A IMPORTÂNCIA DA MUSICALIZAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DA ATENÇÃO NA CRIANÇA Mirian Maria de Almeida 1 Cleudet de Assis Scherer 2 Introdução Este texto tem por finalidade relatar o resultado da prática de Estágio Supervisionado I do curso de Pedagogia da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão (FECILCAM), desenvolvido em uma pré-escola do município de Roncador-PR. Estagiamos em uma turma do nível III, composta por 25 alunos de 4 a 5 anos, com o tema “A importância da Musicalização para o desenvolvimento da atenção na criança”, uma vez que, por meio de observações percebemos que a música não é utilizada nesse contexto escolar como uma linguagem que contribui para o desenvolvimento da criança. Analisamos também que os educadores desconhecem as várias possibilidades de trabalhar com essa linguagem, visto que, a “Música” especificamente, está presente no próprio projeto curricular da escola, porém, não são preparadas aulas próprias com esse conteúdo, apenas a utilizam como passatempo, entre uma atividade e outra. Ao apropriar-se da linguagem musical, segundo autores como Brito (2003), Jeandot (1997), Scherer (2007, 2010), a criança desenvolve sua acuidade auditiva, ao acompanhar gestos e danças, amplia a sua coordenação motora e aguça sua atenção. A música também possibilita a criança um melhor uso da linguagem, estimula a criatividade e imaginação, ao trabalhar com sons propicia a oportunidade de estabelecer relações com seus pares e com o ambiente. Enfim, por meio dela a criança começa a conhecer melhor a si mesma, ao desenvolver sua noção de esquema corporal e também sua comunicação com o outro. 1 Graduanda do curso de Pedagogia da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo MourãoFECILCAM. 2 Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Maringá- UEM e Professora do Departamento de Pedagogia da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão- FECILCAM. Para a realização da nossa prática de estágio, partimos da abordagem HistóricoCultural, proposta por Vygotsky e seus colaboradores, a qual considera que o desenvolvimento humano tem sua origem nas relações sociais, que é influenciado tanto pela história quanto pela cultura. Nesta perspectiva, a criança nasce desprovida de qualquer tipo de conhecimento, no entanto, ela nasce em um meio cultural, em que conhecimentos são produzidos historicamente a partir das relações sociais. E é por auxilio da fala e da vida em um meio cultural que ela irá se situar no mundo. Segundo Gasparin (2002), na perspectiva Histórico-Cultural, a tarefa docente visa trabalhar o conteúdo científico e contrastá-lo com o cotidiano, com o objetivo de fazer com que os alunos, ao executarem inicialmente a mesma ação do professor, por meio das operações mentais de analisar, comparar e explicar aproprie-se dos conhecimentos científicos e neles incorporem os anteriores, dessa maneira, transformando-os também em científicos, constituindo um conceito mais elaborado a respeito do conteúdo. Dessa maneira, os conceitos do professor não se transmitem de forma mecânica e direta ao aluno, não são passados de uma cabeça para outra. O caminho percorrido desde o primeiro contato da criança com o novo conceito até o momento em que a palavra se torna propriedade sua, como conhecimento científico, é um longo e complicado processo psíquico “que envolve a compreensão da nova palavra, seu uso e assimilação real” (GASPARIN, 2002, p.61). Levando em consideração estas questões, cada aluno então, é visto como ser dotado de cultura histórica e social e é participante ativo no seu processo de aquisição de conhecimento. Com base nestas considerações, utilizamos em um primeiro momento os conhecimentos que as crianças já tinham sobre o conteúdo, e logo em seguida exploramos novos conhecimentos, por intermédio de músicas, cantigas de roda, explorando os sons do corpo, da natureza, de casa, os instrumentos musicais. Para isso usamos alguns materiais, como toca CD, instrumentos musicais de brinquedo, instrumentos musicais feitos com sucata. Para melhor explicitar os estudos