Estilo de vida [ Fotos: Gustavo Aragão ] Meritíssimos faixas-pretas 34 GRACIEMAG Juízes e desembargadores – todos faixas-pretas de Jiu-Jitsu – dão dicas e lições para você, estudioso leitor, aproveitar a essência da arte suave para alcançar suas metas profissionais e viver melhor Da esquerda para a direita, os ilustres magistrados faixas-pretas Saldanha, Laguna, Jangutta, Direito e Ruliere. “Quando estamos sob pressão durante um julgamento, o sangue-frio que desenvolvemos com o Jiu-Jitsu nos ajuda a superar os momentos mais difíceis.” GRACIEMAG 35 O desembargador Antonio Saldanha (por baixo) e o juiz Marcel Laguna demonstram um armlock da guarda. E xistem muitas semelhanças entre a trajetória que um praticante de Jiu-Jitsu percorre até chegar à faixa-preta, e o caminho de um estudante de direito que deseja ascender à condição de juiz. A começar pela sucessão de obstáculos e desafios ao longo de ambas as trilhas. Não existem atalhos. É preciso muito estudo, disciplina, consistência e, sobretudo, coragem – já que, nos momentos de maior adversidade, muitos desistem de suas metas e abandonam a travessia. Marcel Laguna, 24 anos de faixa-preta e 17 de toga, ainda se lembra dos tempos em que prestava concurso para a magistratura. “Eu não conseguia passar nas provas; era um processo seletivo dificílimo. Só não desisti por causa daquela força mental que desenvolvi na academia do Carlson Gracie. Eu estudava como quem se prepara para uma série de campeonatos. Sabia que minhas derrotas iniciais eram uma forma de aprendizado e de acumular conhecimento para o teste seguinte. E foi assim, com aquele espírito de lutador, que um dia consegui ser aprovado.” Atraída por relatos como o de Laguna, a equipe de GRACIEMAG fez uma visita ao complexo de prédios do Fórum do Centro da Cidade do Rio de Janeiro, onde, para a surpresa de nossos repórteres, há um dojô de Jiu-Jitsu. Foi lá que, numa tarde de quarta-feira, reunimos um grupo seleto de meritíssimos faixas-pretas para um treininho solto, uma conversa descontraída e uma sessão de fotos. Enquanto trocava o terno pelo kimono, o desembargador Antonio Saldanha Palheiro exaltou os benefícios que o Jiu-Jitsu oferece à saúde de seus praticantes: “Vejo muitos colegas sedentários aqui no Fórum. Eles reclamam de taxas altas de colesterol, costumam estar acima do peso... Enfim, são problemas que tendem a não afetar as pessoas que seguem a filosofia do 36 GRACIEMAG Jiu-Jitsu. Atividade física constante, alimentação saudável, culto pela natureza... Eu, aos 62 anos, tenho muito mais disposição para trabalhar que vários jovens que estão apenas iniciando a carreira. Devo essa energia toda ao Jiu-Jitsu.” “E não é só uma questão de saúde do corpo”, completa Paulo Roberto Jangutta, juiz de direito, hoje auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça. “A saúde da mente também está em jogo. Temos que arrumar uma maneira de aliviar a pressão e o estresse inerentes à nossa profissão. De certa forma, os problemas da sociedade recaem sobre os ombros dos juízes, e é preciso ter uma válvula de escape. O Jiu-Jitsu é minha forma de extravasar e encontrar um equilíbrio”, diz Jangutta, que, no dia da reportagem, tinha um machucado no rosto, próximo ao supercílio direito, em decorrência de um treino puxado, na academia do professor Roberto Corrêa de Lima, o Gordo. Campeão superpesado do Internacional Master & Senior de 2010 (na categoria senior 2), Jangutta demonstrou à nossa equipe o passo-a-passo de um de seus golpes preferidos, o qual ele apelida de “nana, neném”. Trata-se de uma finalização a partir do domínio lateral, capaz de provocar grande desconforto para