8
Os “centros de estudos” na escola
Neste capítulo serão abordados os “centros de estudos” onde, o
coordenador pedagógico assume o papel de formador de seus professores no
espaço da escola. Os “centros de estudos”, como espaço de reuniões, foi
recentemente normatizado pela SME através da Portaria nº 32 (RIO DE
JANEIRO, 2007a). Anteriormente, os “centros de estudos” não se configuravam
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como uma prática sistemática na rede, principalmente, entre as escolas do segundo
segmento do ensino fundamental (6º ao 9º anos), até porque o professor utilizava
o horário para a correção e planejamento das atividades de suas turmas, mas este,
era previsto no calendário letivo, na realização de reuniões pedagógicas nas
escolas. A partir da normatização, as escolas começaram a organizar os seus
espaços de reuniões de acordo com as regularizações estabelecidas (RIO DE
JANEIRO, 2005b; 2007a).
A SME definiu como seriam organizados os “centros de estudos” no
espaço da escola visando às atividades de planejamento, avaliação do trabalho
escolar e de formação continuada dos professores. Essas atividades de formação e
aperfeiçoamento devem ser garantidas pelas direções das unidades escolares,
integradas à carga horária total do professor em exercício na rede pública
municipal (RIO DE JANEIRO, 2007a). As escolas que possuem em seus quadros
funcionais somente Professores II, que lecionam para os anos iniciais do ensino
fundamental, os centros de estudos são definidos pelo calendário escolar (RIO DE
JANEIRO, 2005b), publicado anualmente pela SME, como documento oficial a
ser aplicado nas atividades escolares ao longo do ano letivo. Neste calendário, são
marcadas duas modalidades de centros de estudos. Os centros de estudos parciais
são reservados às escolas que possuem os anos iniciais de ensino fundamental.
Nestes dias, o horário das aulas é reduzido até a metade, incluindo a hora do
recreio e, logo após este, os alunos são dispensados enquanto os professores se
reúnem. E os “centros de estudos” integrais não são considerados dias letivos
142
porque nestes dias não há aulas para os alunos da rede. Eles são considerados
como espaços de reunião disponíveis para o professor durante todo o dia, sem a
presença do aluno na escola (RIO DE JANEIRO, 2005b). As escolas que possuem
em seus quadros funcionais os professores I, que lecionam para os anos finais do
ensino fundamental, os “centros de estudos” são semanais e possuem carga
horária definida de acordo com o número de horas trabalhadas por semana: o
professor se reúne com seus colegas fora de seu horário de trabalho em sala de
aula. Tendo em vista essa diversidade, o coordenador pedagógico adota
estratégias de atendimento aos professores, de acordo com as peculiaridades
previstas pela SME para cada unidade escolar.
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O coordenador pedagógico, como parte integrante de seu trabalho na
escola, visa ao repasse das aprendizagens de sua formação aos professores,
considerando-se a importância dessa atividade exercida pelo coordenador como
categoria relevante de análise.
Nas entrevistas, os coordenadores responderam perguntas referentes à
organização dos “centros de estudos”, utilização de textos, temas estudados,
dificuldades encontradas durante os encontros com os professores, como lidam
com essas dificuldades e por fim, a participação dos professores nas atividades de
formação continuada.
8.1
Organização dos “centros de estudos”
Na categoria organização dos “centros de estudos” define-se como a
atividade própria do coordenador pedagógico: preparar as atividades que serão
desenvolvidas durante a reunião periódica com os professores num espaço
determinado da escola. Os “centros de estudos” são realizados geralmente, às
quartas-feiras, com a presença dos professores da escola, no período de duas
horas-aula (considerando uma hora-aula o tempo de 50 minutos). As reuniões dos
“centros de estudos” semanais devem ser realizadas sem prejudicar a carga horária
de aulas dos alunos. As duas horas restantes, de um total de quatro, devem ser
143
cumpridas na escola, em outros horários, de acordo com determinação da direção.
(RIO DE JANEIRO, 2007a).
Às escolas que possuem turmas dos anos iniciais do ensino fundamental
são reservadas duas horas, marcadas previamente no calendário escolar que são
destinadas aos “centros de estudos”, além dos integrais com suspensão de aula,
sem prejudicar a contagem anual dos duzentos dias letivos, estabelecida pela LDB
(BRASIL, 1996). Nas escolas com Projeto de Educação de Jovens e Adultos PEJA, sendo ele noturno ou diurno, os “centros de estudos” dos professores das
disciplinas do núcleo comum são realizados em seu horário de trabalho sempre às
sextas-feiras e os professores das disciplinas de Educação Física, Artes e Língua
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Estrangeira realizam suas reuniões de “centro de estudos” em outro horário
estabelecido pela CRE, pois atendem aos alunos do PEJA às sextas-feiras. As
escolas que possuem alunos dos anos finais do ensino fundamental, os “centros de
estudos” são semanais de duas horas. O coordenador pedagógico marca, para a
realização dos “centros de estudos”, quatro horários diferentes, tanto no primeiro
turno quanto no segundo turno de funcionamento da escola, geralmente às
quartas-feiras, para atender à demanda do grupo de professores, garantindo que
todos possam ter seu horário de formação continuada na escola (RIO DE
JANEIRO, 2007a).
Conhecendo-se um pouco da estrutura e funcionamento dos “centros de
estudos” na rede pública municipal da cidade do Rio de Janeiro, é possível
entender alguns depoimentos dos coordenadores pedagógicos ao fazerem relatos
da dinâmica destas reuniões em suas escolas. Segundo falas dos entrevistados, a
organização dos horários de “centros de estudos” irá depender dos tipos de
professores que atendem. Portanto, dentro do universo de pesquisa préestabelecido, foram entrevistados coordenadores pedagógicos que trabalhavam em
escolas com número variado de professores (ver tabela 5).
De acordo com o perfil de turmas atendidas, as escolas terão somente
professores I, somente professores II ou as duas categorias de professores, assim,
segundo os tipos de professores que a escola possui, a organização dos centros de
estudos será diferenciada (levantamento feito em 2008 durante a coleta de dados
144
da pesquisa). A tabela a seguir mostra os tipos de segmentos do Ensino
Fundamental existentes no universo desta pesquisa: desde a Educação Infantil –
EI ao período final do terceiro ciclo de formação e PEJA.
