UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO O Processo Político de Criação dos Institutos Superiores de Educação na Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro: trajetória histórica e interesses conflitantes Fernando de Souza Paiva Niterói – RJ 2003 FERNANDO DE SOUZA PAIVA O PROCESSO POLÍTICO DE CRIAÇÃO DOS INSTITUTOS SUPERIORES DE EDUCAÇÃO NA REDE PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: trajetória histórica e interesses conflitantes Dissertação apresentada ao Curso de PósGraduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Campo de Confluência: Movimentos Sociais e Políticas Públicas. Orientador: Professor Dr. WALDECK CARNEIRO DA SILVA Niterói 2003 FERNANDO DE SOUZA PAIVA O PROCESSO POLÍTICO DE CRIAÇÃO DOS INSTITUTOS SUPERIORES DE EDUCAÇÃO NA REDE PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: TRAJETÓRIA HISTÓRICA E INTERESSES CONFLITANTES Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a obtenção do Grau de Mestre em Educação. Aprovada em ____ de dezembro de 2003 BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________________________ Profº Drº. Waldeck Carneiro da Silva Universidade Federal Fluminense ___________________________________________________________________ Profª Drª. Olinda Evangelista Universidade Federal de Santa Catarina ___________________________________________________________________ Profª Drª Lia Ciomar Macedo de Faria Universidade do Estado do Rio de Janeiro ___________________________________________________________________ Profª Drª Iduína Mont’Alverne Braun Chaves Universidade Federal Fluminense A Deus, fonte de toda ciência, sabedoria e inspiração, o meu louvor sincero. À minha querida e dedicada esposa Valéria, pela compreensão e amor não poupados em tantos momentos e de tantas maneiras. Ao meu pequeno Fernandinho, que generosamente partilhou comigo um pedaço da sua infância. HOMENAGEM Uma amiga, uma grande profissional. Assim era Maria de Nazareth de Souza Lima. Sua dedicação à causa da educação tinha traços nobres. Seus gestos de humanidade jamais serão esquecidos. Nazareth foi uma dessas grandes batalhadoras que labutou diuturnamente, na Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro, por uma escola pública mais digna, postergando, durante muitos anos, o sonho de realizar o Mestrado em Educação. Estando quase a concluí-lo na UFF, aprouve a Deus chamá-la no ano de 2002. Seu otimismo, sua bravura, suas palavras amigas estarão para sempre gravados em nossa memória. Como ela mesma falava: “Os governos passam, as pessoas passam, mas a escola fica...” E a realidade de sermos cidadãos que acreditam que sempre poderão aprender mais é que nos faz continuar lutando para alcançarmos uma sociedade mais justa através do saber. À Nazareth o registro carinhoso do seu colega de mestrado saudoso e agradecido. AGRADECIMENTOS Costumo dizer, ao concluir um trabalho, que tenho direito à menor parte. Isso ocorre porque, num gesto de gratidão, divido-o naturalmente com muitos que, no percurso, ajudaram-me a lograr êxito e alcançar esta vitória. Agradecer torna-se muito difícil porque, ao citar nomes, corro o risco de esquecer alguém a quem muito amo. Entretanto, preferindo correr esse risco, resolvi destacar algumas pessoas sem as quais jamais conseguiria realizar esta dissertação. Portanto, a todos estes, agradeço com muito carinho: A Deus, pelo dom da vida, sem a qual nada seria realizado. À minha família, minha esposa Valéria e meu filho Fernandinho, que comigo dividiram tantos momentos, sabendo compreender-me com amor. Aos meus pais, Almir e Elizabete, que com sacrifício pessoal lutaram para que eu nunca deixasse os bancos escolares. Às minhas irmãs Cynthia e Michele, pelo incentivo sempre presente. Ao amigo e cunhado Éverton, cujos conselhos de irmão sempre foram bem-vindos. À minha prima Rosedna, que tantas vezes se absteve das suas atividades para ajudar-me nos afazeres domésticos. Aos meus sogros Valdéris e Max, e minha cunhada Ceny, pelos incentivos constantes. À minha querida tia Lêda Barreto, com quem tanto aprendi na infância. À minha prima Lídia Barreto, pela revisão do texto, executada com tanto carinho e responsabilidade. Às minhas professoras de ensino fundamental, Maria de Holanda e Renilce Cabral, que se sacrificaram, dando comigo os primeiros passos. Ao meu orientador, mestre e amigo, Profº Dr. Waldeck Carneiro da Silva, pelo caráter, encorajamento constante, zelo e ética profissional, não medindo esforços para que eu alcançasse este momento. Aos meus amados irmãos da Igreja Batista Palmeiras de Niterói e irmãos do MDL, Marco, Fábio, Miguel, Paulinho, Carlinhos, Edson, Evandro, Joelma, Mara, Girlaine, Andréia e Rose, pelas orações contínuas. Ao professor Giovanni Semeraro, pelos preciosos conselhos que me valeram a continuidade no curso. A todos os professores e professoras do Programa de Mestrado e Doutorado em Educação da UFF pelos conhecimentos tantas vezes compartilhados. Às professoras Cecília Goulart e Sandra Selles, Coordenadoras do Programa, pela presteza com que sempre nos atenderam. Aos funcionários da Secretaria do Programa, Marilda, Vanda e Isabela, pela ajuda contínua e de forma tão amável. Aos funcionários da Secretaria da FEUFF, Neuza, Fernando, Wanderley e Paulo pela acolhida generosa nos momentos de dificuldades. À professora Olinda Evangelista, pela inspiração dos escritos que me levaram a formular o projeto e pelo acompanhamento durante a trajetória do curso com tantos conselhos, incentivos e interlocuções. À amiga Nívea, que tanto apoio me deu ainda na seleção para o Mestrado, ajudando-me também na formatação da dissertação. À amiga Edna Vilar, pela interlocução qualificada na hora mais necessária. À Mônica Corbucci, que com tanto carinho incentivou-me a iniciar o texto. Aos colegas do Núcleo de Pesquisa de Formação de Professores, pelas intervenções qualificadas. À professora Maria Inez, que com tanto carinho recebeu-me na Coordenação dos ISE, abrindo as portas das instituições para que eu pudesse iniciar a pesquisa de campo. Aos diretores das unidades, professores e alunos do ISERJ, ISE de Santo Antônio de Pádua, Itaperuna, Campos dos Goytacazes, Três Rios e Bom Jesus do Itabapoana, pela receptividade nas visitas. Aos amigos da BHMN, minha segunda casa, Sr. Paulo Renato, Antônio Neto, Estevam, Levi Soares, Wilson, Alfredo Lee e Hypólito Marco, com os quais pude sempre contar durante o curso e na preparação deste trabalho. Aos amigos Adilson Florentino, Lincoln Santos, Flávia M. de Barros e Jacyana, pelo encorajamento constante. A todos os que, de forma direta ou indireta, contribuíram para que eu chegasse até este momento. Reconheço, com sinceridade, que a menor parte desta importante conquista é minha! “As reformas (...) costumam ser grandes cerimônias que movimentam muitas coisas ao mesmo tempo. Despertam expectativas que não se costumam cumprir, causam mais movimentos do que mudanças. Criam a imagem de que existe uma política educacional. No começo, prestam-se muito ao brilho dos políticos e depois também ao seu fracasso, se perduram muito tempo no poder...” (Sacristán, G.) RESUMO O presente estudo, partindo da compreensão histórica do conceito de superiorização da formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, objetivou analisar o processo político de criação dos Institutos Superiores de Educação (ISE) na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro, enfocando os interesses conflitantes nesse processo, particularmente os embates travados pela Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (SEE), pela Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC) e pelo Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro (ISERJ), na disputa pela concepção de formação de professores e pelos locus e modus de sua realização em nível superior. Com base em pesquisa realizada por meio de entrevistas e de análise documental, foram examinados os quatro projetos de criação de ISE/Curso Normal Superior (CNS) elaborados no âmbito do estado do Rio de Janeiro, no contexto do projeto de desenvolvimento do estado e das políticas de formação de profissionais a educação formuladas a partir da LDB 9.394/96. No estudo, destacou-se o processo de interiorização da formação de professores na Rede Estadual do Rio de Janeiro através dos ISE/CNS, como forma de viabilizar a política desenvolvimentista implementada pelo governo Marcello Alencar. Entre as principais conclusões, ressaltam-se a inexistência de diálogo entre a SEE e a FAETEC no processo de criação dos ISE/CNS; a descontinuidade das políticas de formação de professores no estado do Rio de Janeiro; e a opção dos ISE e da FAETEC pelo distanciamento em relação às universidades, inclusive as universidades públicas estaduais. Palavras-chave: Política de formação de professores – Rio de Janeiro; Superiorização da formação de professores; – Instituto Superior de Educação – Rio de Janeiro RÉSUMÉ La présente étude en partant la compréhension historique du concept de superiorização de la formation des enseignants de la maternelle et de l’école primaire, a eu pour but d’analyser le processus politique de création des Instituts Supérieurs d’Éducation (ISE) dans le réseau public de l’État de Rio de Janeiro. L’analyse a mis l’accent sur les enjeux et les conflits impliqués dans ce processus, et particulièrement sur les luttes ménées par le Secrétariat de l’Education (SEE), la Fondation de Soutien à l’École Technique (FAETEC) et l’Institut Supérieur d’Education de Rio de Janeiro (ISERJ) autour de la conception de la formation des enseignants et du locus et du modus de as mise en place au niveau supérieur. Par le d’entretiens et d’anlyse des documents ont été examinés les quatre projets de création d’ISE/Cours Normal Supérieur (CNS) élaborés par des organismes de l’Etat de Rio de Janeiro, dans le contexte du projet de développement de l’Etat et des politiques de formation des professionnels de l’éducation formulées à partir de la LDB 9.394/96. L’étude a mis en évidence le processus de interiorização de la formation des enseignants dans le réseau de l’Etat de Rio de Janeiro, à travers les ISE/CNS, comme une manière de viabiliser la politique de développement du gouvernement Marcello Alencar. Parmi les principales conclusions on peut souligner l’absence de dialogue entre le SEE et la FAETEC dans le processus de création des ISE/CNS; la discontinuité des politiques de formation des enseignants dans l’Etat de Rio de Janeiro; et l’option des ISE et de la FAETEC pour le distancement par rapport aux universités, y compris les universités publiques de l’Etat de Rio de Janeiro. Mots-Clés: Politique de formation de enseignants – Rio de Janeiro; superiorização de la formation des enseignants; – Institut Supérieur d’Éducation – Rio de Janeiro LISTA DE SIGLAS ALERJ ANFOPE ANPED ANP BID CA CAP CAPES CBIA CCDC CEB CCES/CEP CECIERJ CEDERJ CEE CEFET CEI CET CES CETEP CGP CIEP CLN CLT CNE CNS CNPq CONSED CP CRUB CTQE DDE DIRPE ETE FAEP FAETEC FAPERJ FIESP FINEP FORUMDIR FUNABEM FUNDEF IEPIC Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação Agência Nacional do Petróleo Banco Interamericano de Desenvolvimento Classes de Alfabetização Colégio de Aplicação Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior Centro Brasileiro da Infância e Adolescência Centro Comunitário de Defesa do Consumidor Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação Câmara Conjunta de Educação Superior e de Educação Profissional do CEE Centro de Ciências do Estado do Rio de Janeiro Centro de Ensino à Distância do Estado do Rio de Janeiro Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro Centro Federal de Ensino Tecnológico Centro de Educação Integral Centro e Educação Tecnológica Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação Centro de Educação Tecnológica e Profissionalizante Coordenadoria Geral Pedagógica da Secretaria Estadual de Educação Centro Integrado de Educação Pública Comissão de Legislação e Normas do CEE do RJ. Consolidação das Leis do Trabalho Conselho Nacional de Educação Curso Normal Superior Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Educação Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras Centro Tecnológico de Qualidade da Educação Diretoria de Desenvolvimento de Ensino da FAETEC Diretoria Pedagógica da FAETEC Escolas Técnicas Estaduais Fundação de Apoio à Escola Pública Fundação de Apoio à Escola Técnica Fundação Carlos Chagas de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro Federação das Indústrias do Estado de São Paulo Financiadora de Estudos e Projetos Fórum Nacional dos Diretores das Faculdades de Educação Públicas Fundação Nacional para o Bem-Estar do Menor Fundo de Desenvolvimento para o Ensino Fundamental e Valorização do Magistério Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho IERJ IES IEUSP IDORT INEP ISE ISEBJI ISEI ISEPAM ISESAP ISERJ ISETRI ISEP IST IUFM LDB MCT MEC MTb PDT PMDB PNUD PC do B PSB PSDB SECT SEE SIEB SESu TCE UDF UERJ UENF UFF UFRJ UFRRJ UNESCO UNDIME UNICEF UP USP Instituto de Educação do Estado do Rio de Janeiro Instituições de Ensino Superior Instituto de Educação da Universidade de São Paulo Instituto de Organização Racional do Trabalho do Rio de Janeiro Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos Instituto Superior de Educação Instituto Superior de Educação de Bom Jesus do Itabapoana Instituto Superior de Educação de Itaperuna Instituto Superior de Educação Profº Aldo Muylaert Instituto Superior de Educação de Santo Antônio de Pádua Instituto Superior de Educação do Estado do Rio de Janeiro Instituto Superior de Educação de Três Rios Instituto Superior de Educação do Pará Instituto Superior de Tecnologia Instituts Universitaires de Formation de Maîtres Lei de Diretrizes e Bases da Educação Ministério da Ciência e Tecnologia Ministério da Educação Movimento dos Trabalhadores Partido Democrático Trabalhista Partido do Movimento Democrático Brasileiro Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Partido Comunista do Brasil Partido Socialista Brasileiro Partido da Social Democracia Brasileira Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro Secretaria de Estado de Educação Sistema Integrado de Educação Básica Secretaria de Educação Superior do MEC Tribunal de Contas do Estado Universidade do Distrito Federal Universidade do Estado do Rio de Janeiro Universidade Estadual do Norte Fluminense Universidade Federal Fluminense Universidade Federal do Rio de Janeiro Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação Fundo das Nações Unidas para a Infância Unidade de Pesquisa Universidade de São Paulo SUMÁRIO Introdução........................................................................................................................17 - O encontro com o objeto...............................................................................20 - O aprofundamento do objeto.......................................................................21 - A pesquisa......................................................................................................24 - A produção dos dados empíricos.................................................................26 - A organização da dissertação......................................................................30 Capítulo 1 – O pensamento histórico de superiorização da formação docente: modus e locus 1.1 - Apresentação...................................................................................................33 1.2 - Breve histórico da Escola Normal.................................................................35 1.3 - Formação de professores: modus e locus em evidência..............................39 1.4 - Superiorização da formação do professor da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental: modus e locus no front de batalha...............................................................................................................45 Capítulo 2 - Os Institutos Superiores de Educação e o Curso Normal Superior da Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro: seguindo a linha do tempo 2.1 – Apresentação..................................................................................................53 2.2 - ISE/CNS: nos corredores da história...........................................................53 2.3 – Novos governos, novos modelos...................................................................57 2.4 – O projeto do Centro Tecnológico de Qualidade de Ensino da SEE – CTQE.......................................................................................................................64 2.5 – Compreendendo o modelo do CTQE...........................................................67 2.5.1 - A Unidade de Formação de Professores e o Curso de Formação de Professores em Nível de 3º grau do CTQE...........................................................................................71 2.5.2 – A Unidade de Atualização de Professores do CTQE...........................................75 2.5.3 – A Unidade de Pesquisa (UP) do CTQE ................................................................75 2.5.4 – A Unidade de Produção, Promoção Cultural e Esportiva do CTQE.................77 2.6 – Investida, recuo e extinção do projeto do CTQE........................................77 2.7 – Novos tempos políticos no estado: mudanças à vista.................................81 2.8 – Duas Secretarias em Disputa........................................................................82 2.9 – O Primeiro Projeto de ISE/CNS formulado pela FAETEC – “Projeto Nilda Teves”: um caminho sinuoso e contraditório............................................94 2.9.1 – Compreendendo o modelo de ISE/CNS formulado pela FAETEC....................96 2.10 – Em uma arena de lutas..............................................................................102 2.11 – O Projeto de ISE/CNS formulado pela SEE – “Projeto Álvaro Chrispino”.............................................................................................................104 2.11.1 – Compreendendo o modelo de ISE/CNS formulado pela SEE.........................122 2.12 – Algumas análises sobre o Projeto do CTQE e sobre os Projetos “Nilda Teves” e “Álvaro Chrispino”...............................................................................126 Capítulo 3 – O Projeto de CNS do Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro – ISERJ 3.1 – Apresentação................................................................................................135 3.2 – CNS do ISERJ: a história continua...........................................................135 3.3 – Impasse à vista.............................................................................................137 3.4 – Na tentativa de soluções..............................................................................140 3.5 – O Projeto formulado pela Comissão Implementadora do CNS do ISERJ.....................................................................................................................147 3.6 De IERJ a ISERJ: os embates vividos pela Instituição...............................151 3.7 – A importância de um Projeto Integrado entre o CNS do ISERJ e as Universidades Públicas........................................................................................155 3.8 – As lutas intra e interinstitucionais no governo do estado e a consolidação do projeto do CNS do ISERJ...............................................................................161 3.9 – Novos espaços de disputa hegemônica no ISERJ/CNS............................165 Capítulo 4 – O Segundo Projeto de ISE/CNS da FAETEC – as Unidades implantadas no interior do estado do Rio de Janeiro 4.1 – Apresentação................................................................................................170 4.2 – A FAETEC e a nova gestão estadual.........................................................170 4.3 – A Filosofia do Segundo Projeto de ISE/CNS da FAETEC: entre o profissional e o tecnológico..................................................................................172 4.4 – Os ISE/CNS do interior do estado entram em cena.................................180 4.4.1 – O SUB-Projeto I – Organização Funcional dos ISE..........................................182 4.4.2 - O SUB-Projeto II – Organização Funcional do CNS.........................................185 4.4.3 – Desdobramentos e conseqüências de um projeto aligeirado............................187 Algumas Conclusões...................................................................................................201 Referências Bibliográficas........................................................................................206 Anexos.............................................................................................................................220 Anexo 1: Entrevistas Realizadas.........................................................................221 Anexo 2: Roteiro de Entrevista com a Consultora que formulou o Projeto dos ISE/CNS do Interior.............................................................................................222 Anexo 3: Roteiro de Entrevista com os Professores Implementadores do CNS do ISERJ................................................................................................................223 Anexo 4: Roteiro de Entrevista com Diretores e Coordenadores dos ISE/CNS do Interior.............................................................................................................224 Anexo 5: Roteiro de Entrevista com a Formuladora do Primeiro Projeto de ISE/CNS da FAETEC..........................................................................................225 Anexo 6: Roteiro de Entrevista com o Formulador do Projeto de ISE/CNS da SEE.........................................................................................................................226 Anexo 7: Entrevista com a Formuladora do Primeiro Projeto de ISE/CNS da FAETEC................................................................................................................227 Anexo 8: Entrevista com a Consultora que formulou o Projeto dos ISE/CNS do Interior...................................................................................................................237 Anexo 9: Entrevista com a Diretora do ISE de Bom Jesus do Itabapoana.....247 Anexo 10: Entrevista com Professora Implementadora do CNS do ISERJ...256 Anexo 11: Entrevista com o Formulador do Projeto de ISE/CNS da SEE.....271 Anexo 12: Mapa de Localização das Unidades da FAETEC...........................290 Anexo 13: Fotografias dos ISE............................................................................291 Introdução “A importância da Educação como instrumento ideológico poderoso é muito clara tanto para os que detêm o poder quanto para aqueles que pretendem disputá-lo. A diferença quanto à possibilidade de sua utilização reside no fato de que os detentores do poder político se encarregam de determinar a política educacional a ser seguida, os programas a serem promovidos ou estimulados e o conteúdo ideológico dos mesmos. Para os que disputam o poder a educação é um instrumento somente quando as contradições do sistema, as crises, o clima de efervescência ideológica chegou a um ponto em que os programas educacionais podem ser controlados por aqueles que se opõem à ordem vigente.” PAIVA, 1983, p.23) Começar um trabalho científico não é fácil. Imaginamos que todo labor tenha seu grau de dificuldade. Tanto os mais complexos quanto os mais simples partem de um grau de dificuldade. Pensamos que esse grau seja logo o início, quando começamos a redigir o texto. Todas as vezes em que fomos compelidos a desenvolver uma reflexão, vimo-nos ante a dificuldade de iniciar a redação, crendo, por muitas vezes, que nada sabíamos. À medida que se buscam novos horizontes, alguns percursos tendem a ficar mais íngremes. Há passagens difíceis que exigem atenção e cuidado. Há outras que parecem nos ajudar a atravessá-las. Entretanto, como tudo na vida exige algum grau de renúncia, algum grau de determinação e força de vontade, que vai se ampliando à medida que crescemos no entendimento das coisas, outros caminhos mais complexos vão aparecendo e nos desafiando a percorrê-los. Conosco também foi assim. Desde os idos de 1978, quando ainda estudante secundarista, em que cerrávamos as fileiras do Colégio Estadual Aurelino Leal, buscávamos compreender a escola e seus professores. Procurávamos entender os conteúdos ensinados, para quê e onde seriam aplicados. Por outro lado, tínhamos uma incessante curiosidade em compreender a maneira como alguns professores se comportavam na sala de aula. Sempre críticos e prolixos, fazíamos muitas perguntas, e não foram poucas as vezes que fomos calados pela indignação de alguns docentes, talvez pela falta de resposta, ou por não saberem a resposta. Adentramos no ensino superior para graduar-nos em Pedagogia no ano de 1991, em uma instituição privada. Passamos a nos interessar muito pela área, principalmente por querer solucionar os problemas detectados. Fomos cada vez mais desafiados a procurar compreender os fatos, as coisas, a história, as pessoas. Tínhamos uma obstinação: estudar numa universidade pública. Bem que tentamos. Porém, limitados pelas dificuldades teóricas, vimo-nos impedidos pela pontuação do vestibular a realizar nosso sonho, que era cursar História. Porém, continuamos, fazendo o caminho mais difícil, sobretudo financeiramente. Um dia já formados, ao tentar reingresso na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), para o curso de Letras, fomos aprovados. Não nos contentamos. Não era aquilo que procurávamos. Sentíamos “na pele”. Entretanto, ficamos felizes porque o sentimento de impotência que jazia dentro de nós fora embora com aquela aprovação. Mas o desejo de chegar a cursar História continuava. E a oportunidade viria de outra forma. No ano de 1997, num das tardes de novembro, visitando o campus Gragoatá, da Universidade Federal Fluminense (UFF), após irmos à Secretaria do curso de História, fomos informados, com um pouco de aspereza, que não haveria reingresso para a área. Dirigindo-nos após à Secretaria dos cursos de pós-graduação lato-sensu, da Faculdade de Educação, encontramos abertas as inscrições para o curso de especialização “Os profissionais da escola e as práticas curriculares”. Pensamos então: “especialização, por que não tentar?” Fizemos o exame de seleção e conseguimos a aprovação. Agradecemos muito a Deus, naquele dia, pela sua providência para a nossa vida e pelo caminho trilhado e construído na coletividade até ali. Começava na UFF a realização de um sonho: finalmente estávamos assentados nos bancos de uma universidade pública. O curso teve seu deslanchar. Estávamos sendo bem-sucedidos, mas a preocupação com a definição do orientador para a tão temida monografia de fim de curso já começava a rondar os colegas. No ano de 1998, já no meio do curso, a convite da professora de uma das disciplinas, veio à turma o professor Waldeck Carneiro da Silva, recém-chegado da França, onde havia concluído com êxito seu doutoramento. Conversamos um pouco ao fim da palestra e ele sugeriu que o procurássemos. Naquela dia, tivemos certeza de que os nossos problemas com a orientação para a monografia haviam terminado. Ao procurá-lo novamente, ele se dispôs a nos orientar. Nossa discussão inicial e preocupação com a formação de professores gerou o trabalho monográfico intitulado “O currículo em detrimento da ética na formação de professores das séries iniciais do ensino fundamental.” (Paiva, 1999) No ano de 1999, havendo terminado o trabalho, fomos incentivados pelo professor Waldeck a continuar os estudos. Inscrevemo-nos concorrendo a uma vaga ao mestrado da UFF e, logramos êxito. Com orientador definido iniciamos o curso, que, devido à nossa fragilidade teórica, foi muito difícil, sobretudo nas primeiras disciplinas. O tema do projeto, na área do currículo e da ética continuara, mas já sentíamos necessidade de aprofundá-lo. Despertava em nós o interesse em desvelar alguma política pública no campo da formação de professores, pois não havíamos esquecido das dificuldades pelas quais passáramos. Muitas perguntas sem resposta pairavam sobre a nossa mente, pois construir um objeto é algo bem complicado. Mas estávamos determinados a ir em frente. Chegamos a cursar uma disciplina chamada “Currículo e Cultura”, com o professor Antônio Flávio Barbosa Moreira, no Programa de Mestrado em Educação da UFRJ. Porém as dúvidas não nos deixavam. No final do ano 2000 fervilhavam muitas discussões acerca do locus e sobre o nível de formação de professores da educação básica. Interessando-nos cada vez mais pelo processo histórico de formulação das políticas públicas na área de formação de professores e pelas disputas hegemônicas que se travavam no campo, começamos a perceber que havia uma grande necessidade de entender essas políticas. E nelas estavam os recém-criados Institutos Superiores de Educação (ISE), como nova instituição formadora. Junto a ela, numa linha tênue, estava o Curso Normal Superior (CNS).1 Porém, o que pesquisar ali? Como adentrar num tema tão candente, conhecendo-o tão pouco? É bem verdade que toda pesquisa parte de algo que se quer conhecer melhor. Como já estávamos inseridos na discussão do currículo, observamos que talvez a decisão mais acertada seria falar sobre os currículos do CNS. Porém, surgiu outra dúvida: como falar de currículo de CNS se todos os professores com quem conversávamos, e mesmo os colegas de turma não sabiam diferenciá-los? Como trabalhar um tema em que as pesquisas eram tão recentes, ou, ousando afirmar, nem pesquisas havia; se todos os textos que lia sobre o assunto expressavam mais análises que conclusões ? 1 Doravante, no decorrer deste trabalho, utilizaremos, para Institutos Superiores de Educação, abreviatura “ISE”, e para o Curso Normal Superior, a abreviatura “CNS”. Entre o desejo de aceitar o desafio de enfrentar a pesquisa, a pouca experiência como educador e a (ainda) fragilidade teórica de aprendiz de pesquisador, confessamos que o medo de ir a campo pesou bastante, causando-nos tormentos rotineiros. Ao final do ano 2000, muito incentivados pelo orientador, tendo já concluído boa parte das disciplinas do curso, resolvemos aceitar o desafio de aprofundar a compreensão mais detalhada dos ISE e do CNS. O projeto, entretanto, ainda estava amplo e precisava ser melhor delineado. O encontro com o objeto No segundo semestre de 2001, caminhávamos para o término das disciplinas do curso. Porém, como sempre tivemos a filosofia de que “se você quer dominar um campo, busque estar atualizado”, preferimos continuar cursando ao menos uma disciplina por semestre para não nos desligarmos das novidades trazidas pelos professores. A tática deu certo. No segundo semestre, quando cursávamos a disciplina “Política Educacional”, oferecida pelo orientador, veio à turma para dar uma palestra a professora Therezinha Nóbrega, da SECT/FAETEC, que naquele momento estava atuando como interventora no ISERJ, pois, no estado do Rio, desde 1998, a formação de professores nos ISE/CNS passou a ficar vinculada à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. A palestra daquela professora suscitou-nos muitos questionamentos importantes. O que mais intrigou-nos, levando-nos a uma maior aproximação com o objeto, foi: “Como pode a formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental estar ligada à área de ciência e tecnologia?” Começamos a perceber na palestra da professora que a formação de professores havia despertado um interesse político muito grande no estado do Rio de Janeiro, a ponto de separá-la, em parte, da Secretaria de Educação. O que estaria por trás disso? Não compreendíamos por que a formação de professores, mesmo em nível superior, passara a ficar fora do âmbito da Secretaria de Estado de Educação, e muito menos das universidades. Percebendo que havia, no âmbito da Rede Pública estadual, uma disputa pelo espaço de formação do professor e, por conseguinte, que essas lutas se davam no âmbito das Secretarias (SECTI/FAETEC e SEE) do governo e envolviam, de modo especial, os ISE, principalmente o ISERJ, naquele momento já transformado em Instituto Superior; e por fim, levando a FAETEC a interiorizar essa política partindo de projetos centralizados criando uma rede de ISE, resolvemos encarar o desafio de estudar mais a fundo o processo político de criação de ISE/CNS na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro e sobre ela buscarmos a compreensão acerca do jogo de interesses e luta de forças pela hegemonia da formação de professores para a educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental em nível superior, seus desdobramentos, por que e como foram criados, a fim de compreendermos qual a concepção político-ideológica de formação de professores existente por parte dos dirigentes na Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro. Assim, uma vez delimitado o objeto, o universo escolhido para a coleta de dados foi constituído pelos seis ISE da Rede Pública estadual: Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro (ISERJ); ISE de Santo Antônio de Pádua; ISE de Itaperuna; ISE de Campos dos Goitacases (ISEPAM); ISE de Bom Jesus do Itabapoana e ISE de Três Rios, por considerar que não seria possível verificar os possíveis embates gerados pelo processo de criação sem estudar os projetos e visitar cada instituição que os envolvia, uma vez que, no caso do Rio de Janeiro, na Rede Pública, falar de ISE significa também falar em CNS, uma vez que um existe em função do outro, por não existir a oferta de outros cursos superiores nesses Institutos. O aprofundamento do objeto Quatro preocupações básicas envolveram-nos ao procurar viabilizar este estudo: a história, a política, a explicitação dos fatos e a análise dos dados empíricos. Ao buscarmos, através da história, resgatar o processo político de criação dos ISE/CNS na Rede pública Estadual e os projetos existentes, não poderíamos cair no erro de simplesmente contar uma história sob pena de inviabilizarmos o trabalho e frustrarmo-nos nas conclusões (se chegássemos a tê-las). Não poderíamos nos desvencilhar do processo histórico, por ser ele o encontro entre a origem e a compreensão do processo político. Neste aspecto, fazendo uso de seus registros encontraríamos, ao lermos, relermos e analisarmos o percurso, conclusões mais próximas da realidade, menos nossas e, portanto, mais evidentes e contextualizadas no que o real se apresentaria, obviamente à luz de análises. Isso não seria, no entanto, tão original. Por conseguinte, ao resgatarmos através da história, embates políticos que se deram para a criação dos ISE/CNS na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro, não nos livraríamos, na apresentação dos resultados, de parecermo-nos descritivos, mesmo porque ao trabalharmos a teoria e a “empiria” teríamos que enfrentar, de alguma forma, a descrição das análises encontradas nos dados. Não encontrando jeito, teríamos que correr o risco. Assim, optamos por apresentar os resultados o mais organizadamente possível. Com a escolha, não quisemos, entretanto, ser descritivos. Se para alguns a leitura do trabalho leva a considerá-lo uma descrição, saímos a afirmar, em defesa do objeto, que o trabalho tem alma. Pouquíssimas vezes encontramos, no percurso da pesquisa, fatos contínuos que nos possibilitassem uma leitura dinâmica, aberta, concisa e que identificassem de pronto a realidade. Pelo contrário. Mergulhamos num mundo desconstruído, cheio de sinuosidades e riscos. A descrição elaborada, se, por um lado, representou o resultado de uma leitura do conjunto dos diversos documentos que se nos apresentaram, por outro, foi resultado de uma organização própria dos dados, que mesmo inúmeras vezes discutida e compartilhada com o orientador e vários colegas, não deixou de ganhar um toque pessoal nas análises. Por isso não escrevemos simplesmente uma história, mas foram as críticas aos modelos políticos estabelecidos, alicerçadas na teoria e na conclusão dos dados coletados em campo, que escreveram, de fato, as conclusões na forma em que se apresentam. Desta forma, entendemos que toda a pesquisa tornou-se uma conclusão, pois foi produto das diversas leituras conclusivas da realidade compiladas num texto “descritivo” final. Podemos garantir que a versão apresentada é original e não será encontrada em outros espaços, nem mesmo entre os atores que dela fizeram parte, até porque muitos se desconhecem entre si e os documentos analisados foram juntados num processo demorado e de forma lenta e gradual. Para fazer análises e criar categorias próprias, perdemos a conta de quantas vezes tivemos que nos debruçar sobre deliberações, portarias, decretos, pareceres, resoluções, projetos, anteprojetos e minutas. Inúmeras foram as vezes em que nos submetemos às idas e vindas trabalhosas a Quintino, bairro do subúrbio da cidade do Rio de Janeiro e onde se encontra a sede da FAETEC, onde buscamos colher parte dos dados e informações. Felizmente fomos bem recebidos, embora algumas vezes nos tenham evitado, tal foi a maneira insistente com que nos apresentamos. Na busca pelos dados, lembramo-nos que uma das professoras chegou até mesmo a se esconder no banheiro para que não a procurássemos. Mas esperamo-la à porta até que saísse. Com isso, tínhamos a nítida impressão de que as políticas eram feitas às escondidas e as decisões, na maioria das vezes impostas. Alguma coisa estava errada. Por vezes pensávamos como era difícil ser cidadão ou ser um ”cidadão-pesquisador”. E como foi difícil para nós conhecermos um pouco das mazelas enclausuradas nos gabinetes da FAETEC para sobre elas intervir criticamente. Perdemos as contas das reuniões, encontros e seminários de que participamos, mesmo não sendo convidados; em algumas ocasiões fomos até convidados a deixar o recinto. Um grande problema que tivemos para coletar os dados em todas as instituições, principalmente a FAETEC, foi a privatização de documentos públicos. As pessoas que ocupavam cargos estratégicos se apropriavam dos documentos como se fossem seus, muitas vezes impedindo e, quando melhor, dificultando nosso acesso. Tivemos, por muitas vezes, que enfrentar uma burocracia exaustiva, ainda que possuindo autorização formal para verificá-los. Mesmo correndo todos os riscos cabíveis a quem restitui um processo político, e sobre ele interagindo, lançamo-nos a desafio de superá-los. Embora reconhecendo nossa ainda incipiente argumentação teórica sobre o tema, fomos postos à prova no Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro, quando lá, em nossa primeira visita ao Curso Normal Superior, após tantas dificuldades para consegui-la através de autorização formal, quase tivemos que defender ali mesmo a dissertação, sem ter escrito ainda uma só linha, quando ao sermos recebidos pela Comissão Gestora que dirigia a unidade na época, diante de cerca de 40 professores, expusemos a proposta de trabalho. Após cerca de vinte dias, foi aprovada nossa solicitação, feita por carta através do orientador, para pesquisa na unidade, onde passamos a transitar com alegria, pois estávamos ali “provados e aprovados”. Ainda no ISERJ, em uma das vezes em que lá estivemos, percebemos que os armários foram nitidamente fechados e não conseguimos acesso aos documentos que estávamos autorizados a verificar pela gestão colegiada do Instituto. Uma das entrevistas só conseguimos marcar via secretaria, depois de muita argumentação, sendo avisados várias vezes durante aquele período que o tempo havia acabado. Felizmente, na gestão posterior do CNS encontramos um clima solidário com os dirigentes, prontos a colaborar no que fosse possível, o que realmente ocorreu, inclusive com a disponibilização dos documentos de que necessitávamos. Esta foi uma das situações em que comprovamos a existência de uma luta de forças no interior da instituição. Nos Institutos Superiores do interior não tivemos tanta dificuldade. Isso porque contamos com a boa ajuda da Coordenadora dos ISE da FAETEC, que nos recebeu, mesmo num momento de grandes dificuldades. Podemos dizer o mesmo dos diretores, professores e alunos das unidades, por quem fomos tratados com muita dignidade e cordialidade. Desta forma, cada um dos quase 6.000 quilômetros percorridos nas visitas aos ISE do interior valeu a pena! A pesquisa A opção de iniciar o trabalho realizando uma pesquisa com viés político foi tomada como possibilidade de detectar a origem do processo que convencionamos chamar de “superiorização” da formação do professor, objetivando, assim, compreender por quê, como e onde se deu, no tempo e no espaço, o marco inicial do processo de formação de professores da educação básica em nível superior, buscando também evidências sobre o afastamento do locus de formação do professor da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental, da universidade. Para chegar à origem do processo que definimos como “superiorização” da formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental, recorremos aos estudos aprofundados de Olinda Evangelista (2001, 2002), cujos escritos possibilitaram-nos respaldar a pesquisa ainda em forma de projeto, e com quem, nos últimos seis meses, tivemos a oportunidade de, através de diálogo virtual, aprender muito, recebendo, com gestos de humanidade e nobreza, conselhos valorosos fulcrados sobretudo na experiência e na generosidade. Recorrendo aos estudos de Evangelista (2001, 2002) sobre o Instituto de Educação da Universidade de São Paulo - a primeira experiência universitária institucionalizada de formação de professores no Brasil (1934-1938), chegamos a outro marco histórico importante para nossa análise sobre o processo de superiorização da formação do professor da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental: a análise conjuntural desse processo já nos anos 30 do século XX, com Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo, e a criação do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, mais tarde incorporado por Anísio na UDF, primeira experiência de formação de professores em nível superior na universidade em solo fluminense. A fim de conhecermos um pouco mais da história de Anísio Teixeira e sua passagem poética pela vida terrena, encontramos pouso seguro em Nunes (2000). Pudemos também conhecer com detalhes a história do Instituto de Educação do Rio de Janeiro nos anos 30 do século XX, estudando Vidal (2000). Já a dimensão universitária trazida por Anísio para a formação de professores foinos aprofundada com muita propriedade nos estudos de Mendonça (2002), em quem encontramos respaldo para analisar o processo de superiorização do ISERJ, posicionandonos criticamente sobre ele. Esses estudos possibilitaram-nos desvencilhar o modus operandi da época, a fim de encontrarmos respaldo para analisarmos a evolução da superiorização do professor. O recorte que fizemos permitiu-nos chegar à categoria “universitarização” da formação do professor, constituída nos estudos de Silva (1998, 1999, 2001, 2002, 2003), que em síntese possibilitaram-nos compreender as diferenças entre superiorização e universitarização da formação do professor, possibilitando-nos estender a análise sobre os conceitos de tecnificação, superiorização e profissionalização do professor, abordados nos capítulos dois, três e quatro. Com esses atores, procuramos refletir sobre a diferença entre o modelo de superiorização da formação do professor presente dentro e fora do âmbito universitário, identificando inclusive a presença pós-moderna da figura do tecnólogo em educação, que a corrente neoliberal e desenvolvimentista fez aparecer. Confessamos que a importante presença do mestre Anísio Teixeira, em textos originais publicados no fim da década de 60 e início da década de 70 do século XX, pela Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, ajudaram-nos a compreender a face desejável de um professor formado em nível superior, que é a formação universitária da qual somos partidários. Através dos estudos recentes de Santos (2003), pudemos compreender a linha político-histórica desenhada no Estado do Rio de Janeiro a partir da fusão com o Estado da Guanabara, em 1975, o que nos possibilitou verificar, nas descontinuidades administrativas espelhadas pelos governos, a “continuidade das descontinuidades” no âmbito da formação de professores no Estado do Rio, em que cada governo ou governante quis implantar, à sua moda, tais políticas. Tal estudo possibilitou-nos chegar aos vocábulos “decretização” e “vocação” que,embora por nós usadas no texto como categorias, serviram muito mais como forma de expressar um jeito de fazer política e uma interpretação da realidade num ângulo subjetivo. Em Santos (2003), também tomamos emprestada a categoria “prefeiturização”, de Both (1993, 1997), para demonstrar a relação dúbia existente entre o governo estadual e as prefeituras, para impor a política de implementação dos ISE/CNS no estado. Permeando todo o trabalho, buscamos em Schön (1995) o respaldo necessário para investigar a realidade apresentada nos ISE/CNS procurando inserir nela análises críticas sobre a formação do professor enquanto profissional crítico-reflexivo. A partir das análises do primeiro projeto e ISE/ CNS apresentado pela FAETEC no governo de Marcello Alencar, o qual chamamos de “Projeto Nilda Teves” do projeto da SEE, o qual convencionamos como “Projeto Àlvaro Chrispino”, e do segundo projeto de ISE/CNS da FAETEC no interior, no governo de Anthony Garotinho, pudemos perceber, no fenômeno de criação dos ISE/CNS no estado do Rio de Janeiro, um escudo para ofuscar a realidade do uso do termo “superior” como manobra política para o aligeiramento na formação dos professores, bem como verificar a concepção desenvolvimentista, empresarial e mercadológica de educação superior, presente também na formação do professor, concebida como a de um tecnólogo educacional. Essas concepções, com suas ideologias, foram disseminadas no estado por projetos próprios de formação de professores, aparentemente pouco preocupadas com as conseqüências sociais que teriam. Na continuidade da pesquisa, a análise do projeto do ISERJ fez-nos perceber o lado externo de uma instituição com um aparente projeto de CNS democraticamente construído, que chegamos a ter como modelo do que poderia ser o projeto para os ISE/CNS no estado. Por outro, internamente, a triste compreensão de uma instituição corporativista e dividida em seus diversos níveis de formação, com um projeto de formação de professores em nível superior afastado dos ideais universitários, inclusive os de Anísio, por eles tão evocados, ajudando a modelar as políticas institucionais e descontinuadas que a alta administração fluminense vem seguindo fielmente. A produção dos dados empíricos Segundo MINAYO (1994), a abordagem qualitativa “trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.” (MINAYO, 1994, p.22-23) O recorte utilizado para a coleta de dados foi delimitado a partir dos anos 90 do século XX, a partir do qual encontramos os primeiros indícios do pensamento de formação de professores para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental em nível superior na Rede Pública do Estado do Rio, que consideramos provenientes desse momento os ISE/CNS. Ao delimitar cronologicamente o objeto, constatamos que iríamos transitar num espaço cheio de nuances, com a presença de concepções político-ideológicas distintas, expressas pelos vários atores, desembocando em múltiplas e diferentes políticas de governo. A forma pela qual se desencadeou a criação dos ISE/CNS no estado do Rio não representou uma conseqüência natural do tempo, ou simplesmente mais um fato histórico, mas o desencadear sucessivo de embates políticos, por concepções de formação de professores e formas de administração relacionadas e disputadas ante a mudança do locus formação. Por isso se fazia necessário ouvir os atores envolvidos, a fim de compreender, além do que a história já apontara, a razão pedagógica e político-ideológica para a implantação dos ISE/CNS no estado, bem como os interesses que vinham com eles e deles adviriam. Neste sentido, a pesquisa de campo representaria um esforço em busca da realidade como ela se apresentaria. Ao irmos ao encontro dela, teríamos que nos desprender de nós mesmos. Para que não ficássemos prisioneiros de um método fechado, único e sem alternativas, resolvemos seguir o experiente conselho de LUDKE & ANDRÉ (1986), quando apontam que “Há formas muito variadas de registrar as observações. Alguns farão apenas anotações escritas, outros combinarão as anotações com o material transcrito de gravações. Outros ainda registrarão os eventos através de filmes, fotografias, slides ou outros equipamentos.” (LUDKE & ANDRÉ, 1986, p.32) Chegamos à conclusão de que deveríamos nos utilizar, a princípio, de entrevistas semi-estruturadas, pois, segundo LUDKE & ANDRÉ (1986), a entrevista permite correções, esclarecimentos e adaptações que fazem com que ela se torne um instrumento eficaz de obtenção das informações desejadas. Utilizando-nos desse recurso, fizemo-lo com o uso de gravação de áudio, o que nos permitiu, no momento exato da entrevista, a interação com a pessoa entrevistada, tornando-nos seu interlocutor pelo acompanhamento preciso da fala, dos gestos e da expressão, que muito têm a dizer no momento da análise. Feito isso, pudemos, além de transcrever a fala com exatidão, obter melhores conclusões. Outro recurso que utilizamos foi a análise documental. Por constituir-se numa técnica possível de identificar informações factuais nos documentos e por constituir-se numa fonte estável e rica, pois persiste ao longo do tempo, utilizamo-la para retirar o “néctar” dos documentos analisados, pois, ao construir a análise a partir da tensão entre teoria e “empiria”, necessitaríamos fundamentar as declarações e afirmações, cruzando-as com a análise dos documentos. Como o trabalho de analisar e contextualizar as políticas públicas por natureza exige análise de documentos de diversos tipos, a análise documental seria bem empregada na pesquisa, pois poderíamos utilizá-lo em qualquer material escrito que pudesse ser manuseado como fonte de informação. Segundo LUDKE & ANDRÉ (1986) esse universo inclui “(...) desde leis e regulamentos, normas, pareceres, cartas, memorandos, diários pessoais, autobiografias, jornais, revistas, discursos, roteiros de programas de rádio e televisão até livros, estatísticas e arquivos escolares.” (LUDKE & ANDRÈ, 1986, p.38) Assim, levando em conta a análise de documentos, procuramos descrever o projeto do CTQE e os quatro projetos de ISE/CNS existentes. As entrevistas, por sua vez, tiveram papel importantíssimo na revelação de grande parte desses documentos. Ao longo da pesquisa de campo, realizamos 26 entrevistas semi-estruturadas, no período compreendido entre 12/01/2002 e 09/10/2003, dividindo-as em cinco blocos distintos. Feitas as análises, a divisão em blocos foi vital para a construção dos capítulos dois a quatro do presente estudo. O primeiro bloco foi constituído de entrevistas realizadas com professores ligados à SEE, sendo dois Coordenadores Pedagógicos; um Assessor Pedagógico que participou da formulação do projeto do CTQE; dois Ex-Secretários de Educação; um Subsecretário de Educação e o Subsecretário Adjunto de Ensino que formulou o projeto de ISERJ na SEE que gerou o Parecer CEE 430/97. Isso nos possibilitou uma análise conjunta do processo de implementação das políticas de superiorização pela SEE. No segundo bloco, entrevistamos professores ligados à FAETEC, sendo uma delas a Ex-Presidente e Ex-Secretária de Ciência e Tecnologia do governo Marcello Alencar e formuladora do projeto do ISERJ para a FAETEC, que gerou o Parecer CEE 258/98. Entrevistamos também dois interventores do ISERJ, sendo um dos quais o que implementou, juntamente com a equipe do ISERJ, o projeto institucional de CNS. Por fim, ainda ligados à FAETEC, entrevistamos as duas professoras Coordenadoras dos ISE do governo Marcello Alencar e Anthony Garotinho, o Coordenador Pedagógico e um membro do Centro de Memória da FAETEC. Nessa dimensão pudemos analisar a construção político-ideológica do processo de implementação dos ISE/CNS pela FAETEC e como esta procurava intervir no processo nos governos que dele fizeram parte: Marcello Alencar, Anthony Garotinho/Benedita da Silva e início do governo de Rosinha Matheus. O terceiro bloco constituiu-se por entrevistas realizadas com diretores, professores e coordenadores ligados ao CNS do ISERJ. Entrevistamos, ainda no cargo, a Coordenadora do CNS que ajudou a implementá-lo na unidade e a professora que coordenava os projetos de pesquisa. Realizamos uma entrevista conjunta com uma turma de alunos do 8º período do CNS e a professora da disciplina, a fim de estabelecermos o cruzamento dos dados com as informações apresentadas pelos professores que entrevistamos na instituição e as anotações que fizemos no campo. Entrevistamos, mais recentemente, a atual Coordenadora de Ensino Superior do ISERJ e também a atual Coordenadora do CNS, eleitas democraticamente. O quarto bloco foi composto por entrevistas que realizamos com os cinco diretores dos ISE do interior, e três coordenadores dos CNS. Ao visitarmos essas unidades, fomos a várias turmas, em turnos diferentes, onde conversamos com alunos e professores e pudemos tomar várias anotações. Além das conversas, visando aproveitar mais a oportunidade ímpar das visitas, distribuímos entre os alunos das cinco instituições do interior, ao todo, 700 questionários. Embora não tenhamos tabulado as respostas, ao lê-las tiramos várias conclusões, que somaram-se às que tivemos com as entrevistas e com os documentos analisados. O quinto e último bloco foi constituído apenas por uma entrevista, realizada com uma das consultoras que formulou o projeto de implantação e implementação dos ISE/CNS do interior do estado. Ao iniciar as entrevistas no mês de janeiro de 2002, realizamos a primeira com uma colega de mestrado que cursava conosco a disciplina “Política Educacional”. A referida colega trabalhava na SEE, como Coordenadora Pedagógica, prontificando-se a fornecernos várias informações estratégicas, pois havia participado de várias reuniões com o MEC objetivando a formulação de políticas para a superiorização da formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental no início dos anos 90 do século XX, tendo acompanhado de perto as conversas sobre a implantação dos ISE/CNS no estado. A partir de sua entrevista, pudemos mapear um conjunto de atores que participaram efetivamente da formulação e implementação das políticas para a formação de professores no estado. O processo de transcrição foi trabalhoso, lento e gradativo, uma vez que optamos por transcrevê-las e analisá-las gradativamente. Tal procedimento, entretanto, fez-nos desenvolver uma análise minuciosa das contradições e das sinonímias, acrescentando ao estudo, pouco a pouco novas conclusões. Os dados das entrevistas foram, ao longo do trabalho, sendo cruzados com a análise dos documentos, conforme estes nos vinham às mãos. Analisamos inúmeras leis federais e estaduais, deliberações, resoluções, pareceres, portarias e decretos, além de todos os projetos dos ISE/CNS apresentados no estudo, regimentos internos, catálogos de cursos, relatório de avaliação das Comissões Verificadoras (CEE e FAETEC), e vários outros documentos, que em grande parte encontram-se listados nas referências bibliográficas. Como nos utilizamos também da análise documental, ao fazer a leitura dos documentos estabelecemos um critério de importância entre os atores, visando verificar quais, dentro de um conjunto de participações homogêneas, seriam necessários que entrevistássemos. Consideramos o processo de investigação um grande aprendizado, onde a leitura nas entrelinhas de todo o processo levou-nos a conclusões satisfatórias. A organização da dissertação Assim, procuramos organizar sistematicamente o texto em quatro capítulos. No primeiro capítulo, nos propusemos a realizar um breve resgate histórico acerca da categoria que denominamos superiorização da formação de professores, a fim de verificar a origem do pensamento sobre a formação em nível superior para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental no Brasil, buscando evidenciar as fontes históricas que geraram sua evolução, deslanchando e chegando até a criação dos chamados Institutos Superiores de Educação e do Curso Normal Superior. No segundo capítulo, procuramos compreender como esta visão chegou ao estado do Rio de Janeiro, envolvendo diretamente a SEE com um projeto que ficou conhecido como Centro Tecnológico de Qualidade de Ensino (CTQE) e que marcou a gênese do pensamento de superiorização da formação de professores da Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro, apresentando a forma pela qual essa visão foi concebida e quais os seus desdobramentos políticos. Não consideramos, entretanto, o projeto do CTQE como um dos projetos de ISE e seu Curso Normal Superior (CNS) e sim um eminente precursor2, ou um ancestral dos ISE, contendo em uma de suas unidades o CNS. Ainda no segundo capítulo, procuramos compreender a evolução do processo de superiorização da formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental no estado do Rio, chegando até a que consideramos ter sido o primeiro projeto de ISE/CNS na Rede Pública estadual, realizado pela Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC), que denominamos de “Projeto Nilda Teves”. Para tanto, nos reportamos à história da fusão dos Estados do Rio de Janeiro e da Guanabara, quando encontramos elementos que nos permitiram trabalhar sobre a realidade, tendo como pano de fundo as políticas públicas no âmbito internacional, federal e estadual. Continuando o capítulo dois, alcançamos os desdobramentos do projeto de ISE/CNS ensejado pela SEE, que chamamos de “Projeto Álvaro Chrispino”. Esse projeto guardou uma linha divisória muito tênue com o “Projeto Nilda Teves” por ambos terem se efetivado quase que simultaneamente, sendo formulados no governo de Marcello Alencar, os dois com uma visão aligeirada de formação. Com os três primeiros projetos anunciados, formamos um bloco que nos permitiu verificar os principais embates que se deram no governo estadual, entre a FAETEC e a SEE, na disputa pela superiorização da formação do professor em terras fluminenses em seu modus e locus, evidenciando quais as políticas de formação ou projetos em disputa existiram nessa época para que se efetivasse a supracitada formação dentro do estado do Rio de Janeiro. 2 O Curso Normal Superior, pela Resolução 01/99 do CNE/CP, conjugada ao Parecer 133/2001 do CNE/CES, estabelece onde poderá ser criado um CNS. Porém, no caso específico do estado do Rio, na Rede Pública estadual, a existência do CNS está vinculada à existência de um ISE. Ainda não se conhece situação diferente. Portanto, para fins do presente trabalho, todas as vezes que estivermos falando de Instituto Superior de Educação no Estado do Rio de Janeiro, automaticamente teremos, vinculado a ele um CNS, pois nesse caso o que justifica a existência dos ISE, como Institutos Superiores na Rede Pública Estadual é a existência atrelada de um CNS dentro de sua estrutura. Não há ainda nos ISE outra modalidade de curso de graduação sendo oferecida. No terceiro capítulo, procuramos evidenciar as lutas travadas pelo Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro (ISERJ) e a FAETEC, em dois momentos: o primeiro, a partir do governo de Marcello Alencar, com o “projeto Nilda Teves”, e o segundo, a partir do segundo projeto de ISE/CNS, formulado pela FAETEC no governo de Anthony Garotinho. Buscamos também verificar como os dois momentos contribuíram para reforçar o ideal de “autonomia” administrativa e pedagógica do ISERJ, marcado sobretudo pela formulação de um projeto próprio de CNS e os embates que se deram no interior da instituição. O quarto e último capítulo foi por nós desenvolvido com o objetivo de desvelar o projeto expansionista da FAETEC para os ISE/CNS no interior, a partir do governo de Anthony Garotinho, apontando os desdobramentos dessa política para os municípios que dela se “beneficiaram”. O segundo, o terceiro e o quarto capítulos, constituem o desfecho da exaustiva porém gratificante pesquisa de campo, por nós desenvolvida entre os anos de 2002 e 2003. Para melhor expormos o trabalho, visando uma compreensão mais nítida e organizada das diferenças existentes nos diversos momentos, optamos por fazer uma análise sintética de cada projeto de ISE/CNS estabelecido, para que o leitor se aproprie de suas diferenças e, fazendo um cruzamento entre eles, possa tirar outras conclusões que não nos foram possíveis. Por fim, procuramos evidenciar algumas conclusões sobre a pesquisa, ensejando uma compreensão sobre o processo político de criação dos ISE na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro e os conflitos entre as instituições neles tomaram parte, ousando sugerir o que consideramos um projeto viável para a superiorização da formação do professor através dos ISE/CNS, para o Estado do Rio de Janeiro. Capítulo 1 O pensamento histórico de superiorização3 da formação docente: modus e locus “Os professores constituem o patrimônio cultural mais importante na educação de um país, e o principal patrimônio destes professores não é o domínio de conteúdos específicos ou pedagógicos per ser, embora isto seja fundamental. Estou convencida de que esta entidade oculta é o status dos professores, tanto aos olhos da comunidade como aos seus próprios olhos. Se o panorama educacional de um país chega ao ponto no qual os professores são considerados como pessoas que não conseguiram tornar-se intelectuais universitários, ou, pior ainda, que os professores considerem suas próprias carreiras como tal, então a educação nesse país enfrenta graves problemas” (Solomon, J., 1998, p.137) 1.1 - Apresentação Não é fácil falar de um tema tão relevante como formação de professores, sobretudo quando o que está em jogo não é somente a formação, mas uma luta política histórica travada por essa formação, que desemboca, a nosso ver, estruturalmente em dois eixos: seu modus e locus. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB 9.394, de 20 de dezembro de 1996, reabre uma antiga discussão ou anseio, estabelecendo, nos artigos 62 e 63 especificamente, a criação de uma instituição de novo tipo, porém com velhos contornos, com a finalidade precípua de formar profissionais da educação básica em nível superior, a saber, os Institutos Superiores de Educação. Art. 62 - “A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal.” 3 Por superiorização da formação dos professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental entendemos ser o processo pelo qual os professores são formados em nível superior a partir da formação em nível médio em modalidades (modus) ou locais (locus) diferentes. No âmbito deste trabalho procuraremos evidenciar a superiorização da formação do professor nos diferentes projetos de ISE/CNS constituídos na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro. Art. 63 – Os institutos superiores de educação manterão: I cursos de profissionais para a educação básica, inclusive o curso normal superior, destinado à formação de docentes para a educação infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental; II – programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de educação superior que queiram se dedicar à educação básica; III - programas de educação continuada para os profissionais de educação dos diversos níveis.” Tal formulação da Lei deixou confusos, e com enormes interrogações os profissionais da educação de todo o país, sobretudo aqueles que não se dedicam ao estudo das políticas públicas em educação, visto que uma nova instância formadora de professores foi criada seguindo, como dissemos anteriormente, um viés histórico advindo do final do século XIX e início do século XX. No conjunto dessas idéias e discussões, pairava um debate, que se estendeu aos dias atuais, sobre como formar o professor (discussão também centrada nos currículos e programas) e sobre a elevação do seu nível de formação (ascendência à formação em nível superior). Por outro lado, a elevação do nível de formação desse profissional trouxe também nessa discussão a preocupação sobre o locus de formação, ou seja, qual instituição, qual espaço seria realmente desejável para o deslanchar dessa realidade. Desde a promulgação da LDB 9.394/96, entretanto, muitas dúvidas vêm surgindo quanto à realidade dos Institutos Superiores de Educação, em virtude de se tratar (a instituição) de um fenômeno recente na educação nacional. Para que possamos compreender a extensão da questão sobre a superiorização da formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental no Brasil, e nos prender, em momento posterior, ao foco de análise do processo político dessa formação na Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro, sua origem, seus elementos constituintes, seus embates, interesses, sua viabilidade e seu modus e locus ideal de formação, propomo-nos, a fazer um breve resgate histórico, um recorte, uma viagem no tempo. Assim, para que venhamos a compreender e a ligar os fatos no movimento dos acontecimentos, antes mesmo da compreensão do lugar da formação de professores para a educação infantil e educação básica em nível superior - considerando Silva, 1999; percebendo também a evolução do pensamento sobre essa modalidade de formação de professores no Brasil no tempo e no espaço, e, ainda, os fundamentos mais diretos que levaram à razão presente, no caso específico do estado do Rio (cheia de contornos político- ideológicos no bojo dos mais variados gostos e interesses) faz-se necessário esse recorte histórico. Neste capítulo, partindo de um pequeno recorte sobre a Escola Normal e baseandonos nos estudos de alguns estudiosos do campo, tentaremos nos aproximar do que evidências indicam ter sido a origem do pensamento sobre a superiorização da formação de professores4, da educação infantil e educação básica no Brasil, buscando também nesse momento, meios para compreendermos a evolução do pensamento, que deslanchou e chegou até a criação dos chamados Institutos Superiores de Educação (ISE) e o Curso Normal Superior, como nos aponta SILVA (1999, p.55), “...seu carro chefe.” 1.2 - Breve histórico da Escola Normal Leonor Maria Tanuri (2000) resgata muito bem a preocupação com a formação de professores e sua estrutura, reportando-se à publicização institucionalizada da instrução na modernidade e à implementação de idéias liberais de secularização e de extensão do ensino primário a todas as camadas da população. Vilella (1990), por sua vez, assevera que as idéias de um ensino dirigido a todos e as primeiras propostas de formação de professores são encontradas já nos movimentos de Reforma e Contra-Reforma5. Entretanto, como destaca a autora, somente com a Revolução Francesa e seus ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade foi concretizada a idéia de uma Escola Normal a cargo do Estado para a formação de professores leigos, que no século XIX encontraria condições favoráveis para funcionar, paralelamente à consolidação dos Estados Nacionais e a implantação dos sistemas públicos de ensino. 4 Sobre esta categoria nos pautamos em Silva (1998) nos estudos que passou a desenvolver a partir de sua Tese de Doutoramento intitulada “La formation de maîtres à université: analyse sociologiques des èxperiences menèes dans trois facultès d’education de la ville de Rio de Janeiro (Brésil) –Université René Descartes, Paris V, 1997”, importante pesquisa pela qual lança olhares investigativos em uma categoria próxima, que convencionou chamar de “universitarização da formação de professores”. Como a referida Tese ainda não foi traduzida para o Português, sugerimos a leitura do texto Formação de Professores das Séries Iniciais do Ensino fundamental no Brasil: o que temos e o que precisamos, publicado pela revista Tecnologia Educacional v.26 (143) Out/Nov/Dez – 1998, fruto da exposição do professor Waldeck Carneiro da Silva, realizada no Painel “Formação de Professores: o que temos e o que precisamos”, por ocasião do XXX Seminário Brasileiro de Tecnologia Educacional / I Seminário de Formação de Docentes para a Educação Profissional, de 17 a 19 de novembro de 1998 no Rio de Janeiro - RJ. O referido texto traduz o contexto central da Tese, realçando a questão das tendências contemporâneas de universitarização da formação do professor da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental. 5 Dados importantes sobre a origem da Escola Normal também são encontrados na Dissertação de Mestrado de Heloisa de Oliveira Santos Villela, apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal Através desses elementos históricos, podemos verificar que a formação de professores está quase atrelada ao próprio surgimento do Estado como organismo de regulação social (“normalização”), e dentro dessa, a preocupação inicial com a formação de seus formadores e idealizadores. Segundo Tanuri (2000), no Brasil, já em 1827, em pleno período do Império, a lei determinou que fossem criadas as chamadas escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos do império, e que também fossem selecionados, através de exames, seus mestres e mestras. As primeiras escolas surgiram não somente com a preocupação de preparar docentes para ensinar as primeiras letras, mas para instruí-los no método. Verificamos, assim, a busca por uma formação eminentemente instrumental, já no seu alvorecer, sem uma preocupação (ao menos à vista) com a base teórica. As primeiras Escolas Normais em solo brasileiro, entretanto, só seriam estabelecidas, segundo Tanuri (2000) “(...) logo após a reforma constitucional de 1834, que, atendendo ao movimento descentralista, conferiu às Assembléias Legislativas Provinciais, então criadas, entre outras atribuições, a de legislar ‘sobre a instrução pública e estabelecimentos próprios a promovê-la’ (art. 10, item 2).’ foram encarregadas da responsabilidade de legislar sobre a instrução pública.” (Tanuri, 2000, p.63) Podemos observar, a partir desse momento, que a preocupação com a formação e a “moldagem” do cidadão encontra-se presente desde os primeiros instantes em que a sociedade brasileira começa a ganhar seus contornos estatais, embora ainda imperialistas e bastante provincianos. O modelo implantado para a formação dessas primeiras Escolas Normais foi o francês, o que se deu pela tradição colonial das elites nacionais. Porém, a necessidade de se dar molde a uma sociedade, instaurando nela valores, mesmo que resgatados de origens externas, tornou a formação de professores o primeiro ato para a solidificação de um Estado presente na constituição dos ideais de nação, de povo, de unidade nacional. Logicamente os interesses político-ideológicos surgiram, e lutas de forças começaram a ser travadas. Como salienta Tanuri Fluminense (UFF), intitulada “A Primeira Escola Normal do Brasil: Uma contribuição à História da Formação de Professores, 1990”. “(...)as primeiras iniciativas pertinentes à criação de escolas normais coincidem com a hegemonia do grupo conservador, resultando das ações por ele desenvolvidas para consolidar sua supremacia e impor seu projeto político.” (Tanuri, 2000, p.63) Em interlocução com a autora, podemos admitir que já nesse momento de efervescência política em que as bases do Estado Brasileiro ganhavam contornos, não somente a Escola Normal coincide com a hegemonia do grupo conservador, mas a própria formação de professores para as séries iniciais (até então chamadas de primeiras letras), emerge dessas circunstâncias, e é aproveitada para consolidar a supremacia de um grupo e impor seu projeto político. Os embates político-ideológicos começaram a ganhar peso, e a busca pelos espaços de poder emergiu com características e contornos próprios. A primeira Escola Normal brasileira foi criada no estado do Rio de Janeiro, capital da província, pela Lei nº 10, de 18356, para habilitar pessoas ao exercício da instrução primária, e durou até 1849. Em todas as províncias, porém, a duração de outras escolas também criadas foi curta, marcadas por um processo de criação e extinção. Essas escolas somente começaram a lograr êxito após 1870, com a consolidação das idéias liberais e a obrigatoriedade da instrução primária. Talvez a falta de interesse pelas primeiras Escolas Normais, como nos afirma Tanuri, deveu-se sobretudo “(...)à falta de interesse da população pela profissão docente, acarretada pelos minguados atrativos financeiros que o magistério primário oferecia e pelo pouco apreço que gozava, a julgar pelos depoimentos da época7. Acrescente-se ainda a ausência de compreensão acerca da necessidade de formação específica dos docentes das primeiras letras.” (Tanuri, 2000, p.65) Neste recorte vemos a presença de alguns fatores, que, a despeito de deficiências didáticas, parecem continuar a ecoar durante todo o processo de existência da formação de professores: o interesse financeiro, o tipo de formação (específica ou múltipla, no sentido de classes8 – seu modus) e o locus de formação. Pela característica da sociedade da época, que era dependente do trabalho escravo e era economicamente agrária, não havia, em síntese, condições favoráveis para se desenvolver uma política educacional que contemplasse a todos. 6 Hoje Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho, localizado na cidade de Niterói – RJ. Sem grifos no original. 8 Assim afirmamos porque a política de formação para as elites era uma e a política de formação para os demais cidadãos era outra, e seu modus e direcionamentos serem diferentes nos vários níveis sociais. 7 Devido ao insucesso das primeiras Escolas Normais, no período do Império, alguns presidentes de províncias e inspetores de instrução chegaram a rejeitá-las, preferindo o sistema de inspiração austríaca e holandesa dos chamados “professores adjuntos”, que constituía em preparar empiricamente auxiliares (tutores) para o desempenho da profissão. A visão do ofício, portanto, ainda era um forte constitutivo da sociedade eminentemente artesã da época. No final do Império a maioria da províncias não possuía mais que uma Escola Normal pública, “...quando muito duas, uma para o sexo feminino e uma para o sexo masculino, organizadas com dois a quatro anos de estudo, geralmente três.” (Tanuri, 2000, p.67) Finalizando este breve relato sobre o nascimento da Escola Normal, que se confunde com o próprio nascimento da formação de professores (embora ainda não conhecida por esse nome), podemos ver emergirem alguns aspectos que hoje se fundamentam na perspectiva dessa formação: o aspecto social, traduzido por uma formação diferenciada entre as classes; o modus e o locus de formação, vislumbrando principalmente o espaço físico dessa formação; e o atrelamento à diversidade de instituições que desejavam essa formação nos cursos e conteúdos que a subsidiavam. Também a diversidade de interesses políticos que permeavam o campo e a desigualdade existente nas dimensões regionais deram a essa formação contornos e características bastante diferenciados, principalmente pela formação da elite pensante e das próprias oligarquias que existiam e se reforçavam com esses aspectos. Naturalmente, percebemos que ao final do Império essas constatações apontavam para um desenvolvimento qualitativo e quantitativo das Escolas Normais e a sua qualificação, sobretudo do magistério primário, que começava a ganhar contornos evolutivos já no início do século XX, porém com as mesmas aspirações e preocupações, por parte de alguns, e com o mesmo grau de controle político-ideológico por parte de outros pela característica de formação social de modelo público que possuía. A seguir, tentaremos desbravar um pouco da continuidade do pensamento que chamamos moderno-contemporâneo sobre formação de professores, procurando nos remeter às origens, o que certamente nos ajudará a entender aspectos mais relevantes na evolução de nossa pesquisa. Para tanto, buscaremos compreender a evolução das políticas de formação de professores no Brasil, no final do século XIX e início do século XX, sobretudo seus movimentos de níveis e modalidades já desenhados pela linha do tempo, que nos permitirão caminhar para uma maior compreensão sobre as conjunturas, os interesses, as instituições, as políticas de formação e uma visão mais pormenorizada sobre essa formação de professores para a educação infantil e educação básica em nível superior, atingindo o caso específico do Estado do Rio de Janeiro. 1.3 - Formação de professores: modus e locus em evidência A emergência dos fatos apontados a seguir mostra a evolução do pensamento sobre a formação de professores em nível superior basicamente no eixo São Paulo - Rio de Janeiro, no final do século XIX e início do século XX. Em 12/03/1890, como aponta Tanuri (2000) foi realizada a reforma paulista, tendo à frente Caetano de Campos, diretor da Escola Normal da Capital9. Este, segundo Evangelista (2001) “(...) defendeu a criação de um curso normal superior, modelo para a organização do sistema de ensino e de laboratórios10 para a formação de professores. A idéia concretizou-se na Lei nº 88, de 1892, prevendo um curso superior anexo à Escola Normal, que não funcionou.” (Evangelista, 2001: p.249) Entretanto a Escola Normal Superior permaneceu na legislação até 1920, “...como que a registrar os ambiciosos propósitos de seus idealizadores.” (Tanuri, 2000, p. 69) Por conseguinte, Evangelista (2001) nos remete à década de 20 como inauguradora de uma nova denominação para a Escola Normal, quando Sampaio Dória, em São Paulo, criou, pela Lei 1.750, de 8 de dezembro de 1920, “...uma faculdade de educação para aperfeiçoamento pedagógico e ‘cultura geral’, com a intenção de formar inspetores, diretores de escolas normais, ginásios e grupos escolares, além de professores para as escolas complementares.” (Evangelista, 2001, p.249) 9 Segundo Tanuri (2000), embora a Escola Normal Superior não tenha se instalado, já a partir de 1890, na escola Normal, as alterações foram significativas. O currículo foi ampliado com ênfase nas matérias científicas e o curso foi prolongado para quatro anos, com uma cultura enciclopédica e com exames de avaliação para o ingresso na instituição. Isso demonstra percepção, pelos reformadores, de se ampliar os anos de formação visando a um melhor preparo do professor. 10 Sem grifos no original. Notamos que a expressão “Curso Normal Superior” já aparece nesse contexto, ligada a uma formação teórico-experimental. Podemos perceber desde então a revitalização deste modus de formação, sendo novamente arriscado após tentativas imediatamente antecedentes, aparentemente frustradas de elevação do nível da formação dos professores. No entanto, as posições que eram defendidas pelos intelectuais da época eram variadas e derivavam de consensos e dissensos. As decisões eram mais políticas do que propriamente educacionais. A crítica da época acusou o projeto de Sampaio Dória de despreocupação com os altos estudos desinteressados, que eram centrados em muitas das idéias vigentes. Em 1925, por meio do Decreto Estadual nº 3858 de 11 de julho, reaparece o projeto anterior, que mais uma vez não se concretizou. Segundo Evangelista (2001) “Essas leis, além de resultarem dos projetos em disputa quanto à formação docente, possibilitaram debates e críticas a partir dos quais se gestaram propostas de qualificação que encontrariam nos anos de 1930 momento privilegiado de concretização.” (Evangelista, 2001, p.249) Vários intelectuais da época se dispuseram a criticar o modelo de qualificação vigente, dentre os quais, Fernando de Azevedo, que coordenou a publicação de um inquérito sobre a instrução pública realizado em São Paulo, em 1926, pelo Jornal “O Estado de São Paulo”. Segundo Mendonça (2002), nessa ótica, vários estudos sobre o ensino superior foram promovidos no Brasil. Dentre eles, destacam-se os do jornal O Estado de São Paulo, em 1926, e os da Associação Brasileira de Educação (ABE), em 1928. Todos eles tinham como idealização central a preocupação com a criação de universidades no Brasil que se dedicassem à universalidade dos conhecimentos, à pesquisa científica e aos altos estudos desinteressados. Segundo Mendonça (2002), a idéia que predominava era a criação de institutos que desenvolvessem a pesquisa, a cultura livre e desinteressada, e que o modelo vigente nas faculdades de filosofia européias fosse o molde a ser seguido. Novamente vemos emergir a preocupação com o método, com a idéia de ciência pura para a formação de elites letradas direcionadas à alta administração. Em interlocução com Mendonça (2002), percebemos, no desenvencilhar dos anos 20 e 30 do século XX, duas preocupações centrais. A primeira, marcada pela luta na busca de se implantar instituições (universidades) voltadas para a pesquisa. A segunda, em se instalar as chamadas Escolas Normais Superiores, modeladas seja pela base institucional francesa, seja pelos Teacher’s College norte-americanos, pelos quais Anísio Teixeira sedimentaria suas principais idéias, forjadas na teoria de Dewey. Todavia, cumpre-nos reforçar, ainda nesse momento, que é a intelectualidade brasileira no eixo São Paulo - Rio de Janeiro que vai discutir o modelo de universidade que se quer forjar para o momento. Por um lado, a Igreja Católica, que praticamente detinha o monopólio do ensino secundário no Brasil, procurou cristianizar as elites por meio de colégios secundários sediados em todo o país, para controle destas e do próprio povo. Em 1929 foi criada a Associação dos Universitários Católicos que buscava infiltrarse nas instituições de ensino superior para se opor aos valores que não compreendiam serem os seus, sendo visto como projeto embrionário da Universidade Católica. Por conseguinte, nos anos 30, surgem a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade do Distrito Federal (UDF) - esta criada por Anísio Teixeira - que buscaram, através do Manifesto dos Pioneiros de 1932, a unificação da formação do magistério, que deveria ser realizado em nível superior. Segundo Mendonça (2002), a tendência universitária visava possibilitar, por um lado, um acesso mais igualitário e, por outro, formar as elites dos pensadores, sábios, cientistas, técnicos e educadores, de todos os graus de ensino. À universidade, segundo Mendonça (2002, p.23), caberia “...gerar o estado de ânimo capaz de dar força, eficácia e coerência à ação dos homens, independentemente de suas divergências e diferenças de pontos de vista.” Enquanto a USP fora criada com um número de escolas superiores já existentes, inclusive a Faculdade de Filosofia na UDF se integraram escolas profissionais tradicionais. Ao projeto da USP para a formação de professores cabia apenas fornecer o curso de formação pedagógica para os candidatos ao magistério secundário. Já a UDF tinha um projeto mais ambicioso: passou a ser conhecida como Escola de Educação, e teria como objetivo primordial formar em todos os graus para uma cultura pedagógica nacional, sendo assim mais especializada e centrada na formação do professor. Como ressalta Mendonça (2002, p.23), o Manifesto de 1932 “...defendeu a unificação de formação do magistério em todos os graus de ensino, que deveriam ser fundamentados em nível superior. A universidade deveria assumir essa formação.” Havia a preocupação central de se formar nessas universidades toda a classe dirigente (a formação das elites pensantes), porém como o autodidatismo ainda era um fato latente, também havia a preocupação de formar os professores para os cursos secundários, bastante presentes. Enquanto um grupo, liderado por católicos, queria valorizar o papel da escola secundária, interessado em dar um caráter moralizante e uma cultura média homogênea, outro grupo, liderado por oriundos da Escola Politécnica, buscava, com discurso próprio, a criação de universidades “(...) que deveriam constituir verdadeiras usinas mentais, onde se formariam as elites para pensar o Brasil (equacionar os problemas magnos da nacionalidade) e produzir conhecimento indispensável ao progresso técnico e científico. Para este grupo, o cimento da unidade nacional não era a tradição, mas sim um conjunto de medidas de integração nacional, decorrentes do progresso.” (Mendonça, 2002: p. 21) Parece-nos que mesmo com a existência de dois grupos aparentemente opostos em seus pensamentos, ambos representavam ainda um certo poder oligárquico, expresso nas vias do poder que emanava na época. Algo como subjazendo de uma técnica acentuada, de uma preocupação com a forma, deixando um pouco de lado o conteúdo necessário da mudança de que verdadeiramente a sociedade necessitava. Certamente ainda estas características pertenciam à sociedade (se assim podemos dizer) imediatamente anterior. Uma mudança de visão, uma verdadeira tempestade de idéias, de liberdade de pensamento, caracterizou mais de perto a busca pela formação superior, e não simplesmente uma discussão de fundo interesseiro, técnico, político e sobretudo moldado ainda em visões fechadas e extremamente elitistas. Anísio Teixeira desejava um modelo educacional que atendesse a todos. Em parte, ao modelo elitista emprestado ao Brasil da época, e sobretudo ao eixo São Paulo – Rio de Janeiro, é remetida a preocupação de se formar a classe pensante do país nesse bloco. Em Guimarães (2000), encontramos a narração da experiência pioneira, da chamada Academia de Altos Estudos da Faculdade de Filosofia e Letras, e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, certamente as primeiras instituições desse modelo no Brasil, que nos ajudam a compreender mais ainda o modelo vigente, e onde podemos reafirmar nossa compreensão sobre o modus de formação presente à época, voltado a um saber eminentemente técnico por parte das elites, onde o “culto às letras” era essencial inclusive para formar os altos funcionários dos mais diversos escalões do governo. Como nos aponta Guimarães (2000), era preciso não somente conhecer a realidade do país, mas modificá-la. Entendiam esses intelectuais que somente uma escolarização em todos os níveis poderia ser um instrumento poderoso para impulsionar o progresso da sociedade brasileira. Porém essa visão, segundo os associados da Academia de Altos Estudos da Faculdade de Filosofia e Letras do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1916-1921) só poderia vir revelando o Brasil aos brasileiros “...pelo caminho das letras.” Guimarães, 2000, p.39). Reportando-se a Wilson Martins, em sua obra de 1979 intitulada História da Inteligência Brasileira, Guimarães (2000) traz à luz uma menção de Américo Jacobina Lacombe, quando num opúsculo escrito por ocasião da passagem dos 150 anos do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, assim se coloca: “(...) Sabe-se que, justamente em 1915, o Instituto Histórico criou uma Faculdade de Filosofia e Letras (paralela à Escola de Altos Estudos) que funcionou até 1920 e implicitamente denunciava o escândalo que era a inexistência, até então, de uma universidade brasileira.” (Guimarães, 2000, p.39 apud Martins, 1978, p.29) Segundo Evangelista (2001), os intelectuais que criticaram essa incômoda inexistência, eram renomados dos meios acadêmico e político, e “(...) trataram a questão articuladamente aos acontecimentos educacionais do momento e referindo-a aos vários níveis do sistema de ensino. Denomina-se a unidade para a formação do magistério da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Faculdade de Educação, Faculdade de Ciências e Letras, Escola Normal Superior, Faculdade de Pedagogia e Cursos Superiores de Ciências, designações derivadas dos dissensos e consensos entre seus propugnadores”. (Evangelista, 2001, p.249) Estes eram os modelos sugeridos para a formação em nível superior à época, grandemente discutidos pela intelectualidade, numa luta de forças intensa, e que, numa disputa ideológica, como vimos, atuava em consensos e dissensos. Curiosamente, esse modelo de formação de professores vai ainda vigorar durante muitos anos, com a idéia de formação de professores em nível superior vinculada a uma instituição que custou a ser fragmentada: a Faculdade Nacional de Filosofia, criada efetivamente no governo Vargas, em 1939, de tinha caráter eminentemente pragmático. Outrossim, era sentida cada vez mais a necessidade de se enfrentar os problemas educacionais do país em um locus onde as idéias e os meios para se formar professores e intelectuais envolvidos com o magistério estivessem acima de interesses políticooligárquico-classistas, e de tradição elitista, embora essa questão da educação como um todo ainda não fosse bem clara. As posições defendidas, ora por grupos que se engajavam na luta por uma formação de cultura geral pedagógica, ora por formação técnica e centrada nas elites pensantes, caracterizaram todo um momento em que o país viveu, de efervescência na busca de uma formação que suplantasse o primarismo ou o secundarismo. Ao mesmo tempo em que o país, pelo lado das elites pensantes, buscava melhorar mais sua posição, por outro ângulo era necessária uma formação que possibilitasse ascendência para libertar, para formar melhor os professores que atuavam na educação da época. Se para um grupo o saber era tido como liberdade, para o outro grupo a liberdade do pensamento representava o controle. No entanto, ambas as visões que temos desse momento convergem numa só: era necessário ascender a um modelo de ensino superior em instituições que garantissem a condição do nome aliado a uma cultura não-fragmentada. Inicia-se, então, a preocupação com a formação, seja do indivíduo, seja do formador do indivíduo, ou ainda dos dirigentes sociais. Uma formação que suplantasse os modelos até então vistos. A certeza também parecia ser uma só: independentemente do modus a seguir, e independentemente do seu locus de formação, havia uma crença maior, por parte dos educadores, de que um nível de formação mais elevado deveria ser alcançado. Obviamente essa idéia deve ter encontrado enfrentamentos e resistências enormes por parte da elite pensante, devido ao modelo de formação que haveria de emergir. Anísio Teixeira foi o intelectual que nos levou a conhecer um modelo de educação, numa universidade própria, por ele idealizada, diferente, consciente e abrangente. Para ele, segundo Mendonça (2000), a universidade é única e exclusiva porque não prepara simplesmente práticos ou profissionais de ofícios e artes, e, sim, é uma escola que forma os intelectuais de que o país precisa, que servem à inteligência e à cultura, e delas se fartam, pois atuam nas diferentes áreas do saber. É em Anísio que vemos precípua a missão social de um ensino que prepara profissionalmente esse homem que serve e desenvolve o saber, formando-o intelectualmente com uma experiência sempre renovada, consciente e progressiva. Anísio era assim. Embora bacharel em Direito, tendo iniciado o seu curso na capital baiana, vindo a concluí-lo na Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, em 1922, ele enveredou pelas vias da educação, assumindo a Inspetoria Geral de Ensino da Bahia. Após uma viagem aos sistemas escolares das chamadas “nações civilizadas” (Espanha, Bélgica, Itália e França), Anísio inaugurou, em 1926, uma escola de formação de professores em Catité (BA), sua cidade natal. Segundo Gondra (2000, p.74), esse era o “...indício daquilo que será uma de suas maiores preocupações ao longo de sua carreira de educador e homem público: a formação de professores nos diversos níveis de ensino.” Ainda segundo Gondra (2000), Anísio continuou suas observações e, de sua visita, em 1927, aos Estados Unidos, resultou a obra Aspectos Americanos de Educação, publicada pela imprensa oficial da Bahia. Novamente tendo retornado aos Estados Unidos, em 1928, realizou um curso de 10 meses no Teacher’s College, da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, concretizando assim uma aproximação com a experiência americana, sobretudo da filosofia de John Dewey, que lecionava naquela instituição. 