O TORCER MISTO EM MACEIÓ Adriano Lopes de Souza1 O futebol é um esporte de grande apelo popular no Brasil, fazendo parte do nosso cotidiano nas mais diversas formas. Desde cedo, até como uma possibilidade de se socializar ao futebol, o brasileiro realiza a sua escolha clubística. Em Maceió, além daqueles torcedores que escolhem apenas as agremiações locais para torcer, existem também aqueles que escolhem agremiações de outras regiões. Estes, de forma pejorativa, são classificados como torcedores “mistos” pelos torcedores “anti-mistos”, que são aqueles que, além de torcerem apenas pelos clubes locais, não concordam com essa forma “mista” de torcer. O objetivo do presente estudo foi analisar o torcer misto em Maceió, identificando as razões que poderiam motivar o torcedor local a escolher clubes de futebol de outras regiões, além de buscar compreender o que os torcedores da cidade pensam sobre o assunto. Os sujeitos da pesquisa foram alagoanos, residentes em Maceió. As informações foram coletadas por meio de um questionário, enviado pelas redes sociais, além de entrevistas. Os resultados encontrados apontam que a família (39%) e a Mídia (22%) seriam as principais influências na escolha de clubes de outras localidades. Estas sendo a cidade de São Paulo e a cidade do Rio de Janeiro. Por fim, o torcedor “anti-misto” considera que a escolha por um clube de outra região ocasiona uma desvalorização dos clubes locais. Em contrapartida, o torcedor “misto” expõe seu desejo de ser protagonista no futebol, o que não seria possível torcendo pelas equipes locais. PALAVRA CHAVE: futebol, torcer, torcedor e torcedor misto. Apontamentos iniciais. Seja por meio dos “rachas2” com os amigos, nas escolas e nos clubes, nas arquibancadas, nos bares, nas comunidades virtuais ou através das transmissões 1 Graduando em Educação Física pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). televisivas ou radiofônicas, o futebol se faz presente no cotidiano da população brasileira, sendo um esporte de imenso apelo popular. Nesse contexto, muito mais que gostar do futebol, o brasileiro escolhe o seu time do coração e a partir dessa escolha passa a vivenciar todas as emoções e possibilidades inerentes ao esporte. Torcer por um clube de futebol é, antes de mais nada, participar ativamente da vida social. Esta participação começa pela escolha, desde muito cedo, por uma entre as inúmeras agremiações clubísticas (DAMO, 1998, p.11). De acordo com o autor, esse momento pode ser considerado como a “iniciação de um torcedor” que, embora repleta de influências e motivações, é feita de forma individual. Para Damatta (1994), o “torcer” é uma área significativamente aberta, deixada ao sabor das preferências individuais. Em Maceió, ao encontro do que afirmam esses autores, o torcedor também realiza suas escolhas. Existem aqueles torcedores que torcem apenas pelos clubes da cidade como, por exemplo, torcedor do Clube de Regatas Brasil (CRB) ou do Centro Sportivo Alagoano (CSA). Também é comum torcer por, pelo menos, duas agremiações. Além da equipe da cidade de origem, esse torcedor escolhe uma agremiação de outra região. Por exemplo, torcer, simultaneamente, pelo CRB e pelo Corinthians - SP; ou pelo CSA e o Flamengo – RJ. Ainda existe outro tipo de torcedor que torce exclusivamente por um clube de futebol de outra região. Por exemplo, aquele torcedor que escolhe apenas Corinthians – SP. O torcedor que faz a opção de torcer por clubes de outras regiões é, pejorativamente, chamado de torcedor “misto”. Essa rotulação é verificada nas discussões, entre os torcedores mistos e os anti-mistos, que são aqueles torcedores que torcem, exclusivamente, pelas equipes locais além de não concordarem com a escolha clubística feita por seus conterrâneos. Entre os torcedores, há um debate sobre o ato de torcer por times de fora. Nessas conversas os torcedores mistos são com freqüência descritos como alienados, manipulados pela imprensa do Sudeste, pessoas que não valorizam os times locais. Alguns afirmarão ainda que em futebol só se deve torcer por uma equipe. Por sua vez, os mistos se defendem, sustentando o direito da livre escolha, independente das fronteiras, o que não é sinônimo de desconsideração ao nordeste (VASCONCELOS, 2011, p.13). 