UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA CLÍNICA
.
HEITOR PONTES HIRATA
IMPLICAÇÕES DO BULLYING NO STRESS EM ESCOLARES DE ENSINO
FUNDAMENTAL E MÉDIO
Rio de Janeiro
2008
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HEITOR PONTES HIRATA
IMPLICAÇÕES DO BULLYING NO STRESS EM ESCOLARES DE ENSINO
FUNDAMENTAL E MÉDIO
Trabalho de monografia apresentado ao
departamento de psicologia clínica como parte dos
requisitos para obtenção do título de psicólogo
pelo curso de formação de psicólogo da
Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Orientadora: Profª Drª Lucia Emmanoel Novaes
Malagris
Rio de Janeiro, 08 de Agosto de 2008.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA CLÍNICA
IMPLICAÇÕES DO BULLYING NO STRESS EM ESCOLARES DE ENSINO
FUNDAMENTAL E MÉDIO
Trabalho
de
monografia
apresentado ao departamento de
psicologia clínica como parte
dos requisitos para obtenção do
título de psicólogo pelo curso de
formação de psicólogo da
Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
Rio de Janeiro, _____ de Agosto de 2008.
Conceito e/ ou grau: ___________
____________________________________________________
Profª Drª Lucia Emmanoel Novaes Malagris
Orientadora
____________________________________________________
Profª Ana Lila Lejarraga
Chefe do Departamento de Psicologia Clínica
____________________________________________________
Heitor Pontes Hirata
Autor
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DEDICATÓRIA
A todas as pessoas que já enfrentaram ou enfrentam o problema do bullying em suas vidas.
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AGRADECIMENTOS
Aos meus pais Ilma e Shigueru por todo apoio ao longo do curso de graduação, seja
ele moral ou financeiro.
Aos meus irmãos Breno e Ulisses Pontes Hirata pela ajuda nos momentos em que
precisei.
À minha orientadora Lucia Emmanoel Novaes Malagris que sempre me incentivou
e reconheceu o meu trabalho seja nas monitorias ou no estágio em pesquisa.
Ao meu supervisor de estágio Bernard Pimentel Rangé pelas orientações valiosas
em termos profissionais e possibilidade de crescimento dentro da área de clínica cognitivocomportamental.
À professora Hebe Signorini Gonçalves pela indicação de algumas leituras e por me
ajudar a pensar o conceito de violência de um outro modo.
Ao Dr. Aramis A. Lopes Neto pela gentileza e disponibilidade, além de também
pelo livro de sua autoria que foi de grande ajuda na realização deste trabalho.
Aos meus pacientes da Divisão de Psicologia Aplicada da UFRJ sem os quais eu
nunca teria obtido a experiência em psicologia clínica.
Às minhas amigas, amigos e colegas de estágio ao longo do tempo pelo
companheirismo e cumplicidade. Em especial para Eduarda Larrúbia Franco, Nivea Maria
Machado de Melo, Ana Carolina de Sousa Santos Pinto, Pamela Abdon Guimarães
Pimentel, Sthefani Nogueira Saraiva, Camila Martiny Costa, Lianna de Oliveira Nunes,
Jessye Almeida Cantini, Débora Ventura Bezerra e Emmy Uehara Pires.
Aos colegas da turma 2003/01 que estiveram mais próximos nesses anos de
faculdade. Em especial para Mariana Mendes Vieira de Sousa, Juliana Hampshire C.S.
Lopes, Pricila Rivera Di Tomasso, Bárbara Jéssica P. dos Reis, Daniele Muniz de Lima,
Angela Viviane S. de Oliveira e Priscilla Lourenço Leite.
Aos colegas mais novos de outros períodos Felipe Nunes de Lima e Viviane Bello
Cardoso pela amizade ao longo de parte do percurso com os votos de sucesso quando se
tornarem psicólogos.
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EPÍGRAFE
Katie abriu a porta da sala de aula e
entrou. Enquanto ia com Sophie para as
carteiras, sentiu um soco nas costas e
cambaleou para frente, quase caindo.
- Você se acha o máximo né? Rosnou
uma voz atrás dela, e o coração de Katie
encolheu. Shaneek.
Um segundo depois sentiu as lágrimas
brotando nos olhos enquanto a mão de
Shaneek agarrava seu cabelo e o puxava com
uma violência selvagem.
- Eu já não disse? Quando eu te chamar
você tem que vir! – rugiu Shaneek.
Além da dor, a mente de Katie estava
num rodamoinho. O que tinha feito agora para
irritar Shaneek?
- Quebra a cara dela! – veio o grito de
Carleen, e então Katie sentiu uma dor aguda
na perna quando Shaneek chutou-a com força.
Por favor, me ajude, pensou Katie.
Alguém por favor me ajude. Olhou as outras
garotas na sala, mas elas estavam desviando o
olhar. Sophie. Becky. Até Alisa. Alisa, que
Katie achava que gostava dela.
Outro chute e Katie gritou de dor.
- Como eu disse que era seu nome? –
perguntou Shaneek.
- Galinhona – murmurou Katie,
aterrorizada.
Não conseguia entender. O que estava
acontecendo? Por que os apelidos? Por que
aqueles ataques?
- Me deixe em paz... Por favor –
implorou.
A única resposta foi um tapa na cara,
dado por Shaneek. E depois outro. E em
seguida um soco que a lançou no chão. Dor.
Tudo era dor. Estava no inferno.
(Clarke, 2006, p. 13-14).
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RESUMO
O fenômeno bullying se caracteriza por atos violentos que ocorrem de forma repetitiva
causando desequilíbrio de poder entre pares. O estudo sobre o tema começou na década de
60, estendendo-se ao restante da Europa nos anos seguintes. No Brasil, as primeiras
importantes pesquisas iniciaram com cerca de quinze a vinte anos de atraso. No entanto, na
última década os trabalhos a respeito do tema têm crescido em quantidade, o que aponta um
olhar mais consistente da comunidade acadêmica em relação a este assunto. Estudo recente
realizado pela ABRAPIA aponta que 40,5% de estudantes dentro de uma amostra
significativa de escolas do Rio de Janeiro estão envolvidos com o fenômeno de alguma
forma, o que corrobora a importância de se lançar um olhar sobre tema. O presente trabalho
se constitui em uma revisão bibliográfica de parte da literatura existente sobre bullying e
correlaciona o fenômeno com o stress, um outro assunto que tem sido muito desenvolvido
nos últimos anos no Brasil e no mundo. As repercussões nas diferentes áreas durante a
infância e adolescência são abordadas. Serão também discutidas as possíveis conseqüências
do bullying na idade adulta à luz das teorias que embasam as terapias cognitivocomportamentais. Tais conseqüências estão também relacionadas à formação de crenças
que podem aumentar a predisposição do indivíduo a interpretar situações de modo
disfuncional, o que constitui um estressor interno. Por último é feito um breve apanhado
sobre intervenções anti-bullying em contexto escolar e clínico com enfoque cognitivocomportamental.
Palavras-chave: Bullying, stress, estudantes, conseqüências
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ABSTRACT
The bullying phenomenon is characterized by violent acts that occur on a repetitive causing
imbalance of power between peers. The study on the topic began in the decade of 60,
extending to the rest of Europe in the following years. In Brazil, the first major research
started with about fifteen to twenty years of delay. However, in the last decade the work
concerning the issue are growing in number, which indicates a more consistent look of the
academic community regarding this matter. A recent study conducted by ABRAPIA
indicates that 40.5% of students in a significant sample of schools in Rio de Janeiro are
involved with the phenomenon in any way, which confirms the importance of launching a
glance at issue. This work is a literature review of the existing literature on bullying and
correlates the phenomenon with stress, another issue that has been developed in recent
years in Brazil and the rest of the world. The impacts on different areas during childhood
and adolescence are discussed. Will be also discussed the possible consequences of
bullying in adulthood in the light of the theories that embase the cognitive-behavioral
therapy. Such consequences are also related to the formation of beliefs that may increase
the willingness of individuals to interpret situations so dysfunctional, which is an internal
stressor. Lastly will be done a brief look at anti-bullying interventions in school and clinical
contexts with focus on cognitive-behavioral approach.
Key-words: Bullying, stress, students, consequences
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SUMÁRIO
Introdução___________________________________________________________11
1. Aspectos conceituais acerca do bullying_________________________________13
1.1. Definição de bullying____________________________________________ 13
1.2. Modalidades de bullying__________________________________________15
1.2.1. Bater, surrar e outras agressões físicas__________________________15
1.2.2. Xingar e apelidar__________________________________________ 15
1.2.3. Ameaçar e intimidar_______________________________________ 16
1.2.4. Excluir e isolar____________________________________________ 16
1.2.5. Quebrar ou furtar objetos___________________________________ 17
1.2.6. Humilhar e causar constrangimento em público__________________ 17
1.2.7. Extorquir________________________________________________ 17
1.2.8. Cyberbullying_____________________________________________17
1.3. Histórico do fenômeno___________________________________________ 18
1.4. Aspectos culturais e sociais________________________________________20
1.5. Atores sociais envolvidos no bullying________________________________23
1.6. Raiva, hostilidade e bullying_______________________________________26
2. Conseqüências do bullying na infância e adolescência______________________ 28
2.1. Área social_____________________________________________________28
2.2. Área familiar___________________________________________________ 30
2.3. Área acadêmica_________________________________________________31
2.4. Área da saúde__________________________________________________ 31
3. O stress___________________________________________________________33
3.1. Definição de stress______________________________________________ 33
3.2. Fases do stress__________________________________________________35
3.3. O stress na criança e no adolescente_________________________________36
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3.4. As possíveis conseqüências do stress________________________________38
3.4.1. Conseqüências físicas______________________________________ 38
3.4.2. Conseqüências psicológicas__________________________________40
4. Implicações entre bullying e stress_____________________________________ 42
5. Conseqüências na vida adulta_________________________________________44
5.1. Condicionamento clássico________________________________________44
5.2. Condicionamento operante_______________________________________ 45
5.3. Teoria social cognitiva__________________________________________ 46
5.4. Modelo cognitivo______________________________________________ 47
5.5. Teoria dos esquemas____________________________________________50
5.5.1. A desconexão/ rejeição e o bullying escolar____________________ 52
5.5.2. Autonomia/ desempenho prejudicados e o bullying escolar________ 52
5.5.3. Limites prejudicados e o bullying escolar______________________ 53
5.5.4. Orientação para o outro e o bullying escolar____________________ 53
5.5.5. Supervigilância/ inibição e o bullying escolar___________________ 54
6. Intervenções para casos de bullying na infância e adolescência______________ 55
6.1. O programa de prevenção e combate ao bullying de Dan Olweus_________ 55
6.1.1. Medidas aplicadas à escola de modo geral______________________56
6.1.2. Medidas aplicadas em sala de aula____________________________57
6.1.3. Medidas individuais_______________________________________ 57
6.2. Programas brasileiros____________________________________________58
6.2.1. Educar para a paz__________________________________________58
6.2.2. Programa de redução do comportamento agressivo entre
estudantes_______________________________________________ 59
6.3. A terapia cognitivo-comportamental e o bullying_______________________60
6.4. O treino de controle do stress e o bullying____________________________ 64
7. Conclusão________________________________________________________ 66
Referências Bibliográficas______________________________________________ 68
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INTRODUÇÃO
O fenômeno bullying, apesar de ser muito estudado em escolas, pode ocorrer em
diversos lugares ou meios sociais como empresas, hospitais, casas de repouso, prisões,
família, relacionamentos etc (Middelton – Moz & Zawadski, 2007). Ele sempre existiu em
todos os tipos de instituição, inclusive na escola desde a sua criação (Fante & Pedra, 2008).
No entanto, o estudo sobre o fenômeno começou a ganhar dimensões a partir de casos
ocorridos no início da década de 1980, nos países escandinavos, especialmente na Noruega,
onde foram reportados casos de suicídios que ocorreram provavelmente em decorrência do
bullying (Fante, 2005). Desde então, os estudos sobre o fenômeno começaram a ser feitos.
Eles tiveram como pioneiro o pesquisador Daniel Olweus.
Nos dias atuais, diversos casos de bullying são noticiados pela mídia. Se fizermos
uma busca por notícias utilizando as palavras chave “notícias” e “bullying”, encontraremos
mais de 700.000 notas em jornais ou revistas eletrônicos. Destas, muitas noticiam casos de
mortes como ocorreu no ano de 1999 no condado de Jefferson, Colorado, Estados Unidos
no Instituto Columbine ou conforme aconteceu recentemente no caso do estudante sulcoreano que matou 32 pessoas na Universidade de Virginia, EUA. O grande número de
casos reportados pela mídia reflete não só a importância do fenômeno e suas
conseqüências, assim como a sua alta freqüência nas escolas de todo o mundo. Pesquisas
realizadas na Espanha e em países da América Latina como o Brasil, México, Argentina e
Chile apontaram que o próprio Brasil é o país que mais possui ocorrências de bullying
escolar (Fante & Pedra, 2008). Isto nos permite refletir o quanto nosso país carece de
políticas públicas de combate ao fenômeno e o quanto nossa cultura auxilia na perpetuação
dos comportamentos violentos entre escolares. A ocorrência de violência nas escolas
tornou-se, antes de tudo, um grave problema social (Abramovay & Rua, 2004).
A elaboração deste trabalho se revelou importante principalmente pela escassez de
material sobre o tema na área de psicologia clínica e da saúde no Brasil principalmente.
Muitos trabalhos têm sido desenvolvidos a respeito do fenômeno bullying na área de
educação, sociologia, serviço social e até mesmo da psicologia dentro de abordagens como
a sócio-histórica e psicanalítica. A compreensão do tema do ponto de vista cognitivocomportamental ainda é pouco estudada. Este material poderá servir de apoio para estudos
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futuros. Pretendeu-se, portanto, fazer uma revisão bibliográfica e pontuar alguns
questionamentos a respeito da temática do bullying e suas implicações no stress em
crianças e adolescentes durante a idade escolar.
A primeira parte deste trabalho abordará os aspectos conceituais do fenômeno
bullying. Esta sessão irá descrever conceitos, histórico e outros pontos estruturais que
ajudam no entendimento do tema. O segundo bloco de informações será dedicado às
possíveis conseqüências do bullying na infância e adolescência. Em seguida será abordado
o stress, suas repercussões em crianças e adolescentes e relações com o bullying. O capítulo
seguinte traçará interseções entre o fenômeno e a psicopatologias possíveis na idade adulta
à luz dos conceitos da terapia cognitivo-comportamental. Por fim, propostas de
intervenções em âmbito escolar já reconhecidas, incluindo as cognitivo-comportamentais,
serão apresentadas de acordo com a bibliografia existente sobre o tema.
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1. ASPECTOS CONCEITUAIS ACERCA DO BULLYING
1.1 Definição de bullying
A palavra bullying é de origem inglesa, não possuindo uma tradução exata para a
língua portuguesa. Em outros idiomas pode ser traduzida conforme menciona Fante (2005)
quando pontua que o termo mobbing tem sido utilizado em países como Noruega e
Dinamarca e Mobbning na Finlândia e Suécia. Em vários países do mundo há um termo
correspondente ao bullying: harcèlement quotidién na França; prepotenza na Itália; yijime
no Japão; agressionen unter shülern na Alemanha; acoso y amenaza entre escolares na
Espanha e, em Portugal, maus-tratos entre pares. Na maioria dos países, incluindo o Brasil
e os Estados Unidos, o termo empregado é bullying (Fante, 2005).
Diversos autores definem o vocábulo, encontrando-se definições muito parecidas.
Podemos encontrar na maior parte da literatura o significado da palavra como sendo
“comportamentos agressivos entre pares ocorrentes de forma repetitiva, ao longo do tempo,
com intenção de causar danos físicos e/ ou psicológicos a alguém. Tal agressão pode
ocorrer individualmente ou em grupo” (Olweus, 1993, p.9). Por esta definição ser a
utilizada pelo psicólogo norueguês Dan Olweus, que iniciou as pesquisas sobre o fenômeno
no contexto escolar, muitos outros autores adotaram-na. Constantini (2004) enfatiza a
importância de se distinguir o bullying de conflitos ou brigas normais da idade escolar. Os
verdadeiros atos de intimidação, preconceitos e ameaças ocorrem de forma distinta e
costumam ser voltados para indivíduos mais vulneráveis que, impossibilitados de se
defender, acabam sendo levados a condições de sofrimento psicológico, isolamento e
marginalização (Constantini, 2004). Tal fato nos possibilita dizer que para determinado ato
ser considerado bullying, é necessário haver desequilíbrio de poder (Fante & Pedra, 2008).
