XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE e PRÉ-ALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012, UFPI, Teresina-PI. Grupo de Trabalho 04: Educação, Cultura e Sociedade Título do Trabalho: Lei 11.645/2008 e o debate étnico - racial no currículo escolar em uma escola municipal em São Bernardo/Ma Autora: Ana Caroline Amorim Oliveira. Universidade Federal do Maranhão-UFMA. Campus São Bernardo. e-mail: [email protected]. Teresina-PI Setembro/2012 Lei 11.645/2008 e o debate étnico - racial no currículo escolar em uma escola municipal em São Bernardo/Ma Com a Lei 11.645/2008, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB(Lei 9394/96) ao tornar obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio traz uma discussão sobre como tratar os conteúdos referentes aos afrodescendentes e aos povos indígenas nos currículos escolares. Este sendo entendido de uma maneira ampla, não apenas o livro didático, mas também os rituais e as datas comemorativas celebradas pela escola (SILVA, 2010). Neste trabalho busco compreender como esta ocorrendo a implementação desses conteúdos no ensino fundamental, iniciado em 2011, em uma escola municipal em São Bernardo/ Ma. Para tal foi realizada pesquisa bibliográfica e de campo através das técnicas: observação, entrevistas informais e questionários semiestruturados aos alunos, professores e diretores da escola. Introdução Como compreender a inclusão do conteúdo da diversidade étnicoracial na escola tendo como experiência uma escola municipal de São Bernardo/Ma ? Após a contextualização da lei 11.645/08 enquanto uma politica identitária num sociedade multicultural, ou como define Guibernau, estado sem nação, e como esta demanda se torna uma questão educacional e/ou curricular apresentarei um panorama de como esta reivindicação identitária e educacional esta sendo realizada analisando um caso empírico para em seguida voltarmos a questão inicial do trabalho. A Lei nº 11.645 de 2008 veio dar a redação final à lei nº 10.639 de 2003 acrescentando no Artigo 26-A da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB, Lei nº 9.394/96, que nos estabelecimentos de ensino, fundamental e médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da historia e cultura afro-brasileira e indígena. Os conteúdos referentes aos afrobrasileiros e aos povos indígenas devem ser ministrados ao longo de todo o currículo escolar, em especial nas disciplinas de educação artística, literatura e historia brasileiras. (BRASIL, 2010). Esta lei surge dentro de um contexto social e político em que as minorias sociais estão reivindicando reconhecimento de direitos e de maior participação nos espaços públicos anteriormente restritos a um determinado grupo social, econômico e politicamente majoritário. Este espaço público, segundo Semprini (1999, p.116), esta sendo redefinido em um espaço sociocultural no qual “as fronteiras externas, o tecido interno e as linhas de fratura são mais de fundo cultural do que social, econômico ou demográfico”. As reivindicações dos grupos minoritários partem de demandas de fundo cultural e étnico e não apenas em termos econômicos. As políticas identitárias são definidas por Semprini (1999, p.56) como sendo “as reivindicações de determinadas minorias para que sua especificidade e sua identidade sejam reconhecidas e leis sejam criadas, podendo ir da simples concessão de direitos ou privilégios especiais até a concessão de formas de autonomia politica e governamental”. Tais reivindicações surgem em contextos de sociedades multiculturais, como no caso da sociedade brasileira, nas quais os grupos socialmente minoritários –negros e os índios- estiveram excluídos do espaço público. Podemos caracterizar o Brasil como um estado sem nação, a partir da definição de Guibernau (1997, p.126), já que o estado foi arbitrariamente projetado, ignorando-se as identidades culturais e linguísticas dos grupos que estão dentro de suas fronteiras. O estado-nação surge através da tentativa de uma homogeneização cultural para garantir a estabilidade de um governo centralizador sustentado numa ideologia nacionalista entre cidadãos e instituições infundindo uma impressão de formar uma única comunidade étnica, cultural e social. Em termos de formação de identidade o Estado moderno estabelece uma mono-identificação, segundo Cuché (2002, p.188), seja ao reconhecer apenas uma única identidade cultural cujos elementos