CENTRO UNIVERSITÁRIO DE SANTO ANDRÉ MÁRCIA ANGELITA MARTOS GEORGETTI JULIANA TABATSCHNIC EMOÇÕES HUMANAS NA INTERAÇÃO COM ANIMAIS Santo André 2006 MÁRCIA ANGELITA MARTOS GEORGETTI JULIANA TABATSCHNIC EMOÇÕES HUMANAS NA INTERAÇÃO COM ANIMAIS Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, apresentado ao Curso de Psicologia do Centro Universitário de Santo André para obtenção do Grau de Bacharel em Psicologia. Orientadora: Prfª Drª Rosalice Lopes Santo André 2006 Emoções Humanas na Interação com Animais Márcia Angelita Martos Georgetti Juliana Tabatschnic Banca Examinadora Prof.ª Dra. Rosalice Lopes Centro Universitário de Santo André - UNIA Assinatura: _____________________________ Prof.ª Dra. Maria de Fátima Martins Universidade de São Paulo – USP – Campus Pirassununga Assinatura ______________________________ Prof.ª MS. Ivone Varoli Centro Universitário de Santo André – UNIA Assinatura ______________________________ TCC defendido e aprovado em ___/___/___ Dedico este trabalho ao Jairo, Abraão e Luca pela base familiar que me projete com segurança para todos os meus vôos. (Márcia Angelita Martos Georgetti) Dedico este trabalho aos meus pais Hidal e Ana, aos meus irmãos Marcos e Daniela, à minha avó Dora e à minha tia Raquel pela felicidade que me trazem todos os dias e pela importância em minha vida. (Juliana Tabatschnic) AGRADECIMENTOS Pessoas lindas são aquelas que não se conformam com realidades aviltantes e têm ou buscam idéias para modificar tais situações. Muitas vezes a idéia pode não ser original, mas quando a pessoa adota boas idéias de outrem para modificar o que está posto, e se dispõe a transcendê-las para fazer a diferença, isso dignifica a humanidade. Foi o que fez Nise da Silveira, é o que fazem as pessoas que investem em novos caminhos como a TAA - Terapia Assistida por Animais para dar qualidade de vida aos homens e aos animais. Por isso agradecemos profundamente à Prof.ª Dra. Rosalice Lopes, Prof.ª Dra. Maria de Fátima Martins, Prof.ª Dra. MS. Ivone Varolli e aos amigos humanos e animais que participaram tão gentilmente do experimento. Agradecemos profundamente pelo apoio, amor e solidariedade aos nossos familiares: Jairo, Abraão, Tchwz, Gláucia, Benedicta, Luca, Hidal, Ana, Marcos, Daniela, Dora e Raquel.. À amiga Lucidalva pelo carinho e amor dedicados a mim e aos meus filhos Abraão e Luca. Gostaríamos de agradecer ainda a todas as pessoas que direta ou indiretamente contribuíram para nossa formação acadêmica e humana, mas principalmente a Deus que nos possibilitou encontrar todos esses seus filhos lindos pelo nosso caminho. Para ser grande, sê inteiro nada Teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és No mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda Brilha, porque alta vive. Fernando Pessoa Toda gente é interessante se a gente souber ver toda a gente. Que obra-prima para um pintor possível em cada cara que existe! Que expressões em todas, em tudo! Que maravilhosos perfis todos os perfis! Vista de frente, que cara qualquer cara! Os gestos humanos de cada qual, que humanos os gestos! Fernando Pessoa SUMÁRIO Introdução 11 1 – As emoções 14 1.1 – Conceituando Emoções 14 1.2 – Teorias da Emoção 20 1.3 – Emoção e Cognição 21 1.4 – Nojo 23 2 – Simbologia dos animais 28 2.1. O animal na vida do homem 28 2.2. O animal da pesquisa 32 3 – Projeção 34 4 – Método 38 4.1 – Participantes 38 Anexo 1 39 4.2 – Instrumentos 46 Anexo 2 46 4.3 – Local 47 4.4 – Procedimentos 47 4.5 – Categorias de Análise 49 5 – Apresentação dos Dados 50 6 – Análise dos Dados 73 7 – Considerações Finais 82 Referências 84 GEORGETTI, M.A.M; TABATSCHNIC, J. Emoções Humanas Na Interação Com Animais, 2006. 75 f. Trabalho de Conclusão de Curso – Centro Universitário de Santo André – UNIA, Santo André, 2006. O estudo enfoca as reações experimentadas por um grupo de 13 – 7 mulheres e 6 homens – alunos estudantes de Psicologia de um centro universitário na cidade de Santo André na interação com o animal exótico Escargot (Achatina fulica). A partir do relato dos participantes e utilizando-se dos recursos da Psicologia, Psicanálise e Biologia, foi possível verificar que dentre as emoções básicas (emoções comuns a todos os seres humanos e que originam as demais) as mais evidentes e freqüentes foram a tristeza (84.61%), nojo (76.92%) e medo (61.54%). No entanto, outras como a curiosidade (100%) e a surpresa (100%) também foram registradas com unanimidade. O contato com os animais permitiu que os participantes falassem de outros aspectos de suas vidas (100%), relatassem histórias de sua infância (38.46%) e experiências com outras pessoas e animais (100%). As reações emocionais relacionadas ao nojo sugerem em alguns casos uma clara conotação sexual (segundo o nojo freudiano este agiria como uma barreira, impedindo a realização dos desejos inconscientes, cuja função seria se unir a vergonha e ao moralismo buscando frear o instinto sexual). O estudo aponta que o contato com animais permite sim um acesso ao mundo interno das pessoas, mas que ainda se faz necessário um longo processo de pesquisa antes que ele venha a adquirir um valor diagnóstico. Palavras chave: interação homem-animal, emoções, nojo, escargot e psicologia GEORGETTI, M.A.M; TABATSCHNIC, J. The Human Emotions in the Interaction with Animals, 2006. 75 f. Trabalho de Conclusão de Curso – Centro Universitário de Santo André – UNIA, Santo André, 2006. The study focus the reactions experienced by a group of 13 (7 women and 6 men) Psychology students of a University downtown Santo André interacting with an exotic animal Escargot (Achatina fulica). Based on the participants’ reports and using Psychology, Psychoanalysis and Biology resources, it was possible to identify that among the basic emotions (Common emotions to all human being which originate the others) the most evident and frequent were sadness (84.61%) disgust (76.92%) and fear (61.54%). On the other hand, other emotions like curiosity (100%) and surprise (100%) were registered unanimously. The contact with the animals allowed the participants to talk about other aspects of their lives (100%), telling about childhood stories (38.46%) and experiences with other people and animals (100%). In some cases the emotional reactions related to disgust show a clear sexual connotation (according to Freudian disgust this would act as a barrier, preventing the accomplishment of the unconscious desires whose function would be to unite itself to the shame and morality in order to break the sexual instinct). The study shows that the contact with animals do allow an access to the inner world of the people, but it is still necessary a long research process before it can have a diagnostic value. Key words: psychology. Human-animal interaction, emotions, disgust, escargots, Introdução O ser humano é gregário por natureza. Ele busca contato tendo em vista que a solidão é produtora de angústia e ansiedade. Muitos seres humanos apresentam dificuldades de contato inter-pessoal, sendo que essas dificuldades podem tanto ser de origem relacional – problemas familiares como, por exemplo, resultantes de problemas congênitos e/ou adquiridos ao longo da vida. Nesses casos podemos citar, por exemplo, as deficiências físicas – visuais, motoras, etc, e as advindas de acidentes ou mesmo produzidas pelo envelhecimento. Existem muitos casos em que a pessoa que tem algum tipo de dificuldade não pode contar com a ajuda de um outro ser humano, de modo permanente, para superar suas necessidades. Nesses casos, a solução pode vir pela ajuda de um animal de outra espécie. O Homem vêm utilizando animais para melhorar sua vida há séculos, tanto na produção quanto para proteção e companhia. Mais recentemente, especialmente nas duas últimas décadas, pesquisas vêm mostrando outros usos/benefícios trazidos pelos animais ao Homem, como a T.A.A – Terapia Assistida por Animais. Entre elas destacam-se a eqüoterapia, animais nas escolas, animais em hospitais, animais em asilos, animais em centros de reabilitação social, cães guias, entre outros. Nessa interação ser humano-animal ocorre melhora nas condições neurológicas, fisio-motoras, ensino-aprendizagem, cardiovasculares com controle de pressão arterial, diminuição de processos dolorosos e conseqüente diminuição da quantidade de medicamentos utilizados em pessoas com enfermidades graves. Por outro lado, até o momento desse estudo, não encontramos registros sobre pesquisas que investiguem as emoções que determinadas espécies de animais, muitos deles considerados exóticos ou incomuns, despertam nos seres humanos. Muitas dessas emoções estão relacionadas ao medo, à ansiedade e à repugnância. Nossa hipótese é que muitas dessas emoções surgem à vista do animal, em virtude de experiências construídas ao longo da vida das pessoas, quer seja por uma experiência concreta e desagradável ou, em outras circunstâncias, o que nos parece mais freqüente, porque aprenderam com alguém que o animal deveria ser “excluído do convívio”, sem que, de fato, tivesse ocorrido qualquer tipo de aproximação. Nessa direção, o presente estudo visa oportunizar o contato com o animal exótico Escargot (Achatina fulica), de modo a avaliarmos as reações humanas advindas dessa aproximação. Por ser um animal exótico imaginamos que muitas poderão ser as reações manifestadas pelos participantes nesta interação, já que esses animais podem mobilizar conteúdos psicológicos conscientes e inconscientes, resgatando assim possíveis situações e emoções previamente vivenciadas. A importância dessa pesquisa se dá na investigação de como algumas imagens repulsivas são construídas e também de como o contato com um animal exótico pode mobilizar conteúdos não imediatamente conscientes. O estudo almeja ser um primeiro passo na direção de novas alternativas de conhecimento do mundo interno das pessoas, enquanto uma atividade de caráter projetivo. Intrigadas com a diversidade das emoções e com a perspectiva de aprofundar os conhecimentos no assunto, julgamos oportuno relatar que o fato catalisador da presente pesquisa ocorreu em uma das aulas práticas da disciplina zooterapia VNP244 ministrada pela Prof. Dra. Maria de Fátima Martins – USP Pirassununga1. Em contato com um camundongo transgênico (animal desprovido de pêlos) Márcia, diante da fragilidade e do aspecto do animal que, em virtude da transparência da pele deixava visíveis seus vasos sanguíneos, reviveu de forma intensa momentos que passou com seu filho 1 Uma das pesquisadoras do presente estudo, Marcia, é médica veterinária e freqüentava o Curso de Zooterapia na referida Universidade. Abraão, submetido, aos quatro dias de vida, a uma cirurgia cardíaca por alteração congênita (Cris-cross heart com Transposição das Grandes Artérias). Essa interação mobilizou de forma intensa e inesperada, conteúdos até então não conscientizados os quais, para uma estudante de Psicologia, foram suficientes para suscitar a questão de que esse tipo de contato poderia ser uma forma de acesso às emoções humanas, ou seja, que os animais podem ser vistos como catalizadores/veiculadores de emoções de natureza inconsciente, bastaria apenas que nos orientássemos para o fato de um modo mais sistemático e científico. De modo a atingir esses objetivos no campo do presente estudo foi abordado no capítulo 1 como se processam, se expressam e quais são as emoções humanas de modo a obter algumas pistas sobre o quê uma pessoa pode sentir diante de um animal exótico. Para isso foi usado um referencial teórico predominantemente psicológico, com algumas contribuições da neurociência, filosofia e biologia. O capitulo 2 apresenta uma breve incursão histórica da presença dos animais na vida do ser humano, através das diferentes relações que foram se estabelecendo entre homens e animais. Os autores que contribuem para essa exposição são predominantemente da área médica (Medicina Humana e Veterinária). O capítulo 3 aborda alguns conceitos sobre o mecanismo da projeção tomando como referência as concepções da psicanálise freudiana a partir de autores contemporâneos. Pensamos que o contato com animais, e no caso de nosso estudo um animal exótico, seja capaz de despertar conteúdos de natureza inconsciente na forma de projeção e, portanto, nos aprofundarmos sobre esse tema é pertinente à pesquisa. O capítulo 4 apresenta o método utilizado no estudo e o capítulo 5 os resultados obtidos com o experimento utilizando as categorias de análise. No capítulo 6 segue a discussão dos resultados obtidos no experimento em confronto com os objetivos iniciais do projeto. O capítulo aborda nossas conclusões. Capítulo 1 – AS EMOÇÕES 1.1 – Conceituando Emoções As emoções humanas são causas de constantes inquietações e curiosidades. Às vezes fluem de forma espontânea, sem qualquer dificuldade ou obstáculo, como no caso da paixão entre jovens, do medo em virtude de um perigo real, da alegria diante de algo engraçado. Outras vezes, o acesso às emoções se dá de forma indireta, com a finalidade de se produzir algum tipo de conhecimento sobre a personalidade de alguém, como nos casos de avaliações psicológicas. Em quaisquer das situações é inegável que, ao se abordar o tema emoções, estamos trilhando um terreno complexo, profundo e de difícil acesso pois as emoções estão na alma, isto é, na psique. Mas, o que são as emoções? Segundo o Dicionário de Filosofia a raiz etimológica de emoção é latina emotio, de emovere, e tem o sentido de deslocar, movimentar, comover. Emoção também remete a um “estado afetivo brusco, passageiro e violento, acompanhado de reações corporais.” (JACQUELINE RUSS,1994, p. 81) O Dicionário Oxford de Filosofia nos informa que as emoções humanas típicas são o amor, o desgosto, o medo, a raiva e a alegria sendo que cada uma delas é capaz de produzir determinadas ações e interferir em outras tantas. Os estados emocionais encontram-se relacionados a sentimentos e expressões corporais típicas. Ao contrário das disposições ou dos estados de espírito, as emoções têm um objeto, ou seja, a pessoa emocionada sofre por algo ou por alguém em particular, tem medo de algo ou alguém, tem raiva de algo ou alguém. (SIMON BLACKBURN, 1997) No campo da filosofia, os racionalistas da Antiga Grécia afirmavam que as emoções não poderiam ser mantidas sobre controle, que elas, invariavelmente, eram descarregadas de maneira devastadora sobre as funções mentais superiores – pensamento e vontade. (CACIOPPO e GARDNER, 1999 apud MORRIS e MAISTO, 2004) No passado, a psicologia via as emoções como um “instinto básico”, ou seja, um vestígio da herança evolutiva humana, a qual deveria ser reprimida e ocultada em virtude de seus efeitos. (MORRIS e MAISTO 2004) No presente, os cientistas de um modo geral, vêem as emoções de uma perspectiva mais positiva e elas passaram a ser “consideradas essenciais para a sobrevivência e uma importante fonte para o aperfeiçoamento pessoal.” (NATIONAL ADVISORY MENTAL HEALTH COUNCIL, 1995 apud MORRIS e MAISTO, 2004) No campo da neuroanatomia e neurofisiologia, MacLean (1949/1952 apud GAZZANIGA; IVRI e MANGUN, 2006) ampliou o circuito de Papez (rede de regiões cerebrais incluindo o hipotálamo, tálamo anterior, giro do cíngulo e hipocampo subjacente ao comportamento emocional) estendendo essa rede emocional para incluir a amígdala, o córtex órbito-frontal e porções do núcleo da base, o qual chamou de sistema límbico e identificou-o como “cérebro emocional”. Este conceito no entanto não tem se sustentado com o passar dos anos. (BRODAL, 1982; SWANSON, 1983; LE DOUX, 1991; KOTTER e MEYER, 1992 apud GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006) Muitas estruturas límbicas são conhecidas por participarem na emoção, entretanto tem sido impossível estabelecer um critério que defina quais estruturas e vias devem ser incluídas no sistema límbico. Concomitantemente áreas límbicas clássicas, como o hipocampo, têm se mostrado mais importantes em processos não emocionais como a memória. Dessa maneira sem uma clara compreensão do porquê algumas regiões cerebrais são partes do sistema límbico e outras não, é que o conceito de MacLean provou ser mais descritivo e histórico que funcional na compreensão atual das bases neurais da emoção. (GAZZANIGA, IVRY, MANGUM, 2006) Atualmente há um reconhecimento que a emoção é um comportamento multifacetado que talvez não possa ser capturado por uma definição única e colocado em um único circuito neural ou sistema cerebral. Estudos recentes têm apontado tipos específicos de tarefas emocionais identificando os sistemas neurais subjacentes a comportamentos emocionais específicos. Estudos de neurociência cognitiva da emoção apontam um número de regiões cerebrais com papel em diferentes tarefas emocionais (giro do cíngulo anterior, hipotálamo, núcleos da base, córtex insular, córtex somatossensorial). Porém, a amígdala e o córtex orbitofrontal estão associados como as regiões nas quais as funções primordiais estão relacionadas com o processo da emoção. (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006) O córtex orbitofrontal é a parte do córtex pré-frontal que forma a base do lobo frontal e localiza-se na parede superior da órbita acima dos olhos. Esta região do cérebro está relacionada com as tomadas de decisão sociais e emocionais. (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006) Com o formato de uma amêndoa, a amígdala é uma pequena estrutura localizada no lobo temporal medial, adjacente a porção anterior do hipocampo. A amígdala tem o seu mais importante papel no aprendizado e na memória emocional. Esse papel afeta uma variedade de comportamentos emocionais relacionados a aprendizado implícito, memória explícita, respostas sociais e vigilância. (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006) Pesquisas recentes estão começando a mostrar como essas regiões, amígdala e córtex orbitofrontal, trabalham juntas para produzir respostas emocionais normais. (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006) No campo do comportamento humano, R. Plutchik (1980 apud MORRIS e MAISTO, 2004) propõe a existência de oito tipos de emoções básicas: medo, surpresa, tristeza, repulsa, raiva, antecipação, alegria e aceitação. Para ele, cada uma dessas emoções contribuiria para que nos adaptemos às necessidades e exigências do meio ambiente que nos rodeia, embora de diferentes maneiras. Plutchik (1980 apud MORRIS e MAISTO, 2004) propôs um circulo de emoções de modo a que fosse possível melhor entender suas múltiplas manifestações. Nele podemos observar um círculo central, onde encontramos as emoções básicas e um círculo exterior, onde, a partir de combinações das emoções básicas, encontramos diferentes emoções adjacentes. Círculo das Emoções de Plutchik AMOR ALEGRIA OTIMISMO ACEITAÇÃO ANTECIPAÇÃO SUBMISSÃO MEDO AGRESSIVIDADE REVERÊNCIA RAIVA SURPRESA REPULSA TRISTEZA DESAPONTAMENTO DESPREZO REMORSO Dessa forma, por exemplo, a submissão é uma emoção entre a aceitação e o medo; o remorso uma emoção onde encontramos a repulsa e a tristeza; o amor uma emoção onde estão presentes a aceitação e a alegria e assim por diante. Da mesma forma, a surpresa está mais relacionada ao medo que à raiva, que por sua vez, se assemelha mais a repulsa. Segundo Plutchik (1980 apud MORRIS e MAISTO, 2004) “quando a antecipação e a alegria ocorrem juntas, elas produzem o otimismo; a alegria e a aceitação se fundem para gerar amor; a surpresa e a tristeza geram desapontamento.” (pg.281) Alguns cientistas rejeitam o modelo de Plutchik, afirmando não só que ele é valido apenas para os países de língua inglesa, como também que existem diferenças no modo como cada cultura define emoção, ou mesmo o número de palavras ou expressões que definem emoções que seria impossível uma proposta generalizadora. No entanto, o modelo do estudioso, sem dúvida, oferece muitos elementos de reflexão. Segundo Morris e Maisto (2004) Em razão das diferenças na distinção das emoções pelas culturas, a tendência hoje em dia é distinguir entre emoções primárias e secundárias. As emoções primárias são aquelas compartilhadas pelas pessoas do mundo inteiro, independentemente da cultura. Isso inclui, no mínimo, o medo, a raiva e o prazer, mas pode também incluir a tristeza, a repulsa, a surpresa e outras.