2 Futebol informal praticado por um grupo de pessoas. Sinônimo de “baba” na Bahia, “pelada” na região sudeste. Essa desavença clubística reflete em diversas manifestações dos torcedores antimistos. Através de faixas e cartazes nos estádios, camisetas com mensagens, comunidades e vídeos na Internet, eles apresentam argumentos que, a seu ver, são motivos para não se torcer por um clube “de fora” (VASCONCELOS, 2010, p.64). Nesse contexto, diversas campanhas de “conscientização” foram lançadas na capital alagoana. Em 2007, alguns torcedores do CRB, após diversas discussões nas redes sociais, criaram um movimento com o intuito de conscientizar o seu torcedor, com o slogan: CRB Meu único time. Desde então, foram desenvolvidas faixas, camisas, adesivos que fizessem alusão ao torcer apenas pelo clube da terra. No Estádio Rei Pelé3, em Maceió, as equipes do Murici, em 2011, e do Coruripe, em 2012, mandaram seus jogos pela Copa do Brasil contra Flamengo – RJ4 e Palmeiras – SP5, respectivamente. Por meio de uma faixa com a seguinte frase: “Torça apenas para o time do seu Estado”, alguns torcedores apresentaram suas insatisfações pela presença maciça de torcedores maceioenses presentes no espaço destinado para os torcedores visitantes. Ainda em 2012, em partida válida pelo Campeonato Brasileiro da Segunda Divisão, a torcida do CRB lançou uma nova campanha, por meio de uma faixa com os dizeres: “Jogo do CRB = Camisa do CRB” 6. Esses eventos evidenciam uma resistência ao torcer misto. Diante dessa situação, procurei analisar essa forma de torcer em Maceió, identificando quais as razões que poderiam motivar o torcedor local a escolher clubes de futebol de outras regiões, além de buscar compreender o que os torcedores locais pensam sobre o assunto. Os sujeitos da pesquisa foram alagoanos, residentes em Maceió. Como instrumento de coleta dos dados, elaborei um questionário, através da Ferramenta Google drive7, sendo disponibilizado nas redes sociais 8 entre os dias 15 de dezembro de 2013 e 15 de Janeiro 3 Principal e maior estádio de futebol em Alagoas. Disponível em: http://www.educacao.al.gov.br/centrode-documentacao-e-informacao-educacional/superintendencia-de-esporte-e-do-desporto-escolarsuesd/arquivos-ja-existentes-no-site/esportes/estadio-rei-pele 4 Disponível em: https://www.facebook.com/CRBMeuUnicoTime?fref=ts . Acesso em: 25 mar.2015 5 Disponível em: http://noticianamira.blogspot.com.br/2012/03/teremos-segunda-partida.html . Acesso em: 25 mar. 2015 6 Disponível em: http://www.crbacimadetudo.com.br/blog/lucas/teste-2/#.VSLyp9zF8ac 7 8 Disponível em: http://cmapspublic2.ihmc.us/rid=1KXP7L6B3-ZYP4WX-1FNZ/Ferramentasgoogle.pdf As comunidades do ORKUT onde foram disponibilizados os questionários foram: CONTRA OS MISTOS DE ALAGOAS; CRB – CLUBE DE REGATAS BRASIL; FUTEBOL DE ALAGOAS; CRB, meu ÚNICO TIME; Rivalidades Alagoanas; Já os grupos do FACEBOOK foram: CRB – CLUBE DE REGATAS BRASIL; NAÇÃO AZULINA e [OFICIAL] CSA – Centro Sportivo Alagoano. de 2014. Foram analisados 71 questionários. Foram entrevistados dois torcedores sendo um misto e o outro anti-misto. Apresentação dos dados e discussão. Através dos questionários, indaguei o torcedor sobre o seu time do coração. Em seguida, questiono se eles torceriam por outras agremiações. Conforme apresentado na tabela abaixo, 18 torcedores dos 71 que responderam o questionário, torcem por equipes de outras regiões. Estes sendo, portanto, os torcedores mistos. TORCEDOR PRIMEIRO TIME TABELA 1 - TORCEDOR MISTO SEGUNDO PRIMEIRO TORCEDOR TIME TIME 1 C.S.A CORINTHIANS 2 FLAMENGO CRB/VITÓRIA 3 C.R.B FLAMENGO 4 C.R.B FLAMENGO 5 C.R.B SÃO PAULO 6 C.R.B SÃO PAULO 7 C.S.A FLAMENGO 8 FLAMENGO CSA 9 C.S.A FLAMENGO Fonte: Elaborado pelo autor. 