedo, mais tarde, vamos descobrir o que são – comentou Jonas terminando de beber um gole de água. - A água es´ta no fim – afirmou Agatha, sacudindo o cantil. -Porque a gente não acaba com eles daqui? – perguntou Gerson interrompendo a afirmação da moça. - Não tem lógica Gerson! – comentou Drumont. - É verdade. Viemos explorar um mundo, não destruir seus habitantes – disse Jonas concluindo o pensamento de Drumont. - É! Mas tomara que um de nós volte vivo para contar o que viu – resmungou Gerson impaciente com a tranqüilidade dos amigos. - Ora1 Deixe de tragédia – comentou Drumont irritado. - Esta bem... Parem com isso... Vamos tentar subir a noite, agora o melhor é ir procurar água. Dito isso, puxou a faca, e cortando os poucos galhos que atrapalhavam a passagem, embrenhou-se na mata, seguido pelos outros. Drumont, vendo a faca que Jonas usava, lembrou do amigo morto. - Engraçado, - comentou – a faca de Jonas estava ao lado das roupas... Porque será que não levaram? - Se não for ligada, não corta nada. Na certa não acharam serventia para ela. – disse Jonas. - E o fuzil? – perguntou Agatha. - Eu o vi no meio do mato. Acho que quando o Joel foi laçado, a arma escapou da mão, e caiu fora da trilha – disse Gerson. - Porque não pegou? – perguntou Drumont. - Não lembrei! A lembrança do astronauta morto deprimiu todos. Pararam de falar, e continuaram quietos, seguindo o Comandante. O terreno por onde andavam se inclinava ligeiramente, e de onde estavam entre as arvores avistaram num claro da floresta, um pequeno lago cercado por uma praia de areias brancas. Furtivamente se aproximaram da orla da mata. A esquerda deles, agachado na beira do lago, viram um nativo jovem bebendo água com a concha das mãos, totalmente distraído. - É desse que nós vamos ficar sabendo das coisas! – falou Gerson. Jonas tirou a mochila das costas, pousou no chão junto a arma, e disse: - Fiquem aqui... Eu vou por dentro da mata para cercá-lo. Aguardem até eu chegar lá! Virou para seguir, quando Agatha que estava ao seu lado segurou seu braço num forte aperto, e puxou o noivo violentamente. O Comandante virou rapidamente, sem entender, acompanhou o olhar da moça, na direção onde estava o rapaz, e o susto paralisou seus movimentos. Saídos da mata, a meia distância do rapaz, um ao lado do outro, duas grotescas figuras, se aproximavam sorrateiramente do nativo. Pele de um vermelho escuro, joelhos nodosos, pés com dois dedos forquilhados, pernas finas cheias de farpas, embutidas lateralmente num abdômen extremamente volumoso, cintura fina, tórax cartilaginoso, dois braços curtos, finos, de juntas nodosas como as pernas. Cabeça comprida, encimada por duas curtas antenas, olhos pretos amendoados. Saindo das bochechas, duas garras curvas, e entre elas uma boca em forma de meia lua, onde apontavam dois aguçados dentes caninos. Vestiam somente um largo cinturão, provavelmente de couro, envolvendo a cintura, e cruzado no atarracado tórax.. Pareciam enormes formigas andando sobre duas pernas. O que ia pela esquerda do rapaz carregava um bordão grosso e curto, agarrado por uma mão de três grossos dedos saindo de um nódulo no pulso, praticamente sem nenhuma palma. Quando o índio percebeu, os dois já estavam praticamente em cima dele. Tentou fugir, mas um deles o agarrou pelo braço, e o outro, com uma tremenda bordoada estourou a cabeça do infeliz, que em instantes se encharcou de sangue. O que o tinha segurado levantou o corpo do rapaz com incrível facilidade, jogou de atravessado nas costas, e ambos guinchado no que parecia uma conversa alegre, desapareceram na mata antes que os astronautas se refizessem do espanto. - Mama mia! – Onde vim amarrar meu burro! – falou baixinho o piloto. - O tropel, e os guinchados, quando encontramos o Joel... Lembram? – sussurrou Agatha. - Esses são nossos canibais – comentou Drumont. - Não são humanos, e são carnívoros... – afirmou Jonas. - Comeram o Joel! – exclamou Gerson. - Vamos persegui-los? – perguntou Drumont. Jonas raciocinou um instante, e falou: - São inteligentes... Ésta mata deve estar cheia deles, e também de armadilhas, persegui-los sem saber o que vamos encontrar é perigoso. - Vamos embora – pediu Agatha em tom de súplica. - Enquanto tivermos estas armas nas mãos não precisamos temer nada, a não ser surpresas – disse Jonas para acalmar a moça. - Que faremos então? – perguntou Gerson. - Primeiro... Drumont vai encher os cantis... Nós lhe daremos cobertura – pediu o Comandante. Drumont engoliu em seco, lembrou da cacetada que o nativo tinha levado, mas não disse nada. Recorreu os cantis, e olhando muitas vezes para traz chegou até a beira do lago, e num instante voltou com os cantis cheios, sem que nada de anormal acontecesse. Aguardaram mais alguns minutos em silêncio, mas nada se ouvia, a não ser o canto dos pássaros. Aqueles animais com certeza já tinham ido embora, e ninguém tinha visto Drumont. - Vamos retornar pelo mesmo caminho, temos que capturar um daqueles nativos... Ele vai nos dizer que bichos são esses – disse Jonas. Agatha não reclamou. Não era medrosa, e se eles podiam enfrentar aquela parada, ela também. Retornaram pelo mesmo caminho, agora uma trilha aberta, fácil de seguir. Já estavam próximos ao reduto dos nativos, quando começaram a escutar guinchados, e barulho de pedras rolando na encosta. Imaginando o que seria, os alienígenas correram rapidamente pela trilha com as armas engatilhadas, prontos para qualquer ameaça. Agatha no afã de seguir os companheiros, pisou em falso num galho podre, e com um grito de dor caiu no meio da trilha. Os astronautas pararam a corrida, e todos ao mesmo tempo procuraram socorrer a moça. Jonas ajudou Agatha a ficar de pé, mas a torção tinha sido violenta, e ela não conseguia andar. O barulho das pedras caindo, e os guinchos estridentes, agora eram bastante próximos. Jonas virou para Gerson, e disse: - Fique com ela, eu e Drumont vamos ver o que está acontecendo. - Certo – disse o amigo, mostrando um ar de resignação. - Você fica bem Agatha. Voltaremos assim que pudermos. - Cuidado – aconselhou a astronauta aos dois que já se distanciavam. _____________________ CAPITULO VI Jonas, e Drumont correram pela trilha até alcançar o motivo da algazarra. Chegando lá depararam com um espetáculo digno de um filme de terror. Uns trinta animais, iguais aos que tinham visto no lago, escalavam a encosta protegidos pelas rochas, enquanto lá de cima, provavelmente toda a tribo de nativos, na beira do patamar, jogava pedras nos invasores. Uma pedrada atingiu um dos animais, que num guincho de dor, despencou encosta abaixo, pelo meio das pedras. Os outros, porem, nem se abalaram, continuaram subindo protegidos pelas rochas, numa zoeira infernal de guinchados. Para os astronautas, aqueles lá em cima eram seus semelhantes, mereciam apoio e proteção, apesar de terem se mostrado inimigos. Os outros eram animais horrendos e repulsivos. Jonas não teve dúvidas, virou para o amigo e perguntou: - Vamos dar uma mão pra eles? - Pra já! – exclamou Drumont, ao mesmo tempo que seguia o Comandante que já tinha se adiantado. Ambos venceram rapidamente a distância que os separava da meia encosta, e começaram a subir a montanha até se emparelhar com algumas das repugnantes criaturas. Estes, apenas avistaram os intrusos, confundiram os astronautas com os nativos indefesos, e com guinchos de alegria, retiraram os curtos bordões presos as costas, e saltaram na direção dos alienígenas com as garras estalando, e os caninos a mostra. Jonas e Drumont aguardaram que aqueles esquisitos animais se aproximassem bastante. Ai, raios brancos, finos, e silenciosos, partiram das armas mortíferas, e os outros animais espantados, viram as cabeças, e os troncos dos companheiros estourarem em mil pedaços jogando longe os restos estraçalhados dos corpos que rolaram inertes pela encosta abaixo, manchando com uma gosma grudenta, e transparente as rochas na sua passagem. - Não tem sangue! – comentou o piloto. - Acho que são insetos gigantes – gritou Jonas, e concluiu – Vamos continuar. Nesse instante, os nativos quando viram o que acontecia lá em baixo, passaram a saltar, e gritar de alegria pela ajuda inesperada. A maioria dos insetos, ainda na escalada, procuraram descobrir o motivo da alegria dos indígenas, localizaram os astronautas, que continuavam a subir a encosta. Os mais próximos dos alienígenas, sacudindo os bordões acima das cabeças, e partiram na direção dos intrusos. Raios mortíferos porem, barraram suas pretensões. Os mais distantes, vendo os companheiros estraçalhados, se compenetraram que aqueles não eram nativos indefesos. Depois de alguns instantes de indecisão, num repente, despencaram morro abaixo, numa fuga atrapalhada, cheia de tombos espetaculares. Os que chegaram vivos em baixo, desapareceram em desabalada carreira dentro da mata. Em cima um enorme alarido de alegria, saudou a fuga dos invasores. A euforia dos indígenas distraiu sua atenção, e permitiu que Jonas e seu piloto, alcançassem o patamar. Quando os nativos se deram conta da presença dos astronautas, ouve uma correria desenfreada acompanhada de gritos, e tombos. Por fim sob o olhar divertido dos alienígenas, homens, mulheres, crianças, quase todos semi-nus desapareceram dentro da caverna, ou por trás das rochas do patamar. Somente um garoto loiro, de uns doze anos, com um rosto de boneca, permaneceu no lugar que estava, olhando os estrangeiros. Jonas virou para o amigo, e falando baixinho para não assustar o menino disse:- Eu agüento