definidores são uma língua oficial, uma religião oficial e fronteiras delimitadas garantidas pelo monopólio da violência legítima do estado; seja ao reconhecer uma identidade de referência, a única verdadeiramente legítima apesar de admitir um certo pluralismo cultural no interior de sua nação. Como é o caso da sociedade brasileira em que a partir da Constituição Federal de 1988, passou a reconhecer a diversidade cultural, étnica e religiosa mas permanece como a “nação brasileira” com sua língua oficial e território com fronteiras delimitadas. A perspectiva assumida pelo estado é não mais de assimilação em relação aos povos indígenas e de reconhecimento e valorização das religiões e línguas africanas. A lei 11.645/2008 surge nesse sentido como uma demanda de reparação da população afro-descendente e indígena “no sentido de políticas de ações afirmativas, isto é, de politicas de reparações, e de reconhecimento e valorização de sua historia, cultura e identidade”. (BRASIL, 2004, p.10) Como afirma Cuché (2002,p.190): “todo o esforço das minorias consiste em se reapropriar dos meios de definir sua identidade, segundo seus próprios critérios, e não apenas em se reapropriar de uma identidade, em muitos casos, concedida pelo grupo dominante”. A escola era um dos principais espaços que essas minorias eram excluídas não apenas dos bancos escolares, mas dos currículos. Com a lei 11.645/2008 os negros e os índios estão exigindo contar suas versões e perspectivas da formação da sociedade brasileira e sua permanência na atualidade. Não mais uma identidade mitificada, folclorizada e marcada no passado, todavia uma identidade contemporânea e construída por esses próprios grupos. Essa necessidade de reformulação do currículo escolar inserindo conteúdos e mais que isso novas visões da própria historia ‘oficial’ da sociedade nacional brasileira questionando a própria ‘veracidade’ das narrativas nacionais até então propagadas faz com que o currículo passe a ter elementos da ‘diferença’ e não somente da ‘igualdade’. O próprio currículo é então questionado. Entendido não mais como algo dado, pronto e quase naturalizado, mas sim fruto de relações de poder em que um grupo social, cultural e economicamente dominante determina o que possui estatuto de conhecimento e importância para se tornar obrigatório para toda uma população. Para isto exclui todos os outros saberes que não fazem parte ou contradizem a ideologia da nacionalidade. Simplesmente acrescentar em um currículo tradicional conteúdos sobre as minorias sociais e étnicas presentes no estado brasileiro ensinando apenas o respeito a diversidade e a tolerância a essas minorias, não o transforma em um currículo multiculturalista. Bem como as situações estruturais de desigualdade social e econômica desses grupos também não seriam transformadas. Como define Silva (2010, p,88-89)sobre o currículo multiculturalista: um currículo inspirado nessa concepção não se limitaria, pois, a ensinar a tolerância e o respeito, por mais desejável que isso possa parecer, mas insistiria, em vez disso, numa análise dos processos pelos quais as diferenças são produzidas através de relações de assimetria e desigualdade. Num currículo multiculturalista crítica, a diferença, mais do que tolerada ou respeitada, é colocada permanentemente em questão. Não basta apenas inserir no currículo conteúdos sobre a diversidade cultural se a própria noção de currículo e de conhecimento e do que deve ser estudado não for questionado e problematizado saindo da perspectiva folclórica e harmoniosa para uma discussão política do currículo. Um currículo multiculturalista nas escolas brasileiras traz uma problematização da formação social brasileira e de como as relações entre os diferentes agrupamentos sociais –africanos, povos indígenas e os europeusaqui se constituíram. A miscigenação racial foi vista num primeiro momento de forma negativa acreditando-se que provocaria a deterioração biológica prejudicando o progresso do país que estava nascendo. O principal defensor desta tese é o Conde Gobineu que afirma ‘a impossibilidade do progresso para algumas sociedades compostas por ‘sub-raças mestiças não civilizáveis’. (apud SCHWARCZ, 1993, p.64). No entanto, independentemente das teorias europeias foi-se constituindo no imaginário brasileiro que a combinação desses elementos se deu se maneira harmoniosa e benéfica ao estado-nação Brasil estabelecido ideologicamente através da fábula das três raças ou da democracia racial brasileira como afirma DaMatta(1987, p.70 ): “(...) o mito das três raças une a sociedade num plano ‘biológico’ e ‘natural’, domínio unitário, prolongado nos ritos de Umbanda, na cordialidade, no carnaval, na comida, na beleza da mulher(e da mulata) e na música...” As relações sociais no Brasil se deram de uma maneira específica. Ao invés de separar as raças evitando o contato, como ocorre nos Estados Unidos, aqui ocorreu a “intermediação e o sincretismo na síntese que vem impedir a luta aberta ou o conflito pela percepção nua e crua dos mecanismos de exploração social e politica”.