1.4 - Superiorização da formação do professor da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental: modus e locus no front de batalha “A primeira ‘escola de educação’ de nível universitário11, que existiu no Brasil, foi a “Escola de Professôres do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, criada em 1932 no ex-Distrito Federal, que daquele modo passou a designar-se quando de sua incorporação à Universidade do Distrito Federal fundada em 1935.” (Anísio Teixeira, 1969, p. 239)12 A partir da década de 20 houve substancial aumento das massas urbanas. Isso gerou um desejo incontido de mobilidade social, o que provocou, segundo Lopes (2001), uma demanda escolar sem precedentes. Os políticos da época tiveram de repensar a educação popular, que gerou mudanças também no plano ideológico e no modelo doutrinário, inspirados pela Escola Nova para uma série de reformas no ensino. Aos estados, com o advento da República e a descentralização do ensino, cabia o controle da educação primária e do ensino profissional. Com isso, em 1930 nasceu a nova Escola Normal do Distrito Federal, onde, segundo Lopes (2001) o idealismo renovador transformaria a escola tradicional numa nova escola. Essa nova escola nascia já dentro do conflito, poucos anos da eclosão do movimento revolucionário que levaria Getúlio Vargas ao poder. Certamente este seria já um grande sinal para a sobrevivência da nova escola, de vida meteórica, mas de ações que deixaram rastros para as gerações futuras, que permanecem até a atualidade. 11 Sem grifos no original. Cabe-nos ressaltar que, embora as características da “Escola de Professores” de Anísio Teixeira lhe conferissem um mérito universitário, a primeira experiência universitária institucionalizada de formação de professores ocorreu em 1934, com a agregação do IEUSP (criado em 1933) à USP (criada em 1934). 12 Muitos intelectuais da época culpavam a má formação dos professores como causa suficiente para uma sociedade desigual. Nem todos possuíam a visão de que muitos problemas eram resultantes da reprodução dos valores das classes sociais dominantes pela própria escola. Mesmo sendo os métodos da Escola Nova tidos como pseudo-científicos, o movimento renovador tendeu a crescer. Como afirma Lopes “A partir de então, a escola tradicional com sua pedagogia da “essência”, que servia perfeitamente aos interesses burgueses, começa a ser contestada. Os liberais contra-atacam, propondo a pedagogia da “existência”, a partir da constatação de que os homens não são essencialmente iguais e é preciso respeitar as diferenças. Ou seja, a burguesia revolucionária do século XIX, que propagava a igualdade entre os homens era agora uma classe consolidada, receosa de perder o poder, e por isso reacionária.” (Lopes, 2001, p. 103) Cresceu, então, o movimento pela criação de uma escola transformadora, idealizada por Anísio Teixeira, capaz de oferecer aos indivíduos daquele modelo de sociedade, oportunidades iguais e um preparo compromissado para a democracia. Assim, diante de muitos enfrentamentos e posturas contrárias, em 1932, por iniciativa de Anísio, a recém-inaugurada Escola Normal fora transformada em Instituto de Educação, ganhando status de escola de formação superior, porém só destinada a esse nível em 1935, com sua incorporação à Universidade do Distrito Federal, também criada por Anísio Teixeira. A Universidade de Educação ficou assim conhecida por permitir que os profissionais que nela ingressassem tivessem acesso aos mais diversos cursos na área de educação. A escola era destinada (...) à licença do magistério de nível primário, médio e superior e ao preparo de especialistas em educação, cujos graus universitários correspondem ao bacharelado e ao título de licenciado em magistério e em especialização profissional no campo da educação. Em nível de pós-graduação, ministra os graus de Mestre e de Doutor.” (Anísio Teixeira, 1969, p.239) Anísio não podia conter a satisfação pelo feito alcançado. Afinal, pagara o alto preço de uma vida inteira de dedicação, como liberal igualitário que era, pela busca da educação das classes populares, procurando dar-lhes um novo sentido de vida, uma possibilidade de ascendência diante de uma sociedade elitista e excludente. A partir de seu funcionamento como instituição de ensino superior, a Escola de Educação ou Universidade de Educação era comparada pelo mestre Anísio Teixeira como à escola de Medicina, dando-lhe sentido amplo como escola de ciência e arte, aplicandolhe o sentido de prática profissional. Anísio fazia questão de ressaltar que a escola concentraria cursos desde a pré-graduação até a pós-graduação, oferecendo também cursos de aperfeiçoamento, de alta especialização, e, como não poderia faltar, tendo como eixo a pesquisa, elemento constituidor de estudos avançados. Anísio não concebia a formação do professor fora da ambiência universitária, imputando-lhe a responsabilidade de libertar num contexto de formação consciente. Este sempre creditou à educação um estatuto de cientificidade. Ele sonhava em institucionalizar o estudo científico da educação, superando assim, segundo Mendonça (2002) “...o tratamento empiricista que até então se dispensava no país aos problemas educacionais.” A guerra travada por ele era a de planejar a formação do magistério no Brasil. Não um magistério que servisse de paliativo às necessidades prementes da nação, mas um magistério pautado por num professorado consciente, capaz de pensar e resolver os problemas sociais do país. Era como estar em meio a uma guerra. Anísio comparava a formação dos professores a uma campanha para a formação de um exército destinado a uma guerra já em curso. Segundo ele, ter-se-ia que mobilizar todo o sistema escolar “(...) para o ataque ao problema de formação de um magistério em ação, associando seu treinamento à prática mesma no ensino. Será para manter a comparação com a necessidade bélica, um treinamento em serviço, um treinamento em batalha. Ora, a primeira necessidade da guerra é a de um estado-maior com a capacidade de estudo e decisão acertada. As escolas de educação avançadas13 , ou seja, pós-graduadas, são esses estados-maiores, que juntarão capacidade de estudo de ação para ajudar a realização com êxito da batalha do ensino.” (Anísio Teixeira, 1969, p. 240) O sentido que Anísio Teixeira atribuía à Escola de Educação era o de uma escola de altos estudos e também de uma escola de aplicação especializada dos conhecimentos humanos e não uma escola que apenas buscasse o conhecimento pelo conhecimento. Este era o fator que, segundo ele, a diferenciaria das escolas acadêmicas por campo de 13 Sem grifos no original. conhecimento, cujo sentido era a busca desinteressada do saber. À Escola de Educação caberia a preocupação com o saber elaborado em seus diversos níveis. Entretanto, sua tarefa maior a ser desempenhada era a de como ensinar e treinar, de como tratar e organizar o saber para anexá-lo à tarefa do ensino nos mais diferentes níveis e objetivos. Por isso a Escola de Educação ganhara caráter eminentemente superior, pois só a pesquisa de caráter científico, aliada à vontade do saber, poderia aperfeiçoar o professor e torná-lo um verdadeiro formador de gerações. Anísio Teixeira faz um grande detalhamento sobre o funcionamento da Escola de Educação. Não nos cabe, para efeito desse trabalho, mostrar toda a infra-estrutura da Escola. Porém, para podermos ter uma idéia de sua dimensão, descrevemos abaixo, na íntegra, conforme apontamentos do próprio Anísio, a estrutura departamental e os cursos oferecidos por essa escola, que assim era composta: “1 – um departamento de fundamentos filosóficos e sociais da educação; 2 – um departamento de história da educação e de educação comparada; 3 – um departamento de psicologia educacional; 4 – um departamento de construção dos currículos, dos sílabos e dos programas e de metodologias e técnicas de ensino; 5 – um departamento de testes, medidas e avaliação dos resultados escolares; 6 – um departamento de organização e administração escolar; 7 um departamento de systems analysis14 para manter tôda a processualística escolar em permanente reexame e reavaliação de sua eficácia. Cada um desses departamentos é um centro de estudos, pesquisa, experimentação, no seu respectivo campo para fundar e encaminhar uma teoria e uma prática da instrução nos diferentes níveis e linhas de ensino e treinamento dos diversíssimos projetos de currículos e programas de educação do sistema escolar.” (Anísio Teixeira, 1969, pp. 246 e 247) Como podemos observar, Anísio Teixeira era um intelectual à frente do seu tempo. O modelo por ele criado para a Escola de Educação permeava os mais diversos campos da organização educacional, tanto os de detalhe mais técnico, passando pelos pormenores empíricos, até aos que reconhecidamente necessitavam de uma habilidade centrada no domínio de conteúdos e conhecimentos do professor, fossem esses curriculares, escolásticos ( pautados na informação ) ou culturais. Anísio se preocupava com um 14 Segundo Anísio Teixeira, o systems analysis é o método de se ver a educação como atividade que tem de ser organizada, disposta e efetivada com essa plena consciência do que está ocorrendo, e de porque está ocorrendo, a fim de se poder controlar o processo para que o resultado seja previsto. professor que não simplesmente transmitisse o saber escolástico, mas que o descobrisse e o recebesse. Para ele, o saber deveria começar na escola e transpor os seus muros. Isso somente uma universidade poderia dar, devido a sua preocupação com o ensino, com a pesquisa e com a extensão. Já dentro de sua estrutura, o Instituto de Educação era composto de quatro escolas: Jardim de Infância, Escola Primária, Escola Secundária e Escola de Professores, numa perfeita continuidade de ensino. Nessa Escola de Educação, o mesmo aluno poderia passar 16 anos de sua vida no mesmo estabelecimento, sendo três anos no Jardim de Infância, cinco anos na Escola Primária, seis anos na Escola Secundária e dois ou mais anos na Escola de Professores. Segundo Anísio Teixeira, ao Instituto de Educação (este dentro da Universidade) cabia naturalmente o papel de um arquivo de pesquisas educacionais que poderia, com o passar dos anos, influenciar grandemente o pensamento pedagógico do país, uma vez que essas pesquisas fossem elaboradas e publicadas. Uma das curiosidades é que o Instituto não aceitava o ingresso de alunos por transferência de outros estabelecimentos de ensino, a não ser que estes postulassem cursos de extensão e aperfeiçoamento. A Escola Secundária preparava para o ingresso na Universidade e no Instituto, porém esse destinava-se exclusivamente à formação técnica do professorado, auxiliares de ensino e especialistas em educação, na escola de professores, que formava em nível superior. A escola de professores era calcada (como já referenciamos neste capítulo) no modelo dos Teacher’s College americanos, e o curso visava “(...) formar professores conscientes de sua missão, não só capazes de realizar, mas também de entender os fundamentos de seus processos de ação, e capazes de perceber quais as modificações que a experiência venha a aconselhar, em vista das diferenças individuais dos alunos ou dos grupos sociais em que eles vivam.” (Anísio Teixeira, 1934, p.12) A consciência com que eram formados os alunos da Escola de Professores do Instituto de Educação respalda, mesmo que entendido de forma contrária, nos dias atuais, o jargão “superior”, utilizado por muitos cursos de formação de professores espalhados pelo Brasil afora, servindo-lhes de refúgio para uma formação aligeirada. É bem verdade que, infelizmente, muitos desses cursos não têm o compromisso que tinha a origem desses ensinamentos, tanto na carga horária minimalista de formação, quanto nos conteúdos a eles inerentes. Utilizam ementas e programas apenas para considerar o fato de existirem e servirem, em muitos casos, a interesses particulares e economicistas, e no caso de instituições públicas, aos interesses políticos. Parece-nos portanto que algumas expressões como: “missão do educador”, “professor consciente”, “processos de ação e reflexão”, “pesquisa na ação”, continuam sendo utilizadas por muitos que sequer buscam compreender de onde elas vêm, ou como e em que momento foram utilizadas, e o que puderam transformar ou modificar. Embora o Instituto de Educação, com respaldo de instituição formadora de professores em nível superior, tenha sido criado em 1932, a Universidade do Distrito Federal, também criada por Anísio Teixeira, só teve seu início em 1935, e ganhou o apelido sugestivo e carinhoso de “Universidade de Educação”. Como nos aponta Mendonça (2002) “Na prática, a UDF acabou por se dedicar primordialmente à formação de professores, até mesmo porque, pelas próprias restrições que lhe foram impostas pelo governo federal, apenas puderam funcionar em seu interior cursos que forneciam licença para o magistério das escolas secundárias (à exceção de alguns poucos oferecidos pelo Instituto de Artes), como evidenciam tanto os editais de vestibular quanto os relatórios de fim de ano da universidade.” (Mendonça, 2002, p.34) A origem tanto do Instituto como da UDF veio a romper com o autodidatismo existente até então, com que vinham sendo formados os intelectuais da época, proporcionando a criação de um espaço de produção, discussão e disseminação de saberes eminentemente laico. Anísio chegou a comparar a pluralidade de seus cursos com os de medicina, onde o gosto pela ciência e pela pesquisa faria emergir uma cultura verdadeiramente brasileira, com saberes substanciais socializados e que seriam “degustados” por todos os que sabem e os que desejam aprender. Embora sua duração tenha sido curta, a Universidade de Educação deixou marcas profundas na formação do pensamento educacional brasileiro na área da educação, e sobretudo na formação de professores, por se reportar às primeiras experiências positivas de formação para a educação infantil, séries iniciais do ensino fundamental e educação básica como um todo. As experiências de ambas, USP e UDF, segundo Mendonça (2002), seriam a expressão mais acabada de tentativa de estruturação de um campo cultural relativamente autônomo frente ao Estado. É bom frisarmos, porém, que a experiência da UDF foi bem mais marcante, frente à experiência da USP, porque os organizadores daquela foram consensuais ao afirmar que não existiam no Brasil homens de ciência à altura da tarefa proposta pela universidade. Segundo Mendonça (2002), mais de dois terços do professorado da USP eram estrangeiros, principalmente franceses; enquanto, no caso da UDF, a presença de professores estrangeiros foi relativamente menor, pois havia um núcleo nativo de intelectuais (autodidatas, egressos das escolas superiores tradicionais), que aderiram com muito gosto à empreitada para as tarefas de ensino. Interessante verificarmos que desde sua criação, a UDF valorizou a cultura nacional, não ficando à mercê de uma cultura colonialista15. A UDF foi definitivamente extinta em 1939 pelo governo federal, que transferiu sua estrutura para os quadros para da Faculdade Nacional de Filosofia da recémreorganizada Universidade do Rio de Janeiro, que mais tarde ganharia o título de Universidade do Brasil. Percebemos novamente aglutinado numa faculdade de filosofia o modelo de formação de professores, que se perdeu dentro da política do Estado por ser considerado um subproduto da ciência, ou uma não-ciência, que poderia estar perfeitamente subordinado a outros modelos de maior importância. É interessante observar que a Faculdade Nacional de Filosofia não incorporou em sua estrutura a Escola de Educação, que ficou excluída, e com ela o Instituto de Educação, o Departamento de Artes do Desenho e o Departamento de Música, além dos cursos de formação de professores, de orientadores do ensino primário, de administradores escolares e os cursos de aperfeiçoamento da Faculdade de Educação. Segundo Mendonça (2002), o sonho de Anísio Teixeira de institucionalizar o estatuto científico da educação jamais foi atendido, pois, como dissemos anteriormente, a Escola de Educação ficou sendo uma Seção de Pedagogia dentro da Faculdade de Filosofia. Este fato fez com que a geração desses intelectuais não fosse reproduzida, inaugurando no campo da educação uma nova tradição, e renovando seus quadros, e que não conseguissem romper com o empiricismo que reinava, fato que esses intelectuais, especialmente Anísio, continuariam perseguindo nas décadas de 40 e 50 do século XX. A visão que temos hoje da universidade como o locus privilegiado de formação foi uma constante preocupação para Anísio Teixeira, em quem pudemos perceber notável interesse por um modus universitário de formação numa visão ascendente. Neste caso, 15 Expressão utilizada por Silva (1998) para indicar a importação de modelos de formação de professores a fim de serem adaptados à cultura nacional. como nos aponta Mendonça (2002), essa mudança progressiva só a universidade poderia dar, por ser ela, segundo o próprio Anísio, quem poderia formar professores e promover a pesquisa científica, pois, segundo ele, somente a universidade seria capaz de extrapolar seus próprios muros e estender-se para a sociedade como um todo. No próximo capítulo buscaremos dar continuidade ao entendimento do processo histórico que nos permitirá chegar à compreensão do pensamento da superiorização da formação de professores da educação infantil e educação básica nos Institutos Superiores de Educação da Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro. Neste capítulo, buscamos trazer à luz, mediante um denso recorte histórico pautado em diversos estudiosos do campo, os elementos básicos para compreendermos a origem primária do pensamento de superiorização da formação do professor, as estruturas dessa formação e os locais múltiplos que a possibilitaram, o que nos permitirá fazer uma análise dos projetos dos ISE/CNS que surgiram no estado do Rio de Janeiro a partir da década de 90 do século XX. Percebemos também que o pensamento sobre superiorização dessa formação ganhou força e forma em Anísio Teixeira, o qual em um período de quatro anos (19351939), marcou todo um conceito brasileiro sobre formação de professores em sua abrangência, interferindo significativamente em sua história. Queremos enfatizar que é através da análise dessas questões, que em momentos posteriores de nosso trabalho serão mostradas as relações com a atualidade. Certamente este recorte nos será muito útil para a compreensão do pensamento atual e dos embates que estão sendo travados no campo da formação de professores no Brasil, e mais diretamente no caso do estado do Rio de Janeiro, principal alvo deste estudo. CAPÍTULO 2 Os Institutos Superiores de Educação e o Curso Normal Superior na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro: seguindo a linha do tempo “A marca encobridora da ideologia tem aparecido sempre que se procura investigar as razões de uma determinada escolha de métodos, de programas, de parâmetros teóricos e de prioridades políticas no campo da educação. E, se o conteúdo político-ideológico de qualquer ação pedagógica tem sua determinação na prática social, é nela que devemos procurar as razões das escolhas, tanto pessoais (profissionais) como governamentais.” (Lôbo Júnior, 1988, p.3) 2.1 - Apresentação A discussão que procuramos fazer neste capítulo tem, como recorte, o momento político vivido pelo Estado do Rio de Janeiro a partir da década de 70 do século XX, que serviu de base para amplas mudanças na educação e na formação de professores no estado, culminando na criação dos ISE na Rede Pública Estadual. Em nossa discussão, procuramos manter interlocução com diversos estudiosos da política educacional, a fim de apontarmos os principais fatores que marcaram os embates políticos travados no âmbito da Secretaria de Estado de Educação e da Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, representada pela Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC), na área de formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, e que marcaram, a partir da década de 90 do século XX, a origem dos ISE/CNS no estado do Rio de Janeiro, tendo como causa o pensamento de superiorização da formação dos professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental. 2.2 - ISE/CNS: nos corredores da história O processo político de criação dos Institutos Superiores de Educação e, conseqüentemente, do Curso Normal Superior, na Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro, deslanchou-se a partir de medidas de cunho internacional, tendo organismos como o Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), entre outros, como seus orquestradores. As políticas adotadas pelo governo federal para a educação superior derivaram-se de um conjunto de situações históricas que se desencadearam ao longo dos anos, mais fortemente sentidas no século XX, a partir da década de 90. No Brasil, a articulação do binômio capital-trabalho evoluiu e ganhou maior vitalidade a partir da macropolítica desenvolvimentista16 adotada por Juscelino Kubitschek, sob o ponto de vista de acelerar o progresso de 50 anos em cinco, passando pelos anos da ditadura militar, iniciados pela Revolução de 1964 e chegando ao final desta década já com sinais de enfraquecimento. Fazendo um recorte sobre essa questão, Santos (2003), em estudo desenvolvido sobre centralização e descentralização das políticas públicas para a educação, remete-nos à origem da descontinuidade existente nos governos estaduais, a partir do plano federal, convidando-nos a compreendê-la pela dimensão histórica. A esse respeito, o autor verifica que (...) o quadro econômico do governo militar sofrerá com a decadência do modelo, construído ao longo do regime, quando o “milagre econômico” dos tempos de Médici e Delfin Neto já não se manteria com toda a credibilidade nos setores empresariais e na sociedade como um todo. A retração de investimentos, a inflação acelerada e a justificativa para a crise do petróleo contribuirão para o agravamento da crise.” (Santos, 2003, p.63) Com o governo do general Ernesto Geisel foi apresentado à nação o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), que defendeu sobremaneira a oportunidade de emprego, o controle inflacionário e o equilíbrio da balança de pagamentos, procurando 16 Nunes (2000) cita Paiva (1973) evidenciando que “(...) ao escrever ‘Educação popular e educação de adultos’ (1973), Vanilda Paiva apropria-se da Tese de Jorge Nagle reportando-se à tecnificação do campo educacional. Seu trabalho, dissertação de mestrado transformada em livro, analisa as relações entre educação e sociedade, mostrando que a forma como o movimento da sociedade reflete na educação pode ser observada mais claramente sempre que se inicia um período de transformações e o sistema educacional existente (ou em formação) já não atende às necessidades criadas” (Nunes, 2000 p.19). Neste caso evidenciamos o que convencionamos chamar, para efeito do presente trabalho, de políticas desenvolvimentistas ou ações de governo para um desenvolvimento e crescimento sustentável (originadas no plano federal e desencadeadas no plano estadual) compreendendo a categoria em uma dimensão de educação técnica, voltada para o mercado de trabalho. Com esse fim as políticas desenvolvimentistas buscam emergentemente inserir pessoas nesse mercado através de novas tecnologias, para tanto, modernizando também o sistema educacional, porém enfatizando muito mais um aprendizado mecanizado (as técnicas) que o cognitivo (pensar, abstrair, e refletir) para, com isso, avançar na evolução do pensamento. As novas tecnologias, nesse caso, são utilizadas como um fim em si mesmas, não apropriando-se o aluno ou professor de seu real significado. Com isso o desenvolvimento, nesse caso, fica fadado a um mero economicismo, ou seja, um aligeiramento pelo aumento dos bens e serviços. Mas pouco avanço há no aprendizado e no conhecimento acumulado. Em suma, ensina-se a “apertar parafusos”. Com a rapidez das novas técnicas se desenvolve melhor essa prática, porém não se ensina a conhecer “por que se apertam parafusos”. com isso manter o ranço desenvolvimentista e buscando favorecer o capital monopolista internacional, já àquela época avalizado pelo Estado brasileiro. Em 1º de julho de 1974 a lei federal complementar nº 20 determinou a fusão dos estados do Rio de Janeiro e da Guanabara, a partir de 15 de março de 1975, constituindo-se como importante pólo para o governo militar. Santos (2003) nos remete à compreensão de que a região do estado do Rio de Janeiro tornara-se, a partir daquela época, uma região estratégica, pois grandes projetos e centros de pesquisa de excelência acadêmica situavamse em cidades fluminenses, como o desenvolvido em Angra dos Reis, na construção das três usinas para produção de energia atômica pela Nuclebrás, através do acordo de cooperação Brasil-Alemanha, com o apoio da Marinha de Guerra. Após a fusão, o primeiro governador do estado foi Faria Lima, que era que era almirante reformado. Apontamos nessa época o início das políticas caracterizadas como “de excelência”17 no campo da educação, que começaram a emergir com força em terras fluminenses. Considerando a fusão dos estados e o surgimento de uma nova unidade na federação, começam também a surgir as primeiras medidas governamentais com o propósito de instaurar as políticas públicas para a educação no estado do Rio, através da publicação, em março de 1975, das Diretrizes para o Desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro. Com a implantação do I Plano de Desenvolvimento Econômico e Social do estado do Rio de Janeiro (I PLAN-Rio) esboçado pelo governo Geisel, racionalizou-se a administração que passou a ser centralizada na Secretaria de Planejamento. Nesses moldes, buscava-se, por sua vez, para a educação, uma lógica de aproximação de resultados com a economia. A educação passou a ser, então, uma espécie de termômetro para o desenvolvimento econômico do estado, com caráter estratégico. Considerando os interesses com respeito às políticas para a educação pública no estado, observamos que nesse momento a herança deixada pelos governos militares 17 Conceituamos as políticas de excelência ou de excelentização, como políticas exclusivistas, usadas para beneficiar uma parcela de setores do governo. A partir dessa compreensão, percebemos que o governo Marcello Alencar (1995-1998) veiculou, com maior intensidade, fora do sistema educacional estabelecido pela SEE, um sistema educacional paralelo e de cunho empresarial, separando as escolas “boas” das escolas “ruins”, construindo assim modelos de eficiência e organização de projetos pedagógicos fora de um contexto de crise. As escolas tidas com boa qualidade (na Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia) passaram a receber investimentos diretos do governo do estado, enquanto as escolas da Rede Oficial, tidas como ruins, continuavam a obter deste, recursos minguados. Grosso modo, essas políticas de excelentização já eram visíveis no estado do Rio de Janeiro, a partir do primeiro governo de Leonel Brizola (março de 1983 a março de 1987), com a criação dos CIEP (Centros Integrados de Educação Pública), que tomaram espaço privilegiado na política educacional do governo, enfatizando a “opção preferencial pelos pobres”. Essa foi, segundo os formuladores das políticas, uma das razões do Instituto de Educação do Rio de Janeiro ter sido transformado no primeiro Instituto Superior de Educação em terras fluminenses. começa a confundir-se com interesses individuais e oligárquicos de governantes e políticos relacionados a modelos sociais e administrativos tradicionais, que mantêm-se ainda vivos e vigorosos nos dias atuais. Infelizmente essa herança, na maioria das vezes, continua a se constituir, principalmente no campo das políticas de formação de professores, como ação que ora convencionamos chamar de políticas de governo ao invés de políticas de Estado18. Certamente as políticas de formação de professores constituem-se como uma questão de Estado. Porém, no exemplo do Estado do Rio de Janeiro, essa questão, pela descontinuidade com é tratada, caracteriza -se mais como ação governamental, pois cada governante impõe o seu grau de importância e de valor, não aproveitando as boas experiências anteriores, ou sequer aprimorando-as. Sobre isso, Santos (2003) salienta que “A inauguração do governo do Estado do Rio de Janeiro, mesmo considerando as peculiaridades regionais, será resultado dos interesses militares e de setores da política fluminense no sentido de aprofundar o mando interior. Nasce ele contraditório no projeto educacional, com traços liberais19, porém com o invólucro tecnocrático e economicista em seus planos. (...) No caso do Rio de Janeiro, o sistema educacional se constrói sem uma continuidade administrativa20 sem permanência quanto aos projetos e na obstrução dos aspectos contidos nos planejamentos anteriores e as suas operacionalidades. O sistema educacional, no Estado do Rio de Janeiro se consolida em rearranjos conjunturais de governos que ora implementam diretrizes, ao passo que, em outras ocasiões, estabelecem rupturas ou descontinuidades.” (Santos, 2003, p. 73) Como veremos, as políticas de implementação de ISE no Estado do Rio de Janeiro também constituíram-se por um desses rearranjos que são feitos sem planejamento prévio, a fim de sedimentar interesses sectários, quando não individuais, causando mais ônus ao erário público, deixando para outros governos problemas não resolvidos e políticas abreviadas devido a sua descontinuidade. 18 Pela nossa compreensão, as políticas de governo são passageiras e em sua grande maioria, políticas descontinuadas, pois em vários dos casos existe pouco compromisso dos governos que sucedem em continuar qualquer atividade desenvolvida no governo anterior caso o pensamento ideológico ou o partido político não sejam convergentes. Já as políticas de Estado deveriam estar acima de qualquer ideologia ou partido político por ser a representação máxima de um consenso histórico. O Estado existe para atender aos interesses do povo e cabe aos governos implementar as ações por ele estabelecidas, para que o ideário de nação se concretize. 19 Sem grifos no original. 20 Sem grifos no original. 2.3 - Novos governos, novos modelos Nos transpomos à década de 80, momento da súplica nacional pelas eleições diretas. Voltando ao estado do Rio, a oposição assume o poder através de Leonel de Moura Brizola (março de 1983 a março de 1987), eleito pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista). Este, por sua vez, deu ênfase ao compromisso de investir na educação pública, priorizando a educação infantil e o ensino fundamental. Para tanto, foi criada a Comissão Coordenadora de Educação e Cultura, sob a presidência do então vicegovernador do estado, Darcy Ribeiro. Esse primeiro mandato de Brizola teve como característica principal, no campo da educação, o atendimento à clientela do ensino de primeiro grau. Nas vias desse atendimento, a rede escolar foi ampliada com a criação dos CIEP (Centros Integrados de Educação Pública), apelidados de “Brizolões”, que foram, na ocasião, acusados de propagandear a pessoa do governador.21 Posteriormente, Wellington Moreira Franco elegeu-se governador do estado pelo PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro), vindo como oposição à política de Brizola, dando um enfoque técnico-economicista ao Plano de Desenvolvimento Econômico e Social, também amparado pelas políticas neoliberais que seriam iniciadas logo após, no âmbito federal, pelo presidente eleito Fernando Collor de Mello. Moreira Franco defenderia, durante o seu governo, o que considerava “recuperação econômica do estado”, procurando fortalecer a política desenvolvimentista com a participação do setor privado. Ao contrário do primeiro governo de Brizola, que junto a Darcy Ribeiro representou um avanço histórico nas políticas de desenvolvimento social do estado através da educação, Moreira Franco daria ênfase ao desenvolvimento econômico, abandonando o que considerava “um apelo populista”, distanciando-se, no campo da educação, das políticas dos CIEP, limitando-se a repassar e emprestar vários de seus 21 Os CIEP foram escolas de tempo integral, construídas no estado do Rio de Janeiro para serem modelos de educação. Sua infra-estrutura era preparada para cerca de 1000 crianças, lá matriculadas para o 1º grau. Segundo o documento Carta (1996), de distribuição exclusiva do Senador Darcy Ribeiro, foram construídos, ao longo dos dois governos de Leonel Brizola, no Estado do Rio de Janeiro (1983-1987 / 1991-1995), 504 unidades de CIEP em todo o estado do Rio. Sobre o tema, ver JÚNIOR, Dácio Tavares Lôbo, em “CIEPs – A impotência de um desejo pedagógico” – Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Mestrado em Educação da UFF, 1988. prédios para a administração municipal (principalmente na cidade do Rio de Janeiro), fenômeno caracterizado por Both (1993, 1997)22 como prefeiturização. Brizola retornou ao governo em 1991 buscando restabelecer a política dos CIEP, tendo ao lado, novamente, o professor Darcy Ribeiro, desta feita como Secretário de Educação e Cultura. Esse novo mandato veio demarcar, (2003, p. 93) “... àquele modelo de escola, que, a partir da decisão política de isolar o sistema educacional estabelecendo uma ‘ilha de excelência’, deixou a rede estadual de ensino regular numa indefinição dos rumos educacionais.” O novo mandato de Brizola foi marcado diretamente pela retomada do programa dos CIEP, e indiretamente, na SEE, pelo início dos estudos sobre a possibilidade de superiorização da formação de professores da educação básica. A excelentização do ensino superior começou, então, a tornar-se mais visível na área da educação. Nesse caso, o estabelecimento de “ilhas de excelência” não se deu no sentido empresarial, e sim burocrático, criando-se a Secretaria Extraordinária de Programas Especiais, para atender exclusivamente aos CIEP. Por conseguinte, Brizola também teria em seu segundo mandato (a exemplo do primeiro, concluído em 1987), a prioridade de expandir a política dos CIEP, destacando-se por investir na pré-escola e no ensino fundamental de 1ª a 4ª séries, ações que, prioritariamente, deveriam ser da alçada dos municípios. No estado, é mantida a política de expansão de níveis de ensino ligados aos municípios mais por ações de estratégia política do que por reais condições de infra-estrutura. Nessa rápida passagem, chegamos ao quadriênio 1995-1998, com a assunção de Marcello Alencar ao governo do estado, o que marcará o momento em que começou a ser gerado o embrião dos projetos de políticas públicas relacionadas à formação de professores para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, com a utilização da expressão “Institutos Superiores de Educação”, o que até então somente existia no campo das idéias. Até o momento, a concepção existente de formar o professor da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental em nível superior era proveniente das primeiras experiências que teve a SEE no convênio com o governo francês, com a criação 22 Fazemos uma alusão ao conceito de prefeiturização visto por Santos (2003) em Both (1997), por caracterizar-se como categoria importante para compreendermos posteriormente a proliferação dos ISE na Rede Pública, no interior do estado, pelos mesmos estarem sendo apoiados pelas prefeituras dos municípios, no tocante não somente à cessão de prédios para o seu funcionamento, como em alguns casos, desde o pagamento de contas telefônicas até outros compromissos que seriam de responsabilidade da FAETEC como instituição mantenedora, desta feita honrados por essas prefeituras. Para BOTH (1997) a prefeiturização seria do Centro Tecnológico de Qualidade de Ensino (CTQE), e que não chegaram a ser implementadas, mas que se valeram claramente da idéia de implementação do Curso Normal Superior na Rede Pública estadual. Poderemos observar, por conseguinte, que todo o suporte que obteve Marcello Alencar para a expansão, em seu governo, das políticas públicas no campo da educação, partiu, estrategicamente, das ações implementadas nos governos anteriores, fruto de políticas seqüenciais, ora continuadas, ora descontinuadas. Voltando ao plano Federal, em 1994 subia ao poder o ex-senador Fernando Henrique Cardoso (FHC), tendo como principal bandeira a “modernização das estruturas do país”, em vias de arrefecer a política neoliberal, que havia sido inaugurada no governo Collor de Mello com a instauração do chamado estado mínimo, caracterizado principalmente pela redução drástica dos gastos públicos, privatização das estatais, terceirização dos serviços públicos, políticas amplamente conservadoras que se desdobrariam por oito anos, com sua reeleição para o quadriênio seguinte (1999-2002). Com tais estratégias, estabeleceu-se um alinhamento das políticas entre o governo federal e o governo estadual. Portanto, qualquer aparência de proximidade entre as políticas de Marcello Alencar e o governo FHC não seria mera coincidência. Com o início da era FHC (1994-2002), o campo da educação não haveria de ficar dissociado das mudanças estruturais, promovidas pela instauração de novos conceitos ideológicos e políticos na sociedade brasileira. Ao contrário, o campo da educação seria o foco estratégico dessas mudanças. Segundo Evangelista et alli (2002), o governo FHC, ainda no primeiro mandato “em 1995, patrocinou um encontro entre representantes de vários ministérios (MEC, MTb, MCT/CNPq) e segmentos da sociedade civil (organizações de empresários, centrais sindicais, CRUB, CONSED, UNDIME, FIEP – Federação Interestadual das Escolas Particulares). (...) A partir de um documento-base, Questões Críticas da Educação Brasileira, discutiram-se e traçam-se estratégias para a educação, publicadas em 1995 sob o mesmo título. (...) A apresentação do documento deixa clara a sua intenção: o que se busca é a adequação dos objetivos educacionais às novas exigências do mercado internacional e interno, e em especial, a consolidação do processo de formação do cidadão produtivo...” (Evangelista, et alli, 2002, pp. 77-78) caracterizada por ações patrimoniais de repasse às cidades, de edificações que passariam para o controle municipal. Com um olhar focado na educação básica e outro na formação profissional, no afã de cumprir o compromisso assumido em Jomtien, Tailândia23 em 1990, o governo federal, numa espécie de retomada dos tempos de ditadura militar, começou a impor medidas no campo da educação para que o país se alinhasse definitivamente às políticas internacionais, valendo-se da decretização para, em muitos casos, estabelecer tais políticas. No que tange à política de formação de professores, o governo FHC começou a alinhavar uma espécie de aliança com as Secretarias de Educação de estados e municípios, com a finalidade de pôr na pauta de discussões propostas de aligeiramento da formação dos professores que não a possuíam em nível superior, atendendo assim aos compromissos assumidos com os organismos internacionais também nessa área24. O Estado começava sua tática de mudanças profundas em diversos ângulos. Dentre elas, destaca Kuenzer (1998): “(...) compelido pelos atores internacionais a diminuir o custo do Estado para assegurar a estabilidade da economia, o governo tem obedecido às políticas do Banco Mundial para a educação como forma de ter acesso a financiamentos e fazer frente a situações de curto prazo.” (Kuenzer, 1998, pp.113-114) Algumas dessas propostas ou soluções de curto prazo analisadas por Kuenzer (1998) e implantadas pelo governo federal (três, pelo menos), segundo Evangelista et alli (2002), podem ser resumidas em: - maior articulação entre a rede escolar de ensino médio com o setor produtivo, órgãos e programas responsáveis por políticas industriais e de Ciência e Tecnologia; 23 Utilizando-nos de Evangelista et alli (2002), em Jomtien, na Tailândia, em 1990, realizou-se a Conferência Mundial de Educação para todos, financiada pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e Banco Mundial. Dela participaram governos, agências internacionais, organismos não-governamentais, associações profissionais e personalidades destacadas no plano educacional em todo o mundo. Ao todo, 155 países comprometeram-se a assegurar uma educação básica de qualidade através da assinatura de uma declaração. 24 Uma das provas cabais dessa tentativa foi o decreto presidencial nº 3276/99, que daria ao CNS a exclusividade da formação dos professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental. Por esse decreto o governo abria caminho para que a iniciativa privada criasse Cursos Normais Superiores sem o mínimo compromisso com a qualidade na formação dos professores que por lá passariam. Felizmente, após ampla manifestação contrária, estabelecida pelo movimento dos educadores - entre eles a ANFOPE (Associação Nacional Pela Formação dos Profissionais da Educação) e o FORUMDIR (Fórum Nacional de Diretores de Faculdades, Centros de Educação das Universidades Públicas Brasileiras) - o governo recuou através do decreto presidencial 3554/00, que modificou a expressão “exclusivamente” pela expressão “preferencialmente”, amenizando em parte os estragos que seriam causados por tal ação. Para uma maior compreensão dessa dimensão, recomendamos a leitura do livro “Formação de Professores: travessia crítica de um labirinto legal”, de Célia Linhares e Waldeck Carneiro da Silva, Brasília: Plano, 2003, que traz, além - maior articulação entre a universidade e as Secretarias Estaduais e municipais visando redefinir cursos de professores e definir mecanismos para facilitar o acesso ao ensino superior para aqueles que não possuíssem esse nível de ensino; - e por fim a criação de poucas e boas escolas normais superiores para a formação e o aperfeiçoamento de professores dos cursos de licenciatura. Ao voltarmos ao plano estadual, Santos (2003) nos aponta que Marcello Alencar elegeria como meta educacional prioritária em seu programa de governo a autonomia da escola, que seria limitada a uma desresponsabilização do poder público do investimento na educação, principalmente no ensino médio, que era da alçada estadual. Observamos que mais uma vez que os governos federal e estadual, ligados a um mesmo partido político (PSDB), trabalhavam em grande articulação, elegendo como principais metas aquelas que lhes conferissem maior poder político e prestígio frente aos interesses internacionais. Assim, não nos causou estranhamento o fato de que o governo Marcello Alencar, no plano estadual, alinhando-se ao governo de Fernando Henrique Cardoso, no plano federal, passou a se mobilizar na busca da ampliação de um estado máximo em desigualdade e mínimo na execução de políticas públicas de inclusão no campo social, abandonando as escolas da Secretaria de Estado de Educação à própria sorte. Ampliando a experiência estadual do governo anterior, que teve como meta principal a política dos CIEP, Marcello Alencar se utilizou da mesma estratégia para o desenvolvimento de “ilhas de excelência”25 nas escolas públicas, desvinculando as escolas de educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e algumas escolas técnicas de uma ampla discussão sobre os dispositivos legais, atrelada à discussão das principais políticas públicas atuais no campo da formação de professores, um anexo contendo a coletânea do texto legal. 25 Na realidade, o termo “ilha de excelência” é aqui utilizado com referência à FAETEC, como instituição mantenedora das escolas - as próprias escolas, que antes pertenciam à Secretaria de Estado de Educação (SEE) e que passaram a ser mantidas pela FAETEC, ligada à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia (SECT), atualmente, no governo de Rosinha Matheus, Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação (SECTI). As referidas Secretarias serão referenciadas no decorrer do texto por suas abreviaturas. A imprensa, em 2003, ao referir-se às escolas da “Rede FAETEC”, ainda as trata como “ilhas de excelência”. O jornal carioca “Extra”, no seu caderno Educação Pública, edição de 18 de maio de 2003, assim anunciou: “Ilha de excelência no ensino - sucesso inesperado, escolas da FAETEC desbancam CEFET, Pedro II e Aplicação no vestibular da UERJ”. Isto demonstra que os efeitos nocivos da dissociação das Redes de Ensino no Estado do Rio de Janeiro, fenômeno que conceituamos como excelentização do ensino, continuam a existir, causando na mente da população a visão de que no Estado do Rio o melhor ensino está na FAETEC. Essa fratura induz a uma visão de que a culpa pelo funcionamento precário de inúmeras escolas da Rede Pública ligadas à SEE está na má administração da Secretaria e não na segregação de recursos, efetivada pelo governo estadual ainda na atualidade. profissionalizantes da SEE para a FAEP, que seria, em momento posterior, transformada em FAETEC, a fim de que essas escolas recebessem um tratamento diferenciado (privilegiado). A FAEP (Fundação de Apoio à Escola Pública do Rio de Janeiro) foi instituída em 21/07/87, pela Lei 1176, com o intuito de complementar as funções da SEE na agilização dos mecanismos necessários ao funcionamento da Rede Pública Estadual de ensino, atuando como unidade de apoio técnico à SEE. A FAEP, como Fundação, possuía autonomia administrativa, patrimonial e financeira, com personalidade jurídica de direito privado a partir da inscrição no registro civil das pessoas jurídicas e de seu estatuto. Possuía também orçamento estadual e era sujeita à prestação de contas ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro – TCE. Faziam parte do regimento interno da FAEP, publicado por resolução estadual em 14/08/88, constando de categoria, finalidade, estrutura organizacional, competências dos órgãos referidos, as atribuições gerais dos dirigentes e auxiliares e outras disposições gerais, o que tornava-a uma instituição de porte estratégico para alavancar os setores da educação tecnológica no estado, dentro da política de excelentização do ensino a que o estado se adequava. Foi, entretanto, em 1995, que o governo Marcello Alencar, através da própria FAEP, iniciou uma nova dinâmica de trabalho, afirmando querer materializar a missão de promover a valorização da educação profissional no estado, e sua efetiva concretização, como suposta formadora de cidadãos com potencial de empregabilidade, visando, com essa ação, criar e renovar o intelecto-cultural do estado. O modelo populista, tão presente no Estado Novo, redimensionado nas duas gestões de Brizola como governador do estado do Rio, parecia agora estampar uma nova face no governo de Marcello Alencar. O governador, para dar seqüência ao seu projeto de governo, convidou a então Subsecretária do Gabinete Civil do estado, professora Drª Nilda Teves Ferreira, para implantar um projeto que seria destinado a atender menores carentes e alunos oriundos de escolas regulares, objetivando o desenvolvimento de uma filosofia educacional alicerçada no tripé educação-trabalho-ludicidade, com o objetivo de preparar os educandos para o exercício da cidadania e da prática produtiva. Esse projeto, como veremos posteriormente, haveria de ser transformado, ainda no governo vigente, nos chamados CEI (Centros de Educação Integral), centros profissionalizantes de ensino médio, carros-chefe da revitalização da política de excelentização do ensino no Estado do Rio de Janeiro pelos moldes “faetequianos”. Como o referido projeto logrou êxito, em 09/02/1996, através do Decreto Estadual 22.011, a FAEP foi transferida da SEE para a SECT26, para reestruturação e otimização das Escolas Técnicas Estaduais (ETE). Como, na realidade, o governo de Marcello Alencar queria criar as “ilhas de excelência” e essas necessitavam de uma Fundação que lhes amparasse infraestruturalmente para possibilitar o seu funcionamento (e não podendo criar outra Fundação - pois enfrentava resistências da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, que não queria que fossem criadas outras Fundações no estado) transferiu a FAEP, que pertencia à SEE, para a SECT, pela Lei 2735, de 10/06/1997, passando a denominar-se FAETEC (Fundação de Apoio à Escola Técnica), que dispôs também sobre o seu quadro permanente de pessoal. A FAETEC teria como missão principal a atuação no gerenciamento da Rede de Ensino Técnico do estado do Rio de Janeiro. O corpo funcional da FAETEC passou, por sua vez, a ser regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), autorizando a FAETEC a contratar, em caráter excepcional e temporário, professores substitutos para suprir necessidades de serviço pelo prazo de um ano, prorrogável somente para assegurar o término do ano letivo. Com a referida lei, a FAETEC passou a ter, em sua estrutura, os Conselhos Superior, Consultivo e Fiscal, que lhe conferiam mais autonomia de trabalho. Essa estrutura provavelmente era uma antevisão do que estaria por vir, com respeito à entrada dessa Fundação também na educação superior. Desde então, a FAETEC veio assumindo e criando novas escolas técnicas e profissionalizantes. Dentro dessa política de crescimento e independência administrativa, como veremos adiante, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro (IERJ) também foi abarcado. A modificação do nome FAEP para FAETEC, longe de representar uma simples mudança de nomenclatura, representou uma mudança de visão, de metas e de políticas na educação. A FAEP fora criada para dar suporte a todas as escolas da Rede Pública Estadual, independentemente de sua identidade formativa. Já a FAETEC representou uma 26 Parte dos dados coletados quanto a FAEP, FAETEC, CEI e CETEP foram retirados do documento intitulado “Contribuições do Fórum Pedagógico à Construção do Projeto Político Pedagógico da Rede FAETEC de ensino”, coordenado pelo professor Adilson Pereira, da UFRJ. A apresentação do trabalho final do grupo de estudo que coletou os dados históricos da instituição apresentou o referido trabalho no dia 11/12/2002. Tivemos acesso ao fórum, que foi restrito ao pessoal da FAETEC, na qualidade de ouvinte. Segundo o grupo que apresentou o seminário, uma das grandes dificuldades foi coletar os dados históricos da ruptura político-ideológica por parte do governo Marcello Alencar e seus assessores, por beneficiar a estrutura das escolas técnicas, visando à otimização do ensino técnico no estado e privilegiando esse setor da educação, em detrimento das demais escolas vinculadas à SEE. Com essa decisão, não somente foi criada uma nova Fundação, como também o governo passou a valorizar mais algumas escolas, que, por ficarem vinculadas à FAETEC, passaram não somente a ter tratamento privilegiado e boa soma de recursos, como a inflacionar a procura por essas escolas pela população, causando a percepção de que o que era bom estava na FAETEC e o que era ruim estava na SEE. Em um mesmo governo, portanto, vemos a criação de um verdadeiro mercado educacional, com a competição entre as duas Secretarias. Assim, o Estado do Rio passou a ter duas gestões a conduzir seu sistema educacional: uma na FAETEC e outra na SEE. 2.4 - O projeto do Centro Tecnológico de Qualidade de Ensino da SEE CTQE27 No ano de 1992, um grupo de professores (técnicos) da SEE ligados à Coordenadoria de Ensino Básico, que era a responsável direta pelo ensino das Classes de Alfabetização a 4ª série do primeiro grau – CA (na época vinculada à Coordenadoria Geral Pedagógica - CGP) sentiu a necessidade de elaborar um documento de orientação curricular para as classes de alfabetização e 1ª a 4ª séries nas escolas da Rede Pública Estadual. Esse documento foi denominado de Plano Básico de Estudos para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental. instituição, pelo desconhecimento do seu pessoal. Cremos que a grande descontinuidade existente nas políticas públicas governamentais foi também a causa dessa dificuldade. 27 Para essa reconstituição histórica, nos prestaram grande auxílio os professores Hésio Cordeiro (exSecretário Estadual de Educação do RJ – janeiro a outubro de 1999); Maria de Nazareth de Souza Lima (exSuperintendente de Ensino da SEE – janeiro de 1999 a 2001, in memorian); Herondina Calvão da Silva (exAssessora da Coordenadoria Geral Pedagógica da SEE - 1993-1995); Célia Maria Penedo (atual Coordenadora do Ensino Médio da SEE) e Flávia Monteiro de Barros Araújo, atual Coordenadora do Ensino Normal da SEE). Para efeito deste capítulo, não consideramos o projeto do Centro Tecnológico de Qualidade de Ensino como um projeto de ISE e CNS (embora tenhamos encontrado indícios fortíssimos de que ele foi realmente o precursor dessas políticas no Estado do Rio) porque os nomes “Instituto Superior de Educação” e “Curso Normal Superior” não apareceram descritos no projeto como um todo, sendo apenas citados nas entrevistas que realizamos com alguns professores lotados na Secretaria de Estado de Educação. Entretanto, nossa análise, bem como as informações colhidas na SEE, comprovam que o CTQE realmente originou toda a política de implantação dos ISE na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro. Fora o Rio de Janeiro, em alguns estados do Brasil, várias experiências de formação de professores em nível superior floresceram em Institutos de Educação realizadas entre as décadas de 80 e 90 do século passado, como em Belém do Pará, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Recife e São Paulo. Nenhuma delas, entretanto, permaneceu. O grupo que elaborou o referido documento vinha refletindo, ao mesmo tempo, sobre a necessidade de ser criado, pela SEE, um curso de formação de professores, com o objetivo de melhor prepará-los para atuar nas primeiras séries do ensino fundamental. O interesse do grupo era que, através desse curso, os professores adquirissem uma visão holística da escola, passando a atuar de maneira mais eficaz em seu cotidiano, tendo assim a capacidade de ajudar na formulação de políticas educacionais e a auxiliar na elaboração do plano político pedagógico. Ou seja, a idéia da coordenadoria era que os professores passassem a conhecer plenamente a escola em que atuavam, interferindo no seu funcionamento e construindo-a coletivamente. A CGP notou, entretanto, que antes da implementação dessas decisões havia a necessidade de preparar melhor os professores da Rede da SEE, capacitando-os com ferramentas que o instrumentalizassem para a aquisição dos conhecimentos necessários às mudanças que se faziam prementes. A Secretaria, através da CGP, vinha discutindo, também, a modificação dos currículos do ensino médio para as escolas da Rede, inclusive para aquelas que formavam professores em seus institutos e escolas autorizadas para esse fim. No ano de 1994, a CGP iniciou a implementação da política de modificação curricular para o ensino fundamental das escolas da Rede. Paralelamente, no plano nacional, conforme abordou uma de nossas entrevistadas “(...) o Ministério da Educação já tinha firmado um convênio com o governo da França ... (...) Já haviam professores franceses, por conta desse convênio, que vinham... estavam morando no Brasil. Tinha o Michel Brault, em Minas Gerais. Mas ele já tinha estado em Recife. E no Rio Grande do Norte já havia essa experiência pioneira de formação de professores. Mas era um projeto do MEC na Universidade Federal de Pernambuco e junto ao governo do Rio Grande do Norte, o governo do estado. Então eles vieram propor (o MEC veio propor ao Estado do Rio) se nós também não teríamos interesse em participar desse convênio. Em criar no Estado do Rio a formação superior de educação, quer dizer, transformar um Instituto em Instituto Superior no modelo Francês - depois da reforma que tinha havido na França, de formação de professores”. Por conta do Programa Franco-Brasileiro de Cooperação Educacional, Michel Brault28 (citado inclusive em vários artigos e documentos nacionais por intelectuais da 28 Sobre a experiência francesa de formação de professores, ver: BRAULT, M. A Experiência Francesa. In: MENEZES, L.C. (Org). Professores: formação e profissão. Campinas: Autores Associados; São Paulo: NUPES, 1996. ANPED) consultor francês vinculado ao referido Programa junto ao MEC, estava no Brasil realizando um intercâmbio na área de formação de professores, trazendo a experiência dos Instituts Universitaires de Formation des Maîtres - os (IUFM) franceses. Em Pernambuco, Brault (através do MEC e em conjunto com o governo daquele estado e com a Universidade Federal de Pernambuco) havia formulado um anteprojeto de formação de professores adaptado ao modelo Francês29. Com a evolução do Programa, que passou também pelo Rio Grande do Norte e por Minas Gerais, o MEC resolveu propor ao Estado do Rio que, através da SEE, também estruturasse um projeto de formação de professores para o ensino fundamental em nível superior. A SEE, a princípio, vinha resistindo à idéia, porque pairava uma dúvida entre o grupo da Secretaria, que vinha estudando a possibilidade de elaboração do projeto de formação de professores em nível superior, sobre a possibilidade de formar bem um professor em nível médio ou formá-lo “mais ou menos” em nível superior. O grupo que pensava a formação de professores na Secretaria resistia à formulação de um projeto mais audacioso, porque entendia que a simples troca da chancela “médio” por “superior”, sem a real possibilidade de mudança na qualidade desse professor, não traria aos professores os avanços necessários na sua formação. Para o grupo da SEE, modificar o status, o nível de formação do professor, sem a qualidade esperada por essa mudança, seria não sair do lugar onde se estava. No entanto, a SEE já vinha buscando, há alguns anos, a possibilidade de melhorar a qualidade de ensino nas escolas de formação de professores, investindo em seminários, cursos de capacitação pedagógica, encontros com os professores, buscando com isso levar orientação pedagógica e atualização a todos os municípios do estado. Entretanto, com o acenar favorável do MEC para, de forma conjunta com a SEE, desenvolver no estado uma política de formação e capacitação de seus professores através de um novo modelo (por conta do programa de intercâmbio com o governo francês), inclusive com a liberação de recursos financeiros, houve pela Secretaria a decisão de aceitar a proposta e encarar a possibilidade dessa formação, criando um projeto próprio. No bojo desses acontecimentos, em meados de 1994 - já caminhando para o fim do segundo governo de Leonel Brizola (1991-1994) - o srº Cláudio Mendonça (que assumira a Secretaria no lugar de Noel de Carvalho, licenciado para disputar as eleições estaduais 29 Examinamos o documento, que foi originalmente minutado em francês por Michel Brault. como deputado) resolveu levar adiante a idéia, liderando as negociações com o MEC. O grupo que vinha estudando o modelo dos IUFM acelerou as discussões e criou uma comissão para planejar, com o Ministério, as ações de concretização de um projeto de formação de professores em Institutos Superiores para o Estado do Rio de Janeiro. Enfim, chegou-se ao consenso de que o projeto, por ser piloto, necessitaria ser desenvolvido em uma escola da Rede Pública Estadual que já atuasse na formação de professores e a comportasse física e estruturalmente. A escola serviria como modelo para as demais, pertencentes à SEE, inclusive para futuramente ampliar a idéia, visando o preparo de outras escolas, já no desenvolvimento do projeto. Assim, foi realizado um levantamento em vários Institutos de Educação. Dentre eles, foram verificadas as condições do Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho IEPIC), em Niterói, do Instituto de Educação de Nova Iguaçu e do Instituto de Educação do Rio de Janeiro (IERJ), unidades onde o projeto poderia, por razão infra-estrutural, tornar-se viável. Enfim, ao término dessa fase, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro (IERJ) foi o escolhido para abrigar o projeto, por ser considerado o mais centralizado e situado num local mais próximo da sede da Secretaria, e provavelmente por ter abrigado, na década de 30, uma experiência revolucionária de formação de professores em nível superior: a “Escola de Professores” de Anísio Teixeira. Uma vez designado pela SEE, o espaço do IERJ passaria a sediar um projeto tido como revolucionário na formação de professores para as classes de alfabetização e séries iniciais do ensino fundamental, que consideramos como sendo o ancestral da idéia de formação de professores em nível superior em Institutos e escolas isoladas de redes ligadas ao estado do Rio de Janeiro, particularmente as idéias de efetivação dos ISE e CNS. O projeto da SEE, formulado pela CGP, recebeu o nome de Centro Tecnológico de Qualidade de Ensino (CTQE). 2.5 - Compreendendo o modelo do CTQE O Centro Tecnológico de Qualidade de Ensino (CTQE) foi criado no mês de setembro de 1994, pelo Decreto Estadual nº 20.716/94, através de um convênio celebrado entre a SEE e o MEC, com recursos canalizados na ordem de U$$ 700.000 (setecentos mil dólares), a fim de transformar o Instituto de Educação do Rio de Janeiro (IERJ) numa espaço único de formação de professores e atividades educativas, onde seriam desenvolvidas atividades de ensino, pesquisa, capacitação e atualização para os professores da Rede Pública estadual, com o objetivo de aperfeiçoá-los e prepará-los para o melhor desenvolvimento de suas atividades e potencialidades. Embora tenha sido batizado inicialmente como um Centro de Ensino, pelo alcance abrangente que teria (ensino, pesquisa e extensão na formação de professores) sua nomenclatura foi logo modificada para Centro Tecnológico de Qualidade da Educação, pois alguns de seus formuladores consideravam que as atividades que o Centro poderia desenvolver teria maior alcance que apenas o ensino. Com a criação do CTQE, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro sofreu uma ampla reforma e reestruturação em suas dependências. Foi preparado para receber salas de multimídia, unidades de pesquisa e laboratórios de informática equipados com 34 computadores. O Plano de Trabalho apresentado ao MEC previa a aquisição de módulos, compostos por itens adequados ao uso no laboratório de ciências, para remodelação do teatro (composto de 800 lugares), para o laboratório de fotografia e vídeo, salas de áudiovisual, e estúdio de música e som. Seria também adquirido material didático para prover os laboratórios e as salas-ambientes. A biblioteca central do Instituto receberia um acervo de 10.000 novos títulos, entre obras de referência e literatura. Como observamos, o espaço físico, aliado ao espaço formador do IERJ, seria a espinha dorsal do projeto. O pensamento vigente era de que o nome do IERJ passasse a ser modificado para CTQE. A escola de formação de professores de nível médio, que funcionava no Instituto, seria, ao mesmo tempo, uma escola de demonstração para professores-alunos dos cursos de atualização e capacitação e como pólo irradiador de ensino e pesquisa para o pré-escolar, para o ensino básico e para os cursos de formação do magistério (que seria o curso de formação de professores em nível de 3º grau). A idéia do CTQE funcionando no interior do IERJ era a de que o Instituto fosse um grande “laboratório de pesquisas educacionais” e de aplicação e modificação de currículos do pré-escolar ao 2º grau, por isso o Instituto seria transformado em um Centro. Isso possibilitaria à SEE agregar, em um mesmo espaço, ensino, pesquisa e extensão, construindo uma rede progressiva de formação e atualização de professores no estado, irradiando-a por todos os municípios onde houvesse professores da Rede Estadual de Ensino, com diversos tipos de atividades. Isso seria facilitado até mesmo porque nessa época a FAEP era um órgão pertencente à SEE. De certa maneira, o propósito da SEE de utilizar o espaço físico do Instituto de Educação (o prédio com seu teatro, laboratórios e biblioteca) com toda a infra-estrutura que este apresentava, resgatava um momento especial, vivido por Fernando de Azevedo, na construção do prédio em 1930, que foi preparado para receber a Escola de Professores de Anísio Teixeira, seu substituto como Diretor Geral de Instrução do Distrito Federal, com uma visão semelhante. A história do Instituto como Escola de Professores, nesse momento parecia estar sendo “ressignificada”. A SEE deixou claro no projeto os seus objetivos para o CTQE, ao salientar que “(...) a idéia de se ter um Centro onde o ensino se processe através da experiência concreta, através da conscientização criativa e do pensamento crítico, vem ao encontro da proposta da SEE/CGP, expressa em todas as suas ações, bem como atende a uma nova visão de Educação que pretende a escola como espaço dinâmico, oficina onde o aluno desenvolve, principalmente sua visão crítica do mundo, a fim de que o domínio de conhecimentos o instrumentalize para agir sobre a realidade e não para acomodar-se passivamente a ela, pois acredita-se que a aprendizagem se dá quando o indivíduo se torna capaz de interferir na realidade, seja ela interna ou externa, modificando-ª (...) A SEE pretende, pois, a partir do seu objetivo de capacitar os professores da Rede Estadual em Cursos de Atualização e Aperfeiçoamento, implantar um Centro que seja um núcleo polarizador, dinamizador e irradiador de novas propostas em educação.” (Coordenadoria Geral Pedagógica. Plano de Trabalho apresentado ao MEC para criação e execução do CTQE, 1994). A criação do CTQE, a princípio, veio de duas preocupações. A primeira, do próprio grupo da SEE, que estudava uma forma de melhorar a qualidade da formação do professor de ensino fundamental nas escolas da SEE, utilizando os recursos escassos que possuía. A segunda, pela objetivação do novo Secretário de Educação de aliar tecnologia a educação, aproveitando o momento e aderindo aos objetivos propostos pelo MEC. Analisando o Plano de Trabalho que gerou o projeto do CTQE e os seus manuscritos originais, observamos que o Centro seria um pólo de formação de profissionais da educação que atuaria de forma integrada. Verificamos, mediante os referidos documentos, que a sua estrutura organizacional foi desenvolvida para funcionar como um Centro de ensino, pesquisa, capacitação de professores e desenvolvimento artístico-cultural e esportivo. A própria aquisição dos equipamentos e as obras propostas no Instituto denunciaram esse objetivo. O projeto, em sua formulação original, propunha a subdivisão do CTQE em quatro unidades básicas, ou quatro subprojetos: - unidade de formação de professores; - unidade de atualização de professores; - unidade de pesquisa; e - unidade de produção e promoção cultural e esportiva Cada unidade do Centro giraria em torno do seu objetivo, buscando efetiva integração com o todo. Assim, o Centro poderia contar com a formação de professores em nível médio e em nível superior, tendo também a atualização de todos os professores da Rede através de curso; a pesquisa e a cultura como eixos contínuos do projeto. Em síntese, segundo o projeto, o Centro promoveria: - Cursos de duração maior – 90 horas em 2 semestres para os próprios professores do IERJ (efetivos da Escola), ou estagiários por 1 ano, vindo a de outras escolas da Rede Estadual; - Cursos menores – de 20 ou 25 horas, para professores da Rede Estadual, de outras escolas; - Seminários, encontros e outras atividades para atualização de professores; e - Cursos de formação do professores, em nível superior, para os professores do ciclo básico (cinco anos iniciais do 1º Grau). - Trabalho de divulgação, intercâmbio e ação comunitária entre as escolas da Rede Estadual. O Centro seria, portanto, o próprio Instituto de Educação do Rio de Janeiro funcionando como espaço permanente de produção e disseminação do conhecimento e formação dos profissionais da educação da Rede Estadual, de forma que esses sempre estivessem se atualizando naquele espaço e em cursos e seminários propagados nos vários municípios como produto das ações ali implementadas. Como podemos depreender, o projeto do CTQE atuaria em torno da formação múltipla do professor. Seu eixo principal seria “...a reabilitação da escola pública através de um ensino de qualidade via formação de professores." (anteprojeto do curso de formação de professores de 3º grau, p.4). O que mais nos chamou a atenção, no entanto, foi a preocupação expressa pela SEE de melhor formar os professores da Rede, das classes de alfabetização e das cinco primeiras séries do 1º grau em nível de graduação, em conjunto com o MEC. Por isso (embora o CTQE, caso saísse do papel, pudesse ter sido uma experiência marcante, transformadora e duradoura para o Estado do Rio de Janeiro), nosso interesse maior está em compreender o curso superior que seria desenvolvido e as similaridades que esse veio a ter com o nascimento dos ISE e do CNS na Rede Pública Estadual. Adiante, como é intenção do presente estudo, procuraremos compreender um pouco das nuances dessa formação e qual seria sua abrangência, descrevendo e analisando as unidades que atuariam em correlação com o projeto como um todo, e as aproximações que o projeto do CTQE teve com os ISE e o CNS. 2.5.1- A Unidade de Formação de Professores e o Curso de Formação de Professores em Nível de 3º grau do CTQE A unidade de formação de professores do CTQE se constituiria como o coração do projeto. Ela compreenderia o funcionamento do Instituto de Educação do Rio de Janeiro com o curso de formação de professores em nível de 2º grau e uma Escola de Aplicação para o ensino pré-escolar e dos cinco primeiros anos do ensino fundamental. Constituiria também o Curso de Formação de Professores em nível de 3º grau. A busca dos seus implementadores em organizá-la está ligada ao entendimento de que, segundo eles “(...) a solução de todos os problemas da escola básica não se restringiria à formação dos professores per si, mas à qualidade do ensino e à tarefa fundamental de formar cidadãos capazes de participar da vida econômico-social, política e cultural do país. As políticas de formação de professores para todos os graus e modalidades de ensino apontam para uma ação integrada, tendo como pressuposto a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; teoria e prática; conteúdo específico e conteúdo pedagógico; saber científico e saber popular; ação e reflexão.” (anteprojeto do curso de formação de professores de 3º grau, p.4) Para o curso de formação de professores em nível de 3º grau, a justificativa se deu na perspectiva de um projeto piloto cuja clientela seria estabelecida pelos professores da Rede Pública estadual, regentes de turma da pré-escola até o 5º ano de escolaridade do ensino básico (regular/jovens e adultos). Segundo o projeto, esses professores teriam no CTQE um espaço de desenvolvimento do ensino e da pesquisa, trabalhando de forma integrada as dimensões culturais, técnico-pedagógicas e críticas na formação de um professor polivalente. Esse professor teria garantida uma formação que propiciasse o acesso a um conhecimento universal, buscando através de seu aprendizado científico torná-lo um formador de cidadãos conscientes e capazes de participar plenamente da vida social e política do país. A vinculação do ato educativo ao ato político, ou da teoria à prática da transformação, seria o pressuposto maior de sua formação. Pensando numa formação híbrida do professor, aliada a um grau de formação mais elevado (o nível de 3º grau), que lhe permitria emancipar-se cada vez mais no seu cotidiano através do conhecimento, percebemos que a unidade de formação de professores apropriou-se dos estudos de Schön (1995), mesmo sem citá-lo no projeto, quando o eminente teórico aborda que um professor precisa ser formado como profissional reflexivo a partir de uma prática investigativa, buscando nela uma reflexão na ação e sobre a ação30. Um capítulo muito interessante dessa história começou a ser escrito, quando da interpretação utilizada pelos formuladores do projeto para a expressão “formação em nível de 3º grau”. A intenção da SEE para essa unidade de formação de professores era conferir a esse professor egresso do curso uma certificação em nível de graduação, a quem ela chamou “de 3º grau”. Como uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional ainda estava tramitando no Congresso Nacional (mais tarde a lei 9.394/96), a SEE, através da CGP, buscou justificar essa formação em 3º grau no CTQE, fundamentando-se numa combinação de artigos das Leis 4.024/61, 5.540/68 e 5.692/71. Os artigos que deram sustentação ao pensamento foram os seguintes: - Lei 4.024/61, art. 104 – “Será permitida a organização de cursos ou escolas experimentais, com currículos, métodos e períodos escolares próprios, dependendo o seu funcionamento para fins de validade legal da 30 Sobre este tema, ver SCHÖN, Donald A. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, Antônio (Coord.) Os professores e sua formação. 2. Ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote. Instituto de Inovação Educacional, 1995. Ver também artigo de FERRAZ, L.N.B. Formação e profissão docente: a postura investigativa e o olhar questionador na atuação dos professores. Movimento. Revista da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense. Niterói, nº 2, setembro de 2000, pp. 58-66. autorização do Conselho Estadual de Educação, quando se trata de cursos primários e médios, e do Conselho Federal de Educação, quando de cursos superiores ou de estabelecimentos de ensino primário e médio sob a jurisdição do governo federal”. - Lei 4.024/61, art. 59 – “A formação de professôres para o ensino médio será feita nas faculdades de filosofia, ciências e letras e a de professôres de disciplinas específicas de ensino médio técnico em cursos especiais de educação técnica”. Parágrafo único – “Nos institutos de educação poderão funcionar cursos de formação de professôres para o ensino normal, dentro das normas estabelecidas para os cursos pedagógicos das faculdades filosofia, ciências e letras”. - Lei 5.540/68, art. 18 – “Além dos cursos correspondentes a profissões reguladas em lei, as universidades e estabelecimentos isolados poderão organizar outros para atender às exigências de sua programação específica e fazer face a peculiaridades do mercado de trabalho regional”. - Lei 5.692/71, art. 30 – “Exigir-se-á como formação mínima para o exercício do magistério: a) no ensino de 1º grau, da 1ª a 4ª séries, habilitação específica de 2º grau; b) no ensino de 1º grau, da 1ª a 8ª séries, habilitação específica de grau superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura de 1º grau, obtida em curso de curta duração; c) em todo o ensino de 1º e 2º graus, habilitação específica obtida em curso superior de graduação correspondente a licenciatura plena”. Parágrafo 1º - “Os professores a que se refere a letra “a” poderão lecionar na 5ª e 6ª séries do ensino de 1º grau se a sua habilitação houver sido obtida em quatro séries ou, quando em três, mediante estudos adicionais correspondentes a um ano letivo que incluirão, quando for o caso, formação pedagógica”. - Lei 5.692/71, art. 31 – “As licenciaturas de 1º grau e os estudos adicionais referidos no parágrafo 2º do artigo anterior serão ministrados nas universidades e demais instituições que mantenham cursos de duração plena”. Parágrafo único – “As licenciaturas de 1º grau e os estudos adicionais, de preferência nas comunidades menores, poderão também ser ministrados em faculdades, centros, escolas, institutos e outros tipos de estabelecimentos criados ou adaptados para esse fim, com autorização e reconhecimento na forma da lei”. Considerando os preceitos legais à época vigentes, a formação a ser oferecida aos professores pelo projeto do CTQE não estava sendo entendida pela SEE como o simples fato de se superiorizar o professor, mas de graduá-lo, pois mesmo sendo um curso com duração de dois anos, o artigo 30 da lei 5.692/71 o define como curso de graduação, ou seja, em nível de 3º grau, através de uma licenciatura curta, ainda reconhecida como instrumento legal de formação na época. Esta posição diferencia-se da expressão “superior”, a ser compreendida por outro projeto ressignificado anos mais tarde pela Subsecretaria Adjunta de Ensino da SEE, entendido como curso de “nível” pós-médio. Entretanto, pelos limites legais estabelecidos para o curso (art. 104 da LDB 4.024/61) e pelas condições em que seria estabelecido (local e tempo de duração) o curso teria um caráter de “pós-normal”. Um diferencial desse curso de graduação a ser oferecido pela SEE em dois anos era um convênio para sua realização em conjunto com a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). De acordo com o planejamento constante no anteprojeto da unidade de formação de professores, o curso seria dividido em etapas. Na primeira etapa de sua implementação, envolveria o Rio de Janeiro e municípios da região metropolitana. Seriam abertas 200 vagas para professores, constituindo-se de 8 turmas, com 25 alunos cada, distribuídas em quatro turmas no turno da manhã e quatro turmas no turno da tarde. A princípio ficou estabelecido que só haveria seleção, caso a procura fosse maior que a oferta de vagas. Não ocorrendo desta maneira, bastaria ao candidato a apresentação dos documentos comprobatórios de escolaridade e de sua atuação como docente da rede pública que estaria automaticamente matriculado. Neste caso, estaria a SEE valorizando o trabalho docente exercido. O afastamento da sala de aula implicaria o cancelamento da matrícula. Seriam também oferecidas bolsas de estudo com recursos da própria SEE, bem como o financiamento, contando obviamente com a ajuda do MEC, através do Programa Franco-Brasileiro. O corpo docente que atuaria seria constituído pelos professores do IERJ, considerando como relevante a experiência no ensino de 1º e 2º graus e no curso de formação de professores. 2.5.2- A Unidade de Atualização de Professores do CTQE A Unidade de Atualização de Professores do CTQE seria um espaço permanente para atualização de todos os professores pertencentes à Rede Pública Estadual de todos os graus e modalidades de ensino, numa política de educação continuada, onde o espaço crítico seria oportunizado através de uma pedagogia voltada para a transformação. As atividades dessa Unidade seriam bem dinâmicas, propondo-se ao desenvolvimento de Centros de Estudo, Oficinas, Palestras, Painéis, Cursos e Seminários em datas programadas para esses fins. Esta Unidade funcionaria para manter atualizados os professores da Rede nos diversos temas estudados na área da educação, de modo que esses profissionais se mantivessem informados tanto nas suas áreas de atuação (educação especial, jovens e adultos, formação de professores, etc.), como de caráter geral, nas novas tecnologias, no avanço da informática na educação, no currículo e na legislação. O espaço do CTQE seria destinado também a esse fim. 2.5.3- A Unidade de Pesquisa (UP) do CTQE Ligada diretamente aos professores, a Unidade de Pesquisa (UP) do CTQE teria por finalidade contribuir para o ensino e para o melhor rendimento e produtividade do sistema educacional do Estado do Rio de Janeiro, estimulando a realização de estudos e pesquisas sobre problemas educacionais, promovendo maior integração entre as atividades de ensino e capacitação, armazenando e disseminando informações sobre pesquisas realizadas ou em andamento na Rede Pública de educação no estado. Pela UP, professores da Rede Pública Estadual, alunos de cursos de graduação e pós-graduação e pesquisadores vinculados a centros de estudos interessados em problemas educacionais teriam acesso a um espaço no Instituto onde poderiam aprender a realizar, desenvolver e disseminar a pesquisa científica. A UP seria mantida em convênio com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); com a Coordenação do Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (CAPES); com a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e com o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), além de manter interface com o sistema de bibliotecas da UERJ e com outros sistemas de bibliotecas públicas do estado, via rede informatizada. A equipe de coordenação da UP teria a participação de um professor-doutor com experiência em orientação e coordenação de pesquisas, que seria o coordenador, com mais quatro assistentes, todos professores possuidores de pós-graduação strictu-sensu. Disporia a UP ainda de um comitê composto por participantes da Coordenadoria Geral Pedagógica da SEE, da FAPERJ, por um representante do Programa de Pós-Graduação em nível de Mestrado da UERJ e outros dois representantes escolhidos pelos quatro outros Programas de Pós-Graduação Strictu-Sensu em Educação no estado do Rio de Janeiro (UFF, UFRJ, IESAE e PUC/RJ). Esse comitê decidiria a aprovação do auxílio (bolsa aos projetos considerados com mérito e relevância). Através da UP, sediada no CTQE, os professores poderiam fazer uma correlação dos problemas vivenciados em sala de aula, trazendo-os para compartilhamento com outros profissionais da Rede, em um local destinado a esse fim. Além disso, poderia compartilhálos com profissionais qualificados, onde poderiam vivenciar, através da sua pesquisa, mudanças no quadro do cotidiano escolar em suas realidades. Poderiam também intercambiar as informações, trocando-as no relacionamento com outros profissionais. Desta feita, professores formados no CTQE na Unidade de Formação de Professores poderiam contar com um aparato onde não somente receberiam informações, mas discutiriam seus conhecimentos teóricos e práticos, podendo ressignificá-los através da pesquisa-ação, já que esse professor, para ser aluno da Unidade, teria que necessariamente estar atuando em sala de aula. Como pudemos depreender, a UP, guardadas as devidas proporções, seria a antecessora do CEDERJ (Centro de Desenvolvimento de Ensino a Distância do Estado do Rio de Janeiro), um consórcio para realização de cursos de graduação à distância em todo o estado, com atividades presenciais e semi-presenciais, com o envolvimento das principais universidades públicas do estado: UERJ, UENF, UFRRJ, UFF, UNI-RIO e UFRJ. Nesse sentido, parece que o projeto do CTQE não se concretizou naquele momento histórico, mas fragmentou-se pelo fato de algumas unidades virem a se constituir separadamente com o mesmo pensamento de outrora. Ao nosso ver, neste ângulo, podemos, a exemplo, citar a Unidade de Formação de Professores, ressignificada nos ISE/CNS, e a Unidade de Pesquisa, ressignificada no CEDERJ. 2.5.4- A Unidade de Produção, Promoção Cultural e Esportiva do CTQE Essa unidade foi a última a ser agregada ao projeto. Para nossas análises, só tivemos acesso aos manuscritos que seriam elaborados para juntar-se ao projeto total das quatro unidades, pois não chegou a ser elaborada como projeto, a tempo de ser integrada aos demais. Segundo os elaboradores do projeto, “(...) um Complexo da envergadura do IERJ/CTQE não pode prescindir de um setor que congregue as atividades de produção e promoção de eventos na área das artes, da ciência, da cultura em geral, entendendo educação como uma face dessas áreas: educação-arte/educação-ciência/educação-cultura.” (Manuscritos da Unidade de Produção e Promoção Cultural e Esportiva) Nessa Unidade, seriam promovidas atividades de cunho artístico e cultural, como expressão de movimentos, eventos musicais e eventos esportivos. A idéia de unir a cultura à educação foi uma proposta do grupo que se definiu como integradora dos diversos espaços regionais , bem como de interesse em demonstrar que educação é um complexo de atividades que se expressa das mais diversas maneiras. A cultura seria vista como um elo a unir a diversidade dos grupos que ali convergiriam suas práticas educativas, inclusive como elemento auxiliar na discussão e elaboração dos currículos. 2.6 – Investida, recuo e extinção do projeto do CTQE Diante da necessidade da SEE de compreender melhor como poderia ser realizada essa formação de professores em nível superior, aproveitando o convênio firmado e assinado com o MEC, a professora Herondina Calvão da Silva (técnica da SEE) foi enviada à França, e lá permaneceu durante um mês estudando o modelo francês, a fim de verificar a viabilidade de importá-lo para o Brasil e como esse modelo poderia ser utilizado no CTQE. Chegando à França, a referida professora foi encaminhada ao IUFM da cidade de Bouvert, no norte do país. Como destacou a entrevistada “A intenção era conhecer lá e ver como é que ele poderia ser adaptado. Que aspectos a gente podia... Porque obviamente a gente não pode transportar esse modelo completamente, até por isso mesmo. Quer dizer, ele é um modelo federal na França. Nós ficamos nessa cidade. (...) E obviamente não víamos só o que acontecia naquele Instituto. Nós visitamos inúmeras escolas.” A representante da SEE permaneceu na França por trinta dias. Realizou numerosas visitas para observar como o modelo francês poderia ser adaptado ao Brasil. As possibilidades de importar o modelo para o Brasil eram limitadas, tendo em vista que no modelo francês os professores, para ingressarem nos IUFM têm que possuir, como prérequisito, uma graduação. Com base na fala da entrevistada, podemos verificar, nos dizeres de Silva (1998, p.99) a visão “colonialista” que possuem nossos governantes, importando modelos de outros países, ao invés de procurar criar, com nossos próprios professores e com nossa própria sociedade, nossos próprios modelos. A representante da SEE retornou ao Brasil em 15 de novembro de 1994. Tomando conhecimento de que o PDT havia perdido as eleições para o PSDB, o governo pensou logo na possibilidade de descontinuação do projeto. E não se equivocou, ao pensar assim. Um mês mais tarde, na organização dos relatórios e passagem de gestão para o governo seguinte, o projeto do CTQE foi abandonado, não chegando a ser colocado em funcionamento. O convênio com o governo francês foi simplesmente ignorado pelo governo de Marcello Alencar, que assumiu a gestão do estado do Rio, a partir de 1995. Sem dúvidas, houve um avanço muito grande por parte da SEE ao definir o projeto como coletivo, buscando uma formação referendada pela universidade e buscando sua participação e ajuda na elaboração do projeto. O arcabouço teórico, bem fundamentado na linha da reflexividade, inclusive com tendências aos estudos de Donald Schön, garantiriam a elaboração dos ideais de uma escola aberta à cultura e aos questionamentos como forma de construção do conhecimento. Seriam confirmadas as relações ação/reflexão; teoria/prática; saber/fazer; saber científico/saber popular; ensino/pesquisa; escola/comunidade; síntese da direção políticopedagógica emancipadora e de transformação social. No entanto, considerando o desejo de uma formação em nível de graduação, tão defendida pela SEE no projeto, nos interrogamos sobre o porquê de a SEE não ter optado em caracterizar o curso como pleno (com quatro anos de duração), aproveitando o convênio com a UERJ e utilizando-se de seus docentes, mesmo dentro do Instituto, tendo em vista que esta mesma expediria os diplomas, inclusive podendo lançar mão de um consórcio com as demais universidades públicas presentes no estado. Estaria a Secretaria voltada a discussões e a interesses político-partidários, que a levariam a considerar algumas questões, como a ligação plena com a universidade? Estaria a Secretaria interessada apenas em um curso de graduação de dois anos, evitando uma ligação plena com a universidade para manter o controle sobre ele? As discussões da SEE, anteriores ao ato da criação do CTQE levaram-nos a compreender que a idéia de se criar um Curso Normal Superior na Rede Pública já estava sendo amadurecida, embora ainda não apresentada com esse nome. A forma como seriam implementadas as mudanças seriam alvo de preocupações. Como relatou-nos uma professora que participou, na época, das discussões sobre a formação de professores em nível superior “Em 1994 (fins de 93 início de 94) começou a ser discutida, em especial na Coordenadoria Geral Pedagógica, essa questão do ensino e do Instituto Superior de Educação. O Curso Normal Superior era sobre o que mais se falava. E já havia uma discussão na grade sobre a lei. Enfim já havia essa questão da lei levantar e abordar esse tema, enfim, da Secretaria discutir o Curso.” Não somente a fala dos nossos interlocutores, afirmando, pela discussão da nova LDB, haver prenúncios das políticas dos ISE/CNS na Rede Pública estadual, mas também algumas características sobre o projeto do CTQE, levaram-nos à compreensão de que este projeto foi realmente o berço, o nascedouro da política de implementação dos ISE e do CNS na Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro. Uma das evidências é de que a Secretaria, embora tivesse articulado um convênio com a universidade, preferiu superiorizar a formação com um curso pós-médio, e não universitarizá-la, possibilitando-lhe um curso pleno e com grande respaldo científico. A evidência de que, utilizando a priori o espaço do Instituto de Educação do Rio de Janeiro e mais tarde sendo possível a utilização dos espaços de outros Institutos, leva-nos a concluir que a Secretaria tinha o anseio de ligar a Escola Normal ao referido curso, possibilitando ao professor apenas alguns anos de estudo a mais, tendo em vista que esse professor, ligado à Rede, não necessitaria de um concurso para ingressar no referido curso e os alunos da Escola Normal futuramente poderiam candidatar-se a uma dessas vagas dentro do próprio Instituto onde o curso funcionava, caso o projeto lograsse êxito. Outra evidência clara é que a Secretaria, embora afirmando que o curso seria considerado de graduação, tinha o interesse de superiorizar o professor da pré-escola até o 5º ano do ensino fundamental. Podemos, por essas evidências, salientar que se o projeto do CTQE não foi precisamente um ISE ou um CNS, não o foi somente por uma questão de nomenclatura, pois o projeto de certa maneira influenciou todos os demais projetos de ISE/CNS que vieram posteriormente. Todos eles, como veremos adiante, basearam-se de alguma forma no projeto do CTQE, seja por influência de algum técnico da Secretaria ou seja por acesso de seus formuladores a esse projeto. Conforme salienta uma das professoras entrevistadas “...a Secretaria de Educação, digamos, que tenha sido quem começou a pensar no assunto. Ela pensou no assunto em 93. Ela pensou, ela discutiu, ela procurou parceiros para a discussão, mas ficou nesse nível de pensamento e de discussão.” Por conseguinte, a professora que havia ido à França retornou e procurou a Secretaria de Educação para relatar suas conclusões. Como um novo governo havia sido instalado e as pessoas dessa gestão encontradas nem haviam tomado conhecimento do fato, todo o trabalho ficou descontinuado, não indo adiante. As possibilidades apresentadas pelo projeto do CTQE não foram colocadas em prática, pois, como vimos, um novo governo se estabeleceu e todo o planejamento anterior foi esquecido. E podemos dizer que realmente foi esquecido porque não há evidências de sua existência nem mesmo na Secretaria de Educação. O projeto não foi arquivado, como grande parte dos documentos que são elaborados no estado fica perdida com a entrada de novos governos pela questão da descontinuidade administrativa. O acesso a esses documentos, nesse caso, só nos foi possível através de informações prestadas por professores (técnicos) da Secretaria, que deles tomaram conhecimento porque trabalhavam na época ou por terem participado ajudando na elaboração do projeto. No caso do projeto do CTQE, nosso acesso foi conseguido por meio de uma das professoras que ajudou na elaboração. Já as entrevistas realizadas ajudaram-nos a compreender de que forma esse processo aconteceu bem como o rumo que tomou. No entanto, algumas idéias, como a superiorização do professor da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental germinaram, originando os ISE/CNS e o CEDERJ, este, fruto da criação do consórcio entre o estado e as universidades públicas nele estabelecidas. 