Os comportamentos que compreendem atos de bullying podem ser variados. Entre
eles estão: xingamentos, humilhação, propagação de boatos ou fofocas, exposição ao
ridículo, transformação em bode expiatório, acusações, isolamento, socos, agressões,
ameaças, ofensas de cunho sexual, étnico, de gênero e orientação sexual (Middelton-Moz &
Zawadski, 2007). Teixeira (2006) acrescenta a esta lista os comportamentos de apelidar,
perseguir, furtar e quebrar objetos pessoais. Apesar do foco deste, como em muito outros
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trabalhos sobre o tema, ser em bullying no contexto escolar, o fenômeno pode se apresentar
em diversos espaços onde haja relações interpessoais como no trabalho (Hadikin &
O’Driscoll, 2000), hospitais, casas de repouso, prisões, quartéis (Constantini, 2004),
relacionamentos (Middelton-Moz & Zawadski, 2007) e famílias – aparecendo nas
pesquisas, muitas vezes, como violência familiar.
A forma de apresentação do fenômeno pode ser diferente conforme o sexo de quem
o pratica. A participação dos meninos nos atos de bullying tem se mostrado maior de
acordo com índices de pesquisas em países que desenvolvem estudos sobre o assunto
(Fante & Pedra, 2008). No entanto, em pesquisa realizada pela Associação Brasileira de
Proteção à Infância e Adolescência (ABRAPIA), no município do Rio de Janeiro, com
5482 alunos, os meninos obtiveram apenas 1% a mais em participação no fenômeno, o que
sugere que as meninas também possuem expressiva representação em relação ao bullying.
Simmons (2004) descreve uma série de atitudes que são tomadas pelas meninas ao
praticarem o bullying como boatos, fofocas, comportamentos não-verbais que sugerem
reprovação etc. A agressão feminina é mais oculta e fere mais a auto-estima aos poucos.
Algumas vezes elas podem utilizar a amizade que têm umas com as outras para,
futuramente, praticarem o bullying (Simmons, 2004). A autora ressalta, no entanto, que
nem todas as amizades femininas têm este destino, mas que, em estudos realizados por ela,
essas evidências se mostraram importantes (Simmons, 2004). Entre os meninos, observa-se
que os comportamentos agressivos estão mais relacionados com ações físicas (bater, surrar,
empurrar etc) e verbais (xingar, humilhar, ameaçar), o que acaba sendo também um dano
psicológico (Fante, 2005). Garbarino, Eckenrode e Bolger (2000) escreveram sobre o
maltrato psicológico no contexto familiar. Para os autores, este vocábulo é bastante difícil
de se definir. No entanto, algumas condutas podem ser atribuídas ao termo: desdenhar,
aterrorizar, isolar, explorar, negar resposta emocional ou descuidar (Garbarino, Eckenrode
& Bolger, 2000). Apesar do trabalho dos autores ser voltado aos estudos em violência
familiar, podemos trazer esta contribuição para o campo escolar, tendo em vista que a
família e a escola são duas instituições essenciais para desencadear os processos evolutivos
dos indivíduos (Dessen & Polonia, 2007). A violência psicológica, portanto, pode resultar
na destruição de uma série de competências da criança que varia desde capacidade de
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comunicação até sentimento de confiança em si mesmo (Garbarino, Eckenrode & Bolger,
2000). Esta questão será abordada mais adiante.
1.2. Modalidades de bullying
A seguir serão apresentados brevemente alguns tipos de comportamento
relacionados ao bullying. Estas são algumas das principais manifestações. Outras formas
específicas podem ocorrer em qualquer contexto escolar.
1.2.1. Bater, surrar e outras agressões físicas
É um comportamento mais típico dos meninos. Estes aproveitam, por serem mais
fortes do que suas vítimas, para realizar as agressões físicas (Fante, 2005). Dentro da
pesquisa realizada pela ABRAPIA em 2002 e 2003 com 5.482 estudantes da rede pública e
particular, o comportamento de agredir apareceu em 21,3% dos casos totais de bullying de
acordo com respostas dos autores (Lopes Neto & Saavedra, 2008). Este dado é importante
para verificarmos que a agressão física é bastante prevalente. Os pais podem verificar se
algo neste sentido está ocorrendo vendo se os filhos apresentam ferimentos não justificados
ou roupas constantemente rasgadas ou danificadas.
1.2.2. Xingar e apelidar
São formas muito comuns de bullying. Vale relembrar que estas formas de agressão
verbal de fato só podem ser consideradas como bullying caso ocorram de forma repetitiva e
deliberada causando desequilíbrio de poder conforme definição de Olweus (2004).
Algumas diferenças são importantes de serem colocadas aqui. A primeira é entre o apelido
aceito por quem o recebe como uma forma amigável de ser tratado. Caso o dono do apelido
não se importe ou concorde com o mesmo, ou até goste, não há desequilíbrio de poder que
feche um critério diagnóstico de bullying (Olweus, 2004.). Dificilmente um apelido muito
pejorativo será aceito por quem o recebe, o que faz geralmente com que este acabe sendo
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considerado como bullying. Cerca de 51, 7% dos autores do fenômeno utilizam este recurso
intimidador (Lopes Neto & Saavedra, 2008).
1.2.3. Ameaçar e intimidar
A ameaça e intimidação são duas formas de bullying que geralmente vêm
acompanhadas de outras modalidades. A presença do colega agressor por si só é um
elemento intimidador. A ameaça pode aparecer como um artifício do agressor para que sua
vítima não conte nada a ninguém. Pode ser estendida às testemunhas também. A
intimidação é uma das principais responsáveis pelo comprometimento da qualidade do
clima escolar (Fernández, 2005), uma vez que o torna tenso, o que acaba por ser uma fonte
de stress importante.
1.2.4. Excluir e isolar
A exclusão é um ato de bullying silencioso, difícil de ser percebido por quem vê de
fora e, portanto, pouco provável de ser denunciado. É geralmente um comportamento
realizado por meninas (Simmons, 2004). Os impactos são exclusivamente psicológicos e
fazem com que a vítima não se sinta mais pertencente ao grupo. Com o tempo ela pode
acabar se isolando mais o que pode ser um facilitador para outras formas de bullying, uma
vez que o fenômeno ocorre com mais freqüência em indivíduos isolados socialmente
(Constantini, 2004).
O comportamento de isolar pode ocorrer sempre que uma criança é estigmatizada
pelos demais seja por uma característica em especial ou por ser diferente da maioria.
Formas corriqueiras de isolar são: deixar de fazer trabalhos com a vítima, não falar com ela,
impedir que ela se expresse, ameaçar amigos em potencial da vítima forçando-os a não se
tornarem amigos da mesma etc.
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1.2.5. Quebrar ou furtar objetos
Esta modalidade aparece como menos freqüente de acordo com a pesquisa da
ABRAPIA. Cerca de 4, 8% dos agressores admitiram realizar esse tipo de comportamento.
A quebra ou perda constante de objetos é um fator bastante visível para os pais no sentido
de desconfiar que os filhos estejam passando por situações de bullying na escola (Teixeira,
2006). Estas podem estar acompanhadas de outras formas de agressão.
1.2.6. Humilhar e causar constrangimento em público
É uma prática que envolve principalmente exposição do outro a situações muito
desagradáveis e constrangedoras, tendo seu efeito potencializado caso seja em público. Há
notícias em relatos de autores sobre bullying que é legitimado por professores (Chalita,
2008). Nestes casos, as marcas psicológicas da humilhação podem se tornar muito mais
profundas, uma vez que o professor, como figura de autoridade que representa, participa da
agressão (Chalita, 2008). A própria omissão dos professores frente ao bullying pode ser
muito maléfica. Com isso há o reforço da turma face à abstenção ou aprovação do educador
em relação ao bullying.
1.2.7. Extorquir
A extorsão pode ocorrer como uma forma de ameaça, tendo a diferença de envolver
dinheiro. Caso a vítima não traga certa quantia ou lanches para o (s) agressores, ela sofrerá
conseqüências que podem variar da agressão física à difamação ou difusão de boatos pela
escola ou em meios digitais (Fante, 2005).
1.2.8. Cyberbullying
O cyberbullying consiste na utilização dos dispositivos tecnológicos como Internet,
celulares, websites, blogs etc para divulgar conteúdos difamatórios ou que provoquem malestar em uma vítima (Fante & Pedra, 2008). Os episódios causados pelo cyberbullying
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podem ser particularmente humilhantes uma vez que um grande número de pessoas tem
acesso às imagens, fofocas ou difamações propagados pela Internet. Além disso, a agressão
pode ser feita de forma anônima, o que torna a descoberta dos bullies muito mais difícil
(op.cit.). Recursos como os blogs, e-mails, Orkut e Messenger são verdadeiras armas nas
mãos de crianças ou adolescentes que desejam ferir ou causar constrangimento em colegas
sem se expor. Desta forma, mensagens difamatórias, ofensas on-line e montagens
desrespeitosas podem circular com grande facilidade dentro da comunidade escolar (Lopes
Neto & Saavedra, 2008).
O cyberbullying, portanto, acaba por ser uma continuação do bullying ocorrido nas
escolas, uma vez que atinge a vítima dentro de sua própria residência. Por ser algo muitas
vezes realizado de forma anônima, impede completamente que a vítima se defenda, fazendo
com que ela seja alvo de chacota na escola por conta também do que foi colocado na rede a
seu respeito (Fante, 2007).
1.3. Histórico do fenômeno
Apesar de estar sendo tratado com mais atenção na atualidade, o bullying não é um
fenômeno tão recente. Fante (2005) considera esta temática tão antiga como a própria
escola. A partir da década de 1970, os primeiros estudos foram realizados na Europa, mais
especificamente na Suécia, onde os problemas entre agressores e vitimas na escola foram
estudados. A grande repercussão do estudo fez com que os demais países escandinavos
olhassem para a questão que, então, passou a ser considerada merecedora de mais atenção.
No início da década de 1980, um jornal noticiou o suicídio de três crianças com idades
entre 10 e 14 anos. Testemunhas confirmaram o fato das crianças terem sido submetidas ao
bullying. O caso gerou grande revolta na população norueguesa, o que fez o Governo
realizar uma campanha nacional contra problemas entre agressores e vítimas na escola. Dan
Olweus, também na Noruega, desenvolveu uma grande pesquisa envolvendo alunos, pais e
professores. A finalidade era estudar o contexto no qual a criança estava inserida e, com
isso, diagnosticar e diferenciar casos de bullying de brincadeiras corriqueiras típicas do
desenvolvimento do indivíduo. Os resultados apontaram para uma proporção de uma a cada
sete crianças como sendo vítima de bullying. Tal resultado incentivou o governo a
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promover campanhas anti – bullying que reduziram em 50% os casos do fenômeno nas
escolas norueguesas. Este fato instigou governantes de outros países da Europa a criarem
programas de intervenção nas escolas de suas federações.
Em 1999, nos Estados Unidos, os estudantes Eric Harris, 18 e Dylan Klebold, 17,
realizaram um massacre na Columbine High School, uma escola secundária pública num
subúrbio de Denver, Colorado. Foram mortos 12 alunos e um professor, além de outras
pessoas serem feridas. Após a chacina, os estudantes cometeram suicídio. Especulam-se
diversas causas a respeito do ocorrido, mas poucas são as versões que tratam da questão do
bullying neste caso (Fante, 2005). Harris e Klebold pertenciam a famílias de classe média
alta, eram adolescentes considerados típicos dentro da escola. No entanto, a falta de gosto
pelos esportes, além das provocações e ridicularizações por parte dos atletas da escola,
geraram repercussões maiores que o esperado. Desta forma os alunos traçaram um plano de
vingança de modo a extravasar seu ódio e revolta. Alguns atletas que zombavam da dupla
foram executados. Outras vítimas que pouca ou nenhuma relação tinham com a história,
acabaram mortas ou feridas.
Os EUA é um país que carrega um grande número de mortes dentro de escolas
(Marques, 2007). Apenas no ano letivo de 1997-1998 ocorreram 42 homicídios em escolas
americanas (Fernandes, 2004). O massacre de Columbine não foi o primeiro, apesar de ter
sido um dos mais divulgados até mesmo através do documentário Tiros em Columbine do
cineasta Michael Moore (2002).
No Brasil, Fante (2005) cita dois casos ocorridos nos estados de São Paulo e da
Bahia, nos municípios de Taiúva e Remanso, respectivamente. No primeiro, ocorrido em
2003, um rapaz de 18 anos foi até a escola onde estudava, feriu oito pessoas incluindo
alunos, professores e funcionários. Em seguida se suicidou. Ele fora vítima de colegas
durante mais de uma década. Um ano depois, na cidade baiana Remanso, um adolescente
de 17 anos, que era humilhado constantemente, matou duas pessoas e feriu outras três.
Antes de se suicidar foi desarmado. Ele sofria bullying (Fante, 2005).
Outras tragédias semelhantes já ocorreram em diversas outras partes do mundo
incluindo países como Canadá, Argentina, Alemanha e Espanha. Algumas autoridades já
estão desenvolvendo programas de prevenção e intervenção quanto ao bullying. No entanto,
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infelizmente, muitos lugares ainda carecem de programas de qualidade para se enfrentar o
fenômeno, o que possibilita o aumento do histórico deste tema. É o caso do Brasil.
1.4 Aspectos culturais e sociais
Artigos e capítulos de livros há algum tempo já trazem discussões e reflexões acerca
dos componentes culturais e sociais que perpassam pela temática do bullying. Alguns
tópicos relativos ao campo social contribuem com a manifestação do fenômeno como
famílias pouco estruturadas emocionalmente, perda dos valores sociais, exacerbação do
consumismo e do valor estético, estimulação da competitividade exagerada cada vez mais
cedo etc (Oda, 2006). Para um desenvolvimento mais completo a respeito deste tópico, fazse necessário recorrer a alguns autores das ciências sociais, em especial da antropologia e
sociologia.
Homens de culturas diferentes têm uma percepção distinta a respeito dos fatos, o
que faz com que pessoas de outras partes do mundo pensem de formas alternativas sobre
uma série de costumes (Laraia, 1986). A cultura sendo um importante componente a
respeito de nossa visão de mundo, certamente também pode influir na maneira como as
minorias são definidas e tratadas dentro de determinada sociedade. Isto está na base da
discussão sobre o fenômeno bullying, uma vez que a realização de comportamentos
violentos na escola estão ligados, em parte, a aspectos sócio-culturais nos quais os
indivíduos estão imersos (Beaudoin & Taylor, 2006).
Como anteriormente enfatizado, o bullying se dá principalmente por desequilíbrio
de poder, ou seja, quando o mais forte atua sobre o mais o que aparenta ser mais fraco
(Fante, 2005). No Brasil, a origem ou posição social são fatores que influenciam muito na
maneira como as pessoas são vistas ou tratadas. Como afirma Almeida (2007, p. 75) “cada
um deve saber qual o seu lugar na sociedade e se comportar de acordo com ele”. Como
muitos valores são passados entre as gerações, as relações de poder existentes na sociedade
são transmitidas e interiorizadas pela criança, tendo a escola um importante papel neste
processo (Durkheim, 1978). O sociólogo francês Pierre Bourdieu colocou esta questão
através da idéia de que a escola tende a promover a conservação social, ou seja, “fornece a
aparência de legitimidade às igualdades sociais” (Bourdieu, 1998, p.41). Tal transmissão de
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valores, em alguns casos, pode contribuir para a manutenção de uma cultura do desrespeito
às diferenças. Alguns discursos culturais são colocados por Beaudoin e Taylor (2006) como
presentes na prática do bullying. São eles: o patriarcalismo, o individualismo, o capitalismo,
o adultismo, o racismo, a homofobia e o sexismo (Beaudoin & Taylor, 2006).
