ÉDICAS DEPARTAMENTO DE CIRURGIA GERAL NODE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO UNIVERSIDADE DO RIO DE JANEIRO CENTRO BIOMÉDICO - FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DEPARTAMENTO DE CIRURGIA GERAL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FISIOPATOLOGIA E CIÊNCIAS CIRÚRGICAS Mary Juciane Galvão Zamboni CARACTERIZAÇÃO DO PERFIL DE EXCREÇÃO DE GLICOSAMINOGLICANOS NA URINA DE USUÁRIAS DE CONTRACEPTIVO ORAL Rio de Janeiro 2009 Mary Juciane Galvão Zamboni CARACTERIZAÇÃO DO PERFIL DE EXCREÇÃO DE GLICOSAMINOGLICANOS NA URINA DE USUÁRIAS DE CONTRACEPTIVO ORAL Tese apresentada, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, ao Programa de PósGraduação em Fisiopatologia e Ciências Cirúrgicas, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração em Urogenital Orientador: Prof. Dr. Luiz Eduardo Macedo Cardoso Rio de Janeiro 2009 Mary Juciane Galvão Zamboni CARACTERIZAÇÃO DO PERFIL DE EXCREÇÃO DE GLICOSAMINOGLICANOS NA URINA DE USUÁRIAS DE CONTRACEPTIVO ORAL Tese apresentada, como requisito para obtenção do título de Mestre, ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Ciências Médicas, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração: Urogenital. Tese submetida à avaliação em: _______/_______/_________ Banca examinadora: Prof. _____________________________________ Prof.______________________________________ Prof.______________________________________ Rio de Janeiro 2009 Ficha Catalográfica Zamboni, Mary Juciane Galvão Caracterização do perfil de excreção de glicosaminoglicanos na urina de usuárias de contraceptivo oral/ Mary Juciane Galvão Zamboni; orientador : Luiz Eduardo Macedo Cardoso. – Rio de Janeiro, 2009. 53 p. Tese (Mestrado – Departamento de Cirurgia Geral) – Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro pp. 53, vi, 1 ilustrações Unitermos : glicosaminoglicanos, urina, contraceptivo oral. i AGRADECIMENTOS A todas as voluntárias que participaram deste estudo, minha gratidão e respeito. Ao professor e orientador, Luiz Eduardo de Macedo Cardoso pela oportunidade, orientação e apoio, o meu respeito e agradecimento sempre. Aos professores Francisco Sampaio e Valdemar Silva pelo exemplo profissional estimulante, de incansável dedicação. Ao amigo e companheiro solidário Carlos Augusto P. Cabral, as minhas desculpas pela falta de saber no universo científico, o que contribuiu para que sua colaboração tivesse de ser ainda maior. Aos bolsistas de iniciação científica, futuros colegas, que colaboraram na realização deste trabalho, em especial, Alan e Camila, minha amizade e carinho. Aos colegas de pós-graduação pelo apoio e auxílio em momentos tensos. A toda minha família, pela paciência, tolerância diante de minha ausência em diversos momentos, compreensão e, sobretudo o amor proporcionando o equilíbrio necessário para execução deste trabalho. Ao meu companheiro Marcelo, de aprendizado de amor e de vida, de jornada de todos os dias. A professora Ana Lúcia Teixeira Pinto pela cooperação e apoio concedidos durante esta jornada. Aos amigos de trabalho e da disciplina de Tocoginecologia da Faculdade de Medicina de Petrópolis, que em alguns momentos contribuíram permitindo substituições de horários em tempos exíguos e difíceis. Aos funcionários do laboratório do HUPE onde foram realizadas dosagens urinárias de creatinina. Ao colaborador Valdeir pelo auxílio tão generoso. A todos aqueles não citados, mas nem por isto menos importantes, que contribuíram direta ou indiretamente para que este trabalho se tornasse realidade. ii SUMÁRIO INTRODUÇÃO...........................................................................................................01 OBJETIVO.................................................................................................................06 MATERIAIS E MÉTODOS.........................................................................................07 RESULTADOS...........................................................................................................11 