Tabela 12: Descrição geral das escolas do universo pesquisado
Tipos de escolas e os segmentos do ensino fundamental atendidos:
Tipo 1 – 6 escolas de EI ao período intermediário do 2º ciclo – EI ao 5º ano
Tipo 2 – 3 escolas de EI e 1º ciclo – 1º ao 3º ano
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Tipo 3 – 1 escola de EI ao 3º ciclo – EI ao 9º ano
Tipo 4 – 1 escola de período final de 2º ciclo a 3º ciclo e PEJA - 6º ao 9º anos e
Projeto de Educação de Jovens e Adultos
Tipo 5 – 1 escola de período final de 2º ciclo ao final do 3º ciclo - 6º ao 9º anos
8.2
O desenvolvimento dos “centros de estudos”
As características principais das dinâmicas de grupo utilizadas em reuniões
com docentes é, de acordo com Gonçalves e Perpétuo (2005, pp.18-19), levar à
reflexão confrontando comportamentos hábitos, valores e conhecimentos,
objetivando aos participantes a uma avaliação e reelaboração individual evolutiva,
podendo assim aprimorar a sua subjetividade e seu próprio processo de educação
e da construção da prática social. Assim, muitos coordenadores pedagógicos,
como formadores dos docentes valorizam a prática de dinâmicas de grupo como
ferramenta para levá-los à reflexão de suas práticas pedagógicas do dia a dia.
Quanto às dinâmicas de grupo utilizadas nos centros de estudos, 3/12
coordenadores revelaram que as utilizam nos “centros de estudos” para introdução
ao estudo teórico de temas relacionados à educação.
145
Dois dos doze entrevistados informaram que os professores usam o tempo
dos “centros de estudos” para elaboraram o planejamento das aulas,
principalmente, das escolas que possuem somente os anos iniciais do Ensino
Fundamental. Um coordenador disse que deixa uma parte dos centros de estudos
para que os professores possam colocar os registros de classe em dia.
A respeito do desenvolvimento da reunião de “centro de estudos” junto aos
professores, 3/12 coordenadores disseram que utilizam dinâmicas de grupo. Kátia
afirmou: “não gosto de dinâmicas de grupo. Acho que os professores também não
gostam”. Porém, em outro momento ela declarou que já havia utilizado dinâmicas
de grupo em seus “centros de estudos”. A justificativa era que o tempo destinado
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às reuniões dos “centros de estudos” parciais era muito curto.
Quanto ao uso de textos: 3/12 informantes revelaram que utilizam textos
reflexivos; 1/12 declarou que trabalha com brincadeiras e 1/12 relatou que recebe
os professores com um café da manhã, nos dias dos “centros de estudos” integrais.
Considerou-se relevante trazer este fato, uma vez que foi observado que um
coordenador deu importância a elevar a autoestima dos professores. O café da
manhã foi demonstrado por Elisa como uma forma de receber bem os professores
e de fazer a sociabilidade dos docentes na escola. Sobre o desenvolvimento dos
“centros de estudos”, como os coordenadores pedagógicos iniciam a reunião com
os professores, destacou-se nas falas:
Eu sempre tenho o cuidado de trazer um texto que está dentro da
realidade deles (professores), outra hora trago um vídeo, uma música para
sensibilizar, uma dinâmica (Rosana).
Eu começo com uma dinâmica e uma reflexão também. Faço dinâmicas
que os professores possam utilizar em sala de aula com os alunos (Solange).
Eu trago textos, dinâmicas de grupo (...) o que ele (professor) se interessa
mais eu faço: dinâmicas, leitura de textos... Eu pego a dinâmica e diante da
realidade que eu tenho na escola e utilizo a dinâmica que eu aprendi (Elza).
Durante as reuniões de centros de estudos 4/12 disseram que fazem leitura
de textos, 2/12 que elaboram discussões e debates entre os professores sobre
146
determinado tema ou sobre o texto lido anteriormente, 1/12 declarou que faz
leitura de ata das reuniões anteriores, 1/12 disse que faz a pauta das reuniões e
esta é lida diante dos docentes. Na parte de informes, 3/12 falaram que reservam
uma parte do momento dos “centros de estudos” para o repasse aos professores
dos informes e comunicados da SME/CRE e, geralmente, esta parte fica reservada
ao diretor da escola. Apenas um declarou que reserva um espaço nos “centros de
estudos” para informes do CEC.
Então tem sempre um texto, sempre um recorte, tem sempre um
livro...(Aline).
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Na maioria das vezes a gente separa um texto, vídeo...(Zélia).
Eu também trago um texto que venha levantar algum questionamento e
falo de algum problema que está acontecendo e procuro um texto ou outra forma
de apresentação que ilustre o problema...(Elena).
Eu sempre utilizo textos. Textos que passam uma mensagem ética, uma
mensagem
de
vida,
uso
sempre
um
texto inicial
para
dar aquele
“colorido”...(Elisa).
A gente lê um texto, debate, discute os probleminhas que vão
surgindo...(Kátia).
8.3
As “trocas de experiências” entre os docentes
Destaca-se a importância dada pelos entrevistados a compartilharem
experiências na sala de aula entre os próprios docentes; 7/12 revelam que
reservam este espaço para os docentes. Os coordenadores colocaram as “trocas de
experiências” como um fator positivo dos centros de estudos e incentivado por
eles na escola. Dois coordenadores declararam já ter trazido palestrantes que não
fazem parte do quadro funcional da escola para conversar com os professores.
147
E agora estou tentando fazer uma coisa que elas já faziam, que é a troca
horizontal (professores que lecionam para turmas com o mesmo ano de
escolaridade) entre os ciclos. Elas já faziam isso, mas, não de forma organizada.
Então agora estou tentando fazer a troca de forma organizada. Vamos escrever,
sistematizar essa troca. E foi uma coisa que elas pediram para ser feita (Flávia).
Eu procuro valorizar muito o que elas sabem. Elas vão para um curso, e a
gente já define quem vai falar. Eu digo: a professora tem um trabalho tão legal!
Mostre às outras! Ela vai e relata tudo o que fez (Elisa).
De acordo com Nunes, o professor deve ser considerado como um agente
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de sua própria formação, relacionando os saberes iniciais em confronto com a
prática vivenciada, através de sua reflexão. Portanto, deve ser considerado como
“práticas de auto-formação reflexiva” as “trocas” entre os docentes dos saberes
compartilhados entre eles:
...Esses saberes são transformados e passam a integrar a identidade do
professor, constituindo-se em elemento fundamental nas práticas e
decisões pedagógicas, sendo, assim, caracterizados como um saber
original. Essa pluralidade de saberes que envolve os saberes da
experiência é tida como central na competência profissional e é
oriundo do cotidiano e do meio vivenciado pelo professor (2001,
p.31).
