A IMPORTÂNCIA DA MUSICALIZAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DA
ATENÇÃO NA CRIANÇA
Mirian Maria de Almeida 1
Cleudet de Assis Scherer 2
Introdução
Este texto tem por finalidade relatar o resultado da prática de Estágio
Supervisionado I do curso de Pedagogia da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de
Campo Mourão (FECILCAM), desenvolvido em uma pré-escola do município de
Roncador-PR. Estagiamos em uma turma do nível III, composta por 25 alunos de 4 a 5
anos, com o tema “A importância da Musicalização para o desenvolvimento da atenção
na criança”, uma vez que, por meio de observações percebemos que a música não é
utilizada nesse contexto escolar como uma linguagem que contribui para o
desenvolvimento da criança.
Analisamos também que os educadores desconhecem as várias possibilidades de
trabalhar com essa linguagem, visto que, a “Música” especificamente, está presente no
próprio projeto curricular da escola, porém, não são preparadas aulas próprias com esse
conteúdo, apenas a utilizam como passatempo, entre uma atividade e outra.
Ao apropriar-se da linguagem musical, segundo autores como Brito (2003),
Jeandot (1997), Scherer (2007, 2010), a criança desenvolve sua acuidade auditiva, ao
acompanhar gestos e danças, amplia a sua coordenação motora e aguça sua atenção. A
música também possibilita a criança um melhor uso da linguagem, estimula a
criatividade e imaginação, ao trabalhar com sons propicia a oportunidade de estabelecer
relações com seus pares e com o ambiente. Enfim, por meio dela a criança começa a
conhecer melhor a si mesma, ao desenvolver sua noção de esquema corporal e também
sua comunicação com o outro.
1
Graduanda do curso de Pedagogia da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo MourãoFECILCAM.
2
Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Maringá- UEM e Professora do Departamento de
Pedagogia da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão- FECILCAM.
Para a realização da nossa prática de estágio, partimos da abordagem HistóricoCultural, proposta por Vygotsky e seus colaboradores, a qual considera que o
desenvolvimento humano tem sua origem nas relações sociais, que é influenciado tanto
pela história quanto pela cultura.
Nesta perspectiva, a criança nasce desprovida de qualquer tipo de conhecimento,
no entanto, ela nasce em um meio cultural, em que conhecimentos são produzidos
historicamente a partir das relações sociais. E é por auxilio da fala e da vida em um
meio cultural que ela irá se situar no mundo.
Segundo Gasparin (2002), na perspectiva Histórico-Cultural, a tarefa docente
visa trabalhar o conteúdo científico e contrastá-lo com o cotidiano, com o objetivo de
fazer com que os alunos, ao executarem inicialmente a mesma ação do professor, por
meio das operações mentais de analisar, comparar e explicar aproprie-se dos
conhecimentos científicos e neles incorporem os anteriores, dessa maneira,
transformando-os também em científicos, constituindo um conceito mais elaborado a
respeito do conteúdo.
Dessa maneira, os conceitos do professor não se transmitem de forma mecânica
e direta ao aluno, não são passados de uma cabeça para outra. O caminho percorrido
desde o primeiro contato da criança com o novo conceito até o momento em que a
palavra se torna propriedade sua, como conhecimento científico, é um longo e
complicado processo psíquico “que envolve a compreensão da nova palavra, seu uso e
assimilação real” (GASPARIN, 2002, p.61). Levando em consideração estas questões,
cada aluno então, é visto como ser dotado de cultura histórica e social e é participante
ativo no seu processo de aquisição de conhecimento.
Com base nestas considerações, utilizamos em um primeiro momento os
conhecimentos que as crianças já tinham sobre o conteúdo, e logo em seguida
exploramos novos conhecimentos, por intermédio de músicas, cantigas de roda,
explorando os sons do corpo, da natureza, de casa, os instrumentos musicais. Para isso
usamos alguns materiais, como toca CD, instrumentos musicais de brinquedo,
instrumentos musicais feitos com sucata.