a posição aqui, ajude o Gerson a trazer Agatha. Certo – confirmou Drumont retornando vagarosamente, e sumindo por entre as pedras da borda do patamar. Jonas sentou numa pedra, e olhou em volta. Uma ou outra cara aparecia por trás das pedras, sumindo em seguida. Mais distante, na entrada da caverna, um amontoado de indígenas num canto, vigiava seus movimentos. O Comandante, vagarosamente retirou da mochila uma barra das que comiam no café da manhã, desembrulhou, deu uma pequena mordida, e mastigando mostrou o tablete para o menino, e acenou com a mão para que ele se aproximasse. Passaram alguns segundos, r vagarosamente o menino começou a se mover, mas não veio diretamente para o astronauta. Fez uma longa curva, parando as vezes, mais com vontade de fugir que de se aproximar. Jonas deu uma nova mordida no tablete, e o estendeu para o garoto, já bem próximo. Este se chegando mais, num movimento súbito, esticou o braço, pegou a barra, e se afastou rapidamente. Encostou numa pedra, examinou o tablete, e deu uma pequena mordida. Um sorriso alegre invadiu seu rosto. Pudera, o gosto de mel e coco era delicioso, e o menino nunca tinha sentido nada parecido emtoda a sua vida. Sofregamente, aos pulos, e gritos, comeu rapidamente toda a barra. A demonstração alegre do garoto, fez com que vários nativos perdessem o medo, e saíssem dos esconderijos. O menino, mais confiante de todos, chegou bem próximo, e apontando a mochila do astronauta deu a entender com gestos, e num linguajar estranho, acompanhado de grunhidos, que queria mais. Jonas tirou várias barras da sacola, e partindo pedaços começou a oferecer aos nativos que se aproximavam. Em pouco tempo estavam todos pegando os pedaços de sua mão. Depois de experimentarem, alguns riam achando muito gostoso, outros cuspiam fora fazendo caretas, tudo com enorme alarido de palavras estranhas, e grunhidos. Parecia que toda a tribo tinha se reunido em volta de Jonas, e se colocando de pé continuou a distribuir as barras em pedaços, até que retirando a mochila das costas, mostrou a todos que estava vazia, e a jogou no chão como utensílio inútil. Como animais disputando um petisco, dezenas de homens, e mulheres se embolaram na disputa da sacola, com tapas, puxões de cabelo, e mordidas. Um conseguiu arrancar a mochila das mãos dos outros, e saiu correndo para dentro da caverna, seguido por meia dúzia de outros. Todos riam a ponto de rolar no chão, e esqueceram o astronauta que praticamente se incorporou na tribo. O menino segurou sua mão, e Jonas colocando o fuzil a tiracolo começou a andar pela área. Tinha curiosidade em saber como vivia aquela gente, e não entendia como vivendo tão primitivamente, possuíam mãos delicadas, peles brancas, queimadas pela calor de Esperança, e sem pelos. Os homens sem barba, as mulheres de corpo bem formado, muitas verdadeiramente bonitas. Todos loiros de cabelos densos lisos, e compridos. Que se constituíam numa raça branca, delicada, semelhante aos padrões de sua própria raça, que viviam primitivamente, Jonas podia entender. O que não entendia é como sobreviviam sem os vestígios da brutalidade que deveria marcar seus corpos num ambiente tão primitivo, e assediados constantemente por ferozes inimigos. Andou pelo patamar, entrou na imensa caverna, examinou tudo, sempre seguido por um grupo de homens adultos. Em pouco tempo teve a solução de suas questões. Por todos os cantos por onde andava, encontrou toscos cestos de palha, cheios de frutas e raízes de todas as espécies. Em nenhum lugar encontrou panelas, fogueiras, nem mesmo nenhum pedaço de carne crua ou cozida. Teve então resposta para suas duvidas. Aquele povo vivia única e exclusivamente de frutas e raízes, se explicava então porque eram tão saudáveis e delicados. A floresta não tinha pragas,e era repleta de arvores frutíferas, e Jonas tinha constatado isso durante sua travessia pela mata. Catar frutas e raízes era todo o esforço que aquele povo fazia para sobreviver. Porem, como uma espécie de trágica compensação pelos fáceis meios de sobrevivência que tinham, eram caçados ferozmente por horrendos insetos gigantes. Com esses pensamentos Jonas saiu da caverna, e quando estava no meio do patamar, viu Drumont chegando pela meia encosta. Parou aguardando que Agatha e Gerson aparecessem. Ninguém vinha atrás do piloto. O astronauta teve um pressentimento funesto, o coração se acelerou rapidamente, e mudo aguardou o amigo que se aproximava com o rosto extremamente sério. - Não há ninguém lá em baixo, Jonas! - Como assim? – perguntou o astronauta segurando Drumont nervosamente pelo ombro. - Encontrei as armas... O rádio todo arrebentado, mais nada. - Sangue? - Não... Nada... Só o chão todo pisoteado. - Meu Deus... Será que estão vivos? - Não sei. Procurei nos arredores, não vi nada. Jonas era um homem frio, pratico, de decisões imediatas. Não se deixaria levar pelas emoções, e seu desespero passou rapidamente. Virou para um nativo próximo a ele. O homem tinha uma fita de couro amarrada na testa, e o tinha acompanhado o tempo todo junto com os outros indígenas. Jonas calculou que ele poderia ser o chefe da tribo. Apontou para o índio, a meia encosta, mostrou a arma, imitou com as mãos o ato de atirar, indicou a cara afunilada das bestas, seu jeito de andar, o enorme traseiro. Sua idéia era tentar saber de onde vinham aqueles animais. Depois de várias tentativas o homem compreendeu. - Gronco, Gronco, Gronco – repetiu o nativo entre roncos e grunhidos. - Devem chamar os insetos de Groncos – comentou Drumont. - Gronco! Sim, Gronco – disse Jonas, fazendo um sinal de dormir, fechando os olhos, e deitando a cabeça, tentando saber onde os animais dormiam. Repetiu várias vezes o nome, mostrou a floresta, tentou por todos os meios se fazer entender. Deve ter dado um “estalo” na cabeça do chefe porque, segurou Jonas pelo braço, e abrindo caminho pelo meio da tribo que os cercava, levou o astronauta para a beira do patamar, e dali apontou na direção do Norte, alem da mata, um terreno ondulado de onde subiam tênues espirais de fumaça. - Deve ser lá que eles vivem – Disse para Drumont que tinha se aproximado. - Agatha e Gerson devem ter sido levados para lá – concluiu o amigo. Jonas tinha certeza que aqueles nativos saberiam a melhor maneira de atravessar a mata, e chegar naqueles seres. Por isso virou para o “chefe” , e apontou para si mesmo, para o nativo, e para outros que estavam perto, e depois para os morros de onde saiam as espirais de fumaça. Não precisou repetir muitas vezes os gestos para os índios entenderem suas intenções. Balançando as cabeças, e repetindo vária vezes, na,na,na, entre roncos e grunhidos afastaram-se dos astronautas, extremamente assustados com a idéia de ir até o reduto dos Groncos. Jonas sentiu que não poderia contar com aqueles homens. O pavor que tinham era muito grande, e nunca ele iria convencê-los a lhe acompanhar. - Eles não vão, nem que você jogar eles lá em baixo – comentou Drumont com algum desprezo. - Está certo – disse Jonas batendo no peito do amigo, e concluindo – Vamos embora, estamos perdendo tempo. Agilmente os dois desceram pela encosta, saltando por entre as rochas, desviando dos corpos estraçalhados dos Groncos, e em poucos minutos chegaram na floresta, rumando para o Norte na direção dos morros que os nativos tinham indicado. Andaram pela mata cautelosos, com o mínimo de ruído, vigiando os lados, afastados um do outro, armas prontas para qualquer ataque. Não pretendiam ser surpreendidos como Agatha e Gerson provavelmente tivessem sido. ______________________________ CAPITULO VII A mata começou a rarear, um cheiro acre-doce passou a ser sentido vindo do Norte. O vento passou a trazer ruídos distantes, e uivos parecendo de lobos. Jonas parou, e esperou ser alcançado pelo companheiro. Ao lado deles, bem próximo, se via através das arvores a encosta das montanhas que vinham ladeando. - Vamos subir um pouco, para ver o que tem ai na frente – sugeriu Jonas apenas Drumont o alcançou. O piloto aquiesceu com a cabeça, e ambos rumaram para a esquerda, e em alguns minutos estavam subindo pela encosta protegidos pelas rochas. A cadeia de montanhas que vinham ladeando virava abruptamente para a esquerda, no ponto onde estavam. Para o Norte seguia um terreno fortemente ondulado sobre o qual, para os deslumbrados olhos dos astronautas se espalhava a aldeia dos Gronkos. Cupins enormes, disformes, alguns com mais de seis metros de altura, se espalhavam desordenadamente pelo terreno ondulado. Todos tinham grandes buracos a sua volta, mais ou menos circulares, um sempre maior aparecendo a rés do chão, devendo ser a entrada das “casas”. Trilhas batidas contornavam os cupins, por onde dezenas de Gronkos de todos os tamanhos circulavam. Todos os machos usavam largos cinturões em volta dos quadris, e cruzados no peito, carregando nas costas um curto bordão, e na cintura algo parecido com um tosco machado. As fêmeas se identificavam por terem porte menor, e nada usavam alem de rústicas argolas no pescoço fino, e braceletes apertados nos braços. Os pequenos brincavam como qualquer criança humana, espalhados por toda a aldeia. Numa praça, mais ou menos no centro do burgo, um aglomerado de machos escutava um pequeno grupo no centro da roda, narrando alguma coisa. Vez ou outra um apontava no rumo da montanha onde estavam os astronautas. - Aquele grupinho ali – disse Drumont – deve ser os que escaparam do ataque. Ambos, a uma dezena de metros acima do solo da planície ondulada, tinham