O coordenador pedagógico, como gestor dos saberes docentes, deve
adequar-se, respeitar as diferenças de seu grupo, ouvindo o que eles têm a dizer,
comprometendo-se a respeitar seus costumes e valores que fazem parte da
produção humana, ter consciência do coletivo e da cidadania (FERREIRA, 2004,
p.1243). Há uma lógica nesta afirmativa, uma vez que o docente coordenador,
também deve ouvir os anseios de seu grupo, suas dificuldades e estar ciente do
trabalho pedagógico efetuado na escola dentro das salas de aula. Charlot (2000,
pp. 60-61) afirma que a construção coletiva do saber faz parte da constituição do
sujeito e de sua relação com esse saber.
148
8.4
O tempo
O horário é muito curto, nos “centros de estudos” parciais...(Zélia).
Quando ele é integral (centro de estudos) a gente tem mais tempo e o
parcial (centro de estudos) é muito corrido (Shana).
A questão do tempo, levantada pelos entrevistados, passa pelas
descontinuidades das reuniões e dos encontros entre os docentes. A pequena
quantidade de reuniões marcadas no calendário letivo (RIO DE JANEIRO,
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2005b), traz para os docentes das escolas que possuem somente os primeiros anos
do Ensino Fundamental, a sensação da “não terminalidade” das discussões,
gerando uma ansiedade, tanto entre os coordenadores que gerenciam o tempo das
reuniões, quanto dos professores que buscam colocar todas as suas questões ao
grupo, naquele momento único de envolvimento profissional coletivo.
Até o ano de 2008, havia doze “centros de estudos” parciais e quatro
“centros de estudos” integrais, em que não há aula para os alunos. Os “centros de
estudos” são marcados no calendário letivo com a frequência de um a dois por
mês, sem contar com as reuniões de planejamento, num total de duas, uma para
cada semestre. Uma reunião para a atualização do projeto político-pedagógico em
março e três encontros de conselhos de classe que tratam exclusivamente da
avaliação dos alunos e da escola, perfazendo um total de dez reuniões sem aula
mais as doze com horário parcial nas escolas que possuem somente os anos
iniciais do Ensino Fundamental. As escolas que possuem turmas dos anos finais,
os professores, já têm garantido o horário semanal de “centros de estudos” (RIO
DE JANEIRO, 2005b).
149
8.5
O que o coordenador pedagógico considera como “estudo”?
Segundo Cunha (1997, p. 335) estudar vem do latim “studium” que
significa “dedicar-se a aprender”. Portanto, os “centros de estudos” devem ser
espaços dedicados para os professores se voltarem para suas próprias
aprendizagens. Perrenoud (2000, p.169) afirma que o professor deve ser o
administrador de sua formação contínua com locais específicos junto com os seus
parceiros e os gestores da escola. Tardif (2002, p.31) apresenta os saberes dos
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professores como socialmente constituídos e partilhados, no caso aqui, nos
espaços dos “centros de estudos” e nas “trocas de experiências” entre os docentes.
Cinquenta por cento (do tempo) para estudo efetivo do que nós estamos
precisando para “leitura de mundo”... Então tem sempre um texto, tem sempre
um recorte (artigo de jornal, revista), tem sempre um livro... o que eu acho
necessário na nossa função é criar esse ambiente de pesquisa, o professor ir atrás
das informações para poder passar a “leitura de mundo” (aos alunos), então,
essa parte cultural está sempre presente nos “centros de estudos” (Aline).
Tem estudo (centros de estudos) que eu preparo o texto. Eu sempre tenho
o cuidado de trazer um texto que está dentro da realidade deles, outra hora trago
um vídeo, uma música para sensibilizar, uma dinâmica...eu vou atender aquelas
necessidades (do professor). Então eu estou sempre buscando, entendeu? Então
eu vou à “internet”, a seminários e capacitações, os que podem ser usadas na
escola (Rosana).
A partir das necessidades deles....Então eu faço uma pesquisa...já fiz
capacitação de Ciências até porque eu sou bióloga e o nosso projeto aborda o
meio-ambiente...em todas as disciplinas eles já foram capacitados e vamos em
frente à medida que as coisas forem surgindo.(Elisa).
Faço dinâmicas que os professores possam utilizar em sala de aula com os
alunos, criando condições para a produção de texto, trabalhar Matemática, faço
oficinas, repasse das reuniões e cursos que eles (professores) fazem, sempre deixo
150
um espaço, na reunião, tem textos para estudo, de acordo com o que a gente está
necessitando na escola (Solange).
Eu também trago um texto que eu acho que tenha que levantar algum
questionamento e falo de algum problema que está acontecendo e eu procuro um
texto ou outra forma de apresentação que ilustre o problema para que possa ser
desencadeado um debate (Elena).
Essas falas são representativas do grupo pesquisado. Alguns conceitos
podem ser extraídos dessas opiniões sobre o significado do estudo para o
coordenador pedagógico e seu corpo docente. Pode ser observado que Aline
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chama o ato de estudar feito pelos professores de “leitura de mundo”,
parafraseando Freire que apontava a “leitura de mundo” como uma percepção do
que é cultura, da percepção do objeto antes da leitura da palavra, chamada de
compreensão crítica do ato de ler.
A leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura
desta implica a continuidade da leitura daquele. Na proposta a que me
referi acima, este movimento do mundo à palavra e da palavra ao
mundo está sempre presente. Movimento em que a palavra dita flui do
mundo mesmo através da leitura que dele fazemos. De alguma
maneira, porém, podemos ir mais longe e dizer que a leitura da
palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo mas por uma
certa forma de “escrevê-lo” ou de “reescrevê-lo”, quer dizer, de
transformá-lo através de nossa prática consciente (1989, p.11).
Na ótica de Aline, a “leitura de mundo” significa a aquisição do
conhecimento por parte das professoras como pesquisadoras em busca do
conhecimento e da cultura em geral. Este conhecimento só é sistematizado nos
“centros de estudos” através do texto escrito dado aos docentes como forma de
democratizar esse conhecimento, também chamado de “parte cultural”.
A questão de trazer o texto de acordo com a “realidade deles” mostra a
preocupação de Rosana, assim como mais 7/12, de atender às demandas e dúvidas
dos professores da escola. A pesquisa feita por ela visa atender com uma resposta
às perguntas feitas pelos docentes, geralmente relacionadas a questões de sala de
aula, como irá demonstrar a seleção dos temas mais utilizados nos “centros de
estudos”.