2.7 - Novos tempos políticos no estado: mudanças à vista No início do governo de Marcello Alencar, antes mesmo da promulgação da LDB 9.394/96, novos rumos31 estavam sendo dados à política de formação de professores do estado, sobretudo novamente em direção à elevação do nível dos professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental em nível superior, materializando o pensamento de implantação dos ISE e neles o CNS. Novamente a SEE retirou a proposta dessa formação, certamente com influências diretas do projeto do CTQE, que mesmo não aceito pelo governo que assumiu, foi apresentado ao novo governo pela equipe que o elaborou e que permanecia na Secretaria. No entanto, paralelamente, algumas medidas vinham sendo tomadas pela FAETEC e influenciariam definitivamente, ocasionando mudanças substanciais nas metas traçadas para a educação no Estado do Rio de Janeiro. Tanto a SEE como a FAETEC traçavam, naquele momento, metas com vistas a ressignificar o projeto de superiorização da formação dos professores da Rede Pública Estadual em ISE, através do CNS. Em 1997 a SEE pareceu ter dado a largada e quebrado o silêncio estabelecido por cerca de dois anos, apresentando um novo projeto de criação de ISE/CNS ao Conselho Estadual de Educação (CEE), através do processo nº 03/600.128/97, que veio consumar-se no Parecer nº 430/97, aprovado em 25/11/1997 e publicado no Diário Oficial do Estado de 05/12/1997, configurando, ainda no papel, o que seria mais tarde, na visão da SEE, a matriz dos ISE no estado. Esses ISE/CNS passariam a ser conhecidos pela sigla “ISERJ”, significando, naquela circunstância para a Secretaria, “Instituto Superior de Educação no Estado do Rio de Janeiro”, como veremos adiante. Entretanto nessa corrida por interesses, a FAETEC, também em seu silêncio, vinha trabalhando paralelamente um projeto de ISE/CNS para a Rede Pública Estadual. Uma verdadeira “guerra fria” estava sendo travada. De um lado a SEE, procurando restabelecer a política de formação de professores para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental em nível superior, objetivando a tentativa de consolidação de um novo projeto, pois o primeiro não se consolidou. De outro lado a FAETEC procurava se adequar 31 Torna-se imperioso frisar que os passos que relataremos adiante significam ações de governo, pois conforme comentado neste trabalho no capítulo anterior, as intenções para a superiorização da formação dos professores da educação infantil e ensino fundamental há muito vinham-se desenhando. à política com objetivos delineados para também buscar o controle dessa formação, baseando-se no pensamento desenvolvimentista que outrora vimos ser estabelecido. Fazendo um pequeno recorte, ainda em 1997 quando a SEE conseguiu sedimentar e parecia haver consagrado o seu projeto de ISE/CNS, a FAETEC resolveu disputar o espaço pela formação de professores, quando, de forma estratégica e sutil, conseguiria a transferência de várias escolas da SEE para o seu âmbito, incluindo entre elas o Instituto de Educação do Rio de Janeiro (IERJ), transferido pelo Decreto Estadual nº 23.482, de 10/09/97. Esse cenário provocou um desgaste entre as duas Secretarias (SEE e SECT). Aparentemente, no que tange à educação, as políticas estavam confusas no âmbito do governo. Havia um ar de disputa por instâncias de poder. O governo parecia estar estrategicamente afinando-se cada vez mais ao ideário macropolítico do governo federal. Quando o governador do estado sinalizou positivamente que os ISE/CNS ficariam sob a tutela da FAETEC, a articulação que a SEE mantinha com o CEE para a aprovação do seu projeto perdeu o sentido, ficando descontinuada. Não consideramos tal atitude estranha, pois o governador havia-se filiado ao PSDB, partido principal que representava a base de sustentação do governo federal. E como percebemos esse acontecimento? 2.8 - Duas Secretarias em disputa Retornado à seqüência dos acontecimentos, vemos que logo após sua posse como governador do estado, Marcello Alencar passou a priorizar a FAETEC, pois seria ela o arauto do projeto de modelo tecnológico para o estado, visando dar seqüência à sua política de excelentização do ensino na Rede Pública estadual. Marcello Alencar haveria de reduzir consideravelmente o diálogo do governo com as demais Secretarias Estaduais, demonstrando uma política preferencialista e quase sem interlocução do governo, fixando olhares mais firmes na FAETEC. O Decreto 21.752, de 8/11/95 instituiu, sem aumento de despesa, o CEI (Centro de Educação Integral), escola técnica de nível médio, antes mesmo da “fusão” da FAEP à FAETEC, iniciado pela unidade de Quintino, localizada em zona suburbana da cidade do Rio de Janeiro. Essa política foi possível a partir de um convênio, firmado entre o governo federal e o governo do estado do Rio de Janeiro, assinado em 10/08/1993, e os Termos Aditivos de Re-Ratificação e Operacionalização, assinados em 29 de junho e 14 de julho de 1994, respectivamente. Esse convênio fora firmado devido ao espaço físico, o patrimônio e o pessoal serem oriundos da ex-CBIA (FUNABEM), órgão federal que funcionava nas dependências da antiga FAEP, que fora transformada em FAETEC. Portanto as políticas de excelentização do ensino pareciam ser ressignificadas a partir de um novo modelo. Juntamente com a criação da unidade de Quintino, já no ano de 1996, mais três CEI foram criados, sendo dois na zona suburbana da cidade do Rio de Janeiro e um na cidade de Niterói: o CEI Marechal Hermes, o CEI Santa Cruz e o CEI Barreto, respectivamente. Segundo uma das entrevistadas que atuou diretamente na formulação desse projeto, “Na Secretaria de Ciência e Tecnologia, qual era a função da FAETEC? Era viabilizar um projeto de ensino técnico que fosse orgânico como projeto de desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro. Então, havia um projeto de desenvolvimento da indústria, o porto de Sepetiba, atualização dos recursos... Então havia um projeto de governo no campo do desenvolvimento regional. As escolas técnicas deveriam se adaptar, se ajustar a esse modelo.” Pelo decreto estadual 22.011, de 09/02/1996, que transferiu a FAEP da SEE para a SECT/FAETEC visando à unificação, à reestruturação e à otimização das Escolas Técnicas Estaduais (ETE), também foram transferidas, sem aumento de despesas, mais sete escolas da SEE para a SECT, juntamente com todo seu mobiliário. Após a transferência da ETE (Escola Técnica Estadual) “República”, localizada também no complexo de Quintino (a 8ª da lista), totalizou dezesseis, o número de escolas transferidas da SEE para a FAETEC entre os anos de 1996 e 1997. No último ano do governo de Marcello Alencar (1998), a professora Nilda Teves, que outrora assumira a Secretaria do Gabinete Civil a convite do governador e estabeleceu a transposição do modelo da FAEP para a FAETEC (sendo também sua primeira presidente) assumiria, a convite do próprio governador, a Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, com a saída do então Secretário, o senhor Elói de Fernandes e Fernandes para a ANP (Agência Nacional do Petróleo). Desta feita, o projeto silencioso dos ISE pela FAETEC começou a ser posto em prática, sendo ela a principal formuladora do modelo no estado. Nesse momento, percebemos que a política desenvolvimentista iniciada com a fusão dos Estados do Rio de Janeiro e da Guanabara, em 1975, ganhara novo fôlego no governo de Marcello Alencar, quando esse estrategicamente passou a priorizar o ensino tecnológico (profissionalizante)32, para dessa forma alavancar o crescimento econômico do estado. Porém, com a saída da professora Nilda Teves da presidência da FAETEC, a política dos CEI (transformados mais tarde em CETEP), tomou um rumo assistencialista, começando a patrocinar cursos de educação profissional de nível básico através do CCDC (Centros Comunitários de Defesa da Cidadania), sendo interiorizada, ampliando assim a Rede de CETEP para 28 unidades em todo o estado (cinco ainda encontram-se em processo de efetivação) e 14 Escolas Técnicas – ETE (duas também em processo de efetivação), a partir de 1999. Nessa visão também seriam implantados os cinco Institutos Superiores de Educação no interior do estado, que serão objeto de reflexão em capítulo próprio. É interessante atentarmos ao fato de que devido às políticas33 preferencialistas estabelecidas pelo governo do estado na área tecnológica, todas as atenções foram, nesse momento, direcionadas para as escolas transferidas para a chamada “Rede FAETEC”, como foi denominada, a partir de então, a junção das várias escolas que formaram o modelo. A FAETEC transformou-se num gigante com vários braços, passando a atuar diretamente na da educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e técnico, com viés tecnologizante. A Rede FAETEC já nasceu com uma estrutura portentosa, tendo centralidade na política governamental do estado naquele momento. Os objetivos a que se propunha e a importância que lhe era dada, aliados estrategicamente ao motivo para o qual fora criada, despontavam como prioridade política e como ação prioritária do governo: desenvolver o Estado do Rio de Janeiro através de um projeto que fosse orgânico do ponto de vista tecnológico. Outro fator importante a ser considerado é que naquele momento somente foram transferidas da SEE para a FAETEC escolas técnicas e consideradas “as mais bem 32 Fazemos referência ao ensino tecnológico evidenciando a palavra profissionalizante, por entendermos que os cursos profissionalizantes são divididos em duas grandes áreas: a área administrativa, ou técnica (contabilidade, administração, secretariado, dentre outros) e a área tecnológica (eletrotécnica, telecomunicações, eletrônica, etc). A área tecnológica demonstrou ser, no governo Marcello Alencar, a área de real interesse da FAETEC, primeiramente pelo caráter desenvolvimentista do seu governo, e em segundo lugar, se tentarmos para o fato de que as escolas que foram transferidas da SEE para a FAETEC foram justamente as escolas técnicas consideradas de melhor desempenho. Um desses exemplos foi o Colégio Estadual Henrique Lage, sediado no bairro do Barreto, em Niterói. 33 Chamamos de políticas preferencialistas as políticas de inclinação do governo Marcello Alencar à área Tecnológica, que com a criação dos Centros Tecnológicos, fez com que o governo priorizasse a Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e suas escolas, em detrimento das outras Secretarias, inclusive a SEE. estruturadas”. As escolas34 da Rede Estadual vinculadas à SEE, que ofereciam cursos agrícolas e cursos profissionalizantes da área administrativa (como os cursos para formação de técnicos em contabilidade, secretariado e administração), e as escolas de nível médio com cursos de formação geral, ou ainda os institutos e Escolas Normais (à exceção do IERJ, por questão estratégica), continuaram sob administração da SEE tornando-se exceção. E por quê? Segundo a mesma entrevistada, “(...) outras escolas ficaram na Secretaria Estadual de Educação, que foram as escolas agrícolas, e elas não tinham, não gozavam dos privilégios que a FAETEC gozou. Por exemplo, remodelação dos equipamentos, atualização dos equipamentos, mudança curricular, os professores ganhando mais... As outras escolas técnicas não tiveram isso.” Visando a um padrão de excelência, a FAETEC não somente trouxe para si vários cursos que eram oferecidos por escolas da SEE, como criou cursos em várias áreas profissionalizantes, como artes, horticultura, ciências da computação, transportes, idiomas (espanhol, francês e inglês), técnicas comerciais e industriais, informática, moda e beleza e saúde, educação física, lazer e desenvolvimento social. Como o projeto era de viés desenvolvimentista em várias áreas, envolvendo inclusive a esfera privada (pois sua missão precípua era o preparo do aluno para o mercado de trabalho), era interesse do governo ampliá-lo para obter retorno político. E nessa circunstância, a FAETEC somente poderia transferir para si as escolas que lhe dessem esse retorno político para que as ações do governo na área da educação fossem consolidadas, estabelecendo o ensino da FAETEC como sendo de excelência e fazendo com que a Fundação caísse na “graça do povo”. Tendo em vista o programa de privatizações do governo federal, algumas empresas no estado, como no campo da energia elétrica, por exemplo, foram privatizadas. O estado passou a ganhar mais relevância nos investimentos da iniciativa privada com a modernização da indústria, calcada principalmente na instalação de fábricas de automóveis (como o caso da Volkswagen, instalada na cidade de Resende, região sul do estado), e a modernização do porto de Sepetiba, também no sul do estado. Isso justificou o interesse do governo pelo investimento na área tecnológica. 34 Preferimos aqui utilizarmo-nos da expressão escola, no sentido pedagógico, por entendermos ser mais ampla. Nessas circunstâncias, podemos dizer que foi o “filé mignon” para a FAETEC e ficou “o osso” para a SEE, pois a Secretaria ficou sem as suas escolas mais estruturadas, estando nelas incluído o IERJ, e fadada ao segundo plano, no ranking de atenções do governo. E a formação de professores foi colocada nesse meio através do projeto dos ISE/CNS representado pelo IERJ. A intenção da FAETEC nesse momento, ao trazer também o IERJ para sua Rede foi pelo entendimento de que o curso de formação de professores também era um curso técnico. Percebemos aqui que tentativa a anterior da SEE de tornar o IERJ um Centro Tecnológico foi ressignificada pela FAETEC, mais pela visão de fazer desse professor um tecnólogo com uma formação superior rápida, oferecendo ao mercado um profissional abastado de novas tecnologias mas vazio de reflexividade, de senso crítico e de capacidade de inovação frente aos desafios que a formação intelectual exige. A visão da FAETEC naquele momento, com um projeto rápido de formação, era tornar o ensino um experimento a ser construído em laboratórios e oficinas com o uso extremado da tecnologia. E o IERJ possuía essa estrutura física. O projeto da FAETEC mecanizaria o professor, na medida em que esse receberia muito mais um conhecimento através da utilização das novas tecnologias, dos softwares (por meio da informática) do que o tornar esse professor um ser pensante, produtor e disseminador de conhecimentos. Daí a preocupação de formá-lo em um período curto, como os tecnólogos são formados, pois na visão intrínseca dos formuladores do projeto as tecnologias poderiam adiantar essa formação. O espaço físico do IERJ representava muito nessa visão, por ser emblemático. Percebemos na análise anterior, que o equívoco da FAETEC não está no professor utilizar-se ou inserir novas tecnologias na troca, busca ou transmissão do saber. Porém estas devem ser sempre utilizadas como elemento complementar à formação e nunca como fim em si mesmas, o que leva à tecnificação, que é o uso da tecnologia sem a reflexividade. Observamos que a visão da FAETEC, ao trazer as escolas profissionalizantes para sua Rede, não se deu por um fim puramente ideológico. O interesse pelo desenvolvimento da área tecnológica se deve ao fato de que ela está entre os citados códigos da modernidade, sem o qual um país não pode sentar-se à mesa das grandes negociações internacionais. Segundo Moraes (2003), a profissionalização foi um conceito-chave na década de 1990 na América Latina e “(...) tem sido bastante referenciada nos debates sobre a formação de professores. Incluída no rol das belas palavras, a profissionalização tem servido à construção de consensos em torno de uma reforma que tenta consolidar a dualidade na formação de professores. (...) Tal conjugação visa à “desintelectualização” do professor, modelando um perfil de profissional competente tecnicamente e inofensivo politicamente, um expert preocupado com sua avaliação e suas recompensas. (...) O prisma, agora, é bem mais sutil: o conhecimento é campo do vocabulário da prática, e não da teoria”. Assim, valoriza-se a ciência não pelo conhecimento que ela pode produzir, mas por seus subprodutos tecnológicos - informática, robótica, mídia, macroeletrônica, telemedicina, teletrabalho, bibliotecas digitais, o ensino a distância – aspectos que compõem a chamada sociedade do conhecimento.” (Moraes, 2003, p.13 e 1535) Ou seja, segundo a visão desses educadores, é necessário a um país investir em tecnologia e em formação de trabalhadores que manuseiem minimamente esses conhecimentos. No caso do Brasil, isso se faz necessário para que possa continuar oferecendo mão-de-obra qualificada e, ao mesmo tempo barata, aos investidores internacionais. Verificamos, pelo referido discurso, que esse trabalhador precisa estar qualificado para continuar sendo interessante aos investidores e assim poder manter-se como subordinado. Numa pequena digressão, entendemos que professor formado excessivamente por técnicas, ou de forma técnica e com tempo mínimo de formação reflexiva reproduz o sistema capitalista, ao passo que uma formação reflexiva sólida e crítica o fará um elemento independente do ponto de vista intelectual e político numa formação críticoreflexiva sólida. E isso ameaça os grandes interesses do capital internacional monopolista. O Brasil não sairá de sua situação de subordinação com um projeto amplo de escolarização, mas com um projeto de formação de professores que sejam ao mesmo tempo intelectuais. Que sejam criadores e ao mesmo tempo inovadores. Seres que pensem, que reflitam e que sejam, ao mesmo tempo, sujeitos dessas mudanças. Além do modelo tecnológico ser politicamente o mais interessante no momento para o governo estadual, a excelentização do ensino foi demonstrada também pelo privilegiamento das escolas transferidas para a Rede FAETEC, que passaram, no dizer de uma das entrevistadas, “a ter tratamento vip”, em detrimento das escolas que continuaram na SEE, abrindo uma enorme fissura no processo educacional do estado, dividindo as escolas com qualidade supostamente superior, que ficariam na FAETEC, das escolas com qualidade supostamente inferior, que ficaram a cargo da SEE, repartindo de forma 35 MORAES, M.C.M. Proposições acerca da produção de conhecimento e políticas de formação docente. In: MORAES, M.C.M. (Org.) Iluminismo às avessas: produção de conhecimento e política de formação docente. Rio de Janeiro: DP&A, 2003). desordenada, os recursos destinados à educação, que foram, a partir de um processo de transferência de unidades da SEE, canalizados às unidades escolares da Rede FAETEC. O governo criou, portanto, uma Rede paralela de educação, com tratamento privilegiado, com escolas bem atendidas, farto material de trabalho, plano de cargos e salários para os professores (bons salários). Tudo isso em detrimento das escolas da SEE, que juntamente com a própria Secretaria foram as grandes perdedoras nesse processo, ficando abandonadas à própria sorte. Não é de se estranhar que esse modelo de “autonomia” seja muito parecido com o que propôs o governo de Fernando Henrique Cardoso para as universidades públicas. O governo, através de ações unilaterais abandonou a SEE quase que à própria sorte, deixando que, num sentido equivocado de autonomia, a Secretaria junto às suas escolas buscasse isoladamente recursos para manter sua estrutura em funcionamento. Com isso observamos que os interesses político-governamentais por escolas de “excelência” pareceram suplantar a realidade e a necessidade educacional premente do estado, principalmente no tocante a boa parte do ensino médio, de sua total responsabilidade, que ficou praticamente abandonado na SEE. Ao nosso ver, três foram os fatos relevantes no processo que culminou na transferência do IERJ para a FAETEC: separação de algumas escolas de ensino médio, retiradas abruptamente e a esmo da SEE para a SECT/FAETEC; a visão grandemente equivocada do governo com respeito ao ensino normal (tendo-o como profissionalizante e fadando o professor a uma formação tecnificada36), e a vontade política do governo do estado. Interessante frisarmos que o IERJ fora transferido para a FAETEC por um decreto de setembro de 1997, portanto momentos antes do Parecer da SEE ter sido aprovado pelo Conselho Estadual de Educação – em dezembro de 1997, o que nos faz pensar que o jogo de poder entre as Secretarias era visível. Com a transferência do IERJ para a FAETEC, o 36 Inauguramos na categoria tecnificação da formação do professor, a visão de um professor formado por uma ação excessivamente pautada nas técnicas, como se essas pudessem por si substituir a reflexão permanente. A grande preocupação de alguns educadores com a alta tecnologia leva-os a transformar a formação de professores muito mais como profissionalizante do ponto de vista tecnológico, extraindo o pensamento como fonte de reflexão e deixando que as técnicas e novas tecnologias falem por si só, inibindo a ação motivadora do aluno e a ação transformadora do professor, colocando a técnica em seu lugar. Essa ação leva-nos a pensar no conceito de professor reflexivo de Donald Schön (1995), quando, preocupado com a formação desse professor, argúi enfaticamente: “Quais as competências que os professores deveriam ajudar as crianças a desenvolver? Que tipo de conhecimento e de saber-fazer permitem aos professores desempenhar o seu trabalho? Que tipos de formação serão mais viáveis para equipar os professores com as capacidades necessárias ao desempenho do seu trabalho?” (Schön, 1995, pp,79-80). governo de Marcello Alencar demonstra definitivamente seu interesse pela área tecnológica, representado pela FAETEC. Com isso, nos questionamos: se o projeto da SEE realmente tivesse espaço no governo, por que então não deixar o Instituto de Educação do Rio de Janeiro ligado à FAEP dentro da SEE? Por que transformar uma Fundação em outra e ainda transferi-la de Secretaria? Isso nos faz suspeitar que o governo estava propenso a credenciar o projeto da FAETEC por intenções de projeção política, buscando a promoção do seu modelo ideológico, que é capitalista numa visão desenvolvimentista. Pois mesmo com a aprovação, do Parecer 430/97 pelo CEE tal posição foi mantida, desconsiderando-se o projeto da SEE. Mais uma vez afirmamos ser o projeto do governo para a educação, e, conseqüentemente para a formação de professores, de caráter desenvolvimentista, que respaldava-se na necessidade do desenvolvimento do estado à luz de modelos de excelência que privilegiassem o mercado com ações que trouxessem resultados rápidos e não-sustentáveis, do ponto de vista educacional. Assim, consideramos, em nossa análise que a FAETEC, aliada aos interesses do governo do estado naquele momento, havia traçado sua estratégia para assumir o seu projeto de formação de professores, aguardando apenas o momento certo para colocá-lo em prática, golpeando o projeto da SEE, que sairia perdedor. No entanto, não há indícios no projeto da FAETEC, do interesse da Fundação, nesse momento, na ampliação da Rede de ISE pelo estado nem esta deixa a entender que futuramente os ISE/CNS seriam ampliados. Apenas deixa claro que a transformação do IERJ em ISERJ, naquele instante, deveu-se ao seu emblema institucional, para assim fazer parte de uma rede de escolas de excelência, uma vez que também parecia estar nos moldes da FAETEC atuar junto aos diversos níveis da educação. Aproveitando a base já estabelecida, seus futuros gestores partiriam para elaboração de um projeto muito maior: a transformação da FAETEC em Centro Universitário, o que será por nós discutido posteriormente. Assim foi justificado pela formuladora do projeto a transferência do Instituto de Educação para o plano da FAETEC: “O interesse era o seguinte: dar ao Instituto de Educação um lugar de destaque porque ele ficaria numa Secretaria que estava funcionando mais ágil, com mais recursos... com um pouco mais de instância de poder. (...) Uma Secretaria sem Fundação ela é muito emperrada, ela é muito difícil de andar. (...) Não pensava em improvisar um professor. Se pensava em formar um professor de alto nível. Com tecnologia, como... por exemplo: eu botei informática no Instituto... os mesmos laboratórios que eu botei de... botei como disciplina obrigatória, introdução à informática, por quê? Porque o futuro professor vai ter que aprender a trabalhar com softwares. Porque as escolas terão softwares. São novas tecnologias na educação. (...) Vão ter que trabalhar com tecnologias avançadas. Eu botei no Instituto de Educação um laboratório de informática, tá?! E eu não sei se as outras escolas teriam isso.” Com a transferência do IERJ para a FAETEC o governo Marcello Alencar inaugura uma nova fase na administração estadual, (particularmente nas políticas educacionais) a qual categorizamos por decretização37. Os decretos passaram a figurar mais intensamente, conferindo voz de mando à rotina das políticas públicas estaduais, principalmente na área da educação, como veremos, justificando assim uma opção administrativa extremamente verticalizada do governo, considerada “de maior agilidade” para fazer fluir sua opção político-administrativa. Veremos oportunamente que essa política de decretos, para efeito deste trabalho, está presente nos governos federal e estadual. O contexto anunciado deslanchou-se na transferência e, ao mesmo tempo, na criação de instituições, tendo a priori, o caso do Instituto de Educação do Rio de Janeiro como elemento inaugurador estratégico desse processo. O desejo da FAETEC era tornar o ISERJ referência, porque, no entender da formuladora do projeto, ele era emblemático e tinha suporte para ser uma instituição de nível superior. Ela chega a afirmar que a vocação dos professores de 1ª a 4ª séries teria que ser uma vocação38 de nível superior, pois este era um desejo de Anísio Teixeira. O projeto de Anísio foi usado como meio de legitimação do ISERJ. E o modelo criado para o Instituto, de acordo com o seu projeto, seria experimental; a propósito, um pensamento tomado emprestado, equivocadamente, do modelo anisiano. Segundo uma de nossas interlocutoras, o Instituto tinha condições para isso, pois, 37 Utilizamo-nos da categoria decretização, para dar sentido ao mecanismo de ação pelo qual os governantes, movidos por interesses de cunho pessoal, visando aligeiramento da implantação de políticas relativas ao seu programa de governo, ou oligárquicos, visando atender determinados grupos do empresariado ou mesmo de outros setores privados, atuam de forma a legitimar decisões políticas, validando-as pela pena de um decreto, seja ele de qualquer instância pública (federal, estadual ou municipal), a fim de tornar as ações mais rápidas. 38 Nesse momento a categoria vocação aparece no texto como explicação para a possível condição que o IERJ possuía para ser instituição de nível superior dado, ao sonho de Anísio Teixeira. É bom lembrarmos, entretanto, que o desejo de Anísio seria bem mais amplo que tornar o Instituto de Educação em uma Unidade que formasse professores em nível superior. O seu desejo foi materializado pela criação, em 1935, da UDF, que significou a concretização de transformar o Instituto de Educação da Rua Mariz e Barros, nos dizeres de Mendonça (2002), em uma Universidade de Educação, e não em uma simples escola de formação de professores, dado ao que o Instituto se prestava: uma formação sólida em diversos níveis e modalidades: formação em nível médio, superior e em nível de pós-graduação lato e strictu-sensu. “(...) laboratório de tudo, que o Instituto de Educação, do ISERJ, tinha e tem. Laboratório de biologia, laboratório de química, laboratório de ciências, laboratório de linguagens, laboratório de matemática... Lá tem tudo. Então lá pode ser o ensino superior. Tem uma biblioteca maravilhosa que permite pesquisa.” A idéia de laboratórios de análise estava presente também no projeto de Fernando de Azevedo. Isso se devia a convicções que Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo tinham de ciência instrumental, mas não numa perspectiva tecnologizante, por onde parece ter enveredado o projeto da FAETEC. No entanto, nos pareceu um dos equívocos o fato do Instituto ter sido transformado em superior por conta do seu porte. Vemos em Mendonça (2002) que o processo de transformação da antiga Escola Normal do Rio de Janeiro em escola de nível superior para a formação profissional do mestre foi um processo que culminou na incorporação do Instituto de Educação à Universidade do Distrito Federal (UDF). Não era um projeto isolado ou um simples aproveitamento do espaço do Instituto. A intenção de Anísio Teixeira era criar nele um Centro de Formação e Aperfeiçoamento para Professores, de todos os graus de ensino e de todo o país. Uma escola de pesquisas educacionais e de cultura superior na área de formação de professores. O projeto era também cultural, pois Anísio anexou ao decreto de criação do Instituto uma exposição de motivos estabelecendo o Instituto como um centro de documentação e pesquisa para a formação de uma cultura pedagógica nacional. O sonho de Anísio não era simplesmente para o Instituto, mas para a formação de professores num sentido amplo. Quanto a isso, Mendonça (2002) salienta que Anísio tinha o sonho de “Institucionalizar o estudo científico da educação, o que permitiria superar o tratamento meramente empiricista que até então se dispensava no país aos problemas educacionais, fornecendo a base indispensável para uma educação.” (Mendonça, 2002, p.41) A instrumentalização do professor, pensada por Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo, portanto, vai muito além do que formar um professor dotado apenas de técnicas para transmissão do conhecimento, embora essas não se tornem desprezíveis em sua totalidade. Mas vão ao encontro de um professor que transforme seu campo de trabalho num espaço científico de experimentos variados, agindo sobre ele mediante a crítica e a reflexividade, e produzindo novos conhecimentos dessa experienciação, ou, como diria Schön (1995), dessa pesquisa-ação. Interessante observarmos também que esse projeto de formação, estabelecido por Anísio Teixeira e que previa a utilização do espaço do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, parece ter sido o caminho tomado pela SEE no projeto do CTQE. A análise que fazemos é que, mais do que simplesmente ter no Instituto de Educação uma instituição emblemática, ele fazia parte do projeto desencadeado pela FAETEC (abrigando instituições de porte) para, a partir do Instituto, desencadear a construção de centros de excelência no estado para otimizar a política já posta em prática pelo governo federal e que o governo de Marcello Alencar cumpria muito bem. Um dos pontos para compreendermos bem o modelo objetivado entre SEE versus FAETEC pelo governo de Marcello Alencar para a educação e desenvolvimento do Estado do Rio é especificado por uma de nossas entrevistadas, quando afirma que “(...) a ideologia da FAETEC, para alguns, ela foi extremamente (a FAETEC) extremamente elitista, porque ela selecionava no povão... povão... povão... não tem acesso lá. Nesse sentido isso é verdade. Só que eu acho que mais perverso ainda é você ter critério de pobreza, que é o critério de manter o pobre na escola só porque ele é pobre e depois dar um certificado a ele dizendo que ele vai ser professor. Porque isso seria o círculo vicioso da miséria. O miserável entra na escola de professores, se torna professor para miseráveis. (...) Esse é o país; o país é capitalista. Eu não posso sonhar: “vou botar todo mundo”, porque isso é um bleff, é uma mentira.” Não há como negar que a FAETEC se tornaria uma Rede de ensino de excelência, mas não por excelência no estado. Ao menos seus dirigentes tomavam claramente essa direção, fazendo dela uma meta. Isto porque algo nos chama a atenção: por que não investir numa educação de qualidade para todo o Estado do Rio de Janeiro? Por que não levar à população um modelo digno de escola, dividindo as verbas existentes por todas as escolas? Isso nos fez supor que o projeto de educação, por ser um projeto de médio e longo prazo desinteressa a muitos governantes, que preferem ações mirabolantes e rápidas para que seus governos não fiquem esquecidos. Uma vez contando com o Instituto na estrutura da FAETEC, a situação tomaria contornos aparentemente mais tranqüilos. O rumo agora seria aprovar o projeto no Conselho Estadual de Educação. Esse projeto tornou o governo de Marcello Alencar, na área da educação, um governo seletivo. De um momento a outro, e em caráter definitivo, parte da história da formação de professores no Estado do Rio de Janeiro começou a sofrer transformações substanciais39. O cenário inaugurado a partir do ano de 1996 (que vimos instituir-se como inaugurador de um novo marco histórico-político no processo educacional do Estado do Rio particularmente para a formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental) começou a sofrer rupturas estratégicas possibilitando existirem paralelamente modelos aparentemente distintos de formação, idealizados através dos projetos de ISE na SEE e na SECT/FAETEC. Com o fim do ano de 1997, a disputa silenciosa nos bastidores antevia a batalha final pela conquista da gerência do projeto dos ISE, que continuaria pelo ano de 1998. Diante do embate pela apropriação da política de implantação dos ISE no estado, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro (IERJ) começou a figurar como um caso isolado frente às demais instituições de mesma modalidade, já com a sua transferência para a FAETEC efetivada. No entanto, como aprofundaremos adiante, a SEE não desistira do seu projeto e buscaria outras alternativas para validá-lo frente ao governo. Pelo projeto da FAETEC, entretanto, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro (IERJ) haveria de receber a sigla ISERJ porque fora transferido da SEE para tornar-se de nível superior, isolando-se como a primeira e única instituição pública do ramo criada no estado, talvez a única no país40 ligada à área de ciência e tecnologia. As demais escolas públicas de mesma modalidade, além de mantidas sob a administração da SEE, permaneceriam como escolas de formação de professores em nível médio, fadadas ao processo de extinção já iniciado na Secretaria de Educação. 39 Afirmamos essa mudança como parte da história, porque as universidades, como a UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e a UENF (Universidade Estadual do Norte Fluminense), continuaram a desenvolver em seus programas a formação de professores para a educação infantil e séries iniciais no curso de Pedagogia, e não estavam ligadas ao programa de formação que vinha sendo desenvolvido pela FAETEC, embora se constituíssem como instituições vinculadas ao sistema estadual de ensino superior. A FAETEC passa a fazer parte desse sistema quando transfere e cria dentro do seu sistema uma “Rede” de Instituições de ensino superior: os Institutos Superiores de Educação (ISE) e os Institutos Superiores de Tecnologia (IST). O Ensino Normal, na Rede Estadual de Educação, continuaria a existir sob coordenação da SEE. Com a existência de todo esse aparato institucional, seria justificável a criação de CNS numa Fundação criada recentemente e não em uma das universidades estaduais, com larga experiência na formação de professores? 40 Em pesquisa que realizamos não encontramos em nenhum outro estado da federação um fato igual que tenha sido desenvolvido anteriormente. Somente encontramos, como já afirmamos, experiências que antecederam, como em Belém do Pará, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Minas Gerais e São Paulo, na Rede Pública. Entretanto essas experiências guardaram características próprias, não tendo vínculo com alguma Secretaria governamental ligada à área de ciência e tecnologia. 2.9 - O Primeiro Projeto de ISE/CNS formulado pela FAETEC “Projeto Nilda Teves”: um caminho sinuoso e contraditório41 No tocante ao IERJ, a FAETEC submeteu à Câmara de Ensino Superior do CEE, o processo nº E-03/100.284/98, que deu origem ao Parecer 258/98 do CEE, publicado no Diário Oficial do estado de 15/10/1998. Esse projeto foi aprovado em 1998, portanto no último ano do governo Marcello Alencar, e deu ao IERJ, ao transformá-lo em ISERJ, o credenciamento para atuar também como instituição de nível superior, aprovando em sua estrutura o Curso Normal Superior. Embora o governo federal (na instância do MEC ou pela Câmara de Educação Superior do CNE) ainda não tivesse legislado especificamente sobre o funcionamento dos ISE, estando o assunto ainda em tramitação em nível federal, a FAETEC formulou, pelo referido processo, todo um enunciado de questões sobre a viabilidade do projeto, utilizando-se, além de sua interpretação, dos artigos 62 e 63 da LDB 9.394/96. Por eles, a FAETEC elaborou o primeiro projeto, ou “projeto Nilda Teves”, que foi anexo ao processo de credenciamento e autorização para transformação e funcionamento do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, em instituição de nível superior, seu CNS. Em nossa análise, verificamos que o Conselho Estadual de Educação (CEE) ainda estava se adaptando às novas exigências emanadas do texto legal. Desta feita, buscando uma maior aproximação do plano legal, a FAETEC utilizou-se das deliberações nº 222/9742 e 228/98 do CEE para fundamentar melhor o texto, embora só tenha mencionado a primeira deliberação citada, no texto do referido parecer. O projeto da FAETEC, que credenciou o ISERJ como instituição de nível superior e que concomitantemente autorizou o funcionamento do seu CNS, constava de três partes: histórico detalhado da instituição, infra-estrutura e integralização do curso. Num breve relato, a FAETEC solicitou o credenciamento do ISERJ como instituição de nível superior, fundamentando-se nos documentos legais dos planos federal e 41 Quando falamos de Instituto Superior de Educação, fazendo alusão ao projeto da FAETEC para o ISERJ, utilizamos o significado da sigla como sendo “Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro”, em referência à unidade localizada na cidade do Rio de Janeiro, na Rua Mariz e Barros nº 273, no bairro da Tijuca. Por sua vez, a expressão “projeto do ISERJ”, para a FAETEC, constitui a referida unidade como única e “autônoma” no sentido do seu funcionamento. Não era interesse à FAETEC (no governo de Marcello Alencar), na extensão desse projeto, criar uma Rede de instituições. O ISERJ seria a única instituição a ser transformada em ISE, tendo o CNS funcionando nessa estrutura, pela sua ampla condição física. 42 A Deliberação 222/97 do CEE fixa as normas de funcionamento das instituições de educação superior vinculadas ao sistema estadual de ensino, em observância à LDB 9.394/96. Já a deliberação 228/98 dispõe sobre o credenciamento de estabelecimentos isolados de ensino superior no âmbito do Estado do Rio de Janeiro. estadual existentes. Em seguida, a história da instituição (IERJ) foi contada com detalhes, inclusive sobre a condição efetiva da instituição em se tornar realmente de nível superior, o que aparenta ter acontecido mais por conta da influência política da formuladora do projeto junto ao CEE, do que propriamente pela vocação43 do Instituto em constituir-se como tal. Após o relato histórico, o projeto detalha a infra-estrutura da instituição postulante, oferecendo detalhes do prédio, suas edificações e instalações, inclusive apontando com detalhes a biblioteca, por ser um dos pontos nevrálgicos para o credenciamento da instituição como de nível superior junto ao CEE. Enfim, o projeto apresenta o funcionamento do Curso Normal Superior, enfocando detalhes do conceito de formação a que se propunha: “As transformações tecnológicas, econômicas e culturais do mundo moderno apontam para a necessidade da formação de um educador que seja capaz de pensar, decidir, planejar e executar as atividades educacionais, em consonância com os avanços da ciência e tecnologia. O mundo está mudando, velozmente. O computador não é mais um sonho de consumo, uma demonstração de “status”. Ele se tornou indispensável à vida moderna e está, cada vez mais presente nas casas e nas escolas. A sobrevivência das pessoas e dos países depende, indubitavelmente, das novas descobertas tecnológicas. É nessa direção que o mundo caminha e a nação, que não conseguir responder a tais exigências, ficará para trás, porque sociedade alguma progride se não tiver pessoas capazes de realizar um trabalho profícuo que os desenvolvimentos tecnológico e cultural requerem.” (Projeto FAETEC, processo nº E-03/100.284/98, p.11) Com este detalhamento, percebemos claramente a visão tecnificada, dada a ênfase tecnológico-desenvolvimentista44 que a FAETEC empresta à formação do professor, cujas 43 A categoria vocação, na dimensão total do presente estudo, é trabalhada sempre no sentido regional, para cada instituição. Assim sendo, quando fazemos referência à vocação da região, falamos da identificação das características econômicas, sociais, culturais e turísticas daquela região. Portanto, o sentido de vocação da instituição dentro da região em que está inserida, está em planejar a educação naquela instituição e se consolida a partir do atendimento às características da região à qual pertence. Sendo assim, o governo, ao criar uma determinada instituição, deveria perceber as vocações regionais para que a educação venha a ser um meio de alavancagem do progresso regional num desenvolvimento sustentável e não servir simplesmente como prática desenvolvimentista, implantada para atender ao mercado. No caso específico do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, a referida categoria é trabalhada não em relação ao desenvolvimento regional, mas como possibilidade concreta do Instituto ter sido elevado ao nível superior pela história que possui, com destaque para o papel que ocupou no movimento escolanovista. 44 Quando nos referimos à técnica tomamos emprestado o sentido de mecanização. Quando falamos em tecnologia, nos referimos à evolução dada a cada técnica. Ou seja, em nossa visão, percebemos a tecnologia (produto) como a evolução da técnica (modo de emprego). Na tecnologia está inserida a ciência e a pesquisa. Porém no seu emprego raramente encontramos associada a ela, a compreensão de como funciona a técnica, objetivando a pesquisa como um elemento instigador do aprendizado. Por isso, nesse ângulo, a tecnologia nada mais será que uma técnica melhorada. Nesse sentido o professor não se enquadra como técnico ou novas tecnologias, a despeito do professor como antes de tudo um profissional crítico e reflexivo de suas práticas, se apresenta objetivamente. 2.9.1- Compreendendo o modelo de ISE/CNS formulado pela FAETEC Pelo aludido projeto, o Curso Normal Superior (CNS) do ISERJ ofereceria 200 vagas anuais divididas em dois turnos, sendo um pela manhã e um à tarde, num total de quatro turmas por ano. Notamos que não houve interesse no oferecimento de vagas no CNS no turno da noite, porque talvez, de acordo com o que se estabeleceu no projeto, isso pudesse afetar a “excelência da formação”, aparentemente por se destinar o referido curso a formar, como vimos, uma suposta “elite”, sendo o ensino noturno destinado geralmente a profissionais que atuam no mercado de trabalho durante o dia, só tendo condições de prosseguir nos estudos no turno da noite, como é o caso da maioria do professorado. Neste caso, ao formular-se o projeto, já se tinha em mente a clientela à qual o curso seria dirigido. O critério de “excelência” estava aí estabelecido. Pelo primeiro projeto da FAETEC (ou “Projeto Nilda Teves”, como ficou conhecido), o ISERJ seria nivelado, em termos de qualidade no ensino, a instituições como o Colégio Pedro II e o CEFET (Centro Federal de Ensino Tecnológico). Justificando o nivelamento do Instituto, o projeto menciona que ele historicamente havia perdido a qualidade na formação. Havia pouca exigência na formação e muitas pessoas desqualificadas estavam nele estudando, fruto, segundo a idealizadora do projeto, da era Lacerda (década de 50), quando o critério para acesso ao Instituto foi o de demanda social. Era preciso, segundo a professora Nilda Teves, resgatar a qualidade na formação dada pelo Instituto. Sendo assim, afirma veementemente: “(...) Então, quando eu entrei, eu acabei com o critério de pobreza. Eu coloquei no mesmo regimento da FAETEC. E o regimento da FAETEC, eu tirei, eu copiei, ajustei o regimento do Colégio Pedro II. Que a média era 7,0 para passar direto; 6,0 pra ir pra final e 5,0 pra segunda época. Foi um critério de seleção tão grande (porque a procura foi enorme). Então era exigido rigor na entrada e rigor nas promoções.” tecnólogo, porque pensa, critica e age sobre o raciocínio, refletindo e transformando o ensino para além da técnica, ou seja, para além do uso da técnica como condição estanque para se elevar o aluno ao aprendizado. Para que o Instituto de Educação fosse transformado em uma Unidade de Excelência, que era uma das intenções do projeto da FAETEC, um dos seus artifícios foi a culpabilização das pessoas, ou seja, a má conduta das instituições de ensino do estado era derivada da falta de preparo das pessoas, o que exigia uma separação entre escolas boas e ruins, solução que colocaria em pé de igualdade todas as instituições de ensino, mormente as de formação de professores. Quanto a sua integralização, o CNS seria estruturado em quatro semestres (ou dois anos) sendo que o aluno poderia flexibilizá-lo em quatro anos. A carga horária totalizaria, entre componentes curriculares obrigatórios e disciplinas eletivas, 2.880 horas/aula. Juntamente com as obrigatórias, o aluno deveria cursar pelo menos duas disciplinas eletivas ao longo do curso e entregar uma monografia como requisito parcial de conclusão de curso, no máximo após seis meses. Se analisarmos o binômio carga horária e tempo de formação do aluno, veremos que era grande a preocupação em se formar o aluno de maneira aligeirada, pois o que estava em jogo era entregar esse aluno o quanto antes ao mercado de trabalho. E essa foi uma visão com forte viés mercadológico.45 Dependendo da origem desse aluno ingressante no CNS do Instituto, o tempo de formação, independentemente da carga horária, teria grande relevância, pois neste caso, quanto mais tempo o aluno passasse na instituição, aprimorando-se, retendo conhecimentos, associando a sua prática à teoria e vice-versa, mais oportunidades teria de sedimentar esse conhecimento, pois associaria o aprendizado ao tempo de formação, que nesse caso será sempre indispensável. Historicamente, a formação do professor da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental vem sendo aligeirada. Se observarmos a partir da LDB 4.024/61, no seu artigo 53, a formação prevista para esse professor (de caráter regional) seria de, no mínimo, quatro anos em Escola Normal de nível ginasial, que dava direito ao diploma de regente de ensino primário, mais três anos de prosseguimento em Escola Normal de nível colegial, que lhe conferiria o diploma de professor primário. Às licenciaturas era garantida a formação em quatro anos. Com isso, a formação poderia totalizar-se em até onze anos. A Lei 5.692/71, baixada no período da ditadura, além de inserir mudanças substanciais no ensino de 1º e 2º graus - conotando-lhes viés fortemente técnico-, acabou com o curso normal regionalizado, diminuindo o tempo de formação para o magistério nas 45 Por esse viés a proliferação dos ISE foi muito grande na iniciativa privada. Escolas Normais para três ou quatro anos (art. 30) criando a licenciatura curta (dois anos) e levando essa formação a, no máximo, oito anos. Com o advento da Lei 9.394/96, abre-se o caminho para a extinção do Curso Normal de nível médio, reduzindo-se a formação do professor da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental em nível superior para dois anos, facultada pelo Parecer CNE/CP 115/99 e pela Resolução CNE/CP 01/99 e concretizada pela Resolução CNE/CP 02/2002, que instituiu a integralização de duração do CNS em, no mínimo, três anos, fato que atenuou mas não deixou de demonstrar que a formação desse professor realmente sofreu uma queda abrupta no seu tempo e, conseqüentemente, no seu conteúdo, tecnificando a formação. O projeto desencadeado pela FAETEC é a continuidade de um pensamento alinhado aos anseios do governo federal, que por sua vez remete-se também ao plano internacional. Segundo Kuenzer (1998) para buscar “...diminuir o custo do Estado para assegurar a estabilidade da economia, o governo tem obedecido às políticas do Banco Mundial para a educação como forma de ter acesso a financiamentos.” (Kuenzer, 1998, p. 113) Este projeto demonstra seu grau de busca por um aligeiramento na formação com vistas à instrumentalização do conhecimento, uma visão de pragmatismo educativo e não de produção de pensamento, de conhecimento, de reflexão. Como salienta Kuenzer (1998) esses cursos de duração rápida tendem a reafirmar a “redefinição da função do Estado relativa ao financiamento da educação, diminuindo a presença nos níveis superior e médio, e priorizando o ensino fundamental; estimulando as iniciativas públicas e privadas a oferecer cursos mais “adequados e eficientes” para atender às demandas do mercado de trabalho, o que significa dizer de duração mais curta e mais baratos” (Kuenzer, 1998, p.114) Neste sentido podemos observar que, se seriam criadas redes de excelência para as escolas do Estado do Rio, certamente algumas escolas seriam escolhidas para participar dessas Redes; outras não. Isso nos leva a refletir que jamais os recursos utilizados para tornar excelente todo o ensino na Rede Pública Estadual seriam os mesmos recursos utilizados para tornar excelente uma parte dessas escolas. Logicamente os recursos empregados seriam menores. E mesmo que achemos que não, mesmo que os recursos destinados pelo governo para toda a Rede Pública fossem iguais aos que estavam sendo utilizados para parte dela, obviamente cabe-nos pensar que se o governo objetivasse fazer o mesmo, ou seja, excelentizar toda a sua Rede de ensino, teria que gastar muito mais. Nesse sentido, o projeto da FAETEC tornou-se elitista, discriminando boa parte das escolas da Rede Pública estadual que formam professores, sob o simples argumento de não terem base de conhecimento suficiente para participarem do seu projeto. Avançando um pouco em nossa reflexão, veremos que em 1999 foram homologadas pelo governo federal, as políticas que afirmamos anteriormente. A decretização tornou-se a principal via de consecução dos ideais do governo federal para firmar as estacas da mercantilização na formação de professores. Isso aconteceu quando o Presidente Fernando Henrique Cardoso baixou o decreto 3276/99 tornando exclusiva a formação em nível superior dos professores para atuar na educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental nos CNS. Rapidamente houve a proliferação desses cursos na Rede Privada. Porém, o movimento articulado dos educadores, através de suas entidades representativas como a ANDES, o FORUMDIR e a ANFOPE, foi capaz de reverter em parte um processo que, como vimos, vinha tomando corpo no Brasil desde o início dos anos 90. Em virtude dessa luta, o Decreto 3554/00, trocou a expressão “exclusivamente” por “preferencialmente”, ainda não suficiente para reverter todo o processo de mercantilização e aligeiramento na formação de professores. No ano de 2001, novamente o assunto volta à baila, desta feita com a publicação do Parecer 133/2001, que, conforme assevera Silva (2003) “(...) restabelece os termos do Decreto 3.276/99, no que tange à formação dos professores dos anos iniciais do ensino fundamental e da educação infantil, com alcance limitado. Com efeito, o referido Parecer recoloca o monopólio da formação daqueles professores em nível superior para o curso normal superior, nas IES que não têm caráter universitário. Em outras palavras, se a IES não for um centro universitário ou uma universidade, só poderá formar professores da educação básica se criar um instituto superior de educação; e, no caso dos professores dos anos iniciais do ensino fundamental e da educação infantil, só poderá formá-los em curso normal superior.” (Silva, 2003, p.54) Tais evidências enunciadas por nossos interlocutores ajudam a respaldar o teor mercadológico com que vinha sendo desenhado o projeto da FAETEC, e o seu alinhamento com as políticas oficiais do governo federal e no plano internacional, num movimento amplo de instaurar na sociedade um modelo de educação pautado nos ideais conservadores. O sentido dado a essa progressiva política de esvaziamento da formação docente, revelada pela diminuição dos anos de formação do professor, leva-nos a reforçar a visão privatista e mercadológica inserida na educação nesses últimos tempos. Considerando o aspecto científico, que confere maior respaldo na qualidade da formação profissional, e o tempo dessa formação, que lhe garante um conteúdo mais articulado elaborado e discutido, a exigência de uma boa formação torna-se preponderante, para que as instituições alcancem êxito no mundo do trabalho. O tempo de amadurecimento é essencial para uma boa apreensão, solidificação e troca dos conhecimentos adquiridos. Nenhuma instituição, por exemplo, formará um médico em dois anos. E nenhum estudante de medicina sensato buscará adiantar o seu curso (que geralmente é integralizado em no mínimo seis anos) para três anos, simplesmente porque sabe que não viverá experiências suficientes, não sedimentará os conteúdos do curso e nem construirá ou obterá um nível de saber suficientemente amplo para torná-lo um bom profissional, associando assim, a teoria à prática. Por que então, o professor, aquele que molda gerações, que ajuda a formar mentes, pode ter sua formação abreviada? É a educação uma ciência menor? Observando o modelo de CNS previsto para o ISERJ pela FAETEC, aqui denominado de “projeto Nilda Teves”, verificamos que esse primeiro projeto não previa a criação de outros institutos. Ele apenas previa a transformação do Instituto de Educação em ISERJ, numa única unidade, para fazer parte do conjunto de escolas da Rede de excelência da FAETEC. Os ISE criados pela FAETEC no interior, caso que estudaremos adiante, nasceriam de uma visão diferente, pensados por atores diferentes, porém com a mesma intenção de aligeiramento na formação. Isto nos remete a pensar que mesmo dentro da FAETEC, existiam correntes de pensamentos distintas em momentos diferentes, com interesses político-ideológicos distintos. Retornando à análise do primeiro projeto de ISE/CNS da FAETEC, vemos que a LDB 9.393/96 acabara de ser sancionada, e a legislação ordinária (Parecer 115/99 e Resolução 01/9946) servia para dar retoques pequenos, mais no sentido de orientação, pois como verificamos, pela ausência de sustentação legal na construção do projeto, houve interpretação unilateral e individual. 46 O Parecer nº 115/99, aprovado pelo CNE/CP, em 10/08/99, dispõe sobre as Diretrizes Gerais para os ISE, considerados os art. 62 e 63 da Lei 9.394/96 e o art. 9º parágrafo 2, alíneas “c” e “h” da Lei 4.024/61, com a redação dada pela Lei 9.131/95. Já a Resolução nº 01/99, aprovada pelo CNE/CP em 30/09/99 dispõe sobre os Institutos Superiores de Educação, considerando os artigos 62 e 63 da LDB 9.394/96 e o art. 9º parágrafo Não apreendemos, entretanto, que tipo de critério de excelência no ensino seria considerado, tendo em vista que, mais tarde, a própria Resolução 01/99 estabeleceria a carga horária mínima de 3.200 horas/aula no CNS dos ISE, portanto bem acima do estabelecido pelo projeto no estudo. Contudo, como nessa época ainda não havia legislação ordinária estabelecendo critérios, e como a nova LDB, segundo a visão do professor Luiz Antônio Cunha, constituía-se por uma lei sucinta, ou minimalista47, os formuladores do primeiro projeto de ISE da FAETEC sentiram-se à vontade para fazer sua formulação, numa interpretação própria, credenciando a instituição no CEE e aprovando seu Curso Normal Superior sem qualquer dificuldade. Sobre a aprovação do projeto, uma de nossas entrevistadas, Conselheira do CEE e que viveu o momento na SEE, comenta que: “(...) o CEE muitas vezes, em muitos momentos, criticou, se colocou contra. Ali houve realmente uma pressão política; podemos dizer uma “forçação de barra”... Houve uma situação ali de quase constrangimento político e houve uma aprovação ali, que quase as pessoas estavam aprovando sem concordar.” Estaria o CEE a “concordar, discordando”? Certamente o embate político existente no CEE, naquele momento, não foi suficiente para um amadurecimento da discussão e o projeto acabou sendo aprovado por decisão unânime da Câmara de Ensino Superior do Conselho, originando o Parecer 258/98, sem uma análise mais detalhada, inclusive dispensando a etapa de visita da Comissão Verificadora, alegando “... tratar-se de instituição tradicional e por todos reconhecida na área de formação de professores.” (Parecer 258/98 do CEE, p.14) A formuladora do projeto usou todo seu prestígio político para articular, junto ao Conselho, a aprovação do projeto. Ela também era membro, do Conselho, tendo inclusive, em momento anterior, ocupado a função de presidente. Certamente, usando o seu prestígio político, ela ajudou a aprová-lo. Ela assim afirmou em entrevista realizada: “Bom, desde o início do governo que eu fui Conselheira do Conselho Estadual de Educação. E eu aproveitei o meu tempo de 2º, alíneas “c” e “h” da Lei 4.024/61, com a redação dada pela Lei 9.131/95, considerando também o Parecer 115/99. 47 Sobre esse tema, considerar artigo de CUNHA, L.A. A Nova Reforma do Ensino Superior: a lógica reconstruída. Cadernos de Pesquisa, n. 101, jul. 1997. Ainda considerar importante contribuição de SILVA, W.C da. A nova Legislação Educacional e a Formação dos Profissionais da Educação: um esforço de análise. In: CARNEIRO, W.C. da (Org.) et al. Formação dos Profissionais da Educação: o novo contexto legal e os labirintos do real.. Niterói: EdUFF, 1998. Conselho Estadual de Educação para fazer a fundamentação toda, aprovar os programas, aprovar o currículo. (...) Eu criei o primeiro Instituto Superior de Educação do Brasil, entendeu? Porque existia na lei. Ninguém tinha efetivado. Aí eu levei o projeto pro Conselho Estadual de Educação.” Com respeito ao corpo docente constituído para o CNS, como mencionamos anteriormente, fora cedido pela SEE, tendo em vista que o Instituto a ela era subordinado administrativamente. Esses professores, embora em grande parte possuindo cursos de pósgraduação lato-sensu e mestrado48, prestaram concurso para docente I da carreira do estado, ou seja, para carreira docente de nível médio. No entanto, vários professores do ISERJ com os quais mantivemos contato, demonstraram preocupação com a questão administrativa em que se encontravam, embora a estratégia do governo realmente tenha funcionado, pois a elevação salarial fez muita diferença neste caso, para fazê-los aceitar a cessão de Secretaria, como veremos adiante. 2.10 - Em uma arena de lutas Dada a multiplicidade de fatos nesse movimento de ir e vir, de embates envolvendo a FAETEC, o governo do estado, a SEE e o CEE, resgatamos, no momento anterior, a trajetória de transferência do Instituto de Educação do Rio de Janeiro para a administração da SECT/FAETEC. Algumas considerações mais detalhadas se fazem necessárias para compreendermos esse momento de efervescência na criação dos ISE/CNS no estado do Rio de Janeiro, principalmente porque, dada a proximidade dos fatos, parece não ter havido uma simetria entre eles, nos levando a crer (pelos dados que colhemos e pelos documentos que pesquisamos, sobretudo os projetos) que ambos foram formulados quase que 48 No anexo do Parecer CEE 258/98 (cópia a que tivemos acesso) consta uma relação contendo 71 professores com pós-graduação lato-sensu e 22 professores com mestrado. Como nossa dificuldade foi grande para conseguir os dados apresentados (e não sendo a intenção deste trabalho analisar o CNS, apontando dados apenas superficiais sobre esse para melhor compreensão do leitor) não buscamos analisar os referidos dados à luz da legislação vigente. Podemos averiguar, num esforço bem rápido de análise, que embora as intenções do projeto da FAETEC, como afirmamos anteriormente, fossem de cunho desenvolvimentista, o quadro de docentes do ISERJ possuía boa qualificação, fruto, provavelmente, do emblema que aquela casa possuía desde os tempos de Anísio Teixeira. Tais informações não nos eximem, porém, de considerar que título ou grau, nesse caso específico, não esgotam em si mesmos a condição para atuar como docente de nível superior, sendo necessária experiência nesse nível de ensino para o seu simultaneamente. Outro fato que reforça a nossa tese foi a preocupação da formuladora em aprovar o projeto no CEE, demonstrando que existia realmente uma luta políticoideológica ocorrendo nos bastidores do poder. Como todas as evidências factuais apontam, entendemos que a SEE e a FAETEC representam projetos ideológicos diferentes, com metas e políticas de ação distintas e com divergências fortíssimas, embora com pontos de aproximação, como tempo de formação do professor no CNS e escolha do ISERJ como ponto de referência para implantação das políticas dos ISE/CNS. No nosso entendimento caracteriza-se assim uma luta políticoideológica pela conquista do espaço para a implantação dessa Rede de Institutos Superiores, espaço esse estratégico do ponto de vista das políticas estabelecidas num mesmo modelo político de governo estadual. Verificamos que, no governo de Marcello Alencar, foram formulados, portanto, dois projetos de ISE e CNS aparentemente antagônicos, mas que deslancharam com ampla similaridade, inclusive com respeito à carga horária do curso. A força política nessa arena de embates fez com que apenas um deles prevalecesse (o da FAETEC), fazendo sucumbir o outro (o da SEE). Tal fato nos fez perceber que em um governo não bastam ações claras de interesses sociais. A disputa por um projeto de criação de ISE/CNS, no plano estadual, dentro de um mesmo governo, ensejou a existência não somente de projetos ideológicos diferentes e de concepção de formação distintas, mas de vaidades pessoais, de demarcação de espaços nas Secretarias, em detrimento do entendimento de que a Rede Pública estadual necessita rever suas metas para construir sobre elas políticas de formação de professores que atendam aos anseios das redes dos diversos municípios e para a melhoria da formação dos professores que nelas atuam. O que percebemos é que, em muitos casos, o capital político é moeda de troca constante na luta travada para que sejam mantidas as posições, sejam elas pessoais ou ideológicas e que acabam sendo, na maioria das vezes, intitucionalizadas. Adiante, analisaremos o projeto da Secretaria de Estado de Educação para os ISE e CNS no estado do Rio de Janeiro (projeto malogrado) e seus aspectos internos, caminhando para uma compreensão maior acerca do processo, possibilitando vislumbrar seus diversos matizes. exercício, que exige, além de discussões qualificadas, ampla condição de reflexividade, tendo a pesquisa como princípio ativo. 2.11- O projeto de ISE/CNS formulado pela SEE – “Projeto Álvaro Chrispino” A sigla “ISERJ” (Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro), que o Instituto receberia, cunhada pela SECT/FAETEC, quando de sua transformação em instituição de ensino superior, que no tocante à aludida Secretaria seria sinônimo de uma única instituição49, significaria, para a SEE, a transformação, em três anos (a partir do IE Sarah Kubitschek - no bairro de Campo Grande, e do CE Júlia Kubitschek no Centro da cidade do Rio de Janeiro) num conjunto de institutos50 em ISE por todo o Estado do Rio de Janeiro, de acordo com o projeto pela Secretaria Adjunta de Ensino. Ou seja: enquanto por esse primeiro projeto “faetequiano” apenas o IERJ fora transformado em ISE, pelo projeto da SEE vários institutos, em todo o estado, seriam transformados em ISE. Vale ressaltar que na evolução do projeto da FAETEC, já no governo Garotinho (1999-2002), o que veremos posteriormente, objetivou-se construir uma Rede de ISE/CNS públicos por todo o estado. Pelo modelo da SEE as unidades seriam interdependentes, porém ligadas a uma mesma filosofia, tendo uma mesma matriz pedagógica51, unidas em torno da sigla “ISERJ” (Instituto Superior de Educação no estado do Rio de Janeiro) preceituando a expressão um corpo de instituições. Olhando por esse ângulo, o projeto parece ter o mesmo padrão de organização da FAETEC de instituições integradas centradas num único controle. Apenas ressalvamos que as outras instituições ligadas ao modelo não eram ISE, porém CEI, pois no caso da FAETEC, pelo projeto da professora Nilda Teves, relembramos, apenas o IERJ seria transformado em ISE. O governador Marcello Alencar entregou à Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, no ano de 1996, a tarefa de escolher o nome dos novos Secretários de Educação e Saúde, pois vinha enfrentando problemas de gestão nas duas Secretarias. As 49 O projeto da FAETEC não entra em detalhes quanto à implantação de outros Institutos. Recorrendo à entrevista com a professora Nilda Teves, fomos informados de que a intenção da FAETEC, naquele momento era transformar somente uma instituição em ISE, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro. O projeto se encerraria ali. 50 Os outros ISE apontados pelo projeto da SEE para sofrerem transformação em ISE gradativamente, seriam: IE Profº Ismael Coutinho, em Niterói; IE Rangel Pestana, em Nova Iguaçu; IE Profº Aldo Muylaert, em Campos dos Goytacazes – RJ ; IE de Nova Friburgo, – RJ; IE de Itaperuna – RJ; e Instituto de Educação de Teresópolis – RJ. 51 Pela análise do projeto nos certificamos que a linha pedagógica dos institutos seria a mesma em todas as unidades. A matriz curricular seguiria também o mesmo plano, pois o projeto afirma que “...os primeiros Institutos de Educação serão responsáveis pela necessária qualificação e/ou requalificação do corpo docente dos futuros Institutos Superiores de Educação a serem implantados nas diversas regiões.” (SEE, anteprojeto, p.8). bancadas do PSDB (na época o partido do governo) e os partidos aliados indicaram, para a Secretaria de Educação, o nome do então deputado estadual Fernando Pinto, que logo montou sua equipe de trabalho. Um dos membros a compor a referida equipe foi o professor Álvaro Chrispino, proveniente do CECIERJ (Centro de Ciências do Estado do Rio de Janeiro, que hoje constitui-se no CEDERJ - Centro de Educação à Distância do Estado do Rio de Janeiro), à época uma autarquia da Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. O professor Álvaro Chrispino passou a ocupar o cargo de Subsecretário de Ensino da Secretaria de Educação, passando também a ser Conselheiro do CEE. Por conta da necessidade de reestruturar a área de ensino (que segundo ele era sempre secundarizada), propôs transformar a Subsecretaria de Ensino em Subsecretaria Adjunta de Ensino, com a finalidade de “...ficar mais à vontade, mais focados na área de ensino.”, conforme entrevista que nos concedeu. A seu pedido, Fernando Pinto reestruturou a Secretaria de Estado de Educação, extinguindo a Subsecretaria de Ensino e criando a Subsecretaria Adjunta de Ensino, para focar prioritária e estrategicamente o próprio ensino e preocupar-se com a reconstrução das políticas educacionais na Secretaria, dando visibilidade e poder de mando para consecução das medidas governamentais que seriam de ser desencadeadas. Sobre isso, o Subsecretário Adjunto de Ensino nos afirmou em entrevista: “Chegando na Secretaria de Educação, nós tínhamos o seguinte quadro: uma instituição com alta baixa estima (baixa autoestima)... os professores estavam desmotivados por conta dos dois anos que geraram a crise e permitiram o ingresso de Fernando Pinto. Considerando o tempo que nós tínhamos para realizar as mudanças e a necessidade de conhecer a história, de não perder tempo reconstruindo grupos e construindo histórias, todos os que formaram a equipe de transição da área do ensino eram oriundos da rede pública e oriundos da história da própria Secretaria.” Além de toda problemática vivida naquele ano, particularmente no âmbito da Secretaria de Educação, como a secundarização do ensino e a priorização das políticas de desenvolvimento do estado pelo governo de Marcello Alencar, Chrispino sinalizou algumas dificuldades enfrentadas quanto a políticas macroestruturais oriundas do governo federal e que haveriam de ser implantadas no estado, como a própria promulgação da Lei 9.394/96, dificultando assim a implementação dos projetos da SEE para as políticas educacionais no estado do Rio. Dentre as políticas a serem implementadas com urgência na SEE, segundo Chrispino, figurava: a política do Fundo de Desenvolvimento para o Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF), pois inexistiam dados para a sua implantação); o plano de carreira dos professores e a necessidade de mexer com o Curso Normal, com o ensino médio, com a educação profissional, com a educação de jovens e adultos e com a educação especial. Como, pela nova LDB, o ensino médio tornou-se responsabilidade dos estados52 e, segundo Chrispino, no estado do Rio existia a indicação de uma “onda demográfica” que estouraria momentos após, como clientela de alunos represada nas escolas de ensino médio, a rede de escolas da SEE deveria ser preparada para esse momento. Como a nova LDB havia cindido o ensino médio e a educação profissional (tornando-a complementar ao ensino médio) havia a necessidade de se reestruturar a educação profissional na SEE, pois essa também possuía, em sua gestão, escolas profissionalizantes. No caso do ensino normal, segundo ele, esse teria que ser remodelado, ou renivelado porque seria, no dizer de Chrispino, “quase um estelionato” formar professores em nível médio após o disposto no artigo 87 das disposições transitórias da nova LDB. Ao mesmo tempo teria a SEE que capacitar e requalificar os professores da Rede, por conta da lei. Tudo parecia convergir em grande interesse para a mudança na esfera da formação de professores dos ISE. Diante desse cenário, a Secretaria de Educação, em sua nova gestão, parecia ter retomado as discussões, ressignificando53, em parte, o projeto do CTQE e começando a traçar a estratégia visando ao perfil do professor da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental que queria formar para as próximas gerações, tendo como pano de fundo a implantação dos ISE no estado, ligados a sua rede. O projeto era ambicioso. A temática discutida na época em nível nacional pelo MEC era de que a mudança da formação de professores na escola normal passaria de três para quatro anos54. A grande preocupação de Chrispino era a tomada de decisão, em 52 Título IV, art. 10 item VI da LDB 9.394/96. O projeto que foi ressignificado e elaborado pelo professor Álvaro Chrispino, segundo interlocutores ligados à SEE, foi uma retomada das idéias já discutidas no início da década de 90, às quais contamos em momento anterior. 54 O MEC através do CNE/CEB vinha acenando para modificações na esfera do Curso Normal de nível médio. Embora a LDB 9.394/96 sinalizasse para a extinção do referido curso, o CNE/CEB respondeu com a emissão da Resolução 01/99, que instituiu as Diretrizes para o Curso Normal de Nível Médio, garantindo flexibilidade por causa das várias regiões brasileiras e da oferta de professores. Ainda em 1999, o CNE/CEB fixou o perfil do Curso Normal de Nível Médio, instituindo a carga horária de 3.200 h/a em quatro anos 53 relação ao projeto, já no final de 1996, (já ao final desse) principalmente porque além de serem medidas necessárias, dado o momento que vivia a Secretaria, o ano de 1997, sendo ano eleitoral corria o risco de não ser tão produtivo, sob pena de não serem concretizados os planos traçados naquela gestão. Mais uma vez o aligeiramento das políticas tomava conta da situação. Por conta dos sinais dos tempos, visando transpor do plano da essência para o plano da existência, ou do ideal para o real, o Chrispino partiu em defesa do projeto, do qual era entusiasta, (re)formulador e articulador político, afirmando que “(...) tendo acompanhado as discussões da LDB e vendo, já no futuro, as conseqüências da municipalização do ensino de 1ª a 4ª séries e a criação das redes municipais e estaduais; o conflito entre elas nos municípios fluminenses, nós começamos então a perceber que o modelo de formação de professores, precisava atender a uma necessidade estratégica55, para chegar a atender o interesse público. (...) No outro artigo da LDB, se não me engano o 64, quando ele fala da formação de professores, ele vai dizer que você tem uma formação na universidade e no Instituto Superior de Educação, deixando clara ali uma posição de conflito, e que, a nosso ver, desde aquela época criaria confronto entre as duas instituições. E a vantagem da universidade, era seu poder, sua história e a sua capacidade de articulação. Quando a gente percebeu isso, que esse confronto era iminente e que as forças eram desiguais, eu tive a certeza absoluta que os Institutos Superiores de Educação, como estavam na lei não sairiam tão cedo. Mas que a tendência, que é uma tendência mundial é de que o ensino normal passasse a ser posterior ao médio. Então, na verdade nós começamos a identificar, como alternativa, tirar o ensino normal do nível médio e torná-lo a princípio um pósmédio.” A idéia estabelecida nesse momento demonstrava o pensamento predominante na Secretaria de Educação para a formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental: como no projeto “faetequiano”, uma educação superior não- universitária. A inovação está presente no projeto da SEE pelo uso da expressão “pósmédio”, ou seja, uma terceirização dessa formação pela SEE, que no projeto “faetequiano” não surge, mas as evidências indicam tratar-se de um modelo de execução semelhante. O curso pós-médio não conferiria ao professor uma elevação de nível propriamente dita, mas uma estratégia para conseguir-lhe uma formação posterior, ou seja, entre um nível e outro; portanto, poderia permanecer em uma Secretaria de Estado. (parcial) ou em três anos (integral). No estado do Rio, o CEE, através do Parecer 16/2001 aderiu à proposta de um curso com a duração de quatro anos, com a carga horária de 4.800 h/a, sendo 4.000 horas teóricas e 800 horas de prática pedagógica. Assim como Teves (no modelo da FAETEC) transitara bem na área tecnológica, imputando ao projeto um modelo tecnicista, Chrispino, na SEE, percorria o mesmo caminho, por transitar com êxito na área de planejamento e gestão56. Bom articulador e conhecedor das tendências da educação e da LDB, tendo inclusive acompanhado toda a trajetória da lei e suas principais modificações, não necessitou aguardar sua promulgação para tomar medidas que julgou necessárias na SEE, a fim de alavancar as políticas públicas no estado no tocante à formação de professores. Além de Chrispino, a equipe que constituía a Secretaria Adjunta de Ensino do Estado parecia conhecer bem a tendência dessa formação, que vinha sendo adotada em diversos países, a exemplo dos modelos de formação de professores de Portugal e França57, citados no projeto, de onde provinham algumas de suas idéias, senão o esqueleto a ser adaptado à realidade dos ISE pelo projeto da SEE, tendência essa que o MEC já apontava em seus documentos e que estavam sendo articuladas no estado do Rio de Janeiro, como citamos anteriormente, em projetos aparentemente antagônicos. Como nos aponta Evangelista et alli (2002), referindo-se ao Fórum Consultivo Internacional para a “Educação para Todos” (Education for All, EFA), “O MEC expressa essa intenção afirmando que, nesse quadro de mudanças, portanto, será cada vez mais urgente a criação de cursos técnicos de nível pós-médio, uma vez que grande parte dos egressos do ensino médio têm como principal expectativa sua inserção ou a permanência no mercado de trabalho.” (Relatório EFA 2000, MEC/INEP,1999, apud Evangelista, 2002, p.92) Assim sendo, o projeto elaborado por Chrispino, na época Subsecretário Adjunto de Ensino da SEE, parecia ceder às principais propostas estabelecidas pelo MEC para a superiorização do professor das séries iniciais do ensino fundamental naquele momento, 55 Sem grifos no original. O professor Álvaro Chrispino especializou-se em ensino de ciências na USP, realizou mestrado na UFRJ, na área de currículo, e doutorou-se pela mesma universidade, em Políticas Públicas (Planejamento e Gestão). 57 Examinando os modelos citados, verificamos se tratar a situação dos ISE no estado do Rio, numa tentativa de conexão com o modelo Português (guardadas as devidas proporções de tempo de formação e conceito da palavra “superior”), em que o ensino superior engloba dois tipos de ensino: o superior politécnico (ESP) e o ensino universitário. A duração é variável. Uma licenciatura dura, em média, quatro a cinco anos, conferida por universidade. A mesma pode também conferir o grau de bacharel, em certos programas, como é o caso da formação profissional dos professores em Institutos Superiores Politécnicos mediante um quarto ano ou um Diploma de Estudos Especializados, chamado de DESE. Pelo modelo Francês, no entanto, quem deseja ser professor tem que cursar três anos de universidade e depois se candidatar a um Instituto Universitário de Formação de Professores (IUFM). No momento da seleção para o Instituto ele escolherá que professor desejará ser: se de 1ª à 4ª série; especialista numa disciplina; do ensino técnico; do ensino profissional, etc. O curso é realizado em 2 anos e não forma exército de reserva, ou seja, todos os professores que completam o segundo ano de estudos estão automaticamente admitidos pelo Estado francês. 56 guinando-o para uma espécie de licenciatura curta (nesse ângulo assemelhando-se ao “projeto Nilda Teves”) que, diga-se de passagem, a LDB não mais permitia. A aplicação da categoria superiorização, para Chrispino, ganha conotação de “o que está acima de”. Portanto, conceder ao professor a oportunidade de realizar um curso pós-médio seria, no entender de Chrispino, superiorizá-lo. Interessante é verificar que o governo de Marcello Alencar estava permitindo que os dois projetos caminhassem pari-passu até que um deles saísse vencedor, talvez pela urgência de implementação de políticas para a educação pelo novo governo estadual, pois alguma coisa precisava ser feita, ou, simplesmente o governo queria dar impressão de movimentação e inovação. Era, como vimos, uma verdadeira arena de lutas. Continuando sua trajetória na SEE, o projeto que Chrispino coordenou elegeria, como base teórica e ideológica, um documento da CEPAL & UNESCO58 que faz uma justificativa de que na maioria dos países a formação dos professores está passando das escolas normais de nível médio para as chamadas escolas “pós secundárias”. O projeto busca aperfeiçoar esse conceito nas leituras de Moura e Castro (1993), Demo (1995) e Drucker (1993), dentre outros. Segundo ele, “O melhor caminho para definir o que vem a ser – ou o que virá a ser – o Instituto de Educação Superior59 talvez seja informando o que efetivamente ele não é nem poderá ser, por arriscar o futuro da educação brasileira, que não mais suporta projetos faraônicos, megalômanos e destituídos de suportes sólidos e cronogramas factíveis. O capítulo IV da LDB trata da Educação Superior e, no seu artigo 45, aponta que “A educação superior será ministrada em instituições de ensino superior...” e, nos artigos mais adiante, explicitará sobre a universidade (artigo 52) e o novo tipo de instituição de ensino superior, as chamadas universidades especializadas por campo de saber (parágrafo único), não faz referência acerca dos cursos superiores isolados já existentes. (...) Logo, o Instituto Superior de Educação não é parte do capítulo da educação superior da LDB; não é um curso superior em pedagogia; não é o atual curso de formação de professores para 1ª a 4ª séries “redecorado” para continuar como sempre foi.” (Anteprojeto de Implantação do Instituto Superior de Educação no Estado do Rio de Janeiro – Projeto Experimental – pp. 5 e 6) A idéia de um curso pós-médio também revela a presença de uma formação aligeirada no projeto da SEE, pois teria a duração de trinta meses. Assevera o projeto, que: 58 CEPAL. UNESCO. – Educação e Conhecimento: eixo da transformação produtiva com eqüidade. – Brasília: IPEA/CEPAL/INEP, 1995. O documento anteriormente citado serviu de base para a elaboração do projeto da SEE. “ Todos os países sérios resolveram o problema do ensino básico com uma escola regular sem maiores piruetas ou mágicas: um professor bem formado, um bom livro didático, um currículo definido, alunos em sala de aula durante um tempo mínimo e um sistema de avaliação sério e coerente. Quando isto falha, falha também o remendo.” (Anteprojeto de Implantação do Instituto Superior de Educação no Estado do Rio de Janeiro) Não era intenção do projeto elevar o nível de formação desse professor, mas buscar resultados rápidos em sua formação. Portanto o projeto da SEE, nesse momento, buscava uma alternativa de formação superior para os professores que não se configurasse numa formação plena, mas que também não se caracterizasse como formação de nível médio: uma formação com flexibilidade. Assim, o formulador do projeto reconstruiu a proposta estabelecida pela SEE, porém, conduzindo-o talvez numa dimensão um pouco diferente que a pensada nos anos 90 do século XX pelo grupo que estudava a possibilidade de criação do CNS na Rede Pública estadual dentro da Secretaria. Aquele grupo estava articulando-se para conduzir as condições de formação junto à universidade, e propondo uma formação plena em Curso Normal Superior. Não há indícios de que essa formação se dê em “nível pós médio”. Nossa impressão quanto à proposta reelaborada pelo professor Chrispino é que ela guardava semelhança, em termos de tempo de formação, com os cursos superiores de formação tecnológica, que não são de formação plena (dois anos no máximo) mas são cursos superiores do ponto de vista de uma formação além do ensino médio (pós-médio técnico), com intenção de atuação rápida no mercado de trabalho. Essa visão teve o governo federal ao querer aligeirar a formação de professores para cumprir compromissos assumidos com organismos internacionais, imputando ao professor uma visão tecnificada e não considerando as características que essa formação exige, como reflexão, crítica e pesquisa, peculiaridades que somente são conseguidas com tempo de maturação. Em grande semelhança, o projeto ressignificado da SEE parece alinhavar-se a um estudo desenvolvido pelo MEC nas décadas de 70/60 e que foi publicado pela professora Heloísa Marinho60, em que ela afirma: 59 Sem grifos no original. A professora Heloísa Marinho atuou na década de 60 e início da década de 70 como integrante da Comissão designada pela Diretoria do Ensino Superior do MEC, juntamente aos professores Luzimar Alvino Sombra, Stella Maria Monteiro Stelling, e Marilio Pires Domingues (presidente), com o objetivo de estudar a criação de cursos universitários para as modalidades de ensino especializado. Podemos verificar que não são recentes as tentativas do MEC em formar professores para a educação infantil e séries iniciais do ensino 60 “Limitando os cursos pós-normais a professôres primários formados em nível colegial, o art. 55 da Lei de Diretrizes e Bases facilita a organização do treinamento em serviço. Elevando a nível superior não só os conhecimentos, como a prática educativa de professôres primários, com pleno exercício do magistério em jardins de infância e escolas primárias, podem os institutos de educação exercer função preponderante na renovação do ensino primário indispensável ao desenvolvimento nacional.” (Marinho, 1970, p.142) A LDB 4024/61, no seu artigo 59 parágrafo único e os Pareceres 259/69 e 340/63 do Conselho Federal de Educação, já ensejava, segundo Marinho (1964), perspectivas para a organização de cursos superiores de educação primária na universidade e em institutos de educação. Há que se ressaltar, porém, que os estudos do MEC naquela época apontavam para a formação em nível de graduação, cuja visão tornou-se mais clara a partir da Lei 5.692/71, já referenciada neste capítulo. Conforme vimos, a SEE foi quem primeiramente procurou realizar no estado do Rio, nos anos 90 do século XX uma experiência de formação de professores para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental em nível superior (projeto do CTQE), que seria atrelado à universidade, numa demanda já apontada em outras décadas. Entretanto, no projeto ressignificado por Chrispino, embora a universidade participasse como consultora, essa formação se daria nos Institutos, além do que o projeto não garantia que a universidade tivesse outro papel nesse processo. Isso certamente aconteceria para que a SEE não perdesse o domínio administrativo sobre a formação desses profissionais. Essa era uma característica tipicamente cepalina61 dos anos 90, que, conforme nos aponta Evangelista et alli (2002, p.62), “... recomendava que os países da região investissem em reformas dos sistemas educativos para adequá-los a ofertar os conhecimentos e habilidades específicas requeridas pelos sistemas produtivos.” Mesmo no seu isolamento da universidade, o primeiro projeto da FAETEC, (“Projeto Nilda Teves”) aqui se aproxima do projeto da SEE, coordenado por Chrispino, quando ambos demonstram deter o controle central em cada modelo de ISE, na Secretaria. Esta lógica de controle identifica a presença de conceitos do jargão neoliberal nos dois projetos, como flexibilidade e competência, evidenciados por práticas do campo fundamental em nível pós-médio, bem como imputando-lhe semelhanças com cursos profissionalizantes. O artigo de autoria de Heloisa Marinho que contém essas análises intitulava-se: “Formação do professor Primário em Nível Superior”. Foi publicado no volume XLVII, nº 105 p. 142, da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, período de jan/mar de 1967. empresarial na gestão educacional. Evangelista, et alli (2002), novamente nos auxilia na compreensão desse ponto, quando salienta que: “Não se trata aqui de afirmar que o Estado abre, ou abrirá, mão do controle sobre a educação, mas sim que busca adquirir flexibilidade administrativa adotando um tipo de gestão que mescla aspectos de descentralização e centralização. Descentraliza decisões operacionais específicas e a responsabilidade pela eficiência da escola, contudo acirra o controle sobre decisões estratégicas.” (Evangelista, et alli, 2002, p. 118) Superiorizar a formação do professor, pelo projeto de Chrispino, seria oferecer-lhe um curso posterior ao ensino médio e anterior à universidade. Seria uma formação superior, mas não universitária. A opção seria essa. E mais: essa formação se daria por treinamento em serviço com os próprios professores dos institutos, que uma vez preparados pelos dois institutos-piloto garantiriam a formação dos profissionais dos outros institutos a serem transformados em ISE. Segundo Chrispino, a intenção era, como afirmamos anteriormente, utilizar-se da sigla “ISERJ” para todos os institutos e escolas da SEE que haveriam de ser, em Rede, transformados em superiores em uma perspectiva pós-média. Era uma visão de conjunto e em conjunto. O novo Instituto, segundo ele, era um instrumento estratégico de mudança no setor. Sendo assim, o espírito inicial era indicar “(...) duas unidades distintas da Rede Oficial com histórias e realidades também distintas, buscando conhecer as possíveis variações da aplicação do modelo, visando maior adequabilidade no momento de sua extensão para o universo de Institutos de Educação dispostos em pontos estratégicos do Estado do Rio de Janeiro. Estão indicados o Colégio Estadual Júlia Kubitschek, no centro da cidade do Rio de Janeiro, e o Instituto de Educação Sarah Kubitscheck, em Campo grande, a princípio. Estes dois pólos receberão infra-estrutura de apoio tais como computadores e capacitação especial visando a construção de um nicho próprio para a formação de professores. A idéia é que todos aqueles Institutos Superiores de Educação possuam escola de aplicação dos segmentos de estudos em que formarão seus professores.” (Anteprojeto da SEE, p. 7) No transcorrer de 1997, todos os planejamentos seriam executados. Porém a SEE não contava com a entrada da FAETEC nesse cenário, credenciada pelo governo para 61 Trata-se da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe – CEPAL. disputar essa “mercadoria valiosa” que vinha se tornando a formação de professores para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental. A transformação de instituições de nível médio em superior conferiria status à SEE a aos idealizadores do projeto, além, obviamente, de atrair verbas importantíssimas para o governo estadual. Ambos os modelos de ISE/CNS, disputados entre a SEE e a FAETEC, eram benéficos para o governo, pois em qualquer circunstância o projetaria socialmente. Restava apenas saber qual projeto era mais conveniente do ponto de vista político. Por outro lado, estavam em jogo políticas que também ampliariam sobremaneira as Redes de ambas as Secretarias, tornando-as mais influentes, com maior instância de poder dentro do governo. Em 10/09/1997, a disputa parecia ter chegado ao fim, pelo menos no governo de Marcello Alencar, quando este, através de decreto, transferiu o IERJ para a SECT/FAETEC. Foi um fato isolado que surgira repentinamente (ao menos aparentemente) e que trouxe incômodo e transtorno à SEE. Esse acontecimento é facilmente entendido, se observarmos que a FAETEC era recém-criada e não herdara, portanto, os problemas históricos e orçamentários “jurássicos” da SEE e controlava uma Rede de escolas com um número expressivo de cursos e modelos bastante heterogêneos. Finalmente o governo fez sua opção por um dos projetos. Ao nosso ver, tal fato tratou-se de demonstração clara de interesse político, em que o governo privilegiou o projeto da FAETEC em detrimento do projeto da SEE, fatalmente porque aquele lhe traria maior prestígio e projeção política, além de colocá-lo diretamente ligado aos interesses macroeconômicos e de certa maneira privados. Uma verdadeira batalha havia sido travada e venceu o melhor estrategista, tendo o governo descredenciado a política do “perdedor”. Embora não tenhamos encontrado nada documentado, Chrispino afirmou que o IERJ faria parte do projeto elaborado e que, pelo fato de o governo transferi-lo para a FAETEC, a SEE necessitou rever suas intenções e eleger novas instituições para dar continuidade ao processo, já fragilizado pela perda política. Sobre a transferência do IERJ para a Rede FAETEC, Chrispino lamentou: “Então, a instituição, o símbolo da educação do Estado do Rio de Janeiro passou a fazer parte da FAETEC. Então, na verdade, eles não levaram apenas o prédio: eles levaram o símbolo. O ganho não foi o ganho de um prédio centenário, com milhares de alunos e com professores. É a grande marca de qualidade da educação da cidade do Rio de Janeiro. Foi a antiga Guanabara e que era um dos pilares da educação E sem que, para isso, houvesse um projeto já discutido. Tanto é verdade que logo depois que a Educação perdeu o domínio sobre o símbolo do IERJ, o projeto foi reformatado e foi aplicado a outros. Porque nós não tínhamos um projeto pontual. Não era um projeto casuístico; não era um projeto de momento. Não era a gestão de um problema; era a política pública de uma área. Então facilmente tiramos o nome do Instituto de Educação e reformatamos isso, envolvendo outros Institutos de Educação para que a idéia de política pública pudesse ser formada.” Não deixamos de interpretar que já houvesse rumores da transferência do IERJ para a FAETEC e essa transferência já fosse maquinada, pois seria teoricamente impossível dentro de um governo, duas Secretarias com projeção e status de primeiro escalão, com agentes eminentemente influentes e que tinham acesso ao CEE, não manterem um mínimo de diálogo sobre essa questão. No entanto, embates políticos e dissensos sobre tipos de formação e ideologias de formação de professores faziam parte do cenário político do estado do Rio, nesse momento histórico, tendo em vista que o autor do projeto busca separá-lo do que disse ser o espírito da lei e da pedagogia. Nas idéias forjadas pela SEE e ressignificadas através do projeto de Chrispino, uma suposta formação em nível médio com status de superior continuava sendo buscada, ou seja, com “cobertura de formação em nível superior e recheio de formação em nível médio”. Essa formação, por não avançar para uma formação em nível de graduação, plena, parecia guardar semelhanças muito próximas ao curso normal de nível médio, inclusive não se desligando do nome “normal”. Politicamente, a escolha do projeto da FAETEC em detrimento do projeto da SEE foi importante para o estado porque o projeto da FAETEC vislumbrava a criação das Redes de Excelência, marcariam o governo de Marcello Alencar no campo da educação, como um governo inovador que estaria retirando as escolas da situação caótica em que se encontravam, e para isso encontrando culpados, que seriam os professores e a Secretaria de Educação. Mesmo fragilizada com a transferência do IERJ para a SECT/FAETEC, a SEE reformularia o seu projeto que originou o Parecer 430/97 do CEE e teria data marcada para iniciar a sua trajetória de criação dos ISE no Estado, com o CNS como modalidade de “nível” pós-médio, a partir de dois pólos: uma unidade no Centro da cidade do Rio de Janeiro, representada pelo Colégio Estadual Júlia Kubitschek, e outra no bairro de Campo Grande, periferia da cidade do Rio de Janeiro, representado pelo Instituto de Educação Sarah Kubitschek.62 O primeiro Instituto, como narra o projeto, receberia suportes didáticos, biblioteca, up grade em seus computadores e informatização dos processos de administração escolar e pedagógica em parceria com o PRODERJ (Programa de Desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro). Já o segundo receberia os mesmos subsídios, porém nele seria criada uma biblioteca de referência estadual e a implantados laboratórios experimentais para química, física e biologia com recursos oriundos do BIRD (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Na fase seguinte, o projeto seria estendido gradativamente a outros institutos de Educação, a partir de 1998, de acordo com a demanda local e a capacitação do corpo docente. Seriam incluídos, a priori, o Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho63, em Niterói (região metropolitana do estado); Instituto de Educação Rangel Pestana, na cidade de Nova Iguaçu (baixada fluminense); IE Professor Aldo Muylaert, na cidade de Campos dos Goytacazes (região norte do estado); Instituto de Educação de Nova Friburgo e Instituto de Educação de Teresópolis (ambos na região serrana do estado); e Instituto de Educação de Itaperuna (no extremo-norte do estado). Analisando o relato e a idéia do formulador, elucidada no projeto da SEE, e em suas narrativas, podemos identificar que a sua visão, com respeito à formação do professor para a educação infantil e séries iniciais se deu na evidência de elevar a formação dos profissionais num “nível pós-médio”, ou seja, uma formação empenhada em formar tecnólogos em educação, em instituições especializadas para este fim, amadurecidas a partir do Decreto 2.406/97, que busca articular a educação continuada aos setores 62 No período em que esse capítulo era preparado, exatamente no dia 11 de julho de 2003, participamos de um evento, no auditório da SEE, promovido pela Coordenação de Ensino Normal daquela Secretaria, intitulado “Jornadas Pedagógicas do Ensino Normal”, onde estiveram presentes à mesa, além de outros debatedores o professor Waldeck Carneiro da Silva (UFF) e a professora Edil Vasconcellos de Paiva (UERJ). Estiveram também presentes além de representantes da SEE e do governo do estado, cerca de 150 professores das diversas Escolas Normais do estado. Chamou-nos especial atenção o novo movimento que está sendo realizado por essas escolas pela revitalização da Escola Normal. Fato relevante foi que muitos deles manifestaram sua posição contrária à extinção do curso normal de nível médio no estado e no país. O que nos chamou mais a atenção foi o fato de três professores (uma professora do Instituto de Educação Sarah Kubitschek, outra do CE Júlia Kubitschek e outra do Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho, na cidade de Niterói) todos atores em um processo de criação de ISE da SEE que não vingou, terem sido as principais defensoras das falas empreendidas. Suas falas, bastante ressentidas, expressavam, em diversos momentos (inclusive demonstrados de forma bastante clara), como se já não bastasse o fato de terem sido esquecidas na corrida pela transformação em ISE, a tristeza pela possibilidade de extinção do curso normal de nível médio com o fim da chamada “década da educação”, instituída pela LDB 9.394/96. E agora, o que fazer? 