DISCUSSÃO..............................................................................................................16 CONCLUSÕES..........................................................................................................20 APÊNDICE A. Ficha Cadastral Individual (Questionário)..........................................21 APÊNDICE B. Consentimento Livre e Esclarecido....................................................22 APÊNDICE C. Carta de apresentação ao projeto de pesquisa.................................23 APÊNDICE D. Solicitação de amostras de urina para projeto de pesquisa..............24 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................25 ANEXOS....................................................................................................................31 iii LISTA DE TABELAS Tabela 1. Critérios de exclusão para o recrutamento de mulheres voluntárias para o estudo. Tabela 2. Excreção de glicosaminoglicanos urinários totais na primeira e segunda metades do ciclo menstrual em mulheres usuárias de anticoncepcionais orais hormonais (ACHO). Tabela 3. Média de excreção de glicosaminoglicanos urinários totais durante o ciclo menstrual em mulheres usuárias e não usuárias de anticoncepcionais orais hormonais (ACHO). Tabela 4. Proporções de glicosaminoglicanos sulfatados em amostras de urina de mulheres usuárias e não usuárias de anticoncepcionais orais hormonais (ACHO). LISTA DE GRÁFICO GRÁFICO 1. Níveis séricos (em mUI / mℓ) dos hormônios folículo estimulante (FSH) e luteinizante (LH) durante o ciclo menstrual, COM e SEM anticoncepcional oral hormonal (ACHO). iv LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ACHO anticoncepcional oral hormonal CS Condroitin sulfato DPC dor pélvica crônica DS Dermatan sulfato FSH Follicle-stimulating hormone (inglês) Hormônio folículo estimulante (português) GAG Glicosaminoglicano GnRH Gonadotropin-Releasing Hormone (inglês) Hormônio liberador de gonadotrofinas (português) HS Heparan sulfato LH Luteinizing hormone (inglês) Hormônio luteinizante (português) MEC Matriz extracelular TRH Terapia de reposição hormonal v RESUMO CARACTERIZAÇÃO DO PERFIL DE EXCREÇÃO DE GLICOSAMINOGLICANOS NA URINA DE USUÁRIAS DE CONTRACEPTIVO ORAL Introdução e Hipóteses: Glicosaminoglicanos (GAG) no urotélio e na urina possuem um efeito protetor contra desordens tais com urolitíase e cistite intersticial. Adicionalmente, foi demonstrado que hormônios sexuais femininos podem modular a excreção urinária de GAG (Maroclo M.V. et al. J Urol. 2005;173:1789-92). O presente estudo investigou se os anticoncepcionais orais hormonais (ACHO) influenciam na excreção urinária de GAG. Métodos: Amostras de urina foram doadas por mulheres jovens que utilizavam anticoncepcionais orais regularmente: Yasmin® (0,030 mg etinilestradiol + 3,0 mg drosperinona), n=9; Diane 35® (0,035 mg etinilestradiol + 2,0 mg acetato de ciproterona), n=9; e Femiane® (0,020 mg etinilestradiol + 0,075 mg gestodeno), n=7. Controles foram 10 mulheres da mesma faixa etária não usuárias de ACHO. Valores de GAG urinário total da primeira e segunda metades do ciclo menstrual foram expressos como µg ácido hexurônico por mg de creatinina urinária. A proporção de GAG sulfatado foi determinada pela eletroforese em gel de agarose. RESULTADOS: Em contraste com o grupo controle, a excreção de GAG total na primeira e segunda metades do ciclo menstrual foi bastante similar nos grupos usuários de ACHO. Valores de excreção em todo o ciclo foi maior no grupo usuário de ACHO (p < 0,01), particularmente para o grupo usuário de Diane®, no qual os valores foram o dobro dos valores do controle (p < 0,005). Comparados com o controle, os 3 grupos usuários de ACHO produziram diferenças marcantes na composição urinária de GAG sulfatado, com diminuição de aproximadamente 50% no HS (p < 0,02) e DS (p < 0,02), e uma diminuição próxima de 100% no CS (p < 0,004). CONCLUSÃO: O padrão urinário de excreção de GAG está claramente alterado em mulheres que tomam ACHO comumente utilizados. Entretanto, esta excreção