O patriarcado, presente na maior parte das culturas em todo o mundo, possivelmente
atua sobre as causas do bullying em relação aos meninos. Um discurso patriarcalista
defende a idéia de que pessoas do sexo masculino precisam demonstrar poder, força e
autoridade. Assim, comportamentos do tipo “durão”, não-sentimental, independente e
pouco ligado a cuidados são incentivados (Beaudoin & Taylor, op.cit.). Como já vimos na
definição de bullying, há desequilíbrio de poder, onde um indivíduo supostamente mais
forte domina um outro mais fraco. Estabelece-se, assim, uma relação de autoridade e
domínio, presente em um discurso patriarcalista.
Já o individualismo concentra-se na idéia da satisfação das necessidades individuais
em detrimento dos interesses do outro. O sucesso pessoal, a privacidade e o locus de
controle interno são muito valorizados (op.cit.). Sennett (1988) explora a questão da
individualidade através do que denominou “tiranias da intimidade”. O sociólogo norteamericano explora desde o século XVIII como se davam as percepções a respeito do
homem dentro do domínio público. Há a ênfase em relação à crítica ao modelo liberal e à
doutrina capitalista que intensificaram as relações entre sujeito e objeto, constituindo assim
o declínio da vida pública. Deste modo, há a necessidade do homem moderno em
demonstrar dentro da esfera pública traços de sua vida íntima, ou seja, aquilo que ele
representa como indivíduo (Sennett, 1988). Tal necessidade resulta em um narcisismo
desvairado dentro da sociedade onde vivemos. Tamanho enfoque no “eu” provavelmente
causa nas pessoas déficits importantes em habilidades sociais empáticas. Estas, por
definição, são expressas como resposta a demandas que se constituem pela necessidade
afetiva alheia (Del Prette & Del Prette, 2004). A empatia possui grande importância no que
diz respeito ao estabelecimento de relações saudáveis e ajustamento psicossocial. A sua
falta constitui um agravante dos comportamentos anti-sociais e agressivos (Pavarino, Del
Prette & Del Prette, 2005).
Um outro discurso cultural importante que está presente na manutenção do bullying
é o adultismo, que atribui demasiado poder aos adultos sobre as crianças, fazendo com que
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elas não tenham espaço para se expressar, gerando rebeldia e agressividade (Beaudoin &
Taylor, 2006). O capitalismo, por sua vez, é a doutrina econômica dominante no mundo e
,portanto, presente na maior parte das culturas. Seus princípios baseiam-se na
competitividade, na conquista por resultados superiores ao dos colegas e na dicotomia
“vencedor x perdedor” (op.cit.).Tais aspectos geram tensão entre os indivíduos fazendo
com que compitam cada vez mais e, segundo Strieder & Negri (2006), a agressividade está
na base do espírito competitivo.
O racismo, homofobia e sexismo também são aspectos sócio-culturais importantes
que perpassam pela temática do bullying, uma vez que, através dessas idéias, há a
marginalização e estigmatização de grupos específicos (Beaudoin & Taylor, 2006).
Staub (2003) aponta a influência das dificuldades nas condições de vida como um
fator contribuinte ao comportamento violento. Associado a este ponto, as características da
cultura também exercem seu peso em relação ao tema (Staub, 2003). De fato, os dois
componentes parecem estar interagindo fortemente entre si principalmente nos casos em
que a cultura suporta grande discriminação das minorias e manutenção das desigualdades
sociais enraizadas na estrutura social (op.cit.). Certamente não podemos generalizar esta
condição proposta pelo autor tendo em vista a alta prevalência de casos de bullying também
em países ricos e com menos desigualdades sociais (Nascimento, 2007).
Todos esses aspectos apontados anteriormente contribuem para a origem e
manutenção de uma série de comportamentos relacionados à prática do bullying. Botelho e
Souza (2007) fazem menção ao ato de apelidar. Esta é uma conduta que está ligada
principalmente a padrões estabelecidos culturalmente. Por exemplo: “balofo”, “gordo” e
“baleia” são inspirados no padrão de beleza associado à magreza ou ao corpo considerado
como belo. Desta forma, tudo aquilo que é desviante à norma é passível de estigmatização e
preconceitos.
Erving Goffman, sociólogo canadense, escreveu um importante livro a respeito do
conceito de estigma. Ele se refere ao termo como sendo um atributo profundamente
depreciativo que confirma a “normalidade” de outrem (Goffman, 1988). Realiza também a
distinção de três tipos de estigma: os relacionados às abominações do corpo, ou seja,
deformidades físicas; ligados à culpa de caráter individual – tudo relativo à vontade fraca,
paixão tirânica ou não natural. Nesta categoria enquadra-se a pessoa que está
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desempregada, o homossexual, viciados, ex-presidiários etc. Ainda, em um terceiro grupo,
estão os estigmas de raça, nação e religião, cuja denominação é auto-explicativa. A análise
de Goffman é importante para se pensar a temática do bullying principalmente por causa da
questão implícita no próprio conceito do fenômeno ligado ao desequilíbrio do poder. Uma
pessoa estigmatizada possui desvantagem (seja física, ou por ser de determinada raça ou
religião) em relação a alguém que pertence ao grupo dos “normais” (Goffman, 1988). Desta
forma, há a identificação social dos estigmatizados e também daqueles que estão dentro da
norma. Quem sofre do estigma possui menos credibilidade perante todos e está predisposto
a seguir com o papel de vítima no decorrer do tempo (Goffman, 1988). O estigma também
pode ser um fator importante no que diz respeito à atratividade que aquela criança ou
adolescente representa para os agressores que irão identificá-la como um alvo potencial
para sues comportamentos hostis e violentos.
1.5. Atores sociais envolvidos no bullying
Quando estamos tratando de fenômeno bullying, temos que ter em vista as partes
envolvidas na dinâmica do processo. A existência de conflitos e tensões é comum assim
como ocorre em qualquer espaço onde haja seres humanos interagindo (Fante, 2005). No
entanto, é preciso saber identificar e diferenciar comportamentos gerados por conta de
tensões do cotidiano e atos de bullying (Fante & Pedra, 2008). Caso identifiquemos um
determinado tipo de conduta como sendo parte de bullying, há a necessidade de traçar os
papéis, ou seja, quem é o agressor ou bully e quem é (ou são) a (s) vítima (s). Apesar destas
partes serem as mais envolvidas, os alunos que testemunham também fazem parte do
processo. Fante (2005) chama de espectador esse aluno que presencia o ato de bullying sem
o sofrer ou praticar. Estas pessoas representam a maior parte dos alunos envolvidos. Um
engano muito comum é considerar que as testemunhas não sofrem. De fato elas podem até
se divertir vendo um colega ser alvo de “brincadeiras”, mas em muitos casos, o clima de
tensão é tamanho, que muitos espectadores permanecem em silêncio e temem se tornar a
próxima vítima (Fante, 2005). Desta forma, temos a Figura 1.
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Figura 1 – Atores sociais envolvidos no bullying. Baseado em Fante (2005).
No esquema acima podemos observar que há três classificações diferentes de
vítimas. Esta classificação é feita por Fante (2005).
As vítimas típicas são aquelas que recebem as agressões e muitas vezes possuem
características peculiares que chamam a atenção dos agressores. Podem ser crianças ou
adolescentes mais tímidos e fracos fisicamente, com poucas habilidades sociais ou acima
do peso, ou seja, que carregam alguma espécie de estigma, conforme foi colocado
anteriormente segundo a análise de Goffman (1988). A vítima provocadora difere da típica
principalmente pela postura de não passividade perante as agressões. Ela tenta responder de
alguma forma os insultos, porém de forma ineficaz. Sua postura é tipicamente imatura,
costumando ser uma criança ou adolescente hiperativo e dispersivo (Fante, 2005). A vítima
agressora, por sua vez, é aquela que reproduz as agressões em outros colegas, geralmente
vítimas típicas. Um aspecto importante a ser ressaltado a respeito das vítimas em geral é o
fato delas de alguma forma atraírem os agressores. Isto porque, muitas vezes, as crianças ou
adolescentes que sofrem bullying são mais tímidas, pouco hábeis socialmente, fracas,
menores que a maioria etc (Lopes Neto, 2005). A auto-estima também é um componente
importante a ser destacado nas vítimas que geralmente a tem como muito baixa. André e
Lelord (1999) definem auto-estima como sendo o “olhar-juízo” que projetamos sobre nossa
pessoa, sendo isto de fundamental importância para o bem-estar psicológico (André &
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Lelord, 1999). Desta forma, a vítima de bullying além de já ter a auto-estima abalada passa
a tê-la mais rebaixada ainda em decorrência dos constantes xingamentos, apelidos e outras
violências pelas quais é submetido (Lopes Neto, 2005). Um outro ponto importante nos
remete à reflexão do porquê das vítimas serem alvo de violência na escola. Lopes Neto
(2005) aponta alguns fatores como proteção excessiva no ambiente familiar, infantilização
e papel de “bode expiatório”.
Os agressores são aqueles sujeitos que vitimizam os colegas mais fracos e indefesos.
A causa de sua agressividade pode ser explicada por diversos fatores. Assim como no
estudo de vários aspectos da mente e vida humana, como inteligência, afetividade,
sexualidade, personalidade etc, o estudo da agressividade perpassa pela dualidade inato x
adquirido (Ramírez, 1999). Apesar de alguns estudiosos darem ênfase a um aspecto ou a
outro, a maioria dos cientistas prefere a posição integrativa para explicar a agressividade
humana, ou seja, adotam a posição de que os fatores biológicos e sócio-culturais interagem
entre si fornecendo uma série de explicações a respeito de determinadas condutas ou estilos
de vida (Strüber, Lück & Roth, 2006). Alguns genes já foram identificados como
influenciadores do comportamento humano e da personalidade. O 5-HTT é um exemplo.
Tal gene é o responsável pela codificação da proteína transportadora do neuromodulador
serotonina. O polimorfismo, ou seja, a apresentação do gene em outras configurações, pode
ter influência sobre como a pessoa reage ao stress (Canli, 2008). Por outro lado, os aspectos
sócio-culturais também possuem seu peso tendo isso sido abordado no tópico anterior.
As testemunhas são alunos que presenciam os atos de violência ocorridos. Muitas
vezes, o simples fato de estarem inseridos no clima de tensão causado pelo bullying já faz
com que estes estudantes se sintam intimidados, fazendo com que a qualidade do clima
escolar seja prejudicada (Fernández, 2005).
Apesar de muitos autores não mencionarem outros elementos como participantes do
fenômeno bullying, como os professores, funcionários, pedagogos, psicólogos e pais, estes
são peças chave no trabalho de prevenção e combate à violência nas escolas (Fante, 2005;
Constantini, 2004; Rodríguez, 2007).
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1.6. Raiva, hostilidade e bullying
Beck (2000) em seu livro Prisoners of hate, the cognitive basis of anger, hostility
and violence, escreveu a respeito dos processos mentais envolvidos nos comportamentos
violentos e hostis. Ele afirma que os agressores possuem uma espécie de preconceito
positivo a respeito de si mesmos e um preconceito negativo no que se refere aos seus
adversários. Desta forma, as pessoas que dirigem algum tipo de comportamento hostil a um
alvo, realizam algum tipo de interpretação distorcida a respeito de determinada
característica ou competência daquela pessoa (Beck, 2000). Trazendo a contribuição do
autor à temática do bullying, podemos propor que, através da questão do estigma já
abordada anteriormente, o agressor alimenta o preconceito negativo a respeito de seus
alvos, realizando assim, interpretações ligadas a idéias hostis frente às suas vítimas. Desta
forma, o desencadeamento de violência ocorre como proposto por Beck (2000) a seguir na
figura 2:
Figura 2 – O desencadeamento da hostilidade e violência. Baseado em Beck (2000).
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A hostilidade advinda dos agressores constitui um importante fator para se entender
o mecanismo do bullying, mas certamente a raiva e sentimentos relativos à agressão são
gerados na própria vítima e nas testemunhas, havendo, portanto, a criação de um clima de
constante tensão que reflete no progresso acadêmico e social de muitos (Fante, 2005).
Não se pode atribuir ao agressor causas biológicas por seus comportamentos antisociais, salvo em condições psicopatológicas (Ramírez, 1999). No entanto, podemos
apontar alguns aspectos biológicos relacionados à raiva e ao ódio. Os estudos sobre o
cérebro foram impulsionados a partir da década de 90, denominada década do cérebro, em
que muitos estudos a respeito do cérebro humano receberam investimentos e atenção de
pesquisadores especialmente dos Estados Unidos (Lemgruber, 2003). Incluídos nesses
estudos, estão as pesquisas sobre emoções e, entre elas, encontra-se a raiva.
Joseph LeDoux, importante neurocientista estadunidense, dedicou grande parte de
sua vida acadêmica aos estudos sobre as emoções. Segundo ele, os estados emocionais se
mantiveram preservados ao longo de nossa história evolutiva como ferramentas para
satisfazer a necessidade de sobrevivência e cumprimento de imperativos biológicos
(LeDoux, 1998). Lemgruber (2004) utiliza o termo “kit de sobrevivência afetivo” ao se
referir às emoções, tendo em vista a importância delas na sobrevivência e no manejo dos
dados da realidade de forma adaptativa. A autora complementa, ainda, que a raiva é um
afeto importante que, caso utilizado de forma adequada, pode dar origem a melhores
condições de vida para as pessoas (Lemgruber, 2004). Não podemos, portanto, considerar
que a manifestação da raiva seja algo necessariamente ruim. A importância de se discorrer
sobre a raiva dentro da temática do bullying, se deve ao fato de que esta é uma das emoções
mais presentes no fenômeno. Tanto agressores quanto vítimas e testemunhas podem ser
tomados por esse sentimento que se manifesta diante de situações que sugiram provocação,
injustiça, insulto ou maldade (Lipp, 2005).
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2. CONSEQÜÊNCIAS NO BULLYING NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA
O fenômeno bullying, assim como qualquer outra manifestação de violência que
ocorra de forma repetida, deixa suas marcas que perpassam por diversas áreas na vida do
indivíduo. Em crianças e adolescentes há a possibilidade de se encontrar prejuízos no
âmbito social, familiar, ocupacional e da saúde. Nos adultos, as interações no ambiente de
trabalho e a dinâmica familiar no futuro podem ser comprometidas (Fante, 2005). Será
abordado agora, separadamente como são os impactos do bullying em cada área da vida de
crianças e adolescentes. Cabe ressaltar que esta divisão está feita apenas com fins didáticos,
pois na prática todas essas conseqüências geram dificuldades paralelas na vida do
indivíduo, o que constitui a complexidade das repercussões do fenômeno que certamente
merecem mais atenção de pesquisadores e autoridades.
2.1. Área Social
O ser humano por natureza é um ser social. Poucas espécies no reino animal
dependem tanto de seus semelhantes como os homo sapiens. Estamos sempre nos
relacionando com nossos semelhantes ou, no mínimo, esperando algum tipo de contato
(Rodrigues, 1977). Podemos supor, então, que qualquer dano ocorrido na área social é um
grande ônus na vida de uma pessoa.
Os prejuízos na área social para vítimas de bullying é notável, principalmente pelo
fato de haver isolamento no decorrer do tempo após o início das agressões (Fante, 2005). A
auto-estima abalada e sentimento de não-pertencimento ao grupo fazem o estudante se
sentir minoria dentro da escola. Por minoria estabelecemos relação não com o aspecto
quantitativo do termo, mas com a questão das relações de poder implicadas. Assim, as
vítimas consideram que agressor é uma figura superior a elas, mais digna de respeito até
mesmo porque o agressor de fato conquista admiração de alguns colegas (ibid). A
impunidade e o descaso das testemunhas, professores ou pais, que muitas vezes sequer
tomam conhecimento dos fatos, faz o indivíduo se sentir desamparado frente à situação e,
muitas vezes, pode haver aprendizagem das relações sociais como sendo sofridas. Ou seja,
as pessoas não despertam confiança nem amizade, o que influi diretamente na forma como
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as crianças e adolescentes vítimas de bullying vão enxergar o meio social seja na escola ou
fora dela.
Estudos realizados por neurocientistas da Universidade do Texas dirigidos pelo Dr.
Thomas Insel descobriram, no ano de 2006, importantes informações acerca do mecanismo
neural envolvido na resposta do medo e stress associado à agressão e intimidação. De
acordo com a pesquisa, o isolamento social que ocorre quando um rato é exposto a
situações de ameaça se deve às memórias armazenadas relacionadas ao episódio de perigo.