(idem, p.83). A identidade nacional brasileira foi formada por uma ideologia dominante em que a harmonia e o não- conflito entre as três raças se deu de maneira quase natural. Apresentar novas versões a esta narrativa da sociedade brasileira exige problematizar o discurso hegemônico presente não só nos livros didáticos como também na sociedade em geral. Para compreender empiricamente como esta sendo realizada essa negociação identitárias nas escolas foi realizado um diagnóstico étnico-racial na escola municipal Instituto Cônego Nestor, em São Bernardo/Ma. A abordagem utilizada para a realização do diagnóstico na escola foi qualitativa através da pesquisa-ação com uso de técnicas de pesquisa como observação em sala de aula, questionários semi-estruturados e conversas informais. Entrevistamos as diretoras, professores, alunos e pais de alunos, do quinto ao nono ano. A escolha desta escola se deu em virtude do projeto do PIBIDPrograma Institucional Bolsa de Iniciação à Docência1 do Curso de Ciências Humanas, Campus São Bernardo, Ma que tem como tema a relação entre educação e a diversidade étnico-cultural. Esse projeto é realizado nessa escola devido ser a única do município possuidora de uma estrutura mínima possível para a execução do projeto. Após a contextualização da lei 11.645/08 enquanto uma politica identitária num sociedade multicultural, ou como define Guibernau, estado sem nação, e como esta demanda se torna uma questão educacional e/ou curricular apresentarei um panorama de como esta reivindicação identitária e educacional esta sendo realizada analisando um caso empírico para em seguida voltarmos a questão inicial do trabalho. Este projeto é financiado pela Capes- Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. O titulo do projeto do Pibid de Ciências Humanas é: “As ciências humanas e a diversidade étnico-cultural: educação, interdisciplinaridade e cidadania” iniciado em 2011. A lei 11.645/08 na escola: diagnóstico em uma escola municipal em São Bernardo Diante dessa especificidade da formação das relações sociais brasileiras a escola encontra dificuldades ao tentar abordar esse tema junto aos alunos já que a própria noção de currículo não é entendida como fruto de uma herança colonial e marcador de uma identidade nacional. Como afirma Silva (2010, p.101): o texto curricular, entendido aqui de forma ampla- o livro didático e paradidático, as lições orais, as orientações curriculares oficiais, os rituais escolares, as datas festivas e comemorativas- esta recheado de narrativas nacionais, étnicas e raciais. Durante cinco séculos as narrativas dos africanos e dos povos indígenas faziam parte dos conteúdos escolares como sendo algo do passado, do inicio da formação da sociedade brasileira. Apenas como elementos que contribuíram para a construção da nação brasileira através da lembrança pontual do “Dia do Índio” e do Dia da Abolição dos Escravos” e não como agentes presentes na sociedade brasileira. Como percebe Grupioni( 2004, p.488) acerca da representação dos índios nos livros didáticos caracterizados pela negação de traços culturais significativos relacionados a civilidade como a escrita, o estado, a tecnologia para lidar com metais e a utilização de documentos históricos como cartas de viajantes, alvarás etc. para falar sobre os índios levando os alunos a concluírem pela não contemporaneidade dos índios. Não de maneira diferente os afrodescendentes após a abolição da escravidão simplesmente não aparecem mais como tendo um papel importante na construção da sociedade brasileira já que foram substituídos pelos imigrantes. Os negros caem num vazio histórico. São relembrados apenas em determinadas elementos como o carnaval, o samba, futebol, a feijoada, entre outros. Dessa maneira, a questão da raça e da etnia não é simplesmente um tema transversal nos currículos escolares. Ela deve se tornar uma questão central de conhecimento e sua relação entre poder e identidade.