Para melhor explicitar os estudos efetuados, apresentaremos inicialmente no
decorrer deste artigo, a concepção de infância e de Música como linguagem educativa e
posteriormente os resultados obtidos durante a nossa prática de estágio. Sendo possível
afirmar que nosso objetivo de contribuir por meio da musicalização para o
desenvolvimento da atenção voluntária na criança foi atingido, uma vez que, os
professores da instituição notaram a importância de utilizar essa linguagem no contexto
escolar e as crianças aprenderam como é importante escutar com atenção e
concentração.
Musicalização na Educação Infantil: Sua importância para o desenvolvimento da
atenção.
Segundo Oliveira (2008), ao longo de muitos séculos, o cuidado e a educação de
crianças pequenas era atribuído como tarefa de responsabilidade familiar. Logo após o
desmame, a criança vista como um pequeno adulto, desde muito cedo, passava a ajudar
os adultos em tarefas cotidianas. Com o desenvolvimento científico, ocorreram novas
visões sobre como elas deveriam ser educadas. Dessa maneira, foram organizados
serviços de atendimento às crianças abandonadas por suas famílias, ou cujos pais
trabalhavam em fábricas. Como explica a autora,
Gradativamente, surgiram arranjos mais formais para atendimento de
crianças fora da família em instituições de caráter filantrópico [...]
Não tinham uma proposta instrucional formal, embora logo passaram
a adotar atividades de canto, de memorização de rezas ou passagens
bíblicas e alguns exercícios do que poderia ser uma pré-escrita ou préleitura (OLIVEIRA, 2008, p. 60).
Outras iniciativas também levaram à criação de instituições para atender as
crianças acima de três anos, filhos de mulheres operárias. Eram os chamados asilos e as
infant schools, nas quais, era ministrado para os filhos dos operários o ensino da
obediência, da moralidade, da devoção e do valor do trabalho.
Ao longo da história as instituições de crianças pequenas receberam diversos
nomes: Jardim de Infância, Pré-Escola e Creches. Em meados dos anos 80 do século
XX, ocorreram diversos debates em torno das funções das creches que passaram a ser
entendidas como um local de educação de crianças de zero a cinco anos.
A preocupação com a Educação Infantil teve um grande avanço no decorrer dos
anos, como também por um ensino mais centrado na criança. As instituições escolares
como cita Oliveira (2008), não tinham uma proposta instrucional formal, voltavam-se
apenas para o desenvolvimento de bons hábitos e valores religiosos, no entanto,
atualmente possuem uma proposta pedagógica ampla, envolvendo o desenvolvimento
motor, cognitivo, afetivo e psicológico da criança.
A partir da inquietação com uma escola que proporcionasse um ensino mais
centrado na criança, hoje vemos um grande avanço nas propostas pedagógicas no que se
refere ao desenvolvimento da criança em todos os aspectos: corporal, intelectual e
afetivo. Justamente foram esses aspectos que procuramos enfatizar durante a nossa
prática de estágio com a musicalização, nos apropriamos de conceitos de diversos
estudiosos que elaboraram pesquisas com o intuito de perceber como se dá o
desenvolvimento e a aprendizagem na criança de zero a cinco anos, para posteriormente
entendermos qual a importância da música para esse desenvolvimento. Dentre estes
teóricos temos Vygotsky (1896-1934), bem como os seus colaboradores.
Vygotsky (1991) retrata que o desenvolvimento da criança ocorre por meio das
relações sociais, e pela mediação de conhecimentos produzidos histórico e
culturalmente. Por intermédio da interação com o meio e com o mediador que ela
conseguirá se desenvolver. Dessa maneira, “antes de controlar o próprio
comportamento, a criança começa a controlar o ambiente com a ajuda da fala. Isso
produz novas relações com o ambiente, além de uma nova organização do próprio
comportamento” (VYGOTSKY, 1991, p. 27).
O desenvolvimento dessas potencialidades caracteristicamente humanas de
comportamento irá produzir mais tarde na criança, o intelecto, que constitui a base do
trabalho produtivo, ou seja, a forma especificamente humana da utilização de signos e
instrumentos. Segundo Vygotsky (1991), as funções psicológicas superiores, como a
linguagem, a memória e a atenção voluntária, são construídas ao longo da história social
do homem, isso se faz desde o seu nascimento, em sua relação com o mundo por meio
da mediação.