uma visão completa da aldeia. - Com certeza, – afirmou Jonas, e em tom triste rematou – mas não vejo nenhum sinal de Gerson e Agatha. Drumont não fez comentários. A voz insegura do amigo media bem a ansiedade controlada que estava sentindo. Na aldeia, mais ao Norte, havia uma dupla paliçada, uma cercando a outra. Dentro da primeira, alguns humanos perambulavam, prisioneiros com certeza dos Gronkos. No corredor em volta, cercados pela outra paliçada, havia pequenos vultos de animais, alguns deitados, outros correndo de um lado para outro. Jonas, usando a mira telescópica da arma, focalizou os animais, e com um assovio comentou: - Daqueles carcereiros ninguém escapa.! Os animais eram uma espécie de cachorros, de pernas curtas, patas enormes, corpo robusto, sem rabo, crânio miúdo com duas orelhas bem pequenas, focinho largo e quadrado, maxilares com duas robustas fileira de dentes, e dois caninos pontudos e salientes. A aparência dos animais não deixava dúvidas que estraçalhariam qualquer coisa que caísse nas suas garras. - Será que eles estão presos lá? – indagou Drumont, enquanto continuava também explorando a aldeia com a luneta do fuzil. A descoberta do cercado de prisioneiros acendeu uma chama de esperança no peito do Comandante. Durante minutos examinou o cercado com toda a atenção, procurando ver pelo meio dos prisioneiros qualquer vestígio que indica-se a presença dos amigos. Nada viu, mas abaixando lentamente o fuzil respondeu ao amigo: - É possível, mas não da para ver todo o cercado. Durante muitos minutos permaneceram calados. Nada podiam fazer naquele momento a não ser continuar espiando a aldeia. Em diversos pontos, sempre em frente dos cupins, viam-se fogueiras crepitando, e em algumas as fêmeas se ocupavam em assar alguma coisa. Drumont focalizou a luneta em uma delas, e abaixando violentamente a arma, não conteve um palavrão. - Já vi também – disse Jonas com uma careta de raiva. A indignação dos dois era justificável. A fêmea girava sobre a fogueira um espeto, onde estava atravessado o pequeno corpo de uma criança humana, sem vísceras, e sem cabeça. O piloto segurou o braço do Comandante, e com voz embargada pela raiva falou: - Vamos descer... Vamos destruir esses animais... Jonas sacudiu a cabeça – Não, Agatha e Gerson podem estar vivos, temos que localizá-los primeiro. - Mas como se a gente ficar aqui? Drumont se conformou, e ambos os amigos continuaram a vigiar a aldeia. Uma estrutura esquisita quase no fim d aldeia chamou a atenção do Comandante. Fixou a construção com a lente do fuzil, e comentou: - Esses insetos são bastante inteligentes... Até circo eles tem aqui. A observação era válida. A construção era uma arena de chão batido, toda cercada por uma arquibancada feita de troncos de arvores, inclusive os assentos. - Não duvido nada que seja uma arena do tipo Romana – observou o Piloto, que também estava focalizando a construção. - Bem, enquanto se massacrarem entre si está tudo bem. Nós também já fizemos isso na Terra. - Sem comentários – disse Drumont, lembrando que o ser humano também não era flor que se cheire. Continuaram vigiando a aldeia, a esper5a do anoitecer. Iriam tentar localizar os amigos, mas na realidade não sabiam nem por onde começar. O cheiro acre-doce misturado com o odor da fumaça, e carne queimada, embrulhava seus estômagos. No intimo tinham vontade de abandonar tudo, voltar para a nave, e partir daquele planeta maluco. Só a lembrança dos amigos o s segurava ali, mas tinham quase certeza que não iriam encontrar o casal de companheiros vivos, isso se conseguissem localizá-los. Uma coisa porem estavam certos, se Agatha e Gerson estivessem mortos, não deixariam viva nenhuma daquelas criaturas. Já estava anoitecendo. O aglomerado de Gronkos no centro da aldeia já tinha se desmanchado. Luzes mortiças, provavelmente de tochas, começaram iluminar alguns buracos nos enormes cupins. A maioria tinha se recolhido, e poucos transitavam nas trilhas. Os astronautas saíram de seu esconderijo, e vagarosamente, se escondendo o mais que podiam, chegaram ao pé da montanha. Um capinzal alto separava os dois dos primeiros cupins. Lentamente avançaram pelo capim que os cobria totalmente, e quando chegaram na beira da aldeia já era totalmente escuro. A esquerda deles, viram luzes fracas saindo de uma construção que não era um cupim. As paredes eram feitas de troncos verticais, encostados uns nos outros. O telhado inclinado era também feito de troncos, coberto com uma grossa camada de terra compacta, onde se percebia os sulcos das erosões provocadas pelas chuvas. Atrás do barracão, um cercado baixo, de onde se escutava o rosnado, e uivo dos animais. Dentro guinchados de vários tons indicava que pelo menos dois Gronkos conversavam. Ambos correram agachados, e se colaram na parede do barracão. Os animais no cercado roncaram e uivaram mais alto, pressentindo a presença de estranhos. Um guinchado agudo se ouviu lá dentro, e os roncos diminuíram. Jonas se moveu lentamente, e espiou por uma das frestas da parede de troncos, na altura de seu rosto, e o que paralisou seu corpo. Lá dentro, a luz de duas tochas, dois Gronkos encostados num enorme cepo, conversavam num linguajar de guinchados. Em volta próximo as paredes, dependurados com tiras de couro, e espalhadas pelo barracão, várias peças de carne. Umas eram corpos inteiros de seres humanos, sem as vísceras nem as cabeças, e com pés e mãos cortados. Outras pedaços esquartejados. Rins, fígados, e corações, dependurados por correias, completavam a mercadoria de um açougue onde o produto principal era carne de seres humanos. Drumont, que tinha ido espiar por outra fresta, virou, suas pernas falsearam, e ele lentamente escorregou encostado na parede. Jonas que tinha afastado o olhar, também enjoado, teve sua atenção despertada por algo que tinha visto no chão, e voltou a olhar rapidamente para dentro do barracão. Lá estavam, num canto, encostadas na parede, amontoadas e sujas de sangue, um short, e uma camiseta azul. O astronauta tremulo, agachou ao lado do amigo, e em voz sumida falou: - Mataram Gerson! - Como? - As roupas dele estão lá dentro! Drumont ficou paralisado por um instante, depois levantou rapidamente com a arma em punho. Jonas percebendo a intenção do amigo puxou seu braço com força, obrigando o Piloto a agachar novamente. - Não faça isso... Agatha pode estar viva. - Meu Deus, até onde vai nos levar essa tragédia? – lamentou o astronauta, sentado no chão. Nesse instante uns guinchados altos vindos de dentro chamaram a atenção dos dois alienígenas que voltaram a olhar pelas frestas. Outro Gronko tinha entrado no matadouro, carregando um humano morto nas costas. Era uma mulher jovem, nua, que a besta jogou sobre o cepo, entre os dois insetos. Jonas levou um tremendo susto, quando percebeu que se tratava de um corpo de mulher, mas quando viu seu rosto deu um suspiro de alívio. Era uma nativa. O Gronko que tinha chegado teve uma conversa rápida com os outros dois, e o que deveria ser o açougueiro pegou uma machadinha tosca, e com certeiros golpes decepou a cabeça da moça, depois os pés, e as mãos. Juntou o que tinha cortado, e jogou pela janela, dentro do cercado atrás do barracão. No meio de uma algazarra infernal, entre roncos e uivos, os animais no cercado disputaram por algum tempo as presas. Logo tudo se aquietou, e no silêncio da noite, só se ouvia o triturar de ossos, e a respiração ofegante das bestas. Jonas e o piloto, paralisados, continuaram espiando o trágico espetáculo. O açougueiro, que tinha ficado espiando seus animais pela janela, retornou ao cepo onde jazia o corpo da infeliz nativa, pegou a machadinha, e em golpes precisos abriu seu corpo do pescoço até a vagina. Arregaçou seu ventre com as patas, enfiou os dedos nodosos pelo meio dos órgãos, e como se limpasse um peixe, foi arrancando as vísceras, e amontoando no cepo. Drumont não agüentou o espetáculo. Seu estomago sofreu um violento espasmo, virou rapidamente, mas não conseguiu segurar o ruído da ânsia de vomito. Jonas, como um relâmpago, segurou o amigo pelo braço, e o puxou para dentro do capim alto. Nem bem os dois desapareceram no mato, um dos Gronkos apareceu numa janela. Olhou para todos os lados, não viu nada, e voltou para dentro do barracão O guinchado das conversas retornou lá dentro, e os dois astronautas olhando pelos vazios do capinzal respiraram aliviados. Jonas não tinha visto a roupa alaranjada da companheira no açougue, e isso lhe deu esperança de ainda encontrá-la viva. Não sabia porem o que fazer. Os óculos de visão noturna tinham sido destruídos junto com o transmissor. No escuro, como iriam encontrar a moça? Drumont adivinhando os pensamentos do Comandante comentou: Jonas... Só de dia... Não temos nenhuma luz... Vamos procurar como? É, e de dia vai ser uma “parada”, nossas armas não tem carga para segurar a aldeia inteira! - Viu a moça lá dentro? – perguntou Drumont - O que tem? O piloto não teve coragem para dizer o que lhe passava pela cabeça, mas disse: - Se não podemos fazer nada esta noite, pelo menos vamos vigiar esse matadouro... Concorda? Jonas entendeu o que se passava pela cabeça do amigo, mas se recusava ter os mesmos pensamentos. Pegou o braço do piloto, e disse: - Você tem razão, vamos achar um lugar melhor para vigiar. Os dois astronautas se afastaram do barracão por dentro do capim alto, a procura de um lugar mais elevado. Quando se aproximaram da trilha que levava ao açougue, viram a esquerda um enorme cupim semi-destruido. Metade