efetuados, apresentaremos inicialmente no decorrer deste artigo, a concepção de infância e de Música como linguagem educativa e posteriormente os resultados obtidos durante a nossa prática de estágio. Sendo possível afirmar que nosso objetivo de contribuir por meio da musicalização para o desenvolvimento da atenção voluntária na criança foi atingido, uma vez que, os professores da instituição notaram a importância de utilizar essa linguagem no contexto escolar e as crianças aprenderam como é importante escutar com atenção e concentração. Musicalização na Educação Infantil: Sua importância para o desenvolvimento da atenção. Segundo Oliveira (2008), ao longo de muitos séculos, o cuidado e a educação de crianças pequenas era atribuído como tarefa de responsabilidade familiar. Logo após o desmame, a criança vista como um pequeno adulto, desde muito cedo, passava a ajudar os adultos em tarefas cotidianas. Com o desenvolvimento científico, ocorreram novas visões sobre como elas deveriam ser educadas. Dessa maneira, foram organizados serviços de atendimento às crianças abandonadas por suas famílias, ou cujos pais trabalhavam em fábricas. Como explica a autora, Gradativamente, surgiram arranjos mais formais para atendimento de crianças fora da família em instituições de caráter filantrópico [...] Não tinham uma proposta instrucional formal, embora logo passaram a adotar atividades de canto, de memorização de rezas ou passagens bíblicas e alguns exercícios do que poderia ser uma pré-escrita ou préleitura (OLIVEIRA, 2008, p. 60). Outras iniciativas também levaram à criação de instituições para atender as crianças acima de três anos, filhos de mulheres operárias. Eram os chamados asilos e as infant schools, nas quais, era ministrado para os filhos dos operários o ensino da obediência, da moralidade, da devoção e do valor do trabalho. Ao longo da história as instituições de crianças pequenas receberam diversos nomes: Jardim de Infância, Pré-Escola e Creches. Em meados dos anos 80 do século XX, ocorreram diversos debates em torno das funções das creches que passaram a ser entendidas como um local de educação de crianças de zero a cinco anos. A preocupação com a Educação Infantil teve um grande avanço no decorrer dos anos, como também por um ensino mais centrado na criança. As instituições escolares como cita Oliveira (2008), não tinham uma proposta instrucional formal, voltavam-se apenas para o desenvolvimento de bons hábitos e valores religiosos, no entanto, atualmente possuem uma proposta pedagógica ampla, envolvendo o desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo e psicológico da criança. A partir da inquietação com uma escola que proporcionasse um ensino mais centrado na criança, hoje vemos um grande avanço nas propostas pedagógicas no que se refere ao desenvolvimento da criança em todos os aspectos: corporal, intelectual e afetivo. Justamente foram esses aspectos que procuramos enfatizar durante a nossa prática de estágio com a musicalização, nos apropriamos de conceitos de diversos estudiosos que elaboraram pesquisas com o intuito de perceber como se dá o desenvolvimento e a aprendizagem na criança de zero a cinco anos, para posteriormente entendermos qual a importância da música para esse desenvolvimento. Dentre estes teóricos temos Vygotsky (1896-1934), bem como os seus colaboradores. Vygotsky (1991) retrata que o desenvolvimento da criança ocorre por meio das relações sociais, e pela mediação de conhecimentos produzidos histórico e culturalmente. Por intermédio da interação com o meio e com o mediador que ela conseguirá se desenvolver. Dessa maneira, “antes de controlar o próprio comportamento, a criança começa a controlar o ambiente com a ajuda da fala. Isso produz novas relações com o ambiente, além de uma nova organização do próprio comportamento” (VYGOTSKY, 1991, p. 27). O desenvolvimento dessas potencialidades caracteristicamente humanas de comportamento irá produzir mais tarde na criança, o intelecto, que constitui a base do trabalho produtivo, ou seja, a forma especificamente humana da utilização de