(p.282) Ainda para esses autores a maior parte dos pesquisadores usa quatro critérios básicos para identificar as emoções primárias: o primeiro é que a emoção deve ser evidente em todas as culturas; o segundo que a emoção básica deve contribuir para a sobrevivência. O terceiro que a emoção deve estar associada a uma expressão facial distinta e o quarto que essa emoção deve ser evidente em primatas não humanos. Até o momento, não existiria consenso a respeito das emoções básicas, mas o que se admite é que elas pertençam a um grupo pequeno. (MORRIS e MAISTO, 2004). As emoções primárias “emergem cedo no desenvolvimento do indivíduo, são inatas no leque das emoções humanas.” (DOUGHERTY, ABE, & IZARD, 1996; IZARD & BUECHLER, 1980). Elas operam em resposta a outros ativadores não cognitivos, além de serem freqüentemente ativadas pela avaliação ou interpretação cognitiva. Já as emoções secundárias são aquelas encontradas em uma ou mais culturas, mas não em todas. Pode-se considerá-las amalgamações sutis das emoções primárias. Existem muito mais emoções secundárias que primárias, mas também não há consenso sobre quais ou quantas são elas. (MORRIS e MAISTO, 2004, p.282) Cada ação que fazemos é colorida pelo que nela valorizamos, pois cada um de nós tem uma personalidade única com uma maneira de pensar e agir em um mundo social. Segundo GAZZANIGA; IVRY; MANGUN (2006, p.557): Embora usemos palavras como exaltação, alegria e satisfação para descrever como nos sentimos, a maioria das pessoas concorda que cada um desses termos representa uma variação de sentir-se feliz. Desde o trabalho de Darwin sobre as bases evolutivas do comportamento humano, investigadores têm proposto que se defina um conjunto finito e universal de emoções básicas. Darwin abordou esse problema questionando pessoas familiarizadas com várias e diferentes culturas ao redor do mundo a respeito de suas vidas emocionais. Diante do que soube, Darwin determinou que humanos evoluíram de um conjunto finito de estados emocionais, cada um deles único em sua significância adaptativa e expressão fisiológica. Os indicadores fisiológicos (contração muscular, freqüência cardíaca, pressão sanguínea, etc) de emoção também cruzam as fronteiras culturais. Apesar de algumas diferenças, culturas e linguagens, também partilham muitas semelhanças na maneira como categorizam emoções. Assim, a forma como fazemos nossas expressões faciais para demonstrarmos que estamos felizes, tristes, aborrecidos, com medo, surpresos ou furiosos é muito parecida. Há outras formas de se abordar as emoções. Elas podem ser descritas não como estados isolados, mas como reações a eventos no mundo que variam, em um continuum. Dessa forma, “uma abordagem dimensional que tem sido usada propõe que reações emocionais a estímulos e eventos podem ser caracterizadas por dois fatores: valência (agradável/não-agradável e bom/ruim) e estado de alerta (quão intensa é a resposta emocional interna, alta/baixa).” (OSGOOD et al., 1957; RUSSEL, 1979 apud GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006, p.558). 1.2 – Teorias da Emoção Foi W.James, psicólogo americano quem, na década de 1880, criou a primeira teoria moderna sobre emoções. Na mesma época C. Lange chegou às mesmas conclusões. De acordo com a teoria que ficou conhecida como JamesLange, os estímulos do ambiente (por exemplo: ver um grande cão rosnando e correndo em nossa direção) provocam alterações físicas em nossos corpos (batimentos cardíacos acelerados, pupilas dilatadas, respiração mais superficial ou mais profunda, transpiração excessiva,etc), e as emoções se originam dessas mudanças fisiológicas. Assim a emoção do medo seria simplesmente uma consciência quase instantânea e automática das mudanças fisiológicas. (MORRIS e MAISTO, 2004, p.283) Embora algumas pesquisas posteriores tenham vindo a apoiar a teoria James-Lange, as novas teorias sobre o funcionamento do cérebro identificam uma grande falha na primeira. Segundo Chwalisz, Diener e Gallangher (1988 apud Morris e Maito 2004) As informações sensoriais relativas às mudanças corporais seguem até o cérebro por meio da medula espinhal. Se as mudanças corporais fossem a origem das emoções, as pessoas portadoras de severos danos à medula espinhal deveriam sentir emoções menos intensas e em uma freqüência menor, mas não é o que ocorre. Além disso, as mudanças corporais não provocam emoções específicas e podem nem mesmo ser necessárias para a experiência emocional. Indo à busca de uma solução para essa questão, a “teoria de CannonBard afirma que nós processamos mentalmente as emoções e, ao mesmo tempo, respondemos fisicamente, e não o contrário.” (MORRIS E MAITO 2004, p. 284). Dessa forma quando vemos um cão raivoso sentimos medo e nosso coração acelera ao mesmo tempo. Os teóricos cognitivistas contemporâneos, foram um pouco além da teoria de Cannon- Bard. Eles argumentam que nossa experiência emocional depende da percepção que temos de uma determinada situação. Para a teoria cognitiva da emoção, as situações que vivemos nos dá pistas de como devemos interpretar nosso estado de estimulação. Assim Quando vemos o cão, alterações corporais realmente ocorrem; em seguida, utilizamos informações relativas à situação para saber como reagir a tais alterações. Somente quando percebemos que estamos em perigo sentimos tais alterações corporais sob a forma de medo. (MORRIS e MAITO, 2004, p.284). Refletindo sobre isso no campo desse estudo, cabe verificar no que for possível, como os participantes reagiram – expressões faciais, verbais, memórias associadas, etc – diante do animal a eles apresentado, considerando algumas variáveis que certamente interferiram – realização do experimento por colegas de turma, local do experimento – no interior do CAMPUS –, etc. 1.3 – Emoção e Cognição É prolífico o campo de discussão sobre as possíveis influências das emoções sobre o pensamento, cabendo destaque a algumas pesquisas que se direcionaram ao esclarecimento cognição.(ZAJONC,1980; R. LAZARUS, da relação 1984/1991 entre apud emoção GAZZANIGA; e IVRY; MANGUM, 2006). Lazarus (1984/1991 apud GAZZANIGA; IVRY; MANGUM, 2006), admite que a cognição é essencial; muitas emoções importantes derivam de nossas inferências. Para ele o cérebro processa e reage a grandes quantidades de informações sem nossa percepção consciente. Também acaba por reconhecer que algumas reações emocionais não precisam de pensamento consciente. Zajonc (1981 apud Myers, 1999), de outro lado, afirma que algumas reações emocionais simples ocorrem de forma instantânea, não apenas fora da percepção consciente, mas também antes da ocorrência de qualquer processamento cognitivo. Para ele julgamentos afetivos ocorrem antes e independentemente da cognição. Sendo assim, ele argumenta que sentimos algumas emoções antes de pensarmos. Dessa forma sua posição é antagônica à dos teóricos cognitivistas. A emoção, assim como qualquer outro comportamento mental, tem características únicas e definidas. Na medida em que as emoções estão enraizadas no pensamento, pode-se ter a esperança de alterá-las pela mudança do pensamento. Para Mira (1987), a emotividade é resultante de suscetibilidade particular em vivenciar as emoções. As emoções e a afetividade, embora correlatas, não deveriam ser confundidas. Enquanto a afetividade se relaciona aos sentimentos e é uma reação mais íntima e mais psíquica, a emotividade é a capacidade de sentir em profundidade as impressões e, quando percebidas intensamente ocasionam o choque emotivo que se desencadeia em forma brusca e violenta originando uma reação global do sujeito, tanto orgânica como psíquica. (p.87) De todas as emoções que podemos sentir, algumas são mais corriqueiras e poderíamos dizer, socialmente aceitáveis do que outras. Atualmente, podemos conviver e até mesmo aceitar homens que se emocionam até às lágrimas diante da dor e mulheres que manifestam sua raiva quando fortemente frustradas. As concepções de gênero mais antigas têm sido gradualmente superadas e as manifestações emocionais estão, gradativamente, sendo re-interpretadas. No entanto, uma emoção em especial ainda causa desconforto e, quando nos deparamos com ela a vontade é, quando não fugir, disfarçar. Estamos nos referindo ao nojo. Essa reação emocional é de suma importância em nosso estudo tendo em vista o tipo de animal que usamos em nosso experimento. O Escargot (Achatina fulica), por suas características morfofisiológicas é um forte candidato a despertar nos humanos “reações de nojo”. Mas, afinal, o que vem a ser o nojo? 1.4 - Nojo Segundo Darwin (2004), o nojo é uma sensação referente a algo repulsivo, primariamente relacionado à gustação, seja realmente sentido ou vividamente imaginado e, secundariamente, relacionado a qualquer coisa que cause um sentimento similar por meio do sentido do olfato, do tato e mesmo da visão. O desprezo extremo, que se mistura à repugnância, pouco difere do nojo. Decompondo a palavra “disgust” (nojo), temos “gust” com sentido de “gosto, paladar” e o prefixo “dis” com sentido de negação equivalente ao nosso “des", significando, portanto, em sua acepção mais simples, algo desagradável ao paladar. O nosso “desgosto” remete à ausência de prazer, ou seja, temos desgosto em situações de desprazer. O nojo é facilmente despertado por qualquer alteração na aparência, odor ou natureza da nossa comida. Em seu livro “A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais”, Charles Darwin diz: Na Terra do Fogo, um nativo tocou com o dedo uma carne fria de conserva que eu comia em nosso acampamento, e claramente demonstrou um enorme nojo pela sua consistência mole; enquanto eu senti um profundo nojo em ver minha comida ser tocada por um nativo nu, apesar de suas mãos não aparentarem sujas. Restos de sopa na barba de um homem provocam nojo, ainda que não haja, é claro, nada de nojento na sopa propriamente dita. Acredito que isso se deve à forte associação que fazemos em nossas mentes entre visão da comida, qualquer que seja a circunstância, e a idéia de comê-la. (2004, p.241) A sensação de nojo é despertada primariamente em conexão ao ato de comer ou saborear, sendo portanto, sua manifestação principalmente por movimentos ao redor da boca. O nojo causa também mal-estar, geralmente acompanhando-se de um franzir do semblante, e muitas vezes por gestos como empurrar ou proteger-se do objeto que o provocou. (DARWIN, 2004). Essas idéias de Darwin nos remetem aos escritos freudianos sobre a fase oral, período típico de todo o desenvolvimento humano, no qual o mundo é apreendido pela boca. Não seria equivocado supor que nesse aprendizado e reconhecimento do que nos cerca venhamos, fatalmente, a experimentar – quando nossas mães permitem, é claro! – gostos mais ou menos (des)agradáveis. Segundo Zimerman (1999) a boca, durante a fase oral, não é o único órgão importante, mas ela se constitui num modelo de incorporação e de expulsão, ou seja, um protótipo de funcionamento arcaico que faz a intermediação entre o mundo interno – da criança – e o mundo externo e assim É útil destacar que, pelo fato de o bebê não ter condições de distinguir a origem dos diferentes estímulos, ele também não conseguirá diferenciar o conteúdo dos mesmos, resultando daí que tudo aquilo que vier a tocar tem o mesmo significado que o alimento, logo, da mesma forma, ele também quer incorporar. (p.92) O nojo moderado é demonstrado de diversas maneiras; abrindo-se a boca, como que para cair um pedaço desagradável de comida; cuspindo; soprando com os lábios protraídos; ou pelo som de se limpar a garganta (sons guturais tipo agh!ou ugh!, sendo às vezes acompanhados por arrepio, os braços apertados contra a lateral do tronco, e os ombros levantados como ao ficarmos horrorizados). (DARWIN, 2004) O nojo extremo manifesta-se com movimentos ao redor da boca, idênticos àqueles que preparam o ato de vomitar. A boca abre-se totalmente, com o lábio superior fortemente retraído, enrugando as laterais do nariz, e com o lábio inferior protraído e evertido tanto quanto possível. Cuspir parece ser um sinal quase universal de desprezo ou nojo; cuspir representa a rejeição a alguma coisa agressiva para a boca. (Darwin, 2004) Darwin (2004) nos diz ainda que escárnio, desdém, desprezo e nojo são manifestados de muitas e diferentes maneiras por movimentos faciais e gestuais, sendo idênticos ao redor do mundo. Esses sentimentos evidenciam a rejeição ou expulsão de algum objeto real de que não gostamos ou que nos repugna e, que pela força do hábito e da associação, são desencadeadas ações similares toda vez que alguma sensação análoga surge em nossas mentes. Quando sentimos nojo, uma região central de nosso cérebro, chamada ínsula fica especialmente ativada, é este ponto que identifica situações repulsivas e permite reconhecer o nojo que outra pessoa manifesta. Curiosamente nas crianças pequenas (entre três e cinco anos), a repulsa já existe, mas não tem ainda motivo definido. Nesta fase a criança não tem idéia de contaminação por exemplo. O nojo é uma emoção ligada à civilização, ao desejo de se manter distante de qualquer situação ofensiva aos olhos da sociedade. (VARELLA, 2006) Segundo Miller (1997), o nojo é um universo rico em significados que engloba principalmente o corpo e seus orifícios, e também a ordem política, social, moral e cultural. Diz também que o nojo deve necessariamente repelir, senão não é nojo. O nojo é uma emoção e portanto, se relaciona a paradigmas sociais e culturais; nojo é um sentimento sobre alguma coisa e uma resposta a alguma coisa, não sendo assim um sentimento isolado. Miller (1997) diz também, que o nojo vai para além da rejeição da comida e aspectos do paladar. O nojo envolve os cinco sentidos, sendo a audição o sentido que menos desperta o nojo, já o paladar resulta numa forte correlação entre comida e nojo, na medida em que pureza e impureza, pureza e perigo, remetam ao que entra pela boca. A boca vista como um orifício, que como tal é altamente contaminante e contaminado, no sentido físico e simbólico. Para o autor, emoções são sentimentos que se conectam a idéias e, geralmente, resultam em ações. A consciência de estar “enojado” parte de se sentir enojado. O nojo nos força a olhar, por mais que não queiramos. Ao tocar algo viscoso, úmido, pegajoso, esponjoso ou escorregadio, imediatamente sentimos aversão. Os odores nauseabundos parecem ser capazes de contaminar, são ameaçadores. William Miller (1997) refere que sentir nojo é humano e “humanizante”, por ser uma experiência sensorial que mexe com todos os nossos sentidos, tomando-nos de assalto. Miller em seu livro “The Anatomy of Disgust” (1997), classifica o nojo em dois tipos: - O freudiano, no qual o nojo age como uma barreira a impedir a realização dos desejos inconscientes unindo-se ao moralismo e à vergonha para frear o instinto sexual. Assim o nojo nos impediria de chegar muito perto, ainda que tenhamos vontade. O outro se relaciona ao nojo por excesso, é aquele que aparece após agirmos ou pensarmos em agir (comer, beber ou ter relações sexuais em excesso). O excesso aqui funciona como um castigo pelos nossos atos, não como uma barreira. O autor relaciona os atos com a moral, dizendo que o nojo torna matar, roubar, violentar, caluniar, trair, etc atitudes ainda mais reprováveis. Para Miller o nojo habita cada um de nós, reconhecendo que nossa pureza está constantemente ameaçada nos colocando dessa forma em contato com nossa vulnerabilidade. Fenichel (1981) afirma que o precursor do nojo é uma síndrome arcaica de defesa fisiológica que se produz, de forma automática, a partir do momento em que algo repulsivo chega até a boca. O primeiro “juízo” negativo que o ego arcaico do bebê realiza seria isso não é comestível! E como conseqüência ele cospe. O ego, reforçado aprende a usar esse reflexo para o que necessita e transforma-o em defesa; “primeiro, em expressão de negação em geral; depois em defesa contra certos impulsos sexuais, particularmente orais e anais”. (FENICHEL, 1981, p.128). Como pudemos verificar a partir dos diferentes autores, muitas são as representações acerca do nojo e, muito embora muitas de nossas reações possam ter sido aprendidas a partir de nossos contatos com outras pessoas com as quais aprendemos o que deveria ser julgado como “aceitável” ou “nojento”, devemos admitir que na base de toda reação de nojo existe um desejo de aproximação cujas raízes remontam a fase oral e seus mecanismos incorporativos. Despertados pelas emoções e pelos antagonismos de nossas reações de nojo podem despertar em nós, mesmo que não saibamos a princípio, o próximo capítulo visa apresentar alguns aspectos sobre a simbologia animal. CAPÍTULO 2 - SIMBOLOGIA DOS ANIMAIS 2.1. O animal na vida do homem O homem vem utilizando animais para melhorar sua vida há séculos, tanto na produção (trabalho e alimento) quanto para a proteção e companhia. Mais recentemente, pesquisas vêm mostrando outros usos/benefícios trazidos pelos animais ao homem, como a TAA – Terapia Assistida por Animais. Dentre elas destacam-se a eqüoterapia, animais nas escolas, animais em hospitais, animais em asilos, animais em centros de reabilitação social, cães guias, entre outros. (DOTTI, 2005). Nas mais remotas civilizações, há registros históricos antigos que identificam elos de ligação com os animais por meio da representação da afetividade e seus relacionamentos, retratados com muita propriedade por meio de símbolos e desenhos. (DOTTI, 2005; SILVEIRA, 2006) Os animais sempre foram retratados como poderosos, daí a sua grande importância para o homem, o que, de alguma forma, indicava claramente transmutação, proteção, sentimentos básicos humanos e até mesmo evolução espiritual. Sendo assim, seus espíritos eram evocados em diversas cerimônias para trazer saúde e mediar curas. (DOTTI, 2005). A origem do homem e a referência aos seus instintos sempre estiveram vinculadas à natureza animal sendo que esta se encontra inserida no mundo natural por meio da contemplação de algo maior e superior. Dessa forma, os animais representados pelo homem primitivo, eram identificados pelas necessidades básicas, tais como alimentação, vestuário e poder de conquista. (DOTTI, 2005). Em muitas inscrições os animais representavam status de tribos e de grupos, pelos registros da quantidade de animais caçados. Nas vitórias do cotidiano da vida, também eram tidos como seres que conferiam força e poder aos humanos. (DOTTI, 2005). Muitas civilizações ao redor do mundo utilizaram a simbologia dos animais para conceitos e princípios de vida. Para a cultura greco-romana alguns animais eram considerados a representação de Deus, da saúde e da reencarnação. Há registros no século IX a.C., nos quais Hommer escreveu sobre Asklepios, o deus grego da saúde. Asklepios tinha o poder divino que era estendido a cães sagrados. A crença era que uma pessoa cega poderia voltar a enxergar imediatamente depois de ser lambida por um cão sagrado. (BURCH, 2003 APUD DOTTI, 2005, p.35) Desde o Egito antigo até os tempos medievais, os animais ocuparam um papel de suma importância na sociedade e ainda continuam ocupando, embora de forma diferente, com uma manifestação distinta, com propriedades ainda mais definidas e refinadas, como sendo instrumento e catalisador para tratamentos diversos. (DOTTI, 2005). Os egípcios foram os primeiros criadores de animais híbridos. Em todas as suas dinastias, os animais assumiram formas de deuses, pois se misturavam aos humanos e dessa união mágica resultavam seres com formas semi-humanas, que tinham em sua maior parte a caracterização de animais diversos. (DOTTI, 2005). Em sua essência esses animais representavam a sabedoria, proteção e solução para as necessidades humanas. Esses seres eram reconhecidos pela esperança do homem em alcançar a evolução do espírito, e por meio deles ter um exemplo da perfeição e do caminho ideal para se chegar a ela. (DOTTI, 2005). Para Dotti (2005), os animais traçam um paralelo entre um mundo real (mundo dos homens) com um mundo imaginário, pois marcam a mitologia e criam um ambiente esplendoroso de deuses. Através dos tempos, deixam marcas culturais, desde o cristianismo, com a associação dos santos aos animais, até a época medieval, da cultura indígena aos celtas. Em todos os continentes os animais foram adorados e ainda continuam sendo. Ainda segundo esse autor é de suma importância notar que a presença dos animais foi fundamental para situar o homem e suas aspirações em quase todas as culturas, em diferentes épocas e continentes. Ocuparam um papel importantíssimo na vida do homem para atingir o segredo, a magia e a iluminação. Os animais, que freqüentemente intervém nos sonhos e nas artes, formam identificações parciais com o homem, aspectos, imagens de sua natureza complexa. Nas artes eles se destacam na complementação das mensagens inseridas nas obras, revelando um profundo significado. (DOTTI, 2005) Segundo Dotti (2005), desde a infância os animais estão presentes em nossas vidas por meio dos primeiros brinquedos na sua maioria recebidos de pais e parentes. Roupas, utensílios domésticos, quartos, fantasias sempre foram decorados por imagens de animais. Na literatura os animais estão presentes de forma constante, conferindo amor e sabedoria e demonstrando para os humanos os laços de união com esses seres. Os animais têm grande importância na vida dos humanos como elos de ligação entre o mundo exterior e o interior do homem. (DOTTI, 2005) Os animais ocupam atualmente um lugar de fundamental importância nos lares, hospitais, comunidades etc. No Brasil, a psiquiatra Nise da Silveira, foi pioneira na TAA – Terapia Assistida por Animais, na pesquisa das relações afetivas entre pacientes e animais, os quais chamava de co-terapeutas. (DOTTI, 2005) Foi na década de 50 que a Dra. Nise da Silveira utilizou os animais como co-terapeutas no tratamento com esquizofrênicos. Isto ocorreu no Centro Psiquiátrico D. Pedro II – Engenho de dentro, Rio de Janeiro. Segundo ela Há animais que permanecem no hospital em sua função de co-terapeutas e outros que participam de visitas organizadas a hospitais a fim de levar vida e calor a esses frios lugares.