63 O Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho, localizado na cidade de Niterói, zona metropolitana do estado do Rio de Janeiro, foi a primeira Escola Normal do Brasil, datada de 1835. Sobre o assunto, ver dissertação de Heloísa de Oliveira Santos Villela, intitulada A Primeira Escola Normal do Brasil: uma contribuição à história da formação de professores, apresentada ao Programa de Mestrado em Educação da Universidade Federal Fluminense, ou ainda TANURI, Leonor M. História da Formação de Professores. Texto original publicado na Revista Brasileira de Educação, nº 14 – mai-ago/2000. produtivos da economia, ou seja, uma educação rápida e direcionada ao mercado de trabalho. Com isso, concluímos que pelo pensamento de Chrispino, evidenciado no projeto, entendemos que superiorizar64 o professor não significaria, entretanto conferir-lhe, ao menos num curto prazo, status superior, no sentido pleno, mas dar-lhe uma formação além da formação em nível médio e inferior à formação plena, ou seja, uma espécie de licenciatura curta, supostamente conferindo a esse profissional da educação de novo tipo saberes um pouco mais consistentes, numa visão de educação continuada. Esse pensamento pode ser claramente percebido no projeto por ele redigido (p.4 do projeto), quando ao referir-se ao Instituto, trata-o pela expressão “de Educação Superior”, não lhe conferindo autonomia para uma formação plena, pois se assim quisesse, começaria por utilizar, no corpo do texto, a expressão “Instituto de Ensino Superior”. Nesse caso, quem seria superior: a educação ou a instituição? Que tipo de educação seria essa? E o ensino, seria também superior? A terminologia “superior”, neste caso, leva-nos a refletir que o alcance necessário, tanto do Instituto quanto da educação não atingiria os padrões plenos que uma formação superior plena exige, em que o conteúdo, atrelado a um tempo maior de formação viesse tornar possível ao professor um amadurecimento na sua postura e a fusão deste conteúdo com suas práticas e as outras formas de educação existentes (formação cultural, por exemplo). Por isso, ao nosso ver, seria improvável formar esse professor em menos de quatro anos, o que inviabilizaria a realização do projeto de formação superior na SEE. Embora possa parecer que os ISE fossem intermediários entre a formação em nível médio e a formação graduada, eles constituiriam uma modalidade própria: uma formação em nível superior. Quando o autor do projeto redigiu-o com a expressão “Instituto de Educação Superior”, não o fez por acaso; fê-lo para conferir à SEE o direito de mantê-lo sob sua gestão. Se a expressão “Instituto Superior de Educação” fosse mantida, retiraria da SEE o direito de geri-lo, pois a uma Secretaria de Educação Estadual é conferido o dever de gerir sistemas educacionais compatíveis com sua área de ação (nesse caso, o sistema educacional concernente ao ensino médio, que é prioridade dos estados). 64 Utilizamo-nos desta categoria para marcar a diferença entre formação superior do professor, diferenciandoa, portanto, da formação universitária do professor. Esta categoria torna possível a formação do professor em nível superior na SEE, do ponto de vista do projeto. Por ele, a formação se daria “nível pós-médio”, no sentido de além de ou superior a, tendo como referência básica o ensino médio. Pode também significar a formação do professor, não necessariamente ligada a uma universidade ou a uma instituição de nível superior em sua concepção plena de formação, que consideramos de quatro anos, embora a Resolução 02/2002 venha prevê-la em 2.800 horas , com no mínimo três anos de duração. Compreendemos que a educação pode ser superior e não estar fadada a outro nível de ensino, como entendemos que seja o CNS. Como destaca Kuenzer (1998, p.115), na visão implantada para os ISE, “...qualquer profissional que tenha ensino superior, ou até mesmo médio, pode ser professor, desde que faça, nos institutos, a complementação pedagógica ou os estudos adicionais, descaracterizando-se, assim, as licenciaturas.” Mas se o instituto (a instituição, o locus de formação) quer ser superior do ponto de vista pleno, avançando em conhecimentos que incluem pesquisa, produção de conhecimentos através da ciência e autonomia de pensamento, pressupõe-se uma atividade a ser gerida por uma entidade mantenedora ou mesmo uma universidade, com fins especificamente direcionados a esse nível de ensino. Nesse caso, a FAETEC saiu na frente por constituir-se como Fundação, mesmo que não criada propriamente para este fim, e sim para gerir escolas de nível técnico. Mesmo que o projeto ressignificado pela SEE, formulado pelo professor Álvaro Chrispino, ao nosso ver, não tenha atendido à necessidade de uma formação plena para os professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental da Rede Pública Estadual, por não atender a várias características, dentre elas o atrelamento à universidade e o tempo de formação; e, também, mesmo que por convicções ideológicas discordemos de alguns pontos encontrados no texto original, não podemos deixar de mencionar a aproximação do projeto de Chrispino com a universidade, o que levaria o mesmo, com todas as limitações nele encontradas, a uma condição mais ampla de elevação do status desse professor. No projeto da SEE conseguimos ao menos enxergar, senão no momento, mas talvez com vistas a um futuro não muito distante, um possível entrosamento real entre ISE/CNS e universidade, que tornaria essa instituição e o CNS relevantes do ponto de vista acadêmico, por situarem-se também em uma área do conhecimento ainda pouco explorada, que é a educação infantil. Como projeto, a intenção elaborada por Chrispino foi a mais coerente e próxima de uma realidade amadurecida pelo diálogo e trabalhada com calma e coerência. Cremos que esse projeto, mesmo com as ressalvas que apresentamos, representaria, caso não fosse abandonado pelo governo, um grande avanço para a formação de professores no estado por partir de pontos de vista socializadores. No plano infra-estrutural e administrativo, o fato de se apresentar o curso como pós-médio estaria ligado à permanência do seu vínculo administrativo com a Secretaria de Estado de Educação, pois, como pós-médio, não se configuraria assim um curso de formação plena, o que fugiria à realidade e aos propósitos da SEE, pois caso ele fosse realmente transformado em curso de nível superior, com duração plena, não poderia permanecer a ela vinculado, principalmente por não ter uma Fundação que lhe desse suporte para esse vínculo. Afinal, como vimos anteriormente, a FAEP (transformada em FAETEC) não mais estava subordinada à SEE, e sim à SECT. As Secretarias Estaduais são órgãos administrativos de Estado e que compõem sua organização a fim de responsabilizar-se por determinada área da gestão. As Fundações são órgãos de apoio a entidades, sejam elas públicas ou privadas. Essa transposição dos Institutos para uma entidade que os apoiasse se daria mais tarde, segundo o próprio professor Álvaro Chrispino, coordenador do projeto, com a finalidade de manter os futuros ISE ligados à SEE; porém, não sabemos de que maneira. Talvez até mesmo constituindo uma outra Fundação, ou quem sabe vinculando-os à universidade, o que, do nosso ponto de vista seria o ideal. O projeto, em sua extensão, articulado à fala do seu principal mentor, apenas aponta essa possibilidade. Embora nos pareça mais fácil compreender a subordinação dos ISE à SEE que à FAETEC, deparamos repentinamente com outro questionamento, fundamental: por que uma Secretaria de Educação estaria interessada em superiorizar a formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, quando não conseguia resolver os seus problemas mais prementes? O que levou duas Secretarias a disputarem ferrenhamente um projeto tão audacioso? Kuenzer talvez possa nos ajudar a compreender este fato, quando salienta que “(...) as Secretarias Estaduais de Educação, com o olho posto nos recursos do Banco Mundial e do Banco Interamericano (Bird e BID) para finalmente ter uma fonte específica para o financiamento do ensino médio, já estão fazendo seus planos e propostas de reforma extinguindo os cursos profissionalizantes de nível médio, inclusive de Magistério, para criar os institutos pósmédios destinados à formação profissional (...)” (Kuenzer, 1998, p.116) Talvez o governo estivesse com os olhos atentos para utilizar os recursos captados por meio de um provável financiamento por esses organismos internacionais, para utilizálos em outras áreas, como por exemplo, alavancar o ensino profissional no estado para dar continuidade ao seu projeto desenvolvimentista. Quando, porém, a formação dos professores em nível superior é retirada da universidade e conferida a outros segmentos (e aí teríamos as Secretarias como gestoras desse processo), a essa educação é conferido um valor menor. Isso porque, numa concepção elitista, segundo salienta Kuenzer (1998), o legislador, ao possibilitar esse tipo de formação fora de seu locus privilegiado, que é a universidade, torna a educação uma ciência menor, negando-lhe o estatuto epistemológico de ciência e descaracterizando o profissional da educação, como se este não fosse responsável por uma área do conhecimento, evidenciando o ensino superior apenas como formador de cientistas e pesquisadores, ou seja, uma elite pensante. Assim fazendo, o professor conseqüentemente é afastado de uma qualificação científica e de apropriação de metodologias que por si se adequam à produção de novos conhecimentos em educação. A formação de professores em Institutos, por sua vez, desresponsabiliza as unidades federadas de formar esses educadores, automaticamente desresponsabilizando também o governo com relação à sua manutenção. Se o governo se exime de mantê-las, temos aí substituído o princípio da universalidade pelo da eqüidade. Sendo assim, como a educação superior não seria um bem a ser expandido a todos, para que investir em uma formação superior de professores se estes, segundo Kuenzer (1998, p.115), irão trabalhar “...com classes subalternas?” Bastaria assim extinguir os cursos profissionalizantes de nível médio, incluindo-se nesses o Curso Normal de nível médio, e criar cursos pós-médios para se resolver o problema. E isso já está em andamento, em larga escala. Alguns estados, como o Paraná e São Paulo, extinguiram seus cursos de nível médio para criar outros programas de formação de professores, incluindo o magistério. O decréscimo de escolas de ensino Normal, no Estado do Rio de Janeiro, demonstra que isso já é uma realidade. Segundo dados da SEE, entre 1996 e 1997, portanto em pleno berço dos dois projetos de ISE no estado do Rio, havia cerca de 200 Escolas Normais em pleno funcionamento na Rede Pública estadual. A partir do ano de 1997, a SEE começou a fechar essas escolas. Este total, em 1999, declinou para 138 escolas. Em maio de 2003, o número de Escolas Normais, na SEE, atingiu 110 e há previsão de continuidade dessa política de extinção65. Nessa lógica, o pensamento da SEE e da FAETEC parece convergir. Apoiando-nos em Kuenzer (1998), percebemos que a LDB 9.394/96, quando trata da criação dos 65 Dados coletados na Coordenadoria de Ensino Normal da Secretaria Estadual de Educação entre setembro de 2002 e maio de 2003. ISE/CNS, parece convergir à proposta do Decreto 2.208/97, que criou também um sistema separado para a formação profissional, este separado do sistema regular de ensino. Se temos um professor que não necessita alcançar um nível superior para trabalhar com classes consideradas subalternas, logo, esse professor necessitará de um suporte normativo que lhe assegure uma complementação pedagógica para atender a essa demanda do mercado de trabalho, que seriam os cursos pós-médios, criados com este fim. Nesse caso, não haveria necessidade de formar esse profissional em universidade, pois a formação científica, que possibilitaria a este professor uma formação densa e reflexiva, ficaria em segundo plano, levando-o a ter apenas um complemento de conteúdos para continuar atuando no segmento onde leciona. Como destaca Kuenzer “A formação profissional, como é concebida pelo Decreto 2.208/97, que passará a se dar em outro sistema que não o de educação, regido por outra lei que não a LDB, destina-se à educação profissional nos diferentes níveis, do básico ao superior, podendo ocorrer independentemente de escolaridade, para aqueles que em face de sua “competência” não demonstrem “aptidão” para o ensino superior, após rigoroso processo de “seleção” que dar-se-á através do ensino básico, a ser confirmado pelos exames vestibulares. Ou seja, o sistema de educação profissional destinase aos excluídos do sistema acadêmico, constituindo-se em alternativa compensatória e contencionista.” (Kuenzer, 1998, p.116) Assim, a criação dos ISE, que causou tanta euforia para alguns, deveria ser olhada com cautela, pois eles se constituem como perigoso mecanismo de seleção social. Por esse ângulo o tão propagandeado “ensino superior” nos ISE, como pudemos perceber, não passaria de uma forma pela qual as Secretarias Estaduais (SEE e FAETEC), utilizariam o critério de excelência através de recursos dos organismos financiadores internacionais, para separar as escolas da Rede, transformando uma parte delas em escolas pós-médias, a fim de possibilitar uma educação subalternizada à população, muito particularmente aos professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental, que seduzidos por promessas de um acesso mais fácil ao nível superior em tempo menor, não viessem a obter mais do que uma simples complementaridade de seus conhecimentos básicos. Os recursos, por sua vez, são muito importantes ao desenvolvimento e à estrutura de qualquer governo, mas não podem e nem devem ser colocados como simples prioridade para o atendimento do interesse público. A resolução de problemas jurássicos talvez fosse a melhor estratégia para se elevar o nível de ensino do estado, e não criar outros problemas a partir de projetos que não atendam à coletividade. Pensando dessa maneira e olhando o incentivo dos organismos internacionais em valorizar o ensino médio, investindo grandes somas nele, por que então não revitalizar a escola normal antes de assumir um outro projeto? A LDB, ao estabelecer no artigo 63 que o Curso Normal Superior é uma das modalidades de formação dos ISE, criou por vontade própria uma nova instância formadora de profissionais da educação ligados diretamente à educação infantil e às séries iniciais do ensino fundamental. Esse não foi um fato impensado, como alguns possam vir a pensar, mas, ao nosso ver, uma ruptura de caráter elitista na educação, a fim de possibilitar uma retenção no acesso ao ensino superior, mantendo os padrões de diferença entre as elites e as classes menos favorecidas. Tanto a questão da tecnificação da formação do professor, que verificamos no projeto estabelecido pela FAETEC, formalizada pelo “Projeto Nilda Teves”, como a busca para formar o professor em nível pós-médio, possibilitando-lhe alguns conhecimentos a mais, objetivada pelo “projeto Álvaro Chrispino”, podem ser originalmente compreendidas através da história da constituição do sistema educacional brasileiro. Através de estudos desenvolvidos por Cunha (1972), na área de política educacional, percebemos que nunca houve interesse real das elites brasileiras para que as camadas menos favorecidas ascendessem intelectualmente, pois assim sendo representariam uma ameaça à “estabilidade do sistema”. O autor demonstra em seus estudos o desvio do foco da lei 4.024/61, que teve dois objetivos: a função manifesta de produzir técnicos industriais e a função não manifesta de preparar candidatos para os cursos superiores. Já a lei 5.692/71, segundo Cunha (1972), instituiu, como característica básica, um caráter de terminalidade, através do ensino profissional, objetivando fazer uma drenagem para que a pressão em busca dos cursos superiores fosse reduzida, retirando dela as oportunidades de ascensão do pequeno comércio, da pequena indústria, do artesanato e das profissões liberais, a fim de manter as hierarquias ocupacionais burocráticas, solidificando no poder as oligarquias, pré-existentes ao Estado Novo de Vargas, e que com ele firmaramse cada vez mais no poder. Dessa forma, o autor conclui que “A política de profissionalização do ensino médio expressa pela Lei 5.692/71 tem um caráter ideológico, na medida em que seus alvos manifestos não coincidem com os não manifestos. Aqueles são a eliminação de uma suposta intensa escassez de profissionais de nível médio em todos os setores da economia e o combate a uma fonte de frustração da maioria dos concluintes do ensino médio, que se vêem obrigados a tentar o ingresso em curso de nível superior para obter qualificação profissional. Os alvos nãomanifestos seriam o de desviar para o mercado de trabalho concluintes do ensino médio que, em contingentes cada vez maiores, buscam a obtenção de graduação de nível superior como um requisito cada vez mais indispensável à ascensão social no interior das hierarquias ocupacionais burocráticas.” (Cunha, 1977, p. 156) Compreendemos, com isto, que tanto o projeto coordenado pela FAETEC, através da professora Nilda Teves, como o projeto da SEE, elaborado pelo professor Álvaro Chrispino, não foram mais do que formas paliativas de se instituir canais de atualização do professorado da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental da Rede Pública estadual, utilizando-se ambos da superiorização como jogo de palavras, a fim de conformar os ingressantes do CNS, mantendo-os no mesmo nível de formação subalternizada, uma vez que o termo “superior”, estrategicamente utilizado, não seria mais que uma formação técnica e em “nível pós-médio”. A compreensão reducionista dos autores dos projetos, de que, para os profissionais da educação bastam apenas alguns estudos adicionais, aliada à compreensão equivocada da formação de professores como um curso profissionalizante, dão aos ISE/CNS a dimensão de serem nada mais que uma instituição criada para atenuar a insatisfação desses professores não somente pela busca da elevação de seu nível sócio-econômico, mas também intelectual, o que de fato não aconteceu pelo caráter minimalista dos referidos cursos. Tal fato alerta-nos sobre a forma desinteressada e menor como os governantes ainda tratam a formação do professor da educação infantil e do ensino fundamental em nosso país, como se a este profissional não fosse necessária uma formação reflexiva e científica em estudos mais aprofundados, sobretudo nas universidades. 2.11.1-Compreendendo o modelo de ISE/CNS formulado pela SEE Segundo o projeto da SEE, o Curso Normal Superior dos futuros ISE haveria de habilitar os professores em quatro semestres, com a carga horária total de 2.400 horas/aula. Ofereceria inicialmente, em cada unidade escolar, 80 vagas. Os professores seriam os mesmos pertencentes aos quadros da SEE, com titulação em nível de especialização, mestrado e doutorado, preferencialmente ou com notório saber na área de sua especialidade. Chamou-nos especial atenção no projeto o fato de que os concluintes receberiam a titulação de “Curso Normal Superior”, o que demonstra que o referido curso inaugura uma nova nomenclatura. A coordenação do curso seria feita pela própria SEE através da sua Subsecretaria Adjunta de Ensino. Percebemos, embora de maneira preliminar, que os professores não viriam de seleção efetuada para o nível superior e sim eram pertencentes ao quadro da Secretaria, ou seja, provenientes de concurso para o nível médio, sendo aproveitados para o fim proposto, pois a SEE não dispunha em seus quadros (e nem poderia) de professores concursados em nível superior. Já a consultoria técnica seria fomentada pela Faculdade de Educação da UERJ e sofreria uma avaliação externa por uma Comissão de Expertises (especialistas em educação), o que destoava das intenções pensadas pela SEE nos anos 90, que era ter os institutos vinculados à universidade, sendo esse um elemento articulador, orientador e formador do processo. À FAPERJ (Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio, de Janeiro) caberia apoiar o projeto com bolsas de apoio técnico para os professores, com recursos repassados pela própria SEE. O custo estimado seria de R$ 785.660,00 (setecentos e oitenta e cinco milhões e seiscentos e sessenta mil reais), destinados à remuneração de dois diretores, 24 professores, seis coordenadores, quatro consultores e cinco avaliadores. O projeto previa, além do Curso Normal Superior nos termos acima descritos, a criação, nos próprios Institutos, de um núcleo de educação continuada também com estratégias de formação permanente centradas na preparação e ação formativa de facilitadores. Haveria também, como parte dessa formação, a previsão de atividades semipresenciais. Isso caracteriza que por esse projeto a SEE tinha pressa na “elevação de nível”66 dos seus professores, pois considerava que a formação dos professores estava ficando defasada em relação aos fundamentos da modernidade, e que esta estava a requerer dos professores novos referenciais baseados em uma epistemologia dos saberes 66 A título de esclarecimento, trabalhamos durante todo o texto a expressão “pós-médio” como se constituindo um nível. Não há, entretanto, na legislação vigente, nada que constitua o pós-médio como um nível de ensino, permanecendo, portanto, na educação os níveis fundamental, médio e superior. O “nível pósmédio” se constitui num elemento entre o vir a ser e o já estabelecido. Nesse caso, que tipo de diploma seria concedido a um professor formado em “nível” pós-médio? Em que tipo de saber seria formado? pedagógicos. Segundo o projeto, a transmissão do conhecimento pelo professor requer uma contribuição das novas tecnologias. Como podemos perceber, o projeto da SEE era extenso e seria desenvolvido em médio prazo. O projeto da SEE tinha a intenção de fazer com que os professores mais experientes e com maior titulação fossem elementos formadores de outros professores. É interessante frisar a similaridade desse aspecto com o projeto do CTQE para a unidade de formação e atualização de professores, que, embora tivesse uma relação com a UERJ, os professores formadores seriam escolhidos dentro do IERJ. Assim, a SEE implementou uma política de discussão com as massas regionais de professores de todo o estado, para que estes conhecessem o projeto. Um desses encontros foi realizado na cidade de Nova Friburgo, no ano de 1997. Era intenção da SEE de que, a partir do plano piloto desenvolvido nas cinco instituições iniciais e em outras regiões como Campos dos Goytacazes, Resende, Angra dos Reis, Niterói e Três Rios (que possuíam institutos de educação de nível médio), em tempo oportuno todos os institutos de educação do estado fossem transformados em instituições de formação de professores em “nível” pós-médio, tendo, segundo ele, corpo docente qualificado com o projeto de educação continuada que estava contido nos planos da SEE. Pelo projeto, não estaria descartada a possibilidade de esses institutos futuramente darem uma formação plena, em nível superior, aos seus alunos. Chrispino aponta que a transformação dos institutos para a formação no “nível” pós-médio era apenas um estágio, para que não houvesse uma ruptura brusca. Mais tarde, entretanto, eles seriam transformados em instituições de nível superior. Quando a FAETEC publicou no Diário Oficial do estado o Parecer 258/98, credenciando o Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro e autorizando o funcionamento do CNS, a SEE praticamente saiu de cena, e a sua política em busca da formação “superior” do professor da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental ficou descontinuada, encerrando-se a sua trajetória na constituição de um projeto de educação superior. Com isso, praticamente o Parecer 430/97, que aprovara o projeto da Subsecretaria Adjunta de Ensino da SEE para a criação do Instituto Superior de Educação no Estado do Rio de Janeiro caiu numa espécie de “buraco negro”. Embora tenha sido publicado no Diário Oficial do Estado de 05/12/1997, não se ouviu falar mais no referido Parecer, e nem mesmo uma revogação em Diário Oficial foi feita, demonstrando o grau de descontinuidade administrativa das ações do governo estadual. Sobre isso, nosso interlocutor afirma: “(...) nós passamos então um bom tempo, Educação e Ciência e Tecnologia, num embate, na tentativa de fazer valer a força institucional e manter o Instituto de Educação. A Educação foi derrotada. Não que não houvesse projeto, mas foi uma decisão política de fazer com que o Instituto de Educação do Rio de Janeiro fosse transferido para a Ciência e Tecnologia, para a FAETEC, melhor dizendo.” A transferência do IERJ da SEE para a FAETEC parece ter sepultado definitivamente o seu projeto quanto aos ISE e o CNS. Um novo governo tomou posse e o sonho da SEE em trazer para si a política de criação dos ISE no estado foi sepultado definitivamente. Talvez não tenha se tratado de uma derrota o fato do projeto da SEE não se consolidar dentro dos interesses do governo, mas apenas uma mudança de rumo, pois o projeto “vencedor” continuaria no afã de aligeirar a formação de professores, empreendendo-lhe um viés técnico e desenvolvimentista. É interessante percebermos como os embates políticos pelo andamento de um projeto colocaram uma instituição em cheque. O IERJ fora disputado não simplesmente por ser emblemático, mas por constituir-se talvez na única instituição onde o projeto das duas Secretarias encontraria respaldo e poderia ser executado com sucesso, dadas as suas características infra-estruturais, enfatizando-se principalmente o seu corpo docente e o seu espaço físico disponível. Numa primeira aproximação para uma compreensão preliminar, ao que parece, duas preocupações são encaradas pelo governo Marcello Alencar, nesse momento, e nas duas Secretarias. A primeira, na SECT e alavancada pela FAETEC, seria ampliar o ensino tecnológico, tendo como pano de fundo o ensino profissionalizante, por todo o Estado, com a visão de implantar pólos tecnológicos numa visão de ensino desenvolvimentista. No afã de ampliar seu projeto, a FAETEC criou as “ilhas de excelência” para dar suporte ao seu projeto, que seria também articulado com a iniciativa privada, por conta da entrada do mercado no cenário. Essa relação se deve ao fato de a FAETEC entender que a formação de professores também é uma formação técnica, e por isso deveria estar ligada à SECT. A visão de “ilha” já pressupõe uma separação, que confere autonomia na disputa, porém não separada da vinculação administrativa. Para ampliar sua Rede, a FAETEC “interessa-se pela formação de professores” por vê-la como “profissionalizante”67, como possibilidade de estender-se aos confins do estado, e muito mais, nesse momento, pela condição de tornar o ISERJ (como instituição) pertencente aos seus quadros, dando suporte a essa condição, porque o Instituto figurava como instituição emblemática. No entanto, a compreensão de profissional que a FAETEC tinha choca-se com a necessidade de formação de um professor crítico e reflexivo, forjado por saberes amplos, pois ela se restringia a formar um técnico de nível médio, a quem são oferecidos conhecimentos compatíveis com seu grau de formação. Isso é facilmente compreendido se atentarmos para a duração do CNS, que seria de dois anos. Entretanto, um dos motivos que não revelamos anteriormente mas que pareceu extremamente vigoroso na transferência do IERJ para a FAETEC, foi, segundo a formuladora do projeto, por um pedido da primeira dama do governo, ex-aluna do Instituto, e que se sentia constrangida pela situação deplorável em que este se encontrava. Esse argumento serviu para reforçar a compreensão da professora Nilda Teves de que o curso de formação de professores também é ensino técnico e por isso o Instituto deveria estar ligado ao quadro da FAETEC, e não da SEE. Então, por que não levar também os outros institutos? Vemos que a questão está na excelência, no que a instituição oferecia, pelo seu emblema, e no que ela poderia vir a oferecer no caso de um projeto de maior amplitude. Sendo assim há uma ligação entre os interesses das duas Secretarias pelo IERJ, visto que este se constituiria no ponto de partida para cada um dos projetos elaborados. No controle da situação, a FAETEC articularia a criação do primeiro ISE no estado do Rio de Janeiro. Adentrando na formação dos formadores, iniciaria o processo que abriria caminho, mais tarde, para a chamada “Rede FAETEC”, criando no estado os modelos de IST (Institutos Superiores Tecnológicos), com a intenção de transformar-se em Centro Universitário Tecnológico. 2.12- Algumas análises sobre o Projeto do CTQE e sobre os Projetos “Nilda Teves” e “Álvaro Chrispino” 67 Para efeito de nosso estudo, nos esforçamos para estabelecer uma diferença entre o professor reflexivo, com base nos estudos de Schön (1995) e o professor profissional, com base nos estudos de Shiroma (2003). Assim, em nossa compreensão, o professor reflexivo seria um profissional aberto a novos horizontes de conhecimento, crítico, democrático, perseguidor de soluções que possam melhorar a sociedade. O professor profissional, por sua vez seria aquele encara a profissão como meio de manter-se no mercado de trabalho. Por isso é meramente um reprodutor do conhecimento. Para ele os conteúdos são aplicados e não ressignificados, e não tem nenhuma possibilidade de articulação com sua prática, porque ele os recebe e transmite friamente. O projeto do CTQE parece ter sido o início da disputa entre FAETEC e SEE pela formulação das políticas de formação dos professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, em nível superior, no estado do Rio de Janeiro. Embora não se restringindo somente a isso, o projeto do CTQE buscou uma formação continuada dos professores, de reformulação curricular e pela defesa do uso das novas tecnologias na educação. Esses fatores foram defendidos tanto no projeto da FAETEC quanto no projeto da SEE. Nossa consideração quanto ao projeto do CTQE é de que ele foi um projeto preliminar na corrida pela formação de professores em nível superior no estado do Rio. Porém, embora tivesse enfatizado a formação em nível superior, previa outros aspectos, como a cultura, a pesquisa e a atualização dos professores. No entanto, o tipo de formação superior, ensejado pelo CTQE na unidade de formação e atualização de professores e os projetos de CNS ensejados pela FAETEC e SEE demonstram que as idéias não foram perdidas em sua totalidade, apenas direcionadas aos interesses ideológicos de cada uma das gestões administrativas das Secretarias envolvidas nos projetos naquele momento. Certamente essa transmissão de informações se deu, tanto para a FAETEC quanto para a SEE pelo fato de existirem, em ambas as secretarias, técnicos que participaram da formulação de ambos. No tocante às políticas de implementação dos ISE no estado, tanto o primeiro Projeto da FAETEC (“projeto Nilda Teves”) quanto o projeto da SEE (“projeto Álvaro Chrispino”) guardaram similaridades entre si, como o tempo de formação dos professores (dois anos), o locus escolhido para dar suporte ao início do projeto (ISERJ), os profissionais que ministrariam o curso (os professores do Instituto) e a ênfase numa formação fundamentada no uso das novas tecnologias. A visão de ambos os formuladores parece convergir também na direção de que superiorizar o professor é permitir-lhe apenas alguns conhecimentos complementares ao seu grau de formação, e não a necessária visão de rompimento entre a formação do ensino básico, onde o aluno é acompanhado e auxiliado a todo o instante pelo professor, para uma formação de nível superior que parte da uma busca de um conhecimento reflexivo e compartilhado pelo aluno, levando em conta sua experiência de vida. Porém a que ou a quem interessaria num mesmo governo a existência de dois projetos tão similares pertencentes a secretarias distintas, sendo disputados numa corrida para ver qual deles sobreviveria? Ambos os projetos da SEE encabeçados por Chrispino, e da FAETEC, por Teves, têm no fundo outra grande similaridade, que é o interesse pela formação de tecnólogos em educação, no sentido de que superiorizar o professor seria formá-lo numa visão de educação continuada, tendo característica principal o aligeiramento dessa formação para o mercado de trabalho. Aparentemente, muitos interesses políticos, estariam em jogo no governo, e talvez até interesses individuais movidos por algumas vaidades. Uma das questões em evidência é o prestígio pessoal. Talvez o fato de ter o nome gravado nas páginas da história (não importa de que forma) seja o interesse de alguns. E não importa se as políticas que serão implementadas desencadearão problemas irreversíveis na vida de pessoas humildes, ou na vida de gerações de pessoas que sentirão os reflexos dos atos impensados desses governos. Não importa: os governos passam e os governantes também, mas o Estado e a sociedade sempre pagam a conta. Além das vaidades em questão, percebemos o interesse do governo estadual em instaurar suas políticas no campo da educação, amplamente alinhadas ao modelo neoliberal desenhado na instância do governo federal. Com um ou outro projeto vitorioso, o elitismo prevaleceu no governo de Marcello Alencar, que fez da educação um mecanismo seletivo, dizendo a quem deveria ser possibilitado o melhor ensino e qual escola deveria receber os recursos necessários para priorizá-lo. O governo Marcello Alencar, através do projeto da FAETEC, além de querer recapear o populismo surgido no Estado Novo,conotando-lhe uma forma empresarial, procurou, de forma infeliz, redimensionar o sentido de excelência que teve a política dos CIEP, que objetivou trazer a escola para o povo. Fê-lo quando, ao transferir escolas da SEE para a FAETEC, ressignificando o sentido de excelência para uma promessa redentora do ensino público no estado via segregação de escolas, ao querer demonstrar que o que “era ruim” ficaria na SEE, e o que “era bom”, em termos de escolas, viria para a FAETEC. No entanto, tais atitudes não passaram de estratégias para manter no poder as elites, fazendo com que a grande massa encontrasse no ensino técnico resposta para quem não pode, por questões de baixo capital cultural, ascender a um nível mais elevado. E aos professores, esse nível mais elevado seriam os ISE, que através do CNS possibilitariam uma ascensão técnica de nível mais elevado, ou superior ao que possuíam, ou seja, uma frágil ascensão educacional. Apoiando-nos nos estudos de Evangelista e outros (2002) e de Kuenzer (1998), percebemos que, ao editar o Decreto 2.208 de 17/08/97, quis o governo federal separar de vez o ensino técnico do ensino médio, que passou a contar com três níveis: básico (que independe de escolaridade anterior), técnico (que pressupõe o nível médio) e tecnológico (cursos superiores de curta duração). E o que isto tem a ver com os projetos ora descritos? Sucintamente, os dois projetos foram gerados em momentos quase idênticos. A identidade que iriam assumir (ambos de nível pós-médio) prova que, além de outras, uma diferença marcante e relevante que teriam seria o fato de o projeto da FAETEC não prever assessoria das universidades públicas presentes no estado, enquanto o projeto da SEE buscaria essa interlocução. Mesmo assim, verificamos que o projeto desencadeado pela professora Nilda Teves (na FAETEC) acompanharia, em muitos pontos, o modelo ressignificado pelo professor Álvaro Chrispino (na SEE), pelas tendências profissionalizantes que tinham os dois projetos. Os dois projetos vislumbravam uma proximidade com as políticas do governo federal por estarem inseridos em um mesmo partido político: o PSDB. A visão do governo federal, por sua vez, era alinhar-se aos interesses dos organismos internacionais, que buscando conter o acesso ao ensino de nível superior pleno, reforçaria os investimentos no ensino profissionalizante de caráter pós-médio, para dar à população a impressão de uma mobilidade, objetivando manter as elites no poder, mantendo também assim um equilíbrio social. O projeto redesenhado por Chrispino foi o que mais se aproximou, como vimos, das políticas governamentais, por querer ampliar o desenho ideológico do projeto por todo o estado. Mesmo considerando equivocada a direção dada a ele, ponderamos o fato de ter havido nele um avanço significativo na direção de se alinhar com a universidade, considerando a sua chamada para participar do processo. Talvez isso tenha se constituído apenas num jogo de cena ou numa “cortina de fumaça”. Só o desenrolar do projeto, entretanto, revelaria. Outrossim, em que pese a formulação do projeto da FAETEC em seus anseios mais profundos, vislumbrada a excelentização do ensino através da escolha direcionada de algumas escolas, relevamos o fato de que a sua intenção, com respeito ao ISERJ, como modelo de ISE deu-se unicamente a ele, não parecendo objetivar em seu planejamento a constituição do mesmo modelo em mais de uma escola. Pela forma como o projeto foi elaborado e pelo enaltecimento dado àquela instituição, cremos que ela seria a única naquele molde, mesmo porque o projeto não se reportou a nenhuma outra instituição, fazendo referência única e exclusivamente ao ISERJ, segundo a professora Nilda Teves, por ser uma “instituição emblemática”. O IERJ, por sua vez, requintado em sua posição, teve seu lugar garantido no cenário institucional que inauguraria esse momento histórico de se ver transformado em instituto de nível superior - por ambos os projetos - certamente porque possuía, além de uma infra-estrutura mais adequada à implantação do curso, um emblema histórico forte. Não sabemos, entretanto, se o professor Anísio Teixeira gostaria de ver seu projeto interpretado de forma equivocada, o que comentaremos em seguida. No decorrer da pesquisa, percebemos o grande interesse da Secretaria de Educação em estabelecer as políticas do governo federal para a educação, que estavam em ebulição naquele momento, por ver-se como gestora natural dos processos. A preocupação com a formação de professores deu-se ao acompanhar as medidas empreendidas e que estavam em sintonia com a alta administração estadual. Todavia, criar cursos normais pós-médios, superiorizando os professores de uma forma menos acentuada (não-plena), colocando em prática, grosso modo, toda uma visão de educação calcada em conhecimentos suplementares, seria uma boa saída para desenvolver rapidamente uma política de trabalho com resultados satisfatórios? Além disso, os Institutos Superiores de Educação em sua forma ainda embrionária, caso continuassem nos quadros da Secretaria de Educação, realmente trariam mais força e credibilidade, conferindo-lhe realmente status e recursos mais polpudos? Ao que parece, tanto a FAETEC como a SEE, em um mesmo momento mas em planos diferentes, faziam planejamentos para “alçar vôos mais altos”, pois ambas pareciam ter os mesmos interesses. A formação em nível “superior” viria, nesse caso, quando muito, para ajudar a manter o prestígio de uma ou de outra Secretaria, ou de um ou de outro Secretário. Por outro lado o superior em questão era o ensino pós-médio. Este foi, na realidade utilizado como brecha para achar uma saída para os egressos do ensino médio, fazendo-os deslanchar no mercado de trabalho sem uma modificação que necessariamente transformasse em melhores as escolas formadoras, pois o investimento em prédios e infraestrutura seria o mínimo. Vemos, então, que apenas o nome seria trocado. De “Instituto” para “Instituto Superior”, e de “Curso Normal” para “Curso Normal Superior”. Os professores, que seriam os coadjuvantes nesse processo, talvez nem tivessem idéia da dimensão da problemática. Muitos professores, como pudemos evidenciar em visitas que fizemos aos ISE no interior do estado, e que se encontram como alunos dessas instituições, pensam estar mesmo realizando um curso superior no sentido pleno, mas estão sendo ludibriados pelas políticas que os vêm tornando réus de seu próprio aligeiramento na formação, que não os ensina a refletir sobre o que é ensinado. No entanto, esse pensamento remete-nos ao ponto nevrálgico da discussão: a aparente desculpa, para os governantes, de que a sociedade em que vivemos é capitalista e de que não há vagas para todos. Sendo assim (pensamos), as divisões de classe tendem a existir e, para que a sociedade se mantenha no “padrão natural de divisão”, faz-se necessário criar mecanismos para que isso ocorra. Os projetos expostos em nada tenderiam a modificar a formação do professor do ponto de vista da qualidade, porque não atacariam o problema em sua raiz. Além de não o levarem necessariamente a uma mobilidade social, não lhe concederiam um status de ser aprendente, crítico, consciente, reflexivo, mantendo-o no mesmo patamar dos cursos de formação em nível médio. Para que isso ocorra, o corpo docente precisa ser qualificado e municiado com conhecimento indispensável a transpor barreiras. Sendo assim, não basta mudar somente o locus de formação ou o nome do curso, mas o modus como esse professor é formado e como os governantes o enxergam. Também há necessidade de que o sujeito formador também esteja preparado para essa mudança. Outra curiosidade é verificar que a própria SEE estabeleceu políticas para não perder suas escolas, ou o direito tradicional à formação de professores. Na, verdade vemos que o estado do Rio de Janeiro passou, em um determinado momento, a contar com duas Secretarias distintas de Educação, ficando as instâncias formadoras, os professores e os alunos, fadados a uma grande confusão, fruto de políticas de governo sem compromisso público. A análise que fazemos desse primeiro momento é de que a preocupação do governo não estava situada na qualidade ou em como seria possível pôr em prática essas políticas com a consistência necessária, mas importava atender às exigências do mercado de trabalho, atendendo também suas demandas de qualificação mínima, preocupando-se sobretudo com o por que (no caso do que a lei estabeleceria), e não o para quê, segundo a necessidade da construção de conhecimentos sólidos, com qualidade na formação de seu quadro de docentes. Sendo assim, o tempo de formação estaria suplantando o locus, alcançando prioridade máxima, dentro de uma política de limites temporais, pois cada governo dispõe de quatro anos para estabelecer e realizar suas metas. Por que, ao invés de se estabelecerem políticas de formação de professores para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental em nível pós-médio, além de tudo isolada e sem tradição e experiência, não se alavancar uma política madura, de comum acordo com as universidades estaduais (UERJ e UENF), instituições com relevante experiência no campo, para se obter uma formação em nível pleno, qualificada, já que estas desenvolvem inúmeros programas nessa área? Certamente, assim estariam os governantes, ao invés de desperdiçarem recursos com estruturas duvidosas, investindo realmente em melhorias para a educação no estado em todos os aspectos. Além disso, estariam os governantes ampliando reais ações de Estado, permanentes e democráticas, e não simplesmente ações de governo, passageiras e de interesse limitado. Entendemos que, por visões político-ideológicas, tal perspectiva não se consumou. Talvez esta visão estratégica encontre explicações em Evangelista et alli, quando citando Kuenzer, afirma que “... o pós-médio configura-se como uma estratégia de contenção da demanda ao superior, adequando-se à lógica da racionalidade que preside a reforma: só financiar com recursos públicos o que oferecer retorno.” (Evangelista et alli, 2002, p.92) E mais do que isto: é uma solução rápida para alcançar interesses e consolidar compromissos firmados. Uma crítica que fazemos se remete ao Conselho Estadual de Educação. Como instituição reguladora das atividades da educação no estado, percebemos que o CEE, se não foi omisso em relação à aprovação dos Pareceres que referendaram os dois projetos de ISE/CNS, foi ao menos descumpridor de seu real dever, sob o ponto de vista de comprometerem sua credibilidade, porque cedeu à pressão do grupo que articulou os projetos que lhes foram encaminhados, aceitando-os na forma com que foram apresentados, inclusive transformando ambos em pareceres (430/97 e 238/98), sem questioná-los. Ao analisar os dois Pareceres, verificamos que os integrantes das Comissões do CEE que os analisaram (11 meses um antes do outro) tratavam de pessoas diferentes. Porém, o presidente em exercício do CEE, que os assinou, era a mesma pessoa. Desta forma, interrogamos: como o CEE não percebeu que havia dois pareceres de igual teor tramitando, e também o fato de os dois terem sido aprovados e lançados em Diário Oficial, tornando-se de domínio público? Foi o Conselho forçado a aprová-los? Sofreu influência política? Concluímos que houve intensa participação de altos escalões do governo para que um deles fosse aprovado e o outro sucumbisse. Curioso também é perceber que os formuladores dos projetos foram, ambos, em seus momentos junto às Secretarias, membros do referido Conselho, o que leva a supor que os interesses seriam assim melhor viabilizados. Também demonstra que o fato de um formulador de determinado projeto estar ligado ao Conselho, dependendo das relações políticas que mantém, lhe garante a aprovação do projeto, mas não lhe garante a aprovação do governo. Nesse caso, percebemos que, dentro do governo Marcello Alencar, havia lutas de poder travadas dentro das Secretarias. Por outro lado, como poderia um Conselho (órgão normatizador de políticas públicas) ser forçado a aprovar políticas descontinuadas, prejudiciais ao sistema e à sociedade como um todo? Os educadores que o compunham, o que pensavam nesse momento? Percebemos que no CEE, nesse momento, parecia não haver continuidade com respeito a políticas de formação de professores para o estado. Uma vez regulamentadas as políticas no campo da educação superior para os ISE, o egrégio Conselho, ao nosso ver, deveria aguardar posições mais firmes do governo federal em forma de legislação ordinária, mesmo tendo a liberdade de não proceder de tal forma, para adotar um procedimento menos duvidoso. Em que pese a decisão do CEE, percebemos que houve pressão política para que este aprovasse os projetos, pois ambos os formuladores foram seus conselheiros. Nesse aspecto, uma instituição pública deixa de ser relevante, do ponto de vista social, quando deixa de atender aos interesses da sociedade para a qual ela existe, por quem lhe foi concedida autoridade. As políticas, por sua vez, deixam de ser públicas quando deixam de atender aos interesses públicos para atenderem a interesses privados, sejam eles individuais ou corporativos. A luta para a aprovação de um dos projetos nos remete a pensar que existiam interesses, além dos públicos, dentro dos gabinetes envolvidos nesse emaranhado de questões. De muitos desses, no entanto, jamais tomaremos conhecimento. Porém, como os embates que se firmaram ocorreram entre forças do governo e não em conjunto com a sociedade, entendemos então que não foram ou jamais se tornariam públicos. Mesmo discordando dos caminhos trilhados pelo governo de Marcello Alencar para as políticas de formação de professores para a educação infantil e as séries iniciais do ensino fundamental, considerando-os grandemente equivocados, enfatizamos o fato de os referidos projetos terem sido elaborados por pessoas que pensam educação e com experiência significativa em suas áreas de atuação. Dentro do teor principal deste trabalho, continuamos a afirmar, de forma crítica, que o empobrecimento da visão de um educador formado em nível superior, dá-se, em sua grande parte, por uma visão estanque e sua formação alijada e aligeirada. Nisso, temos certeza de que a universidade, com sua larga experiência, ao ser chamada à discussão, e ao serem criadas para ela condições efetivas de trabalho, pode juntar forças significativas na construção de um profissional mais consciente e de um educador mais participativo na sociedade em que está inserido. De forma isolada, porém, e com interesses partidários, teremos uma educação limitada, formando profissionais mecânicos e sem um amadurecimento devido para enfrentar os desafios de um mundo em que o pensar vai além do agir e se forja em ações emancipatórias. Infelizmente a luta de forças que emergiu da formulação de dois projetos de formação de professores nos ISE/CNS, entre a SECT/FAETEC e SEE, só fez ampliar ainda mais a divisão existente no campo educacional do estado, fazendo com que as duas Secretarias passassem a disputar o ensino de forma isolada. Capítulo 3 O Projeto de CNS do Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro - ISERJ 3.1 - Apresentação Como vimos no capítulo anterior, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro, no ano de 1997, no governo de Marcello Alencar, foi transferido da gestão da SEE para a SECT/FAETEC. Neste capítulo procuraremos evidenciar a luta de forças entre o ISERJ e a FAETEC ao final do referido governo e durante o governo de Anthony Garotinho, com a nova administração da FAETEC. Procuraremos também destacar a “autonomia” requerida pelo ISERJ, e as dificuldades de gestão administrativa vividas pelo seu CNS. 3.2 - CNS do ISERJ: a história continua Até meados de 1998, parecia haver uma trégua nas ações relacionadas aos ISE/CNS no âmbito das duas Secretarias. Elas mantiveram um silêncio administrativo, onde cada uma buscou cuidar das próximas ações a serem implementadas em relação à formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental, nas suas instâncias de jurisdição. O curso normal de nível médio do ISERJ, por conta das políticas implementadas, começou a extinguir-se lentamente. No mês de junho de 1998, com a transformação do IERJ em ISERJ e o credenciamento de seu Curso Normal Superior pelo Parecer CEE 258/98, uma situação sui generis começou a se desenhar, mais particularmente na história daquela instituição: duas instâncias formadoras - uma de nível médio, representada pelo que restou do Curso Normal no Instituto de Educação (IERJ) e outra de nível superior , através de um núcleo superior criado para fazer funcionar o Curso Normal Superior do ISERJ -, passaram a ocupar o prédio do Instituto na Mariz e Barros. A unidade passou, a partir daí, a abrigar os alunos de CA (Classes de Alfabetização da educação infantil), do ensino fundamental, o Curso Normal de nível médio, e a partir daquele momento, o núcleo do CNS, ainda em estruturação. A relação entre a SEE e a SECT/FAETEC, no tocante à formação de professores, começou novamente a fervilhar, porém não somente em seus espaços internos, mas também com a participação de um novo ator, que naquele momento passaria a participar novamente do cenário histórico da construção de um curso de formação de professores para a educação básica em nível superior: o Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro, com seu projeto de unidade “autônoma”. Os primeiros meses do ISERJ foram marcados pela descoberta de irregularidades administrativas, o que levou a FAETEC, segundo um de nossos entrevistados, a demitir a diretora “por irregularidade administrativa, merenda... além de outro problema mais sério ainda”. No mês de janeiro de 1999, já no alvorecer do novo governo estadual, a FAETEC, em conjunto com a SEE, instaurou uma intervenção na unidade e foi constituída uma equipe para administrá-la. O início das atividades do Curso Normal Superior do ISERJ, em meio à transição de governo, foi marcado por uma infinidade de problemas administrativos. Aconteciam os preparativos para o primeiro vestibular para o CNS do ISERJ, que veio a acontecer no mês de novembro de 1998. No entanto, ao fim do mesmo ano, ainda na gestão de Marcello Alencar, a Secretaria de Ciência e Tecnologia baixou uma ordem interna para que os alunos do Curso Normal de Nível Médio do Instituto de Educação que tivessem média superior a 7,0 (sete), fossem matriculados diretamente no CNS. Em conseqüência disso, vários alunos que não tinham prestado o exame vestibular ou alcançado média superior a 7,0 (sete), porém, haviam sido aprovados no curso de formação de professores de nível médio do Instituto de Educação, sentiram-se no direito de recorrer à justiça comum, impetrando uma ação liminar para ingressarem na primeira turma do Normal Superior. Seriam cerca de 500 alunos com o suposto direito de compor a primeira turma, um problema foi remetido ao governo seguinte. Em 1999, tomou posse o governador eleito, Anthony Garotinho, pela coligação PDT, PT, PSB e PC do B, num governo de alianças (frente), para cumprir mandato de 1999 a 2002. Por conseguinte, foram nomeados, no primeiro escalão, como Secretário de Estado de Educação, o professor Hésio Cordeiro (ex-presidente do Conselho Nacional de Educação) e, como Secretário de Estado de Ciência e Tecnologia, o professor Wanderley de Souza, tendo como presidente da FAETEC o professor Carlos Augusto de Azevedo. O novo quadro administrativo da SEE, por sua vez, assumiu a Secretaria mediante fortíssimas seqüelas deixadas pelo governo de Marcello Alencar, principalmente no que diz respeito à questão da falsa autonomia escolar por ele praticada, quando deixou à mingua várias escolas da SEE. Os problemas oriundos da transformação do IERJ em ISERJ e da implementação do CNS passaram inevitavelmente à ordem de prioridades da SEE em 1999. A SEE encontraria, além de um desmonte nas escolas (nascido da política de abandono da educação pública do governo anterior) um verdadeiro “incêndio administrativo” gerado pelo processo aligeirado de criação do CNS do ISERJ, que teria que ser debelado. 3.3 - Impasse à vista Pela questão da transformação do Instituto de Educação em instituição de nível superior, as duas Secretarias e a Fundação (SEE e SECT/FAETEC) ficaram ligadas por uma linha tênue. De um lado, o prédio (dependências físicas) do Instituto, que por questão histórica estava ligado à SEE, com o Curso Normal de nível médio ainda em funcionamento. Nele ainda lecionavam os professores da própria SEE, concursados para esse fim. De outro lado, no mesmo prédio, a parte concernente ao CNS do ISERJ, ligado diretamente à SECT/FAETEC, onde o referido curso funcionava ainda como Núcleo de Ensino Superior, em que os professores cedidos pela SEE à SECT/FAETEC nele iriam lecionar em caráter provisório, até que fosse definido um concurso, com novo plano de carreira para a instituição.68 Por essa causa, no início do governo, as respectivas Secretarias tiveram que trabalhar em conjunto para resolver o impasse administrativo criado pela transferência do ISERJ para a FAETEC. Visto por outro ângulo, o primeiro projeto de ISERJ/CNS da FAETEC havia sido elaborado pela equipe da professora Nilda Teves (Secretária de Ciência e Tecnologia do governo anterior), fato que causou impasses entre os professores cedidos pela SEE ao CNS e o Instituto, segundo eles, pela forma unilateral como havia sido elaborado. 68 Os professores do CNS do ISERJ, oriundos do quadro de docentes I (ensino médio) da SEE foram selecionados pelo Conselho Estadual de Educação, por memorial. Todas essas características marcantes e peculiares ao CNS faziam com que a situação para o funcionamento do curso ficasse bastante complicada. Para que a situação se agravasse ainda mais, dentro do próprio governo Garotinho, que era um governo de alianças69, existiam concepções diferentes acerca da administração do Instituto. Para a SEE, o ensino e a extensão deveriam ser por ela realizados, ficando a FAETEC com a pesquisa de ponta (ou tecnológica). No entender da SEE, não deveriam haver escolas ligadas à FAETEC. Para a Fundação, entretanto, o ensino superior deveria “naturalmente pertencer-lhe” porque dentro da SECT também estavam incluídas as universidades estaduais. Nesse sentido, a seqüela deixada pelo governo anterior, com a transferência do Instituto para a administração da FAETEC, ainda não fora esquecida. Como afirmou o Subsecretário de Estado de Educação da época, “(...) a gente enfrentou uma crise institucional, estabelecida principalmente no Instituto de Educação. É bom lembrar que o Instituto de Educação, naquele momento (como é até hoje), administrativamente estava ligado à SECT. E que para nós, na Educação - pelo menos no grupo que estava naquele momento na Educação -, a reflexão que nós fazíamos é que o Instituto de Educação, pelo seu emblema, pelo seu simbolismo e pela sua função, ele deveria estar, na realidade é na SEE. Porque lugar de escola, principalmente na área de educação básica, é na SEE. Esse foi um primeiro princípio de divergência que encontramos no próprio governo. Que haviam setores, principalmente setores esses ligados a outros partidos políticos, que consideravam e defendiam a permanência do Instituto de Educação na SECT.” Esse foi um dos graves e mais difíceis problemas (dentre outros tantos) gerados pelo complexo processo de criação dos ISE/CNS no estado, que atravessou os dois governos e que, no governo Garotinho, na pasta da Educação, estava a dividir opiniões entre os partidos que dele faziam parte. A leitura que fizemos desse período é a seguinte: dentro da descontinuidade político-administrativa pela qual passava o estado do Rio de Janeiro, a única política de continuidade que foi mantida no tocante aos ISE foi a própria descontinuidade administrativa, sem ainda um norte definido, e que continuava a causar sérios impasses e a prejudicar mais ainda o cenário da educação e, particularmente, da formação de 69 Constitui-se um governo onde diversos partidos (neste caso de esquerda) se unem para disputar uma eleição, visando, de forma compartilhada, desenvolver ações compartilhadas com ideologias próximas. Geralmente, como o que aconteceu no estado do Rio, após lograr êxito no pleito, cada partido fica com a responsabilidade de administrar uma ou mais áreas. Convergindo diretamente à nossa área de interesse, no governo Garotinho o PDT e o PT assumiram a SEE e o PC do B juntamente com uma pequena parte do PDT assumiram a Ciência e Tecnologia. professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental no estado do Rio, confundindo a sociedade fluminense. Com respeito ao vestibular realizado para a primeira turma do CNS do ISERJ (problema herdado pela transferência do Instituto para a FAETEC) esta era uma situação administrativa séria a resolver, pois como o exame já fora realizado, os candidatos aprovados aguardavam o início das aulas. No entanto, para além da intervenção do Instituto, e do exame vestibular, a equipe implementadora do CNS do ISERJ, que era constituída pelos professores e interventores, não estava aceitando o projeto formulado pela gestão anterior da SECT/FAETEC, alegando que este mesmo deveria ser reformulado por apresentar numerosas falhas, sobretudo por ser considerado um projeto que não foi construído com a participação de toda a comunidade educacional do Instituto. Os interesses conflitantes encontrados e por sua vez continuados no novo governo (com respeito às políticas de formação de professores e ao CNS do ISERJ) eram inúmeros, tanto na parte administrativa como na parte político-pedagógica. Tais embates foram estabelecidos não somente no campo político-partidário, em que a administração da SEE foi herdada pelo PT e PDT e a administração da SECT/FAETEC pelo PC do B, mas também no campo político-ideológico, pois os dois partidos tinham concepções ideológicas diferentes (às quais já enunciamos) com respeito à educação, e que mais tarde fluiriam. Cada partido quis, a seu modo, constituir equipes que representassem os seus interesses. Como veremos adiante, nesse início de governo, a despeito das diferenças existentes na própria administração do estado, as dificuldades encontradas no Instituto parecem ter sido suficientes para que se tentasse no Instituto uma intervenção conjunta entre a SEE e a FAETEC. As disputas por espaços estavam apenas começando. E, nesse processo, parecia ser difícil uma saída que não fosse dolorosa, mais uma vez causando danos à educação e à sociedade, principalmente aos candidatos aprovados no vestibular para o CNS, que aguardavam sem promessas o início das aulas e propriamente do curso. Gostaríamos de comentar que, em situações dessa natureza, os governantes parecem esquecer que seus governos são públicos e que devem satisfação à sociedade como um todo. Os governos são passageiros, mas as conseqüências de suas políticas implementadas sem planejamento ficam. Os embates por concepções atravessam o campo público e vão ao campo pessoal, sem nenhuma dificuldade, demonstrando a fragilidade com que a “democracia”, sem a participação da sociedade, parece estabelecer-se. As políticas governamentais, no estado do Rio de Janeiro, historicamente parecem ter ignorado, em muitos momentos, a questão ideológica, marcada sobretudo pela diferença de concepções existentes entre seus governantes, priorizando uma ordem unilateral onde o exercício do poder público passa a ser confundido com a possibilidade de viabilizar interesses individuais, numa constante troca de favores e cessão de benefícios. Esse modelo de administração, evidenciado pela personalização de decisões e pelo clientelismo, encontra-se longe de constituir-se como interesse coletivo e de ser definido como política pública. 3.4 - Na tentativa de soluções Como salientamos anteriormente, na intenção de equacionar o impasse no Instituto, o Secretário de Educação, professor Hésio Cordeiro procurou estabelecer sua estratégia de ação, no que se refere ao Instituto, através de um consórcio entre SEE e SECT, ou seja, a constituição de um planejamento integrado para a solução específica dos problemas constituídos no ISERJ. Tal política, no entanto, não seria tão fácil, pois não dependeria somente das ações entre as duas Secretarias. Os próprios professores do CNS (constituído como Núcleo Superior no Instituto, antes mesmo do estabelecimento do novo governo) haviam constituído uma frente de resistência ao projeto deixado pela administração anterior, aproveitando a indefinição em que o CNS se mantinha, buscando assim as novas concepções. O quadro instaurado no Instituto, constituído a partir da criação do CNS, nos leva a vislumbrar uma nova problemática a ser enfrentada pelo novo governo. Além das vontades, materializadas e alimentadas pelas divergências político-ideológicas existentes nas duas Secretarias, um desejo de controle, evidenciado do ponto de vista do próprio ISERJ estava se materializando. Havia naquele momento, um tríplice problema: governo anterior deixando o primeiro projeto de CNS aprovado e não estabelecido, com incontáveis incógnitas; governo novo assumindo, com várias divisões político-partidárias entre as Secretarias; e o ISERJ já instituído como unidade de educação superior, não aceitando o primeiro projeto do CNS da FAETEC deixado pelo governo anterior e querendo ter autonomia sobre as decisões do CNS do Instituto. Quando o interventor, professor William Campos, indicado pelo consórcio entre as Secretarias, assumiu a direção do Instituto, o fez porque a administração anterior, que permaneceu até fevereiro de 1999 (e fora estabelecida pela FAETEC, logo após a transformação do Instituto em instituição de nível superior), apresentou uma série de irregularidades. O então interventor, ao constituir sua equipe de trabalho, convidou para compô-la o professor Livingstone dos Santos Silva, da UERJ, que atuava na Faculdade de Educação da Baixada Fluminense, com experiência e vivência em gestão educacional, e que seria o coordenador do núcleo de ensino superior70, assumindo, concomitantemente, a função de coordenador do CNS, medida tomada porque a situação organizacional do ISERJ ainda não estava definida. Desta feita, o professor Livingstone objetivou mostrar aos professores (cedidos pela SEE para atuarem no CNS do ISERJ) que o projeto da professora Nilda Teves teria que ser reformulado, principalmente, segundo ele, porque “...estava fora da legislação e das orientações emanadas do Conselho Nacional de Educação” Porém, o modelo não deveria ser de todo abandonado, mas, segundo ele, separado nas suas principais deficiências. Qualificou-o o professor Livingstone como uma “licenciatura curta.” Lembramos que, naquele momento, a única orientação normativa existente sobre o CNS era o Parecer CNE/CP nº 53, de 28/01/99, que instituiu as diretrizes gerais para os ISE, portanto ainda muito incipiente. Assim sendo, ressalta um dos interventores: “(...) quando nós chegamos, a primeira coisa que fizemos foi uma reunião de todos os professores envolvidos no CNS. E nessa primeira reunião que nós fizemos – nós nos preparamos para isso – nós mostramos a esse grupo de professores a necessidade de se refazer todo o projeto, porque estava fora da legislação. E estava fora das orientações emanadas pelo Conselho Nacional de Educação. E eu não preciso dizer que houve um início de reação71, 70 Nesse momento a estrutura do CNS do ISERJ ainda não estava definida, pois o curso funcionava apenas como um núcleo do Instituto. O interventor (Diretor-em-Exercício) dirigia toda a instituição. O CNS passou a contar apenas com um Diretor de Educação Superior, que atuava também como coordenador do curso. 71 Sem grifos no original. Esses professores não fizeram concurso para o nível superior, a fim de reingressarem no ISERJ. A FAETEC não possui um quadro de professores de nível superior, ou sequer um plano de carreira. Os professores do CNS foram cedidos pela SEE no momento em que o Instituto fora transformado em instituição de nível superior. Pertencem todos ao quadro de docentes I (nível médio) da SEE. A partir da cessão eles passaram a aguardar uma posição da FAETEC sobre a criação de um quadro de nível superior, vislumbrando a possibilidade de serem transferidos para o mesmo. Também nos questionamos: sendo a FAETEC pertencente à SECT, e, por conseguinte, à UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro, sediada no bairro do Maracanã, centro da cidade do Rio de Janeiro) e à UENF (Universidade Estadual do Norte Fluminense), universidades estaduais respeitadas, também subordinadas à SECT, estas não poderiam ceder professores para o ISERJ, a fim de ligá-lo à universidade? Por que isolá-los da universidade e privá-los dessa experiência? Provavelmente questões políticas e corporativas privilegiaram tal decisão. mas na verdade a gente pôde impor um certo posicionamento até do governo que chegava, e do nosso grupo que chegava ao Instituto, por causa dessas irregularidades. Nós mostramos claramente quais eram as irregularidades e que a gente não estava ali para abandonar um projeto antigo, como se não tivesse nenhuma utilidade. (...) Eu sei que com esse posicionamento nós começamos a ganhar o grupo e fomos mostrando ao grupo, ao longo do trabalho, que o trabalho só estaria pronto a partir de um trabalho coletivo.” O grupo de trabalho que estava intervindo no ISERJ tinha claras intenções de modificar o projeto anterior, desenvolvido pela FAETEC. É interessante ressaltarmos que quase a totalidade dos professores que estava à frente da SEE e da FAETEC, em algum momento manteve vínculos administrativos ou docentes com a UERJ, como por exemplo o Secretário de Educação, o Subsecretário de Educação e os dois interventores72, além da Secretária de Ciência e Tecnologia do governo anterior, o que demonstra que, embora tivessem vínculos na mesma universidade, seus projetos concernentes à superiorização da formação do professor eram antagônicos. A simpatia pelo projeto inicial, desenvolvido nos anos 90 do século XX pela SEE, tendo a UERJ como parceira, e rearrumado em 1997, pelo professor Álvaro Chrispino, quando novamente é evocada a participação daquela universidade, parecia querer emergir novamente com a entrada dos interventores. Outro fato interessante a considerar, a partir da fala do professor Livingstone, é que houve inicialmente a reação dos professores implementadores do CNS, que participaram na construção do seu, que convencionamos, para esse capítulo, chamar de “Projeto do CNS do ISERJ”. Os professores do CNS não concordaram, a princípio, com a modificação exercida pela interventoria, porque vinham (antes mesmo do processo intervenção) pensando em aproveitar a lacuna deixada pela exoneração da antiga direção e pela mudança de governo, para construir o seu próprio projeto, que seria uma forma de tentar fazer do Instituto uma unidade autônoma. Não tinham, portanto a intenção de dividir suas idéias, muito menos com interventores. Essa seria a chance sem igual, no entender daqueles professores, de lutar pela autonomia73 administrativa e pedagógica do Instituto. Uma intervenção representava, nesse sentido, uma ameaça aos anseios daqueles docentes. 72 O Secretário de Educação havia sido Reitor; o Subsecretário de Educação havia sido aluno de graduação e os interventores foram professores dos quadros da universidade. Interessante também observarmos que dos atores citados no presente trabalho, quase totalidade deles mantinha algum tipo de vínculo com a UERJ. 73 Essa autonomia reclamada pelos professores implementadores do ISERJ não deve ser entendida pelo ângulo da autonomia estabelecida pelo governo FHC e Marcello Alencar, concomitantemente. Nesses Sobre essa iniciativa, uma das professoras implementadoras do curso fez o seguinte relato: “Acabou o governo Marcello Alencar e começou um governo de coligação de esquerda. Nessa transição, os professores se apropriaram do processo. Então nós estávamos (nós, por decreto), fomos transformados em Instituto Superior de Educação. O Parecer 258/98 autorizou o curso e credenciou a instituição. E houve a mudança de governo. Nessa mudança de governo, os professores se apropriaram da proposta. E a proposta, que a princípio era de dois anos passou a ser de quatro anos. E aí, Gramsci aponta a atuar nas brechas das descontinuidades das políticas governamentais. E foi exatamente assim que os professores atuaram. A única proposta que foi implementada foi a proposta dos professores, que depois correram atrás do Conselho Estadual para que essa proposta fosse autorizada, e não a de dois anos, da época da professora Nilda Teves.” Uma verdadeira luta de forças foi travada entre a SEE, a FAETEC, o ISERJ e a Intervenção. Isso se deu possivelmente pela qualificação dos professores do núcleo do CNS do ISERJ, a maioria com mestrado e alguns já cursando doutorado, o que tornou o embate mais qualificado, onde à resistência, motivada pelos interesses em jogo, uniu-se o conhecimento e experiência profissional. Em meio às ameaças de repúdio, efetuadas pelos professores à entrada dos interventores no processo de discussão do novo projeto, considerada uma intromissão, um fator positivo contribuiu para que as conversas iniciadas entre o grupo interventor e os professores tivessem êxito: a promessa do então Coordenador do Núcleo de Ensino Superior de que o trabalho de reconstrução do projeto seria coletivo. Ele esclareceu ao grupo de professores que o projeto não seria reformulado pela Secretaria, mas reconstruído dentro do próprio núcleo do ISERJ, com o corpo docente que havia sido designado para trabalhar no CNS. Isso trouxe mais calma ao momento e os professores cederam, inclusive porque passaram a perceber que o processo político de criação e de efetivação seria complexo, tanto do ponto de vista pedagógico como administrativo. Entre “ganhar para perder ou “perder para ganhar”, seria preciso “ceder para vencer” a batalha de implementação do CNS. governos, que são caracterizados expressivamente pela política neoliberal, autonomia significa desresponsabilização do poder público pela educação, deixando as instituições à mingua. A autonomia requerida pelos professores do ISERJ significava gerir o instituto pedagógica e administrativamente, não ficando desvinculado do suporte financeiro da FAETEC. Durante a reconstrução do projeto, efetuada pelos professores implementadores e pelos interventores, a FAETEC não interferiu significativamente no processo de continuidade administrativa, ou mesmo de formulação pedagógica do curso, o que, segundo os interventores, nem poderia acontecer. Em primeiro lugar, pela solicitação da SEE para que isso não ocorresse. Em segundo lugar, porque, na percepção dos interventores, a FAETEC não possuía experiências suficientemente qualificadas no campo da formação de professores para que tal posição fosse exercida. Mesmo com a ausência da FAETEC no processo de reconstrução do CNS, os interventores solicitaram-lhe que não retirasse o provimento financeiro e material do Instituto, pois nunca é demais lembrarmos que, naquele momento, o ISERJ já estava sendo gerenciado administrativamente pela FAETEC. É notável percebermos que em contrapartida ao movimento da FAETEC de se inclinar para a educação infantil e para o ensino fundamental, a SEE continuava a defender sua posição de que todas as escolas deveriam estar a ela vinculadas, lutando assim por sua total hegemonia no ensino. Entretanto, parecia haver um espectro de medo rondando a administração da SEE pois a FAETEC representava uma ameaça, no sentido de levar outras escolas e institutos para sua administração. E isso não seria impossível, porque, naquele momento, outras unidades pertencentes à SEE procuraram a direção pedagógica da FAETEC (mais diretamente à coordenação dos ISE) para também se transformarem em Institutos Superiores de Educação. Sobre este fato, salientou a coordenadora dos ISE no estado, ligada à DDE74: “Então, os Institutos... eu tenho conhecimento, e eu tenho tido procura das pessoas, dos diretores, dos Institutos e até do corpo docente dos Institutos da Rede de Estado de Educação. Eles clamam para vir para a Fundação. Eles querem vir para estar na nossa Rede. Eu... Agora isso foge à decisão, foge à minha competência, à competência da Fundação, porque é uma decisão governo.” Esse relato demonstra claramente que existia, por parte dos professores da SEE, um grande interesse em serem cedidos para a FAETEC, por conta das possibilidades vislumbradas, sendo uma delas a questão salarial. O salário dos professores cedidos para a FAETEC continuava a ser pago pela SEE, mas recebiam uma complementação daquela Fundação. Essa, sem dúvida, era uma diferença considerável a ser levada em conta. 74 Diretoria de Desenvolvimento de Ensino da FAETEC. Para tentar equacionar esse problema e visando defender a manutenção dos institutos na instância da SEE por uma ligação histórica, a equipe da SEE procurou estudar a possibilidade de fazer uma adaptação para equiparar o salário dos professores da Rede Estadual da SEE ao salário dos professores da FAETEC; uma espécie de isonomia salarial, o que não foi possível porque a FAETEC já possuía um plano de cargos e salários para os seus professores. A SEE e a FAETEC, por não possuírem em seus quadros docentes do magistério superior, não contavam com plano de cargos e salários elaborados para eles, o que exigiu da FAETEC uma complementação salarial para os professores, a fim de mantê-los como docentes de nível superior. Essa situação passou a ser sui generis, seja porque os professores não pertenciam a quadros de docentes de nível superior (lecionando em um curso recém-criado), seja porque o CNS ficou ligado a uma Secretaria sem qualquer vínculo histórico com o ensino superior, o que reforça a nossa conclusão de que a intenção da FAETEC, ao lançar no estado o CNS, era torná-lo um curso superior desvinculado de seu sentido de formação plena. A situação salarial obviamente agradou aos professores ligados ao Instituto de Educação, nesse momento os principais atores políticos no processo de criação e implementação do CNS. Aprofundando mais essas questões, chegamos a outra conclusão preliminar. Havia esperanças por parte da SEE de recuperar o Instituto de Educação da Mariz e Barros, tido como patrimônio perdido para a FAETEC. Caso isso não fosse possível, a SEE não faria tanto esforço para constituir um consórcio administrativo com aquela Fundação. Porém, como verificamos, embora o governo de Anthony Garotinho tenha sido um governo constituído por uma frente partidária, as decisões não eram tão fáceis de serem tomadas, tendo em vista a demarcação dos espaços de cada partido, o que impediu algumas ações conjuntas, pois até mesmo uma decisão do governador que viesse beneficiar um ou outro causaria uma crise de maiores proporções no governo. A situação, portanto, foi provisoriamente mantida nas dimensões em que se encontravam, adotando o governo um regime de cautela nas decisões para que a crise existente não se agravasse ainda mais. Olhando por outro prisma, nesse momento de evolução e de primeiros passos do CNS na Rede Pública estadual dentro do ISERJ e sob administração da FAETEC, a equipe pedagógica da SEE continuou a pensar novas possibilidades. Podemos observar que a política pedagógica e administrativa definida pela Secretaria de Educação, quanto à formação de professores da educação básica (nos meses que sucederam o início do mandato do novo governo até a saída do professor Hésio Cordeiro da SEE, em outubro de 1999) parecia ressignificar em parte o projeto do CTQE, do início dos anos 90, com um adendo importante: nessa nova gestão a SEE convidou as universidades públicas do estado do Rio de Janeiro a discutirem, como parceiras, uma alternativa para a formação de professores em nível superior. Nesse momento, a SEE tinha a intenção de iniciar uma política estadual de formação de professores que discutisse o futuro das escolas de formação de professores de nível médio na modalidade Normal, e uma transição desses cursos para o ensino superior, enfocando estrategicamente a vocação75 de cada região do estado para uma política de formação de professores. Segundo o então Subsecretário de Estado de Educação, se estudava, para os “(...) centros com potencial econômico forte, um ensino de nível superior para professores. Só que no interior do estado, quando a gente têm ainda professores leigos, a gente precisaria, de repente, de um núcleo de formação de professores de nível médio. Na verdade, a gente queria estabelecer uma transição. Não acabar de uma hora para outra com os cursos médios de formação de professores .” Entretanto, esse projeto não foi consumado. Sem dúvida, a proposta da SEE naquele momento era a mais pertinente, consistente e cautelosa, porque além de não causar um impacto forte na estrutura educacional, extinguindo de vez os Cursos Normais de nível médio e criando sem planejamento os CNS por toda a Rede, se convidaria as universidades públicas, os verdadeiros mananciais de experiência, de qualidade, de vivência e de pesquisa no ensino superior, para discutirem com ela uma proposta conjunta, exercendo-a de forma madura, criteriosa e responsável. Contudo, como o processo de criação dos ISE e seus CNS no estado já se havia iniciado, os trabalhos dentro do núcleo superior do Instituto de Educação continuaram. Foram cinco meses de trabalho até que o novo projeto tomasse a forma desejável para a equipe que nele trabalhou. As aulas no CNS, nesse ínterim, nem haviam se iniciado. O curso foi inaugurado no dia 31 de maio de 1999 e as aulas só foram iniciadas no dia 1º de junho de 1999. 75 O conceito de vocação, estabelecido pela SEE, significava identificar as características econômicas, sociais, culturais e turísticas de uma determinada região. A “vocação” da região está em perceber as possibilidades de desenvolvimento econômico de um município e como a educação e o seu planejamento se inserem neste contexto. Como mencionamos na introdução, não é intenção precípua deste trabalho entrar em detalhes da discussão sobre currículos, carga horária ou uma análise mais minuciosa do CNS sob o aspecto pedagógico ou mesmo legal, uma vez que nossa análise debruça-se sobre o processo político desencadeado ao longo dos anos para que as políticas dos ISE na Rede Pública estadual se configurassem. Porém, entendemos que, para uma compreensão mais abrangente dos fatos, das políticas e das ideologias presentes naquele cenário - verdadeiro campo de batalhas -, e devido à fragilidade documental, característica que nesse estudo nos foi imposta pela própria descontinuidade administrativa e por políticas que consideramos paliativas, um enfoque sobre alguns aspectos mais abrangentes do CNS do ISERJ referente ao modelo construído pelos professores do CNS daquela instituição faz-se necesário, para que possamos compreendê-lo como uma instância que foi colocada ou colocou-se em separado das demais, constituindo-se como um caso específico. 3.5 - O projeto formulado pela Comissão Implementadora do CNS do ISERJ Com todas as reservas que possamos ter quanto ao projeto do CNS do ISERJ, o qual classificamos como modelo independente, isolado pedagógica e administrativamente do ponto de vista da FAETEC, reconstruído e moldado pelos interventores e comissão de professores implementadores do curso, seria negligência não reconhecermos que este, após ser refeito, tornou-se pleno76, complexo, denso, bem fundamentado e consistente quanto ao compromisso e quanto às reais intenções dos seus formuladores. Há uma diferença considerável entre o projeto formulado por essa equipe (professores e interventores), considerando-se a carga horária e a duração do curso, e o primeiro projeto da FAETEC, o qual parecia ter como proposta o aligeiramento da formação do professor. Este álibi foi utilizado como um motivo para trazer a formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental à instância da FAETEC, emprestando-lhe conseqüentemente um modelo eminentemente desenvolvimentista, marcado pela agilidade e praticidade no envolvimento com a 76 Consideramos como pleno o equivalente a uma graduação com duração de 4 anos, com carga horária de, no mínimo, 3.200 horas/aula. tecnologia, como vimos em momento anterior, pela visão extremamente racional e burocrática com que se impôs. A reelaboração do projeto não se estagnou nos cinco meses após a constituição da intervenção, exercida no ISERJ pela FAETEC. Ela continuou. Fato relevante é que o projeto, no início de sua elaboração, pautou-se literalmente nos Pareceres CNE/CP 53/99 e 115/99, pois ainda não havia legislação específica emanada do governo federal, até ser publicada a Resolução CNE/CP 01/99. Em caráter geral, o CNS do ISERJ é oferecido atualmente em três turnos: manhã, tarde e noite, contrariamente ao projeto da FAETEC, em que o curso seria oferecido somente nos turnos da manhã e da tarde. Foi estruturado em duas habilitações básicas: formação de docentes das séries iniciais do ensino fundamental, com ênfase em educação especial ou educação de jovens e adultos; e, para a formação de profissionais e/ou docentes da educação infantil, com ênfase em educação especial, como previa a Resolução CNE/CP 01/99 no seu artigo 1º, itens I e II, e artigo 6º, itens I e II, e parágrafo 1º, itens I, II, III e V. A carga horária do curso é integralizada em 3.200 horas/aula, previstas pela Resolução 01/99 no seu artigo 6º, parágrafo segundo, sendo que a parte prática é tratada conjugadamente com o artigo 7º, parágrafo segundo. A duração do curso é prevista para oito períodos. Cada período é composto de cem dias letivos. Do primeiro ao quarto período, os alunos têm a mesma grade curricular, com conhecimentos básicos, metodológicos e na área da educação. A partir do 5º período, os alunos escolherão as habilitações. O aluno que escolher a habilitação em educação infantil iniciará a ênfase curricular em educação especial (EE), sendo esta em caráter único de escolha. Por sua vez, o aluno da habilitação ensino fundamental poderá optar por uma das duas ênfases: educação de jovens e adultos (EJA) ou educação especial (EE). Para que um aluno obtenha uma segunda habilitação, terá que realizar complementação de estudos na área escolhida. O projeto prevê que, eventualmente, de acordo com a disponibilidade institucional e a necessidade discente, poderão ser oferecidos períodos acadêmicos extraordinários. Os elementos curriculares do CNS do ISERJ estão distribuídos nas seguintes categorias: obrigatórios fixos por períodos (disciplinas); obrigatórios e não-fixos por períodos (atividades); e opcionais (optativas e eletivas). As disciplinas optativas integralizam o conhecimento específico das habilitações e as eletivas integralizam o conhecimento geral, sendo destinadas a cada categoria, a carga horária de 150 horas/aula. Permeando a estrutura curricular, o projeto prevê uma área de prática pedagógica conhecida como prática docente interdisciplinar (PDI), que percorre todos os períodos, totalizando, no mínimo, 800 horas/aula, divididas em 90 horas no primeiro e segundo períodos; 100 horas no terceiro e quarto períodos; 110 horas no quinto e no sexto períodos; e 100 horas no sétimo e oitavo períodos. De acordo com os formuladores do projeto, a PDI tem o sentido de ir além de um estágio. Como afirmam seus implementadores, “ (...) ela se realiza no sentido de fazer com que o aluno viva a escola de educação básica como parte integrante do ISERJ, e participe do projeto global da instituição. Assim a docência abrange múltiplas instâncias (regência, gestão, iniciação à pesquisa) que efetivam a construção e o desenvolvimento do projeto pedagógico. Fazem parte do curso os seminários multidisciplinares onde a comunidade de professores e alunos refletem coletivamente várias questões do ambiente educacional dentro do micro ou macro sistema e encontros anuais intitulados DIÁLOGOS EM FORMAÇÃO cujo objetivo prioritário é promover o diálogo inter-institucional dos vários locais de formação de professores, das escolas normais de nível médio às universidades.” (Santos, et alli. 2000, p. 70) A PDI possui um regulamento específico, onde são estabelecidos todos os critérios necessários a sua realização. Ela envolve duas dimensões: o estágio supervisionado, que é compreendido por atividades de observação e co-participação (nos dois primeiros períodos) e por atividades de co-participação e docência, a partir do terceiro período. A segunda fase, por sua vez, refere-se à participação em atividades interdisciplinares, que são propostas pelo corpo docente do curso. Segundo o projeto, a cada semestre é elaborado um relatório de avaliação interdisciplinar, em relação ao alcance dos objetivos previstos. O projeto ainda prevê para a PDI uma abordagem de formação continuada, numa integração entre ensino, compromisso pró-pesquisa e extensão, desenvolvendo-se em três projetos interdisciplinares investigativos: - PROEJA – Projeto de Educação de Jovens e Adultos vinculado ao CNS do ISERJ, que implementa classes de jovens e adultos de CA a 4ª série, sendo abertos à comunidade e viabilizando a prática docente voltada à ênfase de Educação de Jovens e Adultos (EJA); - ISEB – Projeto77 de integração ensino superior – educação básica, visando a efetiva de coerência teórico-prática do ISERJ integral; e - PRO-MEMO – Projeto de Memória Pedagógico-Cultural do ISERJ, socialmente irradiada em seus 120 anos de formação de professores. No ano 2000, com a finalidade de homenagear o centenário do nascimento do professor Anísio Teixeira, a equipe do Curso Normal Superior do ISERJ organizou, nas dependências do Instituto, o I Encontro do Curso Normal Superior do ISERJ, intitulado “Diálogos em Formação”. Resultou do evento uma revista a qual se qualificou como científica, publicada pela FAETEC. A revista, que publicou artigos de vários professores da unidade e de outros profissionais da educação, inclusive de universidades públicas e privadas78, serviu para, além de tornar conhecida a instituição, demonstrar uma tentativa de unir historicamente o pensamento de Anísio Teixeira ao CNS do ISERJ, enfatizando ser este uma espécie de evolução do pensamento do renomado educador. Tal evento, segundo afirmam seus organizadores, “(...) buscou resgatar a contribuição deste Educador Brasileiro à constituição profissional do cidadão/professor nas vivências de um sistema público de educação que permitia a todos usufruírem da igualdade social de condições: “educação não é privilégio”. O perfil profissional de nossa instituição e a história de vida de Anísio Teixeira têm a mesma terra fértil na qual são cultivados os desafios do cotidiano dos professores: a educação pública gratuita e laica. Especialmente para o Curso Normal Superior do ISERJ, o caminhar utópico de Anísio, em busca da superação de obstáculos e de interrupções na conscientização de seus projetos, nos instiga a refletir sobre nossa responsabilidade de criar e implementar o primeiro Curso Normal Superior Público do Brasil. Em permanente diálogo com nossas raízes históricas, queremos socializar a importância de Anísio Teixeira para a criação do Instituto de Educação do Rio de Janeiro na década de 30 e seu compromisso com a formação dos professores em nível superior.” (Diálogos em Formação, 2000, p.4) 77 Os formuladores do projeto procuraram, na minuta, realçar a necessidade da articulação entre educação básica e educação superior, o que internamente é conhecido como “Projeto do IERJ Integral”, visando, além de uma ação coletiva entre as duas instâncias, uma proposta de interdisciplinaridade. 