Dessa forma, percebemos que a escola deve propiciar o desenvolvimento de
diferentes linguagens, entre elas citamos a Música, que deve fazer parte da rotina dos
centros de Educação Infantil, visto que, segundo Lino,
A linguagem musical é um meio de organização da realidade, e sua
compreensão não é anterior a seu uso: é o seu uso que organiza a
experiência e permite sua compreensão. A linguagem musical é a
organização do som, estruturado numa forma que estabelece relação e
gera significados, provenientes da coordenação e ordenação integrada
do sujeito, do objeto sonoro e de seu meio sociocultural (LINO, 2005,
p. 68, grifo do autor).
A partir desse pressuposto, consideramos que a música é um instrumento de
desenvolvimento de grande importância, uma vez que por meio dela funções psíquicas,
orgânicas e sociais podem ser aprimoradas. Já que essa linguagem está presente há
muito tempo na vida do ser humano. Como aponta Jeandot,
A receptividade à música é um fenômeno corporal. Ao nascer, a
criança entra em contato com o universo sonoro que a cerca: sons
produzidos pelos seres vivos e pelos objetos. Sua relação com a
música é imediata, seja através do acalanto da mãe e do canto de
outras pessoas, seja através dos aparelhos sonoros de sua casa
(JEANDOT, 1997, p. 18).
Em todas as civilizações costuma-se acalentar os bebês com cantos e
movimentos. Segundo a autora, antes mesmo de nascer, ainda no útero materno, a
criança já toma contato com um dos elementos fundamentais da música: o ritmo, por
meio das pulsações do coração de sua mãe. Antes mesmo de começar a falar, podemos
ver o bebê cantar, gorjear, experimentando os sons que podem ser produzidos com a
boca.
Ao entrar em contato com os objetos, ela rapidamente começa a
interagir com o mundo sonoro, que é o embrião da música, e, nessa
idade, qualquer objeto que produz ruído torna-se para ela um
instrumento musical capaz de prender sua atenção por muito tempo
(JEANDOT, 1997, p. 19).
Como explica a autora, a criança não é artista, mas antes de tudo um ser
“rítmico-mímico”, que usa espontaneamente os gestos ao sabor da sensação que eles
despertam. É só observar um bebê com uma colher posta à sua disposição antes da sopa,
“ele bate na mesa, repetindo o gesto para renovar a sensação provocada” (JEANDOT,
1997, p. 19).
Percebemos desta maneira, que a música tem grande influência sobre a criança
antes mesmo de seu nascimento. Devido a isso os jogos ritmados, próprios dos
primeiros anos de vida, devem ser trabalhados e incentivados na escola, ao adulto
caberá compreender em que medida a música constitui uma possibilidade expressiva
privilegiada para a criança, uma vez que atinge diretamente sua sensibilidade afetiva e
sensorial. Segundo pesquisa de Scherer,
[...] as crianças que já estudam musicalização desde o berçário e hoje
estão em média com três anos e meio a quatro anos, estabelecem uma
diferença positiva no desenvolvimento em relação a outras crianças
recém chegadas a escola, desenvolvimento este, na percepção
auditiva, memória, atenção, coordenação motora, trazendo suas
próprias experiências de fora para o contexto escolar principalmente
na fala e representações sonoras (SCHERER, 2007, p. 107).
Com base em tais conceitos, nosso primeiro contato com as crianças foi por
meio da “chamada musical”, com o intuito de aprendermos os nomes uns dos outros e
sabermos quem estava presente, cantamos: “Quem chegou à aula aqui foi a... que prazer
é vê-la aqui ó...” falando o nome de cada criança.
Posteriormente, explicamos às crianças, a importância de conhecer o silêncio.