151
Elisa define os “centros de estudos” como uma série de reuniões de
capacitação docente, em que ela traz o “currículo a ser estudado” pelo grupo.
Surgem dúvidas, portanto, porque ela mesma diz em outro momento da entrevista
que “seus professores” são capacitados em diversas profissões.
Porque eu não trabalho com uma equipe de professores leigos. Todos têm
o terceiro grau. Eu tenho professor administrador, professor psicólogo,
fisioterapeuta, assistente social, eu tenho professores de diversas disciplinas, que
são PII (professores II). Tenho professora bióloga, historiadora...Então, são
diversos saberes...Eu tenho que estar sempre estudando. Mas, nunca desprezando
o meu próprio saber e o do grupo. Eu procuro utilizar o potencial do grupo a
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favor do grupo e do meu próprio trabalho.
Elisa enfatiza a importância dos saberes trazidos pelo seu corpo docente a
partir da formação acadêmica de cada um. A coordenadora vê esses saberes como
uma oportunidade de se aperfeiçoar mais para poder fazer frente ao conhecimento
que eles trazem. No momento dos “centros de estudos”, ela não diz que traz
algum saber aos professores, mas, trabalha os temas de acordo com as demandas
do grupo, verificando as necessidades de aprendizagem que o grupo docente traz
para ela, colocando-se na posição de dinamizadora dos “centros de estudos”
possibilitando aos professores o espaço de discussões e “trocas de experiências”.
Então eu prefiro o que o grupo me dá...e aí, dependendo do tema, eu
dinamizo, coloco os professores em grupos de trabalho...
Considerando a fala de Solange, os “centros de estudos” são considerados
momentos de criação de atividades para serem desenvolvidas na sala de aula com
os alunos. Ela cita como exemplo, oficinas, produção de texto e dinâmicas. O
tempo reservado para o estudo teórico é considerado secundário. Constatou-se que
3/12 coordenadores citaram como prioritário o chamado “repasse” das
informações oriundas da CRE e SME aos docentes.
Eu procurei fazer dos “centros de estudos” um espaço de “trocas”.
Elena traz um texto para ilustrar situações que estejam ocorrendo na escola
e os “centros de estudos” são utilizados como fórum de debates em prol da
152
resolução do mesmo. O texto passa a ser apenas um detonador para os debates. E
não o foco dos estudos como seria a proposta inicial. Nota-se a importância dada à
resolução das demandas da escola.
Agora o tempo está dividido: cinquenta por cento do tempo para estudos e
cinquenta por cento para eles então ficou mais tranqüilo e mais prazeroso fazer o
centro de estudos.
Aline informa que os professores pedem um tempo para eles, no caso,
uma fração do tempo destinado aos “centros de estudos” para outras atividades
que não sejam os estudos teóricos. Esse “tempo para eles”, corresponde ao tempo
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dos “centros de estudos” destinado ao preenchimento de documentos,
planejamento e organização de atividades com os alunos, numa proporção de 3/12
entre os entrevistados, estando perfeitamente de acordo com o artigo 1º da
Portaria E/DGED nº 32 (RIO DE JANEIRO, 2007a), que estabelece que tempo
destinado aos “centros de estudos” pode ser utilizado também para estas
atividades.
8.6
Que temas são abordados nos “centros de estudos”?
Os temas surgem das entrevistas, mostrando como os coordenadores
pedagógicos trabalham nos “centros de estudos” junto aos professores. Sua
origem e as justificativas para as escolhas são apresentadas a seguir pelos
informantes.
153
8.6.1
Os temas são os docentes que escolhem
Entre os entrevistados 7/12 informaram que os temas são tratados de
acordo com a solicitação docente, justificados das mais diversas formas. A
escolha dos temas tem uma aparente “democracia” nos “centros de estudos”,
dando certa autonomia aos professores decidirem o que é importante ser estudado
por eles. O coordenador pedagógico concorda que os temas a serem priorizados
nos “centros de estudos” podem ser fruto das demandas da escola, as
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aprendizagens específicas são requeridas pelos próprios docentes visando à sua
eficácia na prática com seus alunos. Essas “demandas” quase sempre necessitam
de uma imediata resolução. Levar as questões para uma reunião parece ser uma
decisão mais coerente, deixando claro que não há um planejamento feito a longo
prazo, mas, contínuo, através da observação e coleta das necessidades dos
professores feita pelo coordenador buscando assim, atender aos pedidos do grupo.
Se elas (professoras) pedem alguma coisa eu procuro trazer (Rosana).
Sempre é de interesse. Porque não sou eu que determino. Quem determina
é o grupo (docente) (Elisa).
Eu vejo o que é importante e trago para desenvolver,...vou vendo a
necessidade mesmo (Solange).
Trabalho temas do interesse do professor e da necessidade da escola
(Elena).
A complexidade da sociedade nos tempos atuais e os desafios que
permeiam a educação na atualidade trazem uma tendência que Perrenoud (2001,
pp. 29-30) denomina como “agir na urgência e decidir na incerteza”. Ele refere-se
ao fato de que a escola enfrenta contradições tanto pelos seus atores quanto pelas
relações sociais chamando de “problemas complexos”, por isso, o planejamento
contínuo dos “centros de estudos”.
154
8.6.2
Temas propostos pela Secretaria Municipal de Educação
A influência das datas comemorativas, presentes no planejamento dos
projetos das escolas foi uma demonstração de que o projeto pedagógico também
está presente nos temas abordados, apesar de não ter sido sinalizado desta maneira
pela maioria dos entrevistados. Surgiram temas como: “Machado de Assis”
(3/12); “Bossa Nova” (2/12); “Vinda da Família Real ao Brasil” (3/12). Percebese entre os entrevistados que estes temas eram importantes para os professores e
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buscaram nas reuniões material, textos, ou outros recursos para o trabalho com os
alunos, até porque foram projetos idealizados pela Secretaria Municipal de
Educação aproveitando as datas comemorativas: “100 anos de morte de Machado
de Assis”; “50 anos da existência do ritmo musical Bossa Nova”; “200 anos da
vinda da Família Real ao Brasil: 1808 -2008”.
A própria “história da chegada da Família Real”, e o mais efetivo que
trabalhamos: “Bossa Nova” e “Machado de Assis”, são temas que a gente traz
de maneira aplicada em 2008 (Aline).