dele tinha desmoronado, e nos buracos que ainda restavam, próximos a entrada, não se via nenhuma claridade. - Vamos arriscar? – perguntou Drumont. - Feito... Vamos. Ao dois, agachados numa rápida corrida chegaram na entrada do monte de terra. Colaram nas paredes do túnel de entrada tentando escutar algum som vindo de dentro. Nada ouviram. No fundo ainda dava para perceber que a entrada tinha sido interrompida pelo desbarrancamento do cupim. Porem, a direita da entrada, uma tênue claridade indicava a existência de outro túnel. Vagarosamente se aproximaram, e olharam para dentro da passagem. O túnel subia numa rampa forte. De cima vinha uma tênue claridade do dia que começava a amanhecer. Ambos subiram lentamente a rampa, colados nas paredes do túnel. No alto, chegaram a um pequeno salão abobadado, com uma abertura mais ou menos circular. De onde estavam, bem em frente, mais ou menos a cinqüenta metros de distância, se via perfeitamente através da abertura, o matadouro, e o cercado de cachorros. Depois de uma longa noite de emoções de toda a ordem, o silêncio daquela sala malcheirosa era até bem-vindo. Lá fora, a aldeia ainda estava adormecida. Jonas sentou no chão ao lado do buraco da janela, olhando o açougue, e intimamente rezando para não ver o que mais temia, e Drumont deitou no chão e adormeceu. ______________________________ CAPITULO VIII Clark na cabine de rádio da espaçonave, aguardava ansiosamente que os operadores conseguissem algum contacto com o Comandante. Depois de uma hora de tentativas frustradas, Clark se convenceu que Jonas, estava sem condições de se comunicar com a nave mãe, e os motivos eram impossíveis de serem previstos. Ele Clark precisava tomar uma decisão qualquer, mas não sabia qual. Se ele espera-se qualquer sinal dos exploradores, e estes estivessem em perigo, a falta de socorro poderia ser fatal. Por outro lado se ele trouxesse a nave exploradora, e descesse em seguida para ajudar os companheiros, primeiro, não saberia onde procurá-los, depois se dependessem da nave para escapar, e ela não estivesse no mesmo lugar, poderia significar a morte dos amigos. Clark se desesperava por não achar uma solução, e xingava os construtores da espaçonave por não terem previsto mais uma nave exploradora. - Será que aqueles cornos, não conheciam aquele ditado de quem tem um não tem nenhum! Por fim o bom senso prevaleceu a vontade de correr em socorro dos exploradores. Resolveu esperar mais quarenta e oito horas terrestres, antes de tomar qualquer atitude. Afinal o transmissor poderia ter se estragado, e eles longe da nave, não teriam como se comunicar. Afinal, tinham armas poderosas, e não seriam nunca presos em nenhuma armadilha. Embalado por essas idéias o Sub-comandante se convenceu que deveria esperar. Lá em baixo, enfiados num cupim malcheiroso, os dois astronautas continuavam na vigia ao açougue. O dia já tinha amanhecido, e ambos passaram a ouvir guinchados, um tropel, e uivo de animais. Os dois colaram nas paredes ao lado da janela, atentos aos ruídos que vinham de fora. Jonas olhou pelo buraco da janela, mas pouco viu lá fora alem do matadouro. A parede da janela tinha mais de dois metros de grossura, e impedia totalmente a visão lateral. Deixou a arma, subiu no parapeito do buraco, e lentamente se arrastou até a borda externa. Ali arriscou olhar para baixo. A pouca altura pequenos Gronkos brincavam correndo pelas trilhas em volta dos cupins. Alguns adultos passavam, alguns carregando, por correias presas ao pescoço, animais iguais aos que tinham visto cercando a prisão dos humanos. Em frente de um outro cupim, uma fêmea arrumava lenha numa fogueira. Outras vinham transportando lenha de uma enorme pilha visível a distância, por entre os cupins. Jonas olhou para a direita, para um cupim bem maior que os outros, na beira da aldeia, na borda do capinzal. Sua atenção foi despertada por um pequeno Gronko que saia de dentro do cupim vestindo um cinturão verde que Jonas reconheceu como sendo de Agatha. Retornou rapidamente do buraco da janela, e com voz tremula contou ao Drumont o que tinha visto. - Que você acha? – perguntou o amigo. - Agatha deve estar dentro daquele cupim! - Vamos tentar? - Vamos! Se não tiver nada lá dentro podemos fugir pelo mato – disse Jonas. Ambos desceram a rampa do túnel, e cautelosamente chegaram até a entrada do cupim. Os pequenos Gronkos tinham ido embora, um macho vinha pelo caminho, e passou na entrada sem perceber a presença dos astronautas. Apenas ele desapareceu numa curva, ambos atravessaram a trilha correndo, e se esconderam no capinzal. Continuaram por dentro do mato até mais ou menos a altura do cupim que Jonas tinha visto, e se aproximaram novamente da borda. O cupim de onde Jonas tinha visto sair a pequena besta ficava um pouco longe. Alguns Gronkos circulavam nas trilhas. Se tentassem alcançar a entrada seriam forçosamente vistos. Isso não seria problema, pois poderiam liquidar os Gronkos mais próximos, mas se entrassem depois para procurar a moça, teriam na saída que enfrentar toda a aldeia. A situação era difícil. Jonas porem teve uma idéia, e resolveu apostar na curiosidade daqueles seres. Dali donde estavam se avistavam nitidamente a enorme pilha de lenha onde as fêmeas se abasteciam. O Comandante deu meia carga a potência do fuzil apontou para a pilha de lenha e atirou. Um fino raio de luz branca, atingiu o monte como um relâmpago, e com o impacto jogou paus de lenha para todos os lados, e pegou fogo. A correria foi geral. Gronkos machos, fêmeas, e filhotes apareceram de todos os lados correndo em direção a lenha, para ver o que tinha acontecido. Em pouco tempo as trilhas ficaram limpas, e uma multidão se formou em torno da fogueira. Aconteceu o que Jonas queria. Acompanhado do piloto, aproveitaram o momento, e correndo entre aos cupins, em instantes entraram pela porta por onde Jonas tinha visto o pequeno Gronko sair, com o cinto de Agatha. O cupim era muito grande, e o túnel por onde tinham entrado possuía várias ramificações iluminadas por tochas fumegantes.. Algumas ramificações subiam, outras desciam, os astronautas ficaram desorientados. Se fossem percorrer todos aqueles túneis iriam gastar o dia todo. Aparentemente o cupim estava vazio, todos deviam ter ido ver a fogueira. Depois de alguns instantes de indecisão Jonas sugeriu: - Se ela estiver viva aqui dentro deve responder se a gente chamar! - Boa idéia, - respondeu Drumont – não temos nada a perder. Imediatamente se separaram, e percorrendo o túnel principal paravam na entrada dos outros, um de cada lado, gritando o nome da astronauta. Tinham percorrido já várias entradas sem nada escutar, quando Drumont com um grito de alegria chamou o Comandante. - Aqui Jonas... Ela está aqui! Jonas com “dois” passos alcançou o amigo. Do túnel descendente, mal iluminado, veio o som de um choro de mulher, e logo uma voz embargada, chamou o Comandante. - É ela! – gritou Jonas, “despencando! Pelo túnel abaixo, seguido do amigo. Armas engatilhadas, prontos para qualquer eventualidade, chegaram a uma enorme caverna iluminada por algumas tochas. \pararam estáticos, imaginando que tivessem chegado no centro do inferno. No chão da caverna,grupos de alvéolos feitos de barro se espalhavam por todo o salão. Mulheres nuas, amarradas pelos pés com fortes correias de couro a estacas fincadas no chão, trabalhavam pegando com as mãos uma pasta branca guardada em enormes tachos, colocavam na boca de larvas de filhotes de gronkos, que dentro de alvéolos, no meio de uma gosma grudenta, guinchavam, e se debatiam. Quando as mulheres viram os astronautas, se assustaram, e iniciaram um gritaria, logo seguido pelo guinchado agudo das larvas. Jonas, percorrendo com o olhar o salão, logo reconheceu a roupa alaranjada, toda rasgada de Agatha no meio dos alvéolos. Correu para ela enquanto Drumont permanecia vigiando a entrada do túnel. Agatha, com lagrimas nos olhos, abraçou o companheiro,e este por alguns instantes retribuiu o abraço. Porem não havia tempo a perder, sacou a faca, cortou as correias que prendiam a moça, e auxiliado pelo amigo fez o mesmo com as outras mulheres. No meio dos gritos de alegria das mulheres se sentindo livres, Os três astronautas fugiram em desabalada carreira pelo túnel acima sendo seguidos pelas escravas dos gronkos numa alucinada algazarra. O barulho que as mulheres faziam foi escutado por alguns gronkos que retornavam pela trilha, e eles entraram correndo no cupim para verificar o motivo da gritaria, justamente quando Drumont que ia na frente atingiu o túnel principal. Raios brancos e mortíferos partiram do fuzil do astronauta, atingindo as bestas, que morreram sem saber porque. Pulando pelos corpos Drumont seguido de Agatha alcançaram a entrada do cupim, e correram para o mato na beira da aldeia. Enquanto isso no túnel principal um gronko que tinha se escondido num túnel lateral na hora que Drumont atirou, pulou em cima de Jonas que passava, e os dois rolaram para dentro de outro túnel em frente. Jonas perdeu o fuzil, e quando engalfinhados pararam de rolar, o astronauta se viu por baixo da besta que com dois dedos apertava seu pescoço, e com as garras abertas, boca escancarada, mostrando uma dentadura serrilhada, entre dois pontiagudos caninos, tentava morde-lo. Jonas escorando com o braço o peito cartilaginoso do inimigo procurou desesperadamente, com a outra mão, retirar a faca da cinta. Conseguiu quando seu braço não agüentava mais a pressão do gronko, e antes que ele conseguisse