signos e instrumentos. Segundo Vygotsky (1991), as funções psicológicas superiores, como a linguagem, a memória e a atenção voluntária, são construídas ao longo da história social do homem, isso se faz desde o seu nascimento, em sua relação com o mundo por meio da mediação. Dessa forma, percebemos que a escola deve propiciar o desenvolvimento de diferentes linguagens, entre elas citamos a Música, que deve fazer parte da rotina dos centros de Educação Infantil, visto que, segundo Lino, A linguagem musical é um meio de organização da realidade, e sua compreensão não é anterior a seu uso: é o seu uso que organiza a experiência e permite sua compreensão. A linguagem musical é a organização do som, estruturado numa forma que estabelece relação e gera significados, provenientes da coordenação e ordenação integrada do sujeito, do objeto sonoro e de seu meio sociocultural (LINO, 2005, p. 68, grifo do autor). A partir desse pressuposto, consideramos que a música é um instrumento de desenvolvimento de grande importância, uma vez que por meio dela funções psíquicas, orgânicas e sociais podem ser aprimoradas. Já que essa linguagem está presente há muito tempo na vida do ser humano. Como aponta Jeandot, A receptividade à música é um fenômeno corporal. Ao nascer, a criança entra em contato com o universo sonoro que a cerca: sons produzidos pelos seres vivos e pelos objetos. Sua relação com a música é imediata, seja através do acalanto da mãe e do canto de outras pessoas, seja através dos aparelhos sonoros de sua casa (JEANDOT, 1997, p. 18). Em todas as civilizações costuma-se acalentar os bebês com cantos e movimentos. Segundo a autora, antes mesmo de nascer, ainda no útero materno, a criança já toma contato com um dos elementos fundamentais da música: o ritmo, por meio das pulsações do coração de sua mãe. Antes mesmo de começar a falar, podemos ver o bebê cantar, gorjear, experimentando os sons que podem ser produzidos com a boca. Ao entrar em contato com os objetos, ela rapidamente começa a interagir com o mundo sonoro, que é o embrião da música, e, nessa idade, qualquer objeto que produz ruído torna-se para ela um instrumento musical capaz de prender sua atenção por muito tempo (JEANDOT, 1997, p. 19). Como explica a autora, a criança não é artista, mas antes de tudo um ser “rítmico-mímico”, que usa espontaneamente os gestos ao sabor da sensação que eles despertam. É só observar um bebê com uma colher posta à sua disposição antes da sopa, “ele bate na mesa, repetindo o gesto para renovar a sensação provocada” (JEANDOT, 1997, p. 19). Percebemos desta maneira, que a música tem grande influência sobre a criança antes mesmo de seu nascimento. Devido a isso os jogos ritmados, próprios dos primeiros anos de vida, devem ser trabalhados e incentivados na escola, ao adulto caberá compreender em que medida a música constitui uma possibilidade expressiva privilegiada para a criança, uma vez que atinge diretamente sua sensibilidade afetiva e sensorial. Segundo pesquisa de Scherer, [...] as crianças que já estudam musicalização desde o berçário e hoje estão em média com três anos e meio a quatro anos, estabelecem uma diferença positiva no desenvolvimento em relação a outras crianças recém chegadas a escola, desenvolvimento este, na percepção auditiva, memória, atenção, coordenação motora, trazendo suas próprias experiências de fora para o contexto escolar principalmente na fala e representações sonoras (SCHERER, 2007, p. 107). Com base em tais conceitos, nosso primeiro contato com as crianças foi por meio da “chamada musical”, com o intuito de aprendermos os nomes uns dos outros e sabermos quem estava presente, cantamos: “Quem chegou à aula aqui foi a... que prazer é vê-la aqui ó...” falando o nome de cada criança. Posteriormente, explicamos às crianças, a importância de conhecer o silêncio. Perguntamos o nome de cada um e em seguida pedimos que todos falassem ao mesmo tempo e bem alto o próprio nome, dessa maneira ninguém conseguiu entender o que cada um falou. A partir dessa atividade, evidenciamos que o silêncio é muito importante para podermos