Tais recordações estão ligadas ao sistema límbico, que é o sistema cerebral que regula os
estados emocionais. Assim, um rato exposto continuamente a episódios de intimidação
produz com maior intensidade uma proteína denominada Fator Neurotrófico Derivado do
Cérebro (FNDC), que é essencial para a maturação neuronal. Tal substância sendo
produzida em maior quantidade no sistema mesolímbico possivelmente indica uma maior
intensidade no mecanismo neurofisiológico ligado às emoções. Neste caso, por observação
do comportamento dos ratos estudados, verificou-se amedrontamento em relação aos ratos
intimidadores e também frente aos ratos que inicialmente não representavam nenhuma
ameaça. Infere-se, portanto, que bullying praticado entre os ratos aumentou resposta de
medo e isolamento social e isso foi explicado neurofisiologicamente pelo referido estudo.
Deste modo, um fator relacionado à área social foi explicado com aparatos bioquímicos, o
que corrobora a questão do bullying ser multifatorial, ou seja, estar relacionado a fatores
tanto sociais, culturais e psicológicos, quanto biológicos.
O isolamento referido no trabalho dos pesquisadores da Universidade do Texas nos
remete a um outro ponto de grande relevância na área social: as habilidade sociais. Segundo
Del Prette e Del Prette (2005), elas são de extrema importância para o desenvolvimento de
interações entre os indivíduos. Na infância já podem ser expressas tais habilidades e são
elas que permitem o cultivo de uma rede de amigos da qual a criança irá se apropriar. Caso
haja o isolamento, isto pode ser decorrente da falta das habilidades sociais ou do próprio
bullying, mas este, por fazer a criança se isolar, também é um fator que prejudica o
desenvolvimento de suas relações interpessoais (Fante, 2005). Del Prette e Del Prette
(2005) assinalam, ainda, a preocupação de profissionais da área de saúde mental e educação
acerca das habilidades sociais, uma vez que há correlação entre o déficit delas e uma série
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de problemas psicológicos tais como delinqüência juvenil, desajustamento escolar, suicídio,
problemas conjugais e síndromes clínicas como a depressão e a esquizofrenia.
Outra conseqüência importante do bullying, mas desta vez nos agressores, é a
questão da delinqüência. Fante e Pedra (2008) relatam que agressores têm maior
possibilidade de se envolver em atos criminosos e violência doméstica. Isto é reforçado por
Fox e colaboradores (2003) que apresentam dados de estudos longitudinais sobre meninos
que praticaram bullying e futuramente cometeram crimes. Assim sendo, os autores colocam
que a prevenção do bullying é prevenção do crime (Fox et al, 2003). Eles incentivam ainda
os investimentos em políticas públicas educacionais que visem a redução do
comportamento violento nas escolas.
2.2. Área Familiar
Sabe-se que a influência da família pode ser importante para a formação de um
agressor, uma vez que algumas características familiares propiciam os comportamentos
agressivos (Holmes & Holmes-Lonergan, 2004). No entanto, pouco se fala sobre as
conseqüências que o bullying pode trazer às famílias. Nichols e Schwartz (2007) afirmam
que, dentre os terapeutas familiares, há a opinião de que a família é um sistema que
funciona para além das características individuais de seus pertencentes. Deste modo, o
problema de um membro pode afetar todo o sistema familiar (Souza, 1997). O bullying,
portanto, por ser um fator de stress para a criança ou adolescente na família, gera stress
também dentro de casa. Comportamentos como silêncio excessivo, recusa em falar o que
acontece na escola e choros freqüentes podem ser sinais de que algo vai errado na escola
(Fante, 2005), atingindo também os pais ou outros responsáveis. Deste modo, a criança
participa cada vez menos do convívio familiar. Como muitas vezes não fala a respeito do
problema, pode se confundir o problema que tem raiz na escola, com algum transtorno do
desenvolvimento ou timidez excessiva. Lopes Neto (2005) cita ainda a questão do
comprometimento da relação familiar em decorrência da falta de crédito que os pais podem
ter em relação aos relatos dos filhos que contam sobre o bullying em casa, uma vez que a
criança ou adolescente se sente traído (Lopes Neto, 2005).
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2.3. Área Acadêmica
O bullying, segundo Fante (2005), pode ter como uma das conseqüências, o
desenvolvimento de dificuldades de aprendizagem e declínio do rendimento escolar. As
razões para isso são de supor facilmente, uma vez que as ameaças, apelidos pejorativos,
agressões e outras formas de intimidação recorrentes provocam reações de ansiedade
importantes nos indivíduos que podem afetar seu desempenho (Fante, 2005). O mecanismo
da ansiedade é adaptativo e as estruturas mais primitivas do cérebro humano estão
envolvidas nas reações de ansiedade (André, 2007). Desta forma, caso um aluno perceba o
clima ameaçador, para ele será de grande serventia sentir-se ansioso em relação aos seus
agressores, para poder fugir ou enfrentá-los caso haja necessidade. Essa atenção despendida
à situações de perigo acaba por ser desviada de assuntos relacionados ao cotidiano
acadêmico. Fonseca (1995) propõe um modelo interativo dos fatores que influenciam no
processo de aprendizagem humana. Assim, o autor sugere que condições externas
influenciam tanto quanto a qualidade do ensino, o professor que leciona e as condições
internas da criança, especialmente dentro do que se refere ao seu desenvolvimento
cognitivo (Fonseca, 1995). Deste modo, humilhações, ameaças e desencorajamentos podem
estar na base de uma série de dificuldades de aprendizagem que a criança possa apresentar
(op.cit.). Não
raro algumas escolas enviam seus alunos para fazer exames
neuropsicológicos como se houvessem lesões cerebrais em nível estrutural ou funcional que
justifiquem um prejuízo no aprendizado. Por esta razão é importante a investigação das
variáveis sociais, familiares e interpessoais ao se realizar o exame (Tabaquim, 2003).
2.4. Área da Saúde
O bullying, segundo alguns autores que o estudam, como Fante (2005), Lopes Neto
e Saavedra (2008), podem ter conseqüências importantes no que diz respeito ao
desenvolvimento de problemas de saúde. Dentre esses problemas estão incluídos tanto
transtornos psicológicos quanto problemas físicos. Hawker e Boulton (citados por
Salmivalli, 2005) realizaram estudos longitudinais que comprovaram desenvolvimento de
depressão, transtorno de ansiedade social e transtorno de ansiedade generalidada no
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decorrer de vinte anos. Apesar dessas conseqüências se manifestarem mais em longo prazo,
outras referências citam a manifestação de transtornos psicológicos como a depressão
infantil, ansiedade social ou até mesmo o suicídio na infância ou adolescência (Fante, 2005;
Lopes Neto, 2005). Rigby (2001) citado por Salmivalli (2005) aponta problemas físicos
detectados em pesquisa com adolescentes australianos vitimizados. Dentre eles encontramse: dores de cabeça, dores de estômago e problemas de garganta. Três anos após a pesquisa,
os elevados níveis de stress podem ter tido efeitos importantes no que se refere ao
agravamento dessas enfermidades (Rigby, 2001 citado por Salmivalli, 2005).
Licinio e Wong (2006) consideram que o bullying tem um impacto prejudicial sobre
o bem-estar mental da criança. Os autores enfatizam mais a depressão como conseqüência
do que transtornos de ansiedade.
Alguns comportamentos compensatórios também podem surgir em decorrência do
abuso sofrido na escola. Fante (2005) relata um caso em que isto fica muito claro. A
história é de uma menina que sempre tirava boas notas e recebia atenção e admiração por
parte dos professores da escola. Ela, então, despertou inveja e raiva em alguns colegas que
passaram a inventar que a menina era homossexual. Desta forma, todas as amigas se
afastaram dela. Com o tempo, a adolescente ficou sozinha e isolada. Depois de adulta,
passou a ter comportamentos de sensualidade exacerbados chegando a ser até vulgares. Isto
porque precisava demonstrar feminilidade e delicadeza.
Teixeira (2006) coloca que crianças e jovens vítimas de bullying experimentam
grande sofrimento que pode interferir significativamente no desenvolvimento social,
emocional e acadêmico. Acrescenta ainda que as conseqüências podem ser: baixa autoestima, fobia escolar, abandono dos estudos e até suicídio. O medo de ser avaliado
negativamente e ridicularizado em situações posteriores também pode desenvolver quadros
de fobia social (Teixeira, 2006).
No Brasil ainda são muito escassos os estudos que correlacionam as variáveis
bullying e problemas de saúde tanto físicos quanto mentais.
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3. O STRESS
3.1. Definição de stress
A palavra “stress” tem uma série de origens, uma delas, da engenharia, e inspirou
Hans Selye, ao utilizar o termo para se referir ao desequilíbrio sofrido pelo organismo
frente a certos estímulos A idéia surgiu ao observar que o que ocorria com o organismo era
semelhante ao que ocorria com a matéria inanimada quando sob tensão excessiva. Fazendo
a analogia com uma ponte que pode se romper quando submetida a carga excessiva, o
organismo também poderia sofrer danos quando submetido a excesso de tensão (Selye,
1965).
O stress é uma reação natural do organismo animal. Ele é global e envolve sintomas
psicológicos e físicos diante de situações que excitem, emocionem, confundam e/ou façam
a pessoa muito feliz (Lipp & Novaes, 1996). Ele ocorre em geral frente a estímulos ou
situações que exijam uma certa disposição para lidar com desafios (Lipp, Malagris &
Novais, 2007). O stress pode afetar crianças, adolescentes ou adultos independentemente
da faixa etária e condição socioeconômica (Lipp, Malagris & Novais, 2007). Os primeiros
estudos sobre o assunto ocorreram na década de 1920 quando o fisiologista austríaco Hans
Selye descreveu o stress como um estado de tensão patogênico do organismo (Lipp, 2004).
Atualmente podemos encontrar definições mais atuais para o termo como sendo uma reação
psicofisiológica muito complexa que tem, em sua gênese, a necessidade de o organismo
lidar com algo que ameaça sua homeostase ou equilíbrio interno (Lipp, 2004). Deste modo,
qualquer variável que faça com que seja necessária a adaptação pode ser considerada um
estressor, uma vez que desestabiliza o funcionamento do organismo (Lipp & Rocha, 2007).
Tais variáveis podem ser externas (divórcio, mortes, prisão, aposentadoria, mudança de
trabalho ou cidade etc) ou internas (pensamentos disfuncionais, falta de assertividade, raiva,
alexitimia etc).
A reação neurobiológica responsável pelo mecanismo de stress está ligada a duas
vias neuronais principais: o eixo HPA e o sistema límbico (Almeida, 2003). O eixo HPA
envolve três estruturas principais: o hipotálamo, a glândula pituitária ou hipófise e a
glândula adrenal ou supra-renal.
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O hipotálamo é uma área subcortical, diencefálica muito importante quanto ao papel
regulatório das funções endócrina, visceral e do sistema nervoso autonômico, o SNA
(Kandel, Schwartz & Jessel, 1997). Este está subdividido em sistema nervoso simpático e
parassimpático. A atividade simpática é a responsável pelos sintomas de ansiedade como
sudorese intensa, taquicardia, aspecto pálido, respiração ofegante etc. A parassimpática, ao
contrário, é responsável pelo retorno ao estado de homeostase ou equilíbrio (Lent, 2004). O
hipotálamo também regula os níveis hormonais de substâncias ligadas ao stress. Esta
regulação ocorre através da ligação, através do pedúnculo hipofisário, com a glândula
pituitária, localizada em uma cavidade na base do cérebro (Bear, Connors & Paradiso,
2002). Esta glândula coordena o funcionamento de diversas outras glândulas, assim como
de funções orgânicas como a secreção de GH (hormônio do crescimento), prolactina e
ocitocina (para secreção de leite), endorfinas (que causam bem-estar) entre outros (Purves
et al, 2005). Dentro da questão do stress, nos interessa explorar a ligação da hipófise com a
glândula supra-renal e a secreção dos adrenocorticotrópicos (ACTHs). A glândula suprarenal está localizada no abdômen, mais especificamente acima dos rins e, dentre outras
funções, libera os hormônios corticosteróides que são também neuromoduladores
(adrenalina e cortisol) muito ligados à resposta do stress (Bear, Connors & Paradiso, 2002).
O sistema límbico ou somato-autônomo é constituído por diversas estruturas do
cérebro como o próprio hipotálamo, o hipocampo, a amídala, a ínsula, o córtex cingulado
anterior e o tronco encefálico. É um dos principais responsáveis pela regulação das
emoções. A conexão entre o eixo HPA e o sistema límbico, permite a associação entre
respostas de ansiedade/ stress e estados emocionais positivos ou negativos (LeDoux, 1998).
Outras estruturas além das citadas e muitos mecanismos estão associados ao stress e
suas implicações físicas e psicológicas. Diversos estudos têm sido realizados dentro de
diversas disciplinas. Dentro da psicologia, uma importante e mais recente contribuição
dentro do Brasil foi a descoberta do modelo quadrifásico do stress, proposto por Marilda
Lipp da PUC-Campinas.
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3.2 Fases do stress
Os estudos de Hans Selye envolveram a criação de um modelo denominado
trifásico do stress. De acordo com ele, o stress se divide em três fases: a fase de alerta,
de resistência e de exaustão. A primeira é relativa ao nível de ansiedade normal que
precisamos para realizar as nossas atividades do cotidiano como acordar, atravessar a
rua, conversar, dirigir etc. Sem um pouco de stress não há o gasto de energia necessário
para se gerar produtividade (Lipp, 2003). Apesar de haver o aumento do desempenho
com um pouco de stress, a homeostase, ou seja, o equilíbrio interno do organismo é
quebrado. O retorno a esse estado demanda esforço do corpo e da mente e, caso não
haja tal retorno, o organismo pode passar para a segunda fase, a fase de resistência,
onde há maior secreção de hormônios ligados à ansiedade. Assim, o organismo
necessita utilizar muita energia para estabelecer o equilíbrio. Desta forma, as
repercussões acarretadas podem variar desde leve falta de memória até maior
vulnerabilidade a vírus e bactérias (Lipp, 2005). Apesar de haver maior desgaste nesta
fase, a produtividade ainda é mantida. Por último, de acordo com o modelo de Selye, há
a fase de exaustão, que é caracterizada pela quebra total de reservas energéticas do
organismo, acarretando conseqüências físicas e psicológicas graves como problemas
gastro-intestinais e cardíacos, depressão, transtorno do pânico e muitos outros (Lipp,
2003).
Pesquisas realizadas na PUC de Campinas na década de 90 por Lipp, permitiram
a identificação de uma nova fase entre a fase de resistência e a fase de exaustão: a
quase-exaustão. Esta se caracteriza por um desgaste bastante importante quanto às
reservas do organismo, mas ainda há possibilidade de se responder a algumas demandas
de forma satisfatória, ao passo que na fase de exaustão o indivíduo encontra-se muito
comprometido. Na fase de quase-exaustão algum bem-estar ainda pode ser
experimentado (Lipp, 2003). O modelo de Lipp sobre o stress é denominado de
quadrifásico (Lipp, 2005)
O estudo das fases do stress se torna importante principalmente para se trabalhar
com instrumentos de medida do stress como o Inventário de Sintomas do Stress para
Adultos de Lipp (Lipp, 2005). O conhecimento de tais fases é fundamental ao
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profissional de saúde que trabalhe com psicologia da saúde e stress justamente para se
fazer o diagnóstico correto e encaminhar o paciente ao tratamento adequado.
3.3 O stress na criança e no adolescente
Um mito questionável dentro do senso comum é que criança não experimenta
stress (Lipp, 1998). A não identificação e tratamento podem trazer conseqüências
importantes para as crianças em termos de aprendizagem e desenvolvimento sadio. A
forma do stress se manifestar na criança pode ser através de dores de barriga,
introversão, dores de cabeça, desânimo, cansaço, pesadelos etc (Lipp, 1998). As fontes
de stress na criança podem ser das mais diversas como excesso de atividades, divórcio
dos pais, problemas na escola, morte ou doença na família etc (Lipp, 2000). Dentre
estes fatores podemos, certamente, incluir o bullying.