Estes temas parecem estar presentes no planejamento de Aline para o
trabalho com as professoras, mas, não há referência precisa se estes temas serão
trabalhados com o objetivo de enriquecer o projeto pedagógico ou em forma de
atividades pedagógicas informais ou formais com os alunos. Aline não faz
referência aos temas de projetos acima citados se esses eram resultantes da
demanda dos professores. Flávia, porém, introduz esses temas como demanda do
seu grupo de professores e que ela, em resposta, trabalhou com eles.
Elas estavam com dificuldades em encontrar textos sobre “Machado de
Assis” mais fáceis. Outras me pediram para trazer fotos desenhos e
representações que mostrassem “O Rio de Janeiro no tempo de D. João”, do
tempo de “Machado de Assis”, aí eu trago. Como eu tenho muito material de
História eu vou e trago para elas.
155
Não fica claro no relato de Flávia se foi somente o material didático que
elas solicitaram, se estes temas também foram trabalhados nos “centros de
estudos”, se o material seria analisado e distribuído nos centros de estudos ou se
foi solicitado durante as reuniões. De qualquer forma, os temas são recorrentes em
três dos doze entrevistados.
8.6.3
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Temas relacionados ao projeto pedagógico da escola
Eu procuro trabalhar a vivência do espaço, do tempo, eu geralmente puxo
mais para esse lado. Então todo o lançamento do projeto, na hora da gente
(centro de estudos), eu faço um texto que tem a ver com o tema (...) A gente faz a
avaliação do projeto, daquele período. Os projetos são mais ou menos
quinzenais. Então a gente faz a avaliação do que aconteceu de positivo e
negativo. Isso fazemos em cada “centro de estudos” (Flávia).
Se nós precisamos trabalhar o projeto eu trago textos sobre o projeto
(Solange).
Fazemos a avaliação de algum projeto que deu certo e procuramos
avaliar o que não deu certo com o trabalho do aluno e as experiências que os
professores trazem e fazemos a troca...(Elza).
Os temas relacionados a projetos pedagógicos desenvolvidos nas escolas
são discutidos em 5/12 coordenadores, como tema relacionado à realidade da
escola. O projeto pedagógico da escola, em sua concepção, deve ser fruto de
ampla discussão entre todos os segmentos da comunidade escolar, até que suas
atividades sejam colocadas em prática. O planejamento das atividades do projeto
faz parte das necessidades de formação de um fórum coletivo das atividades da
escola. O coordenador assume o papel de mediador e sistematizador das falas dos
docentes fazendo um resumo ou documento único resultante das conclusões feitas
nas reuniões.
156
Veiga (2004, p. 95) afirma que o projeto político-pedagógico da escola não
visa simplesmente a um documento reduzido à dimensão pedagógica, mas, um
produto que reflete a realidade da escola num sentido amplo que clarifica a ação
educativa da mesma como um todo. Martins (2005, p. 57) revela que o grande
desafio da escola é deixar de ser uma mera repetidora para realmente ousar a
assumir o papel de formadora de educadores e que o projeto, em seu papel
político, teria essa finalidade.
8.6.4
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Temas relacionados ao currículo escolar
De acordo com as demandas dos professores, surgem alguns temas
relacionados com as disciplinas do currículo básico, como, por exemplo,
Matemática, e outros que foram citados como solicitação da escola, vinculados às
atividades pedagógicas docentes: Língua Portuguesa, Geografia, História, Artes.
João traz as disciplinas do currículo como base para os temas trabalhados
nos “centros de estudos”. Não como demanda docente, mas como sugestões
trazidas por ele para serem aplicadas no trabalho pedagógico da escola.
Eu tento utilizar dentro do conhecimento profissional deles (professores).
Quando eu vejo que a discussão está focada para um determinado assunto, tento
direcionar...Teve Língua Portuguesa, História, Geografia, Artes. Eu pego temas
relacionados às atividades do professor, mostro para eles no sentido de solicitar
que eles trabalhem. Eu dou sugestão de temas para os professores trabalharem
nas aulas deles.
Na entrevista de João observa-se que ele determina as atividades
pedagógicas que serão trabalhadas nos “centros de estudos”, e não como uma
demanda proveniente dos professores. Ele se coloca dentro do grupo não só como
mediador, mas como uma pessoa que determina o que deve ser feito nas
atividades pedagógicas dos professores da escola.
157
8.6.5
Temas relacionados à organização da escola
“Registro” e “reagrupamento”, que são temas diretamente relacionados
com a estrutura municipal dos Ciclos de Formação. O “registro de classe” sofreu
no ano de 2007, profundas mudanças. E, durante o ano de 2008, os coordenadores
pedagógicos ainda tinham dúvidas a respeito do uso correto do “registro de
classe”. Segundo comunicado da DEF foram dadas instruções aos coordenadores
pedagógicos, a fim de serem repassadas aos docentes no início do ano letivo de
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2007, além de uma carta destinada aos professores da rede explicando as
mudanças ocorridas na escola decorrentes da expansão dos Ciclos de Formação
para todos os níveis do Ensino Fundamental. Assim como os esclarecimentos a
respeito das novidades na organização curricular como o “Centro de Estudos do
Aluno – CEST” e o “reagrupamento flexível”.
O CEST é um centro de estudo com o objetivo de levar o aluno a se
organizar para a aprendizagem eficiente e prazerosa através de
técnicas e metodologias de estudo. Portanto, o trabalho com o CEST
tem a intenção de “ensinar” o aluno formas de se organizar para
aperfeiçoar seus hábitos de estudo (CUNHA, 2007b, p.3).
A respeito do “reagrupamento flexível” os coordenadores pedagógicos
receberam o material para sanar as dúvidas sobre a organização da escola para
serem apresentados aos professores nos “centros de estudos”. Citando um trecho
presente no documento, o reagrupamento é assim apresentado.
As turmas estão formadas, a escola está organizada, o planejamento
coletivo se transformando em prática, cada professor com sua turma
referência. A proposta é que cada escola realize um projeto para
reagrupar, periodicamente, os (as) alunos (as) da mesma turma ou de
outras turmas para o desenvolvimento de atividades variadas que
atendam às suas necessidades e que também ampliem seu processo de
aprendizagem e desenvolvimento (CUNHA, 2007b, p. 8-9).
A respeito do “registro de classe” houve uma relação de instruções
enviadas à escola para serem passadas aos professores, de forma que o
preenchessem de forma desejável. O “registro de classe” que veio substituir o
antigo diário de classe do professor. O novo registro contém espaços para
158
planejamento processual do professor e de replanejamento, chamada da turma e
atividades desenvolvidas em classe, desenvolvimento dos alunos a cada momento
que o professor considere importante, ata de reunião de pais, conceitos dos alunos
e frequência global para ser alimentado a cada período letivo. Este registro deixa
de ser apenas a chamada e o resumo da matéria lecionada para ser a ata que
contém o desenvolvimento da turma como um todo. É um diário que precisa de
tempo para o seu preenchimento, por isso as demandas dos professores solicitando
reservar um tempo do centro de estudos para atualizarem o “registro de classe”.