ouvir e entender os sons. Perguntamos a eles: Por que vocês não entenderam o que o colega disse? Responderam: “Porque tava muito barulho” Dessa maneira, conseguimos fazer com que entendessem a importância do silêncio, uma vez que é por intermédio dele que conseguimos escutar os sons encontrados em nosso dia-a-dia, escutar os sons dos animais, dos carros na rua, os sons de casa, entre outros. Além disso, propicia a capacidade de ouvir enquanto outro está falando, desenvolvendo assim a atenção voluntária e, ao mesmo tempo o respeito. Solicitamos que todas as crianças debruçassem em suas carteiras e ficassem em silêncio para ouvirem os sons ao seu redor. Em seguida fizemos a seguinte pergunta: Que sons vocês puderam perceber? As crianças responderam: o passarinho, a moto, conversas, carro, entre outros. A partir disso, notamos que existem variados tipos de sons ao nosso redor, mas que para ouvi-los precisamos de algo muito importante, o silêncio. Em outro momento, desenvolvemos atividades envolvendo sons e ruídos, explicamos que os sons agradáveis são chamados de musicais e os sons desagradáveis são chamados de ruídos. Para percebermos o que é o som, pedimos aos alunos que colocassem a mão na garganta e gritassem: Háa! Assim, todos sentiram a vibração da voz, explicamos que por meio do ar as vibrações da nossa voz chegam até os ouvidos. Em seguida cantamos a música “O sapo não lava o pé”, prestamos muita atenção ao som da nossa voz, cada um dos alunos cantou sozinho uma parte da música, para que assim pudesse ouvir somente o som da própria voz. Segundo a autora, “cantando coletivamente, aprendemos a ouvir a nós mesmos, ao outro e ao grupo como um todo. Dessa forma, desenvolvemos também aspectos da personalidade, como atenção, concentração, cooperação e espírito de coletividade” (BRITO, 2003, p. 93). Conforme a autora é importante que o trabalho vocal ocorra num ambiente motivador e descontraído. O educador deve formar bons hábitos nas crianças, ou seja, explicar que não se deve gritar, não forçar a voz e acima de tudo assegurar igualdade de chances para que toda criança possa ter acesso a música. Posteriormente, realizamos uma aula a respeito dos sons do nosso corpo, fizemos um círculo e explicamos que o nosso corpo também produz som. Demonstramos e solicitamos que fizessem sons com a boca, nariz, mãos, dedos, e pés. Nesse momento, uma criança disse: “Profe, minha barriga também faz som, quando estou com fome ela ronca”. A partir dessa atividade percebemos que as crianças trouxeram experiências do cotidiano e compreenderam que existem outras formas de fazermos sons utilizando nosso corpo. Dessa maneira, “o modo como as crianças, percebem, apreendem e se relacionam com os sons, no tempo-espaço, revela o modo como percebem, apreendem e se relacionam com o mundo que vêm explorando e descobrindo a cada dia” (BRITO, 2003, p. 41). As crianças interagem permanentemente com o ambiente sonoro que está ao seu redor, “[...] é um ser ‘brincante’ e, brincando, faz música [...]” dessa forma, se relaciona com o mundo que descobre diariamente (BRITO, 2003, p.35). Após desenharem seu próprio corpo e marcarem na figura as partes que produzem sons, cada aluno mostrou seu desenho para a turma e representou um tipo de som produzido pelo seu corpo. A atividade de interação entre as crianças é muito importante, uma vez que, de acordo com Vygotsky (1991), a fala é um importante instrumento de desenvolvimento, “a criança começa a perceber o mundo não somente através dos olhos, mas também através da fala”, visto que é pela comunicação que ela irá trocar informações com outras pessoas (VYGOTSKY, 1991, p.36). Explicamos aos alunos que os animais também produzem som e que podem ser fortes ou fracos. Exemplificamos que sons fortes são aqueles feitos por leões, onças, elefantes e sons fracos são feitos por passarinho e grilo. Em seguida, pedimos que cada aluno imitasse o som de algum animal, um deles disse: “Vou imitar um dragão, mas como vou soltar fogo pela boca?” outro replicou “Você não precisa soltar fogo, é só imitar o som dele”. Observamos com