alterada constituiria um efeito benéfico adicional dos ACHO, pois ela aumentaria o efeito protetor dos GAG contra desordens do trato urinário. Unitermos: Glicosaminoglicanos, urina, anticoncepcional oral hormonal vi ABSTRACT ORAL HORMONAL CONTRACEPTIVES AFFECT THE CONCENTRATION AND COMPOSITION OF URINARY GLYCOSAMINOGLYCANS IN YOUNG WOMEN INTRODUCTION AND HYPOTHESIS: Glycosaminoglycans (GAG) on the urothelium and in the urine have protective effects against disorders such as urolithiasis and interstitial cystitis. Additionally, we have shown that female sex hormones may modulate urinary GAG excretion (Maroclo MV et al. J Urol 2005;173:1789-92). Here we investigated whether oral hormonal contraceptives (OC) affect urinary GAG excretion. METHODS: Urine specimens were obtained from young women regularly taking the following OC: Yasmin (0.030 mg ethinyl estradiol + 3.0 mg drospirenone), n=9; Diane 35 (0.035 mg ethinyl estradiol + 2.0 mg cyproterone acetate), n=9; and Femiane (0.020 mg ethinyl estradiol + 0.075 mg gestodene), n=7. Controls were from ten agematched women not taking OC. Total urinary GAG from the first and second halves of the menstrual cycle was assayed as µg hexuronic acid per mg urinary creatinine. Content of sulfated GAG species was determined by agarose gel electrophoresis. RESULTS: In contrast to controls, excretion of total GAG in the first and second halves of the menstrual cycle was quite similar in the OC groups. Excretion values for the whole cycle were higher in the OC groups (p < 0.01), especially for Diane, in which the values were twice those from controls (p < 0.005). Compared with controls, the three OC produced marked changes in the composition of urinary sulfated GAG, with decreases of ~50% in HS (p < 0.02) and DS (p < 0.02), and a ~100% increase in CS (p < 0.004). CONCLUSIONS: The pattern of urinary GAG excretion is clearly changed in women taking commonly used OC. However, this altered excretion should constitute an additional beneficial effect of OC, as it enhances the protective effects of GAG against urinary tract disorders. Key words: Glycosaminoglycans, urine, oral hormonal contraceptives 1 INTRODUÇÃO: A integridade do corpo humano e suas estruturas de sustentação são amplamente dependentes da composição e arranjo do tecido conjuntivo. Desta forma, o espaço extracelular, frequentemente preenchido por componentes fibroconjuntivos denominados de matriz extracelular (MEC), é de importância fundamental para função dos tecidos. A MEC é constituída, em proporções variáveis, por colágeno, fibras elásticas, proteoglicanos, glicosaminoglicanos (GAG) e elementos celulares, que se organizam formando uma rede, em parte responsável pela grande diversidade morfológica e funcional (ECKES et al, 2000). Os múltiplos componentes da matriz dividem-se em dois tipos: moléculas protéicas alongadas que se unem formando estruturas fibrilares, como colágeno e elastina; estruturas não fibrilares que podem ser de dois subtipos, a saber: a) glicoproteínas alongadas como a fibronectina e laminina; b) GAG e proteoglicanos. O colágeno e a elastina são responsáveis pelo arcabouço estrutural e elástico. Já, os GAG e os proteoglicanos formam gel hidrófilo, semifluido que permite a circulação de nutrientes, hormônios e outros mensageiros químicos (ALBERTS, 1994). GAG são heteropolissacarídeos que têm como estrutura básica unidades alternadas de hexosamina e açúcar não-nitrogenado unidas por ligações glicídicas. Estas cadeias polissacarídicas foram denominadas de mucopolissacarídeos pela presença em secreções viscosas. Atualmente são referidos como GAG, estando presentes em todas as células animais com diferenças estruturais dependendo do tecido ou do organismo de origem (CECHOWSKA-PASKO; PALKA, 2000). Os principais GAG são: condroitim 4 e 6 sulfato (CS), dermatam sulfato (DS), heparan sulfato (HS), heparina (HEP), queratam sulfato (QS) e ácido hexurônico (AH). Estes compostos diferem entre si quanto ao tipo de hexosamina e açúcar não aminado, quanto ao grau e posição de