morde-lo a faca serrilhada penetrou nas costas do animal que com um guinchado horrível, tombou ao lado do astronauta. Este arrancou a faca do corpo da criatura que se convulsionava, correu para o túnel principal, recolheu o fuzil, e misturou-se com as escravas em fuga. Enquanto isso acontecia, três gronkos, e um daqueles esquisitos cachorros, vinham vindo pela trilha, viram Drumont e Agatha saírem correndo do cupim. Com altos guinchos saíram correndo atrás dos intrusos. No momento que o animal que corria na frente passou em frente da entrada do cupim, Jonas junto com as mulheres apareceram correndo lá de dentro. O astronauta atrapalhado pelas fêmeas tropeçou no animal, e rolou no chão. O fuzil caiu longe, e antes mesmo que pudesse se refazer da surpresa as três criaturas que vinham atrás pularam ao mesmo tempo em cima dele, enquanto o animal em que tinha tropeçado desapareceu assustado numa curva da trilha. A gritaria das mulheres fugindo para o mato, mais os guinchados estridentes dos gronkos chamou a atenção dos que ainda estavam na fogueira, que num barulhento tropel, vieram se juntar aos que moíam Jonas de pancada. Alguns vendo as escravas fugindo tentaram persegui-las mas eram muito lerdos para correr devido ao grande abdômen, e as mulheres em instantes sumiram no meio do capim alto que cercava a aldeia. Seus perseguidores, sabendo que não as alcançariam desistiram, e voltaram para o meio da multidão que cercava o Comandante. Jonas tentou resistir quanto pode, mas eram muitos. Levou uma bordoada, e desmaiou. Seguro por dois gronkos, foi arrastado pela trilha, seguido praticamente por toda a aldeia num amontoado de machos, fêmeas, e filhotes pulando em volta, tentando ver o alienígena a todo custo, tudo no meio de uma zoeira infernal de guinchados. Um dos gronkos achou a arma de Jonas num canto da trilha, parou pegou o fuzil, examinou a arma de todos os lados, não encontrou utilidade para ela, e com total indiferença lançou a arma na direção do capinzal, e correu para se reunir aos outros. Drumont , e Agatha, assistiram tudo de dentro do mato. Não puderam fazer nada. Se o astronauta atirasse poderia ferir o companheiro no meio da multidão, portanto não havia outra coisa a fazer senão aguardar outra oportunidade. Quando a multidão se afastou bastante, Drumont saiu do capinzal, e numa rápida corrida recolheu a arma de Jonas, e voltou para o mato sem ter sido visto por ninguém. De lá, ambos aproveitando a ausência de gronkos na área, voltaram para o cupim desmoronado onde Drumont e Jonas tinham passado a noite. Dali tinham uma boa visão da aldeia, e podiam ver para onde levavam o Comandante. Drumont tinha a convicção que não iriam matá-lo, porque se quisessem fazer isso, já o tinham feito. -O que será que vão fazer com ele? – perguntou Agatha, com uma enorme aflição estampada no rosto. - No meio da aldeia tem uma prisão de nativos humanos... Acho que estão levando ele para lá. – disse Drumont. Sua suposição era correta. A multidão chegou ao duplo cercado onde prendiam os indígenas. Um portão de troncos de arvores, com duas folhas, foi aberto com grande esforço, fechando a passagem dos animais que estavam no corredor. Um segundo portão na paliçada interior com uma única folha foi aberto, e Jonas ainda desacordado, foi jogado no cercado. Os portões foram novamente fechados, e a multidão em pouco tempo se dispersou, sobrando apenas alguns pequenos gronkos atiçando os animais no corredor com varinhas enfiadas pelos vãos dos paus da paliçada. Dentro do curral Jonas foi cercado por vários homens, e algumas mulheres, todos nus, curiosos por conta da roupa azul do novo prisioneiro. ________________________ CAPITULO IX O astronauta recuperou vagarosamente a consciência. Deitado no chão, viu as pernas nuas dos que o cercavam. Não atinou direito do lugar onde estava, levantou a cabeça, viu a paliçada próxima, se arrastou até ela, e sentando encostou na cerca, ainda tonto, olhando interrogativamente para a sua curiosa platéia. Uma mulher do grupo avançou timidamente, puxou a camiseta do astronauta, e se afastou rapidamente. Outro nativo, andando agachado, chegou mais perto, e segurou com força a botina de Jonas, tentando arrancá-la. O astronauta encolheu a perna, já aborrecido com a curiosidade daquelas infelizes criaturas. Alguns sons sem sentido, e grunhidos mais altos se ouviram entre os prisioneiros, e um deles de cara amarrada, com uma espécie de grito de guerra, pulou na frente de Jonas com os braços levantados, e as pernas abertas. O astronauta percebeu que se continuasse a permitir aqueles avanços, acabaria sendo atacado por todos, e com certeza iria no mínimo ficar pelado. O índio de pele branca, na frente dele, com mais um berro abaixou os braços tentando segura-lo pelos ombros. Jonas reagiu, e com um violento pontapé acertou o vão das pernas do coitado, que agarrando nos órgãos genitais rolou no chão gritando de dor. Ao mesmo tempo levantou-se, e todos com o susto da reação do estranho, se afastaram grunhindo. O astronauta deu um passo a frente, e os nativos debandaram, abrindo a roda, onde só sobrou um gigante com mais de sete pés de altura, e uma fita de couro presa na testa, que impassível encarou Jonas com ar feroz. - Esse deve ser o chefão – pensou Jonas. O indígena abriu os braços, e as pernas, curvou o corpo, e com ferozes grunhidos começou a rodear o astronauta. Com um pulo mais corajoso chegou mais perto do intruso, e levou um tremendo soco na boca . O impacto desequilibrou o gigante que caiu sentado no chão, e gemendo cuspiu uns pedaços de dentes quebrados. A raiva estampou-se no seu rosto, num salto se colocou de pé, e com um grito grotesco partiu para cima de Jonas como um búfalo feroz. O astronauta negou o corpo, e o brutamontes se estatelou de encontro a paliçada. O barulho instigou os animais no corredor, e entre latidos, uivos, e mordidas pulavam tentando alcançar o topo da cerca. Sem se preocupar com as feras, o índio virou rapidamente, mas antes que pudesse tomar qualquer iniciativa, Jonas girando sobre o próprio corpo para tomar impulso, levantou a perna, e acertou um pontapé na cara do gigante, que como um enorme tronco decepado, desabou no solo desmaiado. Quando o indígena caiu, Jonas virou, e avançou alguns passos em direção dos outros prisioneiros, que assistiam a luta. Não sobrou ninguém perto do alienígena. Disfarçando, como quem não quer nada, foram para o outro lado do cercado. O astronauta todo doido da surra que tinha levado dos Gronkos, sentou novamente no chão, encostado na paliçada. Os animais se aquietaram, e aparentemente nenhum Gronko tinha se interessado em ver o motivo do alvoroço. Com certeza essas zoeiras deviam ser comuns. Quando o gigante abatido acordou, colocou-se de quatro, meio tonto, viu o astronauta sentado a poucos passos dele, deu um grunhido rouco, cuspiu um pouco de sangue, e mesmo de quatro se afastou do estranho, levantou, e foi se reunir aos outros do outro lado da paliçada. Drumont e Agatha, depois que viram Jonas ser trancado no cercado começaram a imaginar como poderiam fazer para livrar o companheiro. - Ele pode estar muito ferido... Vamos tira-lo de lá... Esses bichos não podem com a gente – pediu Agatha ao amigo. - São muitos, e a distância é longa! Qualquer descuido nosso, e estaremos perdidos – afirmou Drumont - Ora! Estas armas podem destruir toda essa aldeia Nunca chegariam perto de nós. - Agatha, pense bem... Esses bichos estão por toda a parte, não podemos atirar em todos ao mesmo tempo, e vamos acabar na melhor das hipóteses dentro daquele cercado, junto com Jonas. - Mas, e a noite? - As chances vão ser pior que agora... Eles enxergam melhor que nós, Conhecem o terreno, não iria dar certo... Melhor será ao amanhecer, vai haver poucos deles na rua. Acho que poderíamos libertar o Comandante, e fugir para o mato antes de acordar toda a aldeia. - Oh! Meu Deus! Vai ser uma longa espera até amanhã – falou Ágatha suspirando. - Isso se antes não nos descobrirem aqui – disse Drumont - Esse cupim está desmoronando, ninguém vai vir aqui! - Esses filhotes correm por toda a parte... Sei lá! Enquanto Agatha e Drumont decidiam esperar até o dia seguinte, os nativos no cercado, vendo que Jonas não se mexia, foram pouco a pouco se despreocupando, voltando a agir normalmente, tomando cuidado porém para não chegar muito perto do estranho. O astronauta, sentindo que não seria mais importunado pelos nativos, relaxou sua vigilância, dormiu encostado na paliçada, e o resto do dia passou sem incidentes. Apenas começou a amanhecer, Drumont sacudiu levemente o ombro de Agatha, que dormia encolhida no chão. A moça acordou assustada, segurou o fuzil e perguntou: - O que foi? - Nada, calma, está amanhecendo, mas esta acontecendo alguma coisa lá no cercado! Agatha levantou, e olhou pelo buraco da janela. Na paliçada, um grupo de gronkos estava abrindo os portões que davam acesso ao cercado interior. Jonas que já tinha acordado, se colocou de pé, e começou a andar de um lado para outro para distender as pernas, sob o olhar desconfiado dos nativos.. Do outro lado só se ouvia o rosnar, e os uivos dos animais presos no corredor. De repente, ao passar em frente ao portão de entrada da paliçada, um laço preso na ponta de uma vara prendeu o pescoço do astronauta, que foi violentamente puxado de encontro ao cercado ficando praticamente dependurado pelo pescoço. Jonas se dependurou na vara na tentativa de se livrar do laço que o estrangulava, quando meia dúzia de gronkos entraram