78 Vários profissionais ligados a universidades públicas e privadas (seja por formação acadêmica ou por docência), como UERJ, PUC-Rio, UFRJ, UNI-Rio, UNESA, UFF, UNIGRANRIO, UGF e ISEP tiveram seus artigos publicados na revista. Tal fato, porém, não significou o estabelecimento de uma posição de apoio direto ao CNS do ISERJ naquele momento, participando como conferencistas convidados. 3.6 - De IERJ a ISERJ: os embates vividos pela instituição79 Alguns estudiosos da história da formação de professores (Tanuri, 2000; Vidal, 2001) em suas contribuições são categóricos ao afirmar que, como escola dedicada à formação de professores, o Instituto de Educação tem uma experiência de 122 anos, seja para relatar a trajetória da instituição, seja para reconstituir a histórica contribuição do professor Anísio Teixeira, ou seja, para ensejar-lhe um perfil histórico-evolutivo de ascensão no nível de formação. Nessa linha, para que possamos compreender melhor sua evolução, cabe destacarmos alguns fatos históricos do Instituto. O Instituto foi estabelecido como escola de formação de professores já em 05/04/1880, com o nome de Escola Normal da Côrte, passando a funcionar no Imperial Colégio Pedro II. Em 1888, ainda como Escola Normal da Corte, foi transferida para o Largo de São Francisco, área central da cidade do Rio de Janeiro. Ainda no mesmo ano foi transferida para o prédio em que hoje funciona a escola Rivadávia Corrêa. Em seguida, foi transferida para a Escola Pedro Varela, na Rua Joaquim Palhares, que foi demolida para a construção da estação do metropolitano (metrô). Foi, porém, com a administração do prefeito Prado Júnior (1926-1930), quando o Rio de Janeiro era a capital federal, tendo Fernando de Azevedo na Diretoria de Instrução Pública do Distrito Federal, que foi construído o monumental prédio da Nova Escola Normal, que mais tarde (em 1932), através do decreto 3.810, de 19/03/1932, seria transformado em Instituto de Educação, por Anísio Teixeira, o ensino desde o pré-escolar até o ensino superior (a escola de professores), como resgatamos no primeiro capítulo, integrando-se na Universidade do Distrito Federal (UDF) em 1935. Desde sua criação, o Instituto de Educação vem sendo conhecido por ser uma instituição voltada à formação primária de professores, hoje reconhecida como educação 79 Dentre os autores que pesquisamos sobre a história do Instituto, nos debruçamos mais sobre a reconstituição histórica feita pelos professores do próprio CNS do ISERJ, traduzida por SANTOS, S.R.P. e outros, em artigo intitulado Projeto Pedagógico do Curso Normal Superior do ISERJ. In: Diálogos em Formação: revista científica do Curso Normal Superior do ISERJ. Rio de Janeiro: FAETEC, 2001, nº 1, pp. 68-77. Analisamos também artigo de ACCÁCIO, L.O., intitulado A criação do Instituto de Educação do Rio de Janeiro (Trabalho apresentado na 18ª reunião da ANPED, no GT de História da Educação, ano de 1995). Utilizamo-nos também de VIDAL, D.G., em O exercício disciplinado do olhar: livros, leituras e práticas de formação docente no Instituto de Educação do Distrito Federal (1932-1937). Bragança Paulista: Editora da Universidade São Francisco, 2001. infantil e séries iniciais do ensino fundamental. Mais ainda por ser uma instituição, após o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, marcada por grandes acontecimentos que geraram enfrentamentos no campo político e no campo ideológico. Por ser uma instituição criada para ser modelo na formação de professores e que serviu para a formação (além de diversos intelectuais) da elite social da época, o instituto passou por enfrentamentos ideológicos muito grandes. Advindas de Dewey, as concepções de Anísio, como Diretor Geral de Instrução Pública do Distrito Federal, sucedendo os educadores Osvaldo Orico (docente da Escola Normal) e Raul de Faria (inspetor escolar do Distrito Federal), foram grandemente assumidas pelos seus pares, à época, pois foram revolucionárias para o campo da educação, e principalmente para o campo da formação de professores. Por abrigar historicamente tantas personalidades e por ser palco de tantas transformações e experiências político-pedagógicas, talvez possamos afirmar ter encontrado nesses fatos históricos a condição pela qual o Instituto adquiriu um elevado nível de resistência à rotatividade das políticas públicas no estado do Rio, e aos dissensos dos seus formuladores e governantes. Como instituição, desde a sua criação o Instituto de Educação passou por intervenções, em diversas décadas, fosse por discordâncias políticas, choques ideológicos ou mesmo por improbidade administrativa. Tais intervenções vieram a fazer parte de sua história de vida. A mais notável delas foi a interrupção do brilhante projeto de Anísio Teixeira – a UDF - pelo Estado Novo de Vargas. Por Mendonça (2002), observamos existir dentro do Instituto, já constituído como unidade da UDF, uma luta de forças, pois “(...) a idéia, comum aos projetos da USP e da UDF, de formar na universidade as elites que com base na autoridade do saber iriam orientar a nação – pairando, de certa forma, acima do Estado - seria, no contexto da ideologia do Estado Novo, considerada perigosa. O governo federal queria o monopólio da formação dessas elites e impunha sua tutela sobre a universidade.” (Mendonça, 2002, p. 29) Em função disso, o governo Vargas, que instituiu, na década de 30, o chamado Estado Novo, extinguiu definitivamente, em 1939, a Universidade do Distrito Federal (UDF) e com ela a Escola de Professores, sendo reorganizada a URJ (Universidade do Rio de Janeiro), transformada logo após em UB (Universidade do Brasil). Segundo Mendonça (2002), com a criação, no interior da Faculdade de Filosofia, de uma Seção de Pedagogia, bem como de uma Seção de Didática (desvinculada da Seção de Pedagogia), os objetivos tornaram-se corporativos. O Instituto de Educação, por sua vez, tornou a oferecer o curso Normal de Nível Médio, voltando às suas atividades de origem, oferecendo o Grupo Escolar e o Jardim de Infância. Cremos que esse legado, ensejado pelas lutas históricas iniciadas por um de seus mais eminentes educadores – o professor Anísio Teixeira - traduzido por seus pensamentos e ações reproduzidas e ressignificadas na instituição durante todos esses anos, parece revestir cada professor, cada dirigente daquela unidade de peculiaridades afins em suas ações, que são percebidas em seus discursos e sua forma de agir. Seus alunos e professores parecem inspirar-se nessa “essência anisiana”. Mesmo que muitos deles não conheçam essa história, um modus operandi parece envolver a instituição, tornando-a combativa e resistente a qualquer cerco que venha a privá-la de sua suposta autonomia, evocada pelas experiências históricas que viveu. Mesmo considerando um equívoco a existência de uma ligação histórica entre os embates do passado e os do presente, admiramos a postura dos profissionais que lá residem lutar por um projeto que construíram ao longo da implantação do Curso Normal Superior na instituição, embora tenhamos observado um elevado grau de corporativismo existente devido à sempre presente tentativa de se isolar pedagógica e administrativamente, como se o Instituto, por tudo o que viveu e pelos embates que ainda passa, seja elemento central na criação e na vivência de uma formação em nível superior.80 Consideramos, porém, fato irreal a existência de uma vocação de resistência da instituição na formação de professores, empreendida pelos profissionais militantes naquela instituição, como se as lutas presentes se constituíssem numa razão histórica da existência da instituição. 80 Ao inaugurar a categoria superiorização, queremos também nos reportar à formação dos professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental, como formação inicial nos CNS dos ISE , onde estes estejam instalados (Faculdades Isoladas, Integradas ou Institutos propriamente ditos) diferenciando-a seja da formação desses profissionais nas universidades (principalmente as públicas), para o qual nos apropriamos da categoria universitarização da formação do professor, inaugurada por Silva (1997), seja da formação em nível médio – tradicionalmente realizada pela Escola Normal. Desta feita, temos por compreensão que superiorizar a formação do professor não significa, em princípio, instituir-lhe uma formação universitária podendo este realizá-la em instituições isoladas. Em nosso entendimento, seria muito interessante que a formação desse professor se desse inicialmente na escola normal, passando após, pelas cadeiras da universidade onde essencialmente adquirirá uma autonomia crítica inigualável, que em outro espaço não se concretizará. Qualquer outro tipo de formação constituir-se-á na continuidade de uma formação isolada, onde a investigação e a pesquisa por certo não serão incentivadas. A busca por manter concepções unilaterais, com respeito ao modelo do CNS, associada a um enfrentamento ao modelo da FAETEC, o interesse em alcançar um status universitário para o CNS dissociado do diálogo com as universidades fizeram com que o Instituto se envolvesse em embates trazendo de volta as intervenções. Embora o projeto seja denso e bem elaborado (como afirmamos) e tenha fôlego para uma boa formação, uma das críticas que fazemos não é ao projeto em si, mas à forma como foi posto em prática pelos seus implementadores. Como em momentos anteriores já deixamos algumas pistas, a visão que temos quanto aos implementadores do CNS do ISERJ é a de que estes evocaram a história, apropriando-se equivocadamente da concepção de Universidade de Educação, elaborada por Anísio Teixeira, colocando o ISERJ em rota de colisão com a sua própria história. Essa posição de isolamento é perfeitamente vista na fala de um dos professores integrantes da equipe de implementação do projeto do CNS do ISERJ, o qual entrevistamos, quando destaca que: “Hoje o Curso Normal Superior do ISERJ não existe para atender aos preceitos legais. Existe como um processo de resistência para manter a história institucional do Instituto, que é formar professores de CA a 4ª série da educação infantil. Tanto é que as resoluções que prevêem o Normal Superior e os ISE permitem habilitações de professores de toda a educação básica, inclusive prevê mestrado profissional. Não é exatamente nosso perfil. A gente só está fazendo exatamente o que fizemos e com competência histórica para fazê-lo, que é formar professores de CA a 4ª séries e professores da a educação infantil. Então, nesse sentido, o CNS do ISERJ existe hoje; ele é fruto de um processo de resistência em tensão permanente, em tensão histórica com as disposições incisivas, autoritárias do governo. Mas é fruto, sobretudo, de um processo de resistência interna.” O processo de resistência em que vivia o ISERJ e as tensões que geraram o CNS, tanto para com a FAETEC, como para com o governo estadual e em suas próprias instâncias internas, são perfeitamente compreensíveis do ponto de vista político e ideológico. Elas passaram mais ainda a existir quando o ISERJ construiu para si um projeto próprio. No entanto, os implementadores não podem tratar como histórica uma concepção de educação que não veio propriamente de Anísio Teixeira. A resistência que o Instituto criou não pode ser atribuída à história, primeiramente porque foi uma resistência política à FAETEC e a alguns dispositivos legais, como a possibilidade conferida pela Resolução nº 01/99, no seu artigo 1º inciso V, de conferir aos ISE a condição ou autorização para criarem cursos de Pós-Graduação voltados à educação básica. Se o CNS do ISERJ não previa esse tipo de formação, não poderia desconsiderá-la pelo veio histórico, porque a visão de Anísio era tornar o Instituto um locus de formação em todos os níveis de ensino, mas nunca um locus isolado. Os embates em que se envolveu o CNS do ISERJ nos seus primeiros anos deramse, em nossa compreensão, mais pela dificuldade de relações entre o Instituto e as demais instâncias formadoras de professores da educação básica81 do que propriamente por uma conexão com a concepção do professor Anísio Teixeira, quando criou a Escola de Professores. 3.7 - A importância de um Projeto Integrado entre o CNS do ISERJ e as Universidades Públicas Quando em 1932 foi divulgado o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, ocasião em que o grupo dos renovadores da educação assumiu o controle da ABE (Associação Brasileira de Educação), uma das bandeiras comuns entre os escolanovistas era a compreensão do papel da universidade na formação de professores. Mendonça (2002) delineia muito bem esses contornos, quando observa que críticas ferrenhas eram feitas às instituições isoladas de ensino superior, que nunca avançaram os limites de uma formação profissional de caráter técnico no Brasil. Essas críticas eram voltadas também à necessidade de se formar pensadores, sábios, cientistas, técnicos, educadores, professores, dentro da universidade, pois, afinal, uma nação se constrói pelo conhecimento e por quem ajuda a construí-lo e a consolidá-lo. Essa era a principal defesa do movimento desencadeado em 1932. Por essa causa, Anísio empenhou-se muito na criação da UDF, inserindo na estrutura daquela recém-criada universidade o Instituto de Educação. Pelas concepções anisianas, o magistério deveria ter um só corpo e a universidade assumiria a função de bem formar os professores. Como nos aponta Mendonça (2002): “No caso específico da UDF, a universidade aparece como ápice de um processo que Anísio chamava de “transformação 81 Aqui nos referimos às universidades públicas e aos outros seis Institutos Superiores de Educação do estado. ampliativa” da antiga Escola Normal em que o Instituto, se completava com sua absorção pela universidade. A Escola de Educação tem um papel absolutamente central dentro do projeto de Anísio.” (Mendonça, 2002, p. 26) Ou seja, claramente percebemos que do ponto de vista anisiano, a Escola de Professores era uma continuidade da Escola Normal, com o objetivo de tornar o professor um conhecedor profundo do seu ofício. A resistência anisiana era veemente a um projeto que isolasse a formação de professores da universidade, até porque a Universidade de Educação era assim conhecida por realizar um intercâmbio entre os diversos níveis de formação, e por esses níveis ficarem ligados à experiência e ambiência universitárias. Anísio se preocupou em trazer a formação de professores a uma experiência científica plural; seu objetivo primordial era conferir à educação o estatuto de ciência. Para tanto, preocupou-se em congregar a Escola de Educação, denominação que passou a ter o Instituto como parte da Universidade do Distrito Federal, criada em 1935. A Escola de Professores passou a ser mais uma das instâncias formadoras de profissionais, convivendo, na mesma instituição, com cursos nas áreas de Ciências, Economia, Direito, Filosofia e Artes. Mendonça (2002) ressalta o objetivo central da Escola de Professores, que foi o de promover o magistério em todos os níveis, mas salienta também seu propósito de concorrer como centro de documentação e pesquisa para a formação de uma cultura pedagógica ampla. Nesse sentido, Vidal (2001 p.56) remete-nos à compreensão de que o Instituto de Educação surgiu da incorporação do Jardim de Infância, Escola Primária e Escola Secundária à Escola de Professores, tentando cumprir a função de integrar o ensino das diferentes unidades, “...objetivando a formação científica do professorado carioca.” Por seu legado, Anísio jamais pensou em fazer da Escola de Professores um local separado, estanque, sem proporcionar aos professores uma formação múltipla. Portanto, de forma alguma a Escola de Professores pode ser confundida com a atual infra-estrutura do Instituto de Educação e seu CNS. Tampouco pode ser atribuído ao atual “ISERJ” o adjetivo de sucessor natural da Escola de Professores, como se o modelo de 1932 tivesse sido transposto historicamente para o Instituto na condição atual, mesmo que assim se perceba. Cada momento histórico teve a sua importância, bem como as sociedades de ontem e de hoje possuem diferenças substanciais de tempo e de realidade vividos em seu contexto. A experiência anisiana respirava o ar universitário, e foi vivida num momento de efervescência crescente com a criação das primeiras universidades brasileiras: Universidade de São Paulo (USP), criada em 1934 por Fernando de Azevedo; Universidade do Distrito Federal (UDF), criada em 1935 por Anísio Teixeira e Universidade do Brasil (UB) criada em 1937, com a extinção da UDF, pelo Estado Novo, no governo de Getúlio Vargas, como resultado da fusão das duas imediatamente anteriores. Retornando ao contexto do ISERJ, percebemos que o isolamento em que se envolveu, promovido pelo CNS, atribuído como um sucessor das idéias anisianas, nada mais é do que um equívoco. Isso porque o patriarca da Escola de Professores, como afirmamos, jamais admitiu isolar a formação de professores da educação básica da ambiência universitária. Cremos que os questionamentos feitos pela equipe implementadora do ISERJ quanto às posições tomadas pela FAETEC foram muito pertinentes e necessários, dado o grau reducionista do projeto elaborado pela equipe da Fundação. A decisão do grupo do CNS do ISERJ em resistir ao primeiro projeto da FAETEC foi madura e seria reforçada e ajudada por outras instâncias formadoras, inclusive as próprias universidades públicas, se o Instituto não cometesse o equívoco, ele mesmo, de aproveitar sua independência institucional, conferida pela LDB 9.394/96 e mais diretamente pela Resolução CNE/CP 01/99 e do Parecer CEE 258/98, para confundi-la com a possibilidade de também isolar-se no debate intelectual, objetivando chamar a si a responsabilidade de criar uma infraestrutura pesada, de porte universitário, com Colegiado de Curso, Diretoria e Conselho Superior e Diretoria Acadêmica e Administrativa, para com isso resolver seus problemas também de forma isolada. Com isso, o ISERJ adotou uma postura corporativista, não se submetendo à FAETEC nem tampouco debatendo e expondo seus anseios com as universidades. Quando o fez, e uma delas na UFF, no ano 1999, adotou uma atitude explicativa e defensiva, através da Coordenação do CNS, quando foi convidado a participar de mesa de debates com outros professores da casa. A experiência do Instituto de fato existia e existe, porém no âmbito da formação de professores em nível médio, principiando, com o CNS, a formação em nível superior. As vivências obtidas por seu corpo docente, em nível de pós-graduação stricto-sensu, tão necessárias para o aprofundamento da pesquisa e a formação de um profissional mais emancipado no seu saber, constituíram-se quase que unicamente suas trajetórias vividas em pesquisas para obtenção do grau de mestre, porque dentre eles ainda não havia, como não há até o momento em que redigimos este trabalho, nenhum professor com o título de doutor. Conseqüentemente, cremos que, mesmo assim, tais experiências são insuficientes para construir um curso dessa natureza sem associação necessária com as instâncias formadoras, de caráter universitário, em experiência em pesquisa, notadamente as universidades públicas82. As experiências da formação stricto-sensu exigem continuidade do profissional para sua maior emancipação, o que somente os Núcleos de Pesquisa das universidades (e destacamos as públicas) têm condições de aprofundar. É no debate constante, na investigação e no contato com a prática de outros profissionais e suas pesquisas, vistas de diversos ângulos, que um profissional emancipa-se do seu próprio saber, conferindo-o a outro profissional, e dele absorvendo outros saberes. A construção do conhecimento dá-se de forma múltipla e gradual, num exercício constante da diversidade, o que uma instituição isolada, solitária em seu processo de formação, por mais excelência e experiência que possua, dificilmente conseguirá conferir a seus profissionais. Não encontramos, no meio dos professores do CNS, exemplos relacionados com esta questão, a não ser dos professores que encontram realizando mestrado e doutorado, que constituem número reduzido. O isolamento do ISERJ das universidades e da própria FAETEC, e sua estrutura pesada, constituída, como identificamos, por Colegiado de Unidade e diretoria de ensino superior, entre outras, fez, a nosso ver, seus professores e direção confundirem sua missão ou considerá-lo uma instituição universitária. Fez também com que a instituição se calcasse num equívoco histórico, pois sua experiência real de formação sempre se deu historicamente em nível médio, descontando-se o período da UDF. Status profissional e algumas vaidades individuais dentro de uma instituição centenária, movidos pela possibilidade de ascendência funcional e melhorias salariais, fizeram com que o ISERJ “embarcasse numa canoa com muitos furos”, quando poderia trilhar um caminho partilhado, com mais humildade acadêmica, em busca da excelência na superiorização da formação dos docentes. Não queremos afirmar com isso que o ensino que lá é ministrado não é de boa qualidade; e nem teríamos elementos para fazê-lo neste trabalho, por não ser nosso objeto de discussão e análise. Tampouco queremos afirmar que as instituições isoladas não 82 Cabe ressaltar que as universidade públicas detêm maior experiência por alavancarem núcleos de pesquisa permanentes, mantidos pelas agências de fomento, e onde a produção intelectual é uma constante, forjando gerações de pesquisadores renomados e tarimbados, que em sua maioria dedicam tempo integral à causa da produção intelectual e à atividade docente. prestam ao país um serviço de qualidade na área de formação de professores. O que nos propomos a afirmar simplesmente é que a universidade, principalmente a universidade pública, sempre foi e sempre será o locus privilegiado de formação de professores por ser um canal conjunto de atividades de ensino, pesquisa, extensão e intercâmbio cultural. Isso percebemos dentro do próprio espaço do Instituto, pois os professores que estão cursando mestrado e doutorado, o fazem em universidades, pois, das instituições isoladas sediadas no estado do Rio, nenhuma está habilitada a oferecer essa modalidade de curso. Quanto à experiência da escola de professores, evocada como exemplo pelos formuladores e entusiastas do projeto do CNS do ISERJ, essa cessou em 1939, com a extinção da UDF e a fusão de seus quadros com a Universidade do Brasil (UB), retornando o Instituto à formação em nível médio, incorporando-se como unidade da recém-criada Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL). Outro ângulo a ser analisado é a atuação desses profissionais na orientação científica dos alunos. Os professores que atuam no CNS do ISERJ são, sem dúvida, muito experientes na ação de formar professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental em nível médio. Em vários casos essa herança é fruto de suas militâncias no próprio Instituto e em outras escolas de mesmo nível e mesma modalidade. Entretanto, mesmo com a quase totalidade83 desses professores possuindo cursos de especialização e mestrado, muitos ainda não possuem vivência e experiência de campo necessárias à orientação dos alunos nos trabalhos monográficos exigidos pelo próprio CNS, por não estarem ligados em sua maioria a algum núcleo de pesquisa acadêmica, o que certamente limita essa orientação, conforme verificamos no grupo do CNS, no momento em que lá estivemos desenvolvendo pesquisa de campo. Vários professores, entretanto, encontravam-se buscando orientação sobre como ingressar em Programas de Mestrado. Quanto à pesquisa desenvolvida isoladamente para a elaboração de monografias, dissertações e até mesmo teses, a mesma é insuficiente para a orientação, não oxigenada 83 Até o ano de 1998, do total de professores da Educação Básica e Superior do ISERJ como um todo, 22 professores possuíam mestrado em alguma área do conhecimento e 71 possuíam especialização. Desses 71, por conta do parágrafo 1º art. 4º da Resolução CNE/CP 01/99 ao longo dos últimos quatro anos boa parte foi aprovada em programas de mestrado de algumas universidades, em sua maioria públicas. Até o ano de 2002 dentre os 43 professores que compunham o quadro de docentes do CNS, 20 possuíam o título de Mestre e 23, o titulo de Especialista, com algum curso de pós-graduação lato-sensu. A partir desse ano o mesmo passou a contar com quatro doutorandas, uma das quais, com defesa prevista para dezembro de 2003. Do total de 43 professores do CNS, 13 cumprem carga horária de 40 horas, 28 cumprem carga horária de 20 horas, um cumpre carga horária de 24 horas e um cumpre carga horária oito horas. Fonte: Relatório da Comissão Especial de Avaliação Externa do Curso Normal Superior do ISERJ (DIRPE/FAETEC) e entrevistas com professores do CNS do ISERJ. pelos exercícios diuturnos dos embates e debates na academia, que estabelecem a consolidação de um saber elaborado e solidamente construído sob o olhar crítico de vários outros professores. Torna-se imperioso, portanto, que o professor tenha vivência constante não somente no seu espaço de atuação ou no seu espaço de formação, mas faça dos espaços vividos um campo de pesquisa em permanente diálogo com outras instâncias formadoras e com espaços de discussão, para que sua prática diária seja aperfeiçoada, num contínuo exercício de construção de um saber melhor elaborado. Assim fazendo, o saber estará em constante movimento. Essa prática requer do professor a participação em atividades de campo mais densas e que tenham acompanhamento, bem como em espaços de discussão especializados. Nessa ótica, não há como negar que a universidade (e principalmente as públicas) é o canal por excelência, o locus natural para que a formação docente se dê em condições favoráveis ao próprio exercício da docência, pois constitui-se como possibilidade plural e inter-relacional dessa formação. Nenhuma instituição isolada pode adquirir essa experiência sem que se lance com humildade intelectual a uma interlocução, a uma contínua argüição do seu papel formador e social, objetivando a possibilidade de um diálogo com outras instâncias formadoras, em especial com a universidade. Não se trata de subordinação, mas de uma troca de experiências, de um diálogo interinstitucional. Percebemos que, no caso do ISERJ e de seu CNS, houve uma supervalorização do seu projeto por ter sido ele um projeto-piloto, construído por seus próprios docentes, embora com acompanhamento especializado. Por isso o projeto foi tão defendido pelos seus pares e os professores que constituíam o CNS do ISERJ (aqueles cedidos pela SEE) resistiram tanto ao diálogo para sua realização. Com a efetivação desse projeto e a cessão definitiva dos professores que nele atuavam como docentes, haveria a esperança de transformarem-se de uma hora para outra em professores de nível superior, elevando-se assim o seu status, não somente do ponto de vista financeiro com também profissional. No entanto, um professor não é construído somente de experiências cotidianas, mas de vivência no nível em que milita. Quanto à tão evocada experiência para a formação do professor, sinalizada pelo ISERJ/CNS como instituição, na defesa do seu projeto, encontramos no professor Anísio Teixeira um exemplo bem claro, ao destacar a importância da universidade pública no processo de formação do professor. Segundo Mendonça (2002): “Para Anísio a função da universidade é única e exclusiva, já que não se trata somente de difundir conhecimentos nem de preparar práticos ou profissionais de ofícios e artes. (...) Trata-se de manter uma atmosfera de saber, para preparar o homem que o serve e desenvolve. Trata-se de conservar o saber vivo e não morto, nos livros ou no empirismo das práticas não intelectualizadas. Trata-se de formular intelectualmente a experiência humana, sempre renovada, para que a mesma se torne consciente e progressiva.” (Mendonça, 2002, p.24 apud Teixeira, 1935 p.25) No entanto, vários outros profissionais ainda hoje continuam a confundir a experiência compartilhada em uma instituição de nível superior, com uma experiência adquirida na ambiência universitária, o que pode ter influenciado a decisão do ISERJ em não acolher, de modo mais expressivo, a universidade em seu projeto. 3.8 - As lutas intra e interinstitucionais no governo do estado e a consolidação do projeto do CNS do ISERJ Durante todo o ano de 1999, o governo de Anthony Garotinho passou a se organizar administrativamente, por estar vivenciando uma situação política em que vários partidos de esquerda se uniram constituindo uma frente para governar o estado, conforme citamos, constituída pela frente PDT, PSB, PT e PC do B. Os partidos, embora unidos para dar sustentabilidade política ao governo, traziam suas ânsias de programas que gostariam de ver desenvolvidos. Na repartição políticoadministrativa, o PDT, PT e PSB dividiram a administração da Secretaria de Educação, enquanto o PC do B e uma pequena parcela do PDT compartilharam a administração da SECTI/FAETEC. A idéia do Secretário e do Subsecretário de Educação era, a princípio, reconstituir o pertencimento da FAETEC à SEE, entendendo ambos que o ensino deveria ficar com a SEE e a ponta da pesquisa tecnológica com a SECTI. Como o Secretário percebeu que isso seria impossível, pois as redes já haviam se organizado diferentemente na forma de gerir as escolas, o mesmo procurou então realizar uma administração conjunta da FAETEC com representantes das duas Secretarias, visando restabelecer um comando único na educação do estado, o que chamou de “co-gestão”, e que seria efetivado através de um consórcio entre as mesmas, e que também não logrou êxito. Por conseguinte, havia toda uma visão, por parte do PDT, de revitalizar o projeto pedagógico dos CIEP, com a proposta de que pelo menos setenta unidades fossem primeiramente recuperadas, a fim de funcionarem novamente em tempo integral. Com isso, o PDT começou a criar uma tensão no governo, a fim de ganhar mais espaço político. A Secretaria de Educação também objetivava a criação do SIEB (Sistema Integrado de Educação Básica) em que estabeleceria ações conveniadas entre os municípios e o estado, descentralizando as políticas educacionais, visando, por exemplo, que se determinado município tivesse carência no ensino fundamental, e o mesmo tivesse à disposição um prédio para uso, o estado, através da SEE acionaria professores, sanando tal dificuldade, e vice-versa. Com isso, os professores de ambas as redes (municipal e estadual) trabalhariam de forma integrada no ensino fundamental e em programas de capacitação e atualização para os professores. O SIEB não chegou a ser criado, mas a SEE e as Secretarias de algumas prefeituras do estado, como Duque de Caxias, Resende e Angra dos Reis, conseguiram trabalhar em parceria, estabelecendo matrículas conjuntas para que algumas ações fossem implementadas entre os professores da Rede estadual e dos municípios. Embora o governo fosse sustentado por uma frente partidária, a política desencadeada pelo governador era a de estimular a implantação de novas escolas técnicas no interior do estado, fato que fez com que a maior parte dos recursos fossem destinados à SECTI. Conseqüentemente, como o governo não apoiou a maioria das políticas que vinham da Secretaria de Educação, particularmente provenientes do PDT, uma crise foi gerada entre o referido partido e o governo, desencadeando no mês de outubro de 1999, o pedido de exoneração do Secretário de Educação, e em novembro do mesmo ano o pedido de exoneração do Subsecretário, ficando o PT na SEE e no governo até fevereiro de 2000. O PC do B continuou a exercer sua hegemonia na SECTI e mais diretamente na FAETEC. No mês de agosto de 1999, após estruturarem o CNS, com seu Conselho Superior, Colegiado, Núcleos e Coordenações, os interventores, juntamente com o Conselho de Professores, se movimentaram no sentido de novamente eleger a diretoria do Instituto, não incluindo o CNS, que continuou a ser gerido pelos professores implementadores do Curso, tendo à frente uma professora como representante, autorizada pelo Conselho Estadual de Educação a implementar o Curso. No mesmo mês, foi eleito democraticamente o novo diretor da unidade, para cumprir mandato até agosto de 2001, permanecendo o interventor, professor Livingstone, a responder como Diretor de Ensino Superior até fevereiro de 2000, quando sofreu pressão política por parte da FAETEC para deixar a casa, por não pertencer aos quadros da Fundação. Esse acontecimento marcou o início de um tensionamento entre a FAETEC e o ISERJ (mais diretamente com os representantes do CNS) pela hegemonia da instituição e do curso. Neste ínterim, as aulas no CNS, que haviam iniciado em 1º de junho, continuavam sem interrupção até primeiro de outubro, quando terminou o primeiro período. Entretanto, um fato interessante foi que, das 200 vagas abertas para a primeira turma do curso, quase a metade não fora preenchida por conta do período de reformulação do projeto, em que vários candidatos, aprovados no exame vestibular de 1998, desistiram ou migraram para outras instituições. Com a saída dos interventores (professor William Campos, ainda em 1999, e professor Livingstone, em fevereiro de 2000) o ISERJ e mais diretamente o CNS começaram a viver um período conturbado. Vários impasses aconteceram entre o diretor geral, que fora eleito, e a coordenação do CNS e seus professores, porque o diretor não prestigiava as atividades do CNS, segundo uma de nossas entrevistadas, “...desenvolvendo um trabalho muito contrário ao CNS...”, dando prioridade aos ensinos fundamental e médio. A última turma do Curso Normal de nível médio do Instituto formou-se em 2000. Deste momento em diante, o ISERJ passou a contar, em sua estrutura, apenas com a educação infantil, o ensino fundamental e o CNS. A partir do ano 2000, o CNS passou a contar efetivamente com a coordenadora do curso já efetivada, eleita pelos professores implementadores do curso, passando também a contar com o Colegiado de Unidade, composto pelos coordenadores de áreas. No final do ano 2000, novo vestibular foi realizado. A primeira turma do CNS concluiu o segundo período em fevereiro de 2001. Um novo impasse fora iniciado. Uma série de irregularidades administrativas apontadas derrubaram o diretor do Instituto. Afastado o diretor, em fevereiro de 2001, assumiu como Diretora-em-Exercício a professora Therezinha Nóbrega, proveniente da FAETEC. A partir deste momento houve uma certa calmaria nas atividades acadêmicas e administrativas da unidade. Durante a permanência da professora Therezinha Nóbrega, a FAETEC, através da Resolução 071/00, constituiu uma Comissão Especial de Avaliação Externa, para avaliar o CNS do ISERJ, antes mesmo da avaliação para reconhecimento do curso pelo MEC. A Comissão entendia o trabalho como uma “...tarefa delicada devido a circunstâncias institucionais internas.” (ofício enviado pela Comissão ao Secretário de Ciência e Tecnologia do Estado, em 2 de maio de 2001) A referida comissão realizou seus trabalhos de dezembro de 2000 a março de 2001, observando vários aspectos internos. A FAETEC, através da Comissão estabelecida, pareceu dar “um tiro no próprio pé”, pois apontou as seguintes questões internas: - divergências existentes entre a Direção Geral, a Educação Básica e o CNS, que tensionaram as relações entre essas instâncias, causando rupturas dentro do próprio Instituto; - situação funcional dos professores, que necessita de análise jurídica e implementação de alternativas cabíveis; - dicotomia existente entre a política de formação de professores defendida pela FAETEC e a proposta acadêmica do CNS; - necessidade de adequação das instalações físicas do CNS e atualização do acervo da biblioteca, considerado insatisfatório; - reestruturação curricular com revisão das ementas. A Comissão avaliou e propôs, por conseguinte, a criação de um Grupo de Trabalho, a ser indicado pela SECT, pela FAETEC, pela direção do ISERJ e pela Coordenação do CNS, a fim de refletir e estabelecer estratégias de ação adequadas à plena implementação do CNS do ISERJ. A situação do CNS do ISERJ, embora estabilizada pelo Parecer 258/98, permanecia na dependência de diversos fatores para consolidar-se como espaço formador, enfrentando vários embates de ordem externa e interna. No entanto, durante a permanência da Diretora em Exercício, com a calmaria existente, foi possível ao CNS do ISERJ organizar um evento, visando homenagear o centenário de nascimento do professor Anísio Teixeira. O ISERJ promoveu em suas dependências o já citado “I Encontro do Curso Normal Superior do ISERJ - Diálogos em Formação”, visando resgatar a memória daquele renomado educador. A comunidade do Instituto foi envolvida e o evento incluiu a participação dos alunos e vários professores da unidade, marcando presença professores de várias universidades do estado. Como resultado do Encontro, uma publicação, batizada de Diálogos em Formação foi compilada, reunindo textos de alguns professores da instituição e de alguns professores das universidades presentes ao evento, e da própria filha de Anísio, a senhora Anna Christina Teixeira Monteiro de Barros (Babi Teixeira). A Diretora-Interventora conduziu as atividades do Instituto até o mês de outubro do mesmo ano, quando pediu exoneração do cargo. 3.9 - Novos espaços de disputa hegemônica no ISERJ/CNS Ainda no ano 2000 a FAETEC havia contratado uma Consultoria externa84 para preparar um projeto de implantação e implementação de cinco novas unidades de ISE no interior do estado do Rio de Janeiro. Este projeto não seria o mesmo constituído no governo de Marcello Alencar, tendo em vista que além de ser elaborado por uma consultoria externa, trazia nuances diferentes, que detalharemos no capítulo seguinte juntamente com o projeto. A política estabelecida pelo governo Garotinho para o desenvolvimento do interior do estado era prioritária. Para tanto, foi estabelecida uma ligação direta entre a presidência da FAETEC e o governo, visando a desenvolver o interior do estado mediante escolas técnicas, procurando, para tanto, ampliar as relações com as prefeituras dos municípios, que seriam os maiores beneficiados. Os novos ISE faziam parte desse planejamento. Importa compreendermos, que embora a FAETEC não tenha se manifestado diretamente nas relações entre ISERJ, SEE e interventores, no início do governo Garotinho, com a saída do professor Livingstone, a Fundação tinha demonstrado o interesse de constituir o ISERJ como unidade-piloto no novo projeto de ISE/CNS que vinha sendo gestado e que seria colocado em prática. Mas a situação exigia cautela porque o ISERJ constituía-se como um espaço de difícil controle. Ao mesmo tempo que o Instituto era ligado à FAETEC administrativamente, parecia não sê-lo na prática, pois o mesmo agia com quase total independência devido a sua politização. Esse momento foi acentuado logo após o fim do governo Marcello Alencar e início do governo de Anthony Garotinho, quando a primeira diretora do Instituto havia sido afastada e houve a primeira intervenção, em que o projeto do CNS foi reconstruído com a participação dos professores implementadores e interventores, fato que conferiu maior autonomia política à instituição. 84 O novo projeto dos ISE para a FAETEC foi elaborado pela D&M Consultoria, pelas professoras Diomar Schoenau e Maria Lúcia Kohn. Para a FAETEC, entretanto, era preciso tentar o domínio do Instituto e do CNS (uma retomada simbólica) num momento oportuno, para que ele realmente passasse a ser parte integrante do programa de governo para a educação, que haveria de ser expandido, pois na situação em que estava corria o risco de se tornar independente. Retornando ao ISERJ, assumiu a Direção, ainda em outubro de 2001, um novo Diretor em Exercício (interventor), enviado pela FAETEC. O novo interventor, no período de sua gestão, colocou à disposição a coordenação do CNS, disponibilizando outra pessoa para assumi-la, dissolvendo também o Colegiado do CNS. Até então não havia ainda a figura do diretor de ensino superior. Esse período foi marcado por outro grande embate envolvendo a presidência da FAETEC e o CNS: tentar adaptar no CNS do ISERJ o projeto daquela Fundação anteriormente comentado, que vinha sendo desenvolvido no interior do estado desde maio de 2001. O novo interventor assumiu com esse objetivo. A equipe que geria o CNS (coordenadora e professores implementadores), em conjunto com os coordenadores de núcleos do curso, percebendo que a atitude era impositiva, conclamou a comunidade do Instituto para uma audiência pública, a fim de denunciar a pressão que vinha sendo exercida pela FAETEC para também tomar o espaço do Instituto e definir as diretrizes do CNS, uma vez que o projeto que fora formulado num consenso entre a primeira intervenção e os professores implementadores estava sendo trocado por outro. No desenrolar dos fatos, uma consulta foi feita pelo interventor ao CEE sobre a validade da existência do Colegiado Superior para o Instituto. O Conselho se posicionou sobre o assunto, respondendo favoravelmente através do Parecer 544/2002. Anteriormente, uma consulta já havia sido realizada pelos primeiros interventores, arguindo o CEE acerca da necessidade de realização de eleições diretas para o ISERJ, que envolviam também a estrutura do CNS. Este momento de fragilidade por que passou o Instituto não favoreceu à FAETEC no sentido de retomar o poder político no Instituto. Por conta dos movimentos efetivados pela coordenação do CNS e pelos seus professores, da audiência pública e do Parecer emanado pelo CEE, a Coordenadora retomou suas atividades, o Colegiado foi restabelecido e, no mês de abril, após a transição do Governador Anthony Garotinho para Benedita da Silva (que marcou a subida do PT ao governo do estado), a situação foi revertida, gerando a saída da equipe que intervinha no Instituto, e mais diretamente no CNS. Desta feita, assumiu a direção do ISERJ uma Comissão Gestora, composta por todos os professores integrantes do CNS. Para deliberar as estratégias de ação no curso, o Colegiado do CNS passou a se reunir todas as quartas-feiras, pela manhã. O coletivo (Comissão Gestora) se reunia à tarde, para onde todas as decisões das unidades convergiam a fim de se transformarem em decisão final. Assim o Instituto passou a ser gerido. Com o avanço das discussões efetivadas pela coletividade, o Instituto começou a se preparar para novas eleições, e a FAETEC parecia não mais intervir nas decisões administrativas, trazendo à unidade uma certa autonomia, embora permanecendo ligada administrativamente à Fundação. Como podemos perceber, o CNS passou a ser a principal instância do Instituto, ficando a Comissão Gestora a responder indiretamente por toda a unidade. Este fato parece ter trazido insatisfação aos demais segmentos (educação infantil e ensino fundamental) da instituição, que se sentiram diminuídos por quase não exercerem posições nos direcionamentos que eram conferidos ao Instituto como um todo. Sobre este fato, argumentou uma das professoras que entrevistamos: “A forma com que o CNS foi implantado aqui, foi uma forma que ao invés de nos colocar próximo aos outros segimentos nos afastou e foi colocado mais ou menos à força mesmo. Não houve uma discussão na escola. A discussão, ela não perpassou os outros seguimentos, a escola básica, a educação básica.” Por este depoimento, percebemos que o mesmo movimento que a FAETEC tentou fazer com o Instituto, no alvorecer do governo de Anthony Garotinho, não querendo discutir as estratégias de ação e os rumos a serem dados pela instituição, buscando tomá-la à força, faziam agora os integrantes do CNS, não possibilitando que as vozes dos outros segimentos do Instituto fossem ouvidas, gerando descontentamento. No mês de dezembro de 2002, um novo processo eleitoral foi realizado em todo o ISERJ, para eleição do Diretor-Geral, do Diretor de Ensino Superior, do Diretor do Colégio de Aplicação (CAP-ISERJ), do Diretor Adjunto do Diretor Geral e do Diretor de Administração, bem como os coordenadores de áreas. O pleito, que desta feita mobilizou todo o Instituto (educação básica e superior), elegeu uma chapa diferente da que vinha até então coordenando as atividades do Instituto, inclusive renovando toda a coordenação e direção do CNS. Ainda no mês de dezembro, o CNS formou sua primeira turma. Com isso, o Instituto pôde solicitar ao MEC o processo de reconhecimento do curso, com a avaliação realizada pelo MEC, que na primeira avaliação do Exame Nacional de Cursos obteve conceito “A”. Com o novo governo eleito, que trouxe ao poder a governadora Rosinha Matheus, um novo diálogo, aparentemente mais democrático foi estabelecido entre a direção do ISERJ e a FAETEC, representada pela Coordenação dos Institutos Superiores de Educação, vinculada à Diretoria de Desenvolvimento de Ensino da FAETEC, que, por conta da regularização dos ISE do interior do estado, resolveu desistir dos embates e conferiu novamente autonomia relativa85 ao ISERJ. O processo de ocupação do ISERJ por interventores, se pareceu ter desenvolvido um senso de resistência nos profissionais da unidade, conseguindo reverter em parte esse processo, por parte da FAETEC, também ocasionou uma visão do Instituto como uma unidade diferenciada, optando em ter com ele, ao menos na nova gestão, um diálogo menos autocrático, estabelecendo uma diferença entre o CNS do ISERJ e os demais Institutos. A nova Coordenadora dos ISE, do Governo Rosinha Matheus, parece ter assumido, naquela perspectiva, quando afirma que: “A Coordenação é para todos os Institutos. (...) O ISERJ tomou características diferentes. Ele tem, realmente, uma força própria. Ele já tinha toda uma história de mais de cem anos de formação de professores. É um colégio criado para ser formador de professores. E por ter sido criado de uma forma diferente dos outros ele realmente tem características próprias. (...) Mas no CNS do ISERJ, a gente não pretende interferir muito porque é um curso que está dando certo.” Em função dos embates vividos, a relação política e administrativa entre FAETEC e CNS do ISERJ parece ter se estabilizado. A FAETEC parecia ter compreendido que seus planos de expansão pelo estado não poderiam pressupor o ISERJ como aliado. O ISERJ, por sua vez, entendeu a “retirada” da FAETEC da arena de lutas como um indicativo de que poderia continuar se auto-gerenciando como Instituição, principalmente no que diz respeito ao Curso Normal Superior, grande estopim de toda a problemática vivida. Há um protocolo de intenções não-escrito, mas compreendido pelas duas instituições, em que 85 Tratamos a autonomia dada ao ISERJ como “relativa”, porque embora o Instituto pareça desenvolver suas atividades com bastante liberdade de execução, o mesmo é subordinado administrativamente à FAETEC, que é sua Fundação mantenedora. ambas se reconhecem dependentes, mas os seus caminhos não se atravessam. O ISERJ recebe as verbas necessárias da FAETEC para manter sua infra-estrutura, mas decide seus próprios caminhos. No entanto, a nosso ver a autonomia defendida pelo ISERJ chama para si uma grande responsabilidade, na medida em que, quando evoca o status de instituição de formação em nível superior, necessita amadurecer, deixando de lado o corporativismo, denunciado pelo afastamento em relação às instituições universitárias (principalmente as públicas) e objetivado pela tão reclamada “vocação histórica” para a formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental, o que torna o seu diálogo precário (se é que há diálogo). A relação de afastamento simbólico entre o CNS do ISERJ e a FAETEC não deve avolumar-se, a ponto de tornar-se um isolamento do ponto de vista acadêmico. Este tipo de corporativismo, que compreendemos ser a falta de diálogo institucional com as universidades, poderá comprometer uma formação que se quer ampla, madura e democrática, trazendo conseqüências irreversíveis quando poderiam criar, para ambas, amplas possibilidades no amadurecimento de sua atuação no campo educacional. CAPÍTULO 4 O Segundo Projeto de ISE/CNS da FAETEC – as Unidades implantadas no interior do estado do Rio de Janeiro 4.1 – Apresentação Procuraremos discutir neste capítulo o segundo Projeto de Criação de ISE/CNS na Rede Pública Estadual pela FAETEC - as Unidades do interior - desenvolvendo antes, algumas reflexões sobre as estratégias daquela Fundação e sua filosofia de ação para tornálo compatível com o modelo expansionista do governo de Anthony Garotinho, que visava a desenvolver prioritariamente os municípios do interior do estado do Rio de Janeiro para garantir sustentabilidade política ao seu modelo de governo. 4.2 – A FAETEC e a nova gestão estadual Partindo novamente do início da gestão de Anthony Garotinho como governador do estado (1999-2002), observamos que a elaboração do segundo projeto dos ISE/CNS não surgiu do acaso. Dentre os aspectos de maior relevância que estão na base desse processo podemos enumerar três: - Interesse do governo de Anthony Garotinho em criar pólos de desenvolvimento tecnológico no interior do estado, visando também ampliar e estreitar as alianças políticas com as prefeituras locais; - Interesse da FAETEC em ser credenciada como Centro Universitário; e - Embate entre a FAETEC e o ISERJ para sediar o projeto dos ISE proposto pela Fundação, no novo governo. Logo que tomou posse, o governador Anthony Garotinho estabeleceu, como meta prioritária em seu programa de governo, uma política de desenvolvimento para o interior do estado, que fosse capaz de ampliar as relações com os municípios. Isso certamente se daria também para reforçar-lhe o apoio político, já antevendo a corrida presidencial nas eleições de 2002. Entretanto, para que tais objetivos fossem estabelecidos, o governo haveria de contar com o suporte técnico da FAETEC, cujo novo presidente era o professor Carlos Augusto de Azevedo, proveniente dos quadros da UERJ. Portanto, a política educacional desenvolvida pela FAETEC haveria de atravessar em cheio os projetos previstos para o desenvolvimento do estado. Como já salientado no capítulo anterior, o embate entre a FAETEC e o ISERJ deuse sobretudo pela disputa em torno da hegemonia fluminense para a criação do CNS em uma instituição pública. O CNS representava, para o Instituto, a possibilidade de continuar exercendo, agora em nível superior, o que defendia ser sua vocação histórica: formar professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental. Considerandose pois o locus privilegiado para essa criação, evocava princípios históricos, tendo formulado um projeto próprio de CNS, como vimos recentemente. A FAETEC, por conhecer a “tradição pedagógica” do Instituto e a qualificação privilegiada de seus profissionais; por estar muito interessada em seu espaço físico, visado para consolidar um projeto amplo na educação no estado; e por ser a mantenedora do Instituto (transferido da SEE), começou a definir estratégias, objetivando implantar o seu modelo de ISE/CNS também naquela unidade. Embora o ISERJ estivesse administrativamente vinculado à Fundação, o Instituto estava acostumado a desenvolver com muita liberdade suas atividades. Quando, no entanto, a nova presidência da FAETEC tentou sitiá-lo com a idéia de um novo projeto de ISE/CNS, já em andamento, como veremos adiante, o ISERJ, que já havia definido as estratégias para um projeto próprio de formação, resistiu. A administração da FAETEC, percebendo que seria desgastante naquele momento, para o governo, um choque maior com a instituição (o que já acontecera anteriormente) e que um embate de grandes proporções, sobretudo envolvendo a opinião pública, poderia trazer perdas políticas consistentes, resolveu abrir mão de utilizar o espaço físico da unidade para implantar o projeto, reavaliando as metas e condições dando continuidade a essa implantação em outros locais, como já vinha fazendo desde maio de 2001, nas cidades de Santo Antônio de Pádua e Itaperuna. Convém ressaltar que o projeto de criação dos ISE no interior corria em paralelo com outra visão da FAETEC, que era a de implantar os Institutos Superiores de Tecnologia (IST), esses projetados para formar tecnólogos de diversas áreas em nível superior. Com esse modelo amplo de ensino superior (IST e ISE/CNS), a FAETEC procuraria desenvolver a idéia de vocação dos municípios, criando neles espaços formativos que subsidiassem o ensino em torno de áreas peculiares. Com tal visão, a FAETEC criou através de decretos, quatro unidades de IST no estado: duas unidades que ofereceriam cursos de formação de Tecnólogos em Ciências da Computação (uma no bairro de Quintino, na cidade do Rio de Janeiro e outra em Petrópolis); uma unidade que ofereceria o curso de formação de Tecnólogos em Ciências Ambientais, localizada na cidade de Paracambi, interior sul do estado; e uma unidade que ofereceria o curso de formação de Tecnólogos em Horticultura, localizada na cidade de Campos dos Goitacases, interior norte do estado. 4.3 - A Filosofia do Segundo Projeto de ISE/CNS da FAETEC: entre o profissional e o tecnológico Para compreender o novo projeto de ISE/CNS da FAETEC e a visão de interiorização empreendida pelo governo estadual e pela própria Fundação, faz-se necessário nos remetermos novamente à política nacional vigente na área da educação. Apoiando-nos em Neves (2002), verificamos que o nível das instituições de ensino superior no Brasil, no plano vertical, sofreu, a partir dos anos 90 do século XX, principalmente nos dois governos de Fernando Henrique Cardoso, alterações substanciais. Além das universidades, caracterizadas pela pluralidade de áreas existentes, foram criadas as Universidades Especializadas, caracterizadas por concentrar suas atividades de ensino e pesquisa num campo do saber. Também foram criados os Centros Universitários configurados como uma nova modalidade de instituição de ensino superior pluricurricular (a partir do Decreto Federal nº 3860/01). Estes foram caracterizados por ofertar ensino de graduação, gozando de autonomia e prerrogativas, como criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e programas de educação superior, assim como tendo possibilidade de remanejar ou ampliar vagas já existentes, não necessitando, porém, de manter atividades de pesquisa e extensão. No plano horizontal, por sua vez, surgiram as instituições não-universitárias, para atuar “...numa área específica de conhecimento ou de formação profissional.” (Neves, 2002, p.49). Essas instituições passaram a ser compostas por Faculdades Integradas (que abrangem mais de uma área de conhecimento), Faculdades Isoladas, Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFET’S), criados a partir da Lei 8.948 de 08/12/94 e regulamentados pelo Decreto Federal nº 2.406/97 (que são IES técnicas), e por dois novos tipos de instituições: os Institutos Superiores de Educação (ISE) e os Centros de Educação Tecnológica (CET’S), estes servindo de perfil para a criação dos IST no estado do Rio. Para efeito de nossa pesquisa, e em particular, deste capítulo, evidenciaremos mais diretamente os ISE. Partindo da reforma universitária, estabelecida pela Lei 5.540/68 e evidenciada a legislação ordinária acima citada, a organização acadêmica da educação superior no Brasil ficou hierarquicamente estabelecida da seguinte forma: Instituições Universitárias, compostas por universidades e universidades especializadas; Centros Universitários e Instituições Não-Universitárias, compostas por Faculdades Integradas, Faculdades Isoladas, CEFET’S e CET’S e Institutos Superiores de Educação. Voltando ao plano estadual, com o apoio do governo estadual, a FAETEC parecia aproveitar-se dos tempos de mudanças legais na esfera administrativa federal para convencer-se de que a política desenvolvimentista (dentro de uma linha evolutiva)86 seria a melhor opção política a ser implementada, aproveitando, logicamente, o interesse do governo ora estabelecido. Como vimos em momento anterior deste trabalho, a FAETEC, desde a sua criação e transferência para a Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, realizada a partir do Decreto 22.011/96, vinha agigantando-se e ampliando sua inserção na educação pública do estado em todos os níveis de ensino, tornando-se quase uma nova Secretaria de Educação. No entanto, ainda no ano de 1997, a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) havia promulgado a Lei Estadual nº 2.735, de 10 de junho de 199787, na qual procurou deixar claro no artigo 2º do texto legal, dentre outros aspectos que: “A FAETEC, Fundação vinculada à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, sem prejuízo das atribuições determinadas pela Lei que a instituiu, atuará no gerenciamento da Rede de Ensino Tecnológico do Estado do Rio de Janeiro.” (sem grifos no original) 86 Relembramos que as políticas desenvolvimentistas no estado do Rio de Janeiro originaram-se no governo Faria Lima e foram ampliadas no governo Marcelo Alencar. O governo de Anthony Garotinho, com nuances um pouco diferentes, parecia dar seguimento às citadas políticas, desenvolvendo-as através da FAETEC. 87 Esta Lei Estadual, que dispõe sobre o quadro permanente de pessoal da FAETEC e dá outras providências, veio substituir a Lei 1.176, de 21/07/87, que criou a FAEP, de mesmo teor, só que vinculada à SEE. Já em 05/04/2002, a ALERJ voltou à cena para aprovar a Lei nº 3.808, que alterou a natureza jurídica da FAETEC e o regime de pessoal dos seus servidores. Interessante verificarmos que essa mesma lei, em seu artigo primeiro, vem observar que: “A Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro – FAETEC, responsável, na forma da Lei nº 2.735/97, pela educação profissional, nos níveis básico, médio e superior, e pelos institutos superiores de educação, aí atuando como Centro Universitário, passa a ter natureza de direito público.” (sem grifos no original) Três fatos relevantes apareceram nos dois textos legais. O primeiro remete-nos ao artigo 2º da Lei 2.735/97 (a mais antiga), que enfatiza a responsabilidade da FAETEC pelo ensino Tecnológico. O segundo fato é visto no artigo 1º da Lei 3808/02 (a mais recente), atribuindo à FAETEC a responsabilidade pelo ensino profissional nos níveis básico, médio e superior, na esfera pública estadual. O terceiro fato relevante está presente no mesmo artigo, que também fala da atuação da FAETEC como Centro Universitário em virtude da existência dos ISE, como se simplesmente pela existência destes a FAETEC passasse a gozar dessa prerrogativa. Se compararmos o artigo 2º da Lei 2.735/97 com o artigo 1º da Lei 3.808/02, verificaremos que o primeiro artigo afirma ser a FAETEC responsável, no âmbito do estado, pelo ensino tecnológico na Rede Pública. Já o segundo artigo citado atribui à FAETEC a responsabilidade pelo ensino profissional nos níveis básico, médio e superior. A FAETEC, entretanto, desde a transferência do Instituto de Educação do Rio de Janeiro e sua posterior transformação em ISERJ, passou a intitular-se como “responsável” pelo gerenciamento da política de formação dos professores da Rede Pública Estadual para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental em nível superior, quando o Instituto deixou efetivamente de ser vinculado à SEE. Segundo a Resolução CNE/CP 01/99, no seu artigo 1º, os ISE constituem-se como instituições de caráter profissional. Esse “caráter profissional” da lei dá margem a interpretações que vão desde cursos mais rápidos e técnicos na área da educação, até cursos em nível de pós-graduação. A FAETEC utilizou-se das brechas legais para demarcar mais a fundo sua área de atuação e afirmar-se como natural administradora dos ISE no estado, unindo o caráter de educação profissional que lhe era atribuído pelo artigo 1º da Lei 3.808/02 ao caráter de instituição profissional estabelecido pela Resolução 01/99. O que mais nos chama a atenção, no entanto, é que a Fundação, com tal atitude, não escondeu sua atribuição específica concedida pela lei 2.735/97 (instituição de caráter tecnológico), que permaneceu intacta, vigendo ainda na referida lei. Isso porque seu real interesse era demarcar a formação de professores, tratando-a como “de caráter profissional”, e, neste ponto, submetendo-a a um profissionalismo mercadológico expansionista, de características eminentemente técnicas, para difundir o ensino tecnológico por todo o estado. Nesse sentido, a formação de professores seria utilizada apenas para agregar forças ao projeto principal, que era o desenvolvimento tecnológico do estado através de pólos nos municípios. Era necessário, entretanto, que a FAETEC, para estender sua atuação em caráter profissional numa área que não era de sua jurisdição ou “natural atribuição”, modificasse seu caráter de atuação no texto legal, pois, do contrário, como poderia se justificar o fato de uma entidade atuante na área tecnológica ser responsável pela formação de professores para a educação infantil e ensino fundamental? Nesse caso, valeriam muito as interpretações do termo “profissional”. Isso certamente representaria e representa um paradoxo. Além disso, ao utilizar as polpudas somas financeiras destinadas ao ensino tecnológico, a FAETEC também poderia expandir-se em outros níveis e modalidades de ensino, tornando-se uma “outra” Secretaria de Educação, esta com excelência no ensino. Utilizando o termo “profissional” e mantendo o termo “tecnológico” na nova lei estadual, a FAETEC manteria a sua atribuição principal, a formação técnica e tecnológica (com os IST), passando a atuar em nível profissionalizante, nos setores primário, secundário e terciário, bem como na educação infantil, fundamental e nos níveis médio e superior, este último, com o projeto mais recente dos ISE/CNS do interior88. 88 A FAETEC mantém, na Educação Infantil para crianças na faixa etária de até 3 anos, 11 meses e 29 dias, quatro creches: no CETEP Quintino, CETEP Santa Cruz, no ISERJ e ISEPAM (Instituto Superior de Educação Professor Aldo Muylaert). Nas mesmas unidades funcionam creches para crianças na faixa etária de 4 a 5 anos, 11 meses e 29 dias. O Ensino Fundamental (CA a 4ª série) é mantido nas unidades EEEF República, ISERJ e ISEPAM. De 5ª a 8ª série, funcionam na EEEF República, CETEP Barreto, EEEF João Sarlo, EEEF Visconde de Mauá, ISERJ e ISEPAM. O ensino médio (formação geral) é oferecido nas ETE (Escolas Técnicas Estaduais) Adolpho Block, Agrícola Antônio Sarlo, Ferreira Viana, Henrique Lage, João Barcelos Martins, João Luiz do Nascimento, Juscelino Kubitschek, Oscar Tenório, República, Santa Cruz e Visconde de Mauá. Além disso, nas mesmas ETE a FAETEC oferece diversos cursos de formação profissional em nível técnico e tecnológico, em várias áreas, como: administração, contabilidade, empreendimentos, eletromecânica, eletrônica, estruturas navais, eletrotécnica, máquinas navais, mecânica, informática, produção cultural e de eventos, segurança no trabalho, enfermagem, patologia clínica, telecomunicações, turismo, prótese dentária, além de cursos de idiomas, oficinas como teatro, preparação de atores (dentre outras), cursos ligados à indústria e área de música, além de outros. Fonte: Catálogo FAETEC 2002. Assim sendo, o termo “profissional” não repercutiu tão negativamente devido ao maquiamento da expressão. Para que possamos fazer uma análise mais apurada sobre os anseios da FAETEC na educação e na profissionalização do professor, e as manobras utilizadas para a hegemonia do ensino no estado, faz-se necessário que compreendamos melhor qual dimensão de professor enquanto profissional (reflexiva ou técnica) a FAETEC assumiu. Recorrendo aos estudos desenvolvidos por Shiroma (2003, p.90) o conceito de profissionalização aparece recontextualizado pelas reformas dos anos 90 do século XX, “...abandonando-se o modelo de profissional que atendia a aspirações de natureza pública.” Com isso, a profissionalização passou a funcionar, segundo a autora, como “...um artifício para proclamar a independência do professor como especialista, detentor do saber técnico.” (2003, p.90) Nesta concepção, para Shiroma (2003, p.68) ser profissional “(...) é ser identificado como membro de uma profissão que possui algumas habilidades necessárias para ser exercida. As habilidades são mais prioritárias que o conhecimento porque ser profissional significa ser um eficiente fornecedor de um determinado produto (RIBBINS, 199089). Nessa perspectiva, limita-se a autonomia característica das profissões, e aumenta a dependência, uma vez que esta noção de profissional salienta os compromissos dele com seu cliente. Vista deste ângulo, pode-se compreender que a política educacional de profissionalização docente, no Brasil, na última década, acarretou sérias conseqüências à educação pública. Os mecanismos de controle do trabalho docente propostos por essa reforma educacional permitem afirmar que, a despeito do conteúdo positivo inscrito no conceito de profissionalização, as decorrências tendem à proletarização e à desintelectualização do professor.” Compreendemos assim que a FAETEC, dentro da visão de interiorizar o desenvolvimento através de pólos específicos, interiorizou também a política de formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental via ISE, buscando dotar esse profissional de uma visão clientelista e mercadológica, preocupada com técnicas aligeiradas de capacitação para o mercado de trabalho, e não com a emancipação intelectual e visão crítica ada vez maior desse professor. Assim, a FAETEC, ao romper com o ISERJ, e interiorizando os ISE, procurou concentrar no interior uma formação mais rápida de professores, cuja aceleração viesse a 89 Trata-se de citação da autora em RIBBINS, P. Teacher’s as professionals: towards a redefinition. In: MORRIS, R. (ed) Central and local control of education after the Era 1988. Harlo W: Longman, 1990. intervir positivamente no mercado de trabalho local. Como a visão da FAETEC era de desenvolvimento tecnológico, a forma de levar o conhecimento aos profissionais dos ISE não levou em conta a compreensão do processo ensino-aprendizagem, mas o “fornecimento” de saberes rápidos, tratando assim os profissionais locais como clientes, utilizando-se de práticas populistas para levar um ensino superior de qualidade duvidosa ao interior e prometendo, num curto espaço de tempo, habilitar todos os profissionais de acordo com a LDB 9.394/96, preparando-os para o mercado de trabalho. Certamente seria difícil à FAETEC cumprir o que estava prometendo, pois tanto o projeto elaborado para a criação e o estabelecimento dos ISE, como a própria experiência da FAETEC na formação de professores num contexto geral ainda era muito incipiente e não dependia somente dela, mas das orientações e decisões emanadas do CEE. Assim, o projeto serviu muito mais para colocar na “vitrine” os feitos do governo do estado, numa perspectiva eleitoreira que levaria mais tarde à candidatura para deputado federal o presidente da FAETEC, que propriamente resolver os problemas do interior. Com a visão de divulgar suas idéias de interiorização do desenvolvimento no estado do Rio e os feitos que supostamente havia alcançado, no final de 2001 a FAETEC compilou e distribuiu internamente uma publicação, mostrando seus objetivos e avanços. Tal publicação teve distribuição restrita aos participantes de um fórum pedagógico90, organizado por sua Diretoria Pedagógica, em que procurou deixar clara a necessidade da criação dos ISE/CNS, buscando para isso, estabelecer “ (...) convênios e parcerias da Presidência da FAETEC e as diferentes prefeituras municipais do interior do Estado a partir de julho de 2001. A necessidade de oferecer uma formação mais significativa, atual, inovadora e aproximada do mercado de trabalho foi a pedra angular que norteou o desenvolvimento, criação e expansão do Ensino Superior na rede FAETEC no interior do Estado, na gestão do presidente Carlos Augusto de Azevedo. (...) O Instituto Superior de Educação tem a função de possibilitar aos alunos formadores acesso à produção e disseminação do conhecimento através da transmissão da cultura, da investigação científica, do ensino da profissão. (...) O novo desafio que marcará o século XXI é como inventar e difundir uma nova organização, capaz de elevar a qualidade de vida e do trabalho (...) considerando que a tecnologia é a alavanca do processo desenvolvimentista.” (Alves & Guimarães, 2001, pp. 106, 109 e 111) 90 O I Fórum Pedagógico da FAETEC, o qual já referenciamos, foi realizado em 11/12/2002, no auditório da FAETEC, em Quintino, Rio de Janeiro, RJ, do qual participamos a convite da Diretoria Pedagógica e da Coordenação dos ISE. Ao divulgar suas idéias, a FAETEC conseguiu manter a sua característica original, a formação tecnológica para o mercado, procurando unir o “útil ao agradável”, ou seja, uma formação “profissional” nos moldes tecnológicos a uma formação “profissional” e tecnológica dos professores. Essa formação profissional requerida pela FAETEC é salientada por um modelo de ensino técnico, reprodutor, flexível, marcado sobretudo por uma formação aligeirada. A Fundação, ao instituir o projeto dos ISE/CNS, buscaria uma formação profissional porque tinha sua lógica voltada para o mercado, calcada nos novos padrões de acumulação flexível do capital ditados pela ideologia neoliberal e na visão de competências destinadas aos “modernos professores”. A principal preocupação da FAETEC, ao buscar a interiorização dos ISE/CNS, vem ao encontro de formar o professor ciente e consciente das tecnologias e novas formas de trabalho. Na verdade, a ênfase está muito mais em dominá-las do que propriamente conhecê-las. Para justificar a ênfase nas novas tecnologias, deu-se também a criação de novas unidades de IST, CETEP e ETE91, dentro do mesmo projeto de desenvolvimento. A ênfase está calcada mais nos fins do que nos meios. O professor, por sua vez, se vê transformado em um profissional reprodutor, pela rapidez com que forma e é formado. Com a visão voltada para o mercado e para um certo “dinamismo pedagógico”, marcado pela corrida para formar rapidamente o profissional, deixaria a FAETEC, através dos ISE, de formar o professor crítico, capaz de desenvolver novos conhecimentos a partir de uma relação de saber-fazer, para formar um profissional mecânico e limitado a um saber mecanizado. A busca pela formação aligeirada estava assim erigida, desprestigiando-se a construção de um conhecimento coletivo através da relação entre teoria e prática, o que a FAETEC parecia desconhecer ou simplesmente ignorar, tendo em vista sua ênfase exacerbada no uso das novas tecnologias. O futurismo está grandemente presente na FAETEC nesse momento. Construí-lo, porém, com um docente que detenha um conhecimento pedagógico histórico, que o torne sobretudo emancipado para emancipar, ligando a experiência à consciência do saber, unindo teoria e prática, parecia estar longe do anseio da Fundação, pois, por atuar na área tecnológica, não enfatizava a necessidade de aprofundar didática, teórica e empiricamente o professor. 91 Todo o projeto de implantação de novas unidades educacionais no estado pode ser visualizado no mapa anexo ao trabalho. Outra preocupação da FAETEC, ao lançar a referida publicação, foi tornar clara algumas de suas intenções, registrando vários de seus feitos em diversas áreas, a fim de divulgar suas idéias de desenvolvimentismo mediante a educação tecnológica no estado do Rio de Janeiro, e principalmente no interior. Nessa publicação, além de demarcar alguns de seus interesses, dedicou especial atenção à política de implementação da Rede de ISE no interior, afirmando que “(...) contemplados pelo Centro Universitário FAETEC, visam a formação do profissional que atende às exigências do mercado de trabalho atual e local (... ) A consolidação da FAETEC em Centro Universitário surge com o intuito não somente de ajustar a realidade de formação de seus profissionais docentes e discentes em nível técnico e profissionalizante às demandas do mercado de trabalho globalizado. Ela também vem ao encontro de outros profissionais na área do magistério que sentiram o constrangimento legal da LDB 9394/96, cujo texto deixava bem nítida a necessidade de buscar aprimoramento acadêmico, atualização e revisão de práticas e rotinas realizadas em sala de aula e no âmbito escolar. Portanto a idéia de criação dos Institutos Superiores de Educação, bem como dos Institutos Tecnológicos do Centro Universitário FAETEC nasceu de uma prática e de um diagnóstico percebidos na vivência e experiência diária de ensino para a formação técnico-profissionalizante via oferta de cursos em nível de Ensino Médio Técnico e da real urgência em dar subsídios à nova formação do professor que vai atuar com a Educação Infantil e o Ensino Fundamental.” (Alves e Guimarães, 2001, pp. 101, 102 e 103) O recorte imediatamente citado demonstra toda a ambição da FAETEC na área da educação. No grifo que fizemos no artigo 1º da Lei 3.808/02 (e que constitui o terceiro fato por nós apontado anteriormente) aparece a expressão “atuando como”. Embora a expressão na lei tenha suscitado muitos comentários sobre como, por exemplo, com sua promulgação a FAETEC tenha se transformado em Centro Universitário (fato revelado na citação), tais comentários não passaram de equívocos. Ou mesmo a própria FAETEC, para fazer um jogo de palavras e ganhar mais espaço no seu projeto, também buscando conformar e fazer acreditar os menos atentos, tenha sido a responsável pelo encaminhamento da expressão na lei. A ascensão da FAETEC a Centro Universitário, no entanto, não foi real. Primeiramente porque os cursos a ela vinculados estão em fase de implantação e muitos ainda não estão reconhecidos. E, em segundo plano, porque, para constituir-se como Centro Universitário, a FAETEC necessita submeter um processo de solicitação ao CEERJ. Tal processo ainda não existe. A criação dos ISE/CNS e dos IST veio reforçar a ação da FAETEC e do governo estadual na criação de pólos de desenvolvimento A busca pela formação de tecnólogos em diversas áreas e de “tecnólogos em educação” pareceu, nesse momento de efervescência, resgatar dois outros modelos anteriores: o do professor Álvaro Chrispino, no âmbito da SEE, e o da professora Nilda Teves, no âmbito da FAETEC, ambos com visões semelhantes. Aproveitando, pois, o momento de redefinição da hierarquia e da tipologia das instituições de educação superior no Brasil, realizada a partir da LDB 9.394/96 e definida academicamente pelos Decretos complementares 2.406/97 e 3.860/01, e buscando respaldo nas leis estaduais 2.735/97 e 3.808/02, a FAETEC, que já atuava anteriormente desde a educação infantil, ensino fundamental e ensino médio técnico, buscou, nesse momento, além de lançar-se também ao ensino superior tecnológico e de formação de professores (inovações na área da educação), iniciar a trajetória para a sua “transformação” em Centro Universitário. Se isso não foi possível do ponto de vista legal, ao menos com isso conseguiu causar uma grande confusão na mente e na vida de muitos daqueles (professores e alunos, principalmente) que, de uma forma ou de outra, encontravam-se, direta ou indiretamente, ligados à gênese dos ISE/CNS no estado, levando-os a acreditar que a Fundação já havia sido credenciada a funcionar com tal estrutura, como vimos anteriormente, o que de fato não aconteceu. Tal situação serviu de agravamento para a política de formação de professores nos ISE/CNS, conforme detalharemos adiante. 4.4 - Os ISE/CNS do interior do estado entram em cena A partir do governo Anthony Garotinho, a idéia desenvolvida pela nova administração da FAETEC, era de “(...) construir um esquema de implantação de uma série de Institutos Superiores de Educação e Cursos Normais Superiores. É interesse do Estado implementar a formação de profissionais da Educação não só nos grandes centros, mas em todo o Estado com condições de qualificação adequada. Essas condições serão proporcionadas pela instalação de uma rede de instituições que irão garantir uma mesma filosofia de princípios e ações no que diz respeito à formação do formador. (...) Com esta perspectiva, o Estado, através da FAETEC promoverá a transformação dos cursos normais de nível médio em instituições de nível superior ou cursos normais superiores, de maneira gradual e contínua, dotando-os dos recursos humanos da área de Educação que a modernidade exige. É importante ressalvar que não se trata simplesmente de mudar o nível de ensino oferecido atualmente, mas transformar de fato a formação do formador em um curso com uma nova filosofia que buscará também a qualidade, além da competência.” (Projeto de Implantação e Implementação da Rede de ISE, p.1 – Introdução) A idéia original da nova administração, portanto, era constituir uma “Rede de ISE/CNS” a ser implantada em todo o estado. Fazendo uma pequena digressão, na citação anterior percebemos uma tênue ligação filosófica do projeto de ISE a ser desenvolvido pela FAETEC, com o projeto de ISE que seria desenvolvido por Chrispino, na SEE, ressalvando-se que este projeto previa uma ligação (embora em caráter de consultoria) com a universidade. A ligação que mencionamos diz respeito apenas à forma como ocorreriam as transformação das unidades já existentes, ou seja, os diversos Institutos de Educação espalhados pelo estado, em unidades que ofereceriam o CNS, que Chrispino também previu em seu projeto. A primeira tentativa, como vimos, se deu com o ISERJ, que seria uma “instituição vitrine” para as demais, o que não teve êxito. O projeto dos ISE do interior, ou segundo projeto da FAETEC, foi solicitado a uma consultoria externa que prestava serviços para a FAETEC - o Instituto de Organização Racional do Trabalho do Rio de Janeiro (IDORT), que por sua vez o terceirizou para que outra Consultoria (D&M Consultoria), através de duas professoras, o elaborasse92. As professoras, por sua vez, ficaram sabendo da informação da realização do projeto pelo próprio Presidente da FAETEC, de quem uma delas, já aposentada, era colega há mais de 30 anos na UERJ. Ela, então, em entrevista, afirmou: “A gente tomou conhecimento de toda uma proposta do governador Garotinho, da necessidade de desenvolvimento do interior do estado. Então, o Garotinho tinha como programa de 92 O Instituto de Organização Racional do Trabalho do Rio de Janeiro foi a consultoria contratada da FAETEC para a elaboração de projetos da Instituição. Porém o Instituto utilizou apenas o nome, pois terceirizou o serviço para a D&M Consultoria, que o executou, através de duas professoras. Os projetos elaborados para os ISE/CNS assim dividiam-se em vários subprojetos, assim constituídos: Projeto de implantação e implementação da Rede de Institutos Superiores de Educação, que detalhava como seria constituída a Rede de Institutos; Projeto de implantação e implementação do Instituto Superior de Educação e Curso Normal Superior, que detalhava como funcionaria a unidade e o Curso Normal Superior especificamente; e o Projeto de Regimento Interno do Instituto Superior de Educação e Curso Normal Superior. governo desenvolver o interior do estado. A idéia dele era criar pólos de desenvolvimento, utilizando a vocação de cada lugar.” A primeira versão do projeto foi elaborada pelas professoras consultoras em maio de 2000 e recebeu o nome genérico de “Projeto de Implantação e Implementação da Rede de Institutos Superiores de Educação e Organização Institucional”, sendo composto por três Subprojetos: - Subprojeto I – Organização Funcional do Instituto Superior de Educação; - Subprojeto II – Organização Funcional do Curso Normal Superior; e - Subprojeto III – Organização Funcional de outros cursos do Instituto Superior de Educação. Pelo modelo constituído, percebemos que a FAETEC pretendia ampliar bem a sua área de atuação dentro dos ISE, esgotando-lhe as possibilidades descortinadas na Resolução CNE/CP 01/99. 4.4.1 - O Subprojeto I – Organização Funcional dos ISE Pelo Subprojeto I, a FAETEC haveria de reestruturar 25 Institutos de Educação, transformando-os em ISE e criando, junto a estes, 44 Cursos Normais Superiores. Tais Institutos seriam transferidos da SEE. A idéia de “Rede de ISE” ou de “Rede Superior de Educação”, conforme previa o projeto, dividiria o Estado do Rio de Janeiro em regiões, observando o princípio de proximidade entre elas, utilizando o mesmo modelo de CNS em todas as unidades93. Os 25 Institutos de Educação funcionariam como pólos em diversas cidades do estado, servindo de confluência para todos os CNS. Estes CNS seriam administrativamente 93 A Lei Estadual nº 3.781, de 18/03/2002, que dispôs sobre a reestruturação do quadro permanente de pessoal da FAETEC, previa o quantitativo de 1.100 professores para os ISE. Esses professores seriam contratados até que os seus quadros permanentes fossem constituídos. subordinados aos Institutos de sua área de confluência, assim atingindo os municípios menores. Os CNS teriam a mesma estrutura administrativa dos ISE, como direção e coordenação de programas e projetos, dentre outras, incluindo o regimento interno da instituição, porém não teriam Conselhos Superiores, que somente seriam organizados nos ISE. Entretanto, os regimentos dos CNS e dos ISE seriam adaptados ao regimento da FAETEC, que até o presente momento não havia sido reformulado, a fim de prever instituições de nível superior. A consultoria chegou a organizar, para as unidades, um Regimento Interno dos Institutos, que não vigorou (e ainda não vigora) porque a própria FAETEC não possuía (e ainda não possui) um regimento adequado a sua nova realidade. Nesta ótica, torna-se interessante salientarmos que os embates causados com o ISERJ que ocasionaram a saída do último interventor (em fevereiro de 2001) foram provocados exatamente porque o Instituto não aceitou fazer parte do novo modelo estabelecido pela FAETEC, que o agregaria como uma dessas unidades, permitindo assim o avanço necessário à realização do intento de interiorizar a educação em nível superior através da formação de professores a partir do ISERJ, forjando-se na idéia do governo (de criar pólos de desenvolvimento no interior) e também na ambição de estabelecer-se como Centro Universitário. O ISERJ, por sua vez, mesmo continuando a ser citado pela Fundação como pertencente à chamada “Rede FAETEC”, após os impasses e mesmo com a criação dos outros cinco ISE/CNS, passou a ter um tratamento diferenciado, pelo qual administrativamente, a FAETEC lhe concedeu certa “autonomia”. Ao formular o projeto, a princípio a consultoria contratada pela FAETEC baseou-se no Parecer CNE/CP 115, de 10/08/99, que assim discorre: “(...) os Institutos Superiores de Educação poderão ser organizados como unidades específicas de ensino ou como coordenação única de cursos ministrados em diferentes unidades de uma mesma instituição de ensino superior.” Porém, ao querer viabilizar o chamado “Esquema de Redes”, o intento da FAETEC leva-nos a compreender que ela queria se afastar de outra condição fixada pelo mesmo Parecer, que atribui aos ISE a função de serem “(...) centros formadores, disseminadores, sistematizadores e produtores do conhecimento referente ao processo de ensino e de aprendizagem e à educação escolar como um todo, destinados a promover a formação geral do futuro professor da educação básica.” A busca por instituir ISE/CNS implementados como “Redes” e não como “centros formadores e disseminadores do conhecimento”, como afirma o Parecer 115/99, impõe às instituições uma convergência e uma dependência. Assim, a forma como a FAETEC buscou instituir as unidades faria com que ela centralizasse o controle, descentralizando apenas a execução de tudo o que nelas fosse feito, seja em caráter administrativo ou acadêmico. Mais uma vez percebemos que o viés desenvolvimentista atribuído pela FAETEC ocultava uma visão de educação presa a modelos unilaterais, sem decisões coletivas, sem margem de manobra nas unidades, colocando-as em sua eterna dependência, mantendo o controle ao poder central. Razões econômicas e diversos interesses conflitantes, em especial com a SEE e com o ISERJ, como analisados anteriormente, enfraqueceram o projeto e não permitiram a transformação de 25 Institutos em ISE nem a criação de 44 CNS. Tendo em vista as dificuldades encontradas, em maio de 2001, definitivamente, a Fundação resolveu criar a “Rede de Institutos Superiores de Educação”, agora de uma forma mais modesta. Mantendo o pensamento de constituir a “Rede de ISE”, independentemente de todos os embates ocorridos no período compreendido entre maio de 2000 (com a montagem do projeto) até fevereiro de 2001 (com a decisão final de criar as unidades no interior do estado), a presidência da FAETEC, após inúmeras reuniões com os consultores e representantes de cidades do interior interessadas em criar unidades, num processo de negociação política que se estendeu ao longo de mais de um ano, decidiu sugerir ao governador a criação de apenas cinco ISE/CNS no interior. Aceitando a sugestão feita pela FAETEC, e ignorando o Conselho Estadual de Educação (CEE), o governo, criou o ISE de Santo Antônio de Pádua, pelo Decreto Estadual nº 28.420, de 23/05/2001; o ISE de Itaperuna, pelo Decreto Estadual nº 28.739, de 03/07/2001; o Instituto de Educação Professor Aldo Muylaert, de Campos dos Goitacases, transferido da SEE para a FAETEC e transformado em ISE pelo Decreto Estadual nº 28.947, de 14/08/2003; o ISE de Bom Jesus do Itabapoana, pelo Decreto nº 30.302, de 21/12/2001 e o ISE de Três Rios, pelo Decreto Estadual nº 30.303, de 21/12/2001, e, concomitantemente, todos os Cursos Normais Superiores. 4.4.2 – O Subprojeto II – Organização Funcional do CNS Embora a legislação preveja na estrutura dos ISE o funcionamento de outros cursos, como licenciaturas, cursos de extensão e até mesmo cursos de pós-graduação lato e strictosensu de caráter profissional, a princípio o único curso criado em todas as unidades do interior foi o Curso Normal Superior. A FAETEC considerou sua implementação como o “...primeiro passo para o funcionamento integral de um Instituto Superior de Educação.” (Subprojeto II, p. 10) Segundo o projeto, o CNS dos ISE do interior foi desenvolvido para oferecer, em todas as instituições, habilitação para docência em educação infantil em creche e préescola, habilitação para docência no ensino fundamental de 1ª a 4ª (séries iniciais) e 5ª a 8ª séries (educação de jovens e adultos) e habilitação para docência em educação especial. O projeto levou em conta a integralização do curso em 3.200 horas/aula, distribuídas em cinco módulos, já contidas as habilitações. Segundo seus formuladores, cada módulo teria a duração de 75 dias letivos (aproximadamente 15 semanas), sendo composto de 30 créditos, sendo um crédito equivalente a 15 horas/aula, num total de 450 h/a por módulo. Após a conclusão de cada módulo haveria um interstício de uma semana para que fossem realizados procedimentos administrativos e as reavaliações. Os módulos seriam realizados independentemente do ano civil, estando nesses já inseridos as férias docentes, cujo período previsto seria de 15 de dezembro a 15 de janeiro. O aluno, caso desejasse, poderia integralizar mais de uma habilitação concomitantemente, desde que não houvesse conflito de horários. O 1º, 2º e 3º módulos foram chamados de “módulos básicos”, em que seriam ministradas disciplinas comuns a todos os alunos. O 4º módulo foi chamado de módulo específico, dividido nas habilitações em educação infantil e ensino fundamental, e o 5º módulo era a área de concentração, dividida em educação especial e educação de jovens e adultos, respectivamente. Ao final da parte teórica, o aluno teria completado 1350 h/a nos módulos básicos, 450 h/a no módulo específico e 450 h/a na área de concentração, totalizando 2.250 h/a. Somando-se a parte prática, dividida em prática de campo, que totalizava 900 h/a e o trabalho final, que totalizava 50 h/a, o curso se efetivaria em 3.200 h/a e seria composto, ao todo, de 210 créditos. A previsão de conclusão do curso era de 20 meses, ou seja, 1 ano e 8 meses. O currículo previsto para o curso compunha-se ao todo de 34 disciplinas obrigatórias e três disciplinas eletivas, além da prática pedagógica. Pelo planejamento do projeto, o aluno poderia estender o curso até 40 meses com matrícula por disciplina. Ainda previa que os portadores de curso superior, integralizariam o curso em módulos. A parte prática do curso constituída pelo estágio supervisionado, que poderia ser realizado nas etapas finais do curso ou após seu último módulo, somando-se ao trabalho final, que seria realizado em forma de monografia ou estudo comunitário, poderia ser entregue em até 90 dias após a conclusão da parte teórica do curso. De acordo com o projeto, os alunos graduados em curso superior poderiam concluir o CNS em dois módulos, sendo 480 h/a de parte teórica, 130 h/a de trabalho de campo, 120 h/a de supervisão e 50 h/a de trabalho final, concluindo o curso em 780 h/a. Além disso, se quisessem retornar para concluir outra habilitação, teriam reduzida em 70% sua carga horária na parte prática. Os egressos de cursos normais de nível médio, por sua vez, teriam isenção de 30% da carga horária na parte prática, bastando que, para isso, o aluno tivesse pelo menos um ano de experiência em docência. Ainda os profissionais não licenciados que tivessem experiência docente de pelo menos um ano, também teriam reduzida a sua carga horária na parte prática em 25%. Um fato curioso é que, além da carga horária do curso ser bastante reduzida, o mesmo toleraria também a realização em regime semi-presencial (ensino à distância), observada a carga horária prevista, em trabalhos supervisionados pelos professores. Feita essa abordagem das nuances do projeto, podemos observar que as opções de formação eram as mais diversas. A FAETEC fazia “qualquer negócio” para que o seu produto fosse aceito no mercado, como redução de carga horária, habilitações concomitantes, ensino à distância, dentre outras. As medidas emergentes, levadas a efeito pela FAETEC para a superiorização da formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental no interior, a nosso ver, apresentam-se assim em dois sentidos distintos: populismo e banalização da formação, tendo em vista que não se mediram as condições para acesso dos alunos, não se levou em conta a diferenciação existente entre o nível médio e o nível superior e não se levou em conta o tempo necessário à preparação de um profissional para enfrentar a responsabilidade de exercer a profissão docente em seus primeiros anos, além das dificuldades materiais dos alunos para realizar o curso, como material, transporte para locomoção e distância das sedes. Assim, pela forma como elaborou o projeto de criação do CNS no interior, a FAETEC buscou unir o útil ao agradável, ou seja, concretizar a vontade política que tinha o governo de interiorizar o desenvolvimento, dando um tom de praticidade à formação de professores e procurando demonstrar em todos os casos que o governo e a Fundação haviam cumprido a promessa de levar o ensino superior ao interior. Se, por um lado, a FAETEC acertou no diagnóstico, ao querer levar em conta o desenvolvimento do interior via educação, por outro lado, errou na prescrição, ao querer encurtá-la de maneira técnica, aligeirando o curso e com isto informando mais o professor do que formando-o. O período de um ano e oito meses de duração de curso mal possibilita a qualquer aluno assimilar as informações que lhes são passadas, quanto menos maturá-las, discuti-las e analisá-las, possibilitando uni-las à prática que possui, estabelecendo a práxis pedagógica, ou seja, a relação efetiva entre teoria e prática. 