Água
• A água é a substância mais abundante
dos organismos vivos, correspondendo a
70% ou mais da sua composição.
• Os primeiros organismos vivos surgiram
certamente no meio aquoso, e o curso da
evolução foi moldado pelas propriedades
do meio aquoso em que a vida teve
origem.
• As forças atractivas entre moléculas, e a
sua ligeira tendência para sofrer ionização
são essenciais para a estrutura e função
das biomoléculas.
• A molécula de H2O e os seus produtos
de ionização, H+ e OH-, influenciam
profundamente a estrutura, autoorganização e propriedades de todos os
componentes celulares, incluindo
proteínas, ácidos nucleícos e lípidos.
• As forças não-covalentes responsáveis
pela intensidade e especificidade das
interacções entre biomoléculas são
condicionadas pela capacidade de
formação de ligações de hidrogénio entre
a água e os seus solutos.
1. A geometria da molécula de água
• Segundo o modelo de repulsão electrónica da camada de
valência (VSEPR) a água apresenta uma geometria
tetraédrica não perfeita, ou seja, uma estrutura angular:
O = 1s2 2s2 2px2 2py1 2pz1
H= 1s1
H 2O
- 2 pares de electrões ligantes + 2 pares de electrões não
ligantes. Como a repulsão entre pares não ligantes é maior
do que a repulsão entre pares ligantes, iremos ter uma
estrutura tetraédrica distorcida, com uma ângulo de
104.5º entre os átomos de H, em vez de 109.5º.
- Constituída por 2 ligações covalentes entre os átomos de
oxigénio e hidrogénio
- Molécula polar, devido à elevada electronegatividade do
átomo de oxigénio e à própria estrutura da molécula.
-Forma pontes de hidrogénio entre o átomo de oxigénio de
uma molécula e um átomo de hidrogénio de outra molécula.
As ligações de hidrogénio tornam a água
um solvente invulgar
A água apresenta propriedades físicas bastante diferentes
da maioria dos líquidos, que podem ser explicadas pela
existência de forças atractivas entre as suas moléculas.
Estas forças resultam da diferente electronegatividade do
oxigénio e hidrogénio, que provocam uma distribuição
assimétrica de carga na molécula de água.
~23 kJ/mol
1-20 ps
Estrutura do gelo
Estrutura do gelo. Cada molécula de água estabelece
ligações de hidrogénio com 4 moléculas circundantes. O
colapso deste retículo tetraédrico explica a diminuição de
volume associado à fusão do gelo.
A água forma ligações de hidrogénio
com uma variedade de grupos químicos
A formação de ligações de hidrogénio está dependente da
existência de um átomo electronegativo que funciona como
aceitador do hidrogénio, e de um átomo dador a que o
hidrogénio se encontra covalentemente ligado. Muitos grupos
químicos satisfazem estas condições
C
X
X
C
geralmente não
se observam
Solução aquosa de substâncias
carregadas
A água forma ligações de hidrogénio que competem com as
interacções entre as partículas da substância carregada e
possibilitam a sua dissolução.
A dissolução de sais em água é acompanhada de um
aumento de entropia (∆
∆S<0) e de uma variação de entalpia
muito pequena (∆
∆H ≈ 0), pelo que
∆ G = ∆ H - T ∆ S < 0,
sendo o processo favorável.
Blindagem das interacções
electrostáticas
A força de atracção effectiva entre 2 iões na água é dada
por :
F= q1q2 / ε r2
em que r é a distância entre os iões, q1 e q2 as suas cargas
e ε a constante dieléctrica do meio, que para a água é 78.5.
A dissolução de substâncias apolares
em água é um processo desfavorável
Os compostos não-polares forçam as moléculas de água a
assumir conformações energeticamente desfavoráveis na
interface soluto-solvente.
A rotura das ligações de hidrogénio da água não é
compensada por formação de ligações soluto-água (∆
∆H>0), e
a criação de estruturas de água ordenada na interface
provoca uma diminuição de entropia (∆
∆S<0), pelo que temos
∆G = ∆H - T ∆S > 0
Estrutura ordenada da água em
torno de um solute não polar. As
moléculas de água organizam-se
de modo a maximizar o número
de ligações de hidrogénio.
Estrutura de um clatrato. Os
clatratos são complexos
cristalinos de água e um solvente
não-polar. Os clatratos são
considerados bons modelos para
a estrutura da água líquida em
torno de um solvent não-polar.
(n-C4H9)3S+F- • 23 H2O
Moléculas anfipáticas
Substâncias cujas moléculas contêm simultâneamente
regiões hidrofílicas e hidrofóbicas são denominadas
anfipáticas.