essa atividade que, “quando criamos um ambiente musical na sala de aula, podemos notar que as crianças pesquisam e improvisam livremente, criando sons que os adultos talvez só obtivessem com menos facilidade, dada sua inibição e falta de espontaneidade” (JEANDOT, 1997, p. 30). Dessa forma, é importante que o trabalho com a voz ocorra num ambiente motivador e descontraído, livre de tensões exageradas que comprometam a desenvoltura da criança. Para finalizar o conteúdo cantamos a música “A voz dos animais” de Nilsa Zimmermann, fazendo gestos e sons. Segundo Jeandot, “é a partir dessa relação entre o gesto e o som que a criança - ouvindo, cantando, imitando, dançando - constrói seu conhecimento sobre a música, percorrendo o mesmo caminho do homem primitivo na exploração e na descoberta dos sons” (JEANDOT, 1997, p. 19). Conforme Vygotsky (1991), no desenvolvimento da criança a imitação e o aprendizado desempenham um papel importante. Trazem à tona as qualidades especificamente humanas da mente e levam a criança a novos níveis de desenvolvimento. Uma vez que, o que a criança é capaz de fazer hoje em cooperação, será capaz de fazer sozinha no futuro. De acordo com Vygotsky (1991a, p. 89), “para imitar, é necessário possuir meios para se passar de algo que já se conhece para algo novo. Com o auxílio de outra pessoa, toda criança pode fazer mais do que faria sozinha [...]”. Nesse sentido, quando a criança imita a forma que o adulto manipula instrumentos, ela está dominando o verdadeiro princípio envolvido numa atividade particular, dessa forma, está gerando oportunidade de desenvolvimento intelectual. A atenção nessa atividade também exerce papel fundamental, a criança necessita estar atenta, para ouvir a música, fazer o som e no mesmo instante executar o gesto. Segundo Vygotsky (1991) a atenção, sendo uma das complexas funções superiores, tem sua origem nas relações sociais do indivíduo com o mundo, ou seja, a atenção é desenvolvida a partir das relações que o ser humano mantém com o mundo exterior. Notamos assim, a relevância da musicalização nesse desenvolvimento, sendo que, “como uma das formas de representação simbólica do mundo, a música, em sua diversidade e riqueza, permite-nos conhecer melhor a nós mesmos e ao outro - próximo ou distante” (BRITO, 2003, p. 28). Outra atividade que propusemos, foi a respeito dos sons de dentro da nossa casa. Conversamos com as crianças e explicamos que dentro de nossa casa temos vários utensílios desde colheres e panelas, até secador de cabelo, máquina de lavar, entre outros que também emitem sons. Uns podem ser considerados sons e outros ruídos. Entregamos uma ficha para cada aluno contendo a figura de um utensílio, cada um deveria imitar o seu som. Após, disponibilizamos para as crianças revistas, na qual deveriam encontrar figuras de diferentes aparelhos domésticos recortarem e colá-los em seu caderno. Em seguida, ensinamos à música “A casa” de Vinícius de Moraes. Dessa maneira percebemos que, segundo Brito, música é gesto, movimento e ação. No entanto, é preciso dar às crianças a possibilidade de desenvolver sua expressão, permitindo que criem gestos, que observem e imitem os colegas e que, principalmente, concentrem-se na interpretação [...] sem a obrigação de fazer gestos comandados durante todo o tempo (BRITO, 2003, p. 93). Conforme a autora, a canção é um gênero musical que funde música e poesia. Quando cantam as crianças imitam o que ouvem, desenvolvem sua expressão corporal e estimulam sua atenção. Desde que essa atividade seja realizada em um ambiente de orientação e estímulo, tanto à escuta como à interpretação. Conduzimos a aula com os sons da natureza, da mesma forma como fizemos a atividade anterior, as crianças pegaram uma ficha contendo um desenho de um som da natureza: chuva, vento, trovão, cachoeira, entre outros e deveriam imitar o devido som, e em seguida explicitar se esses sons eram curtos ou longos, fortes ou fracos. Segundo a autora, ao desenvolver um trabalho vocal com a criança, além de cantar, devemos “brincar com a voz, explorando possibilidades sonoras