Uma questão importante acerca da origem do stress infantil é a socialização.
Com o intuito de educar e formar indivíduos adequados socialmente, os pais muitas
vezes ensinam formas de pensar que, em algumas ocasiões, podem ser disfuncionais
para a criança (Tricoli & Bignotto, 2004). É o caso daquelas famílias que educam seus
filhos para serem “perfeitas”, “boazinhas” ou “destacadas”. Isso, sem dúvida, é uma
demanda significativa geradora de stress na infância que pode ser evitada (Tricoli &
Bignotto, 2004). No entanto, isto depende da estrutura da família e das crenças que os
pais têm a respeito do mundo, das pessoas e dos problemas da vida. O desenvolvimento
de crenças compartilhadas dentro dos sistemas familiares ocorre de acordo com a
influência cultural de uma certa localidade (Walsh, 2005). Assim, não só dentro de
casa, mas também dentro de uma estrutura social, a criança recebe orientações sobre
como se comportar perante os outros, o que pode ser muito benéfico desde que essas
mensagens não sejam muito enfatizadas (Tricoli & Bignotto, 2004).
David Elkind, um importante estudioso norte-americano do stress infantil,
coloca que muitas pressões e atribuições forçam um encurtamento e apressamento da
infância. Desta forma, constantes demandas a respeito de sucesso, sociabilidade,
destaque e decisões fundamentais acabam por ser geradores de stress importantes nas
crianças nos tempos atuais (Elkind, 2004). Além das demandas excessivas e cobrança
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por um amadurecimento mais veloz por parte dos pais, a escola também ocupa um
papel essencial na gênese do stress infantil, principalmente quando há mudança de
escola, professores, colegas e séries (Lipp, 2000).
É de extrema importância o profissional da área de educação estar atento ao
ritmo de cada criança dentro de sala de aula, uma vez que cada um possui seu tempo
para realizar as tarefas e aprender conteúdos novos (Tricoli, 2000). Ignorar este fato
significa aumentar cada vez mais o stress dos estudantes, pois eles perceberão que não
estão alcançando expectativas de forma satisfatória (op.cit.). Aos mesmos profissionais,
é recomendado manter atenção a respeito do fenômeno bullying nas escolas, já que ele
pode constituir um fator estressante bastante importante.
Quando tratamos do tema “stress” devemos ter em mente que ele pode afetar
pessoas de qualquer condição sócio-econômica, profissão e faixa etária (Lipp, 1998).
Desta forma, sabemos que ele pode se manifestar tanto em crianças, como foi abordado
acima, quanto em adolescentes e adultos. Neste momento a ênfase será dada no stress
do adolescente.
A adolescência, do latim adolescere (crescer) é justamente a fase constituída
por mudanças significativas. Tais modificações se aplicam tanto ao âmbito físico, em
decorrência dos diversos hormônios que são agora lançados no organismo do
adolescente, quanto no que se refere às demandas sociais. Ao adolescente, como já
deixou de ser criança, é cobrada mais responsabilidade, compromisso e decisões
importantes acerca de sua vida. Na realidade, o adolescente de fato não é mais uma
criança, mas também não chega a ser um adulto (Marcelli & Braconnier, 2007). Essa
dicotomia muitas vezes é fonte de diversos conflitos psicológicos para este indivíduo
que está passando por um ritual de passagem dentro de diversos campos. Assim ele
precisa se readaptar dentro das instituições às quais pertence como a família e a escola
(op.cit.). Tantas mudanças são, sem dúvida, fontes importantes de stress.
A pouca experiência em relação à vida aliada a muitas questões que passam
desde as transformações pessoais até tópicos como consumismo, carreira, opção sexual,
relações interpessoais etc, torna o adolescente um dos indivíduos mais propícios a
sofrer com o stress (Lipp, Malagris & Novais, 2007). Outro ponto importante diz
respeito ao encorajamento que a sociedade e a família promovem para que as crianças
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cresçam rapidamente, o que David Elkind (2004) denomina infância pressionada, mas,
ao mesmo tempo, quando as crianças se tornam adolescentes, muitos ainda os tratam
como crianças (Lipp, Malagris & Novais, 2007). Desta forma, o paradoxo entre a
exigência da infância e a infantilização na adolescência constitui também um estressor
importante.
Dentro da escola há uma grande concentração de indivíduos que estão
passando por este período de transição e, portanto, o espaço escolar pode se constituir
em um grande estressor para alunos, professores, funcionários e todos os envolvidos
com a instituição. Há, então, a grande necessidade de se gerenciar o stress dentro da
escola para se evitar tensões, dentro das quais pode se incluir o bullying.
3.4. As possíveis conseqüências do stress
Conforme já mencionado anteriormente, o stress é uma reação natural do
organismo e necessário à nossa sobrevivência. Chegar à fase de alerta e retornar à
homeostase pode ser algo muito benéfico em termos de produtividade (Lipp, 2004). No
entanto, quando o stress atinge níveis mais elevados e não há um controle sobre a
situação, algumas conseqüências tanto físicas quanto psicológicas podem ser
manifestadas (Lipp, 1998).
3.4.1. Conseqüências físicas
Apesar dos estudos sobre as conseqüências do stress serem relativamente
recentes, alguns trabalhos desenvolvidos especialmente na Pontifícia Universidade
Católica de Campinas (PUC-Campinas) apontam dados importantes acerca da
compreensão do assunto. Lipp (2000) enfatiza que a produção de corticosteróides pela
glândula supra-renal passa a ser muito elevada em situações de stress contínuo. Tal
reação, conforme já abordado, ocorre em indivíduos independentemente da faixa etária.
Desta forma, o stress excessivo e prolongado promove alterações no sistema
imunológico, propiciando a contração de doenças causadas por vírus, bactérias ou
outros agentes desencadeadores de doenças (Lipp, 2000). Fases mais avançadas do
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stress podem propiciar o aparecimento de problemas como hipertensão arterial (Lipp &
Rocha, 2007), diabetes (Lipp, 2000), úlceras gastroduodenais (Malagris, 1996),
problemas cardiovasculares (Moreno Júnior, Melo & Rocha 2003), doenças
dermatológicas (Pinto, 1996; Steiner & Perfeito, 2003), doenças bucais (Moraes, 2003),
dores músculo-esqueléticas (Cohen, Almeida & Peccin, 2003) e disfunções sexuais
(Costa, 2003).
Assim, pode-se perceber que crianças, adolescentes ou adultos com altos níveis
de stress têm grandes possibilidades de apresentarem problemas que podem interferir de
forma significativa em seu desempenho, tendo em vista que o estado físico pode ser
comprometido. Isto é demonstrado na curva de Yerkes-Dodson que está a seguir na
figura 3, adaptada de Izquierdo (2002, p. 65):
Figura 3 – Curva de Yerkes-Dodson. Adaptada de Izquierdo (2002).
De acordo com a curva acima, podemos perceber que um nível muito baixo de
stress proporciona uma baixa performance, uma vez que precisamos nos estressar um
pouco para ter vigor e energia para enfrentar os desafios (Lipp, 2003). A fase de alerta,
portanto, está situada em pontos onde se pode perceber uma performance alta. Na fase
de resistência, apesar das reservas do organismo estarem começando a se exaurir, a
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produtividade ainda é mantida, estando ela situada na curva em pontos altos de
performance. Já nas fases de quase-exaustão e exaustão, o rendimento cai de forma
significativa de modo inversamente proporcional ao nível de stress. É justamente neste
ponto que os problemas físicos acima mencionados começam a se manifestar de forma
mais severa (op.cit.).
Lipp (2005) cita os sintomas físicos decorrentes da fase de exaustão como, por
exemplo, tontura freqüente, úlcera, enfarte, hipertensão arterial continuada etc. A
particularidade de alguns problemas ocasionados na fase de exaustão é que uns podem
ser letais, enquanto outros podem ser doenças que irão acompanhar o indivíduo por toda
a vida como é o caso da hipertensão.
3.4.2. Conseqüências psicológicas
A curva de Yerkes-Dodson acima apresentada também pode ser aplicada aos
problemas psicológicos. Assim, alguns sintomas psicológicos são mais típicos de cada
fase do stress, sendo agravado dependendo do estágio em que a pessoa se encontre
(Lipp, 2005). Na fase de alerta, alguns sintomas como aumento súbito de motivação ou
entusisamo súbito podem ser encontrados, o que não chega a ser um problema para a
pessoa caso ela consiga retornar à homeostase (Lipp, 2003). Caso isso não seja possível
e os estressores permaneçam, sintomas como sensibilidade emotiva e irritabilidade
excessiva, diminuição da libido e dúvida quanto a si próprio podem se manifestar,
constituindo um agravamento da situação deste indivíduo estressado que, em termos
técnicos, se traduz nas fases de resistência e quase-exaustão. O diagnóstico situado em
uma fase ou outra irá depender da quantidade de sintomas tanto físicos quanto
psicológicos que o paciente relatar no Inventário de Sintomas de Stress de Lipp (2005).
Em longo prazo, transtornos psicológicos como o transtorno de pânico, transtorno de
ansiedade generalizada ou depressão podem ser desencadeados caso fases avançadas do
stress sejam mantidas sem se tomar alguma providência.
Seligman (1977) descreve uma série de experimentos em que submete cães a
situações de stress intenso através de choques e privações. Tal situação após algum
tempo gerou uma condição de desamparo, que fez com que a motivação para responder
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dos cães fosse aos poucos destroçada e a capacidade de aprendizagem reduzida. Em
seres humanos, tais conseqüências são aplicáveis a partir de problemas como
imprevisibilidade de perigo e malogro infantil (Seligman, 1977).
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4. IMPLICAÇÕES ENTRE BULLYING E STRESS
Já foram abordados, em capítulos anteriores, os conceitos de bullying e stress.
Segundo Lipp (2005) algumas escolas podem constituir um ambiente que favoreça o stress,
uma vez que é um espaço onde a competitividade é estimulada, o desejo de se inserir em
um grupo é constante e a necessidade do bom desempenho é cobrada por pais, professores e
pela própria criança (Beaudoin & Taylor, 2005).
Pereira e Davide (2005) realizaram uma pesquisa em Portugal para levantar os
fatores dentro da escola que estavam correlacionados ao stress. As autoras afirmam que ele
tem sido amplamente associado à mudança de escolas (Pereira & Davide, 2005). Além
deste fator, outros três domínios foram identificados pelas autoras. O primeiro deles foi o
acadêmico, ou seja, relativo à pressão pelo sucesso. O segundo se refere à relação com os
professores e com as regras da escola. O terceiro é ligado à relação entre colegas (Pereira &
Davide, 2005). Em relação a este último ponto, as autoras do estudo identificaram nas
crianças pesquisadas o receio quanto a não ser aceito ou sofrer bullying, que também é uma
constante fonte de preocupação, ou seja, uma fonte de stress interna.
Dentre os acontecimentos ligados ao bullying mais indutores de stress dentro do
contexto escolar, Pereira e Davide (2005) apontam, segundo pesquisa que realizaram, o
roubo dentro das escolas, ter medo de armas na escola e ser castigado por um professor. As
pesquisadoras afirmam que receber apelidos e ser incomodado por estudantes mais velhos
são acontecimentos freqüentes dentro das escolas que pesquisaram (Pereira & Davide,
2005). Oliveira e Antonio (2006) descrevem o bullying como um estressante psicossocial,
ou seja, que gera stress dentro do contexto social. Os autores apontam a importância que as
relações sociais têm durante o período da adolescência, uma vez que há a identificação do
jovem como pertencente ao grupo. Assim, caso não haja tal simpatia com os semelhantes e,
pelo contrário, ocorram atitudes agressivas e violentas, uma grande frustração é
experimentada pelo estudante (Oliveira & Antonio, 2006).
Tricoli (2004) afirma que na adolescência a homeostase já é rompida em
decorrência das intensas mudanças. No entanto não são todos que vivenciam tais
modificações da mesma forma (Tricoli, 2004). A esta capacidade de ser mais ou menos
resistente às adversidades ou mudanças, dá-se o nome de resiliência. Assis, Pesce e Avanci
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(2006) a definem como a interação entre dois extremos: o da adversidade e o da proteção.
Desta forma, por mais que o indivíduo sofra com as adversidades, caso ele possua uma
predisposição a se fortalecer diante dos obstáculos, pode ser considerado resiliente (Assis,
Pesce & Avanci, 2006). O conceito de resiliência nos permite entender, portanto, o porquê
de algumas pessoas serem mais afetadas que outras no que diz respeito ao bullying escolar.
Conforme Lipp (2004) há fontes internas e externas de stress. A violência na escola
pode ser considerada uma fonte externa, uma vez que cria um ambiente escolar
desfavorável à aprendizagem, estabelecimento de amizades e tranqüilidade (Fernández,
2005). Paralelamente o bullying também pode ser considerado uma fonte interna, uma vez
que faz com que a vítima tenha sua auto-estima rebaixada muitas vezes (Sánchez, 2006), o
que pode corroborar crenças de desamor, inadequação e desvalor conforme teoria
desenvolvida por Beck (1976).
A importância em se estabelecer uma relação entre bullying e stress, é de grande
importância, uma vez que, conforme já exposto, os efeitos do stress podem ser bastante
prejudiciais à saúde física e psicológica da criança.
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5. CONSEQÜÊNCIAS NA VIDA ADULTA
As conseqüências do bullying não se restringem à infância e adolescência. Após a
saída da escola, muito do que foi aprendido durante todos os anos pode permanecer de
alguma forma na memória dos indivíduos. Fante (2005) afirma que pessoas envolvidas em
bullying podem continuar a sentir as repercussões do fenômeno nos anos posteriores aos
acontecimentos. Desta forma, alguns prejuízos ligados a relacionamentos afetivos e
profissionais assim como constituição de família podem estar presentes (Fante, 2005). A
autora acrescenta, ainda, que a saúde física e mental pode sofrer danos em longo prazo
(Fante, 2005). Para discorrer a respeito dos danos mentais que podem perdurar durante a
idade adulta, serão utilizadas algumas teorias e conceitos que embasam as terapias
cognitivo-comportamentais.
5.1. Condicionamento clássico
O condicionamento clássico é um mecanismo que foi desenvolvido à luz dos trabalhos
do fisiologista russo Ivan Petrovitch Pavlov datados do final do século XIX e início do
século XX. Esta teoria foi pioneira dentro dos estudos relativos à aprendizagem estudada de
forma sistemática (Aubin, 2008). O condicionamento clássico ocorre por etapas.
Primeiramente há a apresentação de um estímulo incondicionado, ou seja, que produz
resposta reflexa por parte do organismo. Em seguida, um estímulo neutro é pareado com
um estímulo incondicionado. Em um terceiro momento, o estímulo anteriormente neutro,
passa agora a ser condicionado, uma vez que elicia a resposta reflexa por parte do
organismo (Gazzaniga & Heatherton, 2005). As Obras Escolhidas de Pavlov (1980)
explicam o mecanismo com mais detalhes.
A relevância desta teoria para a temática do bullying é notável uma vez que diversos
condicionamentos no espaço escolar podem ocorrer. A resposta incondicionada de medo é
natural de nosso organismo (André, 2007). Assim, quando um estudante é sistematicamente
ameaçado ou agredido (estímulo incondicionado), ele irá experimentar sensação de medo
ou ansiedade intensos (resposta incondicionada). A partir dessas experiências, sempre que o
agressor (estimulo condicionado) se aproximar ele apresentará a resposta de medo (resposta
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condicionada). Dependendo do caso, pode acabar generalizando, ou seja, sentindo o medo
frente a outras pessoas além do agressor para outros colegas e, assim, isolar-se cada vez
mais. As conseqüências em longo prazo podem se refletir em dificuldades de
relacionamento pessoal e de ajuste nos ambientes familiar e ocupacional (Fante & Pedra,
2008). Dependendo da gravidade das agressões para as vítimas, estruturas do sistema
límbico como o hipocampo e a amígdala podem sofrer alterações em seu desenvolvimento,
resultando em desajuste emocional mais tarde (Fante, 2007).