4.4.3 – Desdobramentos e conseqüências de um projeto aligeirado O critério utilizado para a escolha das cidades, se, por um lado, foi político, atendendo aos anseios do governo, por outro não deixou de expressar, em grau muito elevado, o diálogo existente entre a presidência da FAETEC e os prefeitos, que se empenharam pessoalmente para que o pedido fosse atendido. Em algumas unidades (como Santo Antônio de Pádua e Campos dos Goitacases), além do empenho dos prefeitos foi incitada pela própria FAETEC a manifestação das comunidades sob forma de solicitação coletiva (“abaixo-assinados”) visando a instalação do Instituto. Como a criação dos ISE/CNS foi feita por decreto, o CEE, a princípio, não foi consultado sobre a possibilidade de criação desses institutos, fato que somente meses mais tarde foi concretizado (já no ano de 2002), a partir de solicitação de credenciamento das instituições, em bloco através do processo E03/100088/2002. A FAETEC aproveitou-se de sua condição de instituição pública para criar “na marra” os institutos, não respeitando a autoridade do CEE, como órgão regulamentador das políticas educacionais no estado. Curioso percebermos que até mesmo o pedido de credenciamento foi efetuado em bloco, reiterando a posição tomada pela FAETEC, que era de centralidade administrativa e acadêmica absoluta das instituições. A princípio, as recém-criadas unidades foram instaladas em locais provisórios, utilizados para que o CNS passasse a funcionar. Em pelo menos três casos, foram cedidos espaços públicos, como CIEP (ISE de Três Rios), em uma escola municipal (ISE de Itaperuna) e anexo ao complexo administrativo da prefeitura (ISE de Bom Jesus do Itabapoana). Os ISE de Santo Antônio de Pádua e ISE de Campos dos Goitacases, constituíram-se como casos distintos. Para que os CNS das unidades pudessem vir a funcionar, a FAETEC teria de resolver um outro problema, que seria a contratação imediata de professores para as novas unidades. Visando a solucionar o problema, a FAETEC publicou editais de chamada de docentes para contratação provisória imediata, para períodos de 20 a 40 horas semanais. O processo constituiu-se de análise de um memorial, a ser elaborado pelos professores. Foram contratados para todas as unidades, inicialmente, 229 professores94. Com isso, a FAETEC pôde adiar a abertura de concurso público, baseando-se na Resolução 1/99, embora desconsiderando o artigo 2º da Lei Estadual nº 3.781, de 18 de março de 200295. A escolha dos diretores das unidades, entretanto, obedeceu a critérios políticos. Em todas as unidades, os dirigentes foram escolhidos pelos prefeitos. Os ISE de Santo Antônio de Pádua e Itaperuna, foram as primeiras unidades a iniciar as aulas no CNS, simultaneamente, em 28 de maio de 2001, embora o decreto que criou o ISE de Itaperuna seja de 03/07/2001, deixando esta unidade em total inexistência legal durante mais de um mês. O CNS do ISE de Santo Antônio de Pádua, por sua vez, caracterizou-se por ser o único a iniciar as aulas em prédio próprio, num pólo pertencente ao governo do estado, onde também funcionam o CETEP e a Escola Técnica Estadual, e onde o estado pretende construir o campus avançado da Universidade Estadual do Norte Fluminense. O prédio que veio a abrigar o CNS foi construído com recursos 94 Do total de 229 professores inicialmente contratados pela FAETEC para os ISE, 26 foram destinados ao ISE de Bom Jesus do Itabapoana; 38 ao ISEPAM; 42 ao ISE de Itaperuna; 42 ao ISE de Santo Antônio de Pádua e 36 ao ISE de Três Rios. Destes, em todas as unidades, 28 professores possuíam mestrado concluído em alguma área do conhecimento, 22 estavam por concluir e 7 estavam por concluir cursos de doutorado. Fonte: Coordenação dos Institutos Superiores de Educação da Rede FAETEC. 95 O Art.4º, parágrafo 2º, alíneas “a” e “b” estabelece que o corpo docente dos ISE poderiam ser constituídos por “professores contratados pelo instituto ou nele lotados.” Também previa composição “por professores cedidos por outras instituições ou unidades da mesma instituição, desde que o convênio ou termo de cessão, conforme o caso, assegure regime de trabalho e efetiva vinculação pedagógica do docente ao instituto.” O artigo 2º da Lei 3.781, de 18 de março de 2002, no artigo 2º, estabelece: “Os cargos de professores de Institutos Superiores, constantes do Anexo I serão obrigatoriamente preenchidos por concurso público de provas ou provas de títulos.” disponibilizados pela prefeitura do município. Já o CNS do ISE de Itaperuna iniciou suas atividades em um dos prédios de uma escola pertencente à Rede Pública do município, emprestado pela prefeitura da cidade, que havia doado um terreno prevendo também a construção futura de prédio próprio para o Instituto. A criação do ISE de Campos dos Goitacases, todavia, constituiu-se numa relação paradoxal. Sabemos que, por razões políticas, o ISERJ foi transferido da SEE para a FAETEC, porém assim mesmo sua transformação em ISE e a autorização do CNS foram emanadas por Parecer do CEE. No caso do Instituto de Educação professor Aldo Muylaert (IEPAM), entretanto, com um único decreto (anteriormente citado), o governador transferiu o então Instituto de Educação da SEE para a FAETEC, também transformando-o em Instituto Superior de Educação Professor Aldo Muylaert (ISEPAM). As razões dessa transferência foram expressas pela FAETEC, em nota à imprensa, datada de 22/08/2001 (véspera da solenidade de transferência), quando salientou: “Essa medida representa o cumprimento de mais uma etapa do programa do governo do estado do Rio de Janeiro, desenvolvido pela FAETEC, de descentralização e interiorização da educação profissional de nível básico, técnico e tecnológico. O objetivo é prover a população do município de Campos dos Goitacases e cidades vizinhas de meios que lhe permitam a melhoria de sua qualidade de vida, através da oportunidade de se habilitarem ao mercado de trabalho e terem acesso à formação integral para a vida em sociedade e para o exercício da cidadania. Campos é o sétimo município mais populoso e o terceiro do Estado em arrecadação de impostos, graças à presença da Petrobrás (Bacia de Campos).” (FAETEC, Assessoria de Imprensa. Texto para Nota Oficial à imprensa, em 22/08/2001) Certamente a cidade foi escolhida para abrigar um ISE pelo peso de sua infraestrutura. Campos dos Goitacases representava para a FAETEC um pólo importante em seu ambicioso projeto de interiorização e desenvolvimento tecnológico, podendo alavancar ainda mais a idéia do Centro Universitário. Este certamente foi um dos fatores que contribuiu para que a Fundação não conveniasse ou criasse o Instituto dentro da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), o que, se fosse feito, ameaçaria os planos já detalhados, pois, como criar um Centro Universitário com Institutos ligados às universidades? Outro fator que supomos ter influenciado na escolha da cidade, foi que haviam laços políticos estreitos entre o governo estadual e a cidade de Campos dos Goitacases, onde o governador havia sido prefeito. Embora o Instituto de Educação de Campos dos Goitacases (IEPAM) fosse uma instituição formadora de professores em nível médio, não havia nenhum projeto formulado ou pensado na referida instituição para formação em nível superior. Não havia, também, nenhum embate entre o Instituto e a FAETEC. Até mesmo o número de professores cedidos pela SEE para o CNS do ISEPAM foi pequeno (dois professores) em comparação ao ISERJ, o que tornou sua transferência mais fácil de ser conseguida. Como afirmou uma das professoras entrevistadas, “A gente queria o curso superior, mas não tinha noção se seria ligado à Secretaria de Educação. Aí, nós encaminhamos à Secretaria de Educação esses pedidos e fomos orientados no sentido de que só poderíamos ter se o Instituto de Educação Professor Aldo Muylaert, que era ligado à Secretaria de Estado de Educação, passasse a fazer parte da... a estar ligado, subordinado à Secretaria de Ciência e Tecnologia, através da Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC). Aí que nós fomos ter conhecimento de que para ter o curso superior, nós teríamos... teria que haver essa transferência que dependeria de um ato político, de um entendimento político muito maior. (...) isso aí foi um ato político. (...) Houve uma força maior política, uma intervenção política maior no sentido de transformar.” Como nessa ocasião a situação entre os partidos políticos que compunham a base aliada do governo ainda era estável, não houve sinais de resistência da SEE concretizandose assim a transferência do IEPAM para a FAETEC. Interessante frisar que as outras cidades do estado em que os ISE foram criados também possuíam institutos de educação de nível médio que não foram transformados em instituições de nível superior. Houve, portanto, uma posição política constituída entre o governo do estado e a prefeitura de Campos dos Goitacases, fato que facilitou bastante a implantação do ISE, diferenciando a relação com as outras prefeituras, que tiveram que buscar outros meios para concretizar o ideal de criação de um ISE/CNS em seu território, como, por exemplo, a intervenção pessoal dos prefeitos junto ao presidente da FAETEC. Embora os ISE/CNS de Santo Antônio de Pádua e Itaperuna já tivessem iniciado suas aulas em maio de 2001 e o ISEPAM tivesse sido criado em agosto do mesmo ano, este só iniciou as aulas em conjunto com os outros dois restantes (Bom Jesus do Itabapoana e Três Rios), que foram criados em dezembro de 2001. As aulas no CNS dessas três últimas unidades foram oficialmente iniciadas em 07/01/2002. Até aquele momento, no entanto, todos os ISE permaneciam sem credenciamento, e os CNS sem autorização de funcionamento; porém as primeiras turmas já haviam iniciado as aulas no mês de maio. Como salientamos anteriormente, a FAETEC somente se pronunciou ao CEE no ano de 2002, quando, pelo processo E03/100088/2002, solicitou credenciamento e autorização, de todos os Institutos e CNS de uma só vez. O CEE, por sua vez, colocou o pedido da FAETEC em diligência, determinando que a mesma desmembrasse o referido processo e fizesse o encaminhamento em processos separados , sendo um por unidade. A partir da Solicitação do CEE, a FAETEC novamente encaminhou solicitação de credenciamento e autorização, protocolando os processos, desta feita em separado, como solicitados pelo Conselho. 96 Uma vez que os processos já se encontravam no Conselho, iniciou-se uma longa jornada de embates entre a FAETEC e o CEE. Os ISE/CNS do interior, por terem sido criados por Decreto Estadual, ainda continuavam a funcionar sem a devida regulamentação legal, ou seja, funcionavam na “ilegalidade”. Quase em meados de 2002, o governador Anthony Garotinho afastou-se do governo a fim de candidatar-se à Presidência da República. Assumiu o governo a vice-governadora, Benedita da Silva. Entretanto, mesmo com as mudanças ocorridas nos Gabinetes e Secretarias, em virtude das transições normais de governo (inclusive na SEE e na FAETEC), a política da FAETEC, com respeito aos ISE manteve-se inalterada. A fim de possibilitar uma análise conclusiva sobre os processos de credenciamento e autorização encaminhados pela FAETEC, considerados o Parecer CEE 178/98 e a Deliberação 229/9897, o CEE designou, em 10 de junho de 2002, através das Portarias 113, 114, 115, 116 e 117, cinco Comissões Verificadoras para avaliar in loco, as condições de oferta dos ISE e seus CNS, para dar seguimento ao processo de credenciamento e autorização dos mesmos. As Comissões foram compostas por professores de universidades públicas e inspetores do próprio CEE, sempre em número de três membros. 96 Foram protocolados no CEE, separadamente, os seguintes processos: ISE de Santo Antônio de Pádua, processo E03/100.236/2002; ISE de Itaperuna, processo E03/100.237/2002; ISE de Campos dos Goitacases, processo E03/100.353/2002; ISE de Bom Jesus do Itabapoana, processo E03/100.238/2002; e ISE Três Rios, processo E03/100.235/2002. 97 O Parecer CEE 178/98 aprovou o roteiro de relatório de verificação para autorização e reconhecimento de curso de estabelecimento de ensino superior vinculado ao sistema estadual de ensino. A Deliberação 229/98 dispõe sobre autorização de novos cursos em Faculdades Integradas, Faculdades e Institutos Superiores ou em funcionamento no Sistema Estadual de Ensino. Tendo visitado as unidades entre os meses de julho e agosto de 2002, as Comissões emitiram um relatório ao CEE, em que apontaram uma série de irregularidades. As mais comprometedoras, segundo o relatório, foram: - Complementação da hora/aula para 60 minutos, pois vigorava a hora/aula de 50 minutos; - Implantação das bibliotecas, com acervo de títulos e periódicos especializados, com contratação de pessoal habilitado, com instalação de equipamentos conectados à internet, tendo em vista a agilização de consultas e empréstimos; - Nova visita das Comissões Verificadoras após o efetivo atendimento às condições legais de funcionamento; - Realização de concurso de provas e títulos para o corpo docente, pois a contratação provisória somente de títulos, por etapas, não atendeu ao compromisso de qualidade proposto no projeto ISE/FAETEC; e - Suspensão imediata do concurso vestibular de admissão aos cinco ISE, de modo que a proposta viesse a atender à Resolução CNE/CP nº 2002, de 19/02/2002 e deliberação CEE nº 215/9598. Com a entrada em vigor da Resolução CNE/CP 02/2002, foi instituída uma nova carga horária (teórica e prática) para cursos de licenciatura, de graduação plena, para os professores da educação básica em nível superior. A nova Resolução passou a prever o mínimo de 1.800 horas/aula para os conteúdos curriculares de natureza científico-cultural, 400 horas de prática, vivenciadas ao longo do curso, 400 horas de estágio curricular supervisionado, a partir da segunda metade do curso e 200 horas para outras atividades acadêmico-científicas. Segundo a nova Resolução, o curso, deveria ser integralizado em, no mínimo, 2.800 h/a, obedecidos 200 dias letivos por ano, devendo ser concluído em, no mínimo, três anos. Aprofundando a questão, percebemos que esta nova Resolução teve seus motivos históricos para ser aprovada. Se voltarmos ao estabelecido pelo Decreto nº 3276/99, que 98 Fixa normas para os concursos vestibulares das Instituições Isoladas de Ensino Superior vinculadas ao Sistema Estadual de Ensino. dava exclusividade aos CNS na formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, em nível superior, perceberemos que, embora aquele dispositivo tenha sido substituído pelo Decreto nº 3.554/00, o governo federal ainda tornava clara sua política de beneficiar as IES privadas, quando, em 30/01/2001, o Conselho Nacional de Educação voltou a normatizar sobre o locus de formação de professores da educação infantil, e das séries iniciais do ensino fundamental, desta feita, publicando o Parecer CNE/CES nº 133/2001, que passou a tornar obrigatória a formação dos aludidos professores, nas IES não-universitárias, em ISE. Desta feita, para que tais instituições pudessem formar professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental teriam que criar um ISE em sua estrutura. A forma que o governo federal encontrou para amenizar as constantes críticas direcionadas ao CNS, pela qualidade duvidosa e aligeiramento na formação (feitas por grande parte dos estudiosos da área de formação de professores), minimizando assim os impasses, foi, então, baixar a Resolução CNE/CP 02/2002, regulamentando a questão. Assim fazendo, o governo atrelou a questão da carga horária ao tempo mínimo de formação, porém, a nosso ver, continuou a estabelecer uma diferença entre a formação de professores nos ISE das IES isoladas e as demais licenciaturas nas IES universitárias. Com isso, o governo continuou mantendo, embora de forma mascarada, seu apoio às IES privadas. No entanto, ainda que a Resolução 02/2002 tenha configurado um viés minimalista, os CNS dos ISE do interior do estado ainda não estavam cumprindo nem mesmo a Resolução CNE/CP 01/99. A situação de “ilegalidade” tornara o problema dessas instituições e de seus CNS ainda mais grave. O projeto sofreu, meses antes da Resolução 02/2002, uma revisão pela própria FAETEC, passando a ser integralizado em 24 meses, continuando com módulos de 75 dias, com ingresso de alunos três vezes ao ano, e carga horária total do curso variando 2.980 h/a a 3.100 horas99. No entanto, a Comissão Verificadora, ao visitar as unidades e inspecionar o CNS, constatou que “ (...) ainda que a proposta do curso considere em tese 2.980 h/a, o fato é que o somatório minucioso da carga horária em vigor, de fato, nem a exigência anterior, de 3.200 horas, em vigor no início do curso, tampouco a de 2.800 horas são atendidas . De um lado, a contagem da carga horária se deu em função da hora/aula de 50 minutos e não da hora/relógio, como prevê a lei. De outro, as 99 Variando por unidade, para mais ou para menos. exigências da prática e de estágio supervisionado, ambos previstos no art. 12 e 13 da Res. CNE/CP nº 01, de 18/02/2002 não são observadas, restringindo-se aos dois tempos semanais (1º ao 5º módulos) que seriam destinados ao controle dos mesmos, caso estivessem de fato acontecendo.” (Relatório da Comissão Verificadora do CEE para Credenciamento e autorização do CNS, p.5) O problema, uma vez levado ao conhecimento dos Institutos, chegou também ao conhecimento dos alunos. Quando estes souberam da necessidade de complementação da carga horária e foram conscientizados da situação de funcionamento “ilegal” em que se encontravam os Institutos, reagiram com indignação. A FAETEC, percebendo a dificuldade causada, tomou posição de recuo , deixando os diretores das unidades na linha de frente, estes assumindo todos os reveses causados por uma política de implementação de ISE/CNS que, desde seu início, fora equivocada. A realidade dos alunos, porém, não poderia ser modificada, pois, devido ao estado de “ilegalidade” dos ISE/CNS, estes teriam que ser submetidos à lei vigente. Se, por um lado, os ISE/CNS passaram a existir por decreto, por outro, necessitavam de credenciamento do órgão normatizador do estado, o CEE, para funcionarem como instituições de nível superior. O mesmo se prestava aos CNS, que necessitavam de autorização para existir. Os ISE existiam por de decreto, porém os CNS nada possuíam que lhes garantisse funcionamento. Entretanto o que garantia a condição de instituição de ensino superior aos ISE eram os CNS, pois neles não havia outros cursos em funcionamento. E os CNS ainda se encontravam, do ponto de vista legal, inexistentes. Como resolver um impasse de tão grande magnitude, que lidava diretamente com a vida de centenas de pessoas? A consultoria refez o projeto, adaptando-se às “novas exigências” legais (Resolução CNE/CP 02/2002), realizando uma transição do sistema modular para o sistema de períodos, sendo dois por semestre. Com a modificação, os dois primeiros períodos foram concluídos em 75 dias e os demais haveriam de ser concluídos em 100 dias. Com isso, os CNS de Santo Antônio de Pádua e Itaperuna, iniciados em maio de 2001, teriam suas primeiras turmas formadas em maio de 2004, e os demais CNS teriam seus CNS concluintes em dezembro de 2004. Desta feita, atenderia parcialmente ao artigo 2º da Resolução 02/2002, que diz: “A duração da carga horária prevista no artigo 1º desta Resolução, obedecidos os 200 (duzentos) dias letivos/ano dispostos na LDB, será integralizada em, no mínimo, três anos letivos”. Assim, os cursos passariam a ser concluídos em 600 dias. Se por um lado, o artigo da Resolução foi plenamente atendido com respeito ao mínimo de anos exigido, por outro, a carga horária total chegaria a cerca de 3.100 h/a, o que atenderia ao disposto no artigo. Essa foi a fórmula colocada em prática para se resolver o impasse. Por isso os vestibulares não poderiam ser abertos até que se regularizasse a situação. Observamos que a insistência da FAETEC em manter a divisão do curso em módulos e não em períodos (o que só foi modificado a partir da Resolução 02/2002) parece ter sido assim idealizada porque nos cursos técnicos a estrutura modular confere ao concluinte uma idéia de terminalidade. Então, cada módulo (ou fase) concluído garante ao concluinte uma certificado, caso não possa continuar. Caso esse aluno não venha a concluir o curso em sua totalidade, recebe um certificado de conclusão do módulo. Não nos assusta que esta visão tenha sido transposta pela FAETEC aos cursos de formação de professores, a fim de implantar-lhes uma metodologia originada na tecnificação, voltada para a formação de “profissionais” para o mercado de trabalho de maneira mais rápida. Nas entrevistas que realizamos com as diretoras dos ISE e coordenadoras dos CNS, todas manifestaram a dificuldade vivida pela situação “ilegal” em que viviam os Institutos. Segundo elas, o problema gerado poderia ter sido atenuado se houvesse um grau mínimo de preocupação da FAETEC para com as unidades. Embora tenhamos entrevistado todas as diretoras dos Institutos, as falas de duas delas nos impressionaram, quando apontaram de forma dramática todas as dificuldades vividas e o grau de indignação em que se encontravam, tal o desinteresse da FAETEC para com os ISE. A primeira diretora salientou: “(...) na prática, nós estamos enfrentando uma revolta desses alunos. Não são todos. Mas eles estão se sentindo assim desrespeitados e sentindo assim que não foram informados. Nem nós. ‘vai sair... vai sair... vai sair a autorização. Vai sair... vai sair... vai sair....’ E saiu? Quando? Aluno vindo pra mim e eu aqui gelada... Com modelo de diploma, modelo disso, modelo daquilo, quem que vem, quem que não vem, e a gente assim... Agora não, mas à época em que eles começaram planejando a formatura, ficamos angustiadas! Puxa! Cadê a autorização?! E esses alunos falando em formatura e eu vou falar o quê? O que eu poderia falar se eu não tinha uma autorização também?” A diretora de outra unidade, por sua vez, desabafou: “ A situação, na verdade é a seguinte: é de revolta, entendeu? É uma insatisfação geral, tá?! Dia a dia nós somos pegos assim por comentários desagradáveis. Quando nós fomos avisá-los que o curso estava passando para três anos, houve um momento em que se chamou a imprensa, entendeu? A imprensa foi acionada. Até hoje eles ficam solicitando a presença de um representante da presidência da FAETEC, porque ninguém veio esclarecer. Ninguém veio, na verdade, dar uma satisfação para eles. Eles estavam com a formatura toda pronta, paga. Clube marcado, buffet pago. E a gente está aqui à mercê, entendeu, numa situação, na verdade, que ninguém... até mesmo para a gente está sendo complicada. ” Ao visitarmos os ISE e suas dependências, tendo conhecido também toda sua infraestrutura e conversado com os professores e diretores, interagimos com várias turmas de CNS em turnos diferentes. Nas visitas realizadas, comprovamos o grau de insatisfação dos alunos, que em determinado momento nos cobraram respostas acerca do que estava acontecendo e o que seria feito para resolver a situação de desinformação que estavam vivendo. Chegamos a ser confundidos, em determinado momento, com um representante da FAETEC, equívoco que rapidamente desfizemos. Em nossa visita, distribuímos 700 questionários aos alunos dos CNS de todos os cinco ISE. Embora não tenhamos tabulado informações, por entendermos que não haveria condições de utilizá-las, constatamos especialmente que na grande maioria dos questionários os alunos demonstraram a preocupação com a validação do curso. Como se não bastassem todas as dificuldades, as unidades passavam por situações precárias de funcionamento. Em quase todas, as linhas telefônicas encontravam-se mudas devido à falta de pagamento das contas. As prefeituras, por vezes, passaram a assumir as responsabilidades administrativas, inclusive emprestando seus veículos para que os diretores se locomovessem para o Rio de Janeiro, a fim de participarem das reuniões marcadas pela própria Fundação, o que podemos caracterizar como indício da continuidade do processo de prefeiturização anteriormente colocado. Percebemos, com isso, que a FAETEC, ao implantar os ISE/CNS de forma aligeirada no interior, não procurou fazê-lo com base na excelência acadêmica, não prevendo o impacto que os ISE/CNS causariam na vida de milhares de pessoas das cidades atendidas, que acreditaram piamente nas promessas feitas, e cumpridas apenas na aparência. Por sua vez, a não-observância dos princípios legais estabelecidos pelas decisões emanadas do CEE trouxe prejuízo aos mais de 4.000 alunos,100 que em sua grande maioria ainda aguardam por soluções e respostas. É notório que muitos desses alunos procuraram os referidos cursos porque estes, além de oferecerem uma formação em nível superior, o faziam em tempo reduzido. Porém, a FAETEC, interessada na ampliação de sua Rede e de seus cursos, jamais deveria utilizar-se do caráter de desinformação dos alunos para sobre eles estabelecer seus interesses, a nosso ver, desrespeitando pessoas modestas, trabalhadores que estavam gastando o que não possuíam para realizar o sonho de completar um curso superior, que a rigor não existia. O relatório da Comissão Verificadora foi encaminhado ao CEE, que através de despacho101, solicitou à FAETEC que corrigisse todas as discrepâncias apontadas, baixando em diligência os processos e, sobretudo, determinando que os exames vestibulares fossem suspensos. As discrepâncias que geraram os impasses resumidos anteriormente teriam um prazo de 12 meses para serem solucionadas, exceto o exame vestibular, que deveria ser suspenso imediatamente. Além dos alunos, os professores contratados por seis meses, prorrogáveis por igual período, continuavam na mesma situação em que se encontravam, ou seja, lecionando sem concurso público e sem noção de quando e de que forma este viria ocorrer. Mesmo com os problemas apontados, a FAETEC não desistiu facilmente do projeto. Objetivando manter o acesso aos ISE, e visando ao seu credenciamento, bem como à autorização dos CNS, encaminhou nova solicitação em 03/12/2002, através do ofício 1.812, informando que as providências estavam em andamento e solicitando nova visita do CEE. O ano de 2002, porém, chegara ao fim. Ao fim também chegara o curto governo de Benedita da Silva. Entretanto, foram deixadas as irregularidades apontadas para a nova administração da FAETEC, que continuavam insolúveis. Valendo-se da nova solicitação para nova visita das Comissões aos ISE/CNS e desconsiderando a decisão do CEE, tomada após as primeiras visitas realizadas nos 100 Somados os dados colhidos na Coordenação dos ISE, aos dados que colhemos nas entrevistas, levando-se em conta o período compreendido entre maio de 2001 a junho de 2003, há na atualidade, nas seis unidades dos ISE (incluindo-se o ISERJ), cerca de 4.500 alunos, divididos em 119 turmas (levando-se em conta o ingresso das turmas do 2º semestre de 2003 nos ISE do interior). Ao final do ano de 2003, este número diminuirá pela formatura de algumas turmas do ISERJ. Os CNS dos ISE do interior funcionam nos três turnos, com exceção do ISEPAM, que oferece o CNS somente nos turnos da tarde e da noite. Os ISE de Santo Antônio de Pádua, Itaperuna e Bom Jesus do Itabapoana recebem um número considerável de alunos que residem em cidades circunvizinhas dos estados fronteiriços de Minas Gerais e Espírito Santo. ISE/CNS, a FAETEC manteve o exame vestibular para 2003, em todas as unidades, supomos, para tentar o reconhecimento das instituições e a autorização dos referidos cursos. Com a posse de Rosinha Matheus, eleita para governar o estado no período de 2003-2006, a FAETEC passou a ser presidida pelo srº Cláudio Mendonça, o mesmo que, quando Secretário de Educação, no final da segunda gestão de Leonel Brizola, em fins de 1994, havia projetado o CTQE. A Coordenação dos ISE foi também modificada, passando a trabalhar, assim que assumiu, no processo de credenciamento e autorização dos ISE/CNS do interior. A visão da nova coordenação era mais conservadora. O caráter expansionista em que trabalhou a antiga gestão da FAETEC, com o novo governo, cedeu espaço para uma gestão mais preocupada em resolver os impasses deixados pelo governo anterior. Porém encontrara grandes dificuldades para iniciar os trabalhos, pois, a gestão anterior havia “limpado as gavetas”. Grassou novamente a descontinuidade administrativa. A política a ser implantada pela nova Coordenação dos Institutos, segundo a nova coordenadora, era de “(...) autorizar, de reconhecer esses cursos. Nós vamos abrir concurso público para os professores desses cursos. Nós estamos implantando as bibliotecas. Temos um projeto pronto de bibliotecas (de implantação de bibliotecas) nesses Institutos (é uma das exigências da Comissão Verificadora. Enfim, nós vamos atender a todas as exigências feitas pela Comissão Verificadora, a fim de que esses cursos sejam autorizados e reconhecidos dentro do mais breve espaço de tempo possível. Depois que a gente fizer isso, aí a gente parte para uma política de expansão. Por enquanto, é terminar o que nós encontramos aí começado.” A nova coordenação dos ISE dava indícios de não concordar com aquele modelo, considerando-o extremamente padronizado, incompatível com a especificidade de cada ISE, ou seja, com suas características específicas, inclusive de localização geográfica. Por essa causa, a intenção da nova gestão da FAETEC era de conceder maior autonomia decisória aos Institutos. No entanto, como a FAETEC, no governo anterior, havia se manifestado novamente junto ao CEE, no mês de dezembro de 2002, solicitando nova visita aos ISE, a nova Coordenação, visando minimizar os efeitos que seriam advindos dessa demanda 101 Despacho da Câmara Conjunta de Educação Superior e Educação Profissional do CEE, nº 001/2002, de elaborou um plano de trabalho denominado “Projeto para Regularização Legal dos Cursos realizados pelos Institutos Superiores de Educação – ISE”, pelo qual instituiu metas para legalizar a situação dos ISE/CNS. As metas estabelecidas, que começaram a ser executadas no mês de março de 2003, foram as seguintes: - em cinco meses, ter 100% das visitas técnicas feitas às Unidades; - em dois meses, ter avaliado 100% das condições físicas e materiais das Unidades; - Em três meses, ter o registro do levantamento da demanda de mercado, em todas as regiões onde os ISE estão localizados; - Em três meses, realizar o concurso público para docentes; - Em quatro meses, ter 100% das visitas auditoriais realizadas; - Em cinco meses, ter 100% das bibliotecas funcionando; - Em cinco meses apresentar ao CEE/RJ os processos contendo os pedidos de autorização e reconhecimento dos CNS, tendo sido sanadas previamente todas as dificuldades. O CEE, por sua vez, resolvendo atender à solicitação da FAETEC para nova visita (feita em momento anterior) aos ISE, nomeou, pelas Portarias 128, 129, 130, 131 e 132/2002, nova Comissão Verificadora, nos mesmos moldes da anterior. Desta feita, a Comissão, já em abril de 2003, foi acompanhada pela Coordenadora dos ISE. Após várias reuniões entre a Comissão Verificadora e a Coordenação dos ISE, a FAETEC foi advertida do não-cumprimento das diligências baixadas anteriormente. Uma vez que a nova Coordenação estava empenhada em corrigir as distorções apontadas nas Instituições, a Comissão Verificadora, sendo solidária à situação pela qual passavam as unidades, resolveu encaminhar relatório ao CEE, sugerindo o credenciamento dos ISE em caráter provisório, reiterando as diligências anteriores e sugerindo ao Conselho o prazo de um ano para que fossem corrigidas. No dia 10 de junho de 2003, o CEE exarou o Parecer nº 212/2003, publicado no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, em 22/09/2003, credenciando os ISE de Bom Jesus do Itabapoana, de Três Rios, de Itaperuna, de Santo Antônio de Pádua, e Professor Aldo Muylaert, de Campos dos Goitacases, e autorizando o funcionamento de seus Cursos 29/10/2002. Normais Superiores pelo período de um ano, suspendendo qualquer forma de ingresso, até que estes fossem reconhecidos, e determinando à FAETEC que cumprisse as diligências, sem o que os cursos não seriam reconhecidos. Esse Parecer, se não fez muito pelos ISE do interior do estado, ao menos os retirou da “ilegalidade”, dando à FAETEC a possibilidade de “respirar” um pouco mais, enquanto planejava o que fazer para não deixar no prejuízo centenas de alunos que, sem muita opção, confiaram nas políticas públicas populistas que foram construídas no estado ao longo dos últimos sete anos. Algumas Conclusões Ao realizar o presente estudo, nos interrogávamos sobre os motivos que levaram os ISE/CNS a ficarem vinculados à SECTI/FAETEC e não à SEE. No entanto, ao desenvolvermos a pesquisa, percebemos que nosso questionamento inicial foi desconstruído, pois na realidade as evidências indicaram que eles deveriam estar ligados, não a Secretarias de Estado, que são órgãos destinados a promover políticas de governo dentro de sua área de atuação, mas a universidades, no caso, as universidades estaduais. Desta forma, não caberia à SEE a responsabilidade de gerir a formação em nível superior no estado, por ser ela a responsável pelas políticas de educação concernentes à educação básica, que é prioridade dos estados, notadamente o ensino médio. Muito menos tais políticas deveriam ser vinculadas à FAETEC, por ser esta uma Fundação criada para dar suporte ao ensino técnico. Ainda assim, compreendemos que o ensino, seja em que modalidade for, deveria estar a cargo da SEE, ficando a FAETEC com a competência de gerir a pesquisa tecnológica de ponta no estado, num programa de convênio com as universidades. Assim, os ISE/CNS da Rede Pública estadual deveriam ser criados pelo governo, após credenciamento e autorização do CEE, com suporte dado pelas universidades, ficando a estas vinculados, podendo, inclusive, funcionar de forma independente, em termos administrativos, recebendo apoio para o desenvolvimento de pesquisas e ajuda na formulação dos currículos do CNS e das próprias licenciaturas, quando mais tarde viessem a existir. Dessa maneira, os ISE poderiam constituir um braço da universidade levando vários cursos aos locais mais distantes, sem que estivessem isolados, ou viessem a perder a qualidade na formação dos professores. A pesquisa nos levou ao conhecimento de que a formação do professor da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental no Brasil vem sofrendo, desde o final do século XIX, principalmente no eixo São Paulo-Rio, embates históricos com respeito ao seu modus e seu locus de formação. Ao se normalizar essa formação, ela passou a ocupar lugar estratégico, constituindo-se como importante instrumento político-ideológico dos governos para implantar seus modelos sociais. A busca pela compreensão da categoria “superiorização” da formação de professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental possibilitounos estabelecer diferenças na formação em nível superior. Se, por um lado, o termo “superior” pode ser entendido como uma formação plena (de quatro anos, no nosso entender), por outro pode significar apenas uma formação “a partir do nível médio”. Isso possibilitou ao governo estadual, através da SEE e da FAETEC, nos projetos de ISE/CNS que chamamos primeiro projeto da FAETEC, ou “Projeto Nilda Teves”, e projeto da SEE ou “Álvaro Chrispino”, implantar modelos distintos de formação de professores, conforme a política administrativa que adotaria. Essa compreensão levou, com o segundo projeto de ISE/CNS da FAETEC ou projeto do interior, várias pessoas a ingressarem nessas unidades crendo que obteriam, através do CNS, uma formação plena. Nesse caso, a FAETEC utilizou-se do termo “superior” estrategicamente para alavancar um desenvolvimentismo empresarial no estado, bem como para obter êxito na interiorização dos ISE/CNS no estado do Rio, visando a obter retorno político em acordo com as prefeituras municipais. O estudo do processo político de criação dos ISE/CNS na rede pública do estado do Rio de Janeiro nos permitiu analisar vários elementos sobre a realidade da formação de professores no estado. A existência de quatro projetos diferentes de ISE/CNS expõe-nos um dos elementos mais nítidos dessa realidade: a descontinuidade de políticas de formação dos profissionais da educação com base em decisões tomadas nos altos escalões da administração estadual, que são a face mais clara dos interesses políticos conflitantes que desembocam no estabelecimento de políticas próprias de governo e não de estado. Os dados coletados na pesquisa nos levaram a concluir que as políticas públicas no estado do Rio de Janeiro são concretizadas de forma unilateral e oculta pelos governos, sem que a sociedade tome conhecimento e possa interagir no seu processo de construção. Isso se faz pela forma com que as pessoas se apropriam de documentos públicos, quase que negando-lhes o acesso, numa posição privatista. A experiência precursora dos ISE/CNS na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro evidenciou-se nos anos 90 do século XX, através da SEE, com a criação do CTQE, cujo objetivo seria formar um professor habilitado através da teoria, da prática, da cultura e da tecnologia, a atuar melhor em sala de aula. A descontinuidade administrativa histórica dos governos fluminenses fez abandonar uma experiência que tinha grande potencial de relação com a universidade. Quanto às políticas educacionais estabelecidas pela SEE e SECTI/FAETEC, observamos que não há um diálogo entre as duas Secretarias estaduais na busca de uma unificação do sistema público de ensino, principalmente no que tange à formação de professores, o que traz grandes prejuízos à SEE. Ao final, o Sistema Público de Ensino deveria ser de competência da SEE, pois historicamente vem se encarregando dele, dada a sua especificidade. Se as duas Secretarias e a FAETEC deixassem as rixas e convergissem suas políticas para a melhoria da educação no estado, particularmente na área de formação de professores, a situação delicada em que se encontra atualmente a educação no estado teria avanços significativos e a maior ganhadora seria a sociedade fluminense. Com o governo de Marcello Alencar, o estado do Rio de Janeiro transformou-se num grande campo de desenvolvimento empresarial. As políticas de governo tenderam a dar mais ênfase ao desenvolvimento tecnológico, inclusive para a educação e para a formação de professores. Estrategicamente, a escola pública passou a ser olhada não como um lugar de formação diferenciado: o governo, através de uma política de excelentização do ensino, passou a privilegiar as “melhores escolas”, trazidas da SEE para a FAETEC, em detrimento das “piores”, criando assim um ranking educacional. Na área de formação de professores, essa política foi iniciada no governo Marcello Alencar, com a transferência do IERJ para a FAETEC, visando a iniciar na Rede um modelo técnico e aligeirado de ensino, nos moldes desenvolvimentistas, vindo a evidenciar o caráter estratégico, ideológico e político que a formação de professores passou a ter. A derrota política da SEE para a FAETEC dentro do mesmo governo demonstrou que o governo acenava para um projeto de formação de professores que lhe fosse mais rentável politicamente. Um projeto mais próximo dos moldes empresariais. Nosso estudo também levou um esforço por estabelecer uma diferença entre o professor reflexivo, com base nos estudos de Schön (1995) e o professor profissional, amplamente técnico, baseado nos estudos de Shiroma (2003). Assim, concluímos que o professor reflexivo é um profissional consciente, aberto ao diálogo e a novos horizontes de conhecimento, crítico, democrático, perseguidor de soluções que possam melhorar a sociedade. O professor profissional, por sua vez, é aquele que encara a profissão como meio de manter-se tecnicamente qualificado para o mercado de trabalho. Nenhum dos quatro modelos de ISE/CNS evidenciados no estudo que desenvolvemos levou em conta um convênio sério com as universidades públicas do estado. Todos procuraram assumir posições unilaterais. O “projeto Nilda Teves” buscou acelerar a formação do professor, procurando estabelecer uma aproximação com o mercado a partir das chamadas “ilhas de excelência”. O projeto “Álvaro Chrispino” procurou formar o professor em um nível “pós-médio”, maquiando o conceito de superiorização da formação do professor e procurando a universidade apenas como consultora. O projeto do CNS/ISERJ, por sua vez, obedeceu a uma linha corporativista, fechando-se à universidade e aos demais modelos estabelecidos. E o projeto dos ISE do interior, formulado por uma consultoria externa, objetivou levar ao interior os chamados pólos de desenvolvimento, levando os professores que procuraram os ISE/CNS a ter uma falsa interpretação de que esses cursos equivaleriam a uma graduação, causando uma procura desenfreada pela necessidade de ascendência no mercado de trabalho, o que gerou frustração com as evidências de funcionamento clandestino das unidades. Ao criar as Redes de ISE/CNS e IST, a FAETEC buscou transformar-se em Centro Universitário. O projeto de ISE/CNS do interior também foi utilizado em forma de benesse, como uma troca para promover plataformas político-eleitoreiras e ganhar sustentação política através das prefeituras do interior. Com a excelentização do ensino, a FAETEC buscou também exercer posição de uma “segunda Secretaria de Educação”, tendo sob sua administração instituições que atuavam desde a educação infantil ao ensino superior, voltadas para a educação profissional através de um ensino modular. Uma das causas da proliferação de ISE/CNS nas cidades do interior foi a não interiorização das universidades públicas e a conseqüente falta de opção dos alunos por cursos de nível superior públicos. As universidades, por sua vez, precisam urgentemente deixar o encastelamento dos grandes centros urbanos, mobilizando-se junto às prefeituras do interior, no sentido de oferecer ao seu povo a possibilidade de ingressar em carreiras diversas, conforme a área de escolha pessoal, desenvolvendo as vocações de cada município, e impedindo, dessa forma, projetos que banalizem a formação de professores, oferecendo-a como um curso barato e transformando muitos cidadãos em professores por falta de opção. No entanto, cabe ao poder público o investimento necessário para a realização deste feito, pois durante a década de 90 do século XX, o país assistiu a um grande desmonte do sistema público de ensino, que contribuiu de forma significativa para a interiorização das universidades. A presença de vários professores da UERJ como integrantes do primeiro escalão dos governos desde a criação da FAETEC (inclusive os interventores do ISERJ) deveria ser utilizada para estabelecer um convênio entre os ISE/CNS e as universidades estaduais. Entretanto, ela serviu para demonstrar ainda mais o esfacelamento da compreensão sobre a formação de professores por grupos isolados, que se utilizaram de cargos públicos para fazer valer projetos próprios de formação, que não foram discutidos coletivamente. A ideologia de alguns parece estar mais próxima do empresariamento da educação do que de uma administração pública do ensino. A prefeiturização, como modelo de administração utilizado no governo Moreira Franco, voltou à cena no governo de Anthony Garotinho, através da FAETEC, constituindo-se como forma ideal para desresponsabilizar o poder estadual quanto a infraestrutura dos ISE/CNS do interior do estado, deixando para os municípios a responsabilidade de assumi-los, por falta de condições administrativas da FAETEC. Concluímos que o locus e o modus ideal de formação dos professores da educação infantil não devem perpassar as Secretarias porque elas não têm a função de regular o ensino superior. Os Institutos Superiores de Educação, mesmo que em caráter polêmico, constituemse hoje como uma instituição que vem ganhando espaço na formação dos profissionais da educação. Os projetos são muitos e os loci de formação, os mais diversos. Concluímos também que a luta atual não deve constituir-se no extermínio das unidades constituídas, nem na disputa de espaços de formação, mas numa melhor qualificação dos seus profissionais e na melhoria da infra-estrutura dos espaços formadores, convergindo para a possibilidade de uma formação em parceria com as universidades públicas. Compreender, na história e dentro da atualidade, a gênese e os interesses conflitantes do processo político de formação de professores em nível superior no estado do Rio de Janeiro, torna-se necessário para a construção mais sólida de um profissional melhor preparado para lidar com os desafios da pós-modernidade, interagindo criticamente com as estruturas sociais; procurando melhorar a qualificação da formação dos profissionais da educação e banindo os projetos eleitoreiros, empresariais e descompromissados com a coletividade. Referências Bibliográficas ACCÁCIO, Liéte de O. A Criação do Instituto de Educação do Rio de Janeiro. 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Regulamenta o parágrafo 2º do artigo 36 e os artigos 39 e 42 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Decreto nº 2.406/97. Regulamenta procedimentos e critérios para autorização de cursos dentro e fora da sede. Decreto nº 3276, de 06 de dezembro de 1999. Dispõe sobre a formação em nível superior de professores para atuar na educação básica, e dá outra providência. Decreto nº 3.554, de 7 de agosto de 2000. Dá nova redação ao parágrafo segundo do artigo 3º do Decreto nº 3.276, de 06 de dezembro de 1999, que dispõe sobre a formação em nível superior de professores para atuar na educação básica, e dá outras providências. Pareceres do CNE Parecer CNE/CP nº 53/1999, aprovado em 28/01/99. Dispõe sobre as Diretrizes Gerais para os Institutos Superiores de Educação. Parecer nº CNE/CP 115/1999, aprovado em 10/08/99. Diretrizes Gerais para os Institutos Superiores de Educação (Dispõe sobre os Institutos Superiores de Educação, considerados os artigos 62 e 63 da Lei 9.394/96 e o artigo 9º, parágrafo 2º, alíneas “c” e “h” da Lei 4.024/61, com a redação dada pela Lei 9.131/95). Parecer CNE/CES nº 970/1999. Curso Normal Superior e da Habilitação para o Magistério em Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental nos cursos de Pedagogia. Parecer CNE/CP nº 009/2001, aprovado em 08/05/2001. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. Parecer CNE/CP nº 10/2000, aprovado em 09/05/2000. Proposta de revisão do Decreto Federal nº 3.276/99. Parecer CNE/CES nº 133/2001, aprovado em 30/01/2001. Esclarecimentos quanto à formação de professores para atuar na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Parecer CNE/CEB nº 01/2003, aprovado em 19/02/2003. Consulta sobre formação de profissionais para a Educação Básica. Parecer CNE/CEB nº 03/2003, aprovado em 11/03/2003. Consulta tendo em vista a situação formativa dos professores dos anos iniciais do ensino fundamental e da educação infantil. Resoluções do CNE Resolução CNE/CES nº 02, de 13 de agosto de 1997. Fixa prazo para adaptação dos estatutos e regimentos das instituições de ensino superior do sistema federal de ensino à Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Resolução CNE/CEB nº 03, de 26 de julho de 1998. Institui as Diretrizes Nacionais para o Ensino Médio. Resolução CNE/CES nº 01, de 27 de janeiro de 1999. Dispõe sobre os cursos seqüenciais de educação superior, nos termos do artigo 44 da Lei 9.394/96. Resolução CNE/CEB nº 01, de 07 de abril de 1999. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Resolução CNE/CP nº 01, de 30/09/1999. Dispõe sobre os Institutos Superiores de Educação, considerados os artigos 62 e 63 da Lei 9.394/96 e o artigo 9º, parágrafo 2º, alíneas “c” e “h” da Lei 4.024/61, com a redação dada pela Lei 9.131/95. Resolução CNE/CP nº 01, de 18 de fevereiro de 2002. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica em nível superior nos cursos de licenciatura de graduação plena. Resolução CNE/CP nº 02, de 19 de fevereiro de 2002. Institui a duração e a carga horária dos cursos de licenciatura de graduação plena de formação de professores da Educação Básica em nível superior. Resolução CNE/CP nº 03, de 18 de dezembro de 2002. Institui as Diretrizes Nacionais Gerais para a organização e o funcionamento dos cursos superiores de tecnologia. Resolução CNE/CES nº 23, de 05 de novembro de 2002. Dispõe sobre o recredenciamento de universidades e centros universitários do sistema federal de ensino superior. Resolução CNE/CEB nº 01, de 20 de agosto de 2003. Dispõe sobre os direitos dos profissionais da educação de nível médio, na modalidade Normal, em relação à prerrogativa do exercício da docência, em vista do disposto na Lei 9.394/96, e dá outras providências. LEGISLAÇÃO ESTADUAL CONSULTADA Leis Lei 1.176, de 21 de julho de 1987. Autoriza o Poder Executivo a Instituir a Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro – FAETEC. Lei 2.735, de 10 de junho de 1997. Altera a Lei 1.176, de 21 de julho de 1987, dispõe sobre o quadro permanente de pessoal da Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro – FAETEC e dá outras providências. Lei nº 3.781, de 18 de março de 2003. Dispõe sobre a reestruturação do quadro permanente de pessoal da Fundação de apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro – FAETEC, e dá outras providências. Lei 3.808, de 05 de abril de 2002. Altera a natureza da Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de janeiro – FAETEC, o Regime de Pessoal de seus servidores e dá outras providências. Decretos Decreto nº 21.752, de 08 de novembro de 1995. Institui, sem aumento de despesa, o Centro de Educação Integral – CEI. Decreto nº 22.011, de 09 de fevereiro de 1996. Transfere a Fundação de Apoio à Escola Pública – FAEP, da Secretaria de Estado de Educação, para a Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia – SECT/FAETEC. Decreto nº 23.482, de 10 de setembro de 1997. Transfere o Instituto de Educação do Rio de Janeiro para o âmbito da Fundação de Apoio à Escola Técnica – FAETEC -, vinculada à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Decreto nº 24.338, de 03 de junho de 1998. Transforma, sem aumento de despesa, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro em Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro, e dá outras providências. Decreto nº 28.420, de 23 de maio de 2001. Cria o Instituto Superior de Educação do Município de Santo Antônio de Pádua. Decreto nº 28.739, de 03 de julho de 2001. Cria o Instituto Superior de Educação do Município de Itaperuna. Decreto nº 28.947, de 14 de agosto de 2001. Transfere da SEE para a SECTI/FAETEC e transforma em Instituto Superior de Educação, sem aumento de despesa, o Instituto Superior de Educação Professor Aldo Muylaert, do Município de Campos dos Goitacases, e dá outras providências. Decreto nº 30.302, de 21 de dezembro de 2001. Cria o Instituto Superior de Educação do Município de Bom Jesus do Itabapoana. Decreto nº 30.303, de 21 de dezembro de 2001. Cria o instituto Superior de Educação do Município de Três Rios. Decreto nº 30.937, de 18 de março de 2002. Cria o Instituto Superior de Tecnologia em Horticultura do município de Campos dos Goitacases. Decreto nº 30.938, de 18 de março de 2002. Cria o instituto Superior de Tecnologia em Ciências da Computação do Município do Rio de Janeiro. Decreto nº 30.939, de 18 de março de 2002. Cria o Instituto Superior de Tecnologia em Ciências da Computação do Município de Petrópolis. Pareceres do CEE Parecer CEE/CLN nº 430/97, aprovado em 25/11/1997. Aprova o projeto da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro – Subsecretaria Adjunta de Ensino para criação do ISERJ – Instituto Superior de Educação no Estado do Rio de Janeiro. Parecer CEE/CES nº 178/98, aprovado em14 de julho de 1998. Aprova o Roteiro de Verificação para Autorização e Reconhecimento de Curso de Estabelecimentos de Ensino superior vinculados ao Sistema Estadual de Ensino. Parecer CEE/CES nº 258/98, aprovado em 13/10/1998. Credencia o Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro, autoriza o funcionamento do seu Curso Normal Superior e faz recomendações. Parecer CEE/CCES/CEP nº 544/2002, aprovado em 16/04/2002. Responde a consulta da Direção-Geral do ISERJ e dá outras providências. Parecer CEE/CCES/CEP nº 212/2002, aprovado em 1º de julho de 2003. Credencia os Institutos Superiores de Educação de Bom Jesus do Itabapoana, de Três Rios, de Itaperuna, de Santo Antônio de Pádua, Profº Aldo Muylaert, de Campos dos Goitacases, autoriza os Cursos Normais Superiores dos respectivos Institutos, por 01 (um) ano, suspende toda e qualquer forma de ingresso, até o seu reconhecimento dos mesmos, e determina outra providência. Deliberações do CEE Deliberação CEE/CES nº 215/95, aprovada em 05/09/95. Fixa normas para os Concursos Vestibulares das Instituições Isoladas de Ensino Superior vinculadas ao Sistema Estadual de Ensino. Deliberação CEE/CES nº 222/97, aprovada em 02/12/1997. Fixa normas de funcionamento das instituições de Educação Superior vinculadas ao Sistema Estadual de Ensino, em observância à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Deliberação CEE/CES nº 226/98, aprovada em 26/05/1998. Dispõe sobre o credenciamento de universidades no âmbito do Sistema Estadual de Ensino. Deliberação CEE/CES nº 228/98, aprovada em 09/06/1998. Dispõe sobre o Credenciamento de Faculdades Integradas, Faculdades, Institutos Superiores ou Escolas Superiores do Sistema Estadual de Ensino. Deliberação CEE/CES nº 229/98, aprovada em 16 de junho de 1998. Dispõe sobre Autorização de novos cursos em Faculdades Integradas, Faculdades e Institutos Superiores ou em funcionamento no Sistema Estadual de Ensino. Deliberação CEE/CEB nº 265/2001, aprovada em 03/04/2001. Dispõe sobre a formação de professores em Curso de Ensino Médio na Modalidade Normal para a Educação Infantil e para os quatro primeiros anos do Ensino Fundamental. DOCUMENTOS CONSULTADOS RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica/Instituto de Organização Racional do Trabalho do Rio de Janeiro. Subprojeto I – Organização Funcional do Instituto Superior de Educação. Rio de Janeiro, maio de 2000. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica/Instituto de Organização Racional do Trabalho do Rio de Janeiro. Subprojeto II – Organização Funcional do Curso Normal Superior. Rio de Janeiro, maio de 2000. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica/Instituto de Organização Racional do Trabalho do Rio de Janeiro. Projeto de Implantação e Implementação da Rede de Institutos Superiores de Educação. Rio de Janeiro, maio de 2000. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica/Instituto de Organização Racional do Trabalho do Rio de Janeiro. Projeto de Regimento Interno – Instituto Superior de Educação/Curso Normal Superior. Rio de Janeiro, junho de 2000. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica/Coordenação dos Institutos Superiores de Educação. Projeto para regularização legal dos cursos realizados pelos Institutos Superiores de Educação. Rio de Janeiro, março de 2003. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica. Regimento Interno de Unidades Escolares. Rio de Janeiro, 2002. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica. Diretoria Pedagógica. Documento “Contribuições do Fórum Pedagógico e Seminário/Integração da FAETEC”. Rio de Janeiro, 2002. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica. Catálogo Escolar. Rio de Janeiro, 2002. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de apoio à Escola Técnica. Comissão Especial de Avaliação Externa. Relatório Final de Avaliação do Curso Normal Superior do Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro. Rio de janeiro, maio de 2001. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Fundação de Apoio à Escola Técnica. Diretrizes para a Construção do Projeto Político-Pedagógico da Rede de Ensino FAETEC. Rio de Janeiro, 2001. RIO DE JANEIRO (Estado). Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro. Diretoria de Educação Superior. Estudo sobre a organização e implantação do Curso Normal Superior do Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro (Projeto do Curso Normal Superior do ISERJ). Rio de Janeiro, 1999. RIO DE JANEIRO (Estado). Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro. Manual de Orientação Acadêmica do Curso Normal Superior. Rio de Janeiro, 2001. RIO DE JANEIRO (Estado). Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro. Regimento Interno. Rio de Janeiro, 2002. RIO DE JANEIRO (Estado). Conselho Estadual de Educação. Comissão Verificadora. Relatório conjunto de verificação para credenciamento e autorização dos Institutos Superiores de Educação/Curso Normal Superior de Santo Antônio de Pádua, Itaperuna, Campos dos Goitacases, Bom Jesus do Itabapoana e Três Rios. Rio de Janeiro, setembro de 2002. RIO DE JANEIRO (Estado). Conselho Estadual de Educação. Câmara Conjunta de Educação Superior e Educação Profissional. Despacho de Câmara nº 001/2002. Análise dos Processos nº E-03/100.238/2002; E-03/100.353/2002; E03/100.237/2002; E-03/100.236/2002 e E-03/100.235/2002 da FAETEC. Rio de Janeiro, outubro de 2002. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Educação. Subsecretaria Adjunta de Ensino. Anteprojeto de Implantação do Instituto Superior de Educação no Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1997. RIO DE JANEIRO (Estado). Secretaria de Estado de Educação. Coordenadoria Geral Pedagógica. Coordenadoria de Ensino Básico. Projeto das Unidades de Formação de Professores, Atualização de Professores, Unidade de Pesquisa e Manuscritos da Unidade de Produção e Promoção Cultural e Esportiva do CTQE. Rio de Janeiro, 1993. PERNAMBUCO (Estado). MEC/Universidade Federal de Pernambuco. Centro de Educação. Synthèse Du Projet. A la recherche de qualité pour la formation du professeur de l’école primaire e secondaire de l’enseignement public. Pernambuco, 1994. RIO GRANDE DO NORTE (Estado). MEC/Universidade Regional do Rio Grande do Norte. Plano do Curso de Formação de Professores de 1º grau – 1ª a 4ª séries. – em nível de 3º grau. Rio Grande do Norte. ANEXOS ANEXO 1 ENTREVISTAS REALIZADAS 1) Profª Maria de Nazareth de Souza Lima - SEE/RJ 2) Profº Lincoln de Araújo Santos - SEE/RJ 3) Profª Nilda Teves Ferreira – SECT/FAETEC 4) Profº Livingstone dos Santos Silva – SEE/RJ 5) Profª Lia Ciomar Macedo de Faria – SEE/RJ 6) Profª Turma 3381 – turno da noite – 8º período – ISERJ 7) Profª Sônia Maria de Castro Nogueira Lopes - ISERJ 8) Profª Célia Maria Penedo - ISERJ 9) Profª Sandra Regina Pinto dos Santos - ISERJ 10) Profº Milton Coelho - FAETEC 11) Profº Adilson Pereira - FAETEC 12) Profª Ângela Maria Alves de Almeida - FAETEC 13) Profª Maria Inez Mello Guimarães - FAETEC 14) Profº Álvaro Chrispino – SEE/RJ 15) Profª Francisca Maria Frias - ISEPAM 16) Profª Talita Tavares Batista do Amaral de Souza - ISEPAM 17) Profª Rosane Aparecida Bartholazzi - ISEBJI 18) Profª Marlene Mendes de Castro Santos - ISETRI 19) Profª Maria Cristina Souza Machado - ISESAP 20) Profº Sandro Luiz Faria da Costa - ISESAP 21) Profª Izabel Cristina Alfradique Carpi - ISEI 22) Profº Hésio Cordeiro – SEE/RJ 23) Profª Léa Dina Szrajbman - ISERJ 24) Profª Lindomar Luiza Goldschmidt - ISERJ 25) Profª Herondina Calvão da Silva - SEE/RJ 26) Profª Maria Lúcia Kohn - IDORT Data: 12/01/2002 Data: 29/08/2002 Data: 03/09/2002 Data: 17/09/2002 Data: 25/09/2002 Data: 16/10/2002 Data: 17/10/2002 Data: 23/10/2002 Data: 31/10/2002 Data: 25/11/2002 Data: 25/11/2002 Data: 28/11/2002 Data: 12/05/2003 Data: 15/05/2003 Data: 22/05/2003 Data: 22/05/2003 Data: 02/06/2003 Data: 04/06/2003 Data: 05/06/2003 Data: 05/06/2003 Data: 09/06/2003 Data: 13/08/2003 Data: 15/08/2003 Data: 15/08/2003 Data: 08/09/2003 Data: 09/10/2003 ANEXO 2 ROTEIRO DE ENTREVISTA COM A CONSULTORA QUE FORMULOU O PROJETO DOS ISE/CNS DO INTERIOR 1) Gostaria que a senhora falasse quando, como e de quem surgiu o pedido para elaboração de um projeto para o CNS dos ISE no interior do estado. 2) Gostaria que a senhora falasse um pouco sobre de quem foi a idéia de elaboração desse projeto e sobre o momento vivido na época. 3) Fale a respeito das principais dificuldades vividas na elaboração dos projetos e como foi o relacionamento com a FAETEC durante a elaboração. 4) Como a D&M foi realmente contactada para a elaboração dos projetos? De quem surgiu o convite? Houve outra Consultoria contatada? 5) Qual foi a base tomada para elaboração desse projeto? Foi alguma legislação? Houve algum outro projeto que serviu de exemplo? 6) A D& M teve plena liberdade para elaborar o projeto ou a FAETEC interveio? 7) Por que o primeiro projeto previa a duração do CNS para um ano e oito meses? 8) A D&M também elaborou o projeto de Regimento Interno das instituições. Houve outro projeto elaborado? 9) Vocês já ocuparam algum cargo na SEE ou FAETEC? Já ocuparam alguma posição como docente? 10) Vocês já elaboraram outros projetos para entidades públicas ou privadas na área de formação de professores? Poderiam citar? 11) O modelo de CNS elaborado por módulos foi uma idéia da FAETEC, partiu da própria Consultoria, ou de outro órgão ou outro projeto existente? ANEXO 3 ROTEIRO DE ENTREVISTA COM PROFESSORES IMPLEMENTADORES DO CNS DO ISERJ 1) A senhora pode falar um pouco sobre o processo de criação (a gênese) do ISERJ? 2) Como o ISERJ/CNS está estruturado atualmente? 3) A senhora chegou a participar de alguma reunião no período de transição de IERJ para ISERJ? Onde ocorreram, quem as promovia e quais as principais discussões em pauta? 4) Qual a sua participação efetiva no processo de criação dos ISE no Estado do RJ? 5) A senhora poderia falar um pouco sobre como a SECT/FAETEC entrou nesse processo? 6) Na época em que o ISERJ foi criado, houve descontentamentos por parte dos docentes e da Coordenação por causa de sua vinculação à FAETEC? E hoje? 7) O que a senhora acha dos ISE estarem hoje vinculados à SECT/FAETEC e não à SEE? Na prática, para vocês, existe alguma diferença nítida? 8) Qual a sua visão acerca da existência de interesses conflitantes no projeto ideológico da SECT/FAETEC e no papel da SEE quanto à formação de professores? 9) O que lhe agrada e o que lhe desagrada na atual vinculação do ISERJ à SECT/FAETEC? 10) Existe alguma diferença básica entre o projeto de formação de professores efetivado pelo ISERJ e pelos outros Institutos (Itaperuna, Pádua, Três Rios, Campos e Bom Jesus)? 11) Como a senhora percebe a existência dos outros ISE/CNS? 12) Para a senhora, qual seria o papel dos docentes, discentes e demais envolvidos no processo de formação de professores, e qual tipo de profissional, a seu ver, será formado no projeto dos ISE/CNS da SECT/FAETEC? Existem diferenças entre os projetos? 13) Para a senhora, o que seria formar um professor com viés técnico? 14) Para a senhora, a formação de professores é alvo de disputa política no Estado do Rio de Janeiro? 15) A senhora poderia, no seu entender, descrever por que os ISE/CNS ficaram vinculados à SECT/FAETEC e não à SEE? ANEXO 4 ROTEIRO DE ENTREVISTA COM DIRETORES E COORDENADORES DOS ISE/CNS DO INTERIOR 1) Como surgiu a nasceu o projeto desse ISE/CNS e como surgiu a idéia de sua implantação nesta cidade? Gostaria de conhecer a estrutura de funcionamento do ISE no tocante a seus cursos e estrutura administrativa. 2) Desde quando o Instituto existe? 3) Como foi feita estabelecida a política de implementação desse ISE nesta cidade? Por que foi estabelecido nesta cidade? 4) Como é composto o corpo docente? Gostaria que você informasse (se há) a quantidade de professores com graduação, especialização, mestrado e doutorado. 5) Foi realizado vestibular? Como foi a procura? 6) Quantas turmas estão cursando o CNS atualmente nessa unidade? 7) Quantos alunos realizam o CNS nesse Instituto, e em quantos turnos? 8) Quais as maiores dificuldade enfrentadas para seu funcionamento? 9) Além do Curso Normal Superior, quais outros cursos oferece? 10) Qual o percentual de alunos de outras cidades e de outros estados que aqui estudam? 11) Qual a duração do Curso Normal Superior? 12) Quantas turmas de CNS o Instituto já formou? 13) Há alguma espécie de apoio técnico e financeiro ou de outro tipo por parte de outro órgão extra-FAETEC? 14) Qual a relação do Instituto com a prefeitura da cidade? Há alguma parceria? Recebe algum tipo de apoio? 15) O Instituto possui autonomia pedagógica? Como é exercida essa autonomia? Existe algum conselho acadêmico na unidade? Por quem é formado? Possui Regimento Interno? 16) Qual tipo de proposta de formação de professores está sendo gerada pela unidade? Que tipo de professor se pretende formar nesta unidade? 17) Essa unidade possui Colegiado? Possui Conselho Superior? Possui Colégio de Aplicação? 18) Essa unidade desenvolve algum tipo de pesquisa ou extensão acadêmica na área de formação de professores? Quem financia? 19) Como é estabelecida a relação com a FAETEC para funcionamento desta unidade? 20) Há algum programa de intercâmbio entre os ISE? Vocês já visitaram algum outro? 21) Como você percebe a formação aqui é realizada? 22) Você percebeu ou percebe alguma articulação ou manobra política, jogo de interesses com relação à instalação desse Instituto, em relação à FAETEC, prefeitura ou outro órgão regional? De que tipo? 23) Aos alunos que são da Rede Pública Municipal haverá algum tipo de ascensão após o término do Curso? 24) Como foi escolhida a direção? Você acumula a regência de turma? 25) Como está a infra-estrutura do ISE, com respeito a salas, biblioteca etc? 26) O que já foi feito pela FAETEC para autorização/reconhecimento desse ISE? Tem havido reuniões periódicas com esse fim? 27) Esta cidade possui Instituto de Educação em Nível médio? 28) Conte um pouco da sua trajetória no campo da educação. ANEXO 5 ROTEIRO DE ENTREVISTA COM A FORMULADORA DO PRIMEIRO PROJETO DE ISE/CNS DA FAETEC 1) A senhora pode situar no tempo a criação da FAETEC, como se deu essa criação, com que finalidade foi criada e qual a sua participação nesse processo? 2) A senhora pode falar um pouco sobre a missão da Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia? 3) No seu entendimento, a SECT/FAETEC possui alguma relação com a formação de professores em nosso estado? Qual o interesse por esta área? 4) Qual projeto possui a SECT/FAETEC na área de formação de professores e que papel específico ela possui? 5) Qual a sua participação efetiva no projeto de criação dos Institutos Superiores de Educação no Estado do Rio de Janeiro? 6) Na época em que o primeiro ISE/CNS (ISERJ) foi criado no estado do Rio, houve algum descontentamento entre a Secretaria de Estado de Educação e a SECT/FAETEC, por causa da sua vinculação? 7) A senhora acha que há, na atualidade, um “divórcio” de relações entre a SEE e a SECT/FAETEC no que tange aos ISE e à formação de professores? 8) A senhora sinalizaria o porquê do ISERJ ter sido o primeiro ISE a ser criado no estado do Rio e, posteriormente, o porquê da escolha das outras cinco unidades (Itaperuna, Pádua, Três Rios, Campos dos Goitacases e Bom Jesus) terem sido selecionadas para o mesmo processo, a despeito de outras? 9) Houve, em algum momento, articulação entre a SECT/FAETEC e a SEE, no que diz respeito aos ISE, ou a relação foi conflitiva? 10) A senhora acha que existem interesses conflitantes no projeto ideológico da FAETEC e no papel da SEE quanto à formação de professores? 11) A senhora acha que a formação de professores é alvo de disputa política no estado do Rio? ANEXO 6 ROTEIRO DE ENTREVISTA COM O FORMULADOR DO PROJETO DE ISE/CNS DA SEE 1) Gostaria que o senhor nos falasse um pouco sobre o surgimento da idéia de implantação de ISE/CNS na Rede Pública estadual do Rio de Janeiro e quais os primeiros movimentos realizados para essa implantação. 2) Gostaria que o senhor nos falasse um pouco sobre a ligação do projeto dos ISE/CNS com modelos de outros países. 3) O senhor pode nos falar um pouco sobre o projeto que o senhor propôs para a formação de professores nos ISE/CNS, que deu origem ao Parecer CEE 430/97? 4) Qual a sua visão sobre o fato do projeto que foi formulado pela SEE não ter seguido adiante? 5) Na sua visão, por que a SEE não ficou com a gerência dos ISE/CNS no estado do Rio? 6) Como o senhor vê a vinculação administrativa dos ISE/CNS à SECT/FAETEC? Houve alguma jogada política ou interesses conflitantes entre os projetos? 7) Para o senhor, a formação de professores para a educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental no estado do Rio é alvo de uma disputa política? 8) Durante a sua estada na SEE, em algum momento houve discordância sobre o modelo de projeto dos ISE/CNS e de sua vinculação à FAETEC? 9) Por que o seu projeto foi formulado para formar professores em “nível pós-médio” e não uma formação plena? 10) Fale um pouco da sua trajetória como educador. ANEXO 7 ENTREVISTA COM A FORMULADORA DO PRIMEIRO PROJETO DE ISE/CNS DA FAETEC Entrevistador: A senhora pode situar no tempo a criação da FAETEC, finalidade foi criada e qual a participação da senhora nesse processo? com que Entrevistada: A criação da FAETEC é a seguinte: A FAETEC já era um ponto na trajetória que eu fiz no estado. O primeiro período, o primeiro ano de estado foi ... Eu comecei minha trajetória foi como Subsecretária do Gabinete Civil do governo Marcelo Alencar e aceitei o desafio de ir para Quintino e estruturar o Centro de Educação Integral – o CEI. O CEI permitiu que lá eu fizesse um trabalho de educação profissional. No decorrer do ano, quando eu cheguei lá, tinham duzentas e poucas crianças, eu já tinha umas oito a dez mil crianças em um ano. O governador ficou tão entusiasmado com o sucesso do trabalho que resolveu ... (e o meu trabalho lá era educação profissional. Eu estava trabalhando o profissionalizante e tinha criado o Colégio República (que foi um CEI). Então o governador ficou tão impressionado que ele resolveu me dar para tomar conta as escolas técnicas do Rio de Janeiro. Então ele pegou dez escolas e trouxe para mim. Mas como é que ele podia trazer prá mim, se eu era gabinete civil; eu era subsecretária do Gabinete Civil? Então ele fez o seguinte: ele pegou a FAEP, que era uma fundação do tempo do Brizola, que foi criada prá dar é... é..., rapidez, execução nos CIEP. Então era uma Fundação de Apoio às Escolas Públicas, criada ainda no governo anterior. Estava muito mortinha; estava desativada... mas prá criar uma outra fundação teria que submeter à ALERJ. A ALERJ não queria mais que se criasse mais fundações no governo. Então ele pegou a FAEP, botou na Secretaria de Ciência e Tecnologia, transformou a FAEP em FAETEC. Na Secretaria de Ciência e Tecnologia, qual era a função da FAETEC? Era viabilizar um projeto de ensino técnico que fosse orgânico como projeto de desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro. Então havia um projeto de desenvolvimento da indústria, o porto de Sepetiba, atualização dos recursos... Então havia um projeto de governo no campo do desenvolvimento regional. E as escolas técnicas deveriam se adaptar, se ajustar a esse modelo. Então ele pega as escolas técnicas e bota na FAETEC e me dá a presidência da FAETEC. Coube a mim reformular as escolas técnicas, as escalas dos currículos e dos programas; e eu encontrei equipamentos absolutamente caóticos. Expedição de diplomas, regulamentos de estágio, é... critérios de avaliação e promoção, currículos defasados... Eu encontrei a Rede Estadual de Ensino, no que tange o ensino técnico, em precaríssimas condições. Estruturamos, criamos na FAETEC, então, uma infra-estrutura que foi: departamento de compras; comissão de licitação; departamento pessoal... Tudo isso, quem criou fomos nós. Não tinha nada disso. Por que? Porque a FAETEC ela é... a FAEP era embutida na Secretaria de Educação, que não tinha como mexer; era uma coisa meio informe. Depois que eu estruturei a FAETEC... (eu estava estruturando a FAETEC e tocando as escolas), remodelamos as escolas, criamos cursos novos, atualizamos, criamos central de estágios, fizemos obras, botamos informática em todas as escolas, é... criamos cursos como, por exemplo, eletrônica, telecomunicações, o curso de técnico em enfermagem, técnico em informática, tudo, tudo, tudo. Bom, então, durante três anos, aquilo ali foi um sucesso. O CEI chegou a ter 25.000 alunos. Aí criamos mais três CEI: foi o CEI Marechal, o CEI Santa Cruz e o CEI Barreto (virou Escola Técnica do Barreto, que hoje também é uma grande escola). Bom, com isso nós ficamos com quatro CEI (um mais três CEI) e as outras escolas... até o último ano de governo. No último ano de governo, a primeira dama, professora Célia Alencar, ficava extremamente triste de que as outras escolas estavam indo muito bem e o Instituto de Educação , que tinha sido a escola dela, continuava com tapume, abandonada sem Regimento, com (Regimento superado) e ela me pediu que assumisse o Instituto de Educação, tal qual ele era: Escola Normal. Bom, desde o início do governo que eu fui conselheira do Conselho Estadual de Educação. E eu aproveitei o meu tempo de Conselho estadual de Educação para fazer a fundamentação toda (aprovar os programas, aprovar o currículo... ). Quando eu fui ser Secre... Aí no ... no... no... último ano de governo o Dr. Elói Fernandes e Fernandes saiu para ser diretor (um dos diretores da Agência Nacional do Petróleo), o cargo de Secretário ficou vago e o governador me convidou para assumir o cargo. Como eu já estava na Secretaria, porque na verdade eu era presidente de uma fundação da Secretaria, eu assumi a Secretaria. Assumi a Secretaria, fui regularizar a situação da Universidade do Norte Fluminense (que o Dr. Darcy Ribeiro tinha criado a Universidade do Norte Fluminense mas não tinha documentação legalizando-a). Então eu fui legalizá-la. Montei uma comissão de alto nível e legalizamos os cursos, organizamos tudo. Bom, assumi as duas Universidades (que era a UERJ e a UENF), o Hospital Pedro Ernesto, um mega projeto... Então a Secretaria ficou uma coisa muito grande. Mas como a Célia (Célia Alencar) tinha uma dor profunda do Instituto de Educação estar abandonado (abandonado... tá... no meio das outras escolas sem um tratamento especial) ela me disse: “- Nilda, você esqueceu que Escola Normal também é ensino técnico?” E era. É um profissionalizante. É uma escola de formação de professores. É um profissionalizante. Aí eu disse : “não”. Então ela disse: “então pega a escola!” Aí o Dr. Marcelo transferiu o Instituto de Educação para a Secretaria de Ciência e Tecnologia. Foi aí que começou a minha caminhada aqui no Instituto de Educação (acho que eu respondi a 1ª, a 2ª e a 3ª....) – “a senhora situar o campo de criação da FAETEC” - já falei. “A finalidade com que foi criada e qual a participação minha”: já falei. “A senhora pode falar um pouco sobre a missão da Secretaria de Ciência e tecnologia? – já falei, perfeito? Entrevistador: Perfeito. Entrevistada: (lê a questão) – No seu entendimento a SECT e a FAETEC possuem alguma relação com a formação de professores em nosso estado? Qual o interesse dessas por esta área? Acabei de falar também esta questão. Vou explicar o que que era. O interesse o seguinte: era dar ao Instituto de Educação um lugar de destaque porque ele ficaria numa Secretaria que estava funcionando mais ágil, com mais recursos, mais... mais... (não quero usar essa expressão), mas com um pouco mais de instância de poder. A Secretaria de Ciência e Tecnologia, nesta gestão, teve um poder de execução mais rápido por causa da FAETEC. Quando uma Sec... Uma Secretaria sem Fundação ela é muito emperrada, ela é muito difícil de andar. E a FAETEC, ela foi criada para isso, foi prá é viabilizar o projeto do CIEP. Bom, então, eu fui, peguei o Instituto e fui lá assuntar, o Instituto (que que era, quem dera, como é que estava). Por que? Porque o Instituto, prá mim, já estava defasado. Junto a isso eu estou no Conselho Estadual de Educação discutindo a nova Lei de Diretrizes e Bases. E na nova LDB você tinha um “pinto” demarcado para para transformar... é ...para transformar o ensino normal em ensino normal superior, pela Lei. O tinha Darcy Ribeiro (que foi meu grande amigo) e também Anísio Teixeira. O sonho do Anísio é que o Instituto de Educação da Mariz e Barros fosse norma.... fosse superior. O sonho de Anísio Teixeira, tá! Ele achava que a vocação dos professores de 1ª a 4ª teria que ser uma vocação de nível superior. Bom, e eu acho que eu fui prá ajustar um desejo do Anísio (um desejo do Darcy, que ele também pensa por isso). Mas eu fui fazer um modelo, meu filho, um modelo experimental. Eu não criei dois, três Institutos de Educação. Eu criei um só. Porque eu disse: “- vamos dar um tempo, efetivar, montar as bases do ensino de formação de professores de ótimo nível e ver como isso funciona”. Então ele foi experimental. Você me perguntaria: “Por que que você escolheu o Instituto?” Porque o Instituto, já naquela época, tinha tudo. Ele tinha biblioteca; ele tinha corpo docente qualificado; ele tinha instalações, laboratórios... O Instituto no Rio de Janeiro, o Instituto de Educação, criado inclusive por Anísio Teixeira, ele sempre foi um campus nobre de formação de professores. Mas ele foi muito perdendo; ele foi perdendo por uma coisa dramática. Pela própria legislação que (teve um dos governos que eu não sei, parece que foi Carlos Lacerda), que colocou como critério de acesso ao Instituto de Educação, pobreza; demanda social. Isso fez com que entrassem no Instituto pessoas sem nenhuma qualificação, sem nenhuma condição de ter diretamente uma formação de professores a curto prazo. Porque o concurso para o Instituto era dificílimo na década de 50. Era como o vestibular. Eram três anos de curso de formação de professores (o técnicoprofissionalizante), mas o aluno, para entrar lá, tinha que ter domínio da aritmética, domínio de história, de geografia e de português. As redações eram dificílimas, sê tinha explicadores que preparavam pro Instituto de Educação, pro Colégio... pro Pedro II e pro Colégio Militar. Eram os três órgãos de maior exigência para ter acesso.Isso acabou, em relação ao Instituto de Educação. O Colégio Militar continua com alto dizência. O Colégio Pedro II com alta dizência. O Instituto de Educação não. Adquiriu, assumiu o critério de pobreza. Então, quando eu entrei, eu acabei com o critério de pobreza. Eu o coloquei no mesmo regimento da FAETEC. E o regimento da FAETEC eu... eu tirei, copiei, ajustei, o regimento do Colégio Pedro II, que a média era sete para passar direto, seis prá ir prá final e cinco prá 2ª época. Foi um critério de seleção grande (porque a procura foi enorme). Então era exigido rigor na entrada e rigor nas promoções. Quando eu cheguei no Instituto de Educação falando nesse novo projeto, muitos professores disseram dali... “mas professora, não vai ter aluno, a senhora está enganada”. E quando eu fiz a primeira prova, a maior procura da FAETEC foi para a Escola Normal, foi para o Instituto de Educação, onde eu cheguei a ter 40 candidatos por vagas. Então me dizer que não haveria procura porque haveria concurso e ninguém queria ser professor, se desmoralizou ali, porque quando fizemos o primeiro concurso tivemos 40 candidatos por vaga. Então isso foi uma vitória. Bom, aí eu peguei o Instituto de Educação e fiz o projeto para transformá-lo em Instituto Superior de Educação. Mas o que que eu pensava: eu pensava que ali se faria formação de professores de 1º e 2º graus; educação infantil, educa... do ensino médio; do ensino médio no sentido geral porque depois teríamos ali formação de professores de letras, de matemática, de história, de geografia... Eu não terminaria com educação infantil e o normal superior. Eu queria tudo; eu queria formação de professores de educação infantil, normal superior e de 8ª até a última série ( o antigo 2º grau). Aprovamos no Conselho Estadual de Educação e fizemos o projeto. Fizemos o vestibular; a concorrência foi essa que eu te falei, a prova foi muito difícil; constituí uma comissão de seleção com professores da UFRJ (a comissão de seleção foi uma comissão de seleção difícil porque foi uma seleção com as escolas da rede). Então tinha que saber matemática, física, química, geografia, biologia... Foi um vestibular, porque para as escolas técnicas (foi o último vestibular que eu fiz) nós oferecemos 8.000 vagas e eu tive 57.000 candidatos (para as escolas técnicas). Então o povo percebeu que aquelas escolas estavam sérias, rigorosas, bem instrumentalizadas com laboratórios, com tudo, então o povo todo foi. Tanto que os cursinhos todos passaram a preparar para a FAETEC. Todo o lugar que você ia ...