diversas” (BRITO, 2003, p. 89). Ou seja, imitar vozes de animais, ruídos, entoarem movimentos sonoros, entre outros, tendo como finalidade aguçar e desenvolver a criatividade e atenção na criança. Como afirma Vygotsky (1991, p. 40), “dentre as grandes funções da estrutura psicológica que embasa o uso de instrumentos, o primeiro lugar deve ser dado a atenção”. Isso porque a capacidade ou incapacidade de focalizar a própria atenção é um determinante indispensável do sucesso ou não de qualquer ação. Justamente é esse um dos objetivos da música: desenvolver a atenção voluntária nas crianças. A partir desse pressuposto, desenvolvemos nossa aula a respeito dos meios de transporte da seguinte maneira: contamos para os alunos que para nos locomover precisamos de um meio de transporte, que pode ser um carro, uma moto, um avião, um trem, entre outros, em seguida, imitamos juntos o som de cada um dos meios de transporte. Distribuímos figuras de diversos meios de transporte para cada criança, porém existiam cinco fichas iguais, por exemplo: cinco motos, cinco aviões. Explicamos que todos deveriam ficar em círculo e quando fosse dado um sinal todos deveriam imitar ao mesmo tempo o som do meio de transporte que pegou. Desse modo, cada criança deveria prestar atenção nos seus colegas para encontrar e formar grupo com as outros que pegaram a mesma figura, para todos imitarem junto o mesmo som. As crianças ficaram totalmente atentas para descobrir quem estava imitando o mesmo som que o seu, porém houve exceções, alguns estavam dispersos e desatentos, não conseguindo executar a atividade. Conforme a autora, a voz é nosso primeiro instrumento, “instrumento natural que é meio de expressão e comunicação desde o nascimento” (BRITO, 2003, p.87). Evidenciamos então, por meio desta atividade que, estar atento para ouvir os sons que estão ao redor, é muito importante para o desenvolvimento afetivo, cognitivo e obviamente musical. Nossa seguinte atividade foi com o conto sonoro, o qual se tratava de uma história contando as atividades realizadas por um menino num dia de domingo, no decorrer da narrativa existiam diversos nomes de objetos e animais que produzem sons. Entregamos a cada criança objetos como: relógio, sino, escova de dente, xícara de café, martelo e lixa. Contamos a história duas vezes e pedimos que prestassem o máximo de atenção, em seguida explicamos que quando disséssemos o nome de algum objeto que tinham em mãos, deveriam usá-lo e produzir som. A atividade foi muito interessante, sendo que, todos ficaram em total silêncio e apreensivos em ouvir o nome do objeto que estava segurando. Além de desenvolver a concentração e a imaginação, essa atividade também desenvolveu de maneira lúdica o conceito de normas e regras. Cada um deveria esperar o seu momento de fazer o som com o devido objeto. Para Leontiev, Dominar as regras significa dominar seu próprio comportamento, aprendendo a controlá-lo aprendendo a subordiná-lo a um propósito definido. O propósito surge aqui, é claro, diretamente relacionado com o papel representado no brinquedo, ele não é ainda compreendido como a regra do jogo. A significação psicológica do propósito apropriado é, por isso, descoberta mais tarde nos jogos que chamamos de “jogos com regras e objetivos próprios” (LEONTIEV, 1988, p. 139). Desenvolvemos também atividades a respeito da qualidade dos sons, e em especial o timbre, que é a característica que diferencia cada som. Como explica Brito (2003, p.19) “costumamos dizer que o timbre é a “cor” do som”. Demonstramos por meio de exemplos que o som pode ser baixo e alto: quando um som é baixo, é chamado de som grave, quando é alto, é chamado de som agudo e que também os sons podem ser curtos ou longos, como por exemplo, o som do telefone tocando é um som longo, o som de alguém estalando os dedos é um som curto. Para aprender as diferenças entre os sons, ensinamos a canção “O meu chapéu” de domínio popular. Após aprendermos a música, explicamos que quando a professora / estagiária mostrasse um cartão vermelho, todos deveriam cantar só no pensamento sem imitir