5.2. Condicionamento operante
O condicionamento operante é uma teoria desenvolvida pelo psicólogo Burrhus
Frederic Skinner entre as décadas de 30 e 60 do século XX com base nos estudo da lei do
efeito de Thorndike (Gazzaniga & Heatherton, 2005). Skinner, assim como Pavlov, é um
importante teórico a ser estudado em Psicologia da Aprendizagem. Suas idéias são de
extrema importância para se compreender como e por que o ser humano realiza seus
comportamentos de uma maneira e não de outra. Segundo o autor, a manutenção de muitos
do comportamento animal e humano se dá em função das conseqüências deste no ambiente
(reforço) (Skinner, 1980). Assim, um reforço é tudo aquilo que aumenta a freqüência de
determinada resposta (Skinner, 2003). Ele pode ser positivo quando há o acréscimo de um
estímulo reforçador (ex.: água, comida, satisfação etc) ou negativo quando há a eliminação
de um estímulo aversivo como um ruído desagradável, por exemplo (Moreira & Medeiros,
2007).
Segundo pesquisa da ABRAPIA realizada em escolas do município do Rio de Janeiro
com uma significativa amostra de mais de 5.000 estudantes, 694 pessoas assumiram serem
autores de bullying. Dentro destes, 9,2% relataram se sentir bem e 35,3% disseram achar o
bullying engraçado (Lopes Neto & Saavedra, 2008). Tanto se sentir bem quanto achar graça
ou se divertir com esse tipo de conduta podem ser considerados reforçadores ao
comportamento agressivo, o que aumenta a sua probabilidade conforme a teoria de Skinner.
Em longo prazo, uma criança ou adolescente que é constantemente reforçado ao realizar
comportamentos agressivos pode se tornar um adulto que aprendeu a conseguir o que
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deseja através do insulto, da violência e hostilidade. Desta forma, valores como tolerância à
diversidade, compaixão e empatia ficam comprometidos (Fante, 2007).
5.3. Teoria social cognitiva
A teoria social cognitiva foi desenvolvida por Albert Bandura, psicólogo canadense, a
partir da década de 1960. Segundo esta teoria, o ser humano é o agente de sua própria vida
e funcionamento (Bandura, 2008). Desta forma, “as pessoas são auto-organizadas,
proativas, auto-reguladas e auto-reflexivas, contribuindo para as circunstâncias de suas
vidas, não sendo apenas produtos dessas condições” (Bandura, 2008, p. 15). Bandura foi
um dos primeiros autores a introduzir o papel da cognição no estudo do comportamento,
uma vez que até o momento anterior à sua teoria, predominava o behaviorismo radical. Esta
linha teórica, também denominada análise do comportamento, os processos cognitivos são
comportamentos inobserváveis (Moreira & Medeiros, 2007).
Bandura não aborda a questão da agressão como sendo inata. Para o autor, os atos
violentos necessitam não só serem aprendidos, como também treinados (Kristensen, Lima,
Fernin, Flores & Hackmann, 2003). Para um entendimento maior sobre este ponto, se faz
necessário definir o conceito de modelação. Este, segundo Bandura (1979), significa
aprendizagem através da observação do modo de se comportar de um modelo. Assim
sendo, uma criança pode aprender comportamentos agressivos através do constante
testemunho de cenas agressivas entre os pais, jogos violentos ou programas violentos
oferecidos nas programações da televisão (Linn, 2006). O aprendizado de tal tipo de
conduta pode, sem dúvida, favorecer a ocorrência do bullying escolar, mais especificamente
através da criação de nos agressores (Holmes & Holmes-Lonergan, 2004). Em longo prazo,
tantos modelos ensinando o comportamento agressivo pode resultar em um adulto que
reproduza as agressões em suas futuras famílias, o que gera um aumento no número de
casos de violência doméstica (Fante, 2007).
Dois outros conceitos importantes a serem abordados da teoria de Bandura são o de
auto-eficácia e o de expectativa de eficácia. O primeiro, segundo o autor que o elaborou,
diz respeito à percepção dos indivíduos no que se refere às suas habilidades para organizar
e colocar em prática comportamentos exigidos para se chegar a um certo nível de
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desempenho (Bandura, 1977). Conforme mencionado anteriormente, a teoria social
cognitiva parte do pressuposto da perspectiva agêntica (Bandura, 2008). Isto quer dizer que
os indivíduos são dotados de capacidades primordiais que os possibilitam a controlar, em
alguma medida, o ambiente e os aspectos que influenciam suas vidas (Bandura, 1986 citado
por Azzi & Polydoro, 2006). Um conceito que está por trás deste controle é a expectativa
de eficácia, que envolve crenças a respeito de como as pessoas se sentem, pensam,
motivam e comportam (Souza. 2005). Bandura (1977) afirma que as expectativas de
eficácia determinam, além de outros fatores, o quanto as pessoas irão conseguir manter o
esforço ao lidar com situações estressantes. Assim, caso a expectativa de eficácia esteja
alterada, o manejo frente a situações de stress pode se tornar prejudicado. Levando-se em
conta que o bullying escolar é uma importante fonte de stress em alunos (Pereira & Davide,
2005), muitas crianças que sofrem as ações do fenômeno tornam-se crianças estressadas
que irão ter sua expectativa de eficácia alterada, o que irá prejudicar o manejo do stress das
mesmas. Caso essas crianças não recebam o apoio adequado, podem correr o risco de se
tornarem adultos vulneráveis emocionalmente e estressados (Lipp, 2000). Isto, por sua vez,
irá causar problemas em várias áreas da vida dessas pessoas, conforme já mencionado em
importantes pesquisas sobre stress (Lipp, 1998; Lipp, 2004).
5.4. Modelo cognitivo
Assim como Bandura realizou seus trabalhos iniciando a inclusão dos processos
cognitivos na compreensão do funcionamento humano, o psiquiatra estadunidense Aaron
Tim Beck, desenvolveu o modelo cognitivo das perturbações emocionais na década de
1960. Beck era psicanalista e percebeu que os métodos que estava utilizando não eram
eficazes para o tratamento de pacientes deprimidos (Falcone, 2001). Assim, desenvolveu
uma inovadora concepção a respeito de como é o funcionamento de pessoas com
transtornos psicológicos, cunhando o termo terapia cognitiva (Knapp, 2004).
O pressuposto básico do modelo cognitivo é que nossa cognição influencia nossas
emoções e comportamentos (A.T. Beck, 1979). Além disso, nossos pensamentos podem ser
monitorados e alterados, promovendo, desta forma, a mudança comportamental (Dobson &
Dozois, 2006). Os pensamentos passíveis de monitoração são aqueles que ocorrem no
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momento exato de uma determinada situação. A estes, Beck denominou pensamentos
automáticos – PA (A.T. Beck 1979). A partir dos PA, podemos acessar níveis da cognição
mais profundos como as crenças intermediárias e centrais, que são constituídas a partir de
diversas experiências que tivemos ao longo de nossas vidas, desde a infância, sobre nós
mesmos, os outros e o mundo (J. Beck, 1997). As experiências que fazem parte da
construção de crenças que os indivíduos têm decorrem dos seus ambientes familiares até as
escolas onde estudaram e os lugares que freqüentaram no decorrer de suas vidas
confirmando as idéias que eles têm sobre as coisas (J. Beck, 1997). As crenças
intermediárias são como regras que guiam o modo de funcionamento do indivíduo, sendo
menos rígidas que as crenças centrais (Greenberger & Padesky, 1999). Estas estão mais
enraizadas e são ativadas toda vez que um pensamento automático é disparado em face de
uma situação que confirme a validade da crença disfuncional (J. Beck, 1997).
Com base na breve explicação anterior, podemos supor que as situações de bullying
escolar contribuem na formação de crenças disfuncionais do indivíduo a respeito de si
mesmo, das pessoas e do mundo. Isto se manifesta em sintomas clínicos importantes como
déficit em auto-estima, ansiedade excessiva, falta de assertividade e outras habilidades
sociais, déficit em resolução de problemas etc (Sánchez, 2006). A Figura 4 ilustra o um
exemplo do modelo cognitivo de Beck e a constituição de crenças da vítima a partir do
bullying escolar.
Figura 4 – Exemplo de possível modelo cognitivo de uma vítima de bullying escolar. Baseado em J.
Beck (1997) e Fante (2005).
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No esquema acima visualizamos exemplos de crenças disfuncionais que podem
fazer parte da vida do indivíduo que sofreu o bullying durante a fase escolar. Tais crenças
podem acompanhar a pessoa por anos, atrapalhando-a em diversos segmentos de sua vida,
uma vez que é uma “verdade” que as pessoas “sabem” sobre elas que é disfuncional (Beck,
1997). A violência à qual o aluno foi submetido, seja em forma de apelidos pejorativos
constantes ou agressões físicas, são acontecimentos que servem como evidências que
contribuem para o desenvolvimento de crenças disfuncionais ou a apóiam. O bullying, no
caso, pode ser um fator predisponente, ou seja, que predispõe a pessoa a desenvolver algum
tipo de transtorno (Kirk, 1997). Este pode ser desde um transtorno de humor como a
depressão maior; de ansiedade como a fobia social ou ansiedade generalizada (Fante &
Pedra, 2008) ou até mesmo um transtorno alimentar como a anorexia e bulimia nervosa que
podem ter, como parte dos motivos de desenvolvimento, os comentários pejorativos
ocorridos repetidamente ao longo da infância (Galvão, Pinheiro & Somenzi, 2006).
De acordo com o exemplo de modelo cognitivo acima ilustrado, a pessoa com as
crenças centrais supostas provavelmente poderia ter dificuldades interpessoais, problemas
em relacionamentos afetivos e temor em assumir cargos mais elevados no contexto
profissional (Fante & Pedra, 2008).
Os agressores ou bullies também podem ser prejudicados por seus atos violentos
durante sua fase de desenvolvimento. Segundo Fante e Pedra (2008), há uma considerável
possibilidade do vitimizador reproduzir seus comportamentos anti-sociais na idade adulta
caso não sejam estabelecidos limites a ele. Desta forma, pode se predispor esta criança, que
pode já ter um transtorno comportamental como o transtorno desafiador opositivo ou
transtorno de conduta (Teixeira, 2006), a desenvolver um transtorno de personalidade na
idade adulta como, por exemplo, o transtorno de personalidade anti-social ou narcisista.
Isto porque seus valores ligados à compaixão e empatia são pouco ou nada desenvolvidos
(Fante & Pedra, 2008), mas, por outro lado, habilidades ligadas à manipulação e assédio
por sedução podem ser altamente desenvolvidas, uma vez que são altamente adaptativas
durante a fase de desenvolvimento do agressor (Dautenhahn & Woods, 2003).
A seguir, a Figura 5 ilustra um possível modelo cognitivo de um autor de bullying
escolar com base em J. Beck (1997), Fante (2005) e Lopes Neto e Saavedra (2008).
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Figura 5 - Exemplo de possível modelo cognitivo de um autor de bullying escolar. Baseado em J. Beck
(1997), Fante (2005) e Lopes Neto e Saavedra (2008).
A partir do esquema acima, podemos perceber que as crenças constituídas por
autores de bullying podem ser extremamente prejudiciais tanto para eles próprios como
para todos que com ele conviverem seja em ambiente familiar, profissional ou social.
O modelo cognitivo e a terapia cognitiva, conforme visto, pode ser de grande ajuda
na compreensão da dinâmica dos envolvidos no fenômeno bullying. A bibliografia
integrando as duas áreas é praticamente inexistente, o que reforça a importância de mais
pesquisas envolvendo estes campos.
Conforme visto acima, os comportamentos violentos repetidos durante a fase de
desenvolvimento podem contribuir na construção de crenças que irão compor a
personalidade de indivíduos adultos. A seguir será abordada uma outra teoria que pode nos
ajudar na compreensão deste processo: a teoria dos esquemas.
5.5. Teoria dos esquemas
A teoria dos esquemas foi proposta por Jeffrey Young como uma extensão da
terapia cognitiva clássica proposta por Aaron Beck. A razão de sua criação é que a terapia
cognitiva beckiniana possui algumas limitações no que diz respeito ao trabalho com
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pacientes mais crônicos, como aqueles com transtornos de personalidade (McGinn &
Young, 2005). A abordagem focada nos esquemas tem influências de diversas linhas como
a terapia cognitivo-comportamental, construtivismo, das relações objetais, gestalt e
psicanálise, integrando todas essas teorias de maneira unificadora e consistente (Young,
Klosko & Weishaar, 2008).
Esta abordagem integrada trabalha com alguns construtos baseados no modelo
cognitivo de Beck, o qual já foi abordado anteriormente. A expansão proposta por Young
trabalha com cinco tópicos teóricos: esquemas iniciais desadaptativos, esquemas de um
domínio (subdivisões dentro de um domínio), manutenção de um esquema, evitação e
compensação do mesmo (Young, 2003).
Os esquemas iniciais desadaptativos (EID) dizem respeito a pontos altamente
estagnados e recorrentes que são desenvolvidos no decorrer da infância, sendo amplificados
durante a vida do indivíduo, imprimindo em sua vida um grau de disfuncionalidade
importante (Young, 2003.). Este mesmo autor afirma que a maior parte dos EID “são
crenças e sentimentos incondicionais sobre si mesmo em relação ao ambiente” (Young,
2003, p. 16). Por serem tão difíceis de mudar, é que podemos atribuir a importância dos
esquemas ao desenvolvimento e manutenção dos transtornos mentais, em especial dos
transtornos de personalidade (Riso & McBride, 2007). Young, Klosko e Weishaar (2008)
afirmam que a disfuncionalidade do esquema provavelmente irá surgir em momentos mais
tardios da vida do indivíduo, uma vez que as pessoas irão difundir e reafirmar os esquemas
através de suas vivências e relações interpessoais. Ao contrário das crenças intermediárias,
que são estruturas cognitivas condicionais e mais maleáveis (J. Beck, 1997), os EID são
mais rígidos por serem incondicionais (Young, 2003). Assim, o indivíduo atua no mundo
de forma a sempre confirmar seus esquemas, uma vez que são incontestáveis. O
questionamento deles causa no indivíduo bastante desconforto (Young, 2003).
Young (2003) relaciona a formação dos esquemas à estrutura familiar. Por exemplo,
para a construção de esquemas de um domínio de desconexão e rejeição (quando a pessoa
acredita que as expectativas de estabilidade, carinho e aceitação não serão satisfeitas), o
autor o associa à família de origem negligente, agressiva ou imprevisível. Tomando por
base que o ambiente escolar também é de extrema importância no desenvolvimento do ser
humano e que as interações familiares não são as únicas fontes de influências (Bee, 2003),
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podemos supor que a construção dos esquemas cognitivos também recebam contribuições
das relações ocorridas na escola. Estas relações estão ocorrendo em maior quantidade
principalmente em decorrência da crescente inserção da mulher no mercado de trabalho
que, por vezes, acaba forçando que a criança seja cada vez mais deixada aos cuidados de
instituições educacionais (Martins Filho, 2007). Deste modo, não podemos deixar de
analisar o impacto que as relações interpessoais escolares têm sobre os indivíduos.
Young (2003) propõe os domínios de esquemas desadaptativos que são: desconexão
e rejeição, autonomia e desempenho prejudicados, limites prejudicados, orientação para o
outro e supervigilância e inibição. A seguir será feita uma breve correlação entre esses
domínios e situações ligadas ao bullying escolar.
5.5.1. A desconexão/ rejeição e o bullying escolar
O domínio de desconexão e rejeição diz respeito à falta de expectativas que uma
pessoa tem em relação ao atendimento das necessidades de segurança, cuidado, empatia,
aceitação e respeito (McGinn & Young, 2005). Segundo Young (2003), os esquemas
relativos a este domínio são: abandono/instabilidade; desconfiança/abuso, privação
emocional, defectividade e vergonha e isolamento social/alienação. A família de pessoas
com este tipo de esquema geralmente proporciona ao indivíduo um cenário de frieza,
poucos vínculos, muitas rejeições, abusos, explosões e continência (McGinn & Young,
2005). Caso esse tipo de ambiente seja reproduzido também nas escolas através de atos de
exclusão e intimidação principalmente, o esquema desadaptativo de desconexão e rejeição
pode ser reforçado, podendo servir como um modo do indivíduo de conceber as pessoas
como abusivas e rejeitadoras na vida adulta.