(SILVEIRA, 2006, p.114). Segundo Dotti (2005), o homem por ser sociável relaciona-se mentalmente com a natureza e com os animais. Nossa história cultural demonstra que vemos os animais como eternos companheiros de conquistas humanas, seja nas batalhas, na ciência, nos estudos biológicos, na religião e mesmo na formação das crianças por meio de fábulas. Esse inconsciente coletivo demonstra um intenso relacionamento entre nós seres humanos e esses seres e, a cada dia que se passa, a tendência é aumentar e intensificar a freqüência desse relacionamento. É de grande importância lembrar que culturas similares de povos diferentes espalhados nos mais longínquos lugares do mundo, mesmo estando incomunicáveis, demonstravam em suas construções formas, desenhos, pinturas e temas de animais. Para Jung (2000) Silveira (2003), o inconsciente coletivo refere-se às camadas mais profundas do inconsciente e corresponde aos fundamentos estruturais da psique, comuns a todos os seres humanos. Enquanto o inconsciente pessoal constitui-se de experiências individuais, os conteúdos do inconsciente coletivo são impessoais comuns a todos os homens e transmitemse por hereditariedade. A esses conteúdos Jung denominou arquétipos. Os arquétipos são possibilidades herdadas para representar imagens similares, formas instintivas de imaginar, matrizes arcaicas onde configurações análogas ou semelhantes tomam forma. O arquétipo funciona como um nódulo de energia psíquica concentrada que ao assumir uma forma produz a imagem arquetípica diferente do arquétipo que é somente uma virtualidade. (JUNG, 2000; SILVEIRA, 2003) Darwin em seu livro “A Origem das Espécies” (1859), diz que a semelhança entre embriões vertebrados em suas fases iniciais de desenvolvimento é uma das melhores evidências de sua teoria evolutiva, pois observou que os embriões de mamíferos, pássaros, peixes e répteis são inicialmente semelhantes, porém quando totalmente desenvolvidos são bastante diferentes. Com isso Darwin acreditou que o desenvolvimento embrionário mostrava as etapas da evolução ocorrida na espécie da qual pertencia o embrião, chamando isso de recapitulação. Então o que Darwin (2002) propõe para a formação do corpo pode ser análogo ao que Jung (2000) propõe para o funcionamento do inconsciente coletivo, arquétipos e imagens arquetípicas, ou seja, que cada ser vivo revive seu passado evolucionário durante seu desenvolvimento físico e psíquico e, talvez consista aí o estreito vínculo que une homens e animais. 2.2. O animal da pesquisa O Achatina fulica é um escargot (caracóis comestíveis), pertencente ao grupo dos moluscos, classe dos gastrópodes e mais especificamente da ordem dos pulmonados, sendo considerada a mais diversificada classe do filo mollusca. É um animal de origem africana, terrestre, hermafrodita, tem cabeça carnosa contendo dois pares de tentáculos retráteis e um par de olhos na extremidade desses tentáculos. A cabeça liga-se diretamente a um pé musculoso e sobre o qual está a concha formada de carbonato de cálcio. Um epitélio mucoso reveste todas as partes carnosas expostas. Produz uma secreção mucosa através da glândula pedal localizada abaixo da boca, locomove-se através de movimentos bastante lentos. (STORER et al, 1991). A princípio podemos perceber que se trata de um animal incapaz de produzir riscos ao ser humano, ao contrário, sua fragilidade é inquestionável. No entanto, recordando o que já foi afirmado com relação às reações emocionais de nojo, o escargot aparece como um animal associado às lembranças mais remotas – por vezes até inconscientes – de repulsa, evitação, enfim, nojo. A escolha desse animal por parte do grupo foi influenciada – e facilitada – pelo contato de uma das pesquisadoras com o animal em seu Curso de Zooterapia. Nada, além do fato de ser exótico e comestível, havia chamado a atenção das pesquisadoras até o momento da escolha desse “participante” no experimento. A seguir fotos do animal da pesquisa: Escargot (Achatina fulica) Figura 1 Figura 2 Figura 1 e 2 – Gentilmente cedidas pela Prof. ª Maria de Fátima Martins – Heliciário Experimental Prof.ª Dra. Lor Cury – USP Pirassununga CAPÍTULO 3 – PROJEÇÃO Do ponto de vista neurofisiológico e psicológico, projeção é o deslocamento e localização no exterior de fatos neurológicos ou psicológicos. Já do ponto de vista psicanalítico, projeção é a situação na qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro (pessoa, animal ou coisa), qualidades, sentimentos, desejos e mesmo objetos que ele ignora ou recusa nele. Neste caso é uma defesa bastante arcaica encontrada basicamente na paranóia, mas também em modos normais de pensamento. O termo projeção é utilizado em um sentido bastante amplo, na neurofisiologia (sentido da matemática geométrica), na psicologia e na psicanálise. (ANZIEU, 1979; LAPLANCHE e PONTALIS, 2004) Em seu livro “Os Métodos Projetivos”, Anzieu (1979), apresenta uma analogia da projeção em psicologia com a física, matemática e ótica. Sendo que na física, como em um lançamento de projétil, os testes projetivos favorecem a descarga de tudo que o sujeito recusa ser, que vivencia em si mesmo como mau, ou como vulnerabilidades. Na matemática, com a organização da geometria projetiva que estabelece correspondência entre um ponto ou conjunto de pontos do espaço com um ponto ou conjunto de pontos de uma reta, da mesma forma os testes projetivos levam o sujeito a produzir em seu protocolo de respostas uma estrutura que corresponde à estrutura de sua personalidade através de características fundamentais desta. Na ótica, um foco emite raios luminosos incidindo sobre uma superfície, ou seja, o teste projetivo é como um raio-X que ao atravessar a personalidade do indivíduo projeta seu núcleo secreto sobre um revelador (material ambíguo), ficando dessa forma iluminado o que estava escondido, manifesto o que estava latente, o interior vêm à tona desvelando o que temos de estável e de instável. Freud inaugura o termo projeção em 1896 para definir o mecanismo da paranóia afirmando que a projeção é a expulsão de um desejo intolerável e sua rejeição para fora da pessoa, ou seja, projeta-se aquilo que não se quer ser. (ANZIEU, 1979; ROUDINESCO e PLON, 1998; LAPLANCHE e PONTALIS, 2004) Segundo Roudinesco e Plon (1998), o termo projeção foi mais tarde retomado por todas as escolas psicanalíticas para designar uma forma de defesa primária, comum à psicose, à neurose e à perversão, pelo qual o sujeito projeta em um outro indivíduo ou objeto, desejos que provêm dele, mas cuja origem ele desconhece, atribuindo-os a uma alteridade que lhe é externa. Laplanche e Pontalis (2004), afirmam que a base das técnicas projetivas é o aparecimento de estruturas ou traços essenciais da personalidade através do comportamento manifesto. As provas estandartizadas, ou seja, os testes projetivos, colocam o sujeito diante de situações pouco estruturadas e de estímulos ambíguos. O que permite, segundo Anzieu apud Laplanche e Pontalis (2004, p.375): [...] ler, segundo regras de decifração próprias do tipo proposto de material e de organização do seu comportamento e das suas emoções. Então, em uma situação de teste projetivo, as associações livres do sujeito devem ser provocadas. Daí a necessidade de se apresentar ao sujeito um material desencadeador de tais associações, sendo este o mais informe e ambíguo.(LAPLANCHE e PONTALIS, 2004) Segundo Zimerman (2005), muitos autores após Freud, como M.Klein, por exemplo, postularam que, desde a condição de recém-nascido, o ego do bebê está afligido por primitivas e fortes angústias que impelem a criança à utilização de mecanismos defensivos de tipo primitivo. Essas formulações têm sido entendidas como um grande avanço no campo da psicanálise pois permitiram uma compreensão mais clara da evolução da personalidade e dos quadros considerados psicopatológicos, especialmente os mais regredidos como os psicóticos. De acordo com Zimerman (2005) existiriam oito tipos de defesas primitivas: Dissociação, Projeção, Introjeção, controle Onipotente, Deslocamento e Condensação. Idealização, Denegrimento, Na projeção os pedaços que foram “dissociados”, e que são sentidos como maus e intoleráveis, são projetados para fora (por exemplo, os sentimentos de ódio que a criança, ou o adulto, não conseguem suportar) A pessoa atribui como sendo da outra pessoa em que projetou seu ódio e, então, sente-se perseguida por ela. (ZIMERMAN, 2005, p.146-7) A identificação projetiva, conceito criado por M.Klein, deve ser entendida como um mecanismo que, desde o início da vida e na sua continuidade, o psiquismo emprega , trata-se de uma defesa que consiste em projetar nas outras pessoas sentimentos que não podem ser contidos dentro de si e isso com tal intensidade que o outro passa a ser caracterizado como uma réplica dele, ou seja, imaginariamente ficam iguais. (ZIMERMAN, 2005) A situação onde uma menina no colo de seu pai em uma visita ao jardim zoológico, ao se defrontar com um leão rugindo na jaula, nega para si mesma que esteja com medo e ordena ao pai: “pai, vamos embora daqui porque você está com medo”, ilustra a ação da identificação projetiva. Para Zimerman (2005) a identificação projetiva, a exemplo de outras defesas pode ter um caráter positivo e saudável, como por exemplo no caso da empatia, onde a pessoa, a partir de suas próprias experiências emocionais, consegue se colocar no lugar do outro. Quando pensamos na projeção ou na identificação projetiva como fenômenos possíveis no âmbito do presente estudo, não podemos deixar de considerar que o conteúdo projetado, em algum momento, foi objeto de incorporação e que, portanto possa estar relacionado com experiências precoces na vida das pessoas. Dessa forma, levantamos a hipótese de que ao entrar em contato com os escargots, os participantes humanos são estimulados a manifestar conteúdos arcaicos de seu desenvolvimento projetivamente, esses conteúdos. e que suas falas podem conter, É importante também apontar que este estudo poderá ser utilizado em diferentes contextos de psicologia clínica e medicina veterinária, tendo em vista o valor e a eficácia do trabalho zooterapeutico, que nesta pesquisa serão demonstrados dentro dos rigores da pesquisa científica. CAPÍTULO 4 – MÉTODO 4.1– Participantes Os participantes do experimento foram treze alunos do curso de psicologia do Centro Universitário de Santo André, com idades acima de dezoito anos, sendo seis do sexo masculino (46.15%) e sete do sexo feminino (53.85%) selecionados ao acaso (conforme gráfico abaixo). Cujos nomes por questões éticas visando preservar a identidade dos mesmos serão ficticiamente chamados de Atena, Minerva, Vênus, Diana, Cori, Ártemis, Ceres, Vulcano, Dionísio, Horus, Zeus, Apolo e Netuno, em alusão aos deuses da mitologia greco-latina e egípcia e também como forma deferência aos participantes pela disponibilidade e generosidade deles durante o experimento. Participaram também do experimento quinze escargots (Achatina fulica), provenientes do Heliciário Experimental Profa. Dra. Lor Cury – Universidade de São Paulo Campus Pirassununga, gentilmente cedidos pela Profa. Dra. Maria de Fátima Martins. DISTRIBUIÇÃO DOS PARTICIPANTES DO EXPERIMENTO PELO SEXO 7 7 6 6 número de participantes 5 4 3 2 1 0 masculino feminino sexo Anexo 1 TERMO DE CONSENTIMENTO Eu,_________________________________________,RG_______________________, dou meu consentimento livre e esclarecido para participar voluntariamente de uma pesquisa desenvolvida por alunas do Centro Universitário de Santo André, do Curso de Psicologia, sob orientação da Profª Dra. Rosalice Lopes. Declaro estar ciente que o objetivo desta atividade é investigar aspectos da Emoção diante de animais. Autorizo a gravação das entrevistas em áudio e vídeo, para tanto estou ciente de que os procedimentos devem seguir as normas do Código de Ética do Psicólogo e que os dados coletados nessa pesquisa, preservarão a identidade do entrevistado, sendo utilizados apenas, para fins científicos. Temos o compromisso de divulgação e publicação dos resultados, preservando o anonimato dos participantes, apenas em revistas especializadas e eventos científicos. Obtive as informações necessárias para a participação na referida atividade e recebi a garantia de que os dados serão mantidos em sigilo. Poderei contatar o Centro Universitário de Santo André – UniA e o responsável pelo estudo, Profª Dra. Rosalice Lopes através do telefone 4435-8899 ou também através das pesquisadoras : Márcia Angelita Martos Georgetti 95135841 e Juliana Tabatschnic 8266-7886. Este documento possui duas vias de igual teor, ficando uma delas sob meu poder. ____________________________ __________________________________ Assinatura do participante Profª Orientadora Dra. Rosalice Lopes ou seu responsável Centro Universitário de Santo André- Unia __________________________________ Márcia Angelita Martos Georgetti _____________________________ Juliana Tabatschnic PERMISSÃO PARA USO CONDICIONADO DE IMAGEM Eu,_________________________________________________,brasileiro(a), aluno (a) do curso de Psicologia, portadora da cédula de identidade RG nº _______________, CPF nº ______________, residente na Rua __________________, nº ____, bairro ________________, _________cidade onde mora__________, pelo presente, AUTORIZA, a título gratuito que Juliana Tabatschnic, brasileira, solteira, portadora da cédula de identidade RG nº 2087755-3, CPF nº 024787049-86, Cel: 8266-7886 e Márcia Angelita Martos Georgetti, brasileira, casada, portadora da cédula de identidade RG nº 20577133-6, CPF nº061699058-83, Cel: 9513-5841, a utilizar seu nome, a sua imagem (pessoal, gravada e filmada) e declarações no trabalho de Conclusão de Curso a ser realizado no Centro Universitário de Santo André – UniA e posteriores pesquisas científicas. O consentimento expresso na presente autorização e permissão para o uso da imagem está em concordância com as disposições da Lei 10.406/2002. Santo André, ___ de ________________ de 2006. __________________________________________ Centro Universitário de Santo André TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO - TCC CURSO DE PSICOLOGIA FORMULARIO PARA SUBMISSÃO DE PROJETO DE PESQUISA ENVOLVENDO SERES HUMANOS E ANIMAIS AO COMITÊ DE ÉTICA I -Título do Projeto: EMOÇÕES HUMANAS NA INTERAÇÃO COM ANIMAIS II - Nome completo do(s) Aluno(s) Pesquisador(es): 1 – MÁRCIA ANGELITA MARTOS GEORGETTI ....................................................................................................RGM 634.801.................. 2- JULIANA TABATSCHNIC............................................... RGM 648.239................. III – Nome completo do Orientador– Pesquisador Responsável: PROFa. DRa. ROSALICE LOPES IV – Classificação da pesquisa: Estudo Documental X Estudo Experimental Estudo Epidemiológico ( Pesquisa-Ação Estudo Observacional Estudo Clínico ) Outro. Qual? ____________________________________________________ X Qualitativa Quantitativa Quali-quantitativa V– Os participantes da pesquisa pertencem a algum dos grupos abaixo: ( ) População indígena ( ) Crianças /Adolescentes menores de 18 anos ( ) Portadores de Transtornos Mentais ( ) Idosos ( ) Presidiários ( X ) Outro? Qual? Estudantes de Psicologia VI – Justificativa Resumida: O ser humano é gregário por natureza. Ele busca contato tendo em vista que a solidão é produtora de angústia e ansiedade. Muitos seres humanos apresentam dificuldades de contato inter-pessoal, sendo que essas dificuldades podem tanto ser de origem relacional – problemas familiares como, por exemplo, resultantes de problemas congênitos e/ou adquiridos ao longo da vida. Nesses casos podemos citar, por exemplo, as deficiências físicas – visuais, motoras, etc, e as advindas de acidentes ou mesmo produzidas pelo envelhecimento. Existem muitos casos em que a pessoa que tem algum tipo de dificuldade não pode contar com a ajuda de um outro ser humano, de modo permanente, para superar suas necessidades. Nesses casos, a solução pode vir pela ajuda de um animal de outra espécie. O Homem vêm utilizando animais para melhorar sua vida há séculos, tanto na produção quanto para proteção e companhia. Mais recentemente, pesquisas vêm mostrando outros usos/benefícios trazidos pelos animais ao Homem, como a T.A.A – Terapia Assistida por Animais. Entre elas destacam-se, a eqüoterapia, animais nas escolas, animais em hospitais, animais em asilos, animais em centros de reabilitação social, cães guias, entre outros. Nessa interação ser humano-animal ocorre melhora nas condições neurológicas, fisiomotoras, ensino-aprendizagem, cardio-vasculares com controle de pressão arterial, diminuição de processos dolorosos e conseqüente diminuição da quantidade de medicamentos utilizados em pessoas com enfermidades graves. Por outro lado, poucas são as pesquisas que apresentam seus resultados sobre as emoções que determinadas espécies de animais, muitos deles considerados exóticos ou incomuns, despertam nos seres humanos. Muitas dessas emoções estão relacionadas ao medo, à ansiedade, à repugnância. Nossa hipótese é que muitas dessas emoções surgem à vista do animal, em virtude de experiências construídas ao longo da vida das pessoas, quer seja por uma experiência concreta e desagradável ou, em outras circunstâncias, o que nos parece mais freqüente, por que aprenderam com alguém que o animal deveria ser “excluído do convívio”, sem que, de fato, tivesse ocorrido qualquer tipo de aproximação. Nessa direção, o presente estudo visa oportunizar o contato com o animal exótico Escargot (Achatina fulica), de modo a avaliarmos as reações humanas advindas dessa aproximação. Esperamos com o estudo, ampliar o conhecimento das emoções humanas junto aos animais. VII – Objetivos: Identificar emoções e reações humanas advindas da interação com o animal escargot (Achatina fulicans); Buscar correlação entre as emoções vividas durante a experiência com possíveis emoções não imediatamente conscientes; Pesquisar como se constrói rejeições à algumas coisas (Produção cultural de imagens repulsivas); Apontar mais uma utilidade do animal ao homem, contribuindo assim para diminuir o aspecto de descartabilidade sofrido pelos animais. VIII – Método (Participantes, Instrumentos, Local, Procedimentos): Participantes Alunos do curso de psicologia do Unia - Centro Universitário de Santo André; Acima de 18 anos; 6 homens e 7 mulheres; 5 escargots (Achatina fulicans) provenientes do Heliciário Experimental Profa. Dra. Lor Cury –Universidade de São Paulo campus Pirassununga; Nota: Os animais em questão serão transportados segundo critérios técnicos e éticos pela pesquisadora Márcia Angelita Martos Georgetti, que é médica veterinária com CRMV 11.197. Procedimentos O experimento será individual, em sala do LEAPSI – Laboratório de Avaliação Psicológica onde o participante humano será colocado em contato visual e/ou físico por opção do sujeito, com os animais por 30 (trinta) minutos; Registrar as reações do participante frente ao animal. Instrumentos Entrevista semi-dirigida: 1. O que você sentiu com essa experiência? 