na paliçada carregando curtas lanças pontudas de madeira. Enquanto alguns vigiavam os nativos, que tinham recuado para o outro lado da paliçada, os outros prensaram Jonas com as pontas das lanças de encontro a cerca e, imóvel pelas lanças pontiagudas que feriam suas costelas, em poucos instantes se viu de mãos amarradas nas costas, e seguro pelo laço que prendia seu pescoço foi impelido para fora da paliçada. Fora do cercado, uma pequena multidão já aguardava o prisioneiro, que semi-enforcado, e aos cutucões, foi obrigado a seguir por uma trilha, seguido por toda a aldeia, fazendo um barulho infernal. Quando Jonas percebeu que estava sendo levado em direção a arena que tinha visto da montanha teve o pressentimento que seus dias estavam chegando ao fim. Atropelado pelas lanças entrou naquele rústico circo acompanhado pela multidão de gronkos que correndo numa ruidosa algazarra de guinchados em instantes ocuparam toda a arquibancada de troncos, que circundava o picadeiro. Tiraram o laço de seu pescoço, desamarraram suas mãos, jogaram nos seus pés um porrete curto, e uma rede feita de tiras de couro, e se afastaram correndo, deixando o astronauta sozinho no meio da arena. Um silêncio quase total se fez na multidão. Jonas lentamente se abaixou, recolheu o tacape e a rede, e ironicamente pensou: - Agora só falta soltar o leão! Uma guincharia infernal rompeu o silêncio da platéia. O astronauta procurando o motivo de todo aquele barulho, virou, e descobriu, a menos de cinco passos dele, a razão da algazarra. Um gronko gigantesco, com mais de oito pés de altura, patas enormes e nodosas na cintura, uma bunda enorme, ventre quase arrastando no chão, e uma longa cinta de couro cruzada no peito reluzente, o encarava com olhar cruel, mostrando dois pontiagudos caninos, cercados por duas garras enormes saindo das bochechas. Jonas pensou rápido. Se aquele gronko pusesse as patas nele, seria um homem morto. Para usar sua faca, teria que chegar perto, e provavelmente seria estraçalhado antes de poder ferir a criatura mortalmente. O porrete, e a rede não serviam para nada, mesmo porque não saberia usar aquelas armas. Jogou as duas no chão ao seu lado, e seu gesto silenciou de repente o barulho da assistência. O gigante abriu os braços, e avançou pesadamente para ele. A multidão “acordou” saudando seu campeão com frenéticos guinchados. Queriam vê-lo estraçalhar com as mãos, e os dentes, aquele intruso que tinha tido a coragem de invadir sua aldeia. O astronauta deixou a criatura chegar bem perto, ai num movimento rápido, acertou um chute no ventre da besta, que com um urro de dor se encolheu segurando a barriga. Guinchos raivosos partiram da platéia. Jonas se afastou alguns passos, e antes que o gronko se refizesse, numa corrida curta, se elevou no ar, e acertou com os dois pés o peito do animal. Este caiu para trás atordoado, virou o pesado corpo, e apoiou-se nas patas para levantar. Era a oportunidade que Jonas estava esperando. Com um salto pulou nas sua costas, segurou com as duas mãos a cara comprida da besta, e antes que o gronko pudesse esboçar qualquer reação, com um violento tranco quebrou o seu pescoço. O animal se abateu no chão estrebuchando sob as pernas do astronauta, e a platéia emudeceu. O espanto porem durou somente alguns segundos. Furiosos com a derrota inglória de seu campeão, vários gronkos machos, com raivosos guinchados, pularam da arquibancada, alguns brandindo curtos porretes, e correram na direção do alienígena. Jonas recuou lentamente disposto a vender caro a vida. Drumont e Agatha, quando viram Jonas ser levado rumo a arena, aproveitaram que toda a aldeia estava correndo para lá, saíram furtivamente do cupim em ruínas, entraram no mato, e foram contornando a aldeia até se posicionarem bem atrás da arquibancada da aldeia. Escondidos viram quando Jonas e todos os gronkos entraram no picadeiro. Quando a luta começou, e todos estavam entretidos, Drumont carregando sua arma, e a do amigo, deixou a moça no mato, e sorrateiramente subiu pelos paus da arquibancada, sem que nenhum gronko percebesse sua presença.. Quando chegou em cima, Jonas estava recuando, com toda a multidão de gronkos descendo da arquibancada para estraçalhá-lo. O astronauta escutou gritarem seu nome, virou e viu Drumont a meia altura da arquibancada jogando o fuzil para ele. A arma alcançou as suas mãos. Alguns gronkos que vinham em sua direção, sentiram intuitivamente o perigo, e tentaram escapar saindo para os lados em carreira desengonçada. Outros porém desavisados, sem entender a atitude dos companheiros, continuaram sua rebolante corrida. Muitos tendo avistado o outro astronauta, mudaram de direção, e voltaram a subir os degraus da arquibancada na direção do outro intruso. Nessa situação, e entremeado por um barulho infernal de guinchos as armas silenciosas e mortais “falaram” sua língua. Corpos explodiram na frente de Jonas espalhando pedaços por todos os lados misturados com uma seiva gosmenta. Na arquibancada, outros gronkos atingidos pelo Piloto rolavam aos pedaços, levando outros na queda. O pânico se estabeleceu entre os furiosos algozes dos alienígenas. Uma correria desenfreada para sair de perto daquelas mortíferas criaturas, substituiu o desejo de vingança das bestas. Os astronautas pararam de atirar. Jonas achou que deveriam sair dali o mais rapidamente possível. Os gronkos eram muitos, e passado o susto, com certeza voltariam em massa. Atirou nos troncos que formavam os primeiros degraus da arquibancada, que voaram em pedaços, abrindo um enorme buraco. Acenou para o amigo, e pela passagem que tinha aberto correu para fora da arena. Esperou pelo Piloto que em instantes o alcançou, e perguntou: - Onde está Agatha? - Ali, vamos – disse Drumont apontando para o capinzal em frente. Ambos correram para o mato, já escutando o tropel das criaturas em seu encalço. Ágatha e Jonas se abraçaram carinhosamente, enquanto Drumont atirando na multidão, atrasou um pouco a investida dos varões da aldeia. Não havia tempo para comemorarem o encontro. Abrindo caminho no mato alto, atirando de vez em quando para segurar a investida de seus perseguidores, os três alcançaram finalmente a mata. Ali, o terreno era mais limpo, permitia que corressem mais depressa, mesmo assim muitos galhos atrapalhavam o caminho, e atrasavam a fuga. Pelo barulho no mato, os fugitivos perceberam que os gronkos tinham se espalhado na floresta em sua perseguição. O perigo era eles se adiantarem, e cortarem a fuga dos astronautas, e isso realmente aconteceu. Muitos conheciam trilhas limpas, e conseguiram passar a frente dos fugitivos, porém eram muito grandes, incapazes de se esconder na folhagem rala da floresta, e por isso iam sendo abatidos com facilidade. Jonas se convenceu que não conseguiriam chegar na nave naquela situação. A distância trabalhava contra eles. Um descuido, um atraso maior, e aquelas criaturas cairiam sobre eles que nem vespas. Só existia uma possibilidade. Alcançar a caverna dos nativos humanos. Eles com certeza os ajudariam. Jonas orientou a fuga para perto das montanhas, e depois de alguns minutos de correria, viram por entre as arvores, a meia altura, o patamar onde se refugiavam seus semelhantes. Os nativos, alertados pelo barulho na floresta, já estavam todos espiando por entre as pilhas de pedras no patamar. Praticamente com os gronkos nos seus calcanhares, os três saíram da floresta, e iniciaram a escalada pelas rochas, perseguidos por dezenas de criaturas. Nessa altura os nativos começaram a jogar pedras com uma pontaria precisa. Os gronkos acertados por grandes seixos, rolavam pela escarpa abaixo, as vezes carregando outros na queda. Drumont, escalando as rochas por traz de seus amigos, virava constantemente vigiando a escalada dos gronkos. Um deles se aproximou perigosamente, e o astronauta para abatê-lo segurou com uma das mãos na rocha, girou o corpo, e apontou o fuzil para a cabeça de seu perseguidor. De repente a ponta da rocha onde seu pé se apoiava partiu. O Piloto largou a arma, e tentou se agarrar na rocha. A mão não encontrou apoio, o corpo escorregou, e ele com um grito rouco, despencou pela encosta levando com sigo a criatura que o perseguia. Agatha, logo acima dele, deu um grito ao perceber a queda do amigo. Lá embaixo alguns gronkos saltaram em cima do corpo inerte do astronauta, soltando guinchos raivosos, e mordendo o infeliz Piloto. Jonas de onde estava, descontrolado pelo que via, passou a atirar a esmo em todas as criaturas lá embaixo próximas ao amigo, até que um clique inconfundível lhe deu noticia que a carga do fuzil tinha acabado. Jogou a arma em cima de um dos gronkos na escarpa, e completou a escalada acompanhando Agatha banhada em lagrimas. Os nativos continuaram jogando pedras nos inimigos, e estes não tendo podido alcançar os astronautas, desistiram da perseguição. Sabiam já, por dezenas de tentativas frustradas que não seria desta vez que iriam conquistar a escarpa. No meio da gritaria de triunfo dos nativos, os gronkos desapareceram na floresta, mais uma vez derrotados. Na retirada porém, para horror e desespero do Comandante, e sua noiva, levaram junto o corpo do Piloto, não se importando com os outros gronkos mortos e agonizantes, espalhados no sopé da montanha. _________________________ CAPITULO X Agatha abraçada com o Comandante chorou bastante tempo o destino trágico do amigo. Depois ainda abraçados caminharam pela esplanada cercados por vários nativos curiosos em ver de perto a companheira do