5.5.2. Autonomia/ desempenho prejudicados e o bullying escolar
Este domínio se refere a pessoas que são oriundas de um ambiente familiar que
afeta a autonomia do indivíduo, ou seja, ele se percebe menos competente caso esteja longe
da família vivendo de forma independente (Young, 2003). Assim, a família que origina esse
domínio é geralmente intrusiva, superprotetora e/ ou não consegue reforçar a criança caso
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ela alcance um bom desempenho independente em suas tarefas (McGinn & Young, 2005).
Seus esquemas são: dependência/ incompetência, vulnerabilidade, emaranhamento e
fracasso (Young, 2003). Para além do ambiente familiar, os comportamentos de demonstrar
que a criança é inadequada através de apelidos ou estigmatização ou até mesmo a falta de
reforço por parte de professores face às conquistas da criança podem contribuir, em parte,
para a formação desse tipo de esquema.
5.5.3. Limites prejudicados e o bullying escolar
Este domínio tem como esquemas merecimento/ grandiosidade e autodisciplina/
autocontrole insuficientes (Young, 2003). Desta forma, as pessoas que o possui têm
dificuldades em respeitar os direitos alheios, cooperar e assumir compromissos. As famílias
destes indivíduos são calcadas na falta de limites e permissividade excessiva além de
indulgência e falta de direção (McGinn & Young. 2005). Tais características são bastante
relacionadas ao perfil dos autores de bullying que, segundo Coloroso (2004) os classifica
como pessoas que podem procurar causar desequilíbrio de poder, ter intenções de causar
danos e intimidação, não respeitando o espaço do outro. Isto pode estar associado à falta de
limites em casa e, caso não o recebam também na escola, podem ter sua condição ligada ao
esquema de limites prejudicados amplificada.
5.5.4. Orientação para o outro e o bullying escolar
O domínio “orientação para o outro” e seus esquemas – subjugação, auto-sacrifício
e busca de aprovação/ reconhecimento - está relacionado, conforme afirma Young (2003), à
família de origem geralmente calcada na aceitação a todo custo em relação aos outros e
supressão das próprias necessidades e emoções em prol de terceiros. Dentro do contexto
escolar, esta questão pode estar associada às testemunhas.
Coloroso (2004) divide as testemunhas em três tipos: as desengajadas, as possíveis
defensoras e as defensoras. As primeiras são aquelas que fingem que nada acontece. As
segundas não gostam do bullying, mas nada fazem para mudar. As últimas são aquelas que
ajudam ou tentam ajudar a vítima de alguma forma (Coloroso, 2004). Há ainda aquele
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estudante que por ter necessidade de ser aceito em um grupo, conforme ocorre na
adolescência (Bee, 2003), acaba abrindo mão de seus valores pessoais para participar do
bullying. Por vezes isso pode até servir como uma defesa, de modo que esta pessoa não
passe de testemunha à vítima (Fante, 2005). Assim, pessoas que abrem mão de suas
necessidades e valores, como esse tipo de testemunha mencionado, podem ter seu domínio
de orientação ao outro reforçado, o que irá trazer algumas conseqüências na idade adulta
(McGinn & Young, 2005).
5.5.5. Supervigilância/ inibição e bullying escolar
Os esquemas pertencentes a este grupo envolvem negatividade/ vulnerabilidade ao
erro, excesso de controle/ inibição emocional, padrões inflexíveis/ crítica exagerada e
caráter punitivo (Young, 2003). As pessoas pertencentes a este domínio costumam
controlar demasiadamente seus sentimentos, impulsos e escolhas em nome da evitação do
erro ou do atendimento de regras e expectativas (McGinn & Young, 2005). A família de
pessoas dentro deste domínio costumam ser severas, punitivas, perfeccionistas e podem
considerar o prazer e a alegria como menos importantes do que desempenho e regras
(Young, 2003). Dentro do contexto escolar as características ou atos estigmatizados da
vítima que são condenados pelo(s) agressor(es), podem fazer o indivíduo aprender que seu
modo de ser ou de se expressar é inadequado ou infeiror, o que é um fator comum em
pessoas que sofreram bullying, resultando, muitas vezes, em dificuldades interpessoais
(Fante, 2005).
Conforme percebemos, as conseqüências do bullying podem ser exploradas à luz de
diversas teorias que embasam as psicoterapias cognitivo-comportamentais. Deste modo, é
possível também que apliquemos estes conhecimentos à prática da TCC, seja em contexto
clínico ou institucional, conforme sugerem Sánchez (2006), Doll e Swearer (2006) e
Alexander (2007).
No capítulo seguinte serão expostas algumas intervenções anti-bullying de algumas
partes do mundo e também do Brasil. Intervenções em âmbito clínico também serão
enfocadas de acordo com a abordagem cognitivo-comportamental.
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6. INTERVENÇÕES PARA CASOS DE BULLYING NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA
Desde que o bullying escolar começou a ser estudado por Dan Olweus na
Noruega,na década de 80 as pesquisas sobre o assunto começaram a ser iniciadas (Fante,
2005). Os estudos auxiliaram os especialistas a entender melhor o fenômeno e a identificálo dentro das escolas. Anos de dedicação foram necessários para que se pudesse traçar um
campo de pesquisa consistente que mostrasse à comunidade científica a relevância do
problema (Smith, Pepler & Rigby, 2004). Em seguida será exposto o programa clássico
anti-bullying de Dan Olweus e intervenções para o fenômeno bullying no Brasil. Serão
abordadas também algumas intervenções clínicas e em contextos educacionais a partir da
abordagem cognitivo-comportamental.
6.1. O programa de prevenção e combate ao bullying de Dan Olweus
Conforme já exposto, Dan Olweus foi o pioneiro em território mundial dentro dos
estudos sobre o bullying escolar. Seus primeiros trabalhos a respeito de intervenções antibullying ocorreram na década de 80, inicialmente na cidade de Bergen na Noruega e, em
seguida, em Oslo, capital do mesmo país (Olweus, 2004). Com o tempo, as amostras que o
pesquisador utilizou em suas pesquisas eram bastante significativas, já que eram compostas
por cerca de 130.000 alunos de mais de 700 escolas norueguesas. O programa de Olweus
serviu de base para muitos outros projetos criados posteriormente no mundo todo (Gaitán,
Ramuzgo & González, 2006).
Os principais componentes do programa de Olweus estão presentes em sua obra
clássica Bullying at School: what we know and what we can do (Olweus, 1993). Como
metas, o programa pretende “reduzir, ao máximo possível, senão completamente,
problemas existentes entre agressores e vítimas dentro e fora da escola, assim como
prevenir o desenvolvimento de novos problemas” (Olweus, 1993, p. 65).
As intervenções propostas pelo autor se dividem em três tipos: medidas para se
aplicar na escola de modo geral, na sala de aula e individualmente (Olweus, 1993).
Primeiramente ele coloca que, como pré-requisito, todos, ou seja, professores, alunos,
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direção e os pais das crianças da escola onde o programa será aplicado devem estar alertas e
comprometidos com o trabalho a ser realizado (Olweus, 2004).
6.1.1. Medidas aplicadas à escola de modo geral
Uma primeira medida aplicada a todos é a fase de avaliação, que é feita através da
aplicação do questionário de agressores e vítimas, elaborado pelo próprio pesquisador
(Olweus, 1986 citado por Olweus, 2004). Feita a decisão a respeito da implementação do
programa, um dia de conferência é realizado. O objetivo deste dia é estabelecer um plano
de intervenção específico para a escola onde o trabalho será realizado (Olweus, 1993).
Participam desta atividade os professores, diretores, coordenadores, psicólogos,
enfermeiros, além de outros funcionários que porventura trabalhem na escola e pais e
alunos selecionados (Olweus, 1993). Neste passo, é de extrema importância que “sejam
criados passos que se refiram ao compromisso coletivo e responsabilidade pelo programa
escolhido” (Olweus, 1993, p. 70).
Um outro ponto importante que consta no programa do psicólogo norueguês é a
vigilância consistente durante o horário do recreio e intervalos. Isto porque muitos dos
casos de bullying ocorrem justamente nesses momentos e a presença de um adulto
supervisionando inibe a prática (Olweus, 1993). Caso seja possível, é sugerido também que
a escola tome providências no sentido de criar espaços de recreação mais atraentes às
crianças e adolescentes com o intuito de manter todos em contato com atividades positivas
ao invés de pensar no bullying (Olweus, 1993).
Conforme já foi mencionado anteriormente, em alguns casos é difícil denunciar a
agressão para diretores, professores ou outros responsáveis. Isto porque o medo de
represálias vem à tona (Fante, 2005). Para sanar este problema, a criação de um telefone de
contato pode ser útil. Esta medida consiste em um funcionário da escola, psicólogo ou
pedagogo geralmente, dedicar algumas horas de seu expediente para atender ligações, que
são denúncias anônimas de atos de bullying (Olweus, 1993).
Outras estratégias gerais previstas no programa são as reuniões de pais e profissionais
da escola; grupos de professores e círculo de pais. Tais medidas servem para discussão do
andamento do programa; desenvolvimento de redes sociais entre alunos, uma vez que o
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isolamento social propicia o bullying, grupos de estudos sobre textos ou livros a respeito do
tema etc. Isto tudo é importante para que haja manutenção e debate sobre tudo que foi
acertado anteriormente (Olweus, 1993).
6.1.2. Medidas aplicadas em sala de aula
Além da importância de se adotar medidas que englobam toda a escola, o combate
ao bullying deve ser reforçado na sala de aula. Isto pode ser feito através de acordos e
atitudes como elogiar e chamar atenção quando necessário. O desenvolvimento de grupos
de estudos cooperativos para estimular, além da aprendizagem, o espírito colaborativo, a
empatia e laços sociais entre os alunos também constitui estratégia interessante (Olweus,
1993). Deve também ser feito o esclarecimento com os alunos sobre o que significa o
bullying e quais podem ser suas conseqüências. A partir disso, é firmado um acordo
baseado em três pilares: “não intimidar outros alunos; tentar ajudar aos que sofrem
agressões e se esforçar para integrar os alunos que se isolam com facilidade” (Olweus,
1993, p. 82).
6.1.3. Medidas individuais
As medidas individuais são mais focais e voltadas aos agressores, vítimas e seus
pais. Ao se falar com um agressor sobre os episódios de bullying, isto deve ser feito de
forma assertiva e deve-se deixar claro que comportamentos violentos não são e não serão
tolerados na escola (Olweus, 1993). Alguns alunos podem se mostrar desafiadores e se opor
ao discurso do professor que intervém, assim como podem tentar minimizar sua
participação através de discurso manipulador. Em caso de serem muitos os agressores, deve
se falar com eles individualmente e depois em grupo, reafirmando a questão da não
tolerância às agressões no ambiente escolar (Olweus, 1993).
Falar com a vítima também é uma atitude que se faz necessária. Este tipo de aluno
agredido geralmente é tímido, ansioso e inseguro. Neste caso, mostrar a ele que pode ser
protegido e acolhido pelos responsáveis da escola pode constituir uma grande ajuda
(Olweus, 1993). Além disso, muitas vezes por medo de represálias, as vítimas temem falar
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com os pais para que eles tomem algum tipo de atitude. O estabelecimento de uma parceria
entre esses pais (também os pais dos agressores) e a escola é de grande ajuda para os
problemas da vítima (Olweus, 1993).
Uma outra aliança que pode ser feita é entre os alunos que são testemunhas do bullying
e a própria escola, uma vez que eles estão convivendo tanto com as vítimas quanto com os
agressores. Assim, podem servir de colaboradores ao trabalho anti-bullying (Olweus, 1993).
6.2. Programas Brasileiros
6.2.1. Educar para a paz
O programa educar para a paz foi desenvolvido pela educadora Cleodelice
Aparecida Zonato Fante do Centro Multidisciplinar de Estudos e Orientação sobre Bullying
Escolar (CEMEOBES) de Brasília no início dos anos 2000.
Fante (2005) afirma que, a respeito da questão de intervenção anti-bullying, há a
necessidade da conscientização da existência e das conseqüências do fenômeno à
comunidade escolar. Aparentemente parece uma questão óbvia, mas muitas escolas ainda
não estão preparadas para lidar com esta temática justamente por não estarem a par de que a
violência entre escolares constitui um ponto muito peculiar e sério não só em relação ao
desempenho acadêmico das crianças e adolescentes, mas também para a constituição
saudável da subjetividade dos estudantes (Fante, 2005). Assim sendo, a educadora
Cleodelice Fante e colaboradores elaboraram o programa Educar Para a Paz a partir de
muitos anos de experiência na área do magistério e de extensas pesquisas no campo da
educação (Fante, 2005). Os objetivos principais são que os alunos sejam conscientizados do
fenômeno e suas conseqüências, a fim de perceberem que tipos de pensamentos e emoções
estão na base deste tipo de comportamento. Com isto, se interioriza valores humanos e se
desenvolve a capacidade de empatia, além de se estabelecer o comprometimento dos alunos
com o bem-estar comum.
O primeiro passo, segundo o programa, é a aceitação de que o bullying é um
fenômeno real. Isto se mostra importante devido à possível negação que algumas escolas
podem demonstrar ao abordar o assunto (Fante, 2005). Isto acaba por ser uma atitude
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agravante no que diz respeito à propagação da violência dentro da escola (Fante, 2005).
Quanto mais cedo for feita a intervenção, maiores são as chances de resultados serem mais
eficazes e duradouros.
Em seguida é feita uma reflexão a respeito do que significa a violência escolar e
através de que tipos de comportamento ela pode se manifestar. Isto é importante para que
haja identificação das situações de violência que, muitas vezes podem passar despercebidas
(Fante, 2005). Outro ponto importante é a escolha de comissões, coordenador e tutores do
programa. Esta equipe é composta por professores, diretor, coordenadores, alunos e pais.
Este grupo irá intervir e participar do processo de conscientização e das reuniões relativas
ao andamento do programa assim como ajudarão na observação do comportamento entre os
estudantes para possível identificação de bullying escolar. Deste modo, é feito um serviço
investigativo através de observações e aplicação de instrumentos; divulgação dos
indicadores e confecção do material explicativo e apresentação do diagnóstico escolar.
A etapa seguinte diz respeito à modificação da realidade escolar propriamente dita e
isto ocorre por meio de estratégias gerais (medidas de supervisão e observação dos alunos
engajados no programa; serviço de denúncia e encontros semanais para avaliação),
estratégias individuais (redação “minha vida escolar” e “minha vida familiar”; entrevista
pessoal e em grupo com vítimas e agressores), estratégias em sala de aula (apresentação do
estatuto contra o bullying; projetos solidários e investigações semanais) e estratégias
familiares (encontros de pais e tutores, orientações sobre convivência familiar e grupos de
pais solidários). Ao final de todos esses passos, é feito um novo diagnóstico a respeito da
realidade escolar para verificação dos resultados e revisão/ manutenção do programa
(Fante, 2005). Alguns pontos do programa Educar para a Paz são bastante semelhantes com
a proposta de Dan Olweus realizada na Europa.
6.2.2. Programa de redução do comportamento agressivo entre estudantes
O Programa de Redução do Comportamento Agressivo entre Estudantes foi
desenvolvido pela ABRAPIA nos anos de 2002 e 2003 e foi aplicado em escolas do
município do Rio de Janeiro, que participaram também da pesquisa que permitiu o
levantamento do número de estudantes envolvidos com o fenômeno bullying. Lopes Neto e
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Saavedra (2008) afirmam que, na fase de intervenção, o relacionamento com as escolas foi
importante para o sucesso do programa. O entendimento por parte das instituições como
imposição não seria positivo, uma vez que cada escola possui suas próprias características
(Lopes Neto & Saavedra, 2008).
Depois de aceita a participação das escolas no programa, o trabalho começou a ser
desenvolvido. Os autores afirmam que a aplicação do trabalho variou de uma escola para
outra em decorrência das peculiaridades de cada uma. No geral o programa contou com
métodos de conscientização, através de panfletos educativos para alunos, pais e professores.
Tal medida auxilia no entendimento do fenômeno como algo que acontece no cotidiano das
relações escolares (Lopes Neto & Saavedra, 2008).
Além do trabalho educativo realizado, reuniões constantes com membros da escola
eram feitos com a equipe da ABRAPIA, o que permitia troca de informações e orientação
dos profissionais ao público escolar (Lopes Neto & Saavedra, 2008).