2. Esses sentimentos o remeteram a alguma situação já vivida? Gravador; Filmadora. IX – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido: Modelo do termo de consentimento livre e esclarecido anexo Modelo de permissão do uso da imagem anexo X – Referências: (Citar duas referências básicas ao estudo) Darwin, Charles – A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais – São Paulo: Companhia das Letras, 2000. Dotti, Jerson – Terapia & Animais – São Paulo: PC Editorial, 2005. Beck, Alan; Katcher, Aaron – Between Pets and People: the importance of animal companionship – Indiana: Purdue University Press, 1996. Santo André, _________ de _______________ de 2006 _____. Ao Comitê de Ética do Centro Universitário de Santo André As autoras do presente Projeto de Pesquisa vêm, mui respeitosamente, requerer de Vs. Sas. a análise e parecer necessários a sua consecução, para o que anexam os documentos exigidos. Atenciosamente, Aluno(s) Autor(es): _____________________________________________ Márcia Angelita Martos Georgetti RGM 634.801 _____________________________________________ Juliana Tabatschnic RGM 648.239 “A vida é breve, a ciência é duradoura, a oportunidade é ardilosa, a experimentação é perigosa, o julgamento é difícil.” Hipócrates (Aforisma I 1) 4.2– Instrumentos Nesta pesquisa foram utilizados: 1) Entrevista semi-dirigida com três questões disparadoras: As questões procuraram detectar, de forma o mais espontânea possível, as emoções dos participantes advindas da interação com o animal escargot, além disso buscamos verificar se o contato com esse animal exótico mobilizava vivências anteriores dos participantes. Por fim direcionamos nossa atenção para detectar se a reação de nojo estava presente no contato e se poderia estar associada a alguma característica do animal inclusive ao paladar. Anexo 2 Entrevista semi-dirigida • O que você sentiu com essa experiência? • Esses sentimentos o remeteram a alguma situação já vivida? • Você comeria esse animal? 2) Filmadora O registro visual da interação dos participantes permitiu captar as expressões não verbais da interação com o animal, ou seja, as posturas do corpo e expressões faciais, sendo desta forma um importante objeto no estudo, pois registra momentos vivenciados que facilitarão na interpretação dos dados coletados. 3) Gravador A utilização desse equipamento visava o registro da fala dos participantes e operou como um elemento adicional à filmadora, caso alguns elementos do discurso verbal não pudessem ser captados de forma clara. 4) Acessórios • Mini-fitas cassete • Papel e caneta • papel toalha, luvas de látex e álcool para os participantes • caixa plástica branca com tampa e uma bandeja plástica branca utilizadas para acomodar os escargots • Placa de petri contendo ração balanceada para os animais • Placa de petri contendo água para os animais • Folhas de couve para alimentação dos animais. 4.3– Local Leapsi – Laboratório de Estudos em Avaliação Psicológica do Centro Universitário de Santo André - UNIA – Santo André – S.P. 4.4– Procedimentos As pessoas foram convidadas a participar do experimento através de um convite verbal expresso da seguinte forma: Nosso T.C.C2 será sobre emoções humanas na interação com animais. Faremos um experimento no LEAPSI3 utilizando um animal, que nesse momento não poderei dizer qual é, devido a importância do fator surpresa para avaliação das emoções nesse contato. Você gostaria de participar? 2 3 TCC – Trabalho de Conclusão de Curso LEAPSI – Laboratório de Estudos em Avaliação Psicológica do Centro Universitário de Santo André – UNIA À medida que as respostas eram positivas, agendávamos os horários para a realização do experimento oferecendo três datas pré-estabelecidas em virtude de questões operacionais e de manejo dos animais envolvidos no experimento, visando assegurar o bem estar dos mesmos. As entrevistas ocorreram nos dias 14,15 e 18 de setembro de 2006, nos horários das 14:00h às 18:00h na sala 2 do LEAPSI, sendo que esta tem aproximadamente seis metros quadrados de área. Uma caixa branca plástica com tampa, com dimensões 50cmX40cm, contendo os escargots foi colocada sobre uma mesa de fórmica branca pequena (aproximadamente 100cmX60cm) no canto esquerdo da sala próximo à porta. Foi disponibilizado aos participantes papel toalha, luvas de látex e álcool, além de uma cadeira para que os mesmos, caso quisessem, se sentassem. Havia ainda na sala, duas cadeiras para material de apoio, como mini-fitas cassete, fitas para a filmadora, filmadora, gravador, caneta para identificação do material gravado, lista dos participantes, etc. Uma das pesquisadoras manejou a filmadora permanecendo a uma distância razoável do participante de modo a minimizar uma possível interferência na interação do participante com o animal. A outra pesquisadora ficou um pouco mais próxima do participante controlando o gravador. Ao chegar para a entrevista o participante foi atendido na recepção do LEAPSI, momento em que recebeu, para preenchimento de dados e assinatura, um termo livre-esclarecido e outro termo de permissão de uso da imagem com finalidade científica (modelos anexos), ambos em duas vias, ficando uma via com o sujeito e outra com as pesquisadoras. Os termos foram preenchidos e assinados antes de adentrar a sala 2. Feito isso encaminhamos o participante para a sala destinada ao experimento, quando fizemos a seguinte orientação: Esse experimento tem por objetivo avaliar as emoções humanas, nesse caso, as suas emoções na interação com esse animal que já vamos lhe mostrar. Essa interação poderá ser visual e/ou física a seu critério. Caso você tenha alguma pergunta sobre a biologia do animal pedimos que faça ao final do experimento, pois a intenção agora é que você entre em contato com o animal e relate assim que quiser o que você estiver sentindo. Queremos também que você relate, se nesse contato você lembrar de alguma situação vivida anteriormente. Após essas instruções uma das pesquisadoras destampava a caixa para que a interação ocorresse. A filmagem tinha início pela outra pesquisadora a partir do momento que o participante entrava na sala. Após o relato de suas emoções, o participante era informado que se tratava de um animal comestível e então o participante era questionado quanto ao fato de poder vir a comer esse animal. A entrevista era dada por encerrada quando o participante sinalizava que havia terminado. Por fim solicitávamos ao participante que não comentasse sobre qual animal havia sido utilizado no experimento para não tirar o fator surpresa dos demais participantes. 4.5 – Categorias de Análise De modo a estabelecer uma organização nos dados coletados durante o experimento optamos por organizá-lo em categorias de análise a saber: 1- O primeiro contato visual 2- Seqüência Interacional: Reações verbais e não verbais e disposição ao contato 3- Memórias associadas ao contato 4- É possível ir além e comer o animal? 5- Curiosidades despertadas com o contato CAPÍTULO 5 – APRESENTAÇÃO DOS DADOS DISTRIBUIÇÃO DO TOTAL DAS EMOÇÕES PROVOCADAS PELO EXPERIMENTO COM ESCARGOT 14 12 10 8 13 10 6 10 13 9 8 10 11 8 8 4 3 3 2 5 3 2 4 0 3 5 NÃO 0 SIM 0 A NT CO TO NO JO C ? IA ER OM M LE AN BR ÇA S M LE A BR A NÇ S F. IN A XU SE DA LI DE TR ZA TE IS EG AL A RI M O EI EC /R O ED C D DA SI IO R U ES emoções SIM NÃO 1 – O primeiro contato visual - buscou-se identificar nos participantes qual emoção surgiu no primeiro contato visual com o animal exótico e, portanto, fora do contexto cotidiano dos participantes humanos. Observamos que em sua maioria, os participantes demonstraram uma certa angústia, expressa por inquietação, de nojo e de evitação. Essas expressões eram seguidas de racionalizações sobre o que o contato causava. Netuno: Parece que é friozinho aqui né? Vocês não colocam gelo aqui dentro? Dionísio: É limpo esse animal? Ceres: (Aproxima-se da caixa e olha os animais atentamente com um sorriso indulgente. Olha-os de diferentes ângulos mostrando-se curiosa.) Que tem aqui embaixo hum... (risos), eu conheço esse bichinho! (risos) Ai que turma! Eles ficam parados aqui oh! Que bonitinho! Eu posso até falar já! Pegar o bichinho, tirar daí... Eu não sei o que é isso pra cabeça deles né? De ser manipulado, né? tipo ta lá sossegado né nenenzão?! Uuuu! (...) que bonito né? Horus: É... eu acho que não entendi tudo. Assim, eu tenho que pegar o bicho e,...faze o quê? Zeus: Isso é um caramujo? É escargot de verdade? Ai meu Deus. Hahaha. Vou sentar. Aí, eu nunca estive de frente com um desses. Aí, eu tenho que... Como que eu vou interagir? Com um animalzinho desses? Na verdade, eu já... Já tinha visto assim, mas não de perto. A gente nem presta muita atenção. Que monte! E ai? O que que eu posso fazer? Apolo: Pegar? (Ficou um longo tempo observando os animais sem tocá-los, porém bem próximo da caixa e com as mãos apoiadas do lado externo da mesma, numa postura contemplativa) Cori: Que bonito! Ficou observando os animais em pé bem junto à caixa e, eventualmente mexendo neles. Vulcano: Nossa! É esses daqui que come?...Daqui uns vinte minutos do jeito que ele vai... Esse troço é nojento! Isso é estranho, comer isso aqui. Ártemis: Haiii, Márcia, falei pra você. (ficou em silêncio olhando para o interior da caixa contendo os animais, as mãos sendo esfregadas no quadril pelas laterais, queixo alongado em semi relaxamento) Que bonitinho, né?! Muito meigos eles, bonitinhos. Quantos! São bonitinhos, só que eu vou ter que pegar neles? Vou ter que pôr eles na mão? Vênus: Aahh, isss! (tirou os olhos dos animais baixando a cabeça, com a mão na testa, então com a cabeça ainda baixada olhou em direção aos animais, num soslaio, em seguida aproximou-se da caixa contendo os animais sentou-se na cadeira próxima a eles porém, mantendo o corpo retesado para trás, pôs a mão na boca, em concha. Sempre mantendo contato visual como que para saciar a curiosidade em olhar aquele animal estranho) Em seguida porém, disse: Tô com nojo. Muito Nojo! Diana: (Ficou olhando, inclinou-se na direção da caixa que continha os animais mantendo uma certa distância, depois de um tempo foi ficando com a pele do rosto vermelha e com um sorriso nervoso perguntou): Éhh, eu pre, preciso pegar ou não? Atena: (No momento em que viu os animais, imediatamente fez um bico e foi se afastando dos animais, mantendo o bico virou o rosto lentamente em direção às pesquisadoras e sorrindo perguntou Preciso chegar perto? Minerva: Ai. É pra ir até lá? Então se aproximando dos animais disse: É, na verdade não é um animal, eu particularmente não pego na mão. Por mais que eu esteja ciente que ele seja limpo. É de biotério. Mas isso não é aquele escargot que o pessoal come, é?! 2 – Seqüência interacional: reações verbais e não verbais e disposição ao toque - buscou-se verificar, após o primeiro contato, como os participantes deram continuidade à interação com o animal e quais emoções ficaram evidenciadas e quais deles se dispuseram a tocar o animal. A maioria dos participantes demonstrou nojo em consonância com a expressão física e verbal dessa emoção. Alguns se arriscaram a um contato mais próximo mas todos, ao longo de suas falas evidenciam seus sentimentos e é possível perceber como fatos de suas vidas ou formas particulares de estabelecer relação com “um outro” vão sendo manifestadas. No entanto, ficou evidente que todos tentaram manter o controle sobre possíveis experiências de insegurança, indignação, raiva, frustração, curiosidade, racionalização, evitação, fuga por regressão e medo de rejeição. Netuno: (Pegou o animal e colocou-o sobre o dorso da mão, tendo contato com a parte mole) Eu posso manuseá-los? É...é...é...não há dificuldade deles saírem da pele, nada? Bom o primeiro sentimento que eu tive foi de algum foi de algum receio, uma espécie de medo..é o novo!... por causa de um certo medo, mas eu senti o desejo de aproximar-me deles, e ainda (.....) ....então colocando alguns desses seres em contato com a minha pele, agente percebe que ele se recolhe.... é....que há uma certa esquiva... ele.....de alguma maneira eu me senti assim também em contato com esses seres no primeiro momento vou ou não vou! de alguma maneira parece que esses serzinhos aqui representavam a mim... ... eles foram se sentindo mais à vontade... ... foram se....saindo do seu espaço se mostrando como são... ...pra....relacionar-se com esses seres, esse sujeitos faz agente mudar um pouco da...da nossa maneira de....de se sentir, há alteração na...nos nossos sentidos... ...que inicialmente era um sentimento assim de...certa precaução de distanciamento a partir de...quando agente se aproxima agente interage é....tem sido essa sensação de que não tem porque ter receio, ter temor que a experiência pode ser boa, agradável, esse é um sentimento gostoso nesse momento, agradável a ambos. (O participante verbalizava todo o tempo para certificar-se de que o animal não lhe ofereceria qualquer risco ao entrar em contato físico com ele, apresentava um sorriso constante e uma certa agitação, entretanto após ter suas perguntas respondidas pegou o animal sem qualquer cerimônia e colocou-o sobre sua mão esquerda e com a mão direita ficou manipulando outros animais, testando a “resistência” ao puxá-los da superfície da tampa. Ficou por longo tempo em silêncio nessa contemplação.) Dionísio: (Aproximou-se da caixa contendo os animais ficando com as mãos para traz e esfregando os dedos na palma da mesma mão, a expressão facial era de nojo intenso e ansiedade. Pegou o animal e colocou-o sobre a palma da mão, tendo contato com sua parte mole) É comestível? Come isso aqui? Não no Brasil?! No Brasil come isso aqui? Qual classe social come isso aqui? Fico curioso pra pega, mas... ...Pronto? ...Morde? ...não morde? ... Ai que susto! (risos) ... Fez um barulheiro. Já deu pra passar alguma coisa né? ... Mas no começo dava a sensação de nojo mesmo né? ... A gente vai perdendo o medo né? ... Com nojo entendeu? ... Depois eu vi que é... uma espécie bem dócil viu? Bem... sabe... dá até pra cultivar em casa. [...] De, de nojo mesmo né? ... Uma coisa bem dócil né? Uma coisa bem, bem sensível ou delicada né? São esses dois, né? Que eu me expressei mais, né? Medo! Eu só tive medo só de, de, de, pegar e puxar, então medo de alguma maneira de, de machucar ele entendeu? De... soltar do casco é... arrebentar ele entendeu? Mas eles têm uma boa elasticidade né? Agente fica meio retraído [...]Você grudou de propósito né? Isso no começo é... soltinho é... mas quando eles se juntam... mais quando vier uma quantidade coletiva ai... da mais nojo ainda. Expressar isso...por que eles ficam ali parado! Parecem morto! Eles estão morto ali, tão...não? Ta tudo vivo? (Dionísio reluta, tira a mão esquerda que estava atrás em suas costas e leva em direção aos animais, esfrega os dedos na palma da mesma mão como se estivesse com aflição, permanece com a mão direita nas costas. Finalmente pega um dos animais que estava na tampa da caixa, olha-o por baixo (ventralmente) em seguida coloca o animal dentro da caixa. Durante a manipulação a expressão de nojo se intensifica em sua face.) Ceres: (Não pegou o animal na mão. Somente toca em sua concha) [...]Eu não me sinto à vontade pra pegá-los por que é mais a questão assim de não querer interferir na, no “estar” deles, assim só pegar pra que? Só pra sentir, já já... não sei, eu não tenho essa, essa necessidade de, de ter esse contato com eles não é por nojo, não é por nada, é que... é mais por eles mesmo! Se tá assim de repente alguém te arranca assim, te pega, pra sentir você, né? Tem variedade de espécie? Essa coisa de mexer neles é mais, eu não gosto muito dessa relação assim que agente acaba manipulando os animais com uma espécie de, sentindo mesmo... “há! Eu pego! Eu... né” Eu não sei, eu... é claro que se fosse um gatinho nossa! Já tava trepado aqui (risos) mas por que é outro tipo de interação né? ... Animal que se move lentamente....Deixa eu... mas não vou por a mão pode assustar, eu não sei como eles sentem né?... ... eu não vou por a mão a parte molinha deles... ... , por que eu não tenho conhecimento, se eu tivesse lido alguma coisa sobre isso (risos) as sensações de scargot, mas...como eles... né? Expressam de um jeito muito diferente, eu não tenho contato, então eu não quero manipulá-los, mas eu gosto muito, gostei muito acho muito “fofos”, e acho que alguns deles ficam me ouvindo aqui, por que eles tiram a “antenona” pra fora. (Ceres fica com o corpo encurvado para frente para poder enxergar os animaizinhos mais de perto e emitindo sons de júbilo como quem fala com um bebê, então toca nos animais fazendo carinho com o dedo indicador da mão esquerda enquanto a mão direita permanece entre suas pernas.) Horus: (Se aproxima da caixa e olhando para as pesquisadoras começa a gesticular com as mãos e a questionar. Pegou o animal apenas pela concha. Não o colocou na mão) [...] É... eu acho que não entendi tudo. Assim, eu tenho que pegar o bicho e fazer o quê? E se eu quiser perguntar alguma coisa? Ah, no final? Vou mexer nele aqui, ver se me... se eu falo alguma coisa vendo ele. Vocês tamparam aqui porque os mosquitos ficam pousando neles? E ele vem aqui grudado? Ah, pra mim não... você quer que eu fale alguma coisa sobre... ? O que me vem na cabeça... alguma coisa assim? O que que me desperta?” (Em seguida toca nos animais e permanece assim por longo tempo)... “Toda vez que eu vejo um animal, principalmente assim, é... eu tenho uma me vem uma coisa, assim, de que eu não devo... não devo mexer com ele [...] o animal não quer ser incomodado. Um bicho... tudo bem, ele não, sei lá... ele transmite uma coisa meio... de ser meio... sei lá... gosmento, assim. [...] É um bichinho curioso sim. Eu gosto bastante... eu gosto de animais... Eu sou curioso com relação à vida do animal, assim. A forma como eles se relacionam... Ele chega a sair totalmente desse... desse casco ou ele tem... ele é preso? Uma parte dele é presa? Uma parte dele é presa, né? E ela só vai crescendo? Mas nunca se destaca dele? Legal. Eu sou meio fascinado, assim, pela natureza. Por incrível que pareça essa concha dele tem uma relação matemática precisa. Vocês tinham ouvido falar nisso? É o número de igualdade. É uma progressão geométrica que vai, que vai... que ela explica esse aumento... na natureza tem muita coisa disso. Apesar de parecer uma coisa meio aleatória, meio caótica... mas interessante. [...]A sucção dele... qual que é a defesa desse bicho? Fora a casca? Legal! Nunca tinha tido um contato, assim, diretamente. Mais alguma coisa? Preciso falar mais? Fazer