quem está por baixo. Em linhas gerais, o juiz projeta o peso do próprio corpo sobre o adversário, dominando com os braços o pescoço e uma das pernas do oponente. “Quem cai nesta posição comigo desiste na hora”, garantiu o juiz, em tom bem-humorado. Enquanto registrávamos o “nana, neném”, o juiz Carlos Gustavo Direito e o desembargador Camilo Ruliere trocavam algumas considerações sobre a chave omoplata, golpe que Carlos tem facilidade de aplicar em função de suas pernas compridas e de um bom jogo de quadris. O papo fluía com naturalidade, como se os magistrados estivessem debatendo minúcias técnicas de algum processo. O respeito e a admiração à hierarquia são outros aspectos muito semelhantes entre os fundamentos do Poder Judiciário e os de uma escola de Jiu-Jitsu. Todos os magistrados reunidos no dojô da Fórum Academia se mostraram unânimes ao elogiar o trabalho do Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, hoje faixa-coral de Jiu-Jitsu, pupilo de mestre Osvaldo Alves. Num artigo antológico publicado em 2004, na GRACIEMAG #93, Fux declarou: “Quando disputei o cargo de ministro, não faltaram pessoas a me esmorecer nessa caminhada, a dizer que eu era muito jovem, que não devia perseguir a posição. Mas aquela coragem, a ousadia, a determinação e a autoconfiança que aprendi nos tatames sempre me levaram a prosseguir. Desde cedo fui muito perseverante, e decidi que precisava estudar exaustivamente para realizar meus objetivos, mas o Jiu-Jitsu exacerbou essa qualidade e foi fundamental paras as minhas conquistas profissionais”. Após a sessão de fotos no dojô, nossa equipe de reportagem ainda visitou os magistrados em seus gabinetes e caminhou com eles pelos corredores agitados do Fórum. “Ficamos felizes em ver que a GRACIEMAG não se interessa apenas pelos competidores, mas sim por praticantes de JiuJitsu com diversos perfis e estilos de vida”, disse o juiz Carlos Gustavo Direito. “Acho que a nossa arte marcial oferece lições valiosíssimas em várias instâncias, lições que se revelam não só em academias e campeonatos, mas também em nossas vidas cotidianas e nos deveres profissionais.” Carlos Gustavo estava certo. GRACIEMAG acredita que, no final das contas, o que importa não é o título de campeão em si, mas a saborosa sensação de vitória que cada indivíduo pode carregar em seu íntimo, em meio aos diversos tipos de luta cotidiana. Sabemos que a filosofia do Jiu-Jitsu pode ajudar a todos nesses desafios do dia a dia, estimulando cada um a alcançar o verdadeiro potencial em sua vida, como demonstram os ilustres magistrados desta reportagem. “A ideia de coragem, de ousadia no limite da responsabilidade e de respeito ao próximo que o Jiu-Jitsu transmite me ajudou no decorrer da carreira de juiz, em que é preciso ser independente e ter vigor para enfrentar as dificuldades”, disse o Excelentíssimo Ministro Fux, no artigo de 2004. “O juiz pode sofrer pressões de todos os níveis. Acho fundamental para o ser humano o desprendimento e a disposição de não temer, porque a pior sensação é o medo do medo. E o Jiu-Jitsu dá, de antemão, a prevenção dessa sensação, por meio da autoconfiança. A arte ensina que, se eventualmente você estiver numa situação-limite, na pior das hipóteses vai saber se defender.” GRACIEMAG torce para que todos os nossos leitores batam o martelo e definam esse tipo de postura como uma sentença irrevogável na busca do sucesso pessoal. Que vocês tenham a mesma sorte do Ministro Fux. Oss! Foto: José Cruz/Agência Brasil O ministro faixa-coral No dojô e no gabinete, dois momentos do cotidiano do juiz Paulo Jangutta. Na foto menor, o Ministro do STF Luiz Fux. GRACIEMAG 37