10 11 12 13 14 15 16 17 18 SEGUNDO TIME C.R.B FLAMENGO C.S.A FLUMINENSE C.S.A FLAMENGO CORINTHIANS CSA SÃO PAULO CRB C.S.A SÃO PAULO C.S.A CORINTHIANS C.S.A FLAMENGO C.R.B CORINTHIANS A tabela 1 apresenta as escolhas clubísticas dos torcedores mistos. Esses dados vão ao encontro da pesquisa encomendada, em 2013, pelo portal Cadaminuto/IBRAPE9, que indicou uma grande preferência do torcedor maceioense pelas as equipes da região sudeste, em especial, dos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo. O Flamengo lidera a lista com 27,3%, seguido de Corinthians com 10,5% e Vasco com 8,8%. São Paulo (6%), Palmeiras (5%), Botafogo (1,6%), Fluminense (1,4%), Santos (1,1%), Grêmio e Sport(0,4% cada), e Atlético Mineiro e Bahia (02% cada) completam o ranking. Torcedores de times diversos somam 0,3% e 36,8% não souberam ou não responderam (PORTAL CADAMINUTO, 2014). Possivelmente, a imprensa radiofônica tenha sido importante na preferência pelas equipes, principalmente, do eixo Rio – São Paulo. Aguiar (2007), discorre a 9 Disponível em: http://cadaminuto.com.br/noticia/224056/2013/08/28/crb-desbanca-csa-e-aparece-comoo-time-de-maior-torcida-em-maceio . Acesso em: 27 mar. 2015. respeito, atribuindo a Radio Nacional esse papel de divulgação das agremiações, principalmente, carioca. E foram, principalmente, as reportagens esportivas e as notícias transmitidas pelo O Mundo da Bola que fizeram a cabeça dos amantes do esporte bretão, transformando-os em renhidos flamenguistas, botafoguenses, vascaínos e tricolores. Naqueles anos áureos, os campeonatos eram locais e os jogos só se realizavam nos fins de semana. Os jogos de outros estados não eram transmitidos, e o único torneio interestadual era o Rio – São Paulo. Em síntese: a Rádio Nacional era uma emissora carioca, e foi isso, em matéria de futebol, o que ele ensinou ao brasileiro: a torcer pelos clubes do Rio de Janeiro (AGUIAR, 2007). As discussões sobre o torcer misto recaem sobre a perspectiva da valorização regional. De acordo com Ribeiro (2012), “o discurso-ideológico “anti-misto” procura em primeira instância conscientizar os torcedores de clubes de futebol de sua região, para que torçam apenas para os referentes representantes das mesmas”. Imagino que a conscientização tão almejada pelos torcedores anti-mistos perpasse pelo deixar de torcer por equipes de “fora”. Contudo, não compreendo que essa opção seja algo simples já que por mais que se tente discuti acerca do assunto, o torcedor teria suas razões e estas não estariam equivocadas. Damo (1998), deixa claro em seu estudo que por mais convincente e caloroso que sejam os argumentos utilizados, jamais se chegará a uma conclusão definitiva. Nessa perspectiva, antes mesmo de discordar da opção clubística do torcedor misto, entendo que seria importante compreender as razões da escolha pelo “outro”. Por isso, indaguei sobre quais as motivações que levaram os torcedores locais a essa preferência. Os resultados apontam que, preponderantemente, a família e a mídia são grandes influencias, conforme exposto no gráfico abaixo: A família aparece como principal fator de influência na escolha clubística do torcedor misto. Os dados apontam o pai como responsável direto por tal escolha. Dentro da família, o pai ou mesmo a ala masculina parece ter um papel importante na escolha do clube do filho logo ao nascer. Essa importância atrelada a família é corroborada por outros estudiosos. Damo (2005), expõe que os homens procuram reproduzir seus pertencimentos clubísticos entre os familiares. Por isso, para aqueles que o torcer tem algum significado, é necessário fazer a escolha clubística daqueles que acabam de chegar à família. Até mesmo como uma forma de proteção contra as jocosidades inerentes a escolha clubística. Na hipótese de que o filho viesse a se tornar um torcedor fanático, as possibilidades de fluxos jocosos entre eles estariam de qualquer modo descartadas (DAMO, 2000, p. 101). Diante disso, pensando a respeito de Maceió, conforme já apresentado, a concentração de torcedores de agremiações de fora da cidade é elevada. Logo, existiria um “risco” eminente do filho ou mesmo outro membro da família torcer pela agremiação rival. Como forma de proteção, a família tende a influenciar a criança na escolha do clube. Silva (2001), em seu estudo, investigou a relação do torcedor do Clube de Regatas Vasco da Gama com o seu time. A influência da família é um dos principais fatores para escolha do time carioca. Para o autor, a família remete a uma idéia de continuidade, de tradição. O pai, ao educar o filho, apresenta-lhe, às vezes até de forma arbitrária, uma proposta de vida. Por trás dessa proposição estão as experiências vividas e uma concepção de homem, de mundo e de sociedade e o desejo do que há de melhor para o caminho desse filho. Assim