mais? Por mim não. Sei lá. Não tenho muito mais o que dizer ou fazer. Sei lá! Zeus: (Pegou o animal e o colocou no dorso da mão, não tendo coragem de colocá-lo na palma) [...]Ai meu Deus. Hahaha! Vou sentar. Ai eu nunca estive de frente com um desses. Ai eu tenho que... Como que eu vou interagir? Com um animalzinho desses? Na verdade, eu já... já tinha visto assim, mas não de perto. A gente nem presta muita atenção. Que monte! E aí? O que que eu posso fazer? Não, não. Eu prefiro não pegar, porque senão pode machucar. Não, não a mim, mas sei lá. Parece tão sensível. Meu Deus. Não, mas ele... Ah, não sei. Não é melado? Tem muco, né? Eu não quero. Tem outro comendo aqui. Eu to em dúvida. Eu acho que eu vou pegar, eu acho. Como que pega? Pela casca dele?...Não, não, eu prefiro não pegar, porque pode machucar (o bicho). Ai, e agora? Esse fechou todo em baixo! Ele vai ficar deitado se eu pôr ele assim. Parece que estão dormindo aqui. Dormiu. Não, não. Aqui, esse aqui. Psiu, psiu, psiu... psiu, psiu, psiu...está um debaixo do outro. ...Sai da mão depois essa gosma? Ele não é oleoso não, né? E se ele colar depois ele desgruda? Da mão ele desgruda fácil? Ele vai ficar gosmando na minha mão? Ai! Não tenho coragem, não... não tenho coragem de pôr na mão. Eu queria, tenho vontade, mas eu tenho medo. Medo não, né? Nojo! É gelado? Tem que pôr? ...Mas eu quero pôr. Pôr...ai...eeeee... agora ta bom. Eu não vou deixar ele se abrir em mim não. Eu tenho acho que nojo de ele se abrir e grudar assim, como se fosse uma chupetinha, sabe? Ele desgruda fácil da mão, né? Qualquer coisa vocês tiram, ta? Ele não chupa não. Né? Ai, ele não vai me chupar não, vai? Eu não acredito que eu estou com um negócio desse na minha mão. Ai! Ele está colocando a boca em mim! Ele não vai me chupar não, né Márcia? ...Ai, meu Deus! Ele está colocando a boca em mim! Ele está colocando...ai, ele está colocando a boca em mim! Colocando a boca em mim? O que que ele está fazendo? Ah, não. Pelo amor de Deus... Meu Deus, eu acho que ele está me chupando, Márcia. Você me falou que ele não chupava. Márcia, eu acho que ele ta me chupando sim! Olha, ele está se escorregando! Ta escorregando a boca inteirinha em mim. Ah não, agora eu vou tirar. Psiu. Levanta a cabeça... levanta a cabeça! Levanta a cabeça! Ai, todos eles ficam com a boca assim? Ai, meu Deus... gelado. Eu acho que ele está me chupando! Meu Deus! Ai, mas ele não vai querer sair daqui, não. Ai, mas... como que eu tiro? Só dá medo que ele chupa. Mas a gosma dele não é nojenta, não. Parece que... água com sabão. Não vai machucar, né? Porque dá impressão que vai puxar essa casca aqui e vai... Ele vai tentar se prender e vai machucar ele. Ele não quer se encolher mais. Será que ele se acostumou? Ao toque, pra se encolher? Ai, ele ta muito grande na minha mão. Ele não estava desse tamanho. Ai... Agora, esses grandes ali não dá coragem não. O que que é isso aqui? É cocô? Ou é? É cocô deles? Nossa! Quer que eu pegue um grande agora? Psiu, psiu. Uh... [...]Ai, esse aqui eu não tenho coragem não. Ele é muito grande pra pôr na minha mão. Não dá medo. Dá aflição de ficar grudado. Escargot. Ai, que chique, escargot. Não faz nada mesmo, né gente? Gente, eu não acredito que to com um negócio desses na minha mão. Ai não é nojento não, né? É que eu não conhecia, eu acho. Depois que pega... Dá até pra pegar dois agora, né?. Psiu, psiu psiu... psiu, psiu, psiu... Vai, vai, pra dentro... psiu, psiu, psiu... Meu Deus! Não machucou não, né? Não machucou, tem certeza? Ah, meu Deus, tadinho! Que susto. Já pensou se ele cai mesmo? Ia machucar! Deixa eu pôr ele aqui. Pronto. Já está ótimo. Olha, ele está procurando agora... Ta me olhando de novo... pronto, pronto... passou, passou o susto. Então, de começo foi apavorante, né? Porque logo... lesma, assim... eu nunca tinha... tinha estória já, né? Que a gente achava que... mas depois que a gente entra em contato, vai passado. Pelo menos comigo... foi passando e perdi. Acho que agora se fosse pra pegar qualquer um outro, eu pegaria. Normal. Não tenho mais receio algum. Não tenho... ah, não faz nada. Só assim... ele deu uma chupada... uma sensação que ele vai chupar, assim, a pele... a minha pele. Mas coloquei até na mão. Imagina. Eu pensei que nem ia conseguir. Eu não vou pegar esse aqui não, que esse aqui eu tenho nojo. Mas eu coloquei na mão. Imagina que eu ia conseguir colocar na mão. Nunca! (Participante ao ver os animais mudou de lado na sala, estava com os braços cruzados, em seguida esfregou a mão esquerda no ombro direito, demonstrando aflição, enquanto fazia as perguntas foi mudando de lugar, ouve uma mudança no tom de voz assumindo um tom mais agudo e sua gesticulação era, prevalentemente, de tipo caracterizado como feminino a qual permaneceu até o final do experimento. As mãos ficaram por longo tempo entre as pernas e, quando começou a manipular os animais, após titubear bastante, o fez com a mão direita, mantendo a esquerda bem firme entre as pernas.) Apolo: (Aproximou-se da caixa colocando as duas mãos nas bordas, olhando para baixo em direção aos animais após um tempo observando os animais começou a tamborilar a borda da caixa com a mão esquerda, encurvou-se um pouco mais em direção aos animais, em seguida retornou a postura anterior, demonstrando uma certa impaciência/desconforto. Pegou o animal apenas pela concha. Não o colocou na mão) [...] Não tenho nojo. Não tenho nojo, não tenho asco, não tenho dificuldade de interação com ele. [...]Ele já é todo câmera lenta e tal... pra ver se fica mais a sensação de... de que ele precisa de proteção do que... Não precisa fugir dele. Ele é devagar. Eu acho que são bichinhos muito frágeis. Dá mais a sensação de querer empurrá-los porque ele anda muito devagar do que deixar assim. Largar. Eles são mais, assim, passiveis de proteção do que de agressão. Essa... essa associação que eu faço [...] Ele não vai pegar a gente. Não é ofensivo. Não tem garras, não tem chifres, aquelas armas de predador... e demonstra mais fragilidade. Estão bem arrumadinhos aqui, bem quentinhos. Acho que é isso aí. Precisava conhecê-los melhor. [...] eu vejo mais como um amiguinho do que como um... um brinquedo do que como um prato de comida. (No transcorrer da narrativa os movimentos da mão direita foram aumentando, eventualmente movimentava também a esquerda como que para reforçar a explicação. O contato físico com o animal ocorreu somente muito tempo depois do início do experimento.) Cori: (Ficou em pé, levemente inclinada em direção aos animais, corpo bem próximo à caixa, com a mão esquerda na cintura e a direita apoiada na borda da caixa.) Eu nunca tinha visto assim, de perto. (Em seguida toca nos animais que estão dentro da caixa. Pegou vários animais somente pela concha) [...] Bom, igualzinho, assim, eu nunca tinha visto mesmo. Como que chama? Escargot. É bonito pra ver, mas pra comer não. Uma judiação. Bem bonito. É, eu gostei de ver assim de perto. Você me falou algo assim que... eu tivesse alguma lembrança... algum outro animal também? Eu achei bonito. Da impressão que se eu for pegar esses que estão pra fora, que vai... desgrudar daqui, entendeu? É, mas eles estão grudados aqui, né? Daí se eu pegar parece que dá impressão que ele vai... vai pressionar aqui em baixo. Dá impressão que vai machucar. A impressão é que ele está grudado. É melhor não pegar não. Nossa, parece que ele gruda mesmo, né? Dá receio em puxar. Eu gosto de qualquer tipo de animalzinho. Eu gosto mesmo. Tem pessoas que têm preferência por cachorro de raça, pedigree... Eu gosto de... de qualquer um! eu nunca tinha visto de perto. Nunca tinha pegado como eu peguei. Acho até que invadi um pouco, né? Porque ele está ali quietinho e vem alguém e pega o... mas eu achei interessante. Gostei. Muito legal. Não fiquei chocada de ter visto. Porque eu imaginava até um bichinho de pêlo, sabe? ... Eu não gostaria de ser assim (como o escargot) Vulcano: (Aproximou-se dos animais, debruçou-se totalmente sobre a caixa contendo os animais, apoiando a mão esquerda na parede à sua frente e com a mão direita começou imediatamente a manipulá-los, no entanto só os pegou pela concha não colocando sobre a mão) [...] É esse daqui que come? (Mudou de posição ficando agora de frente para a mesa contendo os animais, continuou ora manipulando, ora observando os bichos. Então sentou-se na cadeira, ainda manipulando-os. Virou a tampa da caixa, onde havia um animal como se quisesse vê-lo melhor. Em seguida parou de mexer neles e, ficou somente observando em silêncio. Com uma expressão de nojo e ao mesmo tempo resignação disse) Eles são muito nojento! (Então volta a tocar nos animais dizendo) Acho muito estranho comer isso aqui, esse tipo de bicho assim. Achava que ia sê um rato ou outro bicho...Estranho (puxou a bandeja para perto de si). Quando olhei a caixa assim, eu falei, pensei, né? Que ia ser outro tipo de bicho, assim, né? Pronto! Mais alguma coisa? Acho que ta bom! (pegou um papel toalha e começou a limpar as mãos) Tô com nojo! Tô com nojo! Esses tão grudado. (começou a tirar alguns escargots da tampa e em seguida fechou a caixa) Chega! Ah, “mor” estranho! Dá um sensação estranha mexer com um bicho desses. Não tinha pego na mão. Eu gosto muito de animal. [...]Até bicho tem um lado afetivo assim... Não que nem nós. Não sei se um bicho tem afetividade ou não, mas muito interessante [...] o cachorro, que é o bicho que eu gosto mais se pode dar o maior esporro no cachorro ele ta do seu lado... animal é, é instinto... ... A gente que põe é, é... nossa cultura nele, é pet shop, num sei quê, cachorro passa com psicólogo (rsrsrs) acho tão, estranho, gozado. To dizendo assim, talvez animal não tem assim é, ... uma afetividade, acho que talvez nossa, minha maneira de entende é que assim, no fundo o que se tem com o animal é afetivo, querendo ou não, que acho que afetividade, não é só pá, assim pra cruza a porta do sentimento humano, de carinho, atenção, afetividade também pode sê um sentimento pra destruí algo, pra sei lá, detona com alguma coisa, né? Acho que é isso... mas ó, eu não esperava que tinha uma penca de caramujo aqui (risos). Achei nojento assim. Achei que ia ter um hamister aqui. (Após Vulcano fechar a caixa no início do experimento, ele cruzou as pernas, continuou seu relato e não mais abriu a caixa até o final.) Ártemis: (Se aproximou da caixa olhando para o animais, inicalmente em tocálos. Depois pega um dos animais e coloca-o na palma da mão) [...] Muito meigos eles. Bonitinhos! Quantos? São bonitinhos, só que eu vou ter que pegar neles. Vou ter que pôr eles na mão? Uhum. Vou pegar, eu acho. Eles são bonitos, lindos. Mas eu acho que eu tenho um pouquinho de nojo, assim, sei lá. Ai, ele é grudento. Ele não solta. Olha, as anteninhas aumentam. Por que que ele ta assim? Ta com medo? Acho que eu vou pegar um menorzinho pra eu tentar pôr na mão. Gelado.Dá uma sensação, assim, fresquinha na mão, meio gosmenta. Acho que eu prefiro pegar um maior. Peraí. Eu gostei de pegar nele. Ai! Nossa, olha aqui, tadinho. Ele deve ter ficado morrendo de medo. Deve estar um pouquinho assustado também, que eu derrubei ele. Haha. Mas é bonitinho. Quando ele se sentir mais à vontade ele vai abrir e vai ficar igual ao que ele tava na caixa, na minha mão? Vai? Quem sabe eu não consigo transmitir pra ele que eu não to mais com nojo dele e com medo? Ai, agora eu to sentindo ele mexer. Esse aqui é mais nojentinho. Esses que eu coloquei aqui eles já se abriram. Se sentiram mais seguros no plástico. Do que na minha mão. Não comeria. São bonitinhos também, como eu já disse. Bem exóticos, lindos. Mas não comeria. Eu achei meio assim, que eu não ia pegar, mas peguei e eu acho que é uma coisa bem... parece lesma. Bem maravilhoso, super exótico, afrodisíaco. Digamos, né? Hahaha. É um negócio diferente. É muito lindo. Mas não... Olha que lindo ver ele se movimentar. Bem lento. Mais escorregando, né? Mas eu acho bonitinhos eles ali, né? Acho que do jeitinho que eles estão ta na natureza. Não faria nada com eles não. Deixaria eles quietinhos. Só isso. nunca imaginei pegar um negocio desse. Nunca. Sou meio nojenta pra essas coisas. Não, não foi ruim. No começo eu tava com um pouquinho de... acho que de aversão de colocar na mão e sentir aquele negócio. Né, mas peguei um menor primeiro [...] do menor pro maior. A hora que eu peguei e coloquei ele na mão foi tudo normal. A única sensação que eu tive foi dum gelo, assim, geladinho, úmido, né? Um negócio úmido, mas nem me deu nojo. A hora que eu coloquei ele na mão também não me deu, assim. Foi mais a primeira vista em pensar que eu tinha que pegar ele. Que eu deveria pegar ele, né? Não é que eu teria que pegar, mas... foi essa. Só essa. Uma coisa meio estranha, mas legal. [...] Haha. É, eles são bonitos, assim, todos exuberantes, né? Essas anteninhas quando eles vão... que nem você falou que quando a anteninha está pra fora é porque ele já não está mais com medo, né? Com as anteninhas em pés... esse corpo mole. Hahaha. Não sei não. Por isso que... que parece afrodisíaco. É exuberante. É bonito. É uma coisa bonita. Exótica. É bonita. Ver esse corpinho saindo de dentro, assim, se movimentando, devagarinho. É legal. Me veio na memória chocolate. Mas mesmo vindo na memória chocolate eu não comeria ele não. Hahaha. Eu não... só a... como que chama? A conchinha, né? Só a conchinha. A conchinha é linda. A cor, esse marrom, uma cor que eu gosto também. Que mais? Já te falei porque que eu acho ele exótico e afrodisíaco. Hahaha. Mas ele é sim. Não, parece que ele transmite paz, parece, né? Por causa dos movimentos dele, assim. Bem lento, né? Não é aquela coisa agitada, que... Mostra o quanto que a natureza é bela, né? Porque... eu achei ele... ele é bonito, ele é super lindo, né? Acho que é só isso. Acabou? Agora acabou mesmo. Hahaha” (Em seguida pega um dos animais na mão pela concha, com os dedos em pinça, olha-o por todos os ângulos, a boca mostra-se contraída, bem como os músculos do pescoço, indicando nojo.) Vênus: Aahh, isss! (tirou os olhos dos animais baixando a cabeça, com a mão na testa, então com a cabeça ainda baixada olhou em direção aos animais, num soslaio, em seguida aproximou-se da caixa contendo os animais sentou-se na cadeira próxima à eles porém, mantendo o corpo retesado para trás, pôs a mão na boca, em concha. Sempre mantendo contato visual como que para saciar a curiosidade em olhar aquele animal. Não teve contato físico com eles) [...] Tô com nojo. Muito Nojo! Eu tenho nojo. Eu tenho nojo. Ai gente. Falo nojo de novo. [...] Eu to com muito nojo. Hahaa. Quero ir no banheiro. Não, to brincando. Ah assim, me arrepio. Aquele negócio daquelas anteninhas mexendo. Daquelas coisas melecadas, espalhadas... que eles espalham assim né? Aquilo frio... ele é frio né? Sei lá. Só isso. Eu imaginava qualquer animal menos esse. Hahaha. Até numa cobra eu pensei. É bem light mesmo. (Ficou o tempo todo de lado olhando para os animais por cima do ombro esquerdo. Depois de um tempo afastou a cadeira para distanciar-se dos animais e não mais olhando para eles colocou as duas mãos sobre os joelhos e numa expressão de alívio disse) Não sinto mais nada, viu gente?! (E abriu um sorriso. Vênus não tocou nos animais em nenhum momento, permanecendo até o fim com a boca contraída, engolindo a saliva, os canto da boca contraídos para baixo, em franca expressão de nojo.) Ai. Ta me filmando... Ah assim, me arrepio. Não tenho medo. Acho que tenho mais nojo disso do que de barata. Pra mim é. Não gosto não. Hahaha. Você quer me olhar assim é isso? Por isso que eu to sendo filmada? Pra mim já era. Não. Não me vem mais nada assim. Infelizmente é só isso mesmo. Só o nojo. Não assim, por mim né? Porque eu sinto nojo. Eu não queria ter isso. Porque não tem nada a ver né? Um animalzinho dócil. Uma coisinha tão... não sei.. eu acho tão nojento. (Após a entrevista ser dada por encerrada, e parar a filmagem, Vênus fez um longo relato sobre seus problemas familiares relacionados a drogadição do irmão adotivo, o qual se encontra preso, problemas com o marido que tenta superar vício em jogo, problemas financeiros, insatisfação com a terapeuta que lhe sugeriu que esquecesse o irmão, a cardiopatia do pai devido a preocupação com o filho detido e ainda a preocupação com a filha pequena devido aos problemas enfrentados. Durante todo esse relato Vênus chorou muito e falava com indignação por toda essa situação) Diana: (Sentou-se na cadeira com as mãos entre as pernas e esfregando-as e sorrindo nervosamente. Pegou apenas pela concha. Não o colocou na mão) [...]Eu pensei que eles iam ficar aí dentro. Eles estão grudadinhos aqui. Eu não tenho coragem de pegar, Márcia. Hahaha. Eu não tenho, porque eu tenho nojo. Mas eu particularmente, eu não... é só o contato visual mesmo... porque eu não consigo. Hahah. Não consigo pegar. Não consigo assim, nem pra sentir ele. Eu não tenho coragem assim nem pra sentir a casquinha dele em cima. Então eu acho que a repugnância é maior. Eu não consigo não. Pra ver até que textura tem a casquinha em cima. Que seria o máximo que eu conseguiria pegar. Mas jamais tocar na parte de baixo. Que é ele em si. Talvez por assimilar uma lesma, por ser nojento alguma coisa assim, mas eu não consigo ter contato com a carcaça. Com a carcaça em si talvez, mas ela sozinha, mas do jeito que ela está aí não [...]