“preparase para a FAETEC...” E o instituto entrou no regimento FAETEC, tá? Então eu acho que aqui eu já te respondi a 1ª, a 2ª e a 3ª. Entrevistada (lê a questão) – Que projeto possui a SECT/FAETEC na área de formação de professores e que papel específico ela possui nesta área? É isso. Já respondi. Era prá formar a ... o professor de alto nível. Algumas pessoas me acusaram de querer formar um centro de excelência. Com certeza. Porque eu não acredito que o rebaixamento da qualidade ajude o desenvolvimento do país. Infelizmente pode parecer elitista, mas é muito pior você enganar o povo. Dizer que você está dando escola e essa escola não valer para coisa nenhuma. Então, eu sou socialista, sou a favor do ensino de qualidade prá todos, universalizado; mas não tendo prá todos, deve ser disponibilizado (para aqueles que tiverem acesso), o ensino de muita qualidade. Então eu sou uma fervorosa defensora do ensino de qualidade público gratuito. Eu queria criar um paradigma, uma escola que representasse o que havia de melhor em formação de professores. e a partir dali fosse modelo multiplicativo, tá?! Esse foi o projeto. Entrevistada (lê a questão) - Qual a sua participação efetiva no projeto dos Institutos Superiores de Educação no Estado do Rio de Janeiro e sua criação? Eu criei o primeiro Instituto Superior de Educação do Brasil, entendeu? Porque existia na lei. Ninguém tinha efetivado. Aí eu levei o projeto pro Conselho Estadual de Educação... o pessoal levou um susto. Por que? Porque o Conselho Estadual de Educação tinha autonomia prá aprovar. Então não precisa mandar... Eu não precisava mandar pro Conselho Federal. Depois que o nosso se efetivou aí virou paradigma. Muitos estados assumiram. Eu dei muita ênfase à questão da linguagem (e das linguagens), que na verdade é... Hoje os Parâmetros Curriculares falam na questão das linguagens (dei muita ênfase na questão das linguagens); dei muita ênfase no ensino de laboratório de língua portuguesa. O curso, se você depois pegar o currículo que nós fizemos, você vai ver que ele está todo trabalhado em , é ... laboratórios e oficina; laboratórios e oficinas prá professora (a futura professora) ter a condição de trabalhar , adquirir o conhecimento, construir conhecimento, repassar conhecimento, é... consolidar conhecimentos, é isso tudo era nas oficinas e laboratórios. Entrevistador – A senhora utilizou algum modelo de um outro país? Entrevistada - Não. Não. Quem foi que fez o programa do Instituto de Educação? Eles. Os professores do Instituto de Educação. Montamos uma comissão lá e eles fizeram o currículo e o programa. Não fui eu. Eu apenas me reunia com eles, discutia, é... dava algumas sugestões, mas o projeto do Instituto de Educação saiu dos profissionais de educação do Instituto de Educação, com tarimba de dez, quinze, vinte anos ali. Porque eu não queria que falasse de educação quem nunca alfabetizou. Porque tá cheio de gente querendo falar em Instituto de Educação e nunca alfabetizou. Lá não. Aquela gente lá sabia. E eu achava que os professores que lá estavam conheciam aquilo ali e o modelo sairia deles. Porque eu ia trabalhar com o desejo deles. “-O que que vocês querem prá esta casa ser emblemática?” Aí eles botaram no papel. O projeto não é meu, é deles. Eu apenas encaminhei e aprovamos no Conselho Estadual de Educação. Entrevistada (lê a questão) – É... Qual a participação efetiva... no Estado do Rio de Janeiro... Eu já falei. Seis. Na época em que o primeiro Instituto foi criado no estado, houve algum descontentamento entre a Secretaria de Estado de Educação e a nossa....? Não. porque era um Secretário chamado Fernando, que ele fez um acordo muito bonito com o presidente, reconheceu que era um estado de emergência, que o Instituto tava vindo prá ali... que o Instituto tava vindo prá ali, como se estivesse sendo num CTI. Era normal que o Instituto ficasse no... na Secretaria de Educação. Mas prá ele poder ter um tratamento vip, já que ia ser um projeto experimental, ele foi prá Ciência e Tecnologia, e o Secretário de Educação, professor Fernando Pinto, atendeu, entendeu e deu todo o apoio. Inclusive o grande apoio que ele me deu é que ele cedeu os professores que lá estavam prá Secretaria de Ciência e Tecnologia, assim como todos os professores das escolas estaduais vieram. Eles tiveram um benefício. Porque nós conseguimos prá FAETEC um plano de cargos e salários semelhante ao da UERJ, que nós tiramos do paradigma do CAPES – o Colégio de Aplicação. Já que a Universidade era da ... da.... Secretaria de Ciência e Tecnologia e nesta Universidade tinha uma escola de nível médio – aliás uma escola... um colégio completo – desde o pré-escolar até o ...desde o jardim até o segundo grau, e nessa escola tinha um plano de cargos e salários. Eu solicitei ao governador que também fosse feito um plano de cargos e salários para a FAETEC. E o paradigma foi esse do... do CAPES. Fizemos e hoje tem. O professor que tem é... tem pós-graduação, mestrado e doutorado, ele tem a promoção automática, tá? Isso nós conseguimos. Bom, então não houve descontentamento. Por parte dos professores, ao contrário, houve uma grande alegria em terem vindo prá cá. Eles sentiram que estavam sendo muito prestigiados. Houve descontentamento dos outros Institutos de Educação, que queriam vir também. Acontece que o estado tinha outros institutos de educação. Tinha o Jusscelino Kubistcheck, tinha o Carmela Dutra.... Em Niterói... tinham vários. Só que eu só transformei em Instituto Superior de Educação aquele que veio prá mim, que era a... o ISERJ. Só ele. Então pegamos uma criança saudável mas que tava com muita gripe. Vou curar a gripe que ela vai voltar a ser saudável, entendeu? Porque ele ele já foi emblemático. O Instituto foi emblemático. Os melhores professores do Rio de Janeiro se formaram naquele Instituto.. Ele tava abandonadinho. Então disse “Não. Vamos mudar, tirar o que está ruim aqui e ele vai voltar a ser o que era”. Então nós pegamos ele só. Houve o descontentamento por parte dos outros Institutos. Mas também quero lhe dizer: se eu tivesse que avaliar instituição por instituição, nem todas elas iriam se transformar em Instituto Superior de Educação. Outras se transformariam apenas em escola regular de 2º grau porque não têm infra-estrutura de suporte para ser nível superior, porque o Instituto Superior de Educação é um instituto de ensino superior. Entrevistador – Continuaria como a formação de professores? Entrevistada – Não. Não. Não porque a lei seria enganar as pessoas. Porque a lei vai me dizer que em 2007 ninguém mais vai poder continuar dando aula (se você continuar com as escolas normais abertas, você tá empurrando uma bomba de retardo). Porque vai haver um momento que aquilo significa só segundo grau. É preferível que você dê um segundo grau bom e os habilite a fazer o Instituto Superior de Educação do que você enganar, dizer que ele vai ser professor e em 2007 ele não pode ser mais. Entendeu? Então era essa a nossa visão. Entrevistada (lê a questão) – Questão 8 – A senhora sinalizaria o porquê do ISERJ ter sido o primeiro ISE?. Eu já respondi. Ele foi o primeiro porque foi ele que veio para a Secretaria de ciência e Tecnologia. Só podia ser ele. (continua a questão...) “a ser criado no estado posteriormente...” É ... o estado, isso do estado eu não posso responder por eles. Eu acho que... eu não faria isso. Eu iria ter que analisar cada instituição. Isso não pode ser assim. Eu acho que, de certa forma, isso é uma atitude um pouco... (como é... como é que eu vou dizer assim...) um pouco apressada demais. Porque como é que eu vou, num decreto, passar todas as escolas (Campos, Bom Jesus, Três Rios...) .Será que essas escolas gozam das instalações que o Instituto gozava? Laboratório de tudo que o Instituto de Educação do ISERJ tinha, e tem. Laboratório de biologia, laboratório de química, laboratório de ciências, laboratório de linguagens, laboratório de matemática... Lá tem tudo. Então lá pode ser o ensino superior. Tem uma biblioteca maravilhosa que permite pesquisa. Então eu avaliaria. Na minha cabeça, aqui não tô vendo, por exemplo, o JK e a Carmela Dutra. Essas duas, é que se eu tivesse que passá-las, eu examinaria as condições e as instalações, e essas duas eu passaria. Mas não iria fazer isso aqui. Isso aqui jamais Nilda Teves assinaria embaixo. Porque o Instituto, ele tem, como eu lhe disse, ele atende o desejo do Darcy, atende o desejo da... da... do Anísio Teixeira, mas ele prevê uma coisa: ele antes, ele... ser uma instituição de formação, não é de improvisação. Não se pensava em improvisar um professor. Se pensava em formar um professor de alto nível. Com tecnologia, com... por exemplo, eu botei informática no Instituto... Os mesmos laboratórios que eu botei de... botei como disciplina obrigatória, introdução à informática, porque? Porque o futuro professor vai ter que aprender a trabalhar com softwares. Porque as escolas terão softwares. São novas tecnologias na educação. No meu tempo a gente aprendia no máximo é quadro negro e giz. No máximo a transparência. No máximo um slide, passando um por um. Hoje as escolas vão ter que trabalhar com informática. Vão ter que trabalhar com tecnologias avançadas. E eu botei no Instituto de Educação um laboratório de informática, tá? E eu não sei se as outras escolas teriam isso. É... Entrevistada (lê a questão) – Houve, em algum momento, articulação entre a SECT/FAETEC no que diz respeito ao ISE ou a relação foi conflitiva? Não foi conflitiva. Eu acho que isso aqui está embutido naquela anterior. Não foi conflitiva e eu lhe disse o porquê. E essa articulação foi só no sentido de lhes ceder os professores. Ela gozou de uma total autonomia. Ela teve mais próxima das escolas técnicas... Porque, por exemplo, quando nós tínhamos jogos olímpicos, elas participavam dos jogos olímpicos junto das outras escolas técnicas. Era uma escola profissionalizante. Ela é uma escola profissionalizante. E qual é a formaç... a função dos Institutos? Formar profissionais na área da educação. Então ela tinha as mesmas condições. Se eu tivesse continuado na ... no governo, eu teria criado (e quem sabe criar uma universidade popular do modelo ... do modelo inglês, onde os Institutos... onde os... os... as escolas técnicas seriam o suporte de uma universidade popular técnica). Eu criaria uma universidade popular técnica dentro do modelo inglês. E o Instituto de Educação, ele é um caso à parte, mas também profissionalizante. Entrevistada (lê a questão) – A senhora acha que existem interesse conflitantes no projeto ideológico da FAETEC e no papel da Secretaria quanto à formação de professores? Eu não sei, porque, quando você diz assim “ideologia”, eu posso lhe dizer, que... numa concepção de ideologia que eu adoto, né, ideologia como sentido premente, o sentido hegemônico, a FAETEC foi hegemônica em relação, é..., é em relação à formação técnica. Porque outras escolas ficaram na Secretaria Estadual de Educação, que foram as escolas agrícolas, e elas não tinham, não gozavam dos privilégios que a FAETEC gozou. Por exemplo: remodelação dos equipamentos; atualização dos equipamentos; mudança curricular; os professores ganhando mais... As outras escolas técnicas não tiveram isso. Eu acho, não. Eu acho que, é... o... A ideologia da FAETEC, para alguns, ela foi extremamente (a FAETEC), extremamente elitista, porque ela selecionava no povão... Povão... povão... não tem acesso lá. Nesse sentido isso é verdade. Só que eu acho que mais perverso ainda é você ter critério de pobreza, que é o critério de manter o pobre na escola só porque ele é pobre e depois dar um certificado a ele dizendo que ele vai ser professor. Porque isso seria o círculo vicioso da miséria. O miserável entra na escola de professores, se torna professor para miseráveis. E isso, é..., eu acho que a Secretaria de Educação poderia ser mais enquadrada numa escola, numa visão populista. E a Secretaria de Ciência e Tecnologia nunca foi populista. Não teve interesse de ser populista. Não teve interesse de agradar a pequenos grupos ou a grupos de pressão. Ela teve interesse no desenvolvimento do Estado, no desenvolvimento do país. Então serprofessor é coisa muito séria; é um critério de seleção difícil mesmo; tem que estudar mesmo, senão não passa. Esse é o país; o país é capitalista. Eu não posso sonhar “vou botar todo mudo” porque isso é um bleff, é uma mentira. E essa proliferação de escolas normais aí é um bleff. Isso aí não vai levar a nada. Vai levar professor de Itaperuna, mal formado, prá dar aula em Itaperuna. E isso não conduz; prá mim não conduz a nada. Entrevistada (lê a questão) – A senhora acha que a formação de professores é alvo de disputa política no estado? Eu acho que não é só no estado: é no país. Por que? Porque segmentos de interesse, grupos de interesse na formação de professores. O grupo das Faculdades de Educação que se sentem extremamente ameaçadas com os Institutos de Educação, quando na verdade, os Institutos vêm resgatar, ou pelo menos têm o propósito de resgatar aquilo que foi a antiga “Nacional de Filosofia”: formar professores especificamente. Havia uma dimensão perversa (que eu não posso fazer no quadro por causa do giz), mas eu vou te dizer. Por exemplo: formar professores de letras... letras. Ele entra no Instituto de Letras ou no Instituto de Física; entra todo mundo junto. Faz o curso básico (dois anos). Mas quando o aluno começa a mostrar bom desempenho (média oito, média nove), os próprios professores encaminhavam ele para a formação de bacharéu. E os alunos mais fracos são encaminhados para a licenciatura. O que que acontecia? Chegava na licenciatura, aquelas pessoas já ressentidas (porque no início se pensavam físicos e que acabavam sendo professores de física). Então era o rito três mais um. Três na unidade, um na formação de professores. Este que fez bacharel, que não conseguiu emprego como bacharel e descobria que o maior mercado de trabalho era o de professor, voltava e vinha fazer. Então ele fazia quatro anos no bacharelado e mais um para licenciatura. Então ele fazia cinco. Cheio de ressentimento porque estava ali não era por vocação, mas porque aquilo dali ia lhe dar a chance de trabalhar em algum lugar, porque o sonho dele era ser bacharel pesquisador, não sei o quê... Então esta coisa aqui, a lei tenta terminar. A lei diz assim: quando entrar para ser professor já entra sabendo que vai ser professor. Se ele quiser ser bacharel, ele vai ser em outro lugar. Se ele entrar para física ele tem que entrar dizendo assim: “eu vou ser professor de física”, onde ele deveria entrar diretamente na faculdade de educação... Se a faculdade de educação se transformasse num Instituto de Educação. Mas como ela ainda não tem a sua própria identidade ela tá de lado. E há uma resistência muito grande (e que os Institutos, por exemplo o Instituto de Física não vai querer largar essa parte que ele vem fazendo hoje porque ele vai ficar com muito poucos alunos). Porque vai fazer bacharel são um tiquinho. O grosso vai fazer licenciatura. Então se ele puder ele não vai deixar, entendeu? Há uma bifurcação que houve a partir da morte da Faculdade de Filosofia (da extinção da Faculdade de Filosofia) com a antiga LDB 4024. Ela extinguiu a faculdade de filosofia. Então o que que acontece? Abriu. Abriu para os Institutos e criou-se a Faculdade de Educação. A Faculdade de Educação ficou sendo o patinho encarregado do curso de Pedagogia e de dar licenciatura para essa gente. Hoje a Faculdade de Filosofia pode se transformar num Instituto Superior de Educação e formar prá tudo. Formar o Pedagogo, formar de 1ª a 4ª, formar letras, formar português, formar matemática... Isso tudo pode ser formado no Instituto de Educação. Eu fiz este Instituto para a Universidade Veiga de Almeida. A Universidade Veiga de Almeida, quando eu terminei o governo, fui prá lá como diretora (acabei de sair que pedi que eu tô muito cansada), mas eu formei lá o Instituto Superior de Educação, onde um grupo eu formo educação infantil, pedagogia empresarial, é... gestão escolar, letras, história, geografia, biologia, matemática, informática, tudo na Faculdade de Educação. É que as faculdades de educação ainda não atentaram para o Instituto Superior de Educação, que é a única saída para as faculdades de educação, senão elas ficarão restritas ao curso de Pedagogia e ao Normal Superior. E o grande... (a grande resistência que ela vai ter) é dos institutos de formação geral. Eu quero ver uma faculdade de letras ceder os alunos para serem.... ter a formação total no instituto. Porque ele vai botar o pé ali dizendo: “o que você veio fazer aqui?” “Eu vim ser professor”. Com 1200 horas de estágio. Tem que ter estágio desde o primeiro semestre. Essa é a lei. A nova lei é isso. Não é três mais um não. Ele botou o pé na universidade para ser professor, ele já começa a ter contato com aluno, com professor, com quadro, com método, com tudo. Ele, até o ultimo período tem que fazer 1200 horas de estágio, entende? E tudo isso pode ser feito nos Institutos. Então o Instituto não é só para formar educação infantil e Normal Superior não, isso é uma miopia. O Instituto é para formar professores de um modo geral. Ele... O instituto que nós... O ISERJ tem condições estatutárias de ter doutorado. Ele tá estruturado para ter graduação, mestrado e doutorado, que era o sonho do Anísio Teixeira. Eu acho que ele de lá me... rezando por mim. Entrevistador – Quer dizer ... a senhora tem mais ou menos idéia do tempo de formação (dentro do projeto que a senhora defende) do tempo de formação? Entrevistada – Hoje, três anos. Pro Normal Superior e Educação Infantil. Pro resto, quatro. Entrevistador – E essa questão da universidade (com respeito à universidade e os Institutos) a senhora acha não cumpriria o papel de formar o professor? Entrevistada – Em vários países do mundo (não é, isso é uma fantasia nossa). Em vários países do mundo você tem os Institutos e tem as universidades. A universidade é uma... Por exemplo: na Rússia, o Instituto de Ciência de Moscou, o Centro de Ciência de Moscou não era na Universidade de Moscou. Na Alemanha você tem universidades e Institutos. Você tem o Instituto Pedagógico. Entrevistador – No modo de ver da senhora, então, o Instituto ele faz melhor esse papel do que a universidade, seria isso? Entrevistada – Pode fazer. Eu não estou dizendo que faz melhor ou pior. Eu estou dizendo é que não vai fazer pior. Ele vai fazer diferente. Ele vai ter um foco na formação de professores. Isso não impede do aluno freqüentar a universidade, ir a outro lugar, ir a bibliotecas, ir ao teatro, porque a universidade não tem o monopólio da formação. O aluno vai ao teatro, o aluno vai ao cinema, o aluno... visita a internet. O Instituto é para ajudá-lo a adquirir, construir conhecimento e, e saber fazer a pesquisa...Porque os Institutos podem ser unidades autônomas (entre aspas). Ele pode ser um Instituto dentro das universidades ou fora das universidades. No caso do ISERJ ele é um Instituto fora da universidade. A lei lhe garante esta autonomia. Para ela é importante porque ela é unidade orçamentária. Então o Instituto, como unidade orçamentária, ela tendo autonomia, pode fazer um trabalho muito bom. E muitas vezes o Instituto está dentro da universidade, submetido ao orçamento da universidade, engessado, amarrado, estrangulado pela universidade. Quer fazer concurso, não pode porque a universidade não deixa... Então cada caso é um caso. Existem universidades que vão abrigar institutos muitíssimo bem e a coisa vai bem. Existe universidade que o instituto vai ser estrangulado pelos outros Institutos (Instituto de Matemática, Física....). Eles vão engessar tudo o que venha a ajudar o Instituto a crescer. E existe o Instituto isolado, como é o ISERJ, que tá indo muito bem obrigado, e que vai, vai dar frutos. Você só vai avaliar o que agente fez se a política do Estado, a política do governador destinar ao instituto sua verba, e ele caminhar de maneira boa. Se isso ocorrer, você vai ver grandes resultados ali. Porque mestrado, doutorado, graduação, tudo pode ser feito ali. Ou seja: uma verdadeira escola de formação de professores. Então eu vejo as resistências, as disputas políticas no estado, são essas. Disputas das outras escolas quererem ser Institutos (não podem); é... elas em universidades...Todas as universidades quiseram pegar o Instituto. Eu sei que teve uma reunião lá que disseram assim: “vocês tem que ir prá UERJ”. Por que? Quem é que disse que tem que ir? Não tem, não! Eles podem garantir a autonomia deles e andarem muito bem. A UERJ pode ter um outro Instituto? Pode. A partir da Faculdade de Educação. Criar um outro Instituto de Educação. Entrevistador – Tem uma discussão da universidade como locus privilegiado de formação; por isso que eu fiz essa pergunta. Entrevistada – Mas isso é uma fantasia, querido. No mundo todo você tem locus de formações, de formação, que não é necessariamente a universidade. O que que a universidade propicia que o instituto não propicia? Há um intercâmbio. Ah, é... ótimo! E diz que o aluno fica só lá dentro. Ele não faz intercâmbio aqui, não faz pesquisa junto? Ele não pode... Eu não posso ter uma pesquisa nesta universidade contando com aluno do instituto de educação e um outro do instituto politécnico? Posso! Não faz pesquisa? O Instituto pode fazer pesquisa. Nada impede. Ele vai ter... pode ter mestrado e doutorado Como é que não vai ter pesquisa? Ele tem que ter uma grande biblioteca; ele tem que ter um grande intercâmbio cultural, só que ele vai se centrar na formação de professores. Entrevistador – A senhora não acha que formando o professor nesse lado, por esse ângulo tecnológico, não fadaríamos o professor a ser tecnificado? A utilizar-se demasiadamente de métodos? Entrevistada – Não. Eu não sei o que você chama nesse âmbito tecnológico... o que que é isso? Entrevistador – ... Usando demais as técnicas e não usando muito a reflexividade?. Entrevistada – Não é esse o projeto. O projeto ele tem uma licenciatura pesada. Ele tem sociologia, filosofia, psicologia, antropologia, e... e, novas tecnologias para educação. Ele tem uma formação básica e tem uma formação específica. O grande problema é o seguinte: é que ele tem isso desde o primeiro semestre. Porque a Lei diz 1200 horas, agora 800 horas... Entendeu? Agora a lei diz! Vai ter que começar a mexer no mitiê! Né? Porque era três mais um ele (o aluno) passou a vida inteira sem falar nada em educação. Ai de repente ele chega na Faculdade de Educação e achava tudo uma porcaria. Sociologia? Prá que que eu estou estudando isso? Agora não! Ele entrou ele tem que ter contato com isso. Ele vai entrar, ele vai ter Sociologia da Educação... (ele tá fazendo letras). O que letras tem a ver com sociologia? Tem. Por exemplo: Na Gama (na Veiga) prá fazer odontologia tem sociologia da educação. Tem sociologia (desculpe). Tem sociologia. Porque ele vai ser médico. Tudo bem, ele precisa de sociologia? Precisa, para entender um pouco dessa sociedade. Ele tem português? Tem! ué..., mas você é médico. Sim; mas médico precisa saber escrever direito. Então eu não sacrifico à parte de conteúdos. Só que eu procuro atender o objetivo da lei. Junto a parte específica de conteúdos tem que ter a prática direta com a profissão. Essa prática vem por novas metodologias, por currículos e programas, pela ... a parte didática... Você acha que vai se ensinar uma criança da mesma maneira que eu apredi há anos atrás? Não. A criança hoje circula. A criança entra na internet. A criança... Eu tô falando da criança classe média, com certeza. Porque que eu quero que a criança classe média... esse paradigma, chegue ao povão. Não é porque têm escolas que não tem nem giz que eu vou ter uma visão de a melhor escola é aquela que não tem giz. Isso é uma pobreza de visão. Você tem que ver o melhor e dizer: “tem que trazer todas para esse paradigma”, entendeu? Então eu quero que tenha escolas e formação de professor que saiba trabalhar com escolas que tem giz e escolas com internet. Entrevistador: Deixe eu só esclarecer (já estou terminando). As duas siglas que eu anotei aqui que a senhora usou no início (FAEP e CEI. Entrevistada: Sim. A FAEP era uma Fundação... Antes de ser FAETEC foi FAEP. Era uma Fundação de Apoio às Escolas Técnicas é públicas. Entrevistador: E o CEI? Entrevistada: Centro de Educação Integral. Tá? Tá. Entrevistador: Eu quero agradecê-la e eu me dou por satisfeito. Entrevistada: Eu espero que você faça bom uso. ....................................................FIM. ANEXO 8 ENTREVISTA COM A CONSULTORA QUE FORMULOU O PROJETO DOS ISE/CNS DO INTERIOR Entrevistador: Gostaria que a senhora dissesse em que ano, como, e de quem surgiu o pedido para elaboração de um projeto para o CNS dos ISE no interior do estado. Gostaria, também, que a senhora falasse um pouco sobre a idéia de elaboração desse projet,o e sobre a conjuntura vivida na época. Entrevistada: A idéia do projeto do Instituto Superior de Educação veio de uma constatação e de uma conversa, até, do professor Azevedo, de quem eu fui colega durante 30 anos, na UERJ; eu trabalhava na Faculdade de educação e ele no Instituto de Física; e depois nós fomos juntos trabalhar na Reitoria de pós-graduação e pesquisa e lá nós reorganizamos todo aquele processo de pesquisa e de curso, de pós-graduação, todo, da UERJ. Então, nós nos conhecemos de longa data. E, de uma conversa com ele... eu já estou aposentada da universidade e ele continuou na ativa e a minha sócia também. Entrevistador: Qual a sua formação e a dele? Entrevistada: A graduação dele é Física. A minha é Pedagogia e História. E a da minha sócia também é Pedagogia. Entrevistador: Vocês atuavam dentro dessa área? Entrevistada: É. Foi. Nós atuávamos não só como docentes. Tanto eu quanto ela e ele atuamos como chefes de departamento. E daí atuávamos como chefes de departamento nos Conselhos da universidade e depois fomos atuar mais próximos, quando fomos trabalhar na Subreitoria de Pós-Graduação e Pesquisa. Mas, quer dizer, de uma conversa posterior (eu já estava aposentada) e de encontros assim ocasionais, às vezes a gente fazia alguma pergunta sobre educação, já que eles continuavam (os dois) na ativa. A gente tomou conhecimento de toda uma proposta do governador Garotinho, de necessidade de desenvolvimento do interior do estado. Então o Garotinho tinha como programa de governo, desenvolver o interior do estado. A idéia dele era criar pólos de desenvolvimento e utilizando a vocação de cada lugar para ter um pólo diferenciado. Entrevistador: Essa vocação da qual a senhora fala seria o que? Entrevistada: É... Campos, por exemplo, a vocação é o que? Cana, agricultura e cerâmica. Santo Antônio de Pádua é o que? Pedra ornamental. Então a idéia dele era fazer esses pólos de desenvolvimento. E num papo nosso, a gente colocou uma idéia que é nossa, muito antiga... (na medida em que a gente toda vida trabalhou com educação). É que não adianta você querer fazer um pólo, falar em desenvolvimento desse pólo, quando você não tem um encadeamento ali, um caminhar para esse pólo. Então a gente começou a discutir por quê a nossa educação profissional estava parada no tempo e no espaço, com uma filosofia, do nosso ponto de vista, preconceituosa. Parecia sempre que a educação profissional é para carente, para pobre. E então a gente começou a colocar isso pro Azevedo, que logo depois (talvez não tão logo) passou a ser o presidente da FAETEC. Entrevistador: Isso mais ou menos em que ano? Entrevistada: No ano em que o Garotinho entrou. Antes de começar o governo dele estavam começando esses papos, sabe, essas conversas todas. E o Azevedo, sempre dentro da universidade, ele nos ouviu muito, porque a gente montava curso, a gente montava projeto lá na pós-graduação. A gente que era da educação e ele era da física (fazendo doutorado em astrofísica). A gente sempre mexia com ele: “você está sempre com a cabeça no espaço e nós com os pés no chão”. Estar com a cabeça e não estar com os pés é um negócio meio complicado. A gente colocou isso prá ele, que tinha que ser investido na educação, na formação, né, em escola, até que esse pólo possa ser realmente alguma coisa que diga respeito realmente ao desenvolvimento. Entrevistador: Quer dizer, desenvolver a cabeça das pessoas através da escola para que o local pudesse ser desenvolvido? Entrevistada: Quando você fala num pólo de desenvolvimento, quer dizer pólo de pedra. Por exemplo: a gente acabou trabalhou trabalhando no pólo de pedra, enfim. Todo mundo de lá iria quebrar pedra. Tudo bem. E aí? Há milênios que se quebra pedra e que se vende pedra e que se ornamente coisa com pedra e existe toda uma tecnologia no resto do mundo. E a turma de lá não sabe manejar. Entrevistador: Um questionamento que eu faço à senhora, por curiosidade, para tentar entender: por que o interesse pela formação de professores? Porque até então, um projeto desses ligado ao CETEP seria, até, muito natural. Mas porque o interesse pela formação de professores? Entrevistada: Então: essa história começou exatamente com a nossa colocação, com a defasagem da formação da educação profissional em relação à necessidade de todo um desenvolvimento mais específico. E nesse momento altamente rápido, não é?! E aí falou em escola, né, aí começou: - “a cidade do interior, que professor que vai ter lá? Quem é que vai ensinar ao sujeito uma tecnologia numa educação profissional?” E nós aí fizemos outra consideração: “quem é que está ensinando quem?” Porque o professor dito primário, ele é formado em nível médio, e o da educação infantil não é nem professor (até porque quem fazia a supervisão da antiga creche era o Ministério da Saúde, nem era nada ligado à educação). Então, isso era uma questão que eu dizia, que quanto menor é o aluno, melhor preparada tem que ser a pessoa que lida com ele. E nisso eu trabalhei 20 anos no Instituto de Educação do Rio de Janeiro. Eu fui professora lá 20 anos. Fui coordenadora da primeira escola; do primeiro Curso Normal Superior, que foi uma tragédia. E então, quanto mais eu lidava com isso, mais eu via que a gente cometia, assim, erros muito grandes na relação com as crianças. E embora eu reconheça e fale até hoje, né, século XXI, que enquanto formação de professores, a Escola Normal foi melhor do que qualquer faculdade. Porque então as faculdades elas não formam professores. Elas dão umas pinceladas, que eles chamam de “pedagógicas” e que ninguém quer prestar atenção. Ninguém dá valor, porque todo o pessoal formado em faculdade é muito impregnado de conteúdos. - “Eu sei matemática prá caramba...” E quem não aprende matemática é burro. E eu costumava dizer: “as pessoas não são burras; vocês é que não sabem ensinar matemática”. Não é possível que Deus tenha feito um país, e um país inteiro de burros para matemática. E só para matemática”. Agora, porque é burro para matemática, acaba não aprendendo Física direito... E acaba não aprendendo química. Então, eu acho impossível que Deus tenha feito o brasileiro burro para matemática. Se todo mundo não aprende, o defeito não está no aluno; só pode estar no professor. Entrevistador: Quer dizer: nessa época a senhora começa a discussão, entra o professor Azevedo na FAETEC e aí como ficou a questão do projeto? Entrevistada: E aí, então, ele, dentro da FAETEC, batalhou para ter possibilidade de fazer a formação de professores ligada à ciência e tecnologia. Aí os Institutos Superiores foram criados assim, não especificamente. Olhe, foi alçado o Instituto de Educação daqui do Rio a um instituto de nível superior, assim... um balão de ensaio. Já que ele era préexistente (o Instituto de Educação tem cento e cinqüenta e tantos anos...) Entrevistador: O projeto do professor Azevedo teve alguma ligação com o projeto da professora Nilda Teves? Ele resgatou alguma coisa? Entrevistada: Não. E aí simplesmente o professor Azevedo tentou trabalhar esse currículo no ISERJ. E aí ele nos convidou para trabalhar junto com o ISERJ. E aí o ISERJ não aceitou. E nós também não aceitamos a postura do ISERJ, porque naquele momento era muito mais uma postura de acerto, porque mudados os... (pede para não gravar). Retornando aqui ao nosso tempo, o currículo do Instituto, no nosso ponto de vista, não ficou legal por causa dessas injunções e aí o professor Azevedo nos convidou para montar, então, o Instituto Superior de Educação... Entrevistador: Quer dizer, desses embates com o ISERJ, então, o professor Azevedo deixa de lado a questão e o ISERJ fica lá isolado mesmo? Entrevistada: Com a sua posição... Entrevistador: E aí o ISERJ fica isolado e o professor Azevedo resolve ir para o interior com essa visão do Garotinho, dos pólos? Entrevistada: Exatamente. Ele aceitou muito a nossa idéia de que a educação tinha de acompanhar essa transmigração para o interior, não é, para garantir esse desenvolvimento. Entrevistada: O professor Azevedo convidou vocês e tentou articular alguma coisa com o ISERJ naquele tempo. Mas não conseguindo, por causa do embate, ele tomou o projeto e o colocou para os Institutos? Entrevistada: Não. Não havia ainda esse projeto. Ele nasceu aí, na medida que ficou separado. “Então vamos fazer um instituto superior”. Ele acreditando, como acreditou, que nós seríamos capazes de pensar sobre isso. Aí, a primeira visão do “um ano e meio”, né... Olha, eu não... Não é questão... Eu não posso dizer que eu não saiba sobre o assunto. Eu tenho 52 anos de magistério. Dentro do magistério, eu trabalhei desde creche até a pósgraduação de medicina, tá?! Eu dava filosofia da educação no mestrado da Faculdade de Medicina Social. Bom, então, quer dizer, isso aí era um desafio que a gente achou que era capaz. Entrevistador: E a consultoria já existia nessa época? Entrevistada: Não. Ela passou a existir aí. Foi quando a gente se desvinculou definitivamente da UERJ. E aí, por que nós pensamos em um ano e meio? Nós fizemos as contas e vimos que todos os cursos, na verdade, duram dois anos, tirando todas as férias, e sem falar em greve. Tirando todas as férias existentes a gente fez um mapa de quando as aulas começavam e de quando elas terminavam e dos períodos que as instituições paravam só para prova. Mas computavam isso como tempo letivo. Mas na verdade você pára 15 dias só para fazer prova? Você está só cobrando. Trabalho letivo, de aula, quer dizer, não está acontecendo. A gente computou isso e viu que todos os cursos duram, na verdade, dois anos. De trabalho efetivo, são dois anos. E como, na legislação da educação, né, nascida com a 9.394, ela traz uma década para o pessoal estar preparado em nível superior, nós fizemos um cálculo também (eu nem sei onde foi parar, mas nós fizemos um cálculo numérico mesmo, a gente vendo quantos professores tinham na Secretaria de Estado do Rio de Janeiro) dos professores existentes nas Secretarias Municipais e nós vimos que no mínimo se levaria acho que 22 anos ou 21 anos, uma coisa assim, para você preparar todo mundo em nível superior. Então, nós tendo computado, que de fato trabalho efetivo, produtivo, leva na verdade dois anos e não quatro... Se juntar tudo só leva dois anos. Aí nós pensamos nesses cursos de um ano e meio, que batiam com os cursos de tecnologia, que já estavam também começando a funcionar. E no meu caso, eu fui contemporânea do primeiro curso de tecnologia que foi montado aqui, que era um curso de engenharia operacional, e que o Conselho de Engenharia acabou matando o curso por questões de mercado de trabalho. Entrevistador: Uma curiosidade: por que vocês não ligaram esse projeto à UERJ? Entrevistada: Olha, não sei. Talvez porque eu estava fora... Não sei. Até porque, nessa época, quem estava dirigindo a UERJ foi Regina Veisseman, que foi minha aluna, foi aluna dela... A Ester... Ah! Eu já sei qual foi um outro condicionante. O pessoal todo lá era contra ao instituto superior desvinculado da universidade. Tanto que pouco antes de eu me aposentar eu apresentei, no Conselho Departamental, uma proposta muito parecida com essa que a gente apresentou aqui, com um básico e várias ramificações da licenciatura desse professor. E o pessoal, até na época o pessoal topou, gostou e tal, mas foram entrando outras pessoas de fora, foi sendo arejada, né, a filosofia da coisa, e acabou que isso não vingou. A Pedagogia continua do mesmo jeito e a universidade tinha que ser assim mesmo. A Lia Faria, por sua vez, também não quis, né?! Eu acho que ela criou um empecilho a mais. Ao invés dela ajudar, ela atrapalhou. Ela criou um quarto ano do Ensino Normal, com vistas a que esse quarto ano depois servisse para o aluno continuar, ignorando a legislação específica, né, a anterior, a que se seguiu... Entrevistador: Quer dizer que o projeto do Instituto, então, passou a ser um projeto isolado da FAETEC? Entrevistada: Exatamente. Entrevistador: Ele passa a ser um projeto do professor Azevedo? Entrevistada: Encomendado pela FAETEC. Exatamente. Encomendado pela FAETEC. Entrevistado: Teve alguma outra Consultoria contatada? Entrevistada: Não. Não. Só nós mesmas. A gente consultava assim pessoas que a gente acreditava que gostava de ouvir opinião. E aí, depois disso pronto, o pessoal do Instituto de Educação foi a Brasília e conversou lá com um conselheiro que era reitor de uma universidade particular, e que viu que o curso deles poderia esvaziar as suas dependências. Então, quando o curso já estava montado e implantado, um ano depois, ele baixou uma resolução dizendo que o curso tinha que ter, no mínimo, três anos. E aí teve que ser reformulado. Entrevistador: Isso porque não haviam sido autorizados ainda? Entrevistada: Não. Entrevistador: Porque se tivessem sido autorizados ... Entrevistada: Não. Poderia... Inclusive ele vai ser reconhecido independentemente disso. Depois nós reformulamos, então, para três anos. E aí houve depois uma outra rebordosa, que nós reformulamos para três anos, e aí, alguém do Conselho Estadual disse: “tem que ser três anos de hora cheia”. Hora cheia, hora vazia, hora aula, hora não sei o que... E então, inclusive ... Foi uma coisa interessante, porque a Speranza foi lá, olhou o trabalho que as moças fizeram nessas escolas... honestamente era muito melhor do que era feito no Instituto de Educação do Rio. Esse daqui, cheio de política, de politicagem, cheio de desencontros. E os de lá, não, querendo crescer, fazer as coisas. Inclusive, quando a gente montou o projeto, o Secretário de Ciência e Tecnologia levou o projeto para o governador e o governador disse o seguinte: “agora, como é que a gente faz para começar?” Aí, ele disse: “Bom, a gente tem que pedir autorização ao Conselho e botar para funcionar”. E aí ele virou e disse assim: “Me dá um papel que eu vou autorizar esse funcionamento agora!” Entrevistador: Fez por decreto, né? Entrevistada: É. Por decreto. Ele também sabia das forças... do Conselho. E aí, de repente a gente, de certa maneira até se sentiu culpado agora, porque parece que a gente não sabia que tinha que ser autorizado antes. A gente recebe um ordem do governo. A gente não; quem recebeu ordem do governador foi o professor Azevedo. A gente entregou o projeto. Agora, a implantação dos ISE pela FAETEC... nós supervisionamos toda essa implantação. Inclusive, é... a seleção de professores fomos nós que fizemos. Foi uma seleção provisória, porque para ser definitivo tem que ser por concurso público. Então, nós só não fizemos prova. Mas houve uma seleção pelos currículos. Nós não fizemos só um puro e simples currículo. Nós pedimos um memorial mesmo, né. E aí o próprio governador mesmo perguntou: “Será que vai ter gente para lecionar lá?” E a gente garantiu que teria, no escuro. E tinha, né?! E gente muito boa. Tinha gente com mestrado, tinha gente com doutorado e tinha gente sem nada disso, mas muito boa! Você não precisa ter tanto papel para você ser bom em alguma coisa. Isso dentro do meu ponto de vista. Você pode ser o bom sem ter nada disso. Se for bom com isso é melhor ainda. Mas tinha. Gente preparada, gente com especialização, gente boa para fazer todas essas atividades, para lecionar. E de repente agora está sendo demitida gente assim tão... de uma maneira tão... Entrevistador: Os contratados? Entrevistada: Bom, o problema é o seguinte: você tira porque eram contratados, mas está se contratando outros. Então o esquema é o mesmo. Você está tirando um contratado e botando um contratado. Entrevistador: Por que tem que haver concurso... Entrevistada: Pois é, mas nós fizemos, inclusive. Quando entregamos tudo para ir para o Conselho Estadual, a documentação dos professores todos, fizemos edital de concurso público, até porque a experiência da FAETEC, e vindo da Nilda antes, do Azevedo depois, era uma experiência de concurso de nível médio. A exigência de concurso para nível superior é um pouco diferente. E aí o pessoal lá da FAETEC disse: “Ah, a gente vai fazer um concurso assim como se faz para o estado...” Não é por aí. Depois chegando lá no Conselho, o Conselho Nacional não reconhece. E aí? Então a gente fez um edital e fez um regimento, porque tem que ter um regimento para acompanhar. E nesse regimento não fomos só nós que trabalhamos. Trabalhou uma outra professora da FAETEC e trabalhou a Subsecretária de Ciência e Tecnologia na época, Therezinha Nóbrega, que apesar de ser uma moça da enfermagem, ela é uma tremenda educadora. Entrevistador: A profª Therezinha foi uma das interventoras no Instituto, ou seja, Diretora-em-Exercício? Entrevistada: ... Para tentar consertar aquilo lá. E apesar de ela entrar como interventora, de ela entrar assim com poderes praticamente ditatoriais, ela conseguiu sair... Entrevistador: Uma questão me deixou ainda incomodado: essa questão do professor Azevedo ter esse embate com o Instituto, isso fez com que se criasse o projeto dos Institutos do Interior. Vocês tiveram assim outros projetos que tenham servido de exemplo para esse projeto? Entrevistada: Não. Entrevistador: Foi tudo nascido da lei mesmo, da interpretação que se teve na época, no caso, né? Entrevistada: A interpretação... Entrevistador: Alguém da FAETEC ajudou a elaborar o projeto? Entrevistada: Não. Ninguém. Da FAETEC não. A gente conversou outras pessoas, com alguns... Mais nada. Foi só da lei mesmo. Por que? Veio da nossa experiência também, sabe, de uma filosofia de que o tempo faz as coisas ficarem diferentes até de um dia pro outro. Então, esse professor, para lidar com criança, tem, antes de tudo, que conhecer a criança. Agora essa criança não vive no espaço isolada, né? Ela vive num meio social Ela convive com outros tipos de criança, com adultos, com outro tipos de pessoas. Ela tem acesso a toda uma comunicação através da televisão. Não faço nem em internet porque, pelo menos quando nós duas pensamos em professor de escola pública, a gente está pensando naquela criança que não tem nada disso. Mas que tem uma vida. Tem uma vida de comunidade, em que ela recebe influências dessa comunidade. E a gente imaginou que ela também poderia ter... dentro da nossa experiência, a gente sabe o que é uma multiplicadora de outras experiências de escola. Eu trabalhei num lugar, que era em Deodoro, aqui em Deodoro, porque eu comecei a minha vida como professora primária, e uma vez uma mãe foi procurar a nossa diretora para reclamar de mim e de uma outra professora de primeira série, que nós tínhamos, porque nós estávamos mandando as crianças usarem muita água. E eles tinham dificuldade de conseguir água. Eles carregavam água. Eles não tinham água encanada, em plena década de 50, em Deodoro; e não era tão longe assim. E uma dessas crianças que freqüentava a turma, da outra colega, morava num conjunto residencial que tem lá até hoje, de lá, adentrando em direção à Avenida Brasil. E eu fiquei de boca aberta: ela estava reclamando das crianças gastarem muita água. Porque as crianças queriam tomar banho todo dia, porque as crianças lavavam as mãozinhas quando saiam do banheiro, lavavam as mãozinhas pára comer, porque aprenderam isso com a tia na escola. E as crianças faziam questão, brigavam em casa porque queriam fazer isso. E como aquela mãe não conseguiu calar a boca da criança, ela foi à escola pedir para a professora não dizer essas coisas porque gastava muita água e ela não podia. É, eles não podiam gastar tanta água daquele jeito, porque era mais trabalho, né, mais complicação para a vida deles. Então, a gente partiu dessa premissa. A criança está no meio social e ela tem que conhecer... Esse professor tem que conhecer esse meio, senão, como ele vai atuar? Sem conflito, mas ao mesmo tempo sem acomodação. Entrevistador: Agora, por que só seis ISE? Entrevistada: Porque foram os que se mostraram interessados. Entrevistador: Mas o projeto inicial parece que era para 25 unidades? Entrevistada: É. Exato. Exatamente. A gente até montou no projeto aqui (tem o mapa do Rio direitinho) onde seria o Instituto, tá, e onde seria o Centro de Educação. O Centro de educação superior seria assim o irradiador dos Institutos. Entrevistador: Eu queria entender melhor essa questão que a senhora colocou sobre o professor Azevedo. A ligação deles ali é corporativa, até por ser uma instituição emblemática, não? (proveniente de Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo). Eles evocam muito isso. Agora por que houve propriamente esse embate da FAETEC com o professor Azevedo com o Instituto? Eles não deixaram? Porque pelo que a senhora está colocando não houve uma intenção da FAETEC se impor sobre o Instituto. Eles não aceitaram porque eles tinham projeto próprio? Porque eles também não aceitaram o projeto da professora Nilda Teves? Eles tinham o projeto deles? Mas aí quando o professor Azevedo veio com um outro projeto, eles queriam o quê? Quando houve o embate com eles vocês já tinham um projeto para apresentar e eles não quiseram esse projeto, e aí vocês tiveram que levar essa idéia e fazer um projeto isolado? Ou quando vocês foram discutir o projeto com eles vocês ainda não tinham um projeto e queriam discutir e eles não quiseram? Entrevistada: Não. Nós tínhamos o projeto. E a proposta do professor Azevedo era compatibilizar os dois projetos. Porque o nosso projeto estava sendo (foi) todo pautado no Parecer 115, que era o inicial. E o do Instituto estava pautado naquilo que eles queriam que fosse feito, independente de qualquer coisa. Então o que eles fizeram? Eles fizeram o projeto em que tinha uma coisa chamada atividades. Quer dizer, é.... (tive que desligar a pedido). Entrevistador: A senhora não acha que esse projeto dos ISE do interior ele foi um projeto muito técnico? Porque as instituições estavam nascendo. Os professores, por sua vez, eles não tinham uma vivência da instituição. Eles não tinham amor por aquela instituição porque não eram históricas. Não foram construídas por eles. A senhora acha que as deficiências que houve podem ter surgido disso? Entrevistada: Olha, nem a Speranza achou deficiências. A única pessoa que fez críticas contundentes chamou-se Ângela, que era uma técnica do Conselho Estadual de Educação. E a Ângela era assim, sabe... Entrou para analisar aquilo como se ela estivesse entrado na arena. Ela foi descortês. Ela foi bruta... Mas a única coisa que ela pichou realmente, foi a questão da carga horária. Ela não encontrou mais nada para pichar. Entrevistador: Parece que falaram também da questão da biblioteca, não? Entrevistada: Mas aí não dependia do projeto, entendeu? O projeto, tá... Não sei se você viu o projeto... o gordão... Mesmo naquele a gente pôs até a bibliografia. Porque na nossa proposta teria a inauguração da escola, né. Seria com uma biblioteca de mil títulos. Entrevistador: A senhora sabe me dizer por quê esse aligeiramento, essa correria para se criar os institutos? Entrevistada: Não. Eu acho que esse primeiro açodamento foi por causa da pressa do governador de querer a questão dos pólos. Depois, o segundo aspecto foi a competição com a questão do instituto... Porque o professor Azevedo queria impor... (ela pede para não gravar). Entrevistador: Esse projeto foi usado em outra instituição, em algum instituto privado? Entrevistada: Tem uma coisa parecida , mas não nasceu desse projeto não. É um curso assim também pequeno da Cândido Mendes no interior. Entrevistador: Esse foi anterior ou posterior? Entrevistada: Não. O da Cândido Mendes foi um pouco antes. Mas o que eles fizeram foi simplesmente pegar o curso normal antigo e alçou para nível superior, as mesmas disciplinas, as mesmas coisas. E você vai ver no nosso projeto, que a gente faz toda uma colocação... Sempre tem uma filosofia de lidar com criança pequenina; as condições que ela deve ter com o mais velhinho, e... Todo um processo que acompanha esse desenvolvimento. Mas não tivemos... Entrevistador: Parece-me que no tempo, dentro do fenômeno que eu estou pesquisando, há uma linha de continuidade no trabalho. Todos os professores envolvidos nesses projetos de ISE/CNS, pelo que eu pude perceber no andamento da pesquisa, ou são ou pertenceram aos quadros da UERJ. A questão é que quando a professora Nilda sai e o professor Azevedo entra, esse projeto dela sofre uma ruptura? Vocês não foram buscar nada no projeto dela para dar continuidade ao projeto de vocês? Houve uma ruptura mesmo? (Porque Marcello Alencar foi de um partido; Garotinho de outro). Como se deu essa ligação, essa política de continuidade dos institutos em si? Entrevistada: Aí, eu diria que foi uma atitude do professor Azevedo, né. Ele não foi assim nenhuma pessoa que tivesse essa idéia “de que tudo o que foi feito antes não serve, não é bom, eu não vou continuar”. Tanto que este jovem que está aqui (aponta para um companheiro seu de trabalho na mesma empresa de consultoria) era o vice-presidente de Nilda Teves na FAETEC. E a Nilda foi para outro lugar e o professor Azevedo ficou na FAETEC como coordenador do projeto... Entrevistador: Mas vocês foram buscar alguma coisa no projeto da professora Nilda Teves? Entrevistada: Não. A gente leu, analisou... Claro! A gente não teve idéia de... assim... de fazer igual, parecido, de dar continuidade. O que tem de identidade no fazer, vem de uma postura que é filosófica, sobre o que é importante, o que é bom, se faça para formar esse professor, entendeu? O gancho foi só esse, mas... E a idéia... Essa é a minha idéia desde que eu me entendo como professora. E levou tempo demais para se pensar em formar o professor de criança em nível superior; até para a gente acabar com essa “pecha” da professorinha, sabe, como se qualquer um que fosse para lá estivesse fazendo bem feito. Às vezes a gente encontra, é..., conseqüências gravíssimas num adulto por causa de um problema de escolaridade, tá, muito sério. Porque você não destrói um adulto... Na faculdade, você pode ser bom ou mal professor, ensinar bem, não ensinar... O adulto tem como se defender; a criança não. O emocional dela é muito imaturo ainda. Ela é muito mais emoção do que ela é razão, e as coisas atingem de uma maneira mais profunda. Então essa pessoa tem que ser muito bem preparada. Entrevistador: Essa idéia de se desenvolver o curso em módulos partiu da própria consultoria? Entrevistada: Partiu da consultoria, mas a gente estava se baseando na lei... a gente se baseou na lei, principalmente na área tecnológica. Porque essa idéia de módulo, ela tem um referencial que é terminalidade. A idéia de módulo traz essa terminalidade. Você faz um módulo, você pode levar um certificado de que você sabe isso, entendeu? Então, como a gente quis fazer essa... esse básico com várias saídas, para ensino de jovem e adulto, ou para infantil, ou para educação especial, né... Inclusive a gente fez educação especial por área, que escola nenhuma faz isso. Educação especial é um negócio assim bem, muito esdrúxulo ainda nessa terra, né, muito. Entrevistador: A questão da FAETEC se transformar em Centro Universitário realmente existiu? Os ISE e os Institutos Superiores de Tecnologia foram criados para que a FAETEC fosse Centro Universitário? Porque me parece que ela não é ainda, não? Entrevistada: Não. Saiu no Diário... O que saiu no Diário dava autorização a ela para “funcionar como”. “Funcionar como”, não é “ser”. Entrevistador: “Funcionar como, na estrutura de...” Mas a FAETEC queria mesmo ser Centro Universitário, não? Essa idéia era do professor Azevedo ou era uma idéia da FAETEC em si? Entrevistada: A idéia era dele mesmo. Ele queria elevar, inclusive, principalmente por causa da área profissionalizante. Os Institutos de Tecnologia são muito... também muito visados. O pessoal da área acadêmica torce muito o nariz para o tecnólogo. Então, como Centro Universitário, isso daria uma outra conotação mesmo, né?! E seria muito interessante. E nós mesmas (eu e ela) não encorajamos ele a que fizesse isso. ..................................................FIM. ANEXO 9 ENTREVISTA COM A DIRETORA DO ISE DE BOM JESUS DO ITABAPOANA Entrevistador: Gostaria que a senhora fizesse um breve relato sobre o nascimento desse Instituto, como o projeto foi gerado e como surgiu a idéia de implantação desta unidade aqui na cidade. Entrevistada: Bom, o Instituto Superior de Educação, ele nasce de uma luta dos profissionais do Instituto Normal Éber Teixeira de Figueiredo, Instituto em nível médio. Desde 1997 que os profissionais daquela instituição lutaram para que o Curso Normal Superior viesse para o município. Vários ofícios e documentos foram enviados para a Câmara Municipal (à própria Secretaria de Estado de Educação), sem, no entanto, obter sucesso. Finalmente, partindo para a FAETEC eles conseguiram fazer com que o Instituto Superior fosse implantado no município. Quatro mil assinaturas foram coletadas na comunidade, os profissionais foram para as ruas e nessa luta nós tivemos também o privilégio de contar com o prefeito atual, que abraçou a idéia e trabalhou para que esse Instituto fosse implantado, porque até então nenhum governo municipal tinha demonstrado interesse em investir na educação de nível superior no município. E agradecemos muito ao prefeito, que interferiu diretamente junto à FAETEC e junto à FAETEC assinou um convênio de cooperação técnica, onde disponibilizou o prédio (o espaço físico). Ele paga o aluguel desse prédio. E não só o aluguel desse prédio, como tudo o que nós dependemos aqui em termos de manutenção, a prefeitura nos auxilia. Entrevistador: A senhora não acha curioso ter um Instituto de Educação em nível médio na cidade e ele não ser transformado como foi o ISEPAM e o ISERJ, e sim ter sido criado um Instituto? Entrevistada: É um fato curioso que eu não procurei investigar. Eu não sei exatamente o quê que envolveu isso aí. Eu me lembro que eu trabalhava no Instituto Éber na época, e a equipe da FAETEC esteve presente, inclusive junto com as consultoras, Diomar e Maria Lúcia (que foram autoras do projeto), e elas alegaram que o prédio não era um espaço ideal para a implantação do Instituto. Foi um argumento não muito convincente e te confesso que fiquei sem entender porque é que aquele Instituto não foi transformado. Entrevistador: Eu gostaria de conhecer um pouco da estrutura e do funcionamento do Instituto ( em caráter administrativo). Entrevistada: Bom, nós temos, um diretor (um diretor geral), um coordenador de curso, um coordenador de estágio e um coordenador de núcleo de projetos. E a equipe administrativa mesmo, ela é formada por esses profissionais. Entrevistador: A unidade (curso) possui colegiado? Entrevistada: Nós temos Conselho Acadêmico. E, recentemente, o Diretório Acadêmico também foi eleito. Então nós estamos ainda nos estruturando ainda (gradativamente), à medida em que a instituição vai crescendo. Nós estamos buscando estruturar, da melhor forma possível, essa estrutura administrativa. Entrevistador: Em torno de quantos funcionários trabalham no Instituto? Entrevistada: Nós temos funcionários de apoio cooperativado, nove, o que é uma grande dificuldade. Pouquíssimos funcionários. Nós temos apenas duas serventes. E a escola (a instituição funciona de 7 às 22:45h. todos os dias), com duas funcionárias para limpeza. Entrevistador: São três turnos? Entrevistada: São três turnos. Entrevistador: O Instituto existe desde quando? Entrevistada: Janeiro de 2002. Entrevistador: Como foi estabelecida a política de implementação do Instituto de Bom Jesus do Itabapoana? Por que ele foi estabelecido nesta cidade? A gente sabe que existe ISE em Itaperuna e em Bom Jesus, que são cidades bem próximas. A senhora teria alguma resposta sobre isso? Entrevistada: Eu posso dizer que talvez seja pela luta do Instituto Éber e pelo empenho do prefeito, porque o Instituto Normal de nível médio, ele foi o primeiro da região. Foi o primeiro Instituto da região. Bem antes de Itaperuna ter um Instituto de nível médio nós já tínhamos. Entrevistador: Quando o Instituto Éber foi criado? Entrevistada: O Éber é de 89, me parece. Oitenta e nove, por aí. Entrevistador: Anterior ao de Itaperuna? Entrevistada: Anterior ao de Itaperuna. Então nós achamos mais do que justo que nós tivéssemos aqui um Curso Normal Superior, um Instituto Superior de Educação. E eu acredito também na questão política, né?! Claro! Nada se move sem a política, né, sem o interesse. Entrevistador: E há uma questão de vocação da cidade, alguma coisa assim? Entrevistada: Sim, atende à demanda completamente. Aqui, vamos colocar, entre dez mulheres que trabalham fora, oito são professoras (ou nove). Então, atende à demanda. Bom Jesus é uma cidade que ela vive do funcionalismo público, agricultura... mas mais funcionários públicos. Não temos indústria... Não temos, realmente outra opção. Então aqui, se faz a opção por ser professor, talvez, nem tanto pela vocação. Vocação é algo que ele, o profissional, ele é responsável pelo trabalho dele se ele for um bom profissional. Mas é mais, mesmo, pela falta de opção. Não tem opção. É ser professor ou trabalhar no comércio. Entrevistador: Os alunos que aqui estudam eles vão ter algum tipo de ascensão, por parte da prefeitura? Entrevistada: Com certeza eles terão um enquadramento. Entrevistador: O Instituto realizou vestibular? Como foi a procura? Por quem foi feito o vestibular e como ocorreu o processo seletivo? Entrevistada: O primeiro vestibular (na época eu nem estava aqui) foi em dezembro de 2001. Foi feito pela Cesgranrio. E nós tivemos uma procura muito grande. Nós tivemos uma média de 800; pessoas inscritas, 360 foram classificadas. E esses 360, eles entraram. Porque como funcionava em módulos, eram 120 em três entradas. Cento e vinte entraram em janeiro, cento e vinte em maio e cento e vinte em agosto. Antes da mudanças dos dias letivos e antes do curso passar a ter três anos letivos. Durante o ano de 2002 as entradas ocorreram dessa forma. Entrevistador: Anteriormente aos três anos letivos como funcionava o Curso? Entrevistada: Em dois anos, com seis módulos. Então tinha três entradas num ano. Um módulo durava 75 dias letivos. E nós tivemos um segundo vestibular, agora em dezembro de 2002, onde nós tivemos uma boa procura também. Foram classificados quatrocentos e poucos. Entrevistador: Quantos alunos o ISEBJI possui hoje no CNS? Entrevistada: Hoje nós temos 453 alunos, com previsão, para entrarem em agosto 159, porque com a mudança, o curso, ele tem integralizados três anos letivos em seis períodos e o período com 100 dias. Então nós temos 2 períodos nesse ano de 2003. Nós estamos no primeiro período e vamos para o segundo período em agosto. Então a primeira entrada foi em janeiro e a segunda vai ser em agosto. Entrevistador: E não vai ter vestibular? Entrevistada: A previsão é de que este ano não terá vestibular. Entrevistador: Quais as maiores dificuldades que você enfrenta para o funcionamento do Instituto aqui? Entrevistada: As maiores dificuldades: poucos funcionários de apoio, a questão da distância. Porque tudo eu tenho que resolver diretamente com a FAETEC (a falta de autonomia nesse caso atrapalha o funcionamento da unidade). Nós estamos há quase 400 quilômetros da FAETEC. A questão financeira, que não diz respeito só ao Instituto, é uma questão bem mais ampla, né, que atinge ao estado. Mas está nos afetando mais diretamente, porque como nós estamos muito distantes da FAETEC e tudo é resolvido lá, nós não temos nem sequer telefone para comunicar com a FAETEC. Eles marcam reuniões (eventualmente têm reuniões) e quem arca com o custo somos nós mesmos para nos deslocarmos daqui até a FAETEC. Então essa é a grande dificuldade. Entrevistador: Além do CNS o ISEBJI oferece outro Curso? Entrevistada: Não. Por enquanto não. Entrevistador: Então a parte superior do Instituto é o Normal Superior mesmo, não é? Entrevistada: É. O Normal Superior é o primeiro curso para dar assim o... para implantar o Instituto Superior; a menina dos olhos é o CNS para iniciar. Então depois que esse curso estiver consolidado, não é... (acreditamos que no projeto consta isso em outros cursos) mas partir do momento em que o Curso Normal tiver formado a primeira turma. Entrevistador: O Instituto (CNS) já formou alguma turma? Entrevistada: Não. Nós vamos formar em julho de 2004. Entrevistador: Por conta da mudança do projeto? Entrevistada: Isso. Entrevistador: Como é que é a relação dessa Instituição com as outros ISE? Existe algum intercâmbio? Entrevistada: Temos. Temos. Nós nos reunimos para discutir. Diante de tantas mudanças nós eventualmente nos reunimos em Itaperuna (Institutos de Campos, Três Rios, Itaperuna, Bom Jesus, nós nos encontramos) para discutir que caminhos, que direção tomar. Nós nos falamos muito por telefone. Não muito contato físico. Mas eu já visitei o Instituto de Itaperuna. E qualquer dúvida que a gente tenha nós entramos em contato uma com a outra. Até com Três Rios mesmo (que é mais distante) eu estou sempre em contato. Entrevistador: O Instituto possui alguma espécie de apoio financeiro, administrativo de outra instituição que não seja a FAETEC? Entrevistada: O apoio que nós temos, como eu já te disse, é da Prefeitura Municipal. Entrevistador: Possui outro tipo de projeto em desenvolvimento com outra instituição? Entrevistada: Não. Entrevistador: O Instituto recebe, no momento, apoio financeiro da prefeitura? Entrevistada: Não. Entrevistador: Só apoio técnico? Entrevistada: Apoio técnico. Entrevistador: O Instituto (CNS) possui autonomia pedagógica? Se tem, como a exerce? Existe algum Conselho Acadêmico na unidade? Possui Regimento Interno? Entrevistada: Bom, nós ainda não temos autonomia pedagógica. Temos o Conselho Acadêmico, onde nós estamos procurando regulamentar muita coisa que está em aberto. Diversas portarias nós já fizemos para regulamentar muitas situações pendentes. Mas fizemos isso até por ser ousados, porque nós não temos autonomia. Entrevistador: Gostaria de saber sobre a questão do Regimento Interno. Entrevistada: O Regimento, ele está em processo de elaboração. Nós temos ido ao Rio quinzenalmente para poder regulamentar esse Regimento. Entrevistador: Ele vai ser parte integrante do Regimento da FAETEC? Entrevistada: De acordo com o Regimento da FAETEC. Entrevistador: Então é uma autonomia “sem autonomia”, a senhora concorda? Entrevistada: É. É uma autonomia entre aspas. Nós temos um modelo de Regimento que foi feito para os Institutos que foi feito pelas consultoras Diomar e Maria Lúcia. Portanto nós seguimos esse Regimento até que tenhamos um Regimento definido. Entrevistador: Que tipo de proposta de formação de professores existe para esta unidade? Que tipo de professor é pretendido formar aqui? Entrevistada: Um professor que saiba associar teoria e prática. Um professor que... Eu sempre digo para os meus alunos aqui que eu agora acredito numa mudança na educação. Porque o profissional da educação infantil e ensino fundamental, ele sempre foi um profissional visto como uma categoria mais inferior. Nunca fizeram um investimento nesse tipo de profissional. São os operários da classe, né?! São os que mais trabalham e talvez não tenham o reconhecimento que teriam que ter. Então, eu acho que o nosso papel aqui ele é muito importante. Nós temos que contribuir para uma mudança na educação. Se não, nós não vamos estar cumprindo o nosso papel, que é fazer desse professor um construtor de conhecimentos em sala de aula. Entrevistador: Qual o impacto que esse Instituto gerou nos alunos diante das propostas que estão em prática? Entrevistada: Olha, foi assim um impacto muito grande. Você vai conversar com eles e vai sentir isso de perto. Os depoimentos são arrepiantes mesmo. Porque eles dizem que mudou... Quem já é professor mudou a prática na sala. Quem não é professor, mas que está aí, entrando nessa... (com o propósito de ser professor) diz que os conhecimentos adquiridos têm alterado a vida pessoal neles na família. Muitas pessoas (você vai ver no perfil dos egressos) são pessoas que já pararam de estudar há bastante tempo. Nós temos esses casos e que estavam completamente alienados, desinformados. Então... e eles, quando o curso era em módulo, eles reclamavam que era pouco tempo demais para a gama de informações que eles estavam recebendo. Então foi até importante passar para três anos, porque não adianta você jogar muita informação e ela não ser assimilada, não é?! Mas o impacto foi muito grande. Foi grande na comunidade. Eu posso te dizer que mudou no perfil da comunidade bonjesuense. Entrevistador: O Instituto (CNS) desenvolve algum tipo de pesquisa acadêmica hoje? Há algum fomento à pesquisa? Está se sdesenvolvendo algum projeto de pesquisa dentro da unidade? Entrevistada: Nós desenvolvemos alguns projetos de pesquisa. Nós estamos em parceria com o SEBRAE, a Associação Comercial e a Secretaria de Indústria, Comércio e Turismo. Então, nós desenvolvemos um projeto onde os alunos pesquisaram sobre o perfil do consumidor bonjesuense. E foram apresentados esses resultados para os empresários do município, onde o objetivo era detectar onde é que está a falha para que esse profissional possa investir mais em seu ramo. Então nós fizemos um projeto assim, em parceria com o SEBRAE, e já tem outro projeto. Entrevistador: O próprio SEBRAE financiou? Entrevistada: O próprio SEBRAE financiou. E nós temos também (para ficar na história, que é um projeto até, um sonho que eu sempre tive de realizar esse projeto, e que os nossos alunos estão realizando esse sonho) é fazer um levantamento biográfico das pessoas que têm nomes nas ruas e nas praças do município, né, nós estamos na rua Aristides Figueiredo. Quem foi Aristides Figueiredo? O objetivo é resgatar a história do município, e procurar entender de que forma essas pessoas elas ajudaram na construção desse município. Então é uma pesquisa muito interessante, onde nós já temos o apoio da prefeitura para editar um livro das biografias posteriormente. Entrevistador: Como é estabelecida a relação com a FAETEC para o funcionamento desta unidade? Entrevistada: Olha, é ..., como eu te disse, há dificuldade porque tudo nós resolvemos por telefone. E não é a mesma coisa, não é, do que você estar pessoalmente. Nós temos encontrado bastante dificuldade nesse governo, principalmente agora. Muita dificuldade em resolver. Nada, quase que nada se resolve. A coisa vai assim, sabe, vai levando, a gente não têm uma resposta concreta. Eu entendo a dificuldade deles. Eles também tem as suas limitações. Eu acho que nem é uma questão da própria FAETEC. É uma questão do estado, não é?! Então, eu não sei nem se a gente poderia fazer uma crítica à FAETEC nesse sentido. Acredito que eles têm procurado melhorar. Esse novo presidente, ele já demonstrou ser muito dinâmico. A própria estrutura da FAETEC já melhorou muito. Era precária. Mas eu percebi que ao melhorar a estrutura da FAETEC ficou muito formal o contato. Nós temos hoje mais dificuldade em ter acesso às pessoas em que a gente necessita estar junto para tentar resolver algumas situações, do que antes. Antes eu ligava, “eu estou indo à FAETEC e eu quero uma reunião com o presidente”. Era assim mais fácil o acesso. Ou mesmo o superintendente, entendeu? Hoje está mais complicado. Entrevistador: E a relação com o Conselho Estadual de Educação? Entrevistada: A relação com o Conselho inicialmente foi um pouco assustadora, mas da última vez que eles estiveram aqui (foi agora, há uns 20 dias mais ou menos). o relacionamento está bom. Eles já entendem a nossa situação e já vieram demonstrando em ter um empenho maior em nos ajudar e em fazer tudo para que dê certo. Têm as exigências, né, que não cabe a nós, cabe à FAETEC. Entrevistador: Eu gostaria de insistir numa pergunta que fiz: por que, no seu modo de ver existem dois Institutos tão próximos, um em Itaperuna e outro em Bom Jesus? Entrevistada: Olha, Fernando, poder proteção política; a força política. Entrevistador: Como a senhora vê a formação que é veiculada no Instituto pelo CNS? Entrevistada: Uma formação com qualidade. Os nossos profissionais eles buscam muito, muito fazer o melhor trabalho possível. Dentro das limitações... mas a gente percebe que o curso é um curso de qualidade. Entrevistador: A senhora já teve algum mostruário disso? Por exemplo, algum concurso em que algum aluno tenha sido aprovado? Entrevistada: Sim. Muito bem lembrado. Nós tivemos recentemente um concurso municipal em Campos, onde os primeiros lugares são os nossos alunos. Nós tivemos vinte alunos aqui aprovados e os dez primeiros lugares são nossos alunos. Entrevistador: Concurso para? Entrevistada: Concurso para professor de ensino fundamental do município de Campos. Então isso foi muito gratificante para nós. E o depoimento deles é que o que caiu na prova é o que tem sido dado aqui. Entrevistador: A senhora percebeu e/ou percebe alguma manobra política ou jogo de interesses para Instalação do Instituto, com relação à FAETEC, prefeitura ou outro órgão regional? Entrevistada: Não. Eu não diria manobra política. Eu diria um empenho e a influência do nosso prefeito para essa instalação. Agora, é claro que existem movimentos políticos, né?! Nós tivemos aqui um problema.... Nós poderíamos ter hoje aqui um CETEP e não temos por uma questão ,política, o jogo político. Entrevistador: A questão da vocação, como eu citei anteriormente, acho que agora a senhora esclareceu melhor. Quando eu quis falar vocação, quis falar vocação do município, com relação ao que se faz aqui. Por exemplo: a pecuária tem uma grande extensão no município. Existe outro tipo atividade profissional que justifique a presença de um Instituto Tecnológico aqui na cidade e que não justificaria, por exemplo o CNS? Entrevistada: Não. Eu acho que o Instituto Superior de Educação ele é vocação. Entrevistador: Mas um IST também seria vocação para o município? Entrevistada: Um IST eu acho que atenderia. Quando eu te falo de CETEP é porque a nossa região é uma região carente. Você sabe que o noroeste fluminense é um nordeste no estado do Rio, né?! E é um Rio que o Rio desconhece. É um Rio que o Rio desconhece. Então, a gente carece de cursos que possam qualificar as pessoas. Então, um CETEP iria ser muito bom porque a maior parte das pessoas não sabe, não conhece, sabe, não tem acesso a computador. Então eu acho que o município só vai melhorar quando começar a investir em cursos e a qualificar as pessoas. Entrevistador: Aos alunos que são da Rede Municipal houve alguma promessa da prefeitura para algum tipo de ascensão após a conclusão do curso? Entrevistada: É o que eu te falei. Enquadramento. Entrevistada: E a questão do estágio? Entrevistada: Bom, todo Instituto Superior de Educação deveria ter a sua escola de aplicação. Mas nós, em primeiro lugar não temos espaço físico e achamos desnecessário, porque seria mais uma escola no município. Nós já temos inúmeras de educação infantil e ensino fundamental. Então nós achamos viável, no próprio termo de cooperação técnica que existe entre prefeitura e FAETEC, aditivar, fazer um termo aditivo no convênio existente para parceria com 10 escolas municipais. Eu fiz a solicitação à FAETEC, foi montado um processo e foi deferido. Entrevistador: É isso está previsto no regimento Interno da FAETEC? Entrevistada: Está previsto. Nós temos 10 escolas conveniadas, já documentadas, tudo certinho, onde os nossos alunos, eles realizam os estágios. E tudo o que a gente faz, em termos de projetos, nós fazemos esses projetos voltados para essas escolas. Mostra pedagógica nós realizamos com essas escolas; parcerias de eventos como datas comemorativas nós realizamos com essas escolas (com os profissionais dessas escolas). Nós estamos, junto com o SEBRAE para oferecer aqui vários cursos, cursos de liderança, de aprender a empreender. Então, nós abrimos vagas também para os profissionais dessas escolas. Então é um trabalho muito gratificante. É um trabalho onde a gente consegue muito crescimento. Uma integração boa. Entrevistador: Como foi feita a sua escolha para a direção? A senhora acumula as funções de diretora e docente? Entrevistada: Bom, eu fui escolhida pelo prefeito, não é, sem o menor comprometimento político. Eu recebi uma ligação e um convite. A alegação foi de que no município não tinham pessoas com titulação para assumir a direção. E eu, na época, sendo a única com mestrado, fui convidada a assumir. Como eu tenho duas matrículas na Secretaria de Estado Educação, eu não poderia acumular, eu pedi cessão de uma matrícula. Então, numa matrícula eu estou cedida e na outra eu sou docente no Colégio Estadual Padre Mello. Eu trabalho com história no ensino médio. Entrevistador: Como ficou a questão da sua nomeação? Entrevistada: Eu trabalhei de janeiro de 2002 a julho, aguardando nomeação. Fiquei 6 meses trabalhando e a nomeação só saiu em julho. Em janeiro, fui exonerada pela Rosinha. Fui nomeada agora, a partir de 1º de janeiro novamente. Entrevistador: Como está hoje a infra-estrutura do Instituto em termos de biblioteca e as demais exigências de funcionamento? Entrevistada: O que nós estamos, assim com urgência, é que nós precisamos receber um acervo voltado para as ementas do curso. Nós temos um acervo de 257 livros, apenas, que são voltados para as ementas. Eu consegui com o prefeito (fiz uma solicitação), de que ele colocasse funcionando aqui dentro a biblioteca municipal, para que os nossos alunos tivessem um acesso maior aos livros com mais facilidade. Mas o acervo dessa biblioteca (ele é um bom acervo) mas não é voltado para o curso. Então esse é um problema que nós enfrentamos e que depende da FAETEC resolver o mais rápido possível. Entrevistador: O que já foi feito pela FAETEC com respeito à autorização e o reconhecimento do Instituto? Tem havido reuniões periódicas a esse respeito? Entrevistada: Reuniões periódicas... Eles estão trabalhando muito. Recebemos, de julho até agora, maio, a visita do Conselho Estadual por duas vezes e existe já uma previsão de que a autorização sairá em breve. Entrevistador: Agora eu gostaria que a senhora falasse um pouco da sua história como educadora. Entrevistada: Bom, eu comecei na educação. Acho que eu fiz a opção por ser professora também por falta de opção. É aquela questão de desde pequenininha o que vai ser quando crescer. Existe muito isso no interior. Agora não, mas na minha época sim. E fiz o primeiro concurso para o Estado. Tenho 16 anos em uma matrícula; trabalhei desde o ensino fundamental, como alfabetizadora até o ensino médio. Mas posso dizer que não fiz por opção mas tudo que a gente faz temos que ter comprometimento, ainda mais lidando com pessoas, né, com ser humano. Eu abracei a causa. Gosto. Faço da sala de aula um palco. E comecei no ensino fundamental sem ter ainda uma faculdade. Depois fui para Itaperuna e fiz Ciências Sociais na FAFITA. E aí já peguei o ensino médio, trabalhando com Geografia, Sociologia, a disciplina Ciências Sociais. Fiz uma pós em Docência Superior, e por fim eu consegui chegar ao mestrado em História Social do Trabalho, em vassouras, na Severino Sombra. E a busca é intensa, né, é constante. Eu ainda não estou satisfeita. Quanto mais estudamos, mais sentimos ser uma formiguinha, né?! Então, eu pretendo, em breve, ingressar no doutorado. É muito gratificante. Eu senti um prazer enorme em fazer a minha dissertação de mestrado. Principalmente naquela parte onde você produz, você é o autor. É muito gratificante. Eu me senti uma pesquisadora...........................................................FIM. ANEXO 10 ENTREVISTA COM PROFESSORA IMPLEMENTADORA DO CNS DO ISERJ Entrevistador: Professora, eu gostaria que a senhora falasse um pouco, dentro do seu conhecimento, sobre o processo de transformação do IERJ em ISERJ e sobre as principais modificações que ocorreram nas áreas administrativa e pedagógica.. Entrevistada: Bem, eu vou começar contando a história de como eu me inseri no CNS. Na verdade eu fiz um concurso para a FAETEC em janeiro de 1998. E vim trabalhar aqui no Instituto de Educação, no ensino médio. O concurso era para professor de ensino médio. Então tinha concluído meu mestrado em história política, na UERJ, e por conta disso, mal eu entrei aqui no Instituto, em 98, o Instituto estava sendo transformado em Instituto Superior de Educação. Quer dizer, essa matrícula que eu tenho aqui, ela é recente, de quatro para cinco anos. Quando eu cheguei aqui, exatamente, eu peguei essa situação. O IERJ estava se transformando em ISERJ por conta de um decreto feito no governo Marcello Alencar, por iniciativa da professora Nilda Teves, que na época era presidente da FAETEC, (Secretaria de Estado de Tecnologia). O Instituto de Educação, nesse momento, estava sendo encampado pela SECT. Mas era como se fosse assim uma administração híbrida. Quer dizer, a Secretaria de Estado junto com a SECT. Mas a iniciativa de criação do ISERJ foi pela SECT, pela dona Nilda Teves. Quando eu entrei aqui em 98 (comecei a lecionar no ensino médio - história), começaram a perguntar a todos os professores da casa que tivessem mestrado ou doutorado (titulação), e minimamente especialização, para que, então, se formasse o corpo docente do CNS. Então nós fomos submetidos a uma prova de títulos, né, onde eles procuraram ver experiência (os anos de experiência que nós tínhamos), a titulação, participação em congressos, em eventos, publicação de trabalhos... Então foi feita uma prova de títulos para que os professores então fossem avaliados para ingressar no CNS. Então, nesse momento, nós começamos a montar o projeto do CNS. Foi um grupo de cerca de 40 pessoas que foi selecionado, e... esse grupo que passou a fazer parte foi autorizado pelo Conselho Estadual de Educação (o nome desses 40 professores, cerca de 40, não sei se é um a mais ou um a menos, mas cerca de 40 professores). Nós fomos autorizados pelo CEE para lecionarmos no CNS a fazermos parte desse corpo docente. Então nós começamos a trabalhar no projeto. Isso ainda em 98 (final de 98). Estava tudo pronto, tudo acertado e tal... quando houve a mudança do governo. Saiu Marcello Alencar, veio o Garotinho, e com isso a professora Nilda Teves deixou a FAETEC e outras pessoas vieram substituí-la. Nesse momento (fevereiro de 99 – o curso iria começar em março; estava tudo pronto para começar em março, tá). Nesse momento, houve uma intervenção no Instituto, trocou a direção do Instituto, veio então um novo diretor e veio um coordenador para o CNS, o professor Livingstone. Esse novo coordenador que chegou, ele nos fez refazer o projeto. Por que? Porque esse projeto inicial (e vamos dizer assim)... Entrevistador: O interventor era o professor William Campos? Entrevistada: É. William Campos, diretor geral do Instituto. E o coordenador do superior era o professor Livingstone, que nos fez refazer o projeto. Por que? Porque o primeiro projeto, que foi feito, em 98, ele, na verdade foi feito sob inspiração da professora Nilda Teves. E esse primeiro projeto, ele previa um CNS num período menor, de dois anos e meio. Quando o professor Livingstone chegou disse: “Olha, nós temos que reformular tudo isso porque a licenciatura curta deixou de existir. Nós não podemos formar professores em dois anos, dois anos e meio, porque isso vai configurar curso de licenciatura curta, uma coisa abreviada e nós aqui temos condição de montar um projeto melhor. E a carga horária agora, pelas novas Resoluções, é uma carga horária maior, e tal. Vocês precisam fazer uma.... Vamos estender esse curso para quatro anos. Então nós nos debruçamos durante 3 meses sobre esse projeto, estendendo, criando algumas disciplinas novas, aumentando, ampliando as ementas, enfim. Foi feita uma nova grade, uma nova configuração de curso. E em 31 de maio de 99 o curso foi inaugurado. Então, nós começamos as aulas no dia 1º de junho de 99 sem férias nem de julho nem de janeiro, para dar conta do ano letivo de 99. Na verdade, o ano letivo de 99 ele termina em fevereiro de 2000. Nós não tivemos férias, nem em julho nem em janeiro nem em fevereiro. Nós nos revezávamos assim, por exemplo, pro pessoal entrar um pouquinho de férias em janeiro. Aí ofereciam-se algumas matérias em janeiro, aí o pessoal entrava de férias um pedacinho de fevereiro, aí ofereciam-se outras matérias em fevereiro... Trabalhamos assim, quer dizer, o primeiro ano do curso na verdade findou... Nós fizemos, assim, um semestre de 1º de junho a 1º de outubro de 99. E o segundo semestre, de 1º de outubro a final de fevereiro. Foi mais ou menos isso. E aí, março de 2000, já iniciamos o segundo ano do curso (então o terceiro período). Aí foram feitos vestibulares (o vestibular já havia sido feito no final de 98; no final de 98, em dezembro de 98 já havia sido feito o vestibular).E esses alunos ficaram esperando começar as aulas em março e não houve. Não começaram em março. E por que? Porque nós tivemos que reformular o projeto. Muitos (inclusive essa foi uma grande causa de evasão). Porque alguns alunos ficaram assim um pouco atrapalhados, achando que: “será que esse curso vai abrir? Será que não vai?” Aí também prestaram vestibular para outras instituições e passaram, entendeu? Na verdade nós tínhamos um universo de 200 alunos. E quando nós efetivamente começamos em maio (1º de junho de 99) esse contingente tinha se reduzido quase que a metade por causa desses embaraços. Mas, enfim, começamos o curso. E o curso vem se construindo. Nós vamos formar a primeira turma agora, em dezembro de 2002. A turma que começou em 99 é... vai ter a formatura agora em dezembro. Quer dizer, então houve essa modificação como você está dizendo aí, né. Houve a entrada do professor William Campos, como diretor geral do Instituto. Essa intervenção levou seis meses. Quando foi em agosto de 99 houve eleições. Foi eleito o novo diretor geral, professor Martinelli. Esse era prá durar dois anos. Era prá durar dois anos a gestão dele. Só que em 2000, ainda... Era prá ir de agosto de 99 a agosto de 2001. Quando foi em fevereiro de 2001 foram apuradas uma série de irregularidades dessa gestão. Então a FAETEC colocou aqui (a SECT)... colocou aqui um outro interventor, que foi a professora Terezinha. Essa intervenção da Terezinha... Toda intervenção é abominável; mas de certa forma favoreceu um pouco o nosso CNS. Por que? Porque na gestão do Martinelli nós vivemos uma crise muito grande (interna) aqui. Nós vivemos uma crise interna porque o normal (ensino médio)... Entrevistador: O Martinelli foi o primeiro diretor do ISERJ? Entrevistada: Do ISERJ, eleito, sim. É... Não! Antes do Martinelli teve uma outra professora. Luíza. Que ficou só uns meses. Ficou... O Instituto se transformou em ISERJ em 98, né. Quando foi em fevereiro de 99 a Luíza saiu. E veio a intervenção do William. Aí, em agosto de 99, William deixou que fizessem eleições e foi eleito o Martinelli. Aí o Martinelli, quando chegou em janeiro (fevereiro) de 2001, foram apontadas uma série de irregularidades e ele foi destituído. Houve assim um impeachment, né, se assim agente pode dizer, e veio a intervenção da Terezinha. Nesse momento o Instituto Superior pôde respirar um pouco. Por que? Porque o professor Martinelli desenvolveu um trabalho muito contrário ao CNS. Ele achava que nós estávamos tomando espaço da escola. Na verdade o professor Martinelli vinha de uma série de ligações; era um elemento bastante populista ao meu ver. E começou a franquear vagas à vontade. A escola, que já estava bastante inchada, no que que se refere a 5ª a 8ª e ao ensino médio, ficou... Então nós tínhamos aqui, como temos até hoje (mas nessa época, sobretudo houve um inchaço) a escola se transformando num tremendo escolão, você entendeu, de 5ª a 8ª e de ensino médio. E o curso de formação de professores acuado (até salas eles nos negavam), “a gente, entendeu, tendo que se virar com uma salinha de professores, com duas ou três salas de aula, só, porque diziam que não tinha sala de aula prá agente. Enfim, era um problema. Quando a professora Terezinha entrou, de certa forma ele deu uma cobertura ao CNS. Entrevistador: Até porque o que tornou essa instituição superior foi o CNS, certo? Entrevistada: Exatamente. Ela veio com esse discurso. “Olha, se o Instituto foi elevado a Instituto Superior, a missão desse Instituto, né... a função desse Instituto é formar professores. Não é possível que o curso de professores... já que o curso de formação de professores de ensino médio já foi extinto com a última turma, que foi a de 2000, aqui no Instituto, né... nós temos que dar mais espaço e mais legitimidade a esse CNS”. Foi até um período de uma relativa tranqüilidade. Então, nesse período, nós fizemos a nossa primeira reunião “Diálogos em Formação”. Muitos professores de universidades vieram aqui nos prestigiar trocando informações... O curso começou a ser conhecido fora daqui do Instituto. As universidades, com muita curiosidade de saber como é que esse curso funcionava. Recebemos vários alunos de UFRJ, UFF, de outras universidades (da PUC), fazendo pesquisas... Porque era um curso novo. Todo mundo tinha muita curiosidade de saber como é que estava funcionando; de saber como estava sendo implementado. E foi um período até que transcorreu com uma relativa tranqüilidade. Quando chegou em setembro/outubro de 2001, a professora Terezinha se afastou e deixou no lugar dela o professor Paulo, que era um elemento lá da FAETEC também (professor Paulo Azevedo). E a princípio ele parecia continuar aquele trabalho da professora Terezinha. Parecia que as coisas iriam transcorrer da mesma forma. Entrevistador: Paulo Azevedo é o tão conhecido “Azevedo”? Entrevistada: Não, não. Azevedo era o diretor geral da FAETEC. Esse que se candidatou aí agora a deputado. Esse Azevedo era Paulo Azevedo. Era um professor que estava lá na FAETEC, que veio aqui para substituir a Terezinha. Aí a professora Terezinha, ela deixa aqui o Paulo Azevedo como diretor geral do Instituto. Também tipo “mandato tampão” (ele vai ficar até se faça as eleições... aquela história... aquela coisa...). Bom, o que aconteceu foi o seguinte: no início parece que o professor Paulo iria seguir mais ou menos as diretrizes que a professora Terezinha estava encaminhando. Mas, quando foi nas férias de janeiro (em plenas férias de janeiro), nós fomos surpreendidos, em férias, por uma série de medidas do professor Paulo, é... colocando à disposição todas as direções que existiam aqui no Instituto (do Normal Superior, do ensino médio, de 5ª a 8ª, da escola primária...). Ou colaboravam com ele ou eram colocados à disposição. E ele queria que o CNS fosse dirigido por uma outra pessoa, que queria modificar o projeto. Aí foi a guerra que nós tivemos... Entrevistador: Tinha pretensão em voltar ao que era? Entrevistada: Olha, não voltar ao que era. Não se falava, evidentemente, nesse projeto mais (de dois anos e meio). Até porque nós estávamos lutando para que ele... é... pela escola desqualificação. Mas se a gente deixasse a coisa vingar, era capaz que eles acabassem forçando a gente a retornar, né. Diziam eles que não. O discurso deles era que não. Que esse curso ia ser um curso de excelência, iria ser um referencial, um modelo, ninguém ia mexer no curso de quatro anos... Mas os outros ISE que foram aparecendo por aí estavam todos nessa cartilha de dois anos e meio, né. Então nós pensamos e começamos a fazer uma oposição sistemática a essa intervenção. Isso começou em janeiro (nem férias tivemos). Começamos a fazer essa oposição e nos negamos a colaborar com essa nova direção. Aí, já era janeiro de 2002. Nós nos negamos. Eu, por exemplo, tinha sido eleita para a coordenação de pesquisa e disse ao novo diretor que não podia, não queria; nesses termos eu não iria colaborar. E as colegas fizeram a mesma coisa. Bom, em 25 de abril de 2002, nós revertemos a situação, por conta, justamente, da transição Garotinho para Benedita, né?! politicamente a coisa começou a mudar lá na FAETEC e nós, então, conseguimos reverter esse quadro. Esses inteventores, saíram e tudo voltou a ser como estava em dezembro de 2001, ou seja, conseguimos a promessa (isso nós fomos a políticos, a Chico Alencar...). O professor Ricardo Viera Alves, que assumiu a SECT, entendeu, e nós fomos a ele... Ele disse assim: “Bom, então eu vou resolver essa situação da seguinte maneira: vai voltar tudo como estava em dezembro de 2001. Cada segmento com o seu coordenador antigo”. E como é que vai ficar então, a situação da direção do Instituto? “Olha, a direção do instituto vai ser entregue a uma Comissão Gestora. Cada coordenador de casa segmento vai representar o seu segmento e vocês vão compor uma comissão gestora, com representantes do pré-escolar, de 1ª à 4ª, de 5ª à 8ª, do ensino médio e do superior”. E é isso que está até hoje, até o presente momento. Entrevistador: A direção do ISERJ está com uma Comissão Gestora? Entrevistada: Atualmente. De 25 de abril de 2002 até o dia de hoje, quem responde pela direção do ISERJ é a Comissão Gestora. Entrevistador: E o colegiado? Entrevistada: Bom, o colegiado é um grupo do CNS. Por que? Porque quando nós implementamos o CNS, o CEE exigiu que houvesse gestão colegiada. Então, nós no CNS nós temos essa gestão, que é composta pelos professores que exercem coordenação (coordenação de pesquisa, de extensão, coordenação da prática docente...) e pelos chefes de núcleos, que são as áreas em que se divide o nosso curso (conhecimentos básicos, fundamentos da educação, prática docente interdisciplinar e conhecimentos específicos). Todos nós, juntamente com a coordenadora, que é a Sandra, fazemos parte do colegiado e nos reunimos toda 4ª feira, de nove ao meio dia, e deliberamos, em consonância com o coletivo (porque tudo que o colegiado decide é passado depois pelo coletivo, na reunião da tarde), e o coletivo então também vai opinar, também vai dar suas sugestões, fazer suas críticas... Entrevistador: O coletivo de que a senhora fala, é composto de todos os professores do Instituto? Entrevistada: É. O coletivo é o grupo todo. Entrevistador: Como a senhora viu a intervenção do IERJ na sua fase de transformação em ISERJ? Como é que a senhora viu esse momento em que o curso de formação de professores do Instituto deixou de ser um curso de nível médio para ser um curso de nível superior? Como ocorreu essa transformação? Entrevistada: O momento exato dessa transformação eu não cheguei a viver, eu te disse. Quando eu entrei aqui as coisas já estavam em andamento. Porque na verdade a, Nilda Teves começou a levantar essa questão em finais de 97 e eu entrei aqui em março de 98. Quando eu entrei, a coisa já estava sendo feita, e eu peguei a coisa meio que “o bonde andando”. Entrevistador: Agora, como é que a senhora vê essa vinculação do ISERJ à SECT e não à SEE, não à UENF e nem à UERJ? Entrevistada: Olha, em primeiro lugar, eu acho o seguinte: essa idéia partiu da própria SECT, no governo Marcello Alencar, que foi a Nilda Teves. Não partiu da SEE, tá. Aí eu acho que a SECT... é aquela questão, não é, de estratégia política, né... talvez tenha mais verba, tenha mais prestígio que a Secretaria de Educação, entendeu, e pôde levar a efeito essa mudança. Por que? Porque a SEE administra centenas de escolas. Quer dizer, ficar ligado à SEE é ficar, como agente diz, no bolo. O que que a SECT nos ofereceu? Salários melhores, tá. Quer dizer os professores que fizeram prova para a FAETEC em janeiro de 98 já chegaram com um piso que a Secretaria do Estado não ganhava. Entrevistador: Mas vocês continuam sendo professores de nível médio ou foram reenquadrados? Entrevistada: Não. Nós ainda continuamos como professores de nível médio. Aqui ninguém foi enquadrado em nada. Agora esse pessoal que já estava no Instituto (que era da SEE), o que a SECT fez? Ofereceu um acréscimo no salário, um complemento. Então os professores que são da SEE, eles, na verdade, recebem o salário-base pela SEE e esse complemento que a SECT dá. Entrevistador: E ainda há, no Instituto, professores que são vinculados à SEE? Entrevistada: Tem. Tem ... Acho que a grande parte. Mesmo no Normal Superior. O salariozinho deles magro, né, lá do Estado, da SEE, e o complemento da SECT. Entrevistador: Mas eu pergunto assim... tem algum professor aqui que só recebe salário de lá? Entrevistada: Não, não. Isso não existe. Entrevistador: Eu digo os que estão no ISERJ, independentes de ser do CNS? Entrevistada: Recebem em qualquer segmento, recebem. Até porque foi colocado prá eles: “Querem ficar no ISERJ nessas condições?”. Muitos não quiseram. Outros não quiseram “Não, eu não quero fazer parte dessa SECT. Prefiro ficar com meu salário pequeno mas trabalhar em outro lugar...” E aí saíram. A grande maioria preferiu ficar. Agora o meu caso por exemplo (eu e outros), já somos concursados da FAETEC. A gente não recebe complemento. Recebe só pela FAETEC. Entrevistador: Então, prá você, nesse ponto a vinculação, ela teve um ponto positivo? Entrevistada: Prá mim sim. Entrevistador: E no sentido de trabalho? No sentido de veiculação com respeito aos conteúdos, como é que você vê isso? Entrevistada: Olha, eu acho que aqui nós tivemos uma certa autonomia prá fazer o nosso projeto, tá. Eu não digo que essa autonomia tenha vindo na época da Nilda Teves. Eu acho que na época da Nilda Teves era um grande dever de casa, a meu ver. Embora, como eu te disse, eu entrei no meio do caminho. Acho que nós tivemos autonomia com a intervenção do professor William Campos, que na verdade ele botou aqui no superior o professor Livingsonte. O professor Livingstone foi um ponto positivo. Porque ele nos disse: “olha, vamos trabalhar direito porque...”