Perguntamos o nome de cada um e em seguida pedimos que todos falassem ao mesmo
tempo e bem alto o próprio nome, dessa maneira ninguém conseguiu entender o que
cada um falou. A partir dessa atividade, evidenciamos que o silêncio é muito importante
para podermos ouvir e entender os sons. Perguntamos a eles: Por que vocês não
entenderam o que o colega disse? Responderam: “Porque tava muito barulho”
Dessa maneira, conseguimos fazer com que entendessem a importância do
silêncio, uma vez que é por intermédio dele que conseguimos escutar os sons
encontrados em nosso dia-a-dia, escutar os sons dos animais, dos carros na rua, os sons
de casa, entre outros. Além disso, propicia a capacidade de ouvir enquanto outro está
falando, desenvolvendo assim a atenção voluntária e, ao mesmo tempo o respeito.
Solicitamos que todas as crianças debruçassem em suas carteiras e ficassem em
silêncio para ouvirem os sons ao seu redor. Em seguida fizemos a seguinte pergunta:
Que sons vocês puderam perceber? As crianças responderam: o passarinho, a moto,
conversas, carro, entre outros. A partir disso, notamos que existem variados tipos de
sons ao nosso redor, mas que para ouvi-los precisamos de algo muito importante, o
silêncio.
Em outro momento, desenvolvemos atividades envolvendo sons e ruídos,
explicamos que os sons agradáveis são chamados de musicais e os sons desagradáveis
são chamados de ruídos. Para percebermos o que é o som, pedimos aos alunos que
colocassem a mão na garganta e gritassem: Háa! Assim, todos sentiram a vibração da
voz, explicamos que por meio do ar as vibrações da nossa voz chegam até os ouvidos.
Em seguida cantamos a música “O sapo não lava o pé”, prestamos muita atenção
ao som da nossa voz, cada um dos alunos cantou sozinho uma parte da música, para que
assim pudesse ouvir somente o som da própria voz. Segundo a autora, “cantando
coletivamente, aprendemos a ouvir a nós mesmos, ao outro e ao grupo como um todo.
Dessa forma, desenvolvemos também aspectos da personalidade, como atenção,
concentração, cooperação e espírito de coletividade” (BRITO, 2003, p. 93).
Conforme a autora é importante que o trabalho vocal ocorra num ambiente
motivador e descontraído. O educador deve formar bons hábitos nas crianças, ou seja,
explicar que não se deve gritar, não forçar a voz e acima de tudo assegurar igualdade de
chances para que toda criança possa ter acesso a música.
Posteriormente, realizamos uma aula a respeito dos sons do nosso corpo,
fizemos um círculo e explicamos que o nosso corpo também produz som.
Demonstramos e solicitamos que fizessem sons com a boca, nariz, mãos, dedos, e pés.
Nesse momento, uma criança disse: “Profe, minha barriga também faz som, quando
estou com fome ela ronca”. A partir dessa atividade percebemos que as crianças
trouxeram experiências do cotidiano e compreenderam que existem outras formas de
fazermos sons utilizando nosso corpo. Dessa maneira, “o modo como as crianças,
percebem, apreendem e se relacionam com os sons, no tempo-espaço, revela o modo
como percebem, apreendem e se relacionam com o mundo que vêm explorando e
descobrindo a cada dia” (BRITO, 2003, p. 41).
As crianças interagem permanentemente com o ambiente sonoro que está ao seu
redor, “[...] é um ser ‘brincante’ e, brincando, faz música [...]” dessa forma, se relaciona
com o mundo que descobre diariamente (BRITO, 2003, p.35).
Após desenharem seu próprio corpo e marcarem na figura as partes que
produzem sons, cada aluno mostrou seu desenho para a turma e representou um tipo de
som produzido pelo seu corpo. A atividade de interação entre as crianças é muito
importante, uma vez que, de acordo com Vygotsky (1991), a fala é um importante
instrumento de desenvolvimento, “a criança começa a perceber o mundo não somente
através dos olhos, mas também através da fala”, visto que é pela comunicação que ela
irá trocar informações com outras pessoas (VYGOTSKY, 1991, p.36).
Explicamos aos alunos que os animais também produzem som e que podem ser
fortes ou fracos. Exemplificamos que sons fortes são aqueles feitos por leões, onças,
elefantes e sons fracos são feitos por passarinho e grilo. Em seguida, pedimos que cada
aluno imitasse o som de algum animal, um deles disse: “Vou imitar um dragão, mas
como vou soltar fogo pela boca?” outro replicou “Você não precisa soltar fogo, é só
imitar o som dele”. Observamos com essa atividade que, “quando criamos um ambiente
musical na sala de aula, podemos notar que as crianças pesquisam e improvisam
livremente, criando sons que os adultos talvez só obtivessem com menos facilidade,
dada sua inibição e falta de espontaneidade” (JEANDOT, 1997, p. 30).