É um bicho que eu poderia ter contato, pegar, mas eu não consigo. No máximo bater assim bem de levinho na casquinha para ver a reação dele, né. Por ser um animal assim que por ter um experimento eu não sei como as pessoas trabalhariam, esse não seria um que eu teria habilidade de pegar para manusear, alguma coisa assim. Hum, eu não teria essa habilidade. Eles fazem o movimento e o barulho do que eu imagino que possa acontecer se eu pegar, que vai melecar minha mão. Que ele é muito molengo. Mas eu não tenho coragem não. Vocês querem que eu pergunte alguma coisa ou eu fico em silencio mesmo? A princípio ansiedade, assim eu não imaginava o que seria. Eu imaginava que seria realmente, eu tinha certeza assim que seria um animal que eu poderia ter um contato físico. Acho que foi o nojo que me distanciou totalmente, então eu não... não tenho coragem, não tenho força para tocar eles. Agora, a emoção forte assim foi de nojo, tanto que a minha salivação já ta assim em abundância. Não sei se fosse preciso pegar eles ou pode ver na caixinha eu não ia conseguir não. Talvez eu até pegasse... A carcaça é a única coisa assim que me protege, para tentar pegar. Que eu não tenho tanto nojo, mas o restante de jeito nenhum. Não pego não. Só tendo nojo mesmo. Até aqui ta doendo. Hahaha... Mas de emoção mesmo, a única coisa que eu senti foi que o batimento cardíaco alterou... Não sei se depois da expectativa isso também não se estabilizou um pouco. . A única coisa que impede de eu chegar nele, é que eu vejo que ele é mole e que vai deixar marca na minha mão, ele é molengo. A única coisa tenho nojo, mas não tem nenhum forma, não tem nada de ofensivo. Ele é todo no seu, quietinho. Mas eu não tenho coragem, por qualquer coisa dele... Eu tenho nojo do que pode tocar em mim e marcar, mesmo que eu saiba que eu vou lavar a mão na saída, mas eu tenho essa repugnância de que essa parte mole encoste em mim. Eu tinha até curiosidade para saber como que ele é de baixo, mas eu não tenho coragem de pegar. Vocês estão grudados. Não machuca não, né? Eu não posso matar eles fazendo isso, né? Ai. Acho que eu não comeria não. Piorou quando eu olhei em baixo. Pensei que eu ia ter menos aversão. Não tive. Agora esse, como a gente não tem contato... Se eu tivesse comido já seria diferente. Agora, não seria fácil para mim ter que fazer um experimento, trabalhar diariamente com um bichinho desse. Acho que vai evoluindo, né? Quando a gente vai ficando mais tempo vai tendo coragem de fazer certas coisas só para experimentar. Mas quando eu pego eu tenho nojo. Quando eu toco eu tenho nojo. De longe até vai, mas na hora que eu crio essa coragem de ir pegar ele, depois eu fico com nojo. Pegar esse que é menorzinho. Aii, meu Deus!!!! Parece um peixinho!!!! Não é feio, né? Só é muita de meleca. Ta vendo, agora se fosse preciso guardar tudo na caixinha eu guardaria. Quer que eu guarde? Agora eu tenho coragem. Água para beber. Quando eles sentem sede eles vão lá e tomam. Eu só estou conseguindo fazer isso, porque eu fui criando coragem. Mas eu não me imaginei fazendo. Se me dessem pouco tempo... Assim como com as coisas que eu tive que comer para experimentar. De primeira não. Tive que ver direito. Não sei se eu vou conseguir pegar todos. Aqui não dá para brincar, né? Não dá para medir o quanto eu estou sendo agradável com eles, né? Dói no meu peito de nojo, mas eu faço sabia? Dói no meu peito de tanto nojo, mas eu faço [...] Que nem agora. Se precisasse... e tivesse sozinha eu teria que agir. Mesmo com nojo, medo. Porque não é um bichinho bonitinho. Eu não conheço muito sobre ele, então eu não sei se as coisas que a gente faz lhe agrada...ou ele tem medo. Agora essa imagem vai ficar marcada. Ainda mais pela... coragem de eu ter pego eles. Acho que eu já superei. Ah, mas eu já fiz bastante coisa. Eu achei que meu contato seria só visual. Minha ansiedade já passou. No início assim, a repugnância por ser feio, ser nojento, ela vai passando com o tempo. Eu já não tenho mais. Não tenho mais repugnância pelo nojento e nem é mais tão feio. Só não tenho coragem de colocar, de tocar na parte mole. As sensações desde o início do experimento até agora é medo, ansiedade, nojo, receio, receio de qual bichinho que ia ter. Mesmo pegando nas casquinhas dele eu tinha medo de que ele desgrudasse e tocasse com a parte molinha no meu dedo. O que eu tenho mais receio de tocar é a parte melecada. Se estivesse caindo e eu tivesse que pegar de qualquer jeito eu não ia ter coragem de pegar. Vontade eu tenho de superação, sabe. De pegar na parte mole. Mas, hoje não. Nenhum eu posso tocar agora, porque estão todos grudados e a melequinha ta bem em cima um do outro. Eu poderia ficar horas observando eles e tocando neles de vez em quando. (A medida que o experimento transcorre Diana vai se mostrando cada vez mais nauseabunda, engole constantemente, cantos da boca contraídos para baixo, movimenta-se na cadeira todo o tempo. Após um longo tempo toca com o indicador na concha de um dos animais, em seguida pega um deles pela concha mas sucumbe ao nojo e recoloca-o imediatamente sobre a tampa.) Atena: (Aproxima-se apenas um pouco da caixa contendo os animais, inclinase levemente em direção aos animais balançando-se suavemente como que embalando-se, observa-os por um pequeno espaço de tempo. Não teve contato físico com os animais) [...] É só! Só nojo! Não! Me lembram lesmas.(fala isso com o rosto franzido e olhando para as pesquisadoras) Só! E me causam nojo. Escargot em si eu não conhecia. Vocês levam e trazem essa caixa todo dia? Não tem cheiro né? Essas são as fezes deles? Que bonitinho. Tão namorando. Haha. Só gente!” Minerva: (Aproxima-se um pouco da caixa contendo os animais porém mantendo uma boa distância deles, permanecendo levemente inclinada para frente com as duas mãos entre as pernas, faz alguns relatos e então diz): É pra ir até lá? Interessante. É, na verdade não é um animal, eu particularmente não pego na mão. Por mais que eu esteja ciente que ele seja limpo. É de biotério [...]Sei da importância deles na cadeia alimentar, mas é um bicho que eu respeito. Assim, que eu gosto de ficar longe. A principio quando olha assim, dá meio que um... uegh!... mas é interessante o trabalho de vocês. Eu até quero saber depois, quero ler... Aqui têm machos e fêmeas?” (Ao saber que os animais são hermafroditas Minerva diz): Que legal! Mas não se auto-reproduzem? Eles têm que ter um contato com outro animal? Tem um aqui me olhando. Interessante. Quanto aos meus sentimentos, assim. É um animal que eu... que é curioso, até eu acho interessante, né? [...]Por mais que você fale que eles não mordem, eu sei que eles não saem correndo, mas eu não... deixa eles lá e eu aqui. Não gosto. Interessante... Se eles estão aqui entre nós alguma finalidade eu sei que eles têm. Até para o equilíbrio da cadeia alimentar... mas eu não me interesso. É isso. Uma sensação de nojo. Eu tenho a sensação de nojo. E eles quando andam deixam aquele rastro também ou não? Engraçado quando você vê em algum lugar aquele muco, assim, aquele rastro, você fala assim: Hum, passou esse bicho. É isso Márcia. Só achei interessante esse trabalho de vocês. Por isso que eu vim. Faço questão de ver a apresentação de vocês. Acho interessante. Tudo o que é diferente né? A gente ta tão cansado de ver... pesquisas são sempre as mesmas todo semestre... tanto que a de vocês, quando você brincou aquele dia comigo que era um experimento com animais, eu brinquei com você porque gera curiosidade... acho que tudo que é benéfico pra pesquisa científica eu acho que a gente tem que ajudar, compartilhar, incentivar a participar, né? Por isso que eu to aqui. 3 – Memórias associadas ao contato – Buscou-se verificar a capacidade de mobilização de conteúdos psicológicos/emocionais conscientes imediatamente conscientes dos participantes pelo escargot. A ou maioria não dos participantes demonstra que o contato foi capaz de despertar memórias antigas, ligadas à infância ou comportamentos associados a elas. Suas falas informam não só sobre emoções como medo, admiração ou nojo, mas também dão notícias sobre situações de violência, conflitos familiares, medo da rejeição dentre outros dinamismos psíquicos. Netuno: [...] essa experiência me remete à isso, algumas situações que no primeiro momento você...quer distância é... parece que aproximação se mostra arriscada...de alguma maneira a confiança em vocês me possibilitou essa aproximação...parece que o melhor seria o distanciamento, à não aproximação...depois da...da aproximação agente vê que foi uma situação que valeu a pena, que eram temores banais que a gente tinha...nesse momento me sinto humilde diante desses seres...às vezes eu acho que na própria vida eu acabo me posicionando assim, né? Achando que eu sei mais que o outro, não necessariamente assim né? Toda pessoa que não teve acesso aos estudos que eu tive mas tem uma experiência de vida que poderia me ensinar muito mais esses seres acho que são o retrato disso tudo...então, minha relação para com eles, principalmente os que eu tenho nas mãos né? É de proporcionar-lhes o bem estar...a emoção que eu tenho...insatisfação que agente tem de em se realizar num encontro com um outro...havia um certo temor...receio, medo né?...agora tranqüilidade, esse sentimentos são substituídos por tranqüilidade...eles de alguma maneira, eles ou elas não sei!...poderia tentar concluir se essa aproximação...se é uma aproximação comum na espécie deles...se eles buscam mais a aproximação do que o isolamento...Acho que eu disse todos os sentimentos. Essa proximidade que eles tiveram para comigo que não querem me deixar mais, se tornaram íntimos. Dionísio: Eu tentei comparar ele com outra espécie que fica no brejo, na água estagnada, alguma coisa assim. Até que é bem dócil. Dá até pra cultivar em casa. O que eu tinha pra falar é o sentimento de asco, nojo. Mas também é uma coisa bem sensível, delicada. Isso é o que eu senti mesmo. Só tive o medo só de pegar, puxar. Dá um medo de machucar ele. De soltar do casco. Ceres: Eu tive uma amiga que criou escargot. Ela tinha uma criação. Essa coisa do passado. Foi uma criação até meio trágica porque eles foram se reproduzindo com muita rapidez e no final ela não conseguia vender porque ela achava que ia vender o animalzinho pra culinária mesmo. E ela acabou tendo que dar fim neles, eu nem sei direito o que que ela fez. Também nem me interessei em saber porque era meio trágico. Falei: Não me conte! Mas ela procurou ser ética e ser bondosa com os animais na medida do possível, mas acabaram criando muitos e ela separou do marido.[...]Mas eu acho que o impacto essencial pra mim é a beleza deles. A sensação que eu tenho em relação a eles é muito boa e como coincidência não existe, eles são animais muito lentos. E tem um sentimento em relação a esses animais lentos, como o bicho-preguiça, todo animal que se move lentamente, eu tenho uma afinidade com isso porque as coisas na minha vida são muito lentas [...] Todos os processos pra mim são lentos. Então eu tenho uma simpatia pelos animais que se movem lentamente. Meu pai sempre dizia que “Você tem que fazer as coisas devagarzinho. E eu sempre fui contemplativa. Então eu tenho uma simpatia pelas coisas que se movem devagar. Pelas pedras que demoram muito tempo pra mudar de forma na natureza. Eu tenho uma admiração. É um aspecto da natureza que me atrai muito mais do que a correria, filme de ação [...] No meu jardim tinha bastante caracolzinho, e quando chovia, eles saiam de bando e eu ainda tinha que tirá-los pra não pisar em cima, porque você quebra, achata com eles. E eles eram bem menores e já fazia aquele (ploc) [...] É uma delícia de certa forma, pra mim ver coisas que se movem devagar. Eu gosto dessa idéia. É por afinidade mesmo. Eu sou muito rápida. Eu ando muito rápido. Eu faço muitas coisas muito rápido. De certa forma essa lentidão é contemplatória, não sei explicar. Eu tinha um amigo que falava que os carnívoros deveriam colocar os bois no curral e o carnívoro ia lá, pegava o boi, matava o boi, destrinchava o boi, pra comer o boi. Porque eu como a carne, mas eu preciso sempre abstrair do que é a carne. Se eu penso no que eu estou comendo, eu já fico triste, eu já não tenho vontade de comer [...] Eu sou muito esquisita. Eu sei que a vida se alimenta da morte. Então sempre a vida, o que a gente come está vivo e vive na gente, se transforma. Tive galinha já e todas as galinhas que mataram eu não comi nenhuma. O galo quando mataram e quiseram fazer sopa, eu não comi porque eu fazia amizade com os animais. Então essa coisa do animal é complicado. Eu preferia ser vegetariana. Acho que porque a planta não grita só [...] Então é complicado. Não sei qual é essa minha relação com os animais. É que eu não me sinto, de maneira nenhuma, superior ao escargot. Eu não acho que sou um animal superior. Eu acho que sou um animal diferente do escargot. Mas não superior. Então como a vida dele é distante da minha, o máximo que eu posso fazer é aprender a conviver com ele. Horus: [...] eu lembro de quando eu era pequeno, às vezes, eu ia pra casa da minha avó no interior e aí tinha uns... às vezes lesma mesmo... né? Ou alguns bichos assim... até aqueles caramujinhos e os meus primos, eles tinham aquele costume de pegar sal e jogar em cima, e ficava lá olhando o bicho morrer. Eu ficava pensando o que que ele fez, né? Um bicho... tudo bem, ele não, sei lá... ele transmite uma coisa meio... de ser meio... sei lá... gosmento, assim. Mas, só por isso você tem que torturar ele e jogar uma... jogar sal em cima? Eu achava isso horrível. Eu não gostava. [...]algumas vezes que eu fui no zoológico eu tinha essa mesma impressão. Assim, do bicho estar ali e mas ele não está gostando de todo mundo estar em volta olhando. Ele deve estar pensando por que que esse pessoal não vai embora, né, pra eu ficar tranqüilo? A primeira coisa que eu tenho é isso, assim. Toda vez que eu vejo um bicho numa gaiola ou num lugar assim eu tenho essa coisa, essa impressão. Lembrança, a única que me dá é essa. Dos meus primos jogando sal no bichinho. [...] Tem uma cidade aqui no Brasil que eles estavam tendo problema porque esse tipo de caramujo, ele se prolifera muito facilmente e ele foi trazido pra ser criado, consumido. E acabou não tendo um mercado muito bom e aí o pessoal meio que abandonou a criação e eles começaram a se multiplicar e tava virando até uma praga lá. Não lembro que lugar que era do Brasil. Agora que eu to lembrando. Zeus: Eu tenho um pouco de receio porque, quando eu era pequeno, eu estava num jardim e lógico, acredito que não sejam os mesmos. Eles estavam lá. E umas pessoas falaram pra mim que ah, não pega porque isso daí tem veneno e ai, vai fazer mal. Eu acho que isso daí... daí... estava reprimida essa vontade. Hahaha. De entrar em contato, né? Mas não é igual aquelas lesma comprida, nojenta, não, né? Ah... fica aquela gosma igual de lesma? Colorida... que fica brilhando? Não é né? Elas parecem diferente dessa aqui. É diferente, né? [...] Eu acho que depois que eu peguei esse bicho eu pego qualquer um agora. Acho que pior que isso só uma lagartixa mesmo. Se vocês me aparecessem com uma lagartixa aqui eu ia sumir daqui, hein? Eu tenho um pavor a esse bicho. Lagartixa. Quando eu era pequeno eu gostava de mexer com bicho assim. Não com esse. Mas eu pegava aranha e ficava prendendo aquelas aranhinhas que aparecem no quintal, sabe? Colocava dentro de um aquário, rs. Colocava duas ou três pra ver elas brigando. Minha mãe falava pra eu jogar fora aquilo. Eu tinha um quintal grande e eu colocava elas... uma vez eu criei um, um bom tempo, dentro de um aquário. Caçava mosquitinho pra dar a ele. E ela pegava eles. Também criei lagarta. Haha. Até achei que era lagarta aqui, quando eu vi. Mas não eles. Eu acho que se a minha mãe visse isso ela ia ter um treco. Ela vai falar: “Eu não acredito que você colocou isso na mão! Meu Deus do Céu!” Minha tia que falou que tinha veneno. Sei lá se aquele lá tinha veneno, mas... eu acho que não tem veneno, né? Porque logo... lesma, assim... eu nunca tinha... tinha estória já, né? Apolo: O que vem na minha lembrança... Na minha infância eu brincava na beira de rios e acho que eu via bichinhos parecidos com esses ou até mesmo dessa espécie. Não... não me provocava medo. Porque ele ele é um tanto... muito devagar. Não me provocava medo. Tinha uma sensação de querer colecionar. Por conta dessa casinha, né, que ele entra. Eu associo mais a um bichinho pra proteger, porque eu acho ele um tanto frágil. Um tanto limitado, assim, na locomoção. Foi essa lembrança. Mas vinha sempre a idéia de que eles tinham o habitat deles, né? Então eu não poderia tirar e levar pra casa. É sempre bom ver o bichinho na casinha porque ele fora da casinha ele é um tanto estranho. Causa uma repulsa pra quem não teve esse contato na infância, como eu tive. Muito devagar. Por isso que não dá pra levar pra casa. Porque ele aparenta fragilidade. Eu posso associar a minha infância a esse bichinho. É uma lembrança bem interessante. Da infância. Quando eu era pequenininho, brincava e via, ou numa árvore ou quando sentava na beira desse rio. Me traz uma boa lembrança, uma boa memória. Não é... não é algo assim pra cortar, pra deixar, mas pra guardar. Também a casinha lembra as conchinhas da praia. Parece que é um material que é da mesma família, na minha associação. No mar também tem muito bichinhos que também moram dentro da casinha. Eu me lembro das conchinhas também. Só que esses daqui não são de praia. Mas na praia tem muitos bichinhos que vivem na casinha. Uma terceira lembrança é que na minha infância tinham umas campanhas pra prevenção de esquistossomose. E o bichinho da esquistossomose, não sei... também deve ser dos ancestrais da mesma família desse bichinho aqui. Então tinha aquela....aqueles cartazes que mostravam uma criança num rio contaminado e através do pezinho quando ele pisava nos caracoizinhos eles ficavam com a doença [...] Então me remeteu à beira do rio, do brinquedinho. À beira da praia, por causa da família e uma lembrança ruim, né? Que muita... entrar no rio era proibido porque o bichinho era usado pra inibir as pessoas a... a não se contaminarem. Lembrei da música do Roberto Carlos, debaixo dos caracóis dos seus cabelos. Foi uma música feita em homenagem ao Caetano Veloso, que estava no exílio em 1971. E sempre que a gente canta ou ouve essa música, lembra do formato do bichinho. Caracolzinho. Cori: [...]Sabe, esses dias mesmo eu tava aqui e já era tarde da noite e tava uma bagunça de gente aí fora na rua. Dava pra se ouvir. E um cachorro latindo. Aí eu já fiquei imaginando. Será que estão fazendo alguma coisa de mal pra ele? Ele deve estar perto do bar, onde tem gente comendo, assim, e estão querendo expulsar. Isso mexe muito comigo. Quando eu venho... estou na rua vindo pra cá, se eu vejo um cachorro atropelado... uma vez eu parei pra socorrer. Tava sozinho. Aí quando eu parei, aí começaram a parar. Aí, não, não põe a mão. Que ele vai te morder, ele não te conhece e ele vai ficar com medo. Ainda era perto de casa e eu fui até um veterinário lá perto. Expliquei pra ela o que estava acontecendo. Me aconselharam a não mexer nele, que ele pode me avançar. Ela falou, realmente, não pode. Aí eu fui embora arrasada. Não pude fazer nada. Sabe? Ela falou que ela não podia sair de lá também pra estar indo... Quer dizer, eu não gostaria de ser assim [...] Quando eu era criança eu já tive cachorro. Desde criança eu gosto. Mas não era tanto. Não era tanto assim. Depois de adulta é que foi mais... de gostar mais, sabe? Num sei por que isso. Mas é... sei lá. Eu preferia não ser assim. É assim... me preocupar tanto, sabe? Sentir tanta pena de ver esse sofrimento. Sentir muita pena. Não... e sem poder fazer alguma coisa, entendeu? Que eu não posso também... eu sei que eu não posso. Os cachorros que ficam abandonados na rua. Se eu pudesse eu levava pra minha casa. Eu tenho o meu também em casa, né? Se eu ver um assim na rua, eu num queria que o meu passasse por isso, né? Eu lembro dele... É, o comportamento dele é de filhote. Que, sei lá. Dez anos, né? Não era pra ele se comportar assim. O meu lá em casa, eu saio fico o dia todo fora. A hora que eu chego, nossa, é uma festa que não tem tamanho, né? É, eu... sei lá [...] eu sempre pensei assim... na importância da família, né? E em casa, eu tenho dois filhos, um casal. E a gente se dá super bem. Não tenho mais pai, né? Eu tenho mãe, tenho irmãos, mas num... a minha família é do meu portão pra dentro [...] Eu não fui criada com eles, né? Eu fui criada com a minha vó. Então, não tem assim aquele laço. Nunca teve. Nem com meus irmãos... acho... acho não... é por isso, né? Ah, ela (avó) foi uma grande mulher, né? Porque ela já tinha [...] 