Um “diário de classe” no mais puro sentido da palavra.
Mesmo com todas estas estratégias de esclarecimento, os coordenadores
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pedagógicos sinalizaram em suas falas que ainda havia dúvidas quanto ao
preenchimento do “registro de classe” e uma parte do tempo dos “centros de
estudos” era destinado a esta atividade. Juntamente com o decreto de expansão
dos Ciclos de Formação editado em 2007, a SME emitiu um documento de
esclarecimento sobre a definição do reagrupamento para ser divulgado nas
unidades escolares (CUNHA 2007b, p. 10). E por fim, a “Provinha Brasil”, surge
como tema de “centro de estudos” por ser mais um instrumento de avaliação de
rede voltada para o primeiro ano do ciclo de formação do Ensino Fundamental.
Abaixo a definição do instrumento de avaliação do Ministério da Educação:
A Provinha Brasil é um instrumento de avaliação da alfabetização
concebido pelo Instituto Nacional de Estudos Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (Inep), autarquia do Ministério da Educação (MEC), e
disponibilizado para uso das secretarias estaduais e municipais de
educação em suas redes. Essa avaliação tem o intuito de oferecer aos
gestores públicos e aos professores de suas redes informações sobre o
nível de alfabetização dos alunos, ainda no início do processo de
aprendizagem, permitindo assim intervenções com vista à correção de
possíveis insuficiências apresentadas nas áreas de leitura e escrita
(BRASIL, 2008b).
A avaliação, contada em 3/12 dos entrevistados, foi considerada por Kátia
como um tema bastante relevante em sua escola. Ela apresentou o tema, não só
como demanda do grupo como também uma questão da escola.
O que o grupo necessita a gente trabalha. A avaliação é o foco principal,
um tema e interesse do grupo...vou mostrando atividades que deram certo, para
fugir do tradicional.
159
De acordo com o depoimento de Kátia, a avaliação como tema relevante
nos centros de estudos parece estar voltada para a descoberta de novas formas de
avaliar os alunos, tendo em vista que a escola de Kátia só atende ao primeiro ciclo
de formação.
A comparação pertinente, aqui, pauta-se na relação entre a avaliação
tradicional e novas alternativas de avaliação, conforme Kátia expõe. Romão
(2005, p.61) compara a avaliação tradicional com a avaliação chamada de
progressista. A primeira é chamada de avaliação classificatória, meritocrática e
pontual. A segunda concepção de avaliação é chamada de dialógica, caracterizada
por interna, diagnóstica, qualitativa, que acompanha a trajetória de cada aluno.
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Para Luckesi (2005, p.28), a avaliação das escolas brasileiras serve a um contexto
conservador identificando um modelo social liberal baseado nos moldes
burgueses. Ele propõe como avaliação alternativa libertadora baseada nos moldes
antiautoritários, em que a escola deva ser um instrumento de conscientização e
organização política dos educandos. Já Esteban (2006, p.103) define a avaliação
como um procedimento ligado à esfera do poder e que a escola procede à
avaliação com teorias de caráter conservador de reprodução social. Para ela, a
avaliação progressista, consiste em uma reconstrução do sentido da ação da
produção do conhecimento em sua totalidade.
8.7
Os textos nos “centros de estudos”
Os textos são a constante nos recursos pedagógicos utilizados nos centros
de estudos com os professores. Para os coordenadores, os textos possuem diversas
funções não só como “textos de estudos”, propriamente dito.
160
8.7.1
A função sensibilizadora do texto
Uma das funções destacadas pelos entrevistados (3/12) foram textos
reflexivos, que não possuem valor pedagógico, mas como incentivadores do
professor, citados por Kátia, e Elisa que dizem:
Nós (direção e coordenação) trabalhamos com textos que levantam a
autoestima do professor para dar “uma animada” no início da reunião (Kátia).
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Uso sempre um texto inicial para dar “aquele colorido”, uma música, um
vídeo, sempre tem uma coisa que faça a sensibilização...(Elisa).
As expressões: dar “uma animada” no início da reunião ou dar “aquele
colorido” se caracterizam por funções relacionadas à autoestima do professor. A
preocupação em estimular o professor é uma prática clara entre os coordenadores
que utilizam os textos de sensibilização ou outras formas de estímulo em suas
reuniões.
A sensibilização vem para estimular o professor tão desvalorizado no
exercício do seu trabalho. A motivação é a ferramenta usada pelos coordenadores
pedagógicos para que a participação dos professores seja mais efetiva nos “centros
de estudos” para fazer frente às mudanças que possam pôr em xeque a prática
docente, que Canário (2006, p.16) chamou de “escola das incertezas”.
8.7.2
Texto como estudo pedagógico
Os textos destinados aos estudos pedagógicos dos professores são retirados
de revistas pedagógicas conhecidas dos professores e das publicações da
MULTIRIO. Alguns exemplos entre os entrevistados:
161
Eu utilizo textos de revistas. Eu sou assinante da “Revista Educar”, às
vezes um texto da “Revista Nova Escola”...Eu pego aqueles livros que recebemos
sobre ciclo de formação e também os “Cadernos do Professor”(publicação da
MULTIRIO) que nós recebemos algum tempo atrás...Eu sempre tenho o cuidado
de trazer um texto que está dentro da realidade deles...(Rosana).
Eu uso os textos da “Revista Nós da Escola24” com elas, eu trago bastante
coisa do curso de coordenadores (Flávia).
...na reunião tem textos para estudo, de acordo com o que a gente está
necessitando na escola (Solange).
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Eu também trago um texto que eu acho que tenha que levantar algum
questionamento e falo de algum problema que está acontecendo...(Elena).
Conclui-se que os coordenadores pedagógicos entrevistados consideram os
textos voltados para as questões educacionais, assim como o material pedagógico
patrocinado pela SME, como fontes de estudos junto aos professores.
8.7.3
Texto como fonte teórica para a discussão dos problemas da escola
O texto como disparador das discussões dos “problemas” da escola foi
outro fator destacado em 9/12 entrevistas. As demandas da escola e dos
professores são expostas pelos coordenadores pedagógicos como tema das
reuniões e também como material para os textos trabalhados na escola. A função
social do texto, neste caso, vem como subsídio teórico, como disparador de
discussões em classe, como fonte bibliográfica para o projeto pedagógico ou para
ajudar no trabalho pedagógico do professor ou no seu relacionamento com os
24
Publicação mensal editada pela MULTIRIO dirigida ao professor da rede municipal.