Dessa forma, é importante que o trabalho com a voz ocorra num ambiente
motivador e descontraído, livre de tensões exageradas que comprometam a desenvoltura
da criança.
Para finalizar o conteúdo cantamos a música “A voz dos animais” de Nilsa
Zimmermann, fazendo gestos e sons. Segundo Jeandot, “é a partir dessa relação entre o
gesto e o som que a criança - ouvindo, cantando, imitando, dançando - constrói seu
conhecimento sobre a música, percorrendo o mesmo caminho do homem primitivo na
exploração e na descoberta dos sons” (JEANDOT, 1997, p. 19).
Conforme Vygotsky (1991), no desenvolvimento da criança a imitação e o
aprendizado desempenham um papel importante. Trazem à tona as qualidades
especificamente humanas da mente e levam a criança a novos níveis de
desenvolvimento. Uma vez que, o que a criança é capaz de fazer hoje em cooperação,
será capaz de fazer sozinha no futuro.
De acordo com Vygotsky (1991a, p. 89), “para imitar, é necessário possuir
meios para se passar de algo que já se conhece para algo novo. Com o auxílio de outra
pessoa, toda criança pode fazer mais do que faria sozinha [...]”. Nesse sentido, quando a
criança imita a forma que o adulto manipula instrumentos, ela está dominando o
verdadeiro princípio envolvido numa atividade particular, dessa forma, está gerando
oportunidade de desenvolvimento intelectual.
A atenção nessa atividade também exerce papel fundamental, a criança necessita
estar atenta, para ouvir a música, fazer o som e no mesmo instante executar o gesto.
Segundo Vygotsky (1991) a atenção, sendo uma das complexas funções superiores, tem
sua origem nas relações sociais do indivíduo com o mundo, ou seja, a atenção é
desenvolvida a partir das relações que o ser humano mantém com o mundo exterior.
Notamos assim, a relevância da musicalização nesse desenvolvimento, sendo que,
“como uma das formas de representação simbólica do mundo, a música, em sua
diversidade e riqueza, permite-nos conhecer melhor a nós mesmos e ao outro - próximo
ou distante” (BRITO, 2003, p. 28).
Outra atividade que propusemos, foi a respeito dos sons de dentro da nossa casa.
Conversamos com as crianças e explicamos que dentro de nossa casa temos vários
utensílios desde colheres e panelas, até secador de cabelo, máquina de lavar, entre
outros que também emitem sons. Uns podem ser considerados sons e outros ruídos.
Entregamos uma ficha para cada aluno contendo a figura de um utensílio, cada um
deveria imitar o seu som. Após, disponibilizamos para as crianças revistas, na qual
deveriam encontrar figuras de diferentes aparelhos domésticos recortarem e colá-los em
seu caderno. Em seguida, ensinamos à música “A casa” de Vinícius de Moraes. Dessa
maneira percebemos que, segundo Brito, música é gesto, movimento e ação.
No entanto, é preciso dar às crianças a possibilidade de desenvolver
sua expressão, permitindo que criem gestos, que observem e imitem
os colegas e que, principalmente, concentrem-se na interpretação [...]
sem a obrigação de fazer gestos comandados durante todo o tempo
(BRITO, 2003, p. 93).
Conforme a autora, a canção é um gênero musical que funde música e poesia.
Quando cantam as crianças imitam o que ouvem, desenvolvem sua expressão corporal e
estimulam sua atenção. Desde que essa atividade seja realizada em um ambiente de
orientação e estímulo, tanto à escuta como à interpretação.
Conduzimos a aula com os sons da natureza, da mesma forma como fizemos a
atividade anterior, as crianças pegaram uma ficha contendo um desenho de um som da
natureza: chuva, vento, trovão, cachoeira, entre outros e deveriam imitar o devido som,
e em seguida explicitar se esses sons eram curtos ou longos, fortes ou fracos.