64 anos quando ela ficou comigo. Então, uma senhora de 64 anos assumir um bebezinho de 15 dias... e ela ficou comigo até uns 12 anos. E eu não queria sair de perto dela e nem ela de perto de mim, né? Ela falava que quando eu comecei a falar eu comecei a chamar ela de mãe mas ela não deixou. Ela falava que eu era a avó... ela era a minha avó e não minha mãe. A convivência era com ela e pra mim ela foi, né, a minha mãe. Aí ela se preocupava comigo... que... eu lembro que ela falava que não ia me ver casar... que ela queria mas que ela não ia ver. Ela viu, conheceu meus filhos. Conheceu os dois filhos [..] Não posso falar pra você que eu gosto, adoro a minha mãe e tenho muitas amigas que eu ouço falar, né? A gente não teve um contato. Não teve um apego, não teve... então pra mim é indiferente. Eu faço por ela o que precisa ser feito mas assim, não... por obrigação. E mágoa também não tenho. E quando ela engravidou de mim ela ia fazer outro aborto. E a minha avó que não deixou. Então eu penso... eu penso assim, falo: “Pó, ela não queria a gravidez. Foi indesejada a gravidez. Minha avó me queria. Então quando eu nasci, né, você me queria? Era você que queria, né?. Eu acho que afinidade, o amor, é tudo construído, né? Não é que eu não queira me aproximar. É que não vejo propósito [...] Como eu te falei no início, é indiferente. Eu acho que eu vejo pelos meus filhos, né? Sei lá. Depois que a gente é mãe a gente começa a ver diferente. A enxergar as coisas diferente, né? [...] É como eu te falei, Márcia. Não tenho um sentimento. Não tenho sentimento bom e nem sentimento ruim. [...] Eu não dou o que eu não recebi [...] E eu nunca tive isso antes de conhecer o meu marido. Antes de conhecer o meu marido eu nunca tive isso. Eu fui ter isso depois que eu comecei a freqüentar a casa dele, na época de namoro. Então, eu via o comportamento da minha sogra com os filhos. Totalmente, assim, o oposto, né? E o meu distanciamento com a minha mãe e os meus irmãos ficou maior depois de um fato que ocorreu. O meu irmão que hoje mora com ela, ele morava junto com uma pessoa. Essa pessoa já tinha duas filhas, a mais velha da idade da minha filha. Na época deveria ter uns dezesseis anos. Ele, meu irmão, dentro de casa, ele quase abusou sexualmente da menina. Entendeu? Eu, quando a minha cunhada foi em casa chorando e me contar esse fato eu achei isso um absurdo. E a minha mãe já falou que não. Que eu tava de um lado, da... das duas, da minha cunhada e da filha e eu não tava do lado do sangue do meu sangue. Sabe, eu falei: “Não estou mesmo, mãe. Ta errado o que ele fez.” Eu falei: “Eu não concordo.” Vulcano: Fico olhando assim, fico lembrando que na casa da minha tia, lá no prédio, nas paredes dos prédios tinha tipo assim, caramujos, né? Que lembra muito esse aqui. Tudo grudado na parede assim, e a atirava uma pedra, atirava uma pedra. Eu gosto muito de animal. Lá em casa chegou até tê coelho, né? Eee, atualmente tem três cachorras e um viveiro de piriquito. Né? E aí... Teve uma vez que eu fiquei cuidando dos piriquitos lá em casa, né? Porque meus pais viajaram, fiquei sozinho em casa [...] aí, aí, eu não gostei! Aí me impedia de sair porque eu tinha que dar comida para eles e trocar, não sei que e pô água. Além de tê que cuidá da cachorras tinha que cuidá de mim, ainda cozinhá, fazê fejão, arroiz. [...] Eu lembro assim que teve algumas vezes que eu fui lá pro nordeste e que aí... Eu tinha um primo lá, ele que cuidava das criações do meu vô lá. Então como não tinha muita coisa pra faze a minha diversão era cuida dos bichos junto com meu primo. (rsrsrs) Aí ficava zoando com as cabras, com os cabritos (rsrsrs) Né? Até que uma vez lá, meu vô, ele matou um boi. Assim, foi um fato que eu tenho muito guardado na minha cabeça, acho que eu tinha [...] uns oito anos e aí [...] o boi veio, ele tava com um pedaço de madeira [...] ele veio deu uma porretada na cabeça do boi, ele caiu, aí foi todo mundo lá tirando a pele, tirando o sangue dele. Nossa! Nunca vi tanta carne na minha vida! [...]Eu lembro até hoje assim que eu tava perto do curral e aí tinhaa, uma carcaça assim do, do boi, né? [...]Lembro queee, eles pegaram e abriram o curral, e ficava as vacas lá e as vacas foram ao redor dos restos assim, e começaram a chorar. Achei muito interessante isso! Até bicho tem um lado afetivo assim [...] Eu gosto muito de cachorro, eu sempre tive cachorro, desde, desde criança, eu tive um cachorro que chamava urso, é estranho , um cachorro chamar urso né? (risos) E ele se impacto muito assim, por que ele ta desde a minha infância, até mais ou menos os 17 anos, eu peguei ele filhotinho, da vizinha, então ele cresceu com agente, ele abria a porta, não podia sentir cheiro de bolo, né? [...] acho que desde criança, eu ta envolvido com, com, cachorro, meu... tem que ter cachorro senão não dá, condição básica né, e assim, tem vezes né, que assim, eu vou dar banho nas cachorras, fico cantando pras cachorras, coisa de loco! Fico conversando com as cachorras (risos). ...eu to meio emocionado assim, de falar disso assim, pra mim o convívio com o animal é importante assim, acho que assim tem horas que eu to meio pra baixo, eu vou lá, fico falando com os cachorros, conversando com eles, os cachorros cheguei, eles já chegô a jogar bola com a gente em casa, chuta bola vai atrás, né?[...] É impossível ficar sem cachorro, não dá. Assim tem vezes que eu penso em comprar um apartamento pra ir mora, aí tem aquela coisa, espaço reduzido, né? Ai eu penso nisso às vezes, mas se um dia eu for morar sozinho ou com alguém sem cachorro não dá! Assim, é condição sine qua non pra felicidade [...] As vezes tô em terapia eu comento isso né? As vezes eu pego alguma coisa eu vou lembrando, lembrando, lembrando, uma palavra me lembra várias coisas [...] E acho que não sei, as vezes eu fico pensando na questão assim, de, da memória, tem uns encadeamento assim, né? [...] Não sei por que é... os animais pra mim, lembra assim, muito vida sabe? Lembra... assim é... essa afetividade legal entre você e o animal... Morte acho que é uma coisa que... sei lá, acho que ultrapassa nossa razão de entender, né? A gente tem uma... um vínculo com a pessoa assim, né? Lembro uma vez, né? Assim, foi a única vez na minha vida que assim, a coisa da morte mexeu comigo, quando um tio meu morreu ele bebia muito, né? I ai é... ele fez parte da minha infância e tal, ele que me ensinou a assoviar! Ele gostava muito de música, eu adoro música também, e ai quando ele morreu sabe, tive uma sensação muito estranha, assim... Não queria falá de morte, e tô falando, e aquilo sei lá, o que me passou assim pela cabeça, é que, poxa vida, como uma pessoa tá aqui e de repente não tá mais? Não se mexe mais? Então eu fico louco com isso, agente ta aqui, né? [...] quando uma pessoa morre, eu acho que ela saiu da cultura [...] Ártemis: A hora que eu vi, como eu brinquei a hora que eu cheguei, eu falei assim, é uma lesma... hahaha. Não é uma barata? Não é nada? Eu achei meio assim, que eu não ia pegar, mas peguei e eu acho que é uma coisa bem... parece lesma. Mesmo, né? É uma lesma.? A hora que eu cheguei eu falei assim: “Espero que não seja uma lesma.” Né, nunca imaginei pegar um negocio desse. Nunca. Sou meio nojenta pra essas coisas. Eu acho que eu nunca... a sensação, assim, foi essa. No começo eu tava com um pouquinho de... acho que de aversão de colocar na mão e sentir aquele negócio. A hora que eu peguei e coloquei ele na mão foi tudo normal. A única sensação que eu tive foi dum gelo, assim, geladinho, úmido, né? Um negócio úmido, mas nem me deu nojo. A hora que eu coloquei ele na mão também não me deu, assim. Foi mais a primeira vista em pensar que eu tinha que pegar ele. Que eu deveria pegar ele, né? Não é que eu teria que pegar, mas... foi essa. Só essa. Uma coisa meio estranha, mas legal. Ah, me lembrou uma coisa. Aqueles chocolates que vende no freeshop. Sabe aqueles de conchinha? Lindo. Me lembrou isso. Me deu essa memória agora. Aquele chocolate. Muito lindo. Quando eu ver no freeshop vou lembrar que eu peguei esse negocio na mão. Hahaha. Afrodisíacos. Haha. É, eles são bonitos, assim, todos exuberantes, né? Essas anteninhas quando eles vão... que nem você falou que quando a anteninha está pra fora é porque ele já não está mais com medo, né? Com as anteninhas em pés... esse corpo mole. Hahaha. Não sei não. Por isso que... que parece afrodisíaco. É exuberante. É bonito. É uma coisa bonita. Exótica. É bonita. Ver esse corpinho saindo de dentro, assim, se movimentando, devagarinho. É legal. Me veio na memória chocolate. Não, parece que ele transmite paz, parece, né? Por causa dos movimentos dele, assim. Bem lento, né? Não é aquela coisa agitada, que... Mostra o quanto que a natureza é bela, né?” Vênus: [...] Ele é muito família né? [...] Assim, pela casa, pela união deles, ainda são muito assim, família né? Dentro de si, aquela coisa... no meu modo de ver. A casa dentro de si... eu acho que me passou muito isso. Sempre me passaram isso. Não assim, realmente tem. Mas é mais nojo. Não tenho medo. Acho que tenho mais nojo disso do que de barata. Pra mim é. Não gosto não. Hahaha. Não. Eu falei esse negocio de família porque eu sempre olhei eles com isso né? Até como a própria tartaruga. Ela dentro do casco e tal... a casinha. E então eu sempre tive essa imagem desses animaizinhos. Mas não que me lembrou nada não. Mais lembrança nenhuma. Hahaha. Porque não tem nada a ver né? Um animalzinho dócil. Uma coisinha tão... não sei.. eu acho tão nojento. Pior que eu sempre fui acostumada a jogar sal neles... aquelas coisas para morrer. Hahaha. Tem uns caramujinhos lá. Umas coisinhas, né? Eu sempre fui criada assim. Joga sal que morre. Então sempre criou aquele... né? Aquela barreira. Só isso. Diana: [...]Me lembra realmente lesma. Mesmo porque quando eu era criança eu brincava com isso. Só que eu já tinha repugnância. Só que eu já tinha repugnância [...] Eu tinha até curiosidade para saber como que ele é de baixo, mas eu não tenho coragem de pegar [...] Eu acho que todos os animais que têm pelo, eu tenho um melhor contato. Agora, animais como tartaruga... Todos os outros animais que não têm pelo eu não tenho um bom contato. Eu acho difícil... Talvez fosse mais fácil se fosse qualquer outro animal que estivesse no nosso meio porque [...] Faço isso com tudo assim. Certas coisas muita gente tem nojo de fazer, e eu vejo que nessas situações só eu tenho que fazer, aí eu vou lá e faço. Quando tem lagartixa na garagem de casa, só eu tiro. Porque ninguém tem coragem. Não que eu sou a mais corajosa de todo mundo, mas eu vejo que ninguém vai agir eu vou lá e faço. Agora, sei lá se numa abordagem diferenciada ou meu medo diferenciado dos deles. Mas eu sempre faço assim. Pode ser uma autopromoção ou alguma coisa assim, mas eu sempre faço. Quando todo mundo fala não eu sempre falo que sim. Mesmo que o meu pensamento seja não, mas eu vou lá e faço. Que nem agora. Se precisasse... e tivesse sozinha eu teria que agir. Mesmo com nojo, medo. Não digo para outro bicho. Outro bicho eu acho que... É ele não ta mais tão nojento. Mas continuo sem coragem de tocar certas parte, viu! Agora, admiro quem tem coragem de lidar, de tocar [...] Parece muito com uma lesma e lesma eu morro de nojo.” Atena: Me lembram lesmas. Só. E me causam nojo. Dá lembrança da lesma né? Escargot em si eu não conhecia. Minerva: [...]Eu até esses dias assisti uma reportagem, eu assisto muito a cultura, e saiu uma reportagem falando sobre eles... até acho que em uma cidade aí... talvez até não seja esse tipo de caramujo. Mas a cidade tava infestada com esses bichos. Tava tendo lá... uma desorganização ambiental lá que tava tendo uma apropriação muito grande. Eu assisti bastante. Interessante.A principio quando olha assim, dá meio que um... credo... mas é interessante o trabalho de vocês. Quanto aos meus sentimentos, assim. É um animal que eu... que é curioso, até eu acho interessante, né? Engraçado quando você vê em algum lugar aquele muco, assim, aquele rastro, você fala assim: Hum, passou esse bicho. 4 – É possível ir além e comer o animal? - Objetivou-se verificar a disponibilidade dos participantes em comer o animal em questão. As respostas foram muito variadas. Dos participantes dois disseram que comeriam o animal, sete disseram que não o comeriam e quatro apresentaram conflito entre comer e não comer, sendo que prevaleceu não comer representado por três dos quatro participantes. Netuno: (Você comeria o animal?) Sim Dionísio: [...] Não pra comer! Ainda tenho preconceito por que tenho nojo ainda ... Mas...nada que nenhum tempero possa ajudar (risos) Ceres: Comeria, mas não é uma coisa que eu olho e falo: Ah, comeria. Porque na verdade eu como carne, porque minha alimentação é muito desregrada. Porque a minha tendência seria de não comer. Porque eu não gosto de pensar. Eu tinha um amigo que falava que os carnívoros deveriam colocar os bois no curral e o carnívoro ia lá, pegava o boi, matava o boi, destrinchava o boi, pra comer o boi. Porque eu como a carne, mas eu preciso sempre abstrair do que é a carne. Se eu penso no que eu estou comendo, eu já fico triste, eu já não tenho vontade de comer. Eu não teria problema de comer escargot, bem preparado, por quem conhece, preparar bem. Mas se eu criasse escargot, daí não ia prestar. Não ia comer mesmo, e ninguém ia comer meus escargots.” Horus: Comeria sim. Eu tenho curiosidade, assim, de sabores. Eu tenho muita vontade de comer grilo. Lá no interior, é... aquele tipo de formiga que o pessoal frita e come, eu já comi. É gostoso. Eles tiram a bundinha da formiga e fritam. Comem. Eu acho que eu comeria. Se ela fosse... se fosse feito assim, num prato meio cru, assim... pega e come, eu acho que não. É muito forte, né? Zeus: Ah, não dá coragem de comer, né? Claro que não. Não dá coragem de comer porque... pôr na boca assim, né? Pensou como deve ser? Duro, meio duro de tirar [...]Ah! gente, imagina... comer não. Não sei né, depois de pronto às vezes até sim...mas ver assim e comer, não. Vivo e depois comer? Não. Apolo: Poderia até comer sem a consciência de que são uns bichinhos frágeis. Mas se eu for informado que são os bichinhos frágeis que viram um prato, um delicioso prato, eu acho que eu teria dificuldade de ingeri-los. Por conta dessa razão. E acho que ele precisa mais se preservar e se multiplicar do que ter muitos pratos, né? É melhor preferir soltos, né? Não sei bem pra que eles servem, pro equilíbrio da... ecológico. Se eles tem uma função, assim, de preservação. Deve ter, né? Mas eu não sei. Eu prefiro não fazê-los como prato de comida. Cori: (Você comeria?) Não. Vulcano: Não imagino eu comendo um bicho desses muito... sei lá, estranho sê sabe que come, come... Isso para mim é caramujo. Um caramujo mais... mais avançado, mais sofisticado.- Ártemis: Não comeria. Vênus: (Você comeria?) Não. Diana: Não. Eu gosto de experimentar várias coisas para saber que gosto que tem, mas também depende da forma de preparo. Eu não sei como que isso seria preparado. Talvez até sim.Eu até como coisa que algumas pessoas tem repugnância. Talvez até sim. Para experimentar sim. Mas assim desse jeito eu não me imaginaria. Só depois. Apesar de que eu nunca vi ele. É a primeira vez que eu to vendo assim.Então se alguém preparasse ele para mim assim nesse primeiro contato, talvez eu comeria numa boa. Mas já tendo esse contato, talvez fosse mais difícil. Agora esse aqui eu acho que não comeria, porque eu acho assim, eu acho gosmento. Agora isso só de longe mesmo. Agora, comer mesmo não. Não pelo cuidado, porque eu não tenho dó, nada disso, é pelo formato dele, pela textura. Não sei se chega a ser tão saboroso quantos os outros dizem. Atena: [...]Quer dizer, se eu não soubesse que isso era escargot... se eu não soubesse que fosse esse o animal, talvez eu comeria. Mas vendo o animal assim... e depois ó... esse é o prato feito... eu acho que não. As folhinhas eu comeria. Hahahaha. Minerva: O pessoal que gosta dessa culinária, se come, se aprecia, porque algo também passa pra eles de bom, saboroso, de gostoso. . Mas esse animal eu não comeria. Não dá pra falar eu não comeria. A princípio não. A principio eu acho que não comeria não. 5 – Curiosidades despertadas com o contato – Buscou-se verificar quais foram as curiosidades que os animais suscitaram nos participantes. Alguns se preocuparam com a origem e características físicas imediatas, outros com a sexualidade, outros já tinham ouvido falar que eram comestíveis, mas ficou claro pelo tipo de curiosidade manifestada que a maioria nunca havia tido contato com ele. Netuno: Me fala da origem deles? É só couve que eles comem? Eles caminham quantos metros? Só em Laboratórios de Universidades que eles são encontrados? Tempo de vida? Dionísio: Como que é parecido com qual outro animal? É um animal, né? Que a gente vê no caramujo, é diferente né? Ceres: Eles têm variedade de espécie? Mas você tem que puxar pela casca, né? Horus: Uma parte dele é presa, né? E ela (a concha) só vai crescendo? Mas nunca se destaca dele? [...]É muito forte, né? A sucção dele... qual que é a defesa desse bicho? Fora a casca? E por que que ele é comestível e os outros tipos não? Basicamente são o quê? Insetos que comem? Insetos, não. É.... pássaros que comem eles? Zeus: Isso é um caramujo? É escargot de verdade? Não é melado? Tem muco, né? Como que pega? Pela casca dele? É cozido? Sai da mão depois essa gosma? E não é oleoso não, né? É gelado? É igual lesma? Ele não chupa não, né? Ele vai ficar gosmando na minha mão? Mas não é igual aquelas lesma comprida, nojenta, não, né? ...fica aquela gosma igual de lesma? E ele desgruda fácil da mão, né? Ele não chupa não, né? Não faz barulho não, né? Não vai machucar, né? Será que ele se acostumou - Ao toque, pra se encolher? É coco deles? . Não tem problema de tocar a mão nele, né? Ai não é nojento não, né? Apolo: Não sei bem pra que eles servem, pro equilíbrio da... ecológico? Se eles têm uma função, assim, de preservação. Deve ter, né? Cori: Como que chama?Escargot? Muita gente acha muito saboroso, né? Vulcano: É esse daqui que come? Ártemis: Por que que ele ta assim? Ta com medo? Quando ele se sentir mais à vontade ele vai abrir e vai ficar igual ao que ele tava na coisa, na minha mão? Eles se movimentam bem devagarinho, né? E essas anteninhas é por onde eles enxergam? Esse pontinho preto? Quanto custa pra ter um desse, hein Márcia? Vênus: Ele é frio né? Diana: Mas esse é daquele de se alimentar, Márcia? Ou não? Água para beber ou para eles tomarem banho? Eu tinha até curiosidade para saber como que ele é de baixo... Atena: É lesma isso? Essa casquinha é dura? Vocês levam e trazem essa caixa todo dia? Eles não tem cheiro né? Essas são as fezes deles? Minerva: Mas isso não é aquele escargot que o pessoal come? Acho bastante interessante mas num... estranho, esquisito, eles só comem alface? Aqui têm machos e fêmeas? Mas não se auto-reproduzem? Eles têm que ter um contato com outro animal? Aí tipo assim, onde tem um grupo mais masculino, eles se estabelecem em alguns femininos, para um equilíbrio ou não? Eles têm os dois sexos no mesmo animal, né? E eles quando andam deixam aquele rastro também ou não? CAPÍTULO 6 – ANÁLISE DOS DADOS Foram muitas as informações obtidas a partir desse experimento e foi surpreendente verificar como supúnhamos a princípio como a interação com os animais é capaz de despertar emoções dos mais diferentes tipos em humanos. Nossos participantes foram extremamente generosos em suas descrições e podemos considerar que a maioria se comportou de forma espontânea. É claro que houve por parte de alguns deles uma tentativa de controle consciente de suas manifestações e uma certa evitação defensiva de aprofundar certos temas. Alguns se paralisaram no nojo e foram pouco além. Outros no entanto simplesmente falaram. Lembraram de seu passado de experiências felizes, dolorosas e como as enfrentaram. Alguns chegaram a colocar no animal uma intenção, desejo ou mesmo racionalidade, como se o contato com o animal de outra espécie devesse ser constituído dos mesmos elementos de uma relação entre humanos. Embora tenhamos apresentado os dados em categorias que denominamos “de análise”, após a organização de todo o material, pareceu-nos mais adequado se pudéssemos dirigir nossas tímidas interpretações falando de cada participante de uma vez, ao invés de abordar todos em cada uma das categorias, mesmo porque alguns dados apresentados nessas categorias acabaram por nos parecer óbvios demais e dispensando uma análise mais profunda, como por exemplo a última delas que fala das curiosidades em relação ao animal. É importante lembrar que estamos admitindo no âmbito desse estudo que a forma particular de aproximação que cada participante estabeleceu com o animal – comentários, interjeições, gestos, posturas, expressões faciais, etc sejam passíveis de serem interpretadas como manifestações psíquicas que refletem seu mundo interno e portanto possíveis projeções de modelos particulares de identificação, interação e relação com o outro, sendo esse outro entendido aqui como qualquer ser vivente e de qualquer espécie, inclusive a humana. Consideramos que algumas análises que esboçamos estão dentro de um campo que podemos chamar de provável, outras certamente necessitariam de validação por meio da utilização de técnicas de avaliação da personalidade já consagradas na Psicologia. Com alguns participantes conseguimos avançar mais, com outros um pouco menos. Afinal também devemos assumir algumas resistências. Netuno, em sua interação com os escargots, deixa claro seu medo diante do novo, sua hesitação inicial, mas acima de tudo sua identificação com eles quando afirma que esses serzinhos aqui representam a mim [...] no primeiro momento vou ou não vou, mas também que sentiu desejo de aproximar-me deles. Insiste no contato deixa que eles entrem em contato com sua pele. Admite