Como consequência do efeito hidrofóbico, as moléculas
anfipáticas tendem a export as superfícies polares à agua, e
a tentar “esconder” as superfícies polares, o que produz a
formação de estruturas ordenadas denominadas micelas.
micela
Classificação dos compostos de acordo com a sua capacidade de
interagir com a água:
- Hidrofílicos: Compostos que se dissolvem facilmente em água
(gostam de água), tais como sais e moléculas polares.
- Hidrofóbicos: Compostos não polares tais como os lípidos e as
ceras, são insolúveis em água.
- Anfipáticos: Compostos que contêm simultaneamente regiões
hidrofílicas e hidrofóbicas (Ex: Detergentes).
Formação de micelas em
solução aquosa
Existe uma grande variedade de moléculas biológicas
anfipáticas: proteínas, lípidos de membrane, pigmentos,
vitaminas, etc… possuem regiões polares e regiões apolares
na sua superfície.
Importância bioquímica e estrutural
do efeito hidrofóbico
• A organização estrutura das membranas biológicas
é consequência do efeito hidrofóbico a que estão
sujeitos os fosfolípidos anfipáticos da membrana.
• O efeito hidrofóbico é essencial para a estabilização
da estrutura nativa das proteínas
• Em muitos processos de reconhecimento molecular
(interacções proteína-ligando), o efeito hidrofóbico é
uma componente essencial para a estabilização do
complexo formado.
Forças de van der Waals
Quando dois átomos neutros estão próximos, as
flutuações de carga e o efeito de polarização são
suficientes para criar uma força atractiva fraca entre
eles.
Apesar das interacções de van der Waals serem
muito fracas (~ 3-4 kJ/mol), um elevado número de
contactos intra- e interatómicos pode tornar o seu
papel extremamente significativo, como acontece nas
biomacromoléculas.
Interacções interatómicas fracas são
cruciais para a estrutura das
biomoléculas
Embora os quatro tipos de forças presentes na tabela anterior
sejam individualmente muito mais fracos do que as ligações
covalentes, o efeito somado de um elevado número destas
interacções com uma proteína ou um ácido nucleico poderá ser
bastante significativo.
Macromoléculas como as proteínas, o ADN e o ARN contêm
tantos sítios para potenciais ligações por pontes de hidrogénio,
iónicas, Van der Waals ou interacções hidrofóbicas, que o efeito
cumulativo das muitas forças de ligação fracas é enorme. Para as
macromoléculas, a estrutura mais estável (nativa) é normalmente
aquela em que a possibilidade de estabelecimento ligações fracas é
maximizada. O enrolamento de um polipéptido ou de uma cadeia
polinucleotídica e a sua estrutura tridimensional são determinados
por este princípio.
Influência do soluto nas propriedades coligativas das soluções
aquosas
Os solutos alteram as propriedades coligativas dos solventes em
que estão dissolvidos (Pressão de vapor, ponto de ebulição,
ponto de fusão e pressão osmótica), dado a concentração do
solvente em soluções ser mais baixa do que no solvente puro. Este
efeito depende somente do número de partículas de soluto numa
dada quantidade de solvente.
Osmose – Movimento da água (solvente) através de uma
membrana semipermiável, causado pela diferença de pressão
osmótica (diferença de osmolaridade). Este factor é de extrema
importância na vida da maior parte das células.
Soluções isotónicas – Soluções de igual osmolaridade.
Solução hipertónica – Solução que têm uma maior osmolaridade
do que aquela com que é comparada.
Solução hipotónica - Solução que têm uma menor osmolaridade
do que aquela com que é comparada.
Na célula
Lise osmótica na célula – três mecanismos de prevenção:
1. Bactérias e plantas: A membrana plasmática está rodeada por
uma parede celular não-expansível com rigidez e força
suficientes para resistir à pressão osmótica.
2. Alguns protozoários de água doce: Vivem num meio
altamente hipotónico, pelo que possuem um organelo que
bombeia a água para fora da célula.
3. Animais multicelulares: O plasma sanguíneo e fluído
extracelular dos tecidos são mantidos a uma osmolaridade
próxima da do citosol. A elevada concentração de albumina e
outras proteínas no plasma sanguíneo contribui para a sua
osmolaridade. As células bombeiam também activamente iões
como o Na+ para o fluido extracelular dos tecidos de forma a
balançar a osmolaridade.
As moléculas de H2O podem
ter um papel estrutural
Estrutura da hemoglobina
Estrutura da hemoglobina com as
moléculas de água ligadas
Moléculas de água que se encontram fortemente
ligadas na superfície ou no interior de uma
macromolécula ocupam posições definidades e
perdem as propriedades próprios da água líquida.
Moléculas de água
“sequestradas” no interior
de uma proteína
(citocromo f) podem servir
como canal para conduzir
protões de um local para
outro.