Segundo a autora, ao desenvolver um trabalho vocal com a criança, além de
cantar, devemos “brincar com a voz, explorando possibilidades sonoras diversas”
(BRITO, 2003, p. 89). Ou seja, imitar vozes de animais, ruídos, entoarem movimentos
sonoros, entre outros, tendo como finalidade aguçar e desenvolver a criatividade e
atenção na criança.
Como afirma Vygotsky (1991, p. 40), “dentre as grandes funções da estrutura
psicológica que embasa o uso de instrumentos, o primeiro lugar deve ser dado a
atenção”. Isso porque a capacidade ou incapacidade de focalizar a própria atenção é um
determinante indispensável do sucesso ou não de qualquer ação. Justamente é esse um
dos objetivos da música: desenvolver a atenção voluntária nas crianças.
A partir desse pressuposto, desenvolvemos nossa aula a respeito dos meios de
transporte da seguinte maneira: contamos para os alunos que para nos locomover
precisamos de um meio de transporte, que pode ser um carro, uma moto, um avião, um
trem, entre outros, em seguida, imitamos juntos o som de cada um dos meios de
transporte.
Distribuímos figuras de diversos meios de transporte para cada criança, porém
existiam cinco fichas iguais, por exemplo: cinco motos, cinco aviões. Explicamos que
todos deveriam ficar em círculo e quando fosse dado um sinal todos deveriam imitar ao
mesmo tempo o som do meio de transporte que pegou. Desse modo, cada criança
deveria prestar atenção nos seus colegas para encontrar e formar grupo com as outros
que pegaram a mesma figura, para todos imitarem junto o mesmo som. As crianças
ficaram totalmente atentas para descobrir quem estava imitando o mesmo som que o
seu, porém houve exceções, alguns estavam dispersos e desatentos, não conseguindo
executar a atividade.
Conforme a autora, a voz é nosso primeiro instrumento, “instrumento natural
que é meio de expressão e comunicação desde o nascimento” (BRITO, 2003, p.87).
Evidenciamos então, por meio desta atividade que, estar atento para ouvir os sons que
estão ao redor, é muito importante para o desenvolvimento afetivo, cognitivo e
obviamente musical.
Nossa seguinte atividade foi com o conto sonoro, o qual se tratava de uma
história contando as atividades realizadas por um menino num dia de domingo, no
decorrer da narrativa existiam diversos nomes de objetos e animais que produzem sons.
Entregamos a cada criança objetos como: relógio, sino, escova de dente, xícara de café,
martelo e lixa. Contamos a história duas vezes e pedimos que prestassem o máximo de
atenção, em seguida explicamos que quando disséssemos o nome de algum objeto que
tinham em mãos, deveriam usá-lo e produzir som. A atividade foi muito interessante,
sendo que, todos ficaram em total silêncio e apreensivos em ouvir o nome do objeto que
estava segurando.
Além de desenvolver a concentração e a imaginação, essa atividade também
desenvolveu de maneira lúdica o conceito de normas e regras. Cada um deveria esperar
o seu momento de fazer o som com o devido objeto. Para Leontiev,
Dominar as regras significa dominar seu próprio comportamento,
aprendendo a controlá-lo aprendendo a subordiná-lo a um propósito
definido. O propósito surge aqui, é claro, diretamente relacionado com
o papel representado no brinquedo, ele não é ainda compreendido
como a regra do jogo. A significação psicológica do propósito
apropriado é, por isso, descoberta mais tarde nos jogos que chamamos
de “jogos com regras e objetivos próprios” (LEONTIEV, 1988, p.
139).
Desenvolvemos também atividades a respeito da qualidade dos sons, e em
especial o timbre, que é a característica que diferencia cada som. Como explica Brito
(2003, p.19) “costumamos dizer que o timbre é a “cor” do som”. Demonstramos por
meio de exemplos que o som pode ser baixo e alto: quando um som é baixo, é chamado
de som grave, quando é alto, é chamado de som agudo e que também os sons podem ser
curtos ou longos, como por exemplo, o som do telefone tocando é um som longo, o som
de alguém estalando os dedos é um som curto.