162
alunos. O texto funciona como um anteparo teórico para que o coordenador
pedagógico, junto com o seu grupo de professores, discutam suas práticas
pedagógicas. Alguns “problemas” foram sinalizados pelos coordenadores como
desafios a serem discutidos nos “centros de estudos” que, necessitariam de textos
para nortearem as discussões.
Quando eu cheguei aqui os professores tinham muita dificuldade de
trabalhar com “alunos integrados25”, como eu tinha muita bagagem, trouxe
material sobre autismo, como tratar e sobre algumas síndromes (Laura).
A avaliação está sempre em pauta. A gente discute sempre. Mas, parece
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um círculo vicioso que não tem fim. A gente está sempre falando de avaliação.
Pesquisando coisas novas, tudo que sai a gente lê (Kátia).
Os “problemas” da escola, na verdade aqui apresentados, são questões que
o coordenador pedagógico considerou relevante trabalhar nos “centros de estudos”
devido à demanda do grupo docente, da própria escola ou que ele considera
importante ser trabalhado com o grupo com o objetivo de modificar uma situação
existente.
Laura atendeu a um pedido do grupo ao trabalhar as “síndromes” com os
seus professores. Destaca que não conhecia a princípio as dificuldades do grupo e
que foi moldando o planejamento das reuniões de acordo com os pedidos do
corpo docente de sua escola. Ela valeu-se de seu conhecimento profissional no
assunto.
Kátia diz que encontra resistência em seu grupo de professores para a
adoção de novas posturas pedagógicas na questão da avaliação. Sua estratégia de
mudança é estudar novas teorias de avaliação nos “centros de estudos”.
Tem professores que colaboram e tem um grupo que qualquer coisa está
bom, porque não estão nem aí (Kátia).
25
São alunos portadores de necessidades especiais, acompanhados pelo Instituto Municipal Helena
Antipoff que proporciona a inclusão e acompanhamento da aprendizagem dos que são
matriculados nas escolas públicas da rede municipal, através de professores itinerantes.
163
O desinteresse pelas reuniões dos “centros de estudos”, sinalizado por
Kátia, pode significar que as reuniões possuem conteúdos sem significação prática
ou o docente se sente desmotivado devido à desvalorização da própria profissão
que, para as políticas públicas e sociedade, é considerada uma profissão de
“segundo plano” (TARDIF, 2002, p.34); (CHARLOT, 2005, p.42).
8.7.4
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Textos “curtos”
Os (5/12) coordenadores entrevistados disseram que os textos apresentados
aos professores são “curtos” devido ao “pouco tempo” para os estudos na escola,
além disso, o professor “não tem paciência” para ler textos “muito longos”.
Eu procuro trazer textos “curtos”, “leves”, porque ninguém tem mais
paciência para ficar manuseando “mil folhas de papel” (Elisa).
Num “centro de estudos” parcial, não há tempo para ler um texto muito
longo, então, se eu tenho oportunidade de pegar um texto que esteja mais
condensado e que dá para dar início a uma discussão sobre o trabalho na escola,
eu divido o tempo da melhor forma possível...(Rosana).
Elisa retrata bem as resistências enfrentadas pelo coordenador pedagógico
ao trazer um texto mais complexo ou longo para leitura dos professores. O “tempo
curto” foi posto em pauta neste trabalho e parece ser um fator relevante para a
adoção de textos menores para serem discutidos pelos docentes. Outro fator já
analisado é o fato dos “centros de estudos” serem divididos entre atividades de
estudos e outras de cunho pedagógico como a confecção do planejamento e o
preenchimento dos “registros de classe”. Neste caso, o tempo dedicado aos
estudos pedagógicos torna-se bem menor. Rosana deixa clara a sua opção pelos
textos “mais curtos”, enfatizando que o tempo destinado aos “centros de estudos”
na escola é a causa de sua escolha.
164
Quanto aos textos estudados nos centros de estudos, 3/12 disseram que
entregam antecipadamente os textos que serão estudados nas reuniões aos
docentes, com pelo menos, uma semana de antecedência. Os coordenadores
justificam esta atitude com o argumento de que o horário das reuniões é muito
curto.
8.8
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A participação do professor nos “centros de estudos”
Do universo de coordenadores pedagógicos entrevistados, 11/12 disseram
que o seu grupo de professores é participativo, isto é, aceita bem a proposta de
trabalho dada nos centros de estudos, apenas 3/12 sinalizaram a existência de um
grupo de resistência de professores existente na escola.
Elas gostam muito (Elisa).
A maioria participa ativamente: falando discutindo, analisando e tem um
grupo de meninas (professoras) mais tímidas: mais ou menos umas duas ou três,
do universo que eu falei - 29 professores (Zélia).
Eu estou achando que está sendo legal (Laura).
Tem uma professora que é muito reticente e que reclama muito...e ela vai
vendo que o grupo todo está interagindo ela vai e interage também (Shana).
É um grupo ativo, onde se levantam discussões até chegar num consenso
(João).
Tem um grupo que participa bastante, que debate, que concorda, que
discorda, que critica, que sugere e tem um grupo que prefere fazer careta e
bocejar o tempo todo parecendo que está com sono (Kátia).
165
Às vezes eu preparo um “centro de estudos” maravilhoso ou, eu acho que
é maravilhoso, aí vem o outro e reclama, não dá importância ao que deve dar e
acaba atrapalhando o grupo e me decepciona (Solange).
Somente Elena disse, quando perguntada sobre a participação dos
professores, que os de sua escola são contra os “centros de estudos” e não
participam de forma espontânea, e que ficam questionando a validade das
reuniões semanais.
Seu eu não puxar, eles não participam. Eles são contra os “centros de
estudos”.
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A resistência dos docentes, tanto na escola de Elena quanto nas escolas dos
demais entrevistados, mostra uma insatisfação, possivelmente, decorrente do
“mal-estar docente” que vai paralisando as ações do professor de ser uma pessoa
falante dentro de seu grupo.
Sobre as dificuldades enfrentadas na realização dos “centros de estudos”,
4/12 dos entrevistados falaram da reclamação como forma de resistência dos
professores de participarem das reuniões. Mesmo aqueles coordenadores que não
demonstraram ter problemas, em outro momento, referiram-se o problema da
reclamação do professor. Entre todos, somente 2/12 mostraram ter um grupo
bastante difícil para trabalhar.