acontece na escolha da religião, da profissão, do clube ao qual se deve torcer e em outras escolhas (SILVA, 2001, p.34). Campos (2010), analisou o perfil das mulheres torcedoras da equipe de futebol do Cruzeiro Esporte Clube, de Belo Horizonte. A autora também verificou que a família é a principal responsável pela escolha do Cruzeiro como agremiação das torcedoras. Além disso, essa opção é feita ainda quando criança e é, normalmente, pelo clube do pai. A mídia também aparece, de forma expressiva, como fator de influência, por meio das transmissões realizadas pela televisão. Os torcedores colocaram que os jogos transmitidos das equipes dos Estados do Rio de Janeiro, principalmente, e de São Paulo são recorrentes na região. Além disso, citaram que as informações sobre os clubes locais são disponibilizadas em meios como Internet, Rádio e Jornal com maior incidência em comparação à Televisão. Essa concepção de mídia vai ao encontro do que expõe Vasconcelos (2011). De acordo com o autor, as mídias transmitem toda a informação referente aos clubes de preferência do torcedor. Dentre essas mídias, as redes de televisão exercem um grande poder de influência em cima dos torcedores. É inegável o alcance e influência que a TV é capaz de exercer. As maiores redes de televisão do país estão sediadas no eixo entre Rio de Janeiro e São Paulo. Esses canais retransmitem sua programação para o restante do território nacional por meio de uma rede de emissoras afiliadas. Sua cobertura esportiva privilegia os times dessas duas cidades. Desta forma, Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco (RJ), Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos (SP), dentre outros, são times que com bastante freqüência têm noticias e jogos exibidos pelas principais redes de TV (VASCONCELOS, 2011, p.51). Esse contexto cria um elo entre o torcedor e a sua equipe de preferência já que as longínquas cidades, que abrigam seus clubes, são aproximadas por meio das mídias. Conforme expõe Vasconcelos (2011) toda essa exposição contribui para a criação de afinidades entre times e torcedores (telespectadores, leitores, ouvintes, internautas...), o que interfere em um dos mais populares patrimônios de um time: sua torcida. Outros fatores também foram apontados pelos torcedores. A afinidade com o clube surge da idéia de simpatia. Eles escolheram os times de “fora” por que simpatizaram com a agremiação. As conquistas dos clubes são expostas pelo torcedor assim como a presença de grandes jogadores. A representatividade e a imagem passada pela torcida dos clubes de outras regiões também é apontada como influência na escolha clubística do torcedor misto. Vasconcelos discorre a respeito: Os títulos são um capital simbólico importante. Desde a criação da Taça Brasil em 1959, primeiro grande torneio envolvendo times de vários estados e regiões, os clubes da Região Sudeste detêm o maior número de títulos nacionais e internacionais, seguidos pelos da Região Sul. [...] Além dos títulos, a torcida pode ser interpretada como um capital simbólico relevante. O número de pessoas que afirma ser torcedor de determinada equipe, bem como a quantidade de publico que o time consegue levar aos estádios são com frequência exaltados, tanto pelos clubes quanto pela mídia e pelos próprios torcedores (VASCONCELOS, 2011, p.40-46). Mistos X Anti-Mistos – O que pensam sobre o assunto? Além das informações enviadas por meio dos questionários, entrevistei dois torcedores. Um torcedor era misto. Este atenderá, a partir de agora, pela alcunha de Gustavo Paiva, 25 anos, maceioense e torcedor do Flamengo - RJ e do CSA. Já o torcedor, anti-misto, a partir de agora será chamado de Pacheco, 19 anos e torcedor apenas do CRB. A opinião apresentada pelo Pacheco associada as respostas enviadas pelos voluntários, através dos questionários, adentra na valorização dos clubes locais. Aqueles que optam por torcer por clubes de outras regiões poderiam dificultar o crescimento dos times de futebol de Maceió, principalmente, do ponto de vista econômico: “Eu acho que eles torcendo pra times de fora, comprando camisa dos times de fora, comprando ingresso para ver jogos dos times de fora, eles acabam desqualificando os times daqui. E eles dessa maneira não podem nem querer