A ionização da água
Embora muitas propriedades da água possam ser
explicados em termos de uma molécula neutra (mas
polar), existe uma pequena fracção de moléculas de
água que se encontram ionizada:
H2O
Keq
=
‹
H+ + OH–
[H+] [OH–] / [H2O]
Como a concentração da água pura é constante e
igual a 55.55 mol/L, podemos escrever
Keq
=
[H+] [OH–] / 55.55 M
Keq • 55.55
= Kw =
[H+] [OH–]
em que Kw é o produto iónico da água, que numa
solução aquosa depende apenas da temperatura:
Kw = 1.0x10-14 M , T = 25 oC
Quando [H+] = [OH–] tem-se:
Kw
= [H+] [OH–] = [H+]2 ⇒ [H+] = [OH–] = 10-7 M
Nesta situação diz-se que a solução está neutra.
A escala de pH
pH = – log [H+]
A escala de pH foi inventada por
Sorensen em 1906, devido à
necessidade de controlar
rigorosamente a concentração
hidrogeniónica nos ensaios
bioquímicos.
Constantes de dissociação
de ácidos fracos
Muitos ácidos orgânicos não se dissociam
completamente quando dissolvidos no meio aquoso.
Considerando a ionização de um ácido fraco:
HA
H+ + A–
a sua constante de dissociação, KA , é dada por:
KA
=
[H+] [A–] / [HA]
a ácidos mais fortes correspondem valore de KA
mais elevados, mas define-se a grandeza pK,
pKA = – log KA
De tal forma que ácidos mais fortes terão pKa mais
baixos.
Curvas de titulação de ácidos fracos
A concentração de ácido numa determinada solução
pode ser determinada adicionando uma base forte
(NaOH, por exemplo) em quantidade suficiente para
neutralizar completamente o ácido da solução.
A variação do pH da solução em função da
concentração de base é conhecida como curva de
titulação.
Curva de titulação do ácido acético
Os ácidos fracos podem funcionar
como tampões
Regulação do pH no organismo
• Quase todos os processo biológicos são
dependentes da concentração de H+, observando-se
grandes variações de velocidade de reacção para
pequeníssimas alterações do pH do meio.
• Mesmo quando o H+ não está directamente
envolvido na reacção, a variação da sua
concentração pode ter um efeito profundo na
estrutura e função das biomoléculas.
• Os enzimas que catalisam reacções biológicas
contêm muitos grupos ionizáveis com pKa’s
característicos, cujo carga varia com o pH.
• Os grupos fosfato dos nucleotídos funcionam como
ácidos fracos, sendo a sua ionização sensível ao pH
do meio.
A constância do pH é assegurada pela existência
de tampões biológicos, que são misturas de
ácidos fracos e das suas bases conjugadas.
Influência do pH na actividade enzimática
Constantes de dissociação
de alguns tampões
A equação de Henderson-Hasselbalch
A forma das curvas de titulação dos ácidos fracos é
descrita pela equação de Henderson-Hasselbalch,
que estabelece uma relação simples entre pKa , pH
do meio e concentração dos membros do par ácidobase conjugado:
dissociação do ácido:
resolvendo em ordem a [H+]
Tomando o log negativo de ambos
os membros:
Substituindo com a definição de pH
e pKa:
Quando [HA]=[A-], temos:
Tampões biológicos
No nosso organismo existem alguns tampões
especialmente importantes.
O tampão fosfato:
H2PO4 ↔ H+ + HPO4–
Este tampão tem a sua máxima eficiência a pH=6.86,
sendo eficiente dentro do intervalo de pH da maioria
dos fluídos biológicos e compartimentos
citoplasmáticos (pH 6.9 - 7.4)
O pH do plasma sanguíneo é parcialmente
controlado pelo tampão bicarbonato:
H2CO3 ↔ H+ + HCO3–
K1
=
[H+] [HCO3–] / [H2CO3]
Para além deste equilíbrio é preciso considerar que o
ácido carbónico se forma a partir de CO2 dissolvido
na água, num processo reversível:
CO2(d) + H2O ↔ H2CO3(s)
K2
= [H2CO3] / [CO2(d)] [H2O]
A concentração de CO2 dissolvido resulta do
equilíbrio com CO2 na fase gasosa:
CO2(g) ↔
[CO2(g)] = presssão parcial
K3
CO2(d)
= [CO2(d)] / [CO2(g)]
Assim, o pH do tampão bicarbonato depende, em
última análise, das concentrações de bicarbonato na
fase aquosa e pressão parcial de dióxido de carbono
na fase gasosa.
Tampões biológicos
A histidina, um dos aminoácidos das proteínas,
tem um pKa~6.0, logo pode funcionar como
tampão a pH fisiológico
Mecanismo do tampão bicarbonato
Ex:
C6H12O6 + 6O2 ↔ 6CO2 + 6H2O
A “água metabólica” formada a partir de alimento sólido e
combustíveis armazenados é o necessário para que alguns
animais sobrevivam em habitats muito secos (canguru,
ratos e camelos).
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