sons, cartão azul cantar fraco e cartão verde cantar forte. Dessa maneira, conseguimos fazer com que as crianças exercitassem sua atenção, uma vez que deveriam ficar totalmente atentas para o sinal e consequentemente alterar o tom da voz. A música é linguagem, dessa maneira, devemos seguir em relação à música, o mesmo processo de desenvolvimento que adotamos quanto à linguagem falada, ou seja, “devemos expor a criança à linguagem musical e dialogar com ela sobre e por meio da música” (JEANDOT, 1997, p. 20). O educador, antes de transmitir sua própria cultura musical, deve pesquisar o universo musical a que a criança pertence, e encorajar atividades relacionadas com a descoberta e com a criação de novas formas de expressão por meio da música. Segundo a autora, Muitas vezes, quando a música é ensinada em escolas ou conservatórios, oferece-se à criança um método, um instrumento, e muitos já esperam “maravilhas” ao final do primeiro mês de estudo, sem que haja antes um trabalho, através do qual a criança possa ouvir, escutar, perceber, descobrir, imitar, repetir os sons, isto é, construir seu conhecimento sobre a música (JEANDOT, 1997, p. 20). A partir desse pressuposto, reafirmamos para as crianças que o som está presente em todos os momentos de nossa vida, mas que também existem objetos próprios para produzir sons agradáveis, estes são chamados instrumentos musicais, dos quais podemos tocar lindas melodias, estes podem ser de sopro (flauta, trompete), percussão (chocalho, pandeiro) e de cordas (violão). Entregamos para cada aluno um instrumento musical: pandeiro, violão, flauta e alguns feitos de sucata como: chocalho, reco-reco. Solicitamos que tocassem os instrumentos um de cada vez, para poder ouvir o som que cada um produz. Ensinamos a música: “A loja do mestre André” e quando todos já sabiam cantar, iniciamos com os instrumentos musicais. Nesse sentido, “é importante ressaltar que a música ao trabalhar com instrumentos de percussão, em que as crianças tocam e param nos momentos certos indicados pelo gesto do professor, desenvolverão a atenção seletiva de forma lúdica e prazerosa” (SCHERER, 2007, p. 106). Notamos que as crianças ficaram totalmente atentas ao nosso sinal para tocarem os instrumentos e, ao mesmo tempo fascinadas com a atividade, por vários momentos pediam “Profe, vamos tocar de novo, agora quero o pandeiro...”. Houve até confusão entre as crianças, uma vez que todos queriam o violão ou o pandeiro ao mesmo tempo, porém conseguimos contornar a situação, ao propor que cada um iria tocar uma vez cada instrumento. Assim, segundo Scherer (2007) o universo sonoro deve ser apresentado de forma natural e intencional, de modo a proporcionar à criança o contato com os diversos instrumentos musicais. Conforme Brito, percebemos que, [...] um trabalho pedagógico-musical deve se realizar em contextos educativos que entendam a música como um processo contínuo de construção, que envolve perceber, sentir, experimentar, imitar, criar e refletir. Nesse sentido, importa, prioritariamente, a criança, o sujeito da experiência e não a música, como muitas situações de ensino musical insistem em considerar (BRITO, 2003, p. 46). Dessa maneira, a educação musical não deve visar à formação de possíveis músicos, mas sim à formação integral das crianças. Por fim, realizamos a brincadeira “Bingo dos sons”, entregamos uma ficha para cada criança (como uma cartela de bingo) em cada quadrado havia a figura de algum som, exemplo: cachorro, carro, liquidificador, entre outros. Colocamos um CD contendo sons variados, quando tocasse o som de uma moto, os alunos que tinham a figura em sua cartela deveriam fazer um “X”, as crianças ficaram entusiasmadas com a brincadeira, prestando muita atenção para ouvir cada som. Perceber, produzir e relacionar-se com os sons, faz parte da história de vida de todo ser humano. Dessa forma, é de suma importância que a criança aprenda a diferenciar os sons que estão ao seu redor, uma vez que, segundo a autora, A percepção, a discriminação e a interpretação de eventos sonoros, geradores de interações com o entorno, têm