Para aprender as diferenças entre os sons, ensinamos a canção “O meu chapéu”
de domínio popular. Após aprendermos a música, explicamos que quando a professora /
estagiária mostrasse um cartão vermelho, todos deveriam cantar só no pensamento sem
imitir sons, cartão azul cantar fraco e cartão verde cantar forte. Dessa maneira,
conseguimos fazer com que as crianças exercitassem sua atenção, uma vez que
deveriam ficar totalmente atentas para o sinal e consequentemente alterar o tom da voz.
A música é linguagem, dessa maneira, devemos seguir em relação à música, o
mesmo processo de desenvolvimento que adotamos quanto à linguagem falada, ou seja,
“devemos expor a criança à linguagem musical e dialogar com ela sobre e por meio da
música” (JEANDOT, 1997, p. 20). O educador, antes de transmitir sua própria cultura
musical, deve pesquisar o universo musical a que a criança pertence, e encorajar
atividades relacionadas com a descoberta e com a criação de novas formas de expressão
por meio da música. Segundo a autora,
Muitas vezes, quando a música é ensinada em escolas ou
conservatórios, oferece-se à criança um método, um instrumento, e
muitos já esperam “maravilhas” ao final do primeiro mês de estudo,
sem que haja antes um trabalho, através do qual a criança possa ouvir,
escutar, perceber, descobrir, imitar, repetir os sons, isto é, construir
seu conhecimento sobre a música (JEANDOT, 1997, p. 20).
A partir desse pressuposto, reafirmamos para as crianças que o som está presente
em todos os momentos de nossa vida, mas que também existem objetos próprios para
produzir sons agradáveis, estes são chamados instrumentos musicais, dos quais
podemos tocar lindas melodias, estes podem ser de sopro (flauta, trompete), percussão
(chocalho, pandeiro) e de cordas (violão). Entregamos para cada aluno um instrumento
musical: pandeiro, violão, flauta e alguns feitos de sucata como: chocalho, reco-reco.
Solicitamos que tocassem os instrumentos um de cada vez, para poder ouvir o
som que cada um produz. Ensinamos a música: “A loja do mestre André” e quando
todos já sabiam cantar, iniciamos com os instrumentos musicais. Nesse sentido, “é
importante ressaltar que a música ao trabalhar com instrumentos de percussão, em que
as crianças tocam e param nos momentos certos indicados pelo gesto do professor,
desenvolverão a atenção seletiva de forma lúdica e prazerosa” (SCHERER, 2007, p.
106).
Notamos que as crianças ficaram totalmente atentas ao nosso sinal para tocarem
os instrumentos e, ao mesmo tempo fascinadas com a atividade, por vários momentos
pediam “Profe, vamos tocar de novo, agora quero o pandeiro...”. Houve até confusão
entre as crianças, uma vez que todos queriam o violão ou o pandeiro ao mesmo tempo,
porém conseguimos contornar a situação, ao propor que cada um iria tocar uma vez
cada instrumento. Assim, segundo Scherer (2007) o universo sonoro deve ser
apresentado de forma natural e intencional, de modo a proporcionar à criança o contato
com os diversos instrumentos musicais. Conforme Brito, percebemos que,
[...] um trabalho pedagógico-musical deve se realizar em contextos
educativos que entendam a música como um processo contínuo de
construção, que envolve perceber, sentir, experimentar, imitar, criar e
refletir. Nesse sentido, importa, prioritariamente, a criança, o sujeito
da experiência e não a música, como muitas situações de ensino
musical insistem em considerar (BRITO, 2003, p. 46).
Dessa maneira, a educação musical não deve visar à formação de possíveis
músicos, mas sim à formação integral das crianças.
Por fim, realizamos a brincadeira “Bingo dos sons”, entregamos uma ficha para
cada criança (como uma cartela de bingo) em cada quadrado havia a figura de algum
som, exemplo: cachorro, carro, liquidificador, entre outros. Colocamos um CD
contendo sons variados, quando tocasse o som de uma moto, os alunos que tinham a
figura em sua cartela deveriam fazer um “X”, as crianças ficaram entusiasmadas com a
brincadeira, prestando muita atenção para ouvir cada som.