(SILVA,2010, 102). Toda essa problematização acerca dos currículos escolares e sua reformulação não chegam às escolas e em especial aos professores. O que é colocado as profissionais da educação é apenas a obrigatoriedade e cumprimento da legislação. O porquê da inserção dos conteúdos sobre as minorias sociais não é apresentado de maneira adequada a esses profissionais. E por ser obrigatório acaba por gerar uma resistência por parte dos agentes envolvidos na efetivação da legislação. A secretaria de educação do município de São Bernardo iniciou um projeto em 2011 o “Projeto de cultura afro-brasileira e indígena” para ser inserido no planejamento anual de todas as escolas do município. Os responsáveis por esse projeto foram os professores que ministram as disciplinas de Historia das escolas. No entanto, não ocorreram oficinas ou cursos de formação para os professores ou diretores sobre a temática. As ações deste projeto se restringiram a comemoração do Dia do Índio e da Consciência Negra. Para compreender em que consistia a dificuldade dos professores para trabalharem a temática ( se é que havia) do conteúdo sobre a diversidade étnico-cultural foi perguntado aos docentes do turno vespertino que ministram disciplinas diferentes. Dos onze entrevistados: três informaram que a falta de material é a principal dificuldade, um informou ser a falta de conhecimento, um informou a falta de material e a falta de conhecimento, um afirmou ser impossível trabalhar o tema em sala de aula, um informou sem difícil principalmente pela dificuldade dos alunos e dois informaram que não tinham dificuldade e dois não responderam. A maioria respondeu ser a falta de material a maior dificuldade em se trabalhar a temática apesar de em 2011 a escola ter recebido os livros didáticos de Geografia e História com capítulos tratando da diversidade da formação cultural e racial brasileira. A docente que respondeu ser impossível trabalhar este conteúdo em sala de aula ministra aulas de matemática. Com relação aos pontos positivos de se trabalhar tal temática em sala de aula quatro professores responderam que respeitar as diferenças seria um ponto positivo, três responderam conhecer sobre as culturas, três não responderam e um não sabia informar. Sobre o conhecimento individual que os docentes possuíam acerca da diversidade étnico-cultural oito responderam que possuíam algum tipo de conhecimento sobre a temática, dois responderam que não possuíam nenhum tipo de conhecimento e um respondeu que tinha muito pouco conhecimento. O conhecimento a que se refere os professores que responderam “sim” é em especial as noções de preconceito e de cultura como afirmou um entrevistado. O conhecimento sobre os africanos ou os povos indígenas para a grande maioria das pessoas ocorre através dos veículos de comunicação de massa. O conhecimento mais especifico ainda é bastante restrito aos círculos acadêmicos em especial das áreas de Antropologia, Historia e Linguística.(SILVA;GRUPIONI, 2004, p.19). Em relação ao iniciar os conteúdos sobre os africanos e os índios em sala de aula e de que maneira foi realizado o processo de ensinoaprendizagem: sete professores informaram que já iniciaram em sala de aula a temática através de materiais como textos, jornais, livros didáticos usando como metodologia debates e seminários dos alunos e quatro professores informaram que não iniciaram o conteúdo em sala de aula. Ao relacionar os professores que tinham dificuldade em trabalhar o conteúdo por falta de material com os que informaram ainda não iniciaram a temática em sala de aula percebemos o mesmo quantitativo de docentes: quatro. Mesmo a maioria dos professores entrevistados terem afirmado possuir algum tipo de conhecimento sobre a diversidade étnico-cultural do país. No entanto, este conhecimento é restrito e pontual não sendo uma garantia de um domínio de um conteúdo para ser ministrado em sala de aula por não ter apoio em uma maior variedade de materiais didáticos sobre a temática bem como uma capacitação e formação. Quando os alunos foram questionados sobre a frequência com que esse conteúdo é abordado em sala dos vinte e um alunos entrevistados dezessete responderam que ocorre de forma aleatória, três responderam