astronauta. Sentaram em umas pedras, e o menino loiro amigo de Jonas, foi sorrindo sentar ao lado deles. Uma mulher apareceu pelo meio dos curiosos, e depositou aos pés dos alienígenas um cesto cheio de frutas. Enquanto desoladamente, tentavam comer os curiosos foram se dispersando, e algum tempo depois só o menino permaneceu ao lado dos astronautas. Agatha, extremamente cansada, recostou nas pedras, e em pouco tempo dormiu. Jonas viu o chefe da tribo conversando, agachado, com um grupo de nativos, na entrada da caverna, levantou, e se dirigiu para lá acompanhado pelo garoto. O chefe e os outros se levantaram. O Comandante sorrindo, colocou a mão no ombro do indígena, apontou para si mesmo, para Agatha que dormia nas pedras, e depois para o Sul, tentando dizer ao chefe que precisava ir embora. Não foi necessário muitas tentativas para que tanto o nativo como os outros entenderem o que Jonas queria. Segurando o astronauta pelo braço o indígena o levou a beira da escarpa, mostrando que deveria descer a montanha, e seguir pela mata para o Sul. Ca...Ca...Ca....Confirmaram todos os outros nativos, entre grunhidos. Jonas apontou a floresta, e imitando um gronko, juntou os dedos dando a entender que a floresta estaria cheia deles. O chefe deu um sorriso de resignação, abriu os braços em sinal de que nada poderia fazer, e se afastou totalmente desinteressado pelo problema do alienígena. Acostumados a descer na mata constantemente, escondendo-se dos gronkos, e evitando as armadilhas, para colher água e frutas, não viam porque Agatha e Jonas não poderiam fazer o mesmo. Para os astronautas porém, as coisas não eram tão simples. Não tinham a habilidade dos nativos de se esconder dos gronkos. No planeta Terra de onde tinham vindo, a séculos já não existiam florestas, a não ser pequenos parques conservados a poder de muita vigilância. Aventurar-se sem armas a atravessar a mata para alcançar a nave seria provavelmente suicídio. Não havia porém outra alternativa pensou Jonas. Se pudesse recuperar a arma de Drumont, ou mesmo as de Agatha e Gerson, ai quem sabe poderiam ter alguma chance. Decidiu que essa era a única alternativa, e com esse pensamento voltou para perto da companheira disposto a tentar a fuga no dia seguinte. Se recostou nas pedras ao lado de Agatha, e pouco a pouco o cansaço prevaleceu, e ele dormiu. Acordou no meio da noite, com o crepitar de uma fogueira na beira da escarpa. Vultos de homens sentados nas pedras vigiando a escuridão da mata lá embaixo, demonstravam a preocupação dos nativos de serem surpreendidos pelos seus inimigos. Jonas teve pena daquele povo, humanos como ele, e condenados a uma eterna vigilância num mundo onde, em lugar de dominar serviam para satisfazer o apetite carnívoro de animais parecidos com insetos gigantes. Os pensamentos o fizeram sentir-se humilde e pequeno. Tinha descoberto que no Universo não havia supremacia de raças. O homem era senhor da Terra mas, em quantos outros planetas ele seria somente “gado” para outras espécies dominantes? Não respondeu a própria pergunta, e cansado dormiu outra vez. Amanheceu, e todos dormiam, a menos dos vigias acocorados nas pedras, com os olhos pregados na mata. Jonas acordou com alguém lhe cutucando o ombro. Virou rapidamente, e viu o menino loiro rindo ao seu lado. Rio também, e agradeceu o menino por tê-lo acordado. Quanto mais cedo descessem a escarpa, seria melhor. Acordou Agatha que sentou assustada, piscando para acostumar a vista a claridade intensa do dia. - Está na hora, – disse para a companheira – temos que enfrentar mais uma etapa. Agatha levantou sem dizer nada, e Jonas fez o mesmo. O menino segurou a mão do astronauta, e fazendo um sinal puxou o Comandante para o outro lado da porta da caverna. - O que será que ele quer? – perguntou Agatha. - Quer mostrar alguma coisa... Acho! O menino continuou puxando a mão do astronauta, apontando para o fim do patamar - Vamos ver o que ele quer nos mostrar – disse Jonas, indicando ao menino que seguisse em frente. Passaram a entrada da caverna, seguindo o garoto. Alguns homens, e mulheres saiam da caverna, mas não tomaram conhecimento nem dos alienígenas, nem do menino. No fim do patamar o menino habilmente subiu pelas pedras, e Agatha e Jonas logo perceberam que ele seguia uma trilha por entre as rochas, rumo ao Sul, justamente para onde queriam ir. Jonas comentou – Se ele conhece algum caminho por entre essas montanhas, estamos salvos. - Deus o ouça – foi o único comentário da moça. Acompanhando o menino, subiram e desceram montanhas baixas, ladearam enormes precipícios, e depois de horas de caminhada avistaram novamente a floresta embaixo, e a direita deles aparecendo sobre as arvores a ponta rombuda da nave exploradora. Agatha pulou de alegria quando Jonas mostrou o achado, e o garoto sem nada entender pulou e riu também, vendo o contentamento do casal, mas quando viu o que Jonas apontava, levou um susto, e com um grunhido se escondeu rapidamente atrás de uma pedra. Agatha rindo pegou o menino pelo braço apontou a nave, e ela mesmo, e ele entendeu que não precisava temer aquela coisa estranha que aparecia sobre as arvores. Estavam distraídos, ainda olhando a nave quando Jonas percebeu um bater vigoroso de asas, virou, e dois pés de garras pontiagudas se cravaram no seu peito jogando o astronauta no chão. Sob o olhar espantado de Agatha, e do menino, uma enorme ave de penas brancas, debatendo as asas, equilibrada sobre o astronauta, tentava bicar seu rosto. Jonas segurou o pescoço comprido da ave, ao mesmo tempo que procurava sua faca na cintura. Estava sofrendo dores alucinantes com aquelas garras cravadas no seu peito. Com o braço que segurava o pescoço da ave já perdendo as forças, a outra mão tremula achou o cabo da faca, e num esforço desesperado, puxou a lâmina da cintura, e com um único golpe decepou seu pescoço. Batendo as asas a ave decapitada tombou ao lado do astronauta, que jogou fora a cabeça que segurava pelo pescoço, e sentado apertou o peito gemendo de dor. Agatha com cuidado retirou a camiseta ensangüentada do noivo, limpou o sangue das feridas com o pano, enquanto Jonas mais ou menos refeito, se colocou em pé. - Meu bem – disse Agatha – precisamos chegar na nave o mais depressa possível... Esses ferimentos vão infeccionar! - Não se preocupe, – respondeu o astronauta em tom tranqüilo – já estamos perto, não vamos demorar. O menino puxou a mão de Jonas apontando para a montanha atrás deles. No alto, no meio de algumas pedras, via-se um enorme ninho feito de grossos gravetos, onde três cabeças penugentas com bicos pontiagudos apareciam olhando para baixo. - Por isso ela nos atacou! – comentou Jonas, e completou – Vamos embora. Os três iniciaram a descida pelo meio da rochas da escarpa, que era igual ao patamar dos nativos. Com cuidado para não caírem, em poucos minutos se viram no sopé da montanha, com a mata a menos de cem metros de distância. Precisamos de sorte agora – disse Jonas enquanto se encaminhavam para a floresta. Chegaram na mata sem problemas, e continuaram vagarosamente rumo a nave vigiando tudo, e cortando os galhos que atrapalhavam a passagem com muito cuidado para não fazer barulho. Depois de meia hora de caminhada silenciosa, viram com alegria, por entre os troncos das arvores, a nave brilhando, no centro da clareira. O menino quando viu a maquina, se escondeu atrás de Agatha, e Jonas ajoelhando ao lado dele, apontou a nave, fez o garoto se convencer que aquilo era realmente deles. O garoto era inteligente, entendeu o recado mas continuou acompanhando o casal agarrado na mão da astronauta. Quando Jonas andando na frente, chegou na clareira, num impulso se escondeu na mata arrastando com sigo Agatha e o menino. Em frente deles, bem próximo a nave, meia dúzia de gronkos acocorados, estavam distraídos numa acalorada conversa de guinchados. - Descobriram a nave! – disse Jonas baixinho. - Que será que estão esperando ali? – perguntou Agatha. - Devem ter relacionado a gente com a nave, com certeza estão nos esperando. - São burros... Deviam estar escondidos. - Ainda bem. Se fossem mais inteligentes, esses nativos, - disse Jonas apontando o menino – já teriam virado churrasco. - Que faremos? - São muitos não da para enfrentá-los. O garoto ajoelhado no mato ao lado de Jonas pareceu ter adivinhado o problema. Puxou o braço do astronauta apontou para ele, e para a nave, como que perguntando se ele queria ir lá. O Comandante distraído com as próprias idéias, acenou afirmativamente com a cabeça, e não prestou atenção quando o menino levantou ao seu lado. Quando o pequeno nativo saiu correndo para a clareira, Jonas tomando consciência de seus movimentos, tentou alcançá-lo com um braço, mas era tarde. O menino irrompeu no descampado gritando para chamar a atenção das bestas, e saiu correndo para a esquerda beirando a floresta. Os seis ao ver o garoto levantaram ao mesmo tempo, e ao som de estridentes guinchados saíram correndo atrás do garoto. O menino sabia que poderia escapar deles facilmente. Corria como uma lebre, enquanto os gronkos balançando o enorme traseiro eram lerdos e desengonçados. O astronauta entendeu as intenções do menino. Apertou o botão de controle remoto da porta, no seu cinturão, e juntamente com Agatha correu rapidamente para a nave. Precisava pegar uma arma lá dentro, e socorrer o garoto com urgência antes que aqueles animais o cercassem. Dois gronkos porém, que corriam atrasados dos outros, perceberam o movimento atrás deles, viraram, e