grande importância no que diz respeito à formação e permanente transformação da consciência de espaço e tempo, um dos aspectos prioritários da consciência humana (BRITO, 2003, p. 19). Cantamos diversas músicas utilizando os instrumentos musicais. Cada aluno deveria cantar uma música diferente utilizando seu instrumento, após, todos cantamos juntos novamente a música “A loja do mestre André”. Pedimos que cada criança fizesse um desenho do que mais gostou de aprender e depois explicasse oralmente o porquê do desenho. Como explica Lino, Assim como abrimos os olhos e enxergamos todo um campo visual em nosso redor, o mesmo acontece com nosso ouvido: escutamos quase todo o contexto sonoro que nos envolve. Educar esse ouvido é a tarefa principal da escola onde a escuta se amplia à medida em que promovemos estratégias que levam à experiências de produção, percepção reflexão e representação musicais (LINO, 2005, p. 68). Nessa ótica, analisamos que a musicalização é uma linguagem que pode contribuir muito para o desenvolvimento das complexas funções superiores na criança, em especial a atenção. Enfim, conforme aponta Brito (2003), aprender a escutar com atenção e concentração, faz parte do processo de formação de seres humanos sensíveis e reflexivos, capazes de perceber, sentir, relacionar e comunicar-se. Considerações Finais Diante das dificuldades enfrentadas na realização do Estágio Supervisionado I, devido ao fato de ser a nossa primeira experiência na Educação Infantil, era evidente o nervosismo e a insegurança nos primeiros dias, entretanto com o andamento das aulas e com as devidas orientações fomos adquirindo confiança para podermos transmitir o que haviamos preparado com muita dedicação. Em relação as práticas realizadas, ficou claro que as crianças sentem necessidade de expressar-se tanto corporal como oralmente, são seres ativos que tem a necessidade de exteriorizar suas emoções. Para tanto, a musicalização contribuiu de maneira eficaz nesse processo, por meio dela as crianças desenvolveram a oralidade, a comunicação com o outro, expressaram suas sensações e emoções e em especial, desenvolveram a atenção e a concentração. Podemos apontar que esse trabalho foi de grande contribuição tanto para nós, que pudemos constatar a importância da musicalização para o desenvolvimento das funções mentais superiores, como para os professores do centro de educação infantil que observaram e perceberam que a música não deve ser trabalhada apenas como passatempo ou entre uma atividade e outra, mas sim, como uma linguagem que contribui para o desenvolvimento da criança. Em relação à maneira de trabalhar o conteúdo, procuramos sempre partir dos conhecimentos que as crianças já tinham sobre o assunto, para posteriormente explorarmos novos conhecimentos. Tendo como base a perspectiva Histórico-Cultural, proposta por Vygotsky (1991) a qual considera que a criança aprende de acordo com sua interação com o meio social em que vive. Portanto, é possível afirmar que nossa prática de estágio teve resultados satisfatórios. Como nosso objetivo era contribuir por meio da musicalização para o desenvolvimento da atenção voluntária, consideramos que nossa meta foi atingida, uma vez que, as crianças passaram a escutar com maior atenção as histórias contadas, descrevendo-as com maior número de elementos e vocabulário e na bandinha rítmica com instrumentos de percussão ficavam mais atentos a hora de começar e terminar as canções. Essas ações foram percebidas também pelos professores, os quais puderam ter conhecimento de como explorar melhor esta linguagem e os alunos que perceberam como é importante aprender a escutar com atenção e concentração, sendo que essa potencialidade é de suma importância para o seu desenvolvimento e aprendizagem. Referências BRITO, T. A. Música na educação infantil. São Paulo: Petrópolis, 2003. GASPARIN, J. L. Uma didática para a Pedagogia Histórico-Crítica. Campinas, SP: Autores Associados, 2002. JEANDOT, N. Explorando o universo da música. 2 ed. São Paulo: Scipione, 1997. 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