ocorrer raramente e um frequentemente. Ao relacionarmos as respostas dos alunos com a dos professores percebemos que o conteúdo é abordado em sala, de maneira não sistematizada e frequente, mas sim de forma aleatória e avulsa. Ao perguntarmos aos alunos sobre o material didático utilizado pelo professor sobre a temática da diversidade dezesseis alunos informaram que os professores usam em especial: vídeos, cartazes e livros didáticos e cinco alunos disseram que os professores não utilizavam nenhum material. Percebe-se que mesmo o assunto não sendo abordado com frequência em sala de aula a metodologia e o assunto em si são fixados pelos discentes. Sobre a clareza da abordagem utilizada pelos professores dezesseis alunos responderam que existe uma clareza, dois responderam que não existe clareza na abordagem do docente, dois discentes não responderam e um respondeu “mais ou menos”. Dentre os motivos dos que afirmaram positivamente acerca da clareza obtivemos respostas desde “não entendi, mas gostei”, como seis respostas afirmando que o professor “explica bem” até respostas com maior presença do conteúdo trabalhado: “lembra que os negros foram trazidos de fora para o Brasil; “deixa claro que não se deve apelidar pela cor da pele”; “ele fala dos costumes, lendas e zumbi”. Segundo os alunos as disciplinas nas quais são abordadas o conteúdo sobre a diversidade são: no oitavo ano dois alunos informaram que esse tema aparece nas disciplinas de Historia e Geografia e três alunos informaram que aparece em Historia. Um aluno do quinto informou que era ministrado nas disciplinas de Ciências; dois alunos do sétimo ano informaram que em Historia; cinco em nas disciplinas de Historia e Geografia; do sexto ano cinco alunos que o tema é abordado na disciplina de Historia; dois alunos do sexto ano informaram que ocorre na disciplina de Historia. A LBD no artigo 26-A afirma que os conteúdos sobre os africanos e indígenas devem ser trabalhados no âmbito de todo o currículo escolar em especial nas áreas de educação artística, literatura e historia brasileiras. (BRASIL, Art. 26-A, § 2). No entanto, através da pesquisa foi percebido que as os conteúdos sobre a formação cultural e étnica brasileira é entendida como sendo possível ser trabalhadas apenas nas áreas de Historia e de Geografia. Como afirmou a professora de matemática do sétimo ano: “Na minha disciplina é impossível inserir a temática”. Tal postura foi assumida também pela Secretaria de Educação ao colocar como responsabilidade principal para a execução do projeto da secretaria os professores que ministram a disciplina de Historia nas escolas desconsiderando uma determinação legal. Tal percepção parte de uma ideia restrita na qual os conteúdos sobre diversidade cultural se restringe a cultura, a manifestações artísticas e folclóricas e não em termos de conhecimentos considerados como exclusivamente ocidentais em especial a raciocínio matemático. Em geral são referidos os saberes dos índios e dos africanos como sendo superstições, magia, crenças sem fundamento e sem racionalidade e comprovação científica. Considerações Finais A lei 11.645/08 esta inserida em um contexto contemporâneo de reivindicações identitárias que resultam políticas de acesso ás minorias sociais aos espaços públicos que antes eram restritos a determinados grupos. O espaço público esta sendo transformado, a partir das demandas por direitos dos grupos minoritários, em um espaço sociocultural no qual as solicitações de direitos são de cunho étnico-cultural e de gênero e não apenas econômico. O debate se estabelece não mais em torno da desigualdade econômica de determinados grupos marginalizados, mas sim de reparações culturais em primeiro lugar. Tais reivindicações estão ocorrendo em países de formação multicultural ou de estado sem nação em que primeiro houve a imposição do estado centralizador administrativamente para em seguida haver a construção do sentimento de nacionalidade. Um dos princípios para a estabilidade de um estado sem nação é a homogeneização cultural proporcionado pelo estado que passa a determinar a identidade do seu povo. Isto ocorre através da mono -identificação imposta pelo governo. Esta é definida por ele através das narrativas, dos mitos de origem, memórias e sentimento de comunhão compartilhadas pela população. A escola tem um papel fundamental de construção e formação da identidade nacional da criação