Perceber, produzir e relacionar-se com os sons, faz parte da história de vida de
todo ser humano. Dessa forma, é de suma importância que a criança aprenda a
diferenciar os sons que estão ao seu redor, uma vez que, segundo a autora,
A percepção, a discriminação e a interpretação de eventos sonoros,
geradores de interações com o entorno, têm grande importância no
que diz respeito à formação e permanente transformação da
consciência de espaço e tempo, um dos aspectos prioritários da
consciência humana (BRITO, 2003, p. 19).
Cantamos diversas músicas utilizando os instrumentos musicais. Cada aluno
deveria cantar uma música diferente utilizando seu instrumento, após, todos cantamos
juntos novamente a música “A loja do mestre André”. Pedimos que cada criança fizesse
um desenho do que mais gostou de aprender e depois explicasse oralmente o porquê do
desenho. Como explica Lino,
Assim como abrimos os olhos e enxergamos todo um campo visual
em nosso redor, o mesmo acontece com nosso ouvido: escutamos
quase todo o contexto sonoro que nos envolve. Educar esse ouvido é a
tarefa principal da escola onde a escuta se amplia à medida em que
promovemos estratégias que levam à experiências de produção,
percepção reflexão e representação musicais (LINO, 2005, p. 68).
Nessa ótica, analisamos que a musicalização é uma linguagem que pode
contribuir muito para o desenvolvimento das complexas funções superiores na criança,
em especial a atenção. Enfim, conforme aponta Brito (2003), aprender a escutar com
atenção e concentração, faz parte do processo de formação de seres humanos sensíveis e
reflexivos, capazes de perceber, sentir, relacionar e comunicar-se.
Considerações Finais
Diante das dificuldades enfrentadas na realização do Estágio Supervisionado I,
devido ao fato de ser a nossa primeira experiência na Educação Infantil, era evidente o
nervosismo e a insegurança nos primeiros dias, entretanto com o andamento das aulas e
com as devidas orientações fomos adquirindo confiança para podermos transmitir o que
haviamos preparado com muita dedicação.
Em relação as práticas realizadas, ficou claro que as crianças sentem necessidade
de expressar-se tanto corporal como oralmente, são seres ativos que tem a necessidade
de exteriorizar suas emoções. Para tanto, a musicalização contribuiu de maneira eficaz
nesse processo, por meio dela as crianças desenvolveram a oralidade, a comunicação
com o outro, expressaram suas sensações e emoções e em especial, desenvolveram a
atenção e a concentração.
Podemos apontar que esse trabalho foi de grande contribuição tanto para nós,
que pudemos constatar a importância da musicalização para o desenvolvimento das
funções mentais superiores, como para os professores do centro de educação infantil
que observaram e perceberam que a música não deve ser trabalhada apenas como
passatempo ou entre uma atividade e outra, mas sim, como uma linguagem que
contribui para o desenvolvimento da criança.
Em relação à maneira de trabalhar o conteúdo, procuramos sempre partir dos
conhecimentos que as crianças já tinham sobre o assunto, para posteriormente
explorarmos novos conhecimentos. Tendo como base a perspectiva Histórico-Cultural,
proposta por Vygotsky (1991) a qual considera que a criança aprende de acordo com
sua interação com o meio social em que vive.
Portanto, é possível afirmar que nossa prática de estágio teve resultados
satisfatórios. Como nosso objetivo era contribuir por meio da musicalização para o
desenvolvimento da atenção voluntária, consideramos que nossa meta foi atingida, uma
vez que, as crianças passaram a escutar com maior atenção as histórias contadas,
descrevendo-as com maior número de elementos e vocabulário e na bandinha rítmica
com instrumentos de percussão ficavam mais atentos a hora de começar e terminar as
canções. Essas ações foram percebidas também pelos professores, os quais puderam ter
conhecimento de como explorar melhor esta linguagem e os alunos que perceberam
como é importante aprender a escutar com atenção e concentração, sendo que essa
potencialidade é de suma importância para o seu desenvolvimento e aprendizagem.
Referências
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a importância da musicalização para o desenvolvimento da atenção