O grupo professores da escola de Elena não aceita o fato de ser obrigado a
participar dos “centros de estudos”. Foi observado em seu relato, uma situação de
conflito entre professores I e professores II. Percebe-se também que as estratégias
da coordenadora nem sempre são bem aceitas pelo grupo docente.
Se eu não incentivar, eles não participam. O professor II até que
participa mais, mas o professor I não. Eles ficam levantando questões contra a
freqüência dos “centros de estudos”. Eles pedem um tempo para ler, acaba a
leitura e fica aquele silêncio mortal. Eu sempre pergunto algo, eles respondem
que na outra escola não tem “centros de estudos” toda a semana...Agora, há uma
resistência muito grande, porque os professores II são a minoria e os professores
I são a maioria, criando um impasse. E eu procurei fazer um espaço de “trocas”,
166
para trazer para os “centros de estudos” na próxima 4ª feira, que possa ser feita
num espaço de 1 hora e 40 minutos ou no “centro de estudos integral”. Na hora
que eu joguei para eles trazerem e planejarem, e fazerem, eles não quiseram.
Então eu respondo que iremos retomar a leitura e debate dos textos (Elena).
E ainda:
Eu faço o planejamento pensando que eles fossem desenvolver, gostar,
mas, eles ficaram revoltados e acabam não gostando, ficando uma situação
constrangedora (Kátia).
Na escola de Kátia, os professores são do mesmo segmento, isto é,
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professores II. Para ela, o grupo está dividido entre: os “motivados” e os
“resistentes”.
É um pequeno grupo de professores, mas que faz questão de dizer que
tudo que a gente traz não serve, que o colega traz, que eu trago, que vem da SME,
que vem da CRE não serve, mas, também não contribui, só está para reclamar
mesmo.
Neste caso, ela recebe o apoio da diretora.
Mas, a gente não desiste. A direção sempre dá um jeitinho de lidar com os
probleminhas dos professores.
O diálogo, mesmo que conflitante parece ser a solução encontrada por
Kátia para vencer a resistência docente. A queixa pode ser um sintoma da
síndrome de burnout. Segundo Carlotto, o professor com essa síndrome pode
apresentar alguns tipos de comportamento que podem ser confundidos com
resistência ou confronto, como, por exemplo, a:
perda de entusiasmo e criatividade, sentindo menos simpatia pelos
alunos e menos otimismo quanto à avaliação de seu futuro. Pode
também sentir-se facilmente frustrado pelos problemas ocorridos em
sala de aula ou pela falta de progresso de seus alunos, desenvolvendo
um grande distanciamento com relação a estes. Sentimentos de
hostilidade em relação a administradores e familiares de alunos
também são freqüentes, bem como o desenvolvimento de visão
depreciativa com relação à profissão (2002, p.27).
167
Outra questão a ser analisada sobre a queixa do professor diz a respeito a
questões políticas, isto é, as deliberações legais que são impostas aos professores e
que interferem no seu trabalho. Candau (2003a, p. 41) afirma que as mudanças
das políticas educacionais, não são vistas com bons olhos por parte dos
professores porque são descontextualizadas do dia a dia das escolas e dos
problemas enfrentados por eles no cotidiano. As exigências, trazidas pelas
reformas, por sua vez, não condizem com as condições de trabalho existente,
principalmente nas escolas públicas criando assim, uma resistência por parte dos
professores.
Oliveira (2004, p.769) afirma que, em relação ao trabalho docente, os
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professores sentem-se sobrecarregados por serem obrigados a responder às novas
exigências pedagógicas e administrativas, em situações adversas de violência e
insegurança e falta de respaldo da sociedade para o exercício de sua função,
expressando assim, um comportamento resistente.
8.8.1
A “resistência” à leitura
A resistência a leitura. Eu tenho aquele que acha que seria mais
importante ele estar planejando a aula dele, fazendo o “registro”, tem uns que
fogem, parecem que estão “escorrendo”. Se elas puderem, arrumam outra coisa
para fazer. Aparece sempre alguém dentro do grupo com certa má vontade, vai
“arrastada” (Rosana).
Apenas Rosana expôs como dificuldade a resistência à leitura por parte
dos professores. No caso, pode ser uma resistência às novas idéias que possam
tirar a segurança do professor no seu trabalho, uma vez que Rosana informou que
seu grupo é bem antigo no magistério, com uma minoria de professoras mais
novas. As novas teorias, além de pôr em xeque os conhecimentos delas em
relação ao ato de lecionar, ignoram sua experiência docente, levando-as a uma
resistência em ler os textos e expor suas opiniões e ideias nos “centros de
168
estudos”. Rosana procura solucionar este impasse mudando constantemente o
espaço das reuniões para criar um “ar de novidade” nos momentos de formação
continuada dos professores de sua escola.
Eu tenho que ficar mudando de sala para ele ficar conhecendo o trabalho
do colega.
Ela utiliza as “trocas de experiências” pedagógicas entre os docentes como
uma forma de socializar e valorizar trabalho dos professores.
Foi observado, pelos depoimentos dos entrevistados, que os espaços de
formação continuada na escola, após a regulamentação dada pela SME (RIO DE
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JANEIRO, 2007a), começam a ser mais aproveitados para um efetivo trabalho de
formação, planejamento e discussão dos problemas enfrentados pelas escolas. A
crescente necessidade de promover o encontro entre os professores trouxe, na
visão dos informantes, principalmente das escolas dos anos iniciais, a crescente
necessidade de compartilhar experiências. Os coordenadores pedagógicos dos
anos finais, contudo, enfrentam alguns focos de resistência à realização dos
encontros de formação continuada, podendo ser resultante da profunda diferença
da quantidade de horas disponíveis para a realização dos “centros de estudos” dos
professores II, dos anos iniciais e dos professores I, dos anos finais do Ensino
Fundamental, já que os professores I encontram-se semanalmente para a
realização dos “centros dos estudos”, enquanto que os professores II, que
trabalham com alunos dos anos iniciais, somente uma vez por mês, de acordo com
o calendário estabelecido pela SME (RIO DE JANEIRO, 2005b).
As considerações finais trazem um resumo a respeito do que foi tratado
neste estudo, destacando elementos que permitem conhecer melhor a figura do
coordenador pedagógico atuante na rede de escolas públicas municipais da cidade
do Rio de Janeiro.
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centros de estudos - Maxwell - PUC-Rio