do sentimento de comunidade de grupo através dos símbolos representativos de uma nação. Esta narrativa nacional é afirmada e confirmada nos currículos escolares, livros didáticos e nas datas comemorativas. Como afirma Guibernau(1997, 92): “[...]a nação , usando uma serie particular de símbolos, mascara a diferenciação dentro de si mesma, transformando a realidade da diferença na aparência da similaridade, permitindo assim às pessoas se revestirem da “comunidade” com integridade ideológica”. A demanda por acrescentar conteúdos sobre as minorias sociais no currículo parte de uma reivindicação pelo direito à auto-identificação pelos próprios membros desses grupos e não mais de uma identificação estigmatizada vinda de fora. A reformulação dos currículos escolares é uma reformulação nas narrativas ‘oficiais’ da nacionalidade brasileira. O currículo torna-se alvo de críticas sendo percebido como produto de relações de poder dentro de um projeto de estado-nação. Esses símbolos nas escolas representam os grupos sociais que formaram a sociedade nacional. A representação nos currículos escolares acerca dos negros e dos índios ocorria de forma enviesada apresentados como contribuintes de elementos específicos à nação brasileira na culinária, na música, na língua, em alguns costumes e em alguns traços físicos. Pois a miscigenação entre os povos, característica da sociedade brasileira, fez surgir a democracia racial onde não havia conflitos nem discriminações de ordem racial. Para a construção de um currículo critico sobre sua própria produção de conhecimento, isto é, multiculturalista, como define Silva (2010), é necessário mais do que acrescentar conteúdos a grade curricular e falar sobre diversidade e tolerância. A partir da pesquisa realizada em uma escola do município de São Bernardo/Ma foi identificado que esse contexto no qual esta inserida a Lei 11.645/08, fruto de demandas de minorias sociais até em tão excluídas dos espaços públicos, em especial da educação, não é apresentado aos profissionais da educação. Estes entendem que são apenas novos conteúdos que serão integrados à grade curricular de alguma forma não entendendo muito bem seu sentido em termos de importância política. Essa percepção reverbera nos alunos que quando assistem às aulas sobre os conteúdos sobre os índios e os africanos entendem que se dá de maneira aleatória, não sistematizada e sem continuidade. Proporcionado por falta de material adequado a temática fazendo com que os professores utilizem de sua criatividade para inovar em metodologias e materiais didáticos. O que se torna algo difícil de ser realizado em uma cidade em que não existem bibliotecas públicas funcionando e nem na própria escola. Os conhecimentos atuais sobre os africanos, afro-descentes e dos povos indígenas acabam por ficar restritos aos âmbitos universitários e os materiais produzidos são monografias, dissertações e teses que não chegam na educação básica. A ausência de uma capacitação dos docentes acerca da temática a ser acrescentada nos currículos escolares para que houvesse uma sensibilização do tema. De acordo com a LDB os conteúdos deveriam estar presentes em toda a educação básica e não centralizados em disciplinas especificas da área de ciências humanas de historia e geografia. Os professores possuem conhecimentos esparsos e pontuais que dificultam a própria clareza da abordagem do assunto a partir das respostas dos alunos que acham claro, mas não entendem muito. Diante desse diagnostico realizado compreendo que a inclusão dos conteúdos sobre as minorias sociais permanece pautada em uma folclorização e em uma caricaturização baseada nas representações já existentes acerca desses grupos. A inserção dos conteúdos sobre a diversidade cultural brasileira não significou que outras narrativas de outras versões da formação da sociedade brasileira entrassem nos currículos escolares problematizando-o. O currículo não se tornou ainda multiculturalista. A grade curricular permanece como antes tendo sido acrescentada em disciplinas especificas um capítulo a mais sobre a formação da sociedade nacional. Referencia Bibliográfica BRASIL. Constituição Federal de 1988.Brasilia, DF:Senado Federal,1988. _______. Contribuições sobre a Implementação da Lei 10.639/2003. Brasilia,DF: Ministerio da Educação, 2008. _________. Declaração de Princípios sobre a Tolerância. Brasilia, DF: UNESCO,1995. _______. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o ensino de Historia e Cultura Afro-brasileira e Africana. Brasilia,DF: Ministério da Educação,2004. ________. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.Lei 9394/96. Brasilia,DF: Edições Camara, 2010. ________.Parâmetros Curriculares Nacionais. Temas Transversais: Pluralidade Cultural e orientação Sexual. Brasilia, DF: Ministério da Educação, 1997. ________.Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Nacionais. Brasília,DF: Ministério da Educação, s/d. CARDOSO DE OLIVEIRA, Roberto. Sobre o diálogo intolerante. In: Povos Indígenas e Tolerância: construindo práticas de respeito e solidariedade. GRUPIONE,Luis Donizete.Vidal, Boelitz Lux. FISCHMANN,Roseli(org). São Paulo: UNESP, 2001. CUCHÉ, DENYS. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru,SP: EDUSC,2002. DA MATTA, Roberto. Relativizando: uma introdução à Antropologia Social Ed. Rocco: Rio de Janeiro, 1987. GUIBERNAU, Montserrat. Nacionalismos. Rio de Janeiro: Zahar, 1997. GUPRIONI, Luis Donisete Benzi. Livros didáticos e fontes de informações sobre as sociedades indígenas no Brasil. In: GUPRIONI, Luis Donisete Benzi. SILVA,Aracy Lopes. A temática indígena na escola: novos subsídios para professores de 1º e 2ºgraus. SEVERINO, Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico. 23 ed. São Paulo: Cortez, 2007. SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças-cientistas, instituições e questão racial no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. SEMPRINI, Andréa. Multiculturalismo. São Paulo: EDUSC, 1997. SILVA, Tomaz Tadeu da. A produção social da identidade e da diferença. In: Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. SILVA, Tomaz Tadeu da(org). Petrópolis, RJ: Vozes, 2000. ____________________. Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Ed. Autentica, 2010. ANEXOS PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA - PIBID PROJETO: AS CIÊNCIAS HUMANAS E A DIVERSIDADE ÉTNICO-CULTURAL: EDUCAÇÃO, INTERDISCIPLINARIDADE E CIDADANIA QUESTIONÁRIO SEMI-ESTRUTURADO DOS ALUNOS DA ESCOLA MUNICIPAL INSTITUTO CONEGO NESTOR DE CARVALHO CUNHA SÃO BERNARDO/MA PERFIL DO ENTREVISTADO: 1.Nome:_____________________________________________________________________________ 2. Sexo: (____)Masculino (____)Feminino 3. Idade:____________________________________________________________________________ 3.Ano/Série:_____________________________________________ PROCESSO ENSINO/APRENDIZAGEM 4.Você tem algum conhecimento sobre os povos indígenas ? (____) Sim (_____) Não 11.1.Se sim qual? ________________________________________________________________________________________________________ ____ 5.Voce tem algum conhecimento sobre os povos africanos? (____) Sim (____)Não 6. Se sim qual? ________________________________________________________________________________________________________ _____ 7. Na escola que você estuda você teve alguma aula sobre os negros ou os índios? (____) Sim (____)Não 8. Em qual disciplina/matéria esta temática é abordada na sua escola? (____)Matemática (____)Português (_____) Inglês (_____) Historia (_____)Ciências (_____)Geografia 9. Na sua opinião como esta temática é abordada na sua escola? (____)Frequentemente- todo dia (____) Aleatoriamente- de vez em quando (____)Raramente- quase nunca (____) Nunca 10. Algum professor da sua serie utiliza algum tipo de material didático sobre a temática étnico-racial? (___) Sim (____)Não 10.1. Se sim, qual? ________________________________________________________________________________________________________ ______ 11. A abordagem utilizada pelo professor para trabalhar esta temática em sala de aula fica claro para você? 11.1. (____) Sim (____) Não 11.2. Por quê? ________________________________________________________________________________________________________ _____ PRECONCEITO 12. O que você sabe sobre preconceito racial? ________________________________________________________________________________________________________ 13. Você já foi vítima de preconceito/ discriminação racial na escola? 13.1. (____)Sim (___)Não 13.2 Se sim por quem? ________________________________________________________________________________________________________ 13.3. Como? 14. Você já presenciou na escola alguém sendo vítima de preconceito/discriminação racial? 14.1.