(é claro, né, que havia aí um embate político - Garotinho versus Marcello...). “Vamos trabalhar direito porque esse negócio de licenciatura curta não dá, vamos fazer um projeto legal, de quatro anos, e tal e tal e tal”. Então nós fizemos um trabalho... acabou que o nosso trabalho ficou sendo um trabalho que depois contrariou as expectativas da própria FAETEC, entendeu? Então nós acabamos fazendo um trabalho que contrariou... Ela nos deu uma abertura; nós fomos além desta abertura entendeu? Tanto que o professor Livingstone foi “defenestrado”. Entendeu? O professor Livingstone não ficou.. Entrevistador: O professor Livingstone era ligado à Ciência e Tecnologia? Entrevistada: Não. Ele veio quando veio William Campos, quando veio esse pessoal todo. Mas ele veio com o projeto do CNS. E ele, de certa maneira coordenou. Aí eu sei que aí nós acabamos de fazer um trabalho que depois... Entrevistador: Por que então o CNS não ficou vinculado à UERJ e à UENF, o que seria, digamos, “a coisa mais lógica nisso tudo”? Entrevistada: Aí eu não sei. Eu acho que aí o próprio Estado, ele queria.... Entrevistador: Porque aí em termos de salários seria a mesma coisa, não? Entrevistada: Não. Não seria não. Não seria mesmo! Porque o que nós ganhamos aqui, enquanto professores de ensino médio, não se compara ao salário de um professor, de um docente de nível superior da UERJ e da UENF. Não se compara. É bem menor. Eu acho que até por isso tenha acontecido. Entrevistador: Talvez por um pouco de discriminação deles? Entrevistada: Não sei, eu não sei o por quê. Eu acho que é o seguinte: a mão de obra barata. O grupo, na verdade, criou o projeto. Também não é justo pegar esse grupo e jogar no lixo, entendeu? E pegar esse projeto e dar prá UERJ e dar prá UENF desenvolver, sem que este grupo que desenvolveu o projeto esteja participando. Por outro lado, nós não fizemos concurso prá nível superior. Como é que agente vai abocanhar um salário igual o da UENF e da UERJ? Então são essas questões. Entrevistador: E você sente vontade política deles hoje em reenquadrar vocês? Entrevistada: Não. Eles estão dizendo. Há três anos que eles estão dizendo: “vai haver concurso para o Normal Superior, para esse curso. Porque formaram um quadro provisório, criaram projeto, implementaram, mas não é possível continuar; tem que haver concurso”. E a gente até hoje aguarda. Eu vou te dizer sinceramente: eu não tenho medo de concurso tá?! Eu acho até que a nossa situação se legitimaria mais. Por outro lado, é uma situação um pouco preocupante. Por que? Porque você... não... a gente fez um projeto; a gente implementou um curso; a gente está levando adiante um projeto e aberto um concurso, sobretudo se os salários forem compatíveis com os salários da UERJ, você já imaginou o número de doutores, pós-doutores, esse pessoal que está se aposentando aí nas federais, que vem aqui concorre?. Você se aposenta numa federal e depois vem aqui ganhar um salário razoável. Porque a UERJ, não sei se você sabe, ela paga melhor do que as federais, né. E sei que tem muito doutor, muito pós doutor, muita estrela de primeira grandeza, que quando me encontra, pergunta: “e aí, já abriu concurso?” Entendeu? Quer dizer, nós que projetamos, que planejamos, que implementamos, que estamos nessa luta há quatro anos. Já no título, a gente já seria batido. E aí é uma grande pena a gente pegar um projeto que a gente suou tanto e entregar na mão de pessoas que não estão lá muito comprometidas com isso. Agora, se vier o concurso, eu acho que a gente têm mais que fazer e tentar, né. Entrevistador: Hoje vocês têm aqui, no Normal Superior, você diria, qual a porcentagem de professores doutores e mestres? Há algum professor somente com graduação? Entrevistada: Nós aqui no Normal Superior, dos 42, o título mínimo (40, eu não sei se são 42; eu boto 40 assim no geral), o título mínimo é especialista. Mas nós temos (eu não sei a porcentagem exata... mas... mais da metade mestre. Mais da metade, eu te garanto, têm o título de mestre. E doutor, já com o título de doutor ainda não temos. Nós temos aqui quatro professores fazendo doutorado, né, um dos quais sou eu, né?! Graças a Deus que eu consegui entrar. Mas doutor, mesmo, nós não temos. Nós temos cerca de metade desse grupo de mestres. Quatro, no momento, já estão em programas de doutorado. Tem uma que eu vi que já deve estar defendendo, que ela entrou no programa de doutorado eu acho que em 2000; Dois mil, não, acho que em 99 ela já tinha entrado); A outra é a Ana Novaes, de português, que entrou junto comigo, em 2000. A Ana Novaes está na UFF, mas ela faz em língua portuguesa. A Sandra está na UFF, fazendo educação... Eu estou na PUC, fazendo educação... E tem uma outra moça, da USP, que é também língua portuguesa; essa é a mais antiga, acredito até que ela esteja defendendo ou já defendeu. A mais recente é Sandra, né, que está no primeiro ano. Eu e a Ana Novaes estamos agora concluindo o segundo ano (porque nós entramos em 2001...). Eu devo defender minha tese até o final do ano que vem, se Deus quiser. Acho que eu não vou usar nem os quatro anos, porque eu estou com pressa. Enfim, a situação é essa. E a questão da... agora temos um grupo que é especialista em algumas áreas que não foi possível obter mestres aqui na casa, principalmente na área de educação infantil. Havia um grupo de educação infantil que já trabalhava aqui num curso chamado de estudos adicionais, que era um curso pós-secundário de 1 ano que especializava em educação infantil, com livros publicados. E elas foram incorporadas pelo CNS, porque tinham pós-graduação, embora não fosse mestrado. Agora, dessas que não têm mestrado, a grande maioria já está fazendo, entendeu? Já tem um grupo expressivo que está defendendo aí. Já está. Eu acho que até final do ano que vem, dos 40, eu acho que uns 80% vão ser mestres. Entrevistador: Você acha que existem, pela sua experiência, interesses conflitantes nos projetos ideológicos nos projetos de formação de professores da SECT/FAETEC e da SEE? Entrevistada: Não. Porque a Secretaria de Estado, ela sequer tem um projeto prá curso superior. O projeto de curso superior é da FAETEC. Agora existem sim, projetos conflitantes dentro da própria SECT, essa é que é a questão. Nós aqui constituímos uma exceção. Porque todos os ISE que eles implementaram, que você está se referindo aqui (Itaperuna, Bom Jesus, Pádua...), todos são cursos de dois anos e meio. Inclusive eu não fui, mas um grupo aqui foi se apresentar (foi assistir umas palestras lá em Campos). E o que elas trouxeram prá nós foi que elas fizeram assim um trabalho que elas fizeram sobre chicote, entendeu, um dever de casa mesmo, do jeito que a FAETEC queria. Um modelinho FAETEC; tudo do jeito que eles queriam. E aí nos somos tidas, nesses ISE como as revolucionárias, as... “gente porque que vocês têm tanta autonomia? Como é que vocês conseguem tanta autonomia? Porque nós aqui fizemos o projeto no chicote. Tivemos que fazer tudo do jeito que eles queriam. E o projeto de vocês é um projeto de quatro anos, e tal...” É, a gente têm lutado por isso, né; é isso que a gente não quer deixar morrer. Então, eu acho que a questão, o conflito maior está dentro da própria FAETEC, entendeu? Entre esses ISE que estão saindo por aí formando professores, a meu ver, de uma forma bem aligeirada. E o curso que nós implementamos aqui... Entrevistador: Eu queria que você falasse um pouco do projeto de formação de professores do ISERJ. Voc,ê como pessoa ligada à memória do Instituto, como tentou construir isso? Entrevistada: Olha, nós aqui, no Instituto de Educação, temos uma tradição (embora essa tradição ela não seja lembrada). E quando é lembrada ela se remete ao Império prá dizer que “o Curso Normal do ISERJ tem uma tradição de 122 anos...” Foi a Escola Normal da Côrte, fundada na época do Império, em 1880. É evidente que essa Escola Normal, a primeira do Rio de Janeiro, ela deu origem ao Instituto. Mas não era o Instituto. O Instituto de Educação criado em 1932, já nesse prédio aqui (esse prédio foi inaugurado em 1930, né, na época da gestão do Fernando de Azevedo). Era prá ser a nova sede da escola normal. Só que o Fernando de Azevedo saiu da Secretaria de Educação e foi substituído por Anísio Teixeira, em 1931.E o Anísio Teixeira (a primeira coisa que ele fez) foi transformar a antiga Escola Normal em Instituto de Educação. Ora o que que é isso? O Instituto não é apenas um curso de formação de professores simples, mas sim, um curso de formação de professores, tá, que previa uma escola secundária de seis anos (você vai ler aí nesses artigos que eu te dei). O aluno entrava aqui com 11, 12 anos , começava a escola secundária (o antigo ginásio). Fazia a escola secundária toda. Era um ginásio de cinco anos e um curso complementar de um ano. Depois é que ela prestava um exame para entrar na escola de professores, que era uma escola de dois anos em nível superior. Agora era de dois anos por que? Porque a formação geral dessa professora, ela já vinha sendo sedimentada aqui no Instituto desde a escola secundária. A prova era dificílima para entrar; era uma verdadeira loucura. Prova de exame de saúde, teste de inteligência, provas orais... era uma loucura que as meninas se submetiam. Quer dizer, esses dois anos de escola de professores em nível superior (era chamado assim “Escola de Professores”) eram apenas para trabalhar a parte dos fundamentos da educação e da prática docente e as chamadas matérias do ensino, que vão ser a grande inovação de Anísio Teixeira, que é uma adaptação dos Teacher’s Colleges, da Universidade de Columbia, onde ele se tirou o título de mestre em 1929. É a essa herança que nós temos que nos agarrar. Que tipo de formação de professor Anísio preconizava? Um professor, como ele dizia: “ensinar é uma arte, mas essa arte ela tem que estar articulada ao bastão da ciência”. Claro que nos anos 20 e 30 a ciência era uma coisa de descoberta. A ciência entrando na educação. A educação até então era o que? Era uma empiria, era uma prática, não tinha ... A partir, vamos dizer assim, da chamada renovação educacional, educação ora... dos pioneiros, eles começaram a preconizar essa necessidade do professor ter que estudar sociologia, psicologia, biologia, história da educação, filosofia da educação... Esses eram os chamados fundamentos. Esse curso também tinha um outro núcleo chamado “matérias de ensino”(que é o grande barato desse curso). As matérias de ensino eram as matérias que ele ia ensinar no primário, sob o ponto de vista metodológico. Então ele não dissociava a metodologia da... o conteúdo da metodologia. Os alunos aprendiam ciências naturais, estudos sociais, leitura e linguagem, matemática, cálculo... Mas aquele conteúdo era associado à metodologia, entendeu, e à prática docente, que era chamada prática de ensino, que hoje nós chamamos de PDI (Prática Docente Interdisciplinar). A prática de ensino era extensiva, entendeu, uma coisa assim enorme. Então essa formação de dois anos ela era uma formação excelente, ao meu ver. Por que? Porque hoje nós recebemos alunos que vêm do ensino médio (de qualquer modalidade do ensino médio). Então um curso de dois anos prá nós seria insuficiente. Por que? Porque esse aluno veio com uma formação geral muitas vezes deficiente. Então nós aqui precisamos, muitas vezes, dar um certo reforço no conteúdo a esse aluno. Falta a ele uma certa base. Se a gente fizer um curso de dois anos, dois anos e meio, esse aluno não vai ter essa base de jeito nenhum, porque ele vem deficiente do ensino médio. Então, esse curso do Anísio, por exemplo, ele podia dar em dois anos sim, porque o aluno, para entrar para a escola de professores, tinha que ser da escola secundária do Instituto; não podia vir de outro lugar. Então ele já vinha tendo aquela formação geral formidável (seis anos de estudo), onde ele estudava até alemão, porque a bibliografia era francês, inglês e alemão. Não tinha quase livro traduzido. Ele estudava francês, inglês e alemão aqui. E quando ele chegava na escola de professores, aquela base ele já tinha. Era só cair nos livros de Kilpatrick, de Dewey, de Decroly, de Foliére, entendeu? Tinha que ler aquilo tudo, em francês, inglês... E aí, a escola de professores era articulada com a escola primária e com o jardim de infância. Os alunos faziam a prática aqui mesmo. Essa foi uma das razões pelas quais, inclusive, o Instituto de Educação se revelou um locus importante de formação de professores. Não só por conta dessa história que aliás, infelizmente, essa história é esquecida. A minha tese de doutorado parte exatamente dessa questão. Ninguém aqui que foi aluno daqui nas décadas de 50 e 60 ouviu falar nessa experiência de Anísio Teixeira nos anos 30. Ninguém que trabalha aqui nesse Instituto de Educação há 20, 30 anos (como nós temos companheiras aí que estão aqui desde a década de 70) ouviu falar. Quando ouviu falar era nos cursos universitários, faculdades de pedagogia, de filosofia que faziam. Aqui, enquanto normalistas não ouviam falar dessa experiência. Foi uma experiência silenciada porque ela feriu interesses muito sérios na época. Como foi desmontada a UDF, o Instituto de Educação também, que estava articulado a ela também teve a sua formação de professores reduzida a nível médio, entendeu? Entrevistador: Como a senhora vê esse curso de formação hoje, aqui no ISERJ? Que professor está nele sendo formado? Entrevistada: Olha, não houve preocupação em resgatar essa memória, isso eu te digo. Essa memória da formação de professores está sendo resgatada individualmente por mim, no meu projeto de doutorado (no projeto que eu coordeno aqui, que é o projeto de memória do Instituto). E de tanto eu falar, de tanto eu pregar, de tanto eu doutrinar, hoje alguns professores já incorporaram um pouco esse discurso. Mas quando o projeto foi montado sequer se tinha conhecimento (e eu digo isso assim 85% do corpo docente – porque eu que fiz essa pesquisa) desconhecia essa experiência de Anísio. Seria forte eu dizer que esse curso aqui se inspira nesses princípios, nesses valores, vamos dizer assim, implementados aqui. Por outro lado, você percebe que embora desmontada a estrutura da escola, embora silenciada a experiência, certos resquícios ficaram. Foram reincorporados, foram ressignificados, foram ... ao longo dessas décadas. Então se você abre o nosso projeto hoje, você vai levar um susto. Embora ninguém tivesse lido, vamos dizer assim, o decreto de implementação da escola de professores de Anísio (e tivesse estudado isso) você vai ver certas expressões muito familiares àquela época. Eu credito isso àquela memória que é silenciada mas alguma coisa fica. Porque gerações vão se formando, vão ouvindo, vão passando prá outras. Então você vê assim um discurso que “Pôxa, eu já vi isso. Aí você vai lá no Anísio e isso tudo está posto lá em 32. E a maioria das pessoas acha que descobriu a pólvora agora em 2002. Não descobriu pólvora nenhuma. Pelo contrário! Acho que se se mirasse naquele curso, guardando a devida distância... Porque a gente não pode ser anacrônico. Foi uma experiência dos anos 30. A gente não pode pegar e transplantar sem adaptações. Mas se a gente tivesse ao menos bebido um pouco naquele princípio de formação de professores de Anísio, olha, vou te contar... Não tinha prá ninguém. Entrevistador: A senhora acha que foi uma jogada política, o fato dos ISE ficarem vinculados à FAETEC e não `a SEE? Entrevistada: Eu não sei se jogada. Mais estratégia mesmo. É uma questão assim de disputa dentro do governo. Entrevistador: A senhora acha que existe uma disputa hoje dentro do governo? Entrevistada: Olha, eu não sei se eu poderia te responder isso. Eu acho é eu o Instituto ele é disputado. Tanto pela pela SECT como pela SEE. Ninguém quer abrir mão do Instituto. Porque o Instituto é um espaço político, isso é inegável. Já o era quando foi fundado em 1930; já o foi em todas essas décadas. O Instituto é um espaço diferente, completamente diferente da Rede comum. Não sei se a monumentalidade desse prédio, não sei se é essa tradição; se é essa missão de formar professores... Mas ele é diferente. Houve sim. Houve um tempo em que a SEE queria que a SECT abrisse mão. Aí ficou assim: a SECT faz a parte administrativa e a SEE fica com a parte pedagógica. Mas isso, em termos do CNS acabou não dando certo. Hoje em dia o CNS está completamente vinculado à SECT. Que aliás, foi por intermédio da SECT que ele foi fundado, né?! Entrevistador: Então, a senhora acha que pode existir um “divórcio” de relações entre a SECT e a SEE? Entrevistda: Não acredito . Não acredito que exista “divórcio” de relações porque eles se entendem. Como dizia a minha avó eles são brancos e sempre se entendem Os brancos sempre se entendem. Eles fazem aquela posição, aquela coisa... Mas daqui a pouco já está todo mundo tomando uisquinho, um no gabinete do outro, e a gente é que sofre, né, porque eles querem tirar o melhor partido. Entrevistador: A senhora teria idéia de por quê o ISERJ foi o primeiro Instituto a ser escolhido e transformado em ISE? Tem idéia de por quê (e se) os outros que foram escolhidos, o foram também a dedo? Por exemplo: o Cléria Nancy, em São Gonçalo, não foi. O IEPIC, em Niterói, que tem uma história tão importante não foi... A senhora tem idéia do porquê do ISERJ ter sido escolhido e os outros não terem sido? Entrevistada: . Bom: do ISERJ eu imagino que tenha sido pela própria tradição, né. Porque nós aqui fomos o primeiro curso de formação de professores em 1932, embora essa experiência tenha durado poucos anos. E tem essa tradição toda que vem do Império... Afinal de contas o Rio de Janeiro foi distrito federal, foi capital do Brasil até 1960, não é? Então o Rio atua aí... Tem um sentido de capitalidade, de vitrine do Brasil, de cabeça da nação. Isso é uma coisa histórica, né, que não se pode negar. Eu acho que em parte foi por conta disso; o Instituto ter sido assim como modelar. Porque antes só havia o Instituto. Carmela Dura, Júlia Kubitschek, Heitor Lira, isso tudo foi criado depois. Depois, no final dos anos 40 prá frente (até 1949/1950) o Instituto era o único curso de formação de professores no Rio de Janeiro. Entrevistador: E o IEPIC em Niterói? Entrevistada: Mas Niterói era outro estado. Era estado do Rio. Aqui era distrito federal. Aqui sempre teve essa.... Agora os outros ISE eu não sei como foram escolhidos. Aí estrategicamente, no sentido de oferecer a uma demanda de cidades (Campos, São Gonçalo, Itaperuna, Bom Jesus) sei lá. Eu acho que é para disseminar isso por essas cidades assim menores, né, que tinham de repente uma procura, uma certa demanda por curso superior, não podiam fazer... Agora o Instituto eu creio que tenha sido por isso. Pela questão da capitalidade, por ter sido distrito federal, por ter essa tradição, essa história toda. Os Outros eu não sei. Agora evidentemente que deve haver interesses políticos permeando essas escolhas. Evidentemente nenhuma escolha é neutra. Interesses eleitorais aí nessas cidades, talvez... Campos, por exemplo não precisa nem falar, né? Campos não precisa nem falar. Entrevistador: A experiência do Instituto de Campos é parecida com a do ISERJ? Ela se parece mais com a do ISERJ? Entrevistada: Não. A experiência de Campos é igual a dos outros ISE, como eu te falei. Eu não fui lá nesse dia, mas o grupo que foi voltou dizendo que eles não tinha autonomia; fizeram trabalho de casa, curso de dois anos e meio... E ficam assim bobos de ver “como é que vocês podem tocar aquele projeto, diferente de todos e ninguém perturba vocês...”. Perturbar eles perturbam mas a gente reage. A gente resiste. É uma resistência que nos custa o sangue. A gente resiste. Entrevistador: Comparando o binômio IERJ/ISERJ e tomando a formação de professores em nível médio e a formação de professores em nível superior da educação básica, a senhora acha que essa transformação no projeto do ISERJ resultou em alguma diferença na qualidade de formação desses professores? Entrevistada: Olha, eu acho o seguinte: eu não cheguei a lecionar em nenhum Normal de Curso Médio. A minha trajetória foi ensino médio, formação geral, né?! cursinho prévestibular, e tal... Na verdade até digo: eu sou professora a mais de 30 anos, mas na área de educação, de formação de professores eu não milito a muito tempo. Na verdade eu comecei a militar por conta do CNS. Agora eu acho o seguinte: nós aqui estamos com uma preocupação não só de formar o professor digamos assim, eu não sei... O que me parece é que o curso normal médio ainda estava trilhando um pouco naquela linha meio tecnicista, que começou com força nos anos 70, que permeou toda a lei 5.692 e que, graças a Deus, agora está passando... mas que se impregnou muito. Eu sei por que? Por que eu trabalhei com grades curriculares, na minha pesquisa do PROMEMO, eu tive um trabalho que eu peguei grades curriculares dos anos 30 até anos 80 (até final dos anos 80). E realmente dos anos 70 até o final dos anos 80, pelo menos onde eu vi, era um negócio técnico, tecnicista ao extremo. E eu não acho, por exemplo, que os nossos professores eu não vou dizer que eles vão sair melhor formados.Mas pelo menos eles têm um espaço de discussão aqui que eu tenho certeza de que no curso normal de nível médio eles não tinham. A gente trabalha aqui, num período de quatro anos; a gente faz um pouco essa coisa do... Faz um pouco de revisão geral dos conteúdos. Faz, porque senão não vai dar, entendeu? A gente tem muita leitura, muito texto, muito debate. O nosso esquema de aula aqui é debate de texto direto, seminário (a gente dá eventualmente uma ou outra prova; a prova não tá abolida, eu mesmo de vez em quando dou prova...) Mas a gente faz um trabalho de muita interlocução, de muita leitura. Então eu acredito que no ensino médio isso não pudesse ter sido feito. Era uma coisa na base da apostilinha, da técnica, entendeu? Apostilinha... vendia a apostilinha na xerox, o aluno decorava aquelas técnicas para fazer a provinha. Então eu via muito assim. E hoje aqui nós temos um aluno que discute, que é ouvido, que tem espaço para essa discussão. Nós temos aqui, por exemplo, alunos que fazem parte de mesas nos nossos encontros “Diálogos em Formação”. Trabalhos deles... Que escrevem trabalhos. Nós estamos agora com a primeira turma se formando e nós temos monografias boas, de muito bom nível. E tem até uma ótima... prá mim foi uma felicidade. Foi um presente que eu ganhei no dia do mestre. Eu orientei uma menina do segundo período, hein, segundo período. Passou pro terceiro (tá cursando o terceiro agora). Quando ela começou essa monografia ela estava só com dois períodos. Ela entrou num concurso de monografias e o prêmio era uma viagem a Paris. E o orientador ganhava também E ela me perguntou: “Sônia, você me orienta?” - Puxa, Luíza, é meio complicado eu te orientar; primeiro porque você escolheu informática na formação de professores. Informática não é muito a minha praia. Mas vamos lá”. Essa menina (foram 287 trabalhos inscritos). Essa menina foi a 6ª colocada. Nós não ganhamos a viagem a Paris, mas essa colocação... E ela fez essa monografia em pouco mais de um mês. Mandando prá mim por e-mail, eu corrigia, mandava prá ela, ela mandava... muito direitinho, com referencial teórico... Então é um exemplo de que o nosso aluno, já no segundo período ele tem condições... Por que? Essa menina trabalhou comigo no PROMEMO. Mal ela entrou ela se encantou pelo projeto e ela começou a trabalhar comigo. Fazia entrevistas, transcrevia, discutia os textos teóricos, né?! Então eu acho que o CNS, ele tem essa missão. De formar professores realmente mais críticos, mais reflexivos, mais comprometidos com essa mudança, mais comprometidos com essa sociedade pluralista... Entrevistador: Qual será a atuação deles quando saírem formados no CNS? Entrevistada: Eles vão atuar ou no magistério de 1ª a 4ª séries, dentro do ensino fundamental, ou na educação infantil dependendo da opção que eles fizerem. Entrevistador: E o ISERJ postula a pós-graduação para que esses alunos futuramente possam ser professores do próprio CNS? Entrevistada: Olha, nós temos é... digamos, autonomia para fazer isso. O Instituto Superior de Educação pode ter, né, cursos de especialização... Agora nós no momento ainda não temos nada em projeto. Nós queremos consolidar esse CNS, porque esses primeiros anos foram anos de construção do curso, né?! De erros, de acertos, e de consertos, de reparos, e de reflexões... Entrevistador: A senhora crê que agora a coisa esteja acalmando um pouco? Entrevistada: Não sei. Eu acho que agora essa primeira turma estando formada a gente pode refletir sobre os erros. Por exemplo: uma coisa que a gente vai imediatamente vai fazer mudanças, grandes mudanças é na grade curricular. Nós estamos conscientes de que nós estamos oferecendo uma grade um pouco inchada pro nosso aluno. Nosso aluno está tendo que administrar uma série de matérias. A gente vai procurar fazer uma mudança nessa grade curricular. Essa é a nossa primeira providência, né.?! Agora, assim que acalmar, que eles defenderem as primeiras monografias, a gente já vai entrar o ano de 2003 mexendo nessa grade, provavelmente até nas férias. Entrevistador: Como é que está sendo feita essa defesa de monografia? Entrevistada: Essa defesa de monografia, a primeira turma é essa, né?! Elas vão ter meia hora (cada aluno terá cerca de meia hora). Quinze minutos para apresentar rapidamente o seu trabalho e quinze minutos para possíveis perguntas que a banca não esteja satisfeita. A banca é composta de três professores: o orientador e mais dois, do curso. Entrevistador: Eu queria que a senhora falasse sobre como funciona o CNS do ISERJ. Entrevistada: Isso você vai ter bem no projeto. Nós temos aqui duas opções, que é a educação infantil e o ensino de 1ª a 4ª série. O aluno faz opção. O primeiro período é básico. Tanto a educação infantil como o magistério de 1ª à 4ª, os alunos cursam as mesmas matérias. No terceiro ano (quinto período), começa a diversificar. Então, quem optou por educação infantil vai fazer matérias ligadas à educação infantil. E quem optou por 1ª a 4ª vai fazer matérias... (didática de ensino fundamental, prática de ensino fundamental...). Entrevistador: E quanto às habilitações? Entrevistada: São duas habilitações. Educação infantil e 1ª a 4ª. As ênfases, você tem ênfases em educação especial e em educação de jovens e adultos. Geralmente quem faz 1ª a 4ª, a ênfase é educação de jovens e adultos. O que não impede que seja em educação especial. Agora, quem faz educação infantil, a ênfase só pode ser em educação especial. Mas eles saem não só habilitados como com essa ênfase, porque essas ênfases, nós temos cerca de 360 horas/aula só de disciplinas/ênfase. Quer dizer, o aluno nosso, quando ele sai daqui, na verdade ele é quase que um especialista. Porque tem muitos cursos de especialização que exigem 360 horas/aula. Quer dizer, o montante de horas/aula que nós temos aqui, cerca de trezentas e alguma coisa (não sei se chega exatamente a 360 horas/aula, mas eu creio que chega). Entrevistador: O curso é de? Entrevistada: Três mil e duzentas horas aula. Desconta aí 800 horas de prática e as outras... E dessas que sobram (dessas 2400 que sobram) mais de trezentas são das ênfases (de educação de jovens e adultos, de educação especial... ) Nós temos diversas disciplinas, que você pegando o projeto e vendo a grade você vai ver. E nós funcionamos assim: nós temos quatro áreas: área de conhecimentos básicos (língua portuguesa, educação matemática, história, geografia e ciências); as áreas chamadas fundamentos da educação (história da educação, filosofia da educação, sociologia da educação, psicologia da educação e antropologia); e a prática docente interdisciplinar. E temos ainda a área de conhecimentos específicos, que é quando o curso se bifurca. Então temos os conhecimentos específicos de educação infantil, de 1ª a 4ª, de educação especial, de educação de jovens e adultos (isso tudo entra a partir do 5º período). Entrevistador: Dentro do projeto do ISERJ a senhora percebe divergências ideológicas por parte dos professores que atuam na instituição dentro da formação de professores? Entrevistada: Olha, nã há unanimidade. Já dizia o Nelson Rodrigues que toda unanimidade é burra. Aqui dentro do nosso espaço, embora a gente esteja muito... a gente tem assim um espírito de corpo. Como o francês diz, né, “spirit de corps”. Porque nós criamos isso. Nós viemos juntos construindo isso. Cada tijolinho, cada pedacinho desse curso tem um dedo de um ou de outro. Agora, evidentemente que somos seres com formações diversas, né?! Um veio da história, outro veio da matemática, outro veio da educação física, outro veio da pedagogia... Ideologicamente mesmo. Postura ideológica até mesmo no sentido de político-partidária, digamos, né, e nessa visão de formação de professores, entendeu, alguns acham que o professor tem que ter uma cultura geral sólida; outros acham que isso é uma coisa secundária, o que importa é o amor, a afetividade... Enfim, tem gente que embarca um pouco na linha do Paulo Freire, tem gente que vai mais numa linha do Anísio Teixeira, e tem gente que é mais tradicional, vai numa coisa... Mas eu acho que essas divergências, elas são administradas no coletivo, de uma forma geral. A gente se coloca, agente fala, a gente troca idéias (às vezes briga). A gente briga também, né?! Eu gosto de uma briga, você sabe. Às vezes briga, às vezes discute, entendeu? Mas agente procura, dentro desse coletivo, fazer com que esse espírito, que deu vida, que deu força ao curso não se perca. Então apaga as nossas diferenças ideológicas. Até na questão de encarar a formação de professores, por exemplo; eu não vejo como fazer um professor pesquisador. Eu acho que isso fica muito no papel. Na prática isso é complicado. Professor pesquisador... O que você entende por pesquisa? Se você entender que ele pesquisa cotidianamente a sua prática e sobre ela reflete e procura intervir mudando a sua prática a partir de uma reflexão mais apurada, e que isso é pesquisa, tudo bem, eu acho que isso é papel de todo o professor. Agora aquele professor pesquisador, mais dedicado, mais direcionado para uma pesquisa acadêmica é meio difícil de formar num curso. Porque ele vai estar muito mais ligado no ensino, naturalmente, do que.... Claro que tem um ou outro, que por interesse próprio, feeling, ele é chegado a uma pesquisa, como essa minha aluna. Ela botou o pé no curso, ouviu falar do meu projeto, quis se inserir, aprendeu a pesquisar na marra. Um ano atrás de mim, ela ia atrás de mim prá todos os cantos, prá arquivo, prá entrevista... Aprendeu na marra. Mas essa aí, de repente, tem feeling de pesquisador, não é? A gente não pode exigir que todo nosso aluno tenha essa motivação. O importante é que a gente entenda a pesquisa aqui no CNS como alguma coisa realmente que vem, digamos assim, de uma reflexão sobre a sua própria prática. Agora não pode é ficar só na empiria. É isso é que eu me bato muito. “Ah, eu acho... Porque eu observei na minha turma...” A pessoa já vai pesquisar sabendo o que quer encontrar. Ou seja, a hipótese, ela vai precedendo à pesquisa. Quando a hipótese... Muitas vezes ela tem que ser reformulada, reformatada, até muitas vezes desmantelada... Porque a pesquisa, gente, é busca! Isso é que é gostoso! Muitas vezes você está com aquela idéia pré concebida, e você, quando depara com o documento, diz: “não é nada disso”: e agora? Então, eu escondo esse documento? Digo que não vi? Digo que não existe, para que as minhas hipóteses não sofram nenhuma alteração? Ou eu reformulo tudo e começo do zero?” Preciso ser ético na pesquisa. Preciso ter coragem, né?! Então eu acho o seguinte: que a pesquisa, ela não pode viver só da empiria. Essa coisa de “ah, eu tô fazendo uma pesquisa na minha turma com minhas crianças... a gente tá jogando bola, a gente tá indo na excursão...” Vamos ler o referencial teórico, vamos ver quem está escrevendo sobre isso. Você quer trabalhar o lúdico, ótimo, maravilhoso! Mas quem está escrevendo sobre isso? Gente séria, que está pesquisando, que está escrevendo... Que referencial você está usando, que metodologia, entendeu? Não pode ser assim só no ôba-ôba, na observação. Se você não tiver o referencial teórico para balizar suas interpretações... você observa, mas você vai chegar a essas conclusões amparado em alguém, que já estudou antes de você, que já pesquisou... É à luz desse referencial que você vai poder ter condições, tá, refletir, prá mudar sua prática. É isso que agente está procurando implementar aqui. Sair um pouco daquela pesquisa, só empírica, só na base da ... entendeu? E fazer o nosso aluno começar a ler... ler artigos científicos, ler bons artigos publicados em revistas boas de educação: “Educação e Sociedade”, “Educação e Realidade” ... que trazem sempre aqueles temáticos interessantes... “Olha, tá vendo como é que se constrói um artigo científico? Olha, tem uma introdução. O que ele diz na introdução? A proposta, esse artigo se propõe a isso, o objeto, são os objetivos, é a relevância do trabalho...” Com isso ele já vai observando essa prática para depois, quando chegar a escrever a monografia ele já ter uma base, né. Então é isso aí que agente está procurando mostrar pro nosso aluno. Que a pesquisa não pode ser essa pesquisa firmada só na empriria, na observação, no “eu acho”, mas calcada no referencial teórico. E aí eu volto a Anísio (eu quero terminar com Anísio). Porque Anísio dizia: “ensinar é uma arte. Educar é uma arte. Mas essa arte, ela não consegue se implementar, né, se tornar prática, digamos assim, sem o bastão da ciência. Professor precisa de ciência e arte para ser um educador. Eu acho que é isso que agente quer do nosso professor. Eu, pelo menos, eu quero isso. .........................................................FIM ANEXO 11 ENTREVISTA COM O FORMULADOR DO PROJETO DE ISE/CNS DA SEE Entrevistador: Gostaria que o senhor falasse um pouco sobre, o surgimento da idéia de implantação dos Institutos Superiores de Educação na Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro e quais os primeiros movimentos realizados para a sua implantação (as experiências, os intercâmbios, e também sobre a questão da aprovação do projeto que deu origem ao Parecer 430/97 (por que esse projeto foi aparentemente descontinuado), quando o Estado começou a se mover com respeito aos ISE, qual idéia foi gestada e onde começou essa idéia... É mais ou menos onde eu gostaria que agente começasse a conversar. Entrevistado: Perfeito. Então, antes de mais nada eu gostaria de dizer da minha alegria em poder conversar com você sobre esse assunto e perceber que algo vai ficar na história para que os colegas, os professores, os profissionais, de alguma forma se apropriem dessa história e possam desenvolver melhor seus trabalhos. Para que eu possa ficar mais à vontade na sua pergunta, acho que seria interessante analisarmos o contexto político-institucional daquela época. Até porque isso vai influenciar na arena política e nas forças, que, de alguma forma, criaram oportunidades e dificuldades na elaboração desse projeto e dos outros. Nós estávamos no final do ano de 96, quando o governador à época, Marcelo Alencar, entregou à Assembléia Legislativa a tarefa de escolher os Secretários de Educação e Saúde, que à época enfrentavam dificuldades de gestão. As bancadas do PSDB e dos partidos aliados daquela época identificaram então dois nomes e passaram ao governador para que eles assumissem: um a Secretaria de Saúde e o outro a Secretaria de Educação. O nome escolhido pela bancada para ser o Secretário de Educação foi do Deputado Estadual Fernando Pinto, que tem uma trajetória oriunda ou formada em movimentos chamados de esquerda, e que chegou à educação com a experiência de quem conhece, de quem sabe lidar com conflitos, de quem sabe lidar com diferenças, de quem sabe lidar com é... desafios. E Fernando Pinto, então, teve a sabedoria de, conhecendo as suas potencialidades de bom negociador, de bom mediador de conflitos, convidar um conjunto de técnicos para as áreas específicas da educação. Eu estava entre esses técnicos convidados e é importante informar, não tinha nenhuma ligação prévia com Fernando Pinto. A minha indicação se deu pelo sucesso, pelo êxito que havíamos alcançado na direção científica do Centro de Ciências do Estado do Rio de Janeiro, uma autarquia da Secretaria de Ciência e Tecnologia. Então, por conta dessa... desse êxito que foi alcançado também pela equipe que estava presente no CECIERJ (não foi com certeza um movimento individual, mas coletivo, do grupo), eu aceitei a função de Secretário de Ensino. Era uma Subsecretaria – e por proposta nossa, à época, por conta da necessidade de reestruturação da área de ensino, que sempre foi secundarizada (e ainda o é nas áreas de educação), uma vez que a máquina pública, a atividade-meio da educação é sempre grande, é sempre pesada, é sempre difícil, por incrível que pareça, por mais paradoxal que possa parecer, a atividade-fim, que é o ensino, em si mesmo sempre foi relegado a segundo plano. Então, a manutenção da Rede, a contratação de pessoal, a formação de pessoal, o cumprimento dos índices financeiros obrigatórios pela constituição sempre ocuparam mais tempo, sempre foram mais poderosos do que aqueles que efetivamente se ocupam da atividade-fim da educação. E aí, com a nossa chegada, foi feita a proposta de se transformar a segunda Subsecretaria numa Subsecretaria Adjunta, para que nós pudéssemos ficar mais à vontade, mais focados na atividade de ensino. É nesse período, quando da entrada de Fernando Pinto, que há uma mudança estrutural na Secretaria de Educação, deixando de haver duas Subsecretarias, uma da área administrativa e outra da área de ensino e similar, para se transformar numa Subsecretaria Adjunta de Ensino, com foco estratégico de não ter outras preocupações a não ser de reconstruir e de dar visibilidade e poder de fazer à área de ensino. Essa foi a tarefa que eu recebi do Secretário de Educação da época.Desenhado o perfil político, vamos ver como fica o conjunto de políticas públicas emanadas pelo governo federal no ano de 97. Ao final de 96 nós vamos ter a promulgação da lei 9394, que promove um conjunto bastante grande de mudanças nas políticas públicas brasileiras, que é a LDB. Então, a tarefa, no ano de 97, era, com certeza, fazer as adequações necessárias às diretrizes da nova lei, não só estruturais, mas que atendessem ao espírito da lei. A segunda grande mudança vinha por conta do FUNDEF. O ano de 97 foi um ano, foi o chamado vacatio legis, um espaço em que o poder público deveria se organizar para que o FUNDEF, quer na construção do fundo que repassaria recursos para municípios e estado, quer o processo de valorização do professor, fosse estabelecido. Então foi um ano bastante interessante para um gestor do sistema educacional. Por conta dessas necessidades, eu fui designado para o CEE como um dos conselheiros, e, sendo Subsecretário de Ensino, permaneci sem nenhuma outra função diretiva, pelo mesmo processo tivesse tempo e dedicação para realizar as mudanças necessárias. Chegando na Secretaria de Educação, nós tínhamos o seguinte quadro: uma instituição com alta baixa estima (baixa alta estima), não é, então os professores estavam desmotivados por conta dos dois anos que geraram a crise e permitiram o ingresso de Fernando Pinto. Nós tínhamos um grande descrédito às novas mudanças e começamos então a trabalhar nessa visão de arena pública (a chamada arena política) quem seriam aqueles que efetivamente serviriam como parceiros, como aliados, para as mudanças necessárias a serem realizadas no tempo que nós possuíamos, e identificando as áreas que efetivamente se levantariam como forças contrárias às mudanças institucionais e de política pública que nós tínhamos. Uma coisa importante nesse período é a estratégia que nós utilizamos na condução da gestão pública daquele momento. Apesar de ser Subsecretário e ter tido oportunidade, nós levamos apenas uma pessoa de fora da SEE. Considerando o tempo que nós tínhamos para realizar as mudanças e a necessidade de conhecer a história, de não perder tempo reconstruindo grupos e reconstruindo histórias, todos os que formaram a equipe de transição da área do ensino eram oriundos da Rede Pública e oriundos da história da própria Secretaria. Então, nós fizemos um levantamento, ouvindo inclusive os pares, de forma a identificar as pessoas que construíram respeitabilidade entre os professores, entre os gestores. E essas pessoas, independentemente da sua formação, do seu tempo de casa, da sua vinculação partidária ou das suas ideologias, foram convidadas, foram cooptadas, porque alguns resistiram, tiveram que ser convencidos; e todos os indicados foram nomeados nos cargos de direção, desde a Superintendência de Ensino, até todas as responsáveis por áreas, por setores, ou por projetos na SEE. Então, com isso, nós eliminamos aquele período, aquele mato na ação decisória, que é comum de quando agente traz pessoas de fora, (tem que aprender a história); nós começamos efetivamente no dia seguinte da nossa chegada. Então esse era o cenário político. O que que nós tínhamos que fazer naquele ano e o que que nós começamos a fazer no dia seguinte da nossa chegada? Nós tínhamos que estabelecer as bases de implantação do FUNDEF. As estatísticas educacionais eram inexistentes. Os dados do CENSO eram inexistentes. Estávamos com uma série de dificuldades quanto as informações; e as poucas que porventura existiam, podiam ser questionadas ou tinham fontes conflitantes. Nós tínhamos que fazer a implantação do FUNDEF, a preparação do salário dos professores; tínhamos que mexer no Curso Normal; tínhamos que mexer no ensino médio; tínhamos que mexer na educação profissional; tínhamos que mexer na educação de jovens e adultos; tínhamos que mexer na educação especial, não é... O ensino médio passava a ser obrigação do Estado, prioridade do Estado, dando suporte, na área de suplência, para a educação fundamental. É... E havia demograficamente a indicação de uma onda demográfica que iria estourar tempos depois, com clientela reprimida ou represada (melhor dizendo), das escolas de ensino médio, como aconteceu. Então, nós tínhamos que preparar a Rede de Ensino Médio para isso. Na educação profissional, nós tínhamos a cisão dada pela LDB, de ensino médio e da educação profissional de forma bastante violenta, nos obrigando a reestruturar a parte de educação profissional. No Ensino Normal nós tínhamos a indicação de que só seria permitida a entrada de professores com nível superior a partir de 2007, o que faria da nossa parte (nos permitiria perceber) que a manutenção dos Cursos Normais com ensino médio passava a ser quase que um estelionato oficial. Nós sabíamos que não seria mais permitido ao aluno efetivamente é... se empregar. Da mesma forma, por conta disso, nós tínhamos que fazer a criação de espaços de capacitação, de requalificação dos professores que estavam na Rede. Depois nós tínhamos educação de jovens e adultos, uma vez que no ensino fundamental deixou de ser obrigatória dos 7 aos 14 anos, para ser obrigatória a todo aquele de, de alguma forma, dele desejasse participar. Nós tínhamos a necessidade de mudança da educação especial, uma vez que passamos a visão de inclusão, que dão mais dos depósitos de crianças portadoras de necessidades especiais. Essa é uma mudança de filosofia, uma mudança institucional e que com certeza leva uma década, né, para que você faça isso. Junto com isso nós tínhamos a necessidade de conhecer quantos professores existiam; tínhamos quem rever as grades, que eram inúmeras, tínhamos que identificar as falhas de uma implantação dos professores, as necessidades, e tínhamos que compatibilizar isso com o orçamento. Isso em apenas um ano, porque o anos de 98 seria ano de eleição e as decisões políticas de maior monta efetivamente ficam mais difíceis de ser encaminhadas, levantadas, e realizadas. Então esse era o cenário institucional. E somado a isso nós precisávamos criar uma política de capacitação de professores abrindo espaço para que os nossos professores pudessem fazer, de forma ordenada, de forma institucional, as especializações, os mestrados e os doutorados. Precisamos regrar a participação dos estagiários na Rede Pública, coisa que, efetivamente, não acontecia na época. Então, na verdade, as escolas públicas estaduais “eram a casa de ninguém”, eram a “casa da mãe Joana”, aonde as instituições universitárias iam e vinham, colocavam o que queriam e faziam o que bem desejavam. E nós, que já estávamos ouvindo que havia dificuldades, havia problemas, a escola era complicada, ficamos imaginando o que seria a cada semana aquela Rede, que diziam ser complicada; diziam ser problemática, diziam ser difícil de aprendizado, que recebia estagiários que ninguém sabia de onde vinham e ninguém sabia para que vinham e que não davam satisfação a ninguém. E era uma decisão complicada porque mexia com as forças da educação superior. Então esses eram problemas complicados, não é... E aí, então, nós vamos entrar em mais um tema que é educaç, é... formação de professores, mas dentro desse contexto que agente teve oportunidade de apresentar. Como nós chegamos e pinçamos a situação da formação de professores, o que se tinha na época era a proposta de mudança para quatro anos. Era de três anos e ia passar para quatro. E é interessante historicamente, que toda vez que ninguém sabe o que fazer, mas tem que fazer alguma coisa, passa de três prá quatro; e se tem quatro, passa de quatro prá três. Aliás estamos vivendo isso agora na discussão ministerial sobre o ensino médio. Estão falando que tem que passar para quatro anos. Mal conseguem dar qualidade na que tem três; ainda não conseguiram identificar os problemas que existem nos três, mas como precisa mudar, “como preciso dar uma satisfação de mudança”, muda para quatro. E no próximo governo, como vai precisar mudar, vai passar prá três. Isso é histórico. Então essa era a proposta que se tinha. E... conhecendo o que estava na LDB, tendo acompanhado as discussões da LDB e vendo, já no futuro, as conseqüências da municipalização do ensino de 1ª a 4ª série e a criação das Redes municipais e estaduais, né, o conflito entre elas nos municípios fluminenses, nós começamos então a perceber que o modelo de formação de professores, ele precisava atender a uma necessidade estratégica, para chegar a atender o interesse público. Já não bastava atender a uma necessidade curricular. Era importante que a reforma atendesse ao interesse público visto a médio e longo prazo. O que está no artigo que fala da proibição da contratação de professores de... que não possuam formação superior, é... indicava que a tendência, (como é uma tendência maior) era que a formação do professor passasse a ser de ensino superior. No outro artigo da LDB, se não me engano o 64, quando ele fala da formação de professores, ele vai dizer que você tem uma formação na universidade e no Instituto Superior de Educação, deixando claro ali, uma posição de conflito, e que, ao nosso ver, desde aquela época, criaria confronto entre as duas instituições. E a vantagem da universidade é o seu poder, a sua história, a sua capacidade de articulação. Quando a gente percebeu isso, que esse confronto era eminente e que as forças eram desiguais, eu tive a certeza absoluta que os Institutos Superiores de Educação, como estavam na lei não sairiam tão cedo. Mas que a tendência, que é uma tendência mundial, é de que o Ensino Normal passasse a ser posterior ao médio. Então, na verdade nós começamos a identificar, uma...como alternativa, tirar... tirar o Ensino Normal do nível médio, isto é, feito no nível médio, feito junto com toda a formação do ensino médio, para torná-lo é... a princípio, pós –médio. Uma outra coisa que fortalecia muito isso era o fato de nas conversas que nós tivemos com os alunos, com muitos deles, e os relatos dos professores, do Curso Normal, passar a ser interpretado como um curso mais fácil, que afinal de contas tinha pouca química ou nenhuma química; tinha pouca física ou nenhuma física; tinha pouca biologia ou nenhuma biologia. Então, ao invés de nós termos as melhores cabeças sendo formadas da melhor forma, no processo e.... de formação de professores, nós tínhamos aqueles alunos (falando sempre via de regra, ou em geral) aqueles alunos que optavam pelo Curso Normal porque era um curso mais fácil. E foi um curso, junto com o curso de Contabilidade, que se proliferou desordenadamente pelos municípios do Estado do Rio de Janeiro e nos municípios brasileiros, porque ele não exigia nenhum tipo de investimento em equipamentos. Então, à época da 5.692 e posteriormente à ela, toda vez que um político local queria fazer graça ou animar os seus eleitores, ele pedia ao governo um curso profissionalizante, que era, quando não era Curso Normal, era o de Contabilidade. O Curso Normal para as meninas e o de Contabilidade para os meninos. E a partir daí nós passamos a ter uma proliferação do Curso Normal, não respeitando a tradição ótima de formação de professores que tem esse Curso, não é... O aumento desordenado do curso levou a uma desqualificação da formação dos alunos. Então, nós tínhamos Curso Normal em todos os lugares, com essa história que a gente aponta e o aluno escolhendo o curso, não por vocação, mas porque muitas vezes era o curso que era mais fácil, ou muitas vezes era o Curso que estava disponível, no espaço aonde ele estava, ou no município onde ele morava, não é... Então, nós temos, na verdade, municípios onde uma geração inteira, todas as meninas eram normalistas e todos os meninos eram contabilistas. E isso não pode acontecer. A educação profissional é muito mais do que uma escolha por exclusão. Ela precisa ser uma escolha madura. Nós tínhamos caso, por exemplo, de alguns municípios do Rio de Janeiro, onde eram encontrados, em média, 15 cursos de formação de professores mantidos pelo poder estadual. Era o caso, à época, do município, por exemplo, de São Gonçalo. Era o caso do município de Nova Iguaçu, que além de contarem com um grande... um grande Instituto, que era o caso do “Cléria Nancy”, em São Gonçalo e do “Governador Roberto Silveira”, em Nova Iguyaçu, eles possuíam um conjunto bastante grande de Escolas Normais, que cresceram e se proliferaram fora de uma visão estratégica de atendimento do interesse público. Então esse era o quadro que, então, nós estávamos enfrentando. E resolvemos começar uma discussão e montar um projeto, para posteriormente apresentá-lo aos professores envolvidos nos cursos. E fizemos isso. E propusemos que os Cursos Normais deixassem de ser cursos é... de nível médio, para se tornarem cursos pós-secundários. E qual era a função estratégica disso? Primeiro, nós abriríamos espaço na Rede Pública para alunos de ensino médio. Então, aqueles que iam para o Ensino Normal ou para o Ensino de Contabilidade porque só existia aquilo, teriam a oportunidade, o direito de fazer o ensino médio. Aqueles alunos que porventura desejassem seguir a carreira de normalista, de professor de 1ª a 4ª séries, fariam a opção direcionada pela vocação e pelo interesse. Com isso nós daríamos ênfase a... ao dever constitucional do Estado, de promover o ensino médio (lembrando que a educação profissional é modalidade na LDB). Então, na verdade, a prioridade do Estado está em atender ao ensino médio e atender supletivamente ao ensino fundamental. A educação profissional tem que ser secundarizada quando os direitos do cidadão são colocados em análise. E o que nós vimos nesse período foi uma supervalorização da educação profissional, em detrimento à obrigação constitucional de preparar a Rede Pública pro atendimento daquilo que era dever, que era o ensino médio. Então, a idéia era fazer um curso pós-secundário, é... abrindo espaço das escolas públicas para o atendimento do ensino médio, e diminuir, de forma bastante drástica, o número de cursos de formação de professores, a partir do momento em que nós constatávamos que em algumas escolas havia um número igual de professores e de alunos. Então você tinha um curso que possuía hipoteticamente (para não ser traído pela memória), vinte professores do estado e você tinha, ao longo dos 3 anos, vinte alunos. Então, isso num município aonde se podia contabilizar mais 13... 14... 15... outros cursos de formação de professores, cujo quadro não era muito diferente disso. Lógico que existiam escolas com alta demanda, não é... alta procura de alunos. Então a idéia era efetivamente essa. Mas nós não podíamos fazer isso repetindo os mesmos currículos de antes, porque a lógica era diferente. E nós começamos a... a discutir, a propor uma grade curricular que permitisse ao professor uma formação verdadeiramente integral, completa, não é... E... e fizemos essa proposta de grade, aonde nós, inclusive fazemos algumas excursões ao campo da liberdade de propor, quando a gente diz, por exemplo, que não é Filosofia da Educação, mas Filosofia para Educadores, dando espaço para que professores de Filosofia possam... (que formados em Filosofia, que conhecem a lógica, a estrutura interna da disciplina) pudessem dizer aos educadores o que de bom a Filosofia tem para eles. Fizemos a mesma coisa, de uma Sociologia para Educadores, e não uma Sociologia dada por Pedagogos, ou por pessoas ligadas à área da educação. E assim nós fomos trabalhando. A idéia do projeto era de que ele fosse pós-médio; que houvesse pelo menos um deles em cada município e que, além de atender à formação dos alunos vocacionados, agora com certeza em número menor, ele servisse de núcleo de capacitação de professores da própria Rede e das Redes de ensino. Então um trabalho de requalificação, de recapacitação dos professores a médio prazo. Entrevistador: Nesse momento que o senhor está colocando, o projeto do senhor já sofria interferência da criação dos institutos (já havia uma ligação histórica com essa corrente de pensamento, vamos dizer assim)? Entrevistado: A idéia era fazer a gênese dos Institutos Superiores de Educação. Como não hávia na lei nada que dissesse que era um curso de ensino superior declaradamente (Instituto Superior de Educação, mas não estava claro nem declarado que era em nível superior) nós nos aventuramos a criar o modelo do pós médio... Entrevistador: E com isso o senhor diz que o Instituto era superior, mas não que o curso fosse superior... Entrevistado: Naquela época, nada diria isso ainda. Lógico que nós percebíamos e a nossa leitura de futuro era de que ele seria uma instituição de ensino superior. Mas, naquele momento, nós precisávamos de uma alternativa estratégica, que fosse, na verdade, o grande mote para fazer a mudança de sistema, atraindo os professores com um projeto de futuro. Entrevistador: Permitindo-me aprofundar um pouco mais a questão: antes mesmo de o senhor estar na Secretaria de Educação, onde o senhor começou a ter essa visão de Institutos Superiores de Educação até a implantação da idéia na íntegra? Entrevistado: A idéia surge primeiro da experiência. A discussão, no próprio Centro de Ciências, da inexistência de política. Então na verdade, o que você vem percebendo até hoje (e aí é uma crítica, um parêntesis, uma crítica institucional) é que você tem, na direção da educação, pessoas que são ótimos docentes e de um dia para o outro amanhecem como gestores de educação. E que continuam tratando uma Rede de 2.000 escolas (75.000 professores) como quem trata a sua escola; como quem trata a sua turma. Então o que se percebe historicamente no Estado do Rio de Janeiro é uma ausência quase absoluta de políticas públicas. O que, na verdade, esses cargos, essas funções, quer de níveis mais projetados, quer de níveis mais operacionais, eles acabam sendo ocupados por pessoas que se projetaram, na vida acadêmica, como belos docentes, como profissionais competentíssimos, na competência docente e não na competência administrativa. Então, o que nós temos, na verdade, são pessoas que se projetam na vida acadêmica como produtores de conhecimento e nisso eles são muito bons. Ou então, pessoas que se projetam na comunidade acadêmica como belíssimos docentes e nisso eles são competentes. E de um dia para o outro eles passam a ter a função de gerir sistemas e a produzir políticas. Então, o que acontece: por mais que tenham boa vontade, eles têm dificuldade de fazer política. O que se entende por política pública? São intencionalidades de ação de viver. Intencionalidades no momento em que elas são formuladas, que elas são discutidas no campo da ciência política. Então, no campo da ciência política tudo se pode. Tudo é possível, nada é proibido. “Vamos discutir, vamos falar, vamos jogar na mídia”. Então esse é o campo da ciência política. E passa para o campo da ciência da administração e da gestão, quando a idéia toma forma por meio das leis, por meio dos decretos, por meio das portarias , por meio das deliberações de Conselho. Entrevistador: E aí uma outra pergunta, aprofundando a mesma questão: O senhor bem coloca as políticas de governo, a questão dos Institutos e o marco de entrada deles no país como quase que o marco de entrada deles no Estado do Rio. Essas políticas, seriam políticas de Estado ou seriam políticas de governo? Entrevistador: A partir do momento em que você tem uma lei que levou 13 anos sendo discutida e negociada e que é uma lei de consenso, então não adianta ficar perdendo tempo (como fazem muitos colegas nossos na academia) escrevendo e imaginando como seria se o outro projeto, ou se um dos projetos de LDB fosse vencedor da demanda legislativa. Não foram vencedores. Então, o que a gente têm hoje é esta lei, não é? É a lei que vigora. É a lei ideal? Não. É sempre a lei possível. É a lei que demonstra a média do pensamento não só dos legisladores, mas dos setores capazes de se articular e fazer pressão para que as idéias possam sair desse campo da ciência política, em que tudo pode, para o campo da administração, que se manifesta por meio das leis, dos decretos, e tal. Então, esse marco é importante porque não foi uma lei saída de um dia para o outro. Foi uma lei discutida, uma lei gestada com muita dificuldade, com muita medição de força, com muito conflito, com muito confronto. Entrevistador: E que cargo o senhor ocupava (no Estado) na discussão da lei? Entrevistado: Nesse momento eu estava na direção do Centro de Ciências do Estado do Rio de Janeiro, que era um órgão formador de professores, uma autarquia da Ciência e tecnologia, mas já havia convivido desde antes com os estudos dos ginásios públicos e a proposta de Darcy Ribeiro de reformular a educação brasileira, na Secretaria de Educação. Entrevistador: Tecnologia? O senhor estava, então, na Secretaria de Estado de Ciência e Entrevistado: Eu, antes em 95 e 96, enquanto a lei tramitava nós estávamos no Centro de Ciências, que é uma autarquia da Ciência e Tecnologia; que era irmã institucional da FAPERJ, irmã institucional da FAETEC, irmã institucional de fomento da Ciência e Tecnologia. Entrevistador: Mas com o corpo ligado à Secretaria de Educação? Entrevistado: Não. Ciência e Tecnologia. Entrevistador: O senhor com o corpo ligado à Ciência e Tecnologia, também? Entrevistado: Tudo ligado à Ciência e Tecnologia. Entrevistador: O seu pertencimento... Entrevistado: O meu pertencimento a uma autarquia... Entrevistador: Então, ao contrário de outros casos, o senhor foi passado da SECT para a SEE? Entrevistado: Exatamente. Por conta dos resultados que o grupo que foi nomeado para o Centro de Ciências obteve. Então, foi de lá, por conta dos projetos, da capacitação de professores, da projeção nacional e internacional do Centro de Ciências em dois anos,que surgiu o convite para que fizéssemos as mesmas coisas, as mesmas mudanças no campo da educação. Entrevistador: E esse pensamento de formar professores em nível superior, independentemente do pós-médio ou do ISE, antes mesmo dele existir (antes da lei), no Estado, como estava sendo pensado isso até chegar o seu momento? Entrevistador: Não estava. Eu não tenho conhecimento de nenhuma discussão... Entrevistador: Estou fazendo essa pergunta porque eu ouvi falar de um projeto chamado “Projeto Magister”, em que alguns professores foram enviados para a França para buscar subsídios... Entrevistado: No tempo inclusive da própria Secretária Maria Yedda, que já era alguém preocupada com isso, era alguém com olho nisso tudo, com vasta experiência, alguém que efetivamente fazia diferença na história da educação do Rio de Janeiro, mas que não teve espaço e nem suporte para fazer as mudanças possíveis. Então, quando nós fomos para a educação, fomos com alguma facilidade de propor, tínhamos algum poder de realização. E aí surge, então, essa idéia.Voltando ao raciocínio anterior, nós precisávamos, então, vocacionar as escolas e preparar alguma coisa que no futuro seria um curso que formasse professores depois do ensino médio e que pudesse atender o interesse da coletividade. Entrevistador: Vocacionar as escolas? Entrevistado: Vocacionar as escolas. Entrevistador: Em que sentido? Entrevistado: No sentido de trazer para o curso de formação de professores aquelas pessoas que efetivamente quisessem ser professores, e não que estavam ocupando as cadeiras e as vagas porque não havia, para eles, outras opções, que é o que acontecia nos Cursos Normais do interior. Então você tinha uma quantidade absurda de professores formados. Por que? Porque só existia ou o Curso de Contabilidade ou o Curso Normal na sua cidade, no seu município. Então quando nós propusemos o modelo institucional, nós olhamos para o futuro e olhamos para o interesse público. O futuro indicava (e a data de hoje prova que nós estávamos absolutamente correto) que o curso de formação de professores passaria para o ensino superior pós-médio, de algo... algo depois do ensino médio. Entrevistador: O senhor, então, se antecede a isso nos seus próprios estudos e até à própria lei? Entrevistado: Exatamente. Entrevistador: Uma pergunta de fundo: por que não ao invés de pós médio, o superior pleno? Entrevistado: Essa é uma pergunta inteligente e que tem a ver com o jogo de poder. Primeiro porque... Entrevistador: Permita-me uma breve interrupção: a gente passa, então, nessa pergunta, a um segundo momento da entrevista. Entrevistado: Veja só. O que nós temos hoje é... na história da educação brasileira é que o nível superior forma professores para os níveis que o antecedem. Então você tem, por exemplo, que o professor do ensino médio é formado pela universidade. O professor do ensino fundamental é formado na universidade. O professor de 1ª a 4ª séries é formado no ensino médio e o professor (aquele que vai atuar na educação infantil) é formado em lugar nenhum, até bem pouco tempo. Então, essa era a realidade que nós tínhamos. E o que que você tem nisso? A Escola Normal de nível médio acha que sabe o que é importante para quem vai trabalhar com 1ª a 4ª séries. E nenhum (ou grande parte dos professores) jamais habitou permanentemente uma sala de aula de 1ª a 4ª séries. A esmagadora maioria dos professores jamais efetivamente labutou numa classe de ensino de educação infantil, assim como a universidade acha que sabe o que é importante e vital para o ensino médio. E temos um número bastante grande de professores que pode ter passado pelo ensino médio, mas não conviveu o tempo bastante para aprender a sua lógica, os seus paradigmas, as suas relações de poder, suas dificuldades institucionais e inclusive as suas relações com os alunos, com a sua clientela. Então se eu tivesse àquela época proposto (me antecipasse demais) e proposto a criação de Instituto Superior de Educação com caráter de instituição de ensino superior ele sairia do domínio da Educação (da Secretaria de Educação ) e passaria para o domínio da Secretaria de Ciência e Tecnologia, aonde já estavam a UERJ e a UENF. Então, o que acontecia, naquele momento, é que eu precisava de um instrumento capaz de resgatar a auto-estima da Rede, no caso, em especial, da Educação... E nós fazíamos as mesmas coisas com a educação profissional; tínhamos um mesmo movimento. Precisava de um instrumento que resgatasse o professor; que desse a ele uma taxa de gratificação de futuro, (quer dizer, fazendo isso o futuro será melhor) e colocando na mão dele esse tipo de coisa, porque as decisões estavam no universo da Educação e não da Ciência e Tecnologia. Então era um instrumento de realização de política pública que atraía o parceiro: “Eu não posso fazer reformas de essência na educação sem que o professor seja meu parceiro”. Se ele não for olhado a reforma sai do gabinete e jamais chegará o resultado. Então o modelo que nós propúnhamos naquela época era alguma coisa que... posterior ao ensino médio. Mas por que não foi classificado como ensino superior? Porque a Educação (a Secretaria de Educação) perderia domínio sobre ele. Entrevistador: Porque teoricamente a Ciência e Tecnologia, ela detém (vamos dizer assim) o domínio, o monopólio, no Estado, da formação superior nos ISE? Entrevistado: Ela é mandatária desse tipo de atividade. E mais: não existia nenhum tipo de discussão no Conselho Nacional. Mesmo que eu quisesse e achasse que fosse bom (e eu não achava) que seria interessante, no momento de transição que nós vivíamos, é... não havia nenhum tipo de discussão, a nível nacional que me permitisse nortear a criação do Instituto Superior de Educação como instituição superior. Entrevistador: O senhor estaria infundado? Entrevistado: Exatamente. Eu perderia um tempo absurdo, um tempo que eu não tinha, buscando fundamentos; e tendo mais um adversário pela minha frente, que era a universidade, com o seu poder e a sua história. Entrevistador: Teoricamente o senhor teria que primeiro lutar (“brigar”) pelas questões políticas; e o próprio pensamento da modificação do ensino, das próprias escolas ficaria fadado a um segundo plano? Entrevistado: Exatamente. Então, o que nós fizemos? Foi propor alguma coisa que estivesse dentro do nosso universo de decisão. E cujo corpo docente fosse aquele que estava na nossa volta, participando das discussões, participando do amadurecimento da idéia. E com esse modelo, nós reunimos os professores em algumas regiões do Estado (Friburgo, por exemplo, nós reunimos todos os professores, delegados, reunimos centenas de professores dos cursos e fomos discutir com eles o porquê nós propúnhamos fechar a esmagadora maioria dos Cursos Normais do Estado, dizendo a eles: “vamos transformar os pequenos cursos, os numerosos cursos em uma quantidade menor de Institutos Superiores de Educação Pós-Médios”, agregando nesses Institutos os professores que estavam em torno das outras Escolas Normais, vocacionando essas escolas; reunindo a bibliografia (que eram poucas e eram ultrapassadas muitas vezes e insuficientes em outras); mas no momento em que você conseguia pegar esses fragmentos de bibliografia e colocava numa só biblioteca, você passava a ter uma biblioteca um pouco melhor. Reuniria os poucos professores que estavam esparsos nos cursos de formação de professores em um ou dois Institutos Superiores na região, e vamos ter um corpo docente bem preparado, bem qualificado. Dando ênfase, inclusive aos professores com especialização, com mestrado e doutorado, que já proliferavam na Rede. E aí a idéia é que você tendo dois núcleos formadores no primeiro ano, com corpo docente qualificado, extraídos da própria Rede. E o projeto propunha o Instituto Superior: o Instituto de Educação do Rio de Janeiro e o Júlia Kubitscheck. O do Rio de Janeiro era o espaço aonde nós dispúnhamos de maiores alternativas; estávamos mais próximos para ajudar com o amparo do curso de formação de professores da UERJ. E no ano seguinte, multiplicaríamos para mais cinco, já com a previsão de trazer o corpo docente desses outros cinco para conviverem, para trabalharem juntos, para formularem em conjunto os programas, as mudanças institucionais; e no terceiro ano, então, nós iríamos abrir um grande leque para atender, em quatro ou cinco anos a esmagadora maioria dos municípios do Rio de Janeiro. Entrevistador: Como senhor bem coloca, o seu projeto, nesse momento, estava tomando corpo; estava caminhando para o que seria o Parecer 430/97. Como podemos ver, pela sua fala, ele antecedeu ao projeto 258/98, que foi o projeto “Nilda Teves”, vamos colocar assim. A FAETEC, por sua vez, também estava sendo criada (praticamente) nesse momento. A professora Nilda Teves foi a primeira presidente da FAETEC. E já nesse momento o seu projeto submetido e aprovado pelo CEE, para onde foi? Entrevistado: nesse momento nós tínhamos as discussões com as bases. Reunimos os professores. Então nós fomos a Angra, nós fomos a Friburgo, nós fomos a Niterói, trouxemos professores para o Rio, falamos com todos e fomos absolutamente transparentes. Desenhamos o cenário futuro da educação e dissemos qual seria a nossa proposta e quais seriam as etapas. Mesmo eles percebendo que seria uma mudança bastante radical no cotidiano da vida profissional de muitos deles, eles fecharam conosco a proposta. Entrevistador: E aí aonde é que entra a FAETEC nisso? Entrevistado: Pois é. Então nós tínhamos o primeiro momento; o primeiro ano, dois Institutos treinando corpos docentes de outros cinco. Entrevistador: E isso chegou a ser implementado? Entrevistado: Desses cinco, outros 10, se não me engano, até nós alcançarmos um Instituto... O que hoje nós tínhamos (nós tínhamos naquela época) os Municípios que possuíam Institutos de Educação, em três anos teriam Instituto Superior de Educação. Já existia uma malha bastante grande dos chamados Institutos de Educação. Tinha no Rio de Janeiro, tinha em Niterói, tinha em Friburgo, tinha em Angra dos Reis, tinha em Três Rios, tinha em Resende, tinha em Campos, tinha em todos os lugares. Em três anos nós transformaríamos todos os Institutos de Educação já existentes, nesse modelo novo, discutido com os professores e aprovado pelos professores, no curso pós-secundário, que seria a gênese do futuro ensino superior na atualidade. Então, quando as bases do Instituto Superior de Educação, com ensino superior, que ainda não estão claras nem estabelecidas nem amadurecidas (não estão), quando elas se estabelecessem, bastaria pegar os ISE distribuídos para atender ao interesse público de todo o Estado do Rio de Janeiro e transformá-los em Institutos Superiores, com os corpos docentes já preparados. Porque havia a identificação de professores com mestrado ou com doutorado, existia uma política de capacitação de professores é... que indicava a saída, para a formação em serviço, dos professores para fazerem mestrados e para fazerem doutorados, como eu falei no início, tudo isso conjugado. Então, em três ou quatro anos nós teríamos praticamente todo o Estado coberto (lógico que não considero os municípios recém criados, os municípios muito pequenos na febre é... injustificável de emancipações municipais, tá...). Então nós tínhamos um mapa que era estratégico e tinha visão de futuro. Então, com este desenho, nós fechamos o projeto. Projeto institucional, de política pública e longo prazo, porque eu não entendo política pública que é pontual e é local. E aí vem a sua pergunta: “onde é que entra a FAETEC?” A FAETEC surgiu, creio eu, não é..., na tentativa de se utilizar do modelo da Secretaria de Estado de Educação de São Paulo, aonde está a Fundação Paula Souza, que reúne todas as escolas de educação profissional, como profissionalizantes ou técnicas, mantidas pelo governo de São Paulo. E aí, uma discussão bastante interessante, que infelizmente não é a nossa discussão no momento, que ela pega; ela leva para si o que agente pode chamar na pauta de termo melhor, de filé mignon. Porque na verdade nós passamos durante esse longo tempo (eu com a Rede de Educação Profissional, eu, na Educação), tendo que responder por um conjunto absurdo, grande, de cursos da área primária da economia; os cursos agrícolas, da área secundária, que são as áreas de transformação e das áreas terciárias. E aí começa que o Henrique Lage, de Niterói, passa para a FAETEC. O João Barcelos Martins de Campos, outra grande escola, passa para a FAETEC. E eles foram, então, levando as escolas de maior porte... E aí eu resgato aquela discussão de qual é o dever institucional do Estado (o primeiro dever) que é o ensino médio, sem menosprezar a importância da educação e trabalho. Mas nós ficamos, então, no período em que você tinha tanto educação profissional do lado de lá, na ciência e tecnologia, como tinha educação profissional do lado de cá. Do lado de lá estavam as facilidade, porque a FAETEC era recém criada e não herdava problemas históricos; não herdava é... problemas orçamentários. Tinha uma outra lógica na sua gestão, enquanto nós continuávamos é com as dificuldades de gerir uma Rede com um número bastante grande de cursos com modelos de escola completamente diferentes, e com combinações de cursos e escolas completamente diferentes. Copiando um modelo que o Darcy Ribeiro usou, ao meu ver estrategicamente equivocado, de criar uma Rede para os CIEP e uma Rede Oficial, não é? Então nós tínhamos o primo pobre e o primo rico. Então, é... essa era a realidade e aí entra a tentativa, a primeira tentativa da FAETEC, de levar para si, que é a sua próxima pergunta, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro. Porque dizer, um dos fundamentos da FAETEC, era de que a Educação não tinha projeto. E efetivamente se processaram reuniões é... em processo decisório de alto nível, é... e onde a Educação mostrava que tinha projeto; havia projeto; inclusive projeto ...(esse projeto que nós estamos discutindo) ele foi discutido com o MEC, ele foi discutido no Conselho de Secretários de Estado de Educação, no CONSED, não é..., do qual eu fazia parte e era o representante do Estado do Rio de Janeiro no Conselho de Secretários; é... e discutindo com a comunidade acadêmica de forma a amadurecer o modelo para que ele efetivamente pudesse dar certo. E nós passamos, então, um bom tempo, Educação e Ciência e Tecnologia, num embate, na tentativa de fazer valer a força institucional e manter o Instituto de Educação. A Educação foi derrotada. Não que não houvesse projeto, mas foi uma decisão política de fazer com que o Instituto de Educação do Rio de Janeiro fosse transferido para a Ciência e Tecnologia, para a FAETEC, melhor dizendo. Então, a Instituição, o símbolo da educação do Estado do Rio de Janeiro passou a fazer parte da FAETEC. Então, na verdade, eles não levaram apenas o prédio: eles levaram o símbolo. O ganho não foi o ganho de um prédio centenário, com milhares de alunos e com professores. É a grande marca de qualidade da educação da cidade do Rio de Janeiro. Foi antiga Guanabara e que era um dos pilares da educação; e sem que, para isso, houvesse um projeto já discutido. Tanto é verdade que logo depois que a educação perdeu o domínio sobre o símbolo do Instituto de Educação do Estado do Rio de Janeiro, o projeto foi reformatado e foi aplicado a outros. Porque nós não tínhamos um projeto pontual; não era um projeto casuístico; não era um projeto de momento. Não era a gestão de um problema; era a política pública de uma área. Então facilmente tiramos o nome do Instituto de Educação e reformatamos isso envolvendo outros Institutos de Educação para que a idéia de política pública pudesse ser formada. Entrevistador: Importante isso que o senhor está falando. Quer dizer então, que quando o senhor faz o projeto que seria transformado no Parecer, a idéia, ela é anterior ao projeto da FAETEC ( se é que a FAETEC tinha projeto)? Entrevistado: Sim. Entrevistador: Mas o momento em que o IERJ se transforma... que ele vem para a FAETEC, esse momento o faz um ajuste? Porque o projeto seria para o IERJ, não é? O senhor, então, altera-o, colocando nele mais dois outros institutos, porque o IERJ tinha sido levado para a FAETEC, e, portanto, não se tinha mais como aplicar o projeto nele, não? Entrevistado: O primeiro projeto, ele tinha o Júlia Kubitscheck e o IERJ. O Júlia Kubitscheck ... O IERJ como modelo de Instituto grande e o Júlia Kubitscheck como modelo de Instituto pequeno. Entrtevistador: Aí o projeto teve que ser reconsiderado... O Júlia Kubitscheck e ao Sara Kubitscheck. O Sara Kubitscheck era o maior Instituto depois do IERJ. E depois o senhor também coloca o IEPIC. Entrevistado: Sim. O segundo momento seriam os Institutos já de interiorização. Entrevistado: A idéia era o Instituto de Educação, que era o símbolo e o agente, reunia na força da tradição, professores capazes de validar o projeto, e de replicar isso nos outros Institutos do ano seguinte. Então quando você coloca cinco outros Institutos a serem implantados no ano posterior, eu pressuponho que, para serem instalados no ano anterior, esses professores (o corpo docente e a direção) iriam participar dos projetos com ... do IERJ e do segundo Instituto, o Júlia Kubitscheck. Quando na verdade, o Instituto, retirado da Educação e levado para a FAETEC, nós então esse. O Instituto de Educação do Rio de Janeiro por ser outra grande instituição de ensino, porque nós queríamos saber como que era gerir o projeto de mudança num Instituto grande e num Instituto de menor tamanho. Entrevistador: Agora: por que o IERJ passa para a FAETEC? Entrevistado: É uma boa pergunta que eu espero que alguém um dia me responda. Porque nós tínhamos projeto! Entrevistador: A FAETEC tinha um projeto de formação de professores? Por que a FAETEC se propõe à formação de tecnólogos. Teoricamente seria isso: formação tecnológica e não formação de professores? Ela tinha um projeto de formação de professores? Porque ela logo depois lança o Parecer 258/98 e este entra como o projeto que vigora. Como é que se explica isso? Entrevistado: Não sei. Eu não me lembro do parecer 258. Entrevistador: O Parecer 258/98 credencoua o ISERJ e autorizou o funcionamento do CNS do próprio ISERJ. Ele entra no CEE já funcionando. E aí a gente não vê mais o 430/97 aparecendo na história, e sim o 258/98. Entrevistado: E aí você vê as dificuldades que você tem até hoje no desenrolar porque não foi um processo amadurecido. Não foi um processo em que os professores eram parceiros, não é? Então, à época em que a Educação deixou de gerir o Instituto de Educação não foi apresentado projeto. Entrevistador: Os primeiros indícios de formação para as sérios iniciais do ensino fundamental em nível superior, professor Álvaro, apontam ao professor Anísio Teixeira. O professor Darcy Ribeiro compartilhou dessas idéias embora as suas concepções, em algum momento, parecem ser um pouco diferentes, pelo projeto que se transformou na lei 9394/96. O professor Darcy teve alguma influência na criação dos ISE aqui no Estado do Rio, ainda em seus primórdios? Entrevistado: Eu penso (e aí é muito da experiência) que o Darcy efetivamente conduziu a LDB para uma lei de consenso. Porque você tinha o projeto que estava tramitando... Entrevistador: Consenso entre as bases? Entrevistado: É. A LDB que nós temos hoje é, na verdade, resultado do consenso. Aquilo que a a gente não pode falar antes. Agora, o que a gente pode trazer para a discussão é que o modelo inicial que Darcy Ribeiro propunha era diferente do modelo que a LDB promulgou (foi promulgado na LDB). Então nós lembramos, por exemplo, que o Darcy falava de uma escola que deveria ter aproximadamente 10 séries, envolvendo o antigo 1º grau com o antigo 2º grau. E os professores diziam assim “Ah, mas nós vamos perder, porque eram onze e vão passar para 10 anos”. Eu disse: “não, as lógicas são diferentes”. E ele dizia que depois disso você teria alternativas. Você teria o pré universitário, para aqueles que efetivamente desejassem caminhar para a universidade (seria um ensino propedêutico). Você teria mais alguns anos (dois anos ou três anos, de acordo com a carreira profissional) o espaço para a educação técnica, educação profissional, e um terceiro de professores; o terceiro bloco. Então, na verdade, eu tenho que dizer que a inspiração de fazer um pós-médio, um pós secundário é... pode ter surgido dessas discussões iniciais do Darcy que foram testadas no Estado Rio de Janeiro com ginásios públicos. Entrevistador: Essa idéia dos ISE virem da França, ele busca isso no modelo dele? Entrevistado: Me parece que sim. Me parece que é o modelo da estrutura francesa, que no momento da aplicação da LDB, né; a LDB formata diferente a divisão por níveis e por modalidades e começa a importar o modelo francês. Então, me parece que o modelo inicial tinha a sua estrutura no modelo francês. O modelo que vingou na LDB (também me parece, porque não é minha área, a área da minha especialidade) e você tem uma absorção do modelo fortemente espanhol (que é o modelo por competências); e aí depois mais um enriquecimento com as posições teóricas da escola portuguesa, principalmente. Mas eu posso dizer que a idéia de pós-médio, para o Instituto Superior de Educação daquela época pode ter sido inspirada na experiência que nós tivemos na a produção e na elaboração dos ginásios públicos ainda na Secretaria de Estado de Educação, à época da professora Maria Yedda Linhares. Entrevistador: O senhor participou da história da criação dos Institutos, chamados, na época, de cursos pós-médios, mas foi o embrião dos ISE aqui na Rede Estadual. O senhor vê a vinculação da SEE e da FAETEC constituir-se numa luta de forças que deslanchou, finalmente, numa jogada política, com o projeto da professora Nilda Teves? Entrevistado: Eu não diria o projeto de cunho pessoal da professora Nilda Teves porque não me cabe um domínio sobre essas motivações pessoais. Mas, se nós fizermos uma análise institucional, ou de poder de processo decisório, você há de convir que possuir no seu quadro uma universidade, é... faz uma diferenciação. E daí você imaginar que transferir as universidades estaduais, no caso a UENF e a UERJ, da antiga estrutura da SEE para atual estrutura da Ciência e Tecnologia, é, na verdade, uma decisão de gestão. Não é, porque o Secretário de Educação possui 2.000 escola, 75.000 professores (em números redondos) e ainda mais 2 grandes instituições universitárias para gerir. Então é uma decisão que tem um aspecto de facilitação da gestão pública. Mas tem também, uma relação de poder. Porque passa a ter, no corpo da Ciência e Tecnologia, os produtores de conhecimento. Da mesma forma, eu não posso ser ingênuo ao ponto de achar que, a transferência ou a criação de uma Fundação para gerir a educação profissional fora dos limites da Educação, não tenha também um embate de forças é... de grupos ou até de estruturas (aí, no caso da Ciência e Tecnologia), que queira, na sua área de subordinação, escolas que têm centenas de professores, e que no seu grupamento envolvendo milhares de professores, e que vão, de alguma forma, atingir e alcançar milhares de alunos e milhares de famílias. Então seria ingênuo de nossa parte imaginar que essas mudanças institucionais, que saem de uma área e vai para outra são meras decisões administrativas ou de gestão. Acho que deve haver aí uma relação de poder bastante forte. O que sempre me encantou como dúvida de ciência política é por que que ao fazer isso é... a recém criada Fundação não levou para lá todos os cursos de educação profissional. Porque deveria ter levado as centenas de cursos de contabilidade, de administração... Deveria ter levado os secretariados, deveria ter levado essas coisas todas, porque são cursos de difícil gestão... de difícil gestão, não é? Então fica bastante... bastante interessante dizer porque que levou o que agente chama de “filé mignon” e deixou o “osso” do lado de cá. Então, com certeza há assunto para ser discutido posteriormente. Entrevistador: Mas não são todas políticas de Estado? As duas Secretarias não pertencem ao Estado? Entrevistado: Não. Eu diria políticas de governo. O modelo que nós fazíamos, de Institutos de Educação, ele iria transpor os limites do governo. Entrevistador: Sim, a FAETEC, como o senhor colocou agora, ela só leva o “filé mignon”; ela não leva o “osso”. Mas ao fazer isso, ela está transferindo para ela algo que pertence ao próprio Estado, e, teoricamente, ao próprio governo, porque, as duas Secretarias estão dentro do Estado e estão dentro do próprio governo. A questão, então, passa a ser pessoal? Passa a ser mais pessoail que de fundo? Porque as duas Secretarias estão dentro do próprio Estado e dentro do governo, não e?! Há, então, uma luta entre Secretarias? Porque o “ganho” seria do governo, estando “lá” ou estando “cá”... Entrevistado: É... Eu vou resgatar aquele cenário que eu desenhei para você, no início, mostrando a situação crítica da educação naquele período, e a tarefa bastante difícil, de Fernando Pinto, ao assumir. E quero lembrar, isso é importante, que foi o único ano, dos últimos anos, que não houve greve dos professores. Foi o ano de 97, não é...? Porque os professores se sentiram participantes. Nós fizemos, pelo menos na nossa área, uma gestão transparente, chamando os professores a discutirem e a participarem das decisões de assuntos próprios e pertinentes de cada um deles, e foi um ano que não houve paralisação de professores... Não é...? Então o que eu acho é que a FAETEC, como modelo institucional, ela precisava dar certo, não é..., como modelo. E dificilmente ela daria certo se ela começasse os seus dias açambarcando todos os problemas da educação profissional. Então, a decisão institucional talvez tenha sido (aí eu não estava lá prá entender as decisões) em, absorvendo as escolas (os cursos de educação profissional) até conseguir abranger todo o universo. Só que neste, nesta dinâmica ou neste caminho, ele levou os prédios, levou os professores e desarmou a estrutura que deveria(volto a dizer) atender aos deveres da educação média. Entrevistador: E qual o entendimento que se tinha de profissional por formação de professores? Entrevistado: Essa também é uma dúvida que eu arrasto até hoje, né.... Porque, efetivamente se levou o Instituto de Educação do Rio de Janeiro e deveria ter levado o IEPIC, deveria ter levado o Sara Kubitschek, o Rangel Pestana, é... o Roberto Silveira, é... os Instituto de Educação de todos os lugares. Mas, mais uma vez foi uma decisão, nesse caso, pontual; e que, para nós, na Educação, como nós tínhamos um projeto de política pública que transcendia ao espaço dos quatro anos de governo, para nós foi doloroso viver a experiência de perder o símbolo. Mas, na formulação as políticas, nós substituímos, no nosso modelo, o Instituto de Educação por outro Instituto, que atenderia, da mesma forma, o que se pretenderia pelo interesse público. Entrevistador: E talvez, com um pouco mais de tradição, retirando a pessoa do professor Anísio Teixeira, porque o IEPIC, por exemplo, data de 1835... Para o Senhor, a formação de professores é alvo de uma disputa política no Estado do Rio de Janeiro? Entrevistado: Sempre será. Sempre será. Não só no Estado do Rio de Janeiro, que é a sua questão, mas você percebe hoje a luta que há, na definição dos espaços do Instituto Superior de Educação no Brasil, ou do Curso Normal Superior. Há, na verdade, uma luta de espaço entre os cursos de Pedagogia, os cursos de licenciatura instituídos no modelo mais antigo e o Instituto Superior de Educação e o Curso Normal, são duas coisas: um é gênero e o outro é espécie. É... Deixando claro que mesmo em nível, no nível superior de ensino, você tem as mesmas disputas para saber quem é capaz efetivamente é capaz de se dizer um formador de professores, se é o curso de Pedagogia, se o curso de licenciatura, ou ainda os novos (e em processo de amadurecimento) Institutos Superiores de Educação. Entrevistador: Há uma outra questão que me deixou intrigado na sua fala. O governador Marcelo Alencar, ele instituiu Fernando Pinto como Secretário de Educação. Ao mesmo tempo o professor Elói Fernandes e Fernandes era o Secretário de Ciência e Tecnologia da época... Entrevistado: Tecnologia. Que foi o responsável pela reconstrução e formatação da Ciência e Entrevistador: (continuando a pergunta) Dentro deste governo o Secretário de Educação, então, perdeu um pouco de prestígio? Porque saiu o Instituto de uma instância para outra. inham um projeto que iria dar certo e repentinamente sai de uma Secretaria para outra. E o senhor também era Conselheiro do CEE, junto com a professora Nilda Teves. O Secretário havia perdido o prestígio em relação ao outro? Foi alguma coisa combinada entre os Secretários? Como se deu isso? Entrevistador: O que eu posso dizer é que aconteceram reuniões aonde estavam presentes os Secretários (professora Nilda Teves, eu) não é...; e o próprio governador, aonde se discutia a transferência do Instituto de Educação. E o que nós dizíamos foi a o seguinte: “não estamos perdendo um prédio: estamos perdendo um símbolo”. Entrevistador: Então, não foi uma transferência pacífica? Entrevistado: De forças políticas, com certeza não, não é...? Mas é alguma coisa que está no contexto da chamada “arena política”. O que nós apontávamos é que nós tínhamos problemas na velocidade. Por que? Porque tínhamos realmente que pensar no Instituto, num conjunto de outras escolas; um universo de Escolas bastante grande. Mas que tínhamos projeto. Inclusive apresentávamos essas idéias, esses projetos que estavam sendo alinhavados. E tanto é verdade que quando nós perdemos (que a Educação perdeu o Instituto) na verdade sai um Instituto e entra outro. Porque o projeto de política não se prende a pontos, mas sim a grandes idéias. Entrevistado: O senhor colocou em um momento da entrevista, que muitas gerações foram formadas, no interior, em Curso Normal, porque não havia outra modalidade oferecida. O senhor não acha que transformar o Curso Normal em Superior seria voltar ao passado, dando apenas uma nova roupagem ao referido curso e deixando as pessoas sem oportunidade de escolha? Por quê não se interiorizam também cursos tecnológicos? Se assim continuar, as pessoas dessas cidades não estarão fadadas a uma mesma formação? Entrevistado: Com certeza. Na verdade você chama a atenção para uma coisa bastante interessante: não se aprendeu muito com os erros de antes. Agora, se visto pela ótica do administrador, a pergunta tem uma outra conotação, uma outra conseqüência. Porque imagine você o que seja criar um curso de engenharia, em alguns...... municípios do interior. Imagine você o que é criar cursos de odontologia, com gabinetes, com as cadeiras de dentista... Então, na verdade, nós tendemos a repetir, por facilidade, as mesmas dificuldades de antes. Colocaram-se Curso Normal e a Contabilidade (ou Administração) porque não precisávamos de fazer investimentos. Entrevistador: E nesse caso, a universidade não teria, de certa forma, um papel mais importante, mais facilitador, para a interiorização desses cursos, tendo em vista que ela já possui já uma estrutura, uma base maior para isso? Porque a retórica que se tem hoje sobre dos Institutos Superiores de Educação é que eles foram criados porque a universidade levou muito tempo discutindo e não se interiorizou. Eu chamaria a atenção para isso: a universidade não exerceria esse papel com mais facilidade e qualidade? Entrevistado: Com certeza, não é...?! Duas coisas têm que ser apontadas aí. Primeiro é a certeza absoluta de que a universidade detêm o conhecimento acumulado na tradição. Isso não se pode questionar. Mas a Segunda coisa é que esse processo de valorização institucional que a universidade vive e convive muitas vezes impede que ela saia do espaço limitado da sua cátedra, para enfrentar as realidades do cotidiano. Então, se a universidade tivesse acostumada a fazer o movimento de saída, com certeza ela já teria, de alguma forma, contribuído nessa mudança. Então, volto a dizer que o que nós temos hoje é um problema concreto: os professores precisam ter formação superior a partir de 2007. Então, na verdade, quando se dá ênfase à formação (da formação e professores), primeiro porque é um caminho de mobilidade social. Querendo ou não, a busca é de mobilidade social. Ao passar por um curso e você é visto socialmente de forma melhor. E segundo, o poder público tem que encontrar alternativas para é... superar esse obstáculo que é legal. Terceiro, para ser coerente, o caminho seria a transformação dos Cursos Normais já existentes, aproveitando o corpo já qualificado. Até porque aí tem uma outra pergunta bastante interessante: quando os Cursos Normais deixarem de formar alunos (porque os alunos não poderão mais trabalhar – porque serão professores de ensino médio – o que será feito do corpo docente de centenas de cursos normais? Quando o Estado transferir para os municípios as escolas de 1ª a 4ª séries, e ficar com o professor de 1ª a 4ª séries na sua folha, o que será feito desse professor de 1ª a 4ª séries? Essas perguntas nós fizemos em 97. E quando nós nos propusemos a requalificar o corpo docente das Escolas Normais da época, conversando com os professores, nós perguntamos isso. Então, no modelo apresentado em 97, nós tínhamos os núcleos de capacitação para garantir que os professores fossem requalificados, e que, quando houvesse o encerramento do Curso Normal de Nível Médio, os professores pudessem ter espaço para atuação, porque já eram funcionários de carreira, já estavam nos quadros do Estado, e simplesmente deixariam de dar aula nos Cursos Normais de nível médio para dar aula no Curso Normal Superior. E os professores de 1ª a 4ª séries que eram oriundos e estavam lotados em escolas estaduais que foram municipalizadas seriam requalifiacdos para poder atuar em escolas de ensino médio. Então hoje nós temos professores de 1ª à 4ª séries na folha do Estado sem ter com o que trabalhar. E não atendemos à esmagadora maioria do interior do Estado na necessidade de formar professores de ensino superior e de qualificar os professores da própria Rede. Há aí um vazio estratégico, um equívoco, uma inexistência de visão de futuro. Entrevistador: Professor Álvaro, eu queria que o senhor falasse um pouquinho da sua trajetória como educador. Entrevistado: Eu sou oriundo de escola pública. Fui aluno do Colégio Estadual Nilo Peçanha, em Niterói, e vivi algumas experiências bastante interessantes. Fiz habilitação básica em química. E já naquela época vivi as dificuldades de ser aluno de uma escola pública que tinha um curso na área secundária da economia. Então, a gente tinha dificuldade de obter reagentes e algumas coisas do gênero. Desde aquela época, o que me chama a atenção é a necessidade de encontrar caminhos alternativos e concretos para resolver problemas que já existem há muito tempo. Então, de lá fui fazer curso superior de química. No meio do caminho do curso superior, obtive uma autorização para lecionar na antiga Inspeção Escolar e comecei a dar aula, no meio da faculdade, prá ensino médio. E nesse período, sempre trabalhando com alternativas de problemas. Se tem um problema é... vamos superar o problema. E aí todas as vezes que nós conseguimos fazer o fechamento de uma alternativa (e nós apresentávamos isso aos órgãos competentes daquela época, lá pelos idos de 80) a resposta era a seguinte: “não tem política”. Então você tinha um problema; e se tinha se encontrado a solução, ouvia-se a seguinte frase: “não tem política”. E eu ficava muito curioso, porque não tinha a mínima idéia do que significava a expressão “não tem política”. E eu perguntava para as pessoas o que é política e ninguém sabia me dizer o que era política. E aí nós fomos (por conta desses trabalhos, concretos e em cima de problemas reais e com os resultados) tendo uma série de espaços e eu direcionei minha vida para a área de educação, na área de ensino de ciências. Por conta desses projetos desenvolvidos no Liceu Nilo Peçanha, fui trabalhar na Secretaria de Estado de Educação, na área de ensino médio. Acompanhei a mudança, a implantação da lei 7.044 (mudança curricular). É... depois fui fazer especialização no ensino de ciências na Universidade de São Paulo também trabalhando problemas concretos na prática do professor. Fui fazer meu mestrado em formação de professores na UFRJ, na área de currículo, onde nós estudávamos a relação de ciência de química e sociedade, em ciência, e sociedade (como formar o professor cujo conhecimento efetivamente modificasse a formação do cidadão capaz de interferir na sociedade em que vive). E sempre me dedicando a enfrentar problemas chamados crônicos e apresentando propostas, e sempre ouvindo dos dirigentes a mesma expressão: “não tem política”. E aí, resolvi então, já que ninguém consegui me dizer o que era ter política ou não ter política, fazer o doutorado na UFRJ em Políticas Públicas (Planejamento e Gestão), para entende que diabos é política pública. E coincidiu, nesse período, com a minha ida para o Centro de Ciências, formando um grupo bastante ativo, e... chamado novamente a enfrentar um problema concreto, que foi superado pelo Centro de Ciências, depois deslanchou e hoje está aí com o CEDERJ e outras coisas do gênero. É... Depois disso fui para a Educação (Secretaria de Educação), enfrentei os problemas. Na minha saída em 98, tive a oportunidade de ser convidado para trabalhar em Brasília, onde continuei trabalhando com problemas concretos. Participei do projeto “Pela Justiça na Educação”; participei do projeto de criação do ENEM. Participei do projeto... Aliás, ao primeiro, anterior ao ENEM foi feito no ano em que nós trabalhávamos (o Rio de Janeiro participou). Participei do projeto “Toda Criança na Escola”. Participei, na gênese, da discussão do “Bolsa Escola”. Depois fui trabalhar na área de planejamento (planejamento propriamente dito) na implantação de rotina da Lei de Responsabilidade Fiscal, sempre buscando soluções concretas para problemas verdadeiros e tentando profissionalizar a gestão. Ao longo da minha vida eu tenho visto professores com estremada competência docente e uma boa vontade absurda, tendo que decidir sobre coisas paras às quais eles não foram preparados. E isso me deixou sempre muito preocupado. Daí a minha ida para a área de políticas públicas e a minha preocupação de, no doutorado, discutir o uso de cenários futuros para a educação; a educação tem que parar de tomar decisões olhado para o próprio umbigo e olhando só para o amanhã. Então toda política pública do ensino fundamental tem uma conseqüência de, no mínimo, oito anos. No ensino médio, de no mínimo três anos. Todo programa de implantação de mudanças, para acontecer leva de dois a três ou quatro anos; e nós não estamos treinados, na educação, a formular políticas públicas; a enfrentar os projetos de implantação disso, principalmente olhando pro futuro. A educação brasileira, infelizmente, ainda tem o péssimo hábito de tomar decisão olhando para o passado, olhando para a história, mas de costas para o futuro, não é... Então o Instituto de Educação hoje, seis anos depois do que foi, é o marco de que o que foi projetado antes numa visão de futuro, numa visão de cenários, é exatamente o que o Brasil está vivendo hoje. Se Estado do Rio de Janeiro tivesse absorvido esse modelo com a força da base que tinha, do apoio que teve dos professores da época, com certeza Estado do Rio de Janeiro não estaria vivendo as dificuldades institucionais que vive hoje no campo da educação. E a universidade, ao invés de ter alguém para disputar com eles o espaço da educação, ao invés de ser alguém que é visto como esvaziador da tarefa da universidade, seria um outro espaço, formando um professor numa lógica diferente. E aí os ISE e universidade, nessa lógica, permanente de troca de experiências, ou divisões pluralistas de mesmo fenômeno, fariam que o Estado do Rio de Janeiro efetivamente crescesse. Faço votos que nessa história toda, os nossos gestores educacionais sejam formados para isso. E que a gente aprenda a tomar decisão primeiro visando o interesse público. Sempre o interesse público, porque quem paga a conta é a sociedade. E segundo, olhando para o futuro..............................................FIM.