brandindo os curtos bastões partiram para cima dos intrusos. Jonas parou para enfrentar as feras, e gritou para Agatha – Suba, traga uma arma! A moça continuou correndo, e subiu “voando” pela escada telescópica que acabara de se abrir. Enquanto isso, Jonas desembainhou a faca, ligou sua lâmina serrilhada, e esperou o ataque da criatura que vinha na frente. Segurando o porrete no alto da cabeça o gronko alcançou o alienígena, e desceu a arma com toda a força na sua cabeça. O astronauta tirou o corpo de lado, agachou, e cravou a faca na barriga da criatura, que com um guinchado agudo, tropeçando no próprio bordão, se amontoou no chão estrebuchando. O outro que vinha atrás, roncando de raiva, e sem diminuir a carreira, tentou da mesma forma rachar a cabeça do Comandante. Este aproveitando o impulso do adversário, segurou seu braço, deitou de costas no chão, colocou o pé no seu ventre, e num balão perfeito jogou o animal por cima do corpo, que se estatelou de costas no chão, por trás do astronauta. Jonas levantou rapidamente, pegou o porrete que tinha escapado das mãos da criatura, e com uma bordoada estourou a cabeça do gronko com tanta violência que seus olhos como duas enormes ameixas, saltaram de suas órbitas. Nesse instante Agatha apareceu no alto da escada carregando dois fuzis. Jogou um para o astronauta, que segurou a arma, e sem esperar pela companheira saiu correndo em socorro do menino. Enquanto Jonas era barrado pelos dois gronkos, o garoto entrou na mata perseguido pelos outros, deu uma enorme volta, sempre se deixando ver pelos seus seguidores, e retornou para a clareira justamente em frente ao amigo que vinha em seu socorro. Quando as quatro criaturas irromperam na clareira, em lugar de avistar o garoto, deram de cara com o astronauta, plantado em sua frente, as pernas abertas, e o fuzil seguro por uma das mãos, a meia altura do corpo. Não houve tempo para reações, raios brancos e mortais partiram da arma, e dois dos animais com os órgãos estraçalhados despencaram no chão. Os que vinham atrás desapareceram dentro do mato, e quando Jonas chegou na borda da floresta, só ouviu o som de galhos violentamente quebrados pela sua fuga desabalada. Desistiu de persegui-los. Não tinham mais importância. Dependurou a arma no ombro, e deu de costas para a mata. O menino gritando de alegria correu para ele de braços abertos, e se dependurou no seu pescoço. Carregando o garoto em um dos braços o astronauta voltou para a nave onde no pé da escada Agatha o esperava sorrindo. Colocou o menino no chão, e segurou a moça pelo ombro de encontro ao peito, enquanto por instantes, olhando distraidamente a floresta, se perdeu na lembrança dos companheiros mortos. Voltou a realidade rapidamente, colocou a mão na cabeça do garoto, e disse para a noiva: - Ele não pode ficar... Temos que levá-lo. - Ah! É lógico, se ficar podem pegá-lo, - e concluiu – aqueles dois que fugiram podem estar espreitando a nave. - Tem razão, vamos embora – concluiu o astronauta, empurrando o garoto para a escada. O menino deslumbrado pela aventura subiu pulando os degraus como se estivesse muito familiarizado com a nave, seguido de Agatha e Jonas, sorrindo com o entusiasmo do garoto. _______________________________ CAPITULO XI O Comandante assumiu o painel de controle, recolheu a escada, fechou a porta de entrada, ligou o vídeo-transmissor, e na tela apareceu a imagem do operador da nave mãe, que estando meio adormecido, se assustou com o aparecimento na tela a figura do Comandante. O menino deslumbrado, olhava tudo com espanto, se assustou mais ainda com o aparecimento do operador, e num salto se escondeu atrás da poltrona do astronauta - Comandante! – exclamou o operador, e completou – Graças a Deus! - Positivo Frank, transfira a transmissão para a cabine de comando, quero falar com Clark. - Pra já senhor. A imagem do vídeo embranqueceu por instantes, e em seguida Clark, com um largo sorriso apareceu no vídeo, e foi logo gritando: - Arre! Você nos pregou um enorme susto... O que aconteceu? A fisionomia séria do astronauta no vídeo matou de imediato a alegria do Subcomandante. - Não fomos felizes... Joel, Drumont e Gerson estão mortos.. - Como? – perguntou Clark com espanto. - Verdade – afirmou o Comandante. - Meu Deus! Como foi isso? E Agatha? -Ágatha esta bem... Vocês saberão de tudo apenas eu subir, mas não vai ser agora... Tenho um serviço ainda para fazer. - Sozinho? - Não se preocupem, vocês podem acompanhar tudo pela tela, e apenas eu terminar entrarei em contacto de novo... Aguardem. Dizendo isso, Jonas que tinha pressa, porque queria terminar sua missão antes que o dia terminasse, desligou o transmissor, e em seguida ligou a tela panorâmica. Em instantes a imagem de cento e oitenta graus, de toda a área externa, apareceu em três dimensões. Agatha olhou para o garoto, para sentir sua reação, mas este não se espantou. Para ele tinham aberto uma enorme janela, e o que ele via nada mais era do que a região onde ele vivia. - Prenda o garoto – pediu Jonas. Agatha pegou o menino pela mão, fez ele sentar numa poltrona em frente ao vídeo, e o prendeu com os cintos de segurança. O menino apesar de um pouco assustado, aceitou ser preso na poltrona, e se tranqüilizou quando Agatha fez o mesmo na poltrona ao lado. O astronauta ligou os foguetes da nave, e acelerou lentamente sua potência. Um ligeiro tremor, e o barulho surdo dos propulsores foram as únicas coisas que indicaram sua ascensão. Os pés pneumáticos se encolheram desaparecendo na fuselagem, e a cento e sessenta pés de altura a nave se estabilizou. Jonas ligou os foguetes laterais, manejou os controles, e com uma ligeira inclinação a nave avançou rumo ao Norte. A floresta, e a montanha começaram a passar lentamente na tela panorâmica, para assombro do garoto que olhava extasiado. Em pouco tempo o patamar onde se refugiavam os nativos humanos apareceu na tela, foi se aproximando, e tornou-se perfeitamente visível a esquerda do telão, e enquanto a nave passava a meia altura a sua frente, se via os nativos apavorados, correndo por todos os lados, agachados entre as pedras, e desaparecendo na entrada da caverna. O menino vendo seu povo correndo feito loucos, passou a rir nervosamente, e sem entender porque todos estavam tão assustados, começou a agitar os braços, e a gritar, pensando ser visto e ouvido. Quando a imagem da tribo desapareceu na lateral da tela, o menino parando de se agitar, olhou desanimado para o astronauta que, sorrindo de sua ingenuidade, afagou seus cabelos. Em poucos minutos a mata terminou, Jonas reduziu a velocidade da nave, e parou no ar na orla da floresta. Na tela panorâmica, bem em frente, sob o olhar apavorado do menino, aparecia toda a aldeia dos gronkos, envolta pela fumaça das fogueiras. Quando as criaturas que estavam nas trilhas, viram a nave pairando sobre a mata, as reações foram as mais diversas possíveis. Alguns brandindo os curtos porretes no rumo da nave, guinchando de raiva, davam demonstração de coragem para os companheiros. Outros, simplesmente curiosos, se li9mitavam a olhar. As fêmeas, mais assustadas arrastavam os filhotes para dentro dos cupins, e nos buracos das janelas dezenas de cabeças pontudas apareceram para ver o que estava acontecendo. Na nave duas escotilhas se abriram projetando para fora dois canhões estriados. Na tela panorâmica uma cruz branca, dirigida por Jonas no painel de controle, se fixou sobre os primeiros cupins da aldeia. - Por mim e pelos meus companheiros – sussurrou o astronauta, ao mesmo tempo que apertava um gatilho vermelho embutido na alavanca de controle.Raios brancos partiram das armas, e com precisão cirúrgica atingiram o local marcado pela cruz. Uma violenta explosão jogou pelos ares milhares de torrões de terra, misturados com corpos de gronkos despedaçados. Sob os olhos espantados do garoto, Jonas foi sistematicamente destruindo a aldeia das criaturas, que desesperadas tinham se escondido nos cupins. Durante meia hora o astronauta permaneceu atirando contra a aldeia. Quando parou, abaixo da nuvem de poeira que se elevava no céu, só se via montes de terra solta coalhada de corpos gosmentos das criaturas estraçalhadas. A nave, flutuando sobre os escombros da aldeia totalmente destruída, parou no ar a pouca distância do cercado dos prisioneiros nativos, que não tinham sido molestados. Tanto os índios brancos, como os cachorros que os cercavam, totalmente apavorados pelo barulho das explosões corriam por todos os lados, desorientados, tentando fugir de qualquer maneira. Raios brancos partiram dos canhões da nave, se fixaram em pontos das duas paliçadas, e em pouco tempo a madeira se transformou em cinza, abrindo duas grandes passagens na prisão. Cachorros,e prisioneiros se misturaram na fuga pela passagem, e se espalharam pelos destroços da aldeia. Jonas virando para o menino, disse: - Seu povo agora vai ter sossego por algum tempo. O garoto olhou interrogativamente o astronauta sem entender, e Agatha perguntou: - Vamos devolve-lo agora? Jonas pensou alguns instantes, e disse: - Não. Vamos levá-lo conosco. É jovem, pode apreender nossa língua, estudar, e quem sabe algum dia possa voltar, e ajudar seu povo a eliminar deste planeta essa raça de criaturas nojentas. Naquela tarde, na tribo do menino, todos ouviram os estrondos vindos da aldeia dos gronkos, e viram espantados, sobre uma enorme nuvem de poeira, aquele estranho objeto, que tinha passado em frente deles, subindo rapidamente, e desaparecendo nas nuvens do céu. FIM