(____) Sim 14.2. Se sim por quem? (____)Não ________________________________________________________________________________________________________ _ 14.3. Como? ________________________________________________________________________________________________________ _ 14.4. Qual foi a sua postura diante de tal acontecimento? ________________________________________________________________________________________________________ ___ 15.Como você se auto-denomina de acordo com a raça/etnia? (_____)Negro (_____)Branco (_____)Indígena (_____)Amarelo/Asiático (_____)Pardo (_____)Moreno PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA - PIBID PROJETO: AS CIÊNCIAS HUMANAS E A DIVERSIDADE ÉTNICO-CULTURAL: EDUCAÇÃO, INTERDISCIPLINARIDADE E CIDADANIA QUESTIONÁRIO SEMI-ESTRUTURADO DOS PROFESSORES DA ESCOLA MUNICIPAL INSTITUTO CONEGO NESTOR DE CARVALHO CUNHA SÃO BERNARDO/MA PERFIL DO ENTREVISTADO: 1.Nome:_____________________________________________________________________________ 2. Sexo: (____)Masculino (____)Feminino 3. Idade:____________________________________________________________________________ 3.Formação:_____________________________________________4. Ano da formação:_________________________ 5.Se possui pós-graduação:(____)Sim (____)Não 6.1.Qual? ________________________________________________________________________ 7.Area de Atuação:__________________________________________________________________________________ 8.Escolas que trabalha:______________________________________________________________________________ 9.Quanto tempo esta atuando na área de educação?__________________________________________ 10.Qual o ano que estas ensinando?_______________________________________________________________ ESCOLA 11.Tem algum conhecimento sobre o tema da diversidade étnico-cultural? ________________________________________________________________________________________________________ ____ 12.Já começou a inserir o tema na sala de aula? Como? ________________________________________________________________________________________________________ _____ 13. A secretaria de educação já iniciou algum tipo de projeto para incluir a temática nos currículos escolares? (____) Sim (____)Não 13.1. Qual foi a ação? ________________________________________________________________________________________________________ ______ 13.2. Há quanto tempo esta sendo desenvolvido? (____)8 anos (____)7 anos (____)6 anos (____)5 anos (____)4 anos (____)3 anos (____)2 anos (____) 1 ano (____)6 meses (____) Menos de 6 meses 14. Esta ação da secretaria tem contribuído de alguma maneira? ________________________________________________________________________________________________________ _____ 15. A sua escola possui Projeto Politico-Pedagógico? (____) Sim (____)Não 16. No PPP da escola foi inserido o tema da diversidade étnico-racial? (____)Sim (____)Não 17. E o Planejamento Escolar Anual tem alguma ação pedagógicas prevista para a inserção deste tema? (____)Sim (_____)Não 18.1.Qual?___________________________________________________________________________________________ ______ MATERIAL DIDATICO 19.Você já teve acesso a livros didáticos com a temática étnico-racial? (_____) Sim (____)Não 19.1.Quais?(Se souber a editora, Autor). ________________________________________________________________________________ 19.2.Você sabe o ano em que o material chegou a sua escola? (____)8 anos (____)7 anos (____)6 anos (____)5 anos (____)4 anos (____)3 anos (____)2 anos (____) 1 ano (____)6 meses (____) Menos de 6 meses 20. Este material esta sendo utilizado por você em sala de aula? 21.Quais as dificuldades que você encontra para se trabalhar esta temática? 22. Quais os pontos positivos de se trabalhar esta temática? 23. Na sua opinião, como seus alunos se caracterizam de acordo com a raça e /ou etnia? (_____)Negro (_____)Branco (_____)Indígena (_____)Amarelo/Asiático (_____)Pardo (_____)Moreno 24. E você ? (_____)Negro (_____)Branco (_____)Indígena (_____)Amarelo/Asiático (_____)Pardo (_____)Moreno 25. Você já presenciou ou soube de algum tipo de preconceito racial na escola em que trabalha? 25.1.Qual foi a sua postura diante de tal acontecimento? FORMAÇÃO DO PROFESSOR: 26. Você recebeu algum tipo de capacitação para trabalhar a temática? 27. Na sua opinião, a escola em que trabalha esta preparada para atender a determinação legal da inserção das leis 10.639/2003 e 11.645/2008? 28. Qual a sua opinião sobre a o tema da diversidade étnico-racial?