Infelizmente em muitas escolas o investimento em programas anti-bullying é muito
pouco, o que dificulta o combate ao fenômeno. Lopes Neto e Saavedra sugerem que, para
além de um programa realizado em determinado momento na escola, o Programa de
Redução de Comportamentos Agressivos deve fazer parte do plano político-pedagógico de
cada escola (Lopes Neto & Saavedra, 2008).
A implementação do programa em escolas do município do Rio de Janeiro
conquistou resultados em tais instituições de ensino, servindo como exemplo e inspiração à
elaboração de outros programas em escolas do Rio de Janeiro e Brasil. A pesquisa completa
com mais informações, os autores publicaram em obra recente e atualizada (Lopes Neto &
Saavedra, 2008).
6.3. A terapia cognitivo-comportamental e o bullying
Além das estratégias criadas para implementar em escolas sugeridas pela área da
educação (Fante, 2005) e pediatria (Lopes Neto & Saavedra, 2008), podemos somar a
contribuição da psicologia através das intervenções cognitivo-comportamentais. A seguir
será feita uma explanação a respeito dessa abordagem para que seja possível a compreensão
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de como ela pode ser útil nos casos de bullying conforme alguns autores já descrevem (Doll
& Swearer, 2006; Sánchez, 2006).
A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma abordagem psicoterápica que
teve início entre os anos 60 e 70 do século XX, quando os processos cognitivos começaram
a ser incorporados às técnicas comportamentais (Costa, 1997). A TCC tem em sua base,
portanto, princípios comportamentais e cognitivos. No que se refere aos princípios
comportamentais, é importante lembrar que embora tenha sido Watson o fundador do
Behaviorismo (Baum, 2006), as contribuições de Skinner, principal representante do
Behaviorismo
Radical,
são
fundamentais
para
a
compreensão
das
estratégias
comportamentais que compõem a TCC. Importante lembrar que os estudos de Watson
tiveram como base os experimentos de Ivan Pavlov do final do século XIX o qual trabalhou
com cães chegando ao chamado condicionamento clássico. Pavlov concluiu que ao associar
dois estímulos (incondicionado e neutro) iria provocar o condicionamento de uma resposta,
antes apenas presente frente ao estimulo incondicionado, frente ao estímulo neutro, agora
chamado de estímulo condicionado. Esses estudos são importantes por explicarem o
desenvolvimento de uma série de comportamentos desadaptativos. A TCC inclui estratégias
comportamentais de tratamento que se baseiam nesse tipo de condicionamento (Rangé,
2001).
Já os estudos de Skinner foram formulados a partir de experiências feitas por
Edward Thorndike também do final do século XIX. Este pesquisador realizou uma série de
experimentos com gatos, observando que após emitirem diversas respostas, os felinos,
então, passavam a manifestar apenas uma: aquela que era seguida da possibilidade de
acesso ao alimento (Falcone, 2006). Tal fenômeno ficou conhecido como lei do efeito, que
postula que dentre as várias respostas emitidas em uma mesma situação, aquela que é
seguida de satisfação do desejo do animal será a mais fortemente conectada com a situação
(Glassman & Hadad, 2006). A lei do efeito de Thorndike foi precursora à teoria do
condicionamento operante de Skinner, o qual desenvolveu uma série de experimentos nos
quais concluiu que o comportamento do indivíduo é mantido em termos de freqüência
devido às suas conseqüências, de modo que tais conseqüências reforçam o comportamento
que as causou. Os estudos sobre condicionamento operante explicam também uma série de
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comportamentos desadaptativos e a TCC possui técnicas comportamentais baseadas nesse
entendimento.
Outro importante autor para o desenvolvimento da abordagem cognitivocomportamental foi Albert Bandura que caracterizou a psicologia social cognitiva. Alguns
aspectos essenciais da teoria de Bandura estão em sua publicação Modificação do
Comportamento (1969). Os conceitos mais importantes da teoria de Bandura são:
modelação (repetição de comportamento através da observação), experiência vicariante,
auto-eficácia e expectativa de desempenho. Estes conceitos são muito importantes em um
contexto de psicoterapia, uma vez que podem ser utilizados para se basear substancialmente
uma formulação de caso cognitivo-comportamental como no caso das adicções, por
exemplo (Aubin, 2008).
Na década de 60, alguns modelos de psicoterapia cognitiva começaram a surgir
como o treinamento auto-instrucional de Donald Meicheinbaum e a terapia racional
emotiva de Albert Ellis (Dobson & Dozois, 2006). Este último foi um importante autor para
o advento da terapia cognitiva tal como ela é hoje. Ellis publicou A Guide to Rational
Living em 1961 onde escreveu sobre a angústia e ansiedade como resultados de
pensamentos irracionais. O indivíduo passando a pensar racionalmente e aprendendo a
aceitar a realidade provavelmente não sofreria tanto. Isto não quer dizer que a pessoa deva
ser passiva diante das circunstâncias, mas também não seria racional ela ter pensamentos
tão derrotistas conforme ocorre com os indivíduos que têm crenças irracionais (Ellis, 1962).
As idéias de Ellis influenciaram significativamente o criador do modelo cognitivo mais
difundido atualmente: Aaron Beck. O modelo cognitivo de Beck (1976) já foi exposto em
capítulo anterior.
O método de trabalho da terapia cognitivo-comportamental está calcado no
empirismo colaborativo, ou seja, paciente e terapeuta trabalham em equipe para atingir o
objetivo da terapia (Costa, 1997). Para alcançá-lo, é feita uma lista de metas, elaborada
pelas duas partes. A abordagem, conforme mencionado anteriormente, é mais diretiva do
que outras abordagens, muito embora não seja superficial, visto o aparato teórico por trás
da prática da TCC, em especial a teoria dos esquemas de Young (2003) e o modelo
cognitivo de Beck (1976), que lida com a modificação de estruturas profundas como as
crenças centrais (Beck, 1997).
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As aplicações da terapia cognitivo-comportamental são bastante abrangentes,
conseguindo abarcar uma série de problemas, incluindo depressão (Beck, 1997;
Greenberger e Padesky, 1999; Fennell, 1997); transtorno do pânico (Barlow & Cerny,
1999); transtorno obsessivo-compulsivo (Cordioli, 2006; Cordioli, 2008; Rangé; Asbahr,
Moritz & Ito, 2001); transtorno de estresse pós-traumático (Caminha, 2005); transtornos de
personalidade (Beck, Freeman e Davis, 2005; Young, 2003); transtorno de ansiedade
generalizada (Deffenbacher, 2003; Dugas & Robichaud, 2007); fobias específicas (Costa &
Lanna, 2001); fobia social (Picon & Knijnik, 2004); dependência química (Luz Júnior,
2004; Rahioui & Reynaud, 2008); transtornos alimentares (Appolinário & Duchesne, 2001;
Duchesne, 2006); stress emocional (Lipp e Malagris, 2001); jogo patológico (Prieto, 2001;
Tavares & Rossini, 2008); transtornos do sono (Buela-Casal & Sanchéz, 2001); disfunções
sexuais (Carey, 2003); transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (Duchesne &
Mattos, 2001); tricotilomania (Opdyke & Rothbaum, 2003); esquizofrenia e outros
transtornos psicóticos (Beck & Alford, 2000); ansiedade frente a provas e concursos (José,
Álvares, Sauer & Pergher, 2008) etc. A TCC ainda pode se adequar a diferentes públicos
como crianças (Friedberg & McClure, 2004; Stallard, 2004; Stallard, 2007; Caminha &
Caminha, 2007); grupos (White & Freeman, 2003; Bieling, McCabe, Antony et al, 2008);
casais (Dattilio & Padesky, 1998); idosos (Bertrand, 2001), portadores de deficiências
(Glat, 2001) e intervenções em contextos educacionais (Mennuti, Freeman & Christner,
2006), incluindo situações de bullying e coerção (Doll & Swearer, 2006; Sánchez, 2006).
As intervenções cognitivo-comportamentais em casos de bullying possuem uma
particularidade que é centrar-se na dinâmica escolar, uma vez que o fenômeno ocorre na
interação entre pares (Doll & Swearer, 2006). No entanto, ações efetivas anti-bullying
incluem também intervenções em casa e na comunidade onde a escola está inserida, uma
vez que podem ocorrer episódios de violência fora da escola também (Doll & Swearer,
2006). Sánchez (2006) descreve uma intervenção em caso de bullying onde separa o
tratamento por etapas. Tais etapas envolvem entrevistas com pais, entrevistas com a
paciente, aplicação de escalas para avaliação, formulação do caso, treinamento de
habilidades sociais, trabalho de auto-estima através de reestruturação cognitiva,
relaxamento, treino assertivo e psicoeducação que envolve reuniões dos pais com
responsáveis do colégio para explicar a situação que está ocorrendo (Sánchez, 2006).
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As intervenções cognitivo-comportamentais para casos de bullying podem se
mostrar eficazes tanto para a criança vítima do fenômeno quanto para as agressoras, assim
como para a escola, pais e professores que aprendem a lidar com situações de indisciplina
(Doll & Swearer, 2006). Smallwood, Christner e Brill (2007) sugerem propostas de
intervenções cognitivo-comportamentais em escolas a partir de três níveis: universal,
secundário e terciário (Smallwood, Christner & Brill, 2007). O primeiro é aquele que tem
como alvo a escola inteira, ou seja, no caso do bullying, uma intervenção como o programa
de Dan Olweus seria considerado como sendo deste nível. Os autores apontam este tipo de
trabalho para outros problemas como uso de drogas, gravidez na adolescência, suicídio e
promoção de competência (Smallwood, Christner & Brill, 2007). As intervenções em nível
secundário restringem-se a estudantes específicos que estejam em situação de risco
particulares dentro do contexto escolar (Smallwood, Christner & Brill, 2007), que no caso
do bullying pode ser uma vítima prestes a cometer um suicídio ou até mesmo uma chacina.
As intervenções em nível terciário, por sua vez, foca os estudantes com sintomas
psicológicos. A terapia cognitivo-comportamental em grupo pode auxiliar esses alunos
através de um programa de aconselhamento promovido pela própria escola (Smallwood,
Christner & Brill, 2007). Assim, problemas como raiva, ansiedade excessiva com provas ou
outras situações, depressão (Smallwood, Christner & Brill, 2007) podem ser trabalhados,
além de isolamento social (Simmerman & Christner, 2007) e até mesmo adolescentes com
síndrome de Asperger em contexto escolar (Livanis, Solomon & Ingram, 2007) que muitas
vezes podem ser alvos de bullying (Dubin, 2007).
Pode-se perceber, portanto que a terapia cognitivo-comportamental pode ser
aplicada a contextos educacionais para ações anti-bullying ou não. No Brasil este tipo de
intervenção ainda não é muito utilizado, sobretudo porque ainda há muito pouco
conhecimento nessa área em vários países.
6.4. O treino de controle do stress e o bullying
Foi visto anteriormente que o bullying pode atuar como uma variável que contribui
significativamente para o desenvolvimento do stress crônico em crianças e adolescentes. Já
foi enfatizada também a importância das estratégias de combate ao bullying dentro das
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escolas. No entanto, uma outra abordagem terapêutica pode auxiliar vítimas e testemunhas
do fenômeno a não chegar a fases mais avançadas do stress: o treino de controle do stress
aplicado a crianças (Lipp, 2000). Lipp (2000) afirma que o stress na infância pode ser
diagnosticado e controlado, evitando assim, o desenvolvimento de problemas maiores.
Tricoli (2000) sugere medidas preventivas em relação ao stress. Isto inclui uma série de
fatores por parte de professores como: cuidar do próprio stress, ser claro e paciente,
reconhecer o trabalho bem feito de alunos, conhecer melhor os estudantes, estimular a
superação de obstáculos, evitar ser agressivo, respeitar a individualidade, orientar na
solução de problemas etc (Tricoli, 2000). Todas essas medidas são úteis não só para se
evitar o stress em crianças, como também para fazer elas se sentirem mais valorizadas.
Outra técnica fundamental neste contexto é o relaxamento infantil para que as crianças
aprendam desde cedo a manejar as reações de stress (Tricoli, 2000). Como medidas a serem
adotadas pela diretoria das escolas, o incentivo à prática de esportes com base na
competitividade positiva e criação de espaços reservados ao convívio entre os alunos
podem ser de grande ajuda para o combate ao stress (Tricoli, 2000). Uma alimentação farta
em nutrientes necessários ao enfrentamento do stress é necessária (Lipp, Malagris &
Novais, 2007). Esta dieta deve incluir uma série de vitaminas e sais que irão repor o que foi
gasto pelo organismo ao reagir ao stress (Lipp, 1998).
Todas essas medidas que compõem o treino de controle do stress - estratégias
cognitivo-comportamentais, técnicas de relaxamento, alimentação e atividade física - são de
grande ajuda para a promoção de bem-estar das crianças em ambiente escolar, o que pode
conseqüentemente favorecer a redução da agressividade e stress excessivo (Lipp, 2000),
que podem ser fatores conseqüentes e predisponentes ao bullying.
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7. CONCLUSÃO
Ao longo deste trabalho pôde-se perceber que o fenômeno bullying é muito amplo,
abrangendo uma série de áreas de estudo desde as ciências sociais como a sociologia e a
antropologia até a psicologia, neurociências e educação. Os impactos que o bullying pode
ter na vida de escolares de ensino fundamental e médio são importantes de serem notados
pela sociedade em geral, que deve repensar a questão do bullying ser apenas brincadeira ou
adversidades naturais da fase de desenvolvimento, as quais devem ser vencidas pela própria
criança ou adolescente sozinho. De fato, o gerenciamento do stress e aprendizado quanto a
lidar com situações estressantes é extremamente benéfico para a formação de adultos
saudáveis que saibam manejar o stress de forma adequada. No entanto, caso haja um
estressor externo que, conforme foi visto, pode causar o desenvolvimento de crenças
disfuncionais, que irão se manifestar como pensamentos automáticos disfuncionais
(estressores internos), deve haver intervenções para que as conseqüências do fenômeno não
alcancem a vida adulta. Os programas de prevenção e combate ao bullying já criados
podem ser implementados nas
escolas
assim como as
estratégias
cognitivo-
comportamentais podem ser utilizadas. Lipp (2000) afirma que uma sociedade composta
por adultos saudáveis é bom em termos de produtividade. Para que essa sociedade exista,
devemos estar atentos não só ao modo como as crianças e adolescentes aprendem a lidar
com o stress, mas também como elas estão construindo suas relações interpessoais e
lidando com a agressividade e os estímulos incessantes de uma sociedade cada vez mais
pautada em valores da pós-modernidade.
O trabalho com crianças estressadas é de extrema importância para se evitar o
desenvolvimento ou agravamento de transtornos psicológicos na infância (Malagris &
Castro, 2000). As intervenções anti-bullying favorecem a redução do stress na medida em
que criam um clima escolar menos tenso e mais propício ao aprendizado.
Todos que lidam com educação devem estar atentos a respeito dos atos violentos,
pois eles fazem parte da natureza humana. Eles estão presentes nas nossas pequenas
relações do cotidiano (Hirigoyen, 2008). Negar a sua existência pode apenas abrir mais
espaço para que o fenômeno ecloda de maneiras mais visíveis e problemáticas. Conforme
Lopes Neto e Saavedra (2008) enfatizam, os programas de combate ao bullying escolar
devem fazer parte do plano político-pedagógico de cada escola, pois assim as ações antipdfMachine
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bullying farão parte do dia a dia dos estudantes que aprenderão em cada momento a
interiorizar os valores de empatia, solidariedade, amizade e respeito ao próximo, o que
Chalita (2008) propõe como pedagogia da amizade. A terapia cognitivo-comportamental
pode fazer parte deste tipo de planejamento, podendo dar suas contribuições de forma
significativa conforme os trabalhos de Doll e Swearer (2006), (Simmerman & Christner,
2007) e (Smallwood, Christner & Brill, 2007) demonstram. Podemos finalizar afirmando
que a promoção de uma cultura do respeito dentro das escolas ajudaria muito na promoção
da saúde mental, controle do stress e qualidade de vida das crianças, adolescentes e futuros
adultos de nossa sociedade.
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