que o contato com os outros pode mudar um pouco a nossa maneira de sentir. Não recusa a aproximação mesmo com temor inicial pois a experiência pode ser boa e agradável. Admite que o contato com o animal o faz recordar situações das quais a princípio você quer distância e que a aproximação é arriscada. O fato de conhecer as pesquisadoras ajudou na aproximação com os animais deixando entrever que necessita de apoio de outras pessoas em algumas situações e que suas decisões podem ser influenciadas pela confiança que deposita nelas. Deixa transparecer que algumas de suas decisões podem ser contaminadas por um julgamento precipitado achando que sei mais que o outro porque estudou mais, o que pode sugerir certa arrogância, mas que a experiência de vida de pessoas simples assim como os escargots o fazem pensar em humildade. Dionísio fica bastante perturbado com a presença dos animais. Suas primeiras falas remetem a conteúdos relacionados à fase oral, tais como apresentados pelos psicanalistas. É comestível? [...] Morde? Fala também de seu nojo, uma emoção que tem raízes na fase oral. O animal também evoca imagens de tipo destrutivo relacionadas à morte a ponto dele perguntar tá tudo vivo? De outro lado, o contato lhe permite associações relacionadas à docilidade, sensibilidade e delicadeza e num continuum de seu medo de machucar esses animais ao tocá-los. Essas imagens despertadas em Dionísio sugerem, de um lado seu medo e necessidade de fuga diante do novo, um medo do contato que pode produzir algum tipo de contaminação associado à imagem da água estagnada, mas um medo que se dissipa quando vê no animal a fragilidade que lhe permite até pensar em cultivar em casa. Ceres manteve um contato fácil e afetivo com os animais, preocupada, inclusive, num possível significado que o contato poderia ter pra cabeça deles, atribuindo aos mesmos uma racionalidade de tipo semelhante à dela. Suas verbalizações e vocalizações eram similares às de uma mãe falando com bebês. Houve uma grande preocupação em não incomodar os animais e que não queria interferir no estar deles e racionaliza dizendo que se tivesse lido alguma coisa sobre as sensações do escargot. Os animais a remetem à lentidão dos processos – que não chega a dizer quais são – em sua vida, ao fato de ser contemplativa, mas por outro lado diz ser muito rápida em muitas coisas que faz. É possível supor que Ceres deva viver uma boa dose de frustração ao ter que esperar, apesar de sua pressa, que as coisas aconteçam no seu tempo e não no dela. Transparece um sentimento de impotência em proteger o que é frágil – como no caso da amiga que criava escargots - e um desejo de não interferir no curso natural das coisas, apesar de sua pressa. Os animais permitiram recordar muitos fatos de sua infância e admite uma relação de igualdade com todos os seres vivos. Sua interação permitiu até que se identificasse projetivamente, com o animal e no que ele poderia estar sofrendo se ta assim de repente alguém te arranca assim, te pega, pra sentir você, né? [...] eu não vou por a mão na parte molinha deles [...] eu não quero manipulá-los. Suas associações nos remetem a possíveis conflitos de natureza sexual, os quais não podemos afirmar. Horus, se coloca como quem chega e não sabe bem porque escolheu estar ali, ou seja, é um voluntário descompromissado que só percebe natureza da escolha que fez – e que talvez não tenha sido muito boa – quando já está lá: eu acho que não entendi...eu tenho que pegá? Acaba tocando na concha talvez para provar para os outros que não tem medo, mas suas perguntas insistentes falam de alguém que não queria entrar em contato com o animal e se ocupava mentalmente, perguntando sem parar. Identifica-se com o animal e afirma que o animal não quer ser incomodado, ou seja informa que só permite o toque na concha, na exterioridade, nada mais. Fala do animal como alguém que está preso em si mesmo, em sua concha, ou numa gaiola o que nos faz refletir sobre possíveis questões relacionadas aos espaços que tem e se permite para si e em seus vínculos. Em suas lembranças extrapola a experiência com os escargots para outros animais e, identificado com eles sugere sua necessidade de reclusão e isolamento quando afirma ele deve estar pensando porque esse pessoal não vai embora, né, para eu ficar tranqüilo? Deixa evidente que se trata de uma pessoa inteligente – e que talvez mais racionalize do que se permita a entrar em contato com suas emoções – quando se põe a descrever as relações matemáticas presentes na concha dos escargots. Mas uma possível vulnerabilidade aparece na pergunta: Qual é a defesa desse bicho? O participante de outro lado se mostra como alguém sem preconceitos, e disponível ao contato pois, apesar do animal ser assim gosmento, admite que comeria pois tem curiosidade, assim de sabores. Se admitimos que a oralidade é a base do contato, Horus é alguém que quer experimentar, mas para isso talvez precise enfrentar alguns bloqueios. Zeus, desde o início do experimento apresenta clara mudança em seu tom de voz que adquire um timbre mais agudo, assim como adota posturas e gestos que lembram as usualmente classificadas como femininas. Suas falas, por várias vezes evocam imagens de natureza sexual: Não é melado? Tem muco? Ele vai ficar deitado? Eu não vou deixar ele se abrir em mim... Se ele colar depois desgruda? Ele vai ficar gosmando na minha mão? Ai ele não vai me chupar não vai? Ele está colocando a boca em mim! A presença do animal mobiliza em Zeus conteúdos primitivos ligados à sua sexualidade, especialmente a oral, a qual se apresenta permeada de conflitos entre o desejo e a evitação. Tendo em vista que se refere ao animal, em todos os momentos utilizando-se dos pronomes no masculino, é possível supor que esses conflitos ao fato de desejar/evitar um contado com alguém do mesmo sexo. Esse desejo de contato produz culpa: Sai da mão depois essa gosma? [...] Se eu lavar sai? Mas também produz medo e nojo: Esse bicho não morde não, né? Eu queria, tenho vontade, mas eu tenho medo. Medo não, né? Nojo! Eu tenho acho que nojo dele se abrir e grudar como se fosse uma chupetinha, sabe? É possível supor que parte de seus conflitos esteja relacionada à censura moral que a sociedade coloca quanto às escolhas que possa vir a fazer em sua vida o que sugere quando fala, simbolicamente sobre os animais: umas pessoas falaram pra mim que ah!, não pega porque isso daí tem veneno e vai, vai fazer mal. Fica claro que ele ainda não encontrou formas de superação pois estava reprimida essa vontade. Apolo inicialmente faz o discurso defensivo: não tenho nojo, não tenho asco, não tenho dificuldade de interação. No entanto, não se permite tocar nas partes moles do animal. Usa expressões como proteção e nega a agressividade projetada no animal: ele não vai pegar a gente [...] não é ofensivo, não tem garras, não tem chifres, armas de predador e evidencia seu medo de ser atacado. Mas seu discurso assume, gradualmente, um tom regressivo e infantilizado enquanto descreve suas experiências. Constrói o relato com frases infantis, permeadas em abundância por diminutivos: bichinhos, casinha, brinquedinho, conchinhas, quando eu era pequenininho, num tom claramente regressivo. Trás como lembrança da infância a necessidade de se adequar às regras sociais e à censura reprimindo seus impulsos: via esses bichinhos, dava vontade de colecionar. Mas vinha sempre a idéia de que eles tinham o habitat deles, né? Então eu não poderia tirar e levar para casa. Projeta no animal um possível sentimento de fragilidade, desproteção e incapacidade pois eles são um tanto frágeis e limitados na locomoção. A exemplo de Dionísio, suas lembranças associadas ao animal remontam a imagens de contaminação e doença. Cori projeta-se nos animais o tempo todo muito embora só os tenha pegado pela concha. Em seu discurso inclui experiências com outros animais que foram significativos durante sua vida. O contato com os escargots fez com que ela evocasse importantes conflitos de sua vida, relacionados à família de origem com a qual não tem assim aquele laço. Identifica-se projetivamente com os animais em sua fragilidade e teve medo de machucar algum deles ao tocálos. Em suas lembranças fica evidente que tem conflitos significativos relacionados ao amor próprio em virtude de ter sido rejeitada pela mãe: [...]quando ela engravidou de mim ela ia fazer outro aborto [...] ela não queria a gravidez. Mesmo tendo sido criada pela avó materna e negando que nutra mágoa para com a mãe afirma: eu não dou o que eu não recebi. Refere que em sua família a situação de abuso sexual já ocorreu e demonstra indignação para com ela. Sente-se desprotegida e o fato de ter sido abandonada pela mãe pode ter contribuído para que se sinta como um cachorro sem dono. Vulcano surpreendeu-se com o animal da pesquisa, e manifesta claramente sua decepção quando afirma que achava que ia ser um rato ou outro bicho. No entanto não hesita e de modo quase automático coloca um em sua mão, fato do qual se arrepende em seguida manifestando nojo por expressões verbais e não verbais. Ao longo do contato trás histórias de sua infância e de seus contatos com familiares e com outros tipos de animais admitindo que quando perdeu seu cão eu não senti muita coisa, mas hoje lembrando eu fico triste, ou seja, ao relembrar sua vida durante experimento, re-significou uma emoção do passado. Suas memórias de contato com animais estão permeadas de imagens relacionadas a morte, violências e perdas e admite que até bicho tem lado afetivo. Sugere que tem alguma dificuldade em suas relações e vínculos uma vez que vê o animal, no caso o cão, como extensão de si mesmo [...] se um dia eu for morar sozinho ou com alguém [...] é impossível ficar sem cachorro, não dá! O cachorro [...]Assim, é condição sine qua non pra felicidade. Vulcano coloca claramente que o animal é uma parte indispensável da relação com outro humano. Sugere fortes condicionantes de gênero em uma família nordestina onde homem não pode demonstrar sua sensibilidade e a sua no caso mostra-se represada Ártemis demonstra uma excitação inicial combinada ao nojo que vai se dissipando à medida que ela interage com os animais. A beleza dos animais percebida por Ártemis vai seduzindo-a num movimento fluído de aceitação. Suas falas partem de um ponto onde infantiliza os animais tratando-os por diminutivos e atingem um ponto mais erotizado quando fala que o toque nele é afrodisíaco, palavra que usa mais de uma vez para se referir aos escargots. Sua oralidade fica evidente quando, mesmo negando que os comeria assim como são, lembra daqueles chocolates que vende no freeshop. Sabe aqueles de conchinha? Lindo! Aquele chocolate muito lindo. Quando eu ver no freeshop eu vou lembrar que eu peguei esse negócio na mão. Quando se interessa pelo valor do animal e até mesmo quando fala de sua exuberância, projetivamente vê neles valores ou aspectos de si mesma, uma vez que se trata de pessoa que cultiva boas coisas, é bonita e atraente. As antenas do animal permitem associações com o órgão sexual masculino que nem você falou que quando a anteninha está pra fora é porque ele já não está mais com medo, né? Com as anteninhas em pé... esse corpo mole. Hahaha. Não sei não. Por isso que... que parece afrodisíaco. Vênus demonstra muito surpresa e desapontamento quando vê os animais. Inicialmente tampa o nariz com as mãos evitando sentir o cheiro e em uma sucessão de expressões faciais e corporais transparece seu nojo intenso. Esta situação é bastante desconcertante e faz com que se sinta pouco à vontade em meio àquelas coisas melecadas, espalhadas e que lhe dão um frio. Suas falas são rápidas, quase monossilábicas numa clara tentativa de evasão. Várias vezes afirma às pesquisadoras: só isso! Refere que tem vontade de vomitar, certamente uma resposta ao seu nojo. No entanto, de modo paradoxal, os animais fazem-na se reportar ao tema da família: Ele é muito família, né? E aí admite algum nível de aproximação e associação: Só isso que mexe muito comigo. Embora tenha admitido isso ainda enquanto estava sendo filmada, somente depois que a câmera é desligada Vênus aborda sentimentos mais profundos. Fica clara sua manipulação e necessidade de proteger-se de situação de maior exposição de sua vida, mas também fica evidente que a situação foi capaz de desencadear nela a necessidade de exteriorizar seus conflitos. Diana dentre os participantes foi a que demonstrou a emoção nojo de forma mais intensa. A expressão do nojo foi evidenciada através de sua face, gestos corporais, atos reflexos de engolir constantemente presentes pela sialorréia intensa, referida inclusive pela participante: [...] eu já tinha repugnância. A emoção forte assim foi de nojo, tanto que a minha salivação já tá assim em abundância. Meu batimento cardíaco alterou. É surpreendente como, apesar da dor no meu peito em virtude do nojo ela admite eu faço sabia? Faço isso com tudo assim. Ela pega no animal pela concha com muito esforço e depois de várias tentativas. Relata que em sua vida certas coisas que outras pessoas tem nojo de fazer ela, mesmo com nojo se sente na obrigação de fazer, se vê como a salvadora só eu tenho que fazer. Essa atitude que assume a coloca em destaque e com responsabilidade diante dos outros, mas também revela a maneira que pode usar para ter poder, ou seja, fazer aquilo que outros não fazem. Suas colocações permitem pensar que por vezes pode se colocar em situações que lhe causem muito desgaste e aversão e nas quais usa todos os recursos para obter sucesso, mas para não demonstrar fragilidade diante do outro, enfrenta alguns limites e quando alcança seu objetivo considera [...]Acho que eu já superei. No entanto ainda percebe em si mesma alguns bloqueios, situações que talvez sejam insuperáveis como tocar nas partes moles. Estaria ela nos dando alguma sugestão sobre suas dificuldades em lidar com o mais sensível? Acho que isso eu não consigo fazer. Mas o contato permitiu a ela que re-significasse experiências anteriores: Não tenho mais repugnância pelo nojento e nem é mais tão feio. Atena pré-estabelece uma recusa a entrar em contato com os animais. Foi nítido seu desejo de escapar àquela situação tão incomoda e desconfortável. Só gente!. Usa essa expressão várias vezes na tentativa de por fim ao experimento. Seu contato é claramente com as pesquisadoras e nem um pouco direcionado ao animal. Faz algumas perguntas e comentários bastante superficiais Vocês levam e trazem essa caixa todo dia? Não tem cheiro, né? Essas são as fezes deles? Que bonitinho, tão namorando, muito provavelmente para quebrar o incômodo silêncio. Admite que sente nojo e provavelmente essa emoção impediu-a de ir adiante. O nojo para Atena foi paralizante. Minerva utiliza-se de racionalizações para dar conta da angústia que o contato com o animal lhe causou. A necessidade de manter o controle foi tal que não chega a admitir verbalmente que está com nojo, limita-se a emitir o som: Begh! No entanto, o contato evoca nela o tema da sexualidade quando questiona: Aqui tem machos e fêmeas? A resposta de que os animais são hermafroditas, mobiliza uma certa curiosidade, porém sem que a emoção apareça claramente: Onde tem um grupo mais masculino eles se estabelecem em alguns femininos, para um equilíbrio ou não? Recusa-se a falar de seus sentimentos sugerindo certa fuga e evitação Quanto aos meus sentimentos assim, é um animal que eu... Que é curioso. Até eu acho interessante, né? Minerva faz questão de não ter contato com os animais, ela diz:[...]...deixa eles lá e, eu aqui. Os sentimentos que por ventura sentiu e não foram manifestados podem ter sido bloqueados conscientemente porque não queria se expor, ou então ainda estão sobre a ação de forte repressão, causando apenas a necessidade clara de fugir e evitar. Por fim, apesar de sua dificuldade em se permitir ao contato direto com os animais foi gentil – para com as pesquisadoras quando racionaliza: Acho que tudo o que é benéfico pra pesquisa científica, eu acho que a gente tem que ajudar, compartilhar, incentivar a participar, né? Por isso eu estou aqui. CAPÍTULO 7 – CONSIDERAÇÕES FINAIS As emoções humanas se constituem, verdadeiramente, num amplo campo de pesquisa. Quanto mais nos debruçamos sobre elas, mais temos a certeza de que muito ainda temos a pesquisar. De tudo o que pudemos conhecer ao longo de nossa pesquisa, a mais verdadeira é que só tocamos a superfície da infinidade de emoções que fazem parte da vida daqueles que gentilmente se dispuseram a nos ajudar. A observação do contato dessas pessoas – humanos animais – com os escargots – algumas vezes humanizados – nos permitiu atingir o objetivo de verificar quais emoções esse contato desperta. Sem dúvida, a emoção mais marcante foi o nojo e pudemos conferir o que Darwin, Freud, Fenichel e tantos outros afirmaram acerca dele. Com certeza o nojo é uma experiência que surge em tempos remotos de nossas vidas. As falas associadas ao nojo revelam, por vezes, sua associação direta com conteúdos da sexualidade oral e genital, outras vezes refletem a influência do familiar – pai, mãe, tios, etc. Alguém, de alguma forma, acaba por nos influenciar e reforçar nossas reações de nojo. Mas não foi somente do nojo que nossos participantes falaram e isso acabou por nos surpreender. Eles falaram de suas memórias, muitas carregadas de dor e sofrimento, nos levaram de volta ao seu passado contando suas aventuras e viagens por lugares carregados de emoção, nos contaram de suas experiências da infância algumas delas não tão felizes. Ouvimos relatos de abandono, de medo, de solidão. Tudo isso nos leva a acreditar que o contato com o escargot facilitou suas revelações. No entanto não deve ter sido só isso. Preferimos crer que nossos participantes, especialmente aqueles que mais se abriram conosco, falaram porque sentiram confiança e espaço para fazê-lo. Porém não podemos afirmar que qualquer pessoa que não conhecesse previamente as pesquisadoras se comportaria da mesma forma e com a mesma disposição a se expor. Assim o experimento necessitaria ser repetido inúmeras vezes até que pudéssemos verificar sua validade para compreender – e diagnosticar? – as emoções humanas. Com relação ao animal foram várias as associações de tipo mais negativo o que nos leva a pensar que a cultura – ao menos a demonstrada pelos participantes – ainda não valoriza essa espécie e muitos sequer admitem o fato dele poder fazer parte do cardápio. As intervenções participantes da com pesquisa, o animal escargot, condições propícias deram a aos retomada indivíduos do seu desenvolvimento emocional bloqueado, a fim de que ele pudesse transpor as limitações impostas pelo seu eu. Estes dados estão em sintonia com os encontrados por Martins et al 2006. Registram-se outros achados implícitos nesta pesquisa, quais sejam os de estabelecimento de vínculos e os de relações de confiança que contribuíram para a exteriorização dos sentimentos. (Martins, 2006) Desse modo, espera-se que esta pesquisa contribua para a produção científica da área não apenas no sentido de reduzir a insuficiência de dados a respeito do tema e auxiliar os profissionais que atuam na área de zooterapia e área da saúde em geral. (Martins, 2006) Por fim nosso estudo permitiu-nos, efetivamente, admitir que a utilização dos animais para o conhecimento dos humanos é algo possível e que demos um passo, mesmo que pequeno, na direção de ampliar os horizontes da pesquisa em Psicologia. REFERÊNCIAS ANZIEU, D. Os Métodos Projetivos. 2º ed. Rio de Janeiro: Editora Campus Ltda, 1979. BLACKBURN, S. Dicionário Oxford De Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997.114p. DARWIN, C. A Expressão Das Emoções No Homem E Nos Animais. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. 241p. DARWIN, C. A Origem Das Espécies. São Paulo: Martin Claret, 2006. DOTTI, J. Terapia & Animais. São Paulo: Noética Editora, 2005. 35p. FACHIN, O. Fundamentos de Metodologia. 4º ed. 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