assim, dizer que não torcem pelos times locais, pois os times locais não têm recursos se eles mesmos não dão recursos para os times locais (PACHECO)”. De acordo com o entrevistado, falar que as equipes locais não realizam investimentos no futebol seria um argumento inconsistente já que os torcedores mistos investem todos os seus esforços para acompanhar os clubes do coração de outras cidades. Em contrapartida, o torcedor Gustavo Paiva expõe que torcer por clubes de “fora” seria uma possibilidade de participar efetivamente do mundo do futebol. De acordo com o torcedor, as equipes locais não disputam competições importantes em condições de igualdade com as agremiações das demais regiões: “Como a gente não vê frequentemente um time alagoano participando de primeira divisão, de segunda divisão do campeonato frequentemente a gente torce “pra” um time da mídia (GUSTAVO)”. Gustavo também aponta que escolher uma agremiação “de fora” apresenta uma necessidade de reconhecimento, não proporcionado quando a escolha é pelos clubes locais. Sobre essa idéia, Vasconcelos (2011) discorre: Deseja-se alcançar patamares cada vez mais elevados de reconhecimento, de ser mais vitorioso do que o vizinho. O torcedor nordestino que almeja os níveis mais altos de reconhecimento no campo do futebol encontra nos times de sua região um obstáculo, visto que eles ocupam uma situação periférica e de dominados [...] Por que não torcer para São Paulo, Fluminense ou Internacional? Se não encontrar resposta a essa pergunta, o torcedor não vê mais nenhum obstáculo para ser um membro da torcida de times com status mais elevados no futebol (VASCONCELOS, 2011, p. 23). Considerações finais. A escolha clubística apresenta características individuais. Contudo, essa individualidade não é levada em consideração por alguns torcedores quando a opção é por agremiações de outras regiões, fomentando as discussões sobre o torcer misto. A partir desse contexto, realizei o presente estudo com o intuito de analisar essa forma de torcer, levando em consideração a cidade de Maceió. Desde já, esclareço que não tenho a pretensão de apresentar formas corretas de torcer ou mesmo dizer que existem “lados” certos ou errados nessa discussão, mas sim problematizar uma temática que está presente no dia a dia do torcedor. Além disso, embora algumas inferências possam ser feitas a partir deste trabalho, entendo que os resultados encontrados não devem ser generalizados. Corroborando com outros estudos e pesquisas de opinião, existe uma tendência do torcedor em escolher agremiações das cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. Compreendo que esse cenário é de difícil mudança. Porém, o torcedor anti-misto aparece como um foco de resistência a escolha de clubes de outras regiões sobre uma perspectiva de conscientização e, acima de tudo, valorização dos clubes locais. A partir das motivações apresentadas pelos torcedores mistos, o viés familiar perpassa pela idéia de tradição. Dessa forma, a escolha clubística é passada de pai para filho ao longo das gerações. Além disso, no contexto das equipes locais, existe um protagonismo apenas no âmbito estadual, sendo raro desempenhos marcantes em competições regionais ou nacionais, refletindo na exposição midiática reduzida dos clubes da capital alagoana em detrimento das equipes do eixo Rio-São Paulo. Referências. CAMPOS, Priscila Augusta Ferreira. Mulheres torcedoras do Cruzeiro Esporte Clube presentes no Mineirão. 2010. 130 f. Dissertação (Mestrado em Lazer) – Escola de Educação Física, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. DAMO, A. 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Tua imensa torcida é bem feliz...da relação torcedor com o clube. 2001. 130 f. (Doutorado em Estudos do Lazer) – Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001. VASCONCELOS, A.A. Identidade Futebolística: Os Torcedores “Mistos” no Nordeste. 2011. 90 f. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Departamento de Ciências Sociais, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2011. VASCONCELOS, A. “VERGONHA DO NORDESTE”: o discurso dos torcedores “anti-mistos”. In: ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE e PRÉ-ALAS BRASIL, 15, 2012, Teresina. Anais...Teresina: 2012. 15 p.