sulfatação, bem como quanto ao tipo de ligação glicosídica inter e intra dissacarídica. Com exceção do ácido hialurônico, todos os GAG estão ligados covalentemente a esqueleto protéico, formando assim os proteoglicanos (FRASER; LAURENT, 1997). Proteoglicanos são componentes macromoleculares da matriz extracelular (MEC) que desempenham vários papéis na fisiologia celular normal e em estados patológicos (BISHOP; SCHUKSZ; ESKO, 2007). A degradação destes glicoconjugados frequentemente envolve ações de 2 metaloproteinases da matriz extracelular e de um pool de enzimas intracelulares (VERMA; HANSCH, 2007). Estão envolvidos em múltiplas funções biológicas como adesão, migração e proliferação celular, secreção de proteínas e expressão gênica. De forma geral, os GAG contribuem para a estrutura e as propriedades de permeabilidade do tecido conjuntivo, bem como guia para enzimas e fatores de crescimento tanto na matriz quanto na superfície das células (CECHOWSKA-PASKO et al, 1996). Fato que ultimamente tem despertado interesse é a relação entre a MEC e diversas enfermidades, tais como afecções urológicas, a exemplo, infecções, tumores, litíase e, especialmente, cistite intersticial (STABELLINI; CALASTRINI; GILLI, 1999; HENNESSEY; HURST; HEMSTREET, 1981). Uma concentração maior de GAG na urina pode ser favorável. Inúmeros estudos têm mostrado que estes polímeros polianiônicos possuem efeitos protetores no trato urinário. Por exemplo, GAG reduz a formação de cálculo urinário através de interações específicas que inibem o crescimento de cristais, aglomeração, e aderência (BOEVÉ et al, 1994). Mecanismos moleculares semelhantes explicam outros efeitos urinários protetores de GAG, tais como contra infecção urinária (STABELLINI; CALASTRINI; GILLI, 1999) e cistite intersticial (WEI et al, 2000). De fato, mudanças na concentração normal de GAG total urinário e nas proporções das diferentes espécies de GAG estão associadas com aumento de risco para estas desordens (BOEVÉ et al, 1994; GOHEL; SHUM, TAM, 2007; STABELLINI; CALASTRINI; GILLI, 1999; WEI et al, 2000). Como um exemplo do rol de prováveis sintomas gerados pelas entidades acima citadas, a dor pélvica é comum em mulheres. Estimativas sugerem que mais que 9 milhões de mulheres nos Estados Unidos experimentam este evento (MATHIAS et al, 1996). Mulheres com dor pélvica consultam ginecologistas mais frequentemente que outros especialistas, mas 75% destas numa anamnese mais apurada possuem sintomas urológicos (PARSONS et al, 2001). Como muitas outras síndromes dolorosas, a dor pélvica crônica (DPC) é uma condição multifatorial, com origens de dor possíveis nos tratos reprodutivo, urinário ou gastrintestinal, sistema nervoso central, ou no sistema músculo-esquelético. A taxa de prevalência 3,8% nas mulheres britânicas é similar à prevalência de dor de cabeça (2%), dor nas costas (4%) e asma (3,7%) (DALPIAZ et al, 2008). 3 DPC tem sido definida em publicações anteriores como dor não maligna percebida em estruturas pélvicas, constante ou recorrente acima de um período de seis meses. Em alguns casos, ela pode estar associada a conseqüências comportamentais e sociais (FALL et al, 2007). Esta definição está na mais recente recomendação da terminologia proposta pela Sociedade Internacional de Continência (ABRAMS; CARDOZO; FALL, 2002). Infecções recorrentes do trato urinário são comuns em mulheres jovens e saudáveis, mesmo que em geral tenham o trato urinário normal, anatômica e fisiologicamente. As infecções urinárias são causa notável de morbidade mundialmente e estima-se que nos Estados Unidos seja responsável por seis milhões de consultas/ano; com uma prevalência de 5% ao ano (PINGGERA, 2005). A cistite intersticial (CI) é uma síndrome clínica de natureza multifatorial, caracterizada basicamente por desconforto suprapúbico, dor pélvica ou perineal, dor vesical, polaciúria, urgência miccional e noctúria, ocorrendo de modo cíclico e crônico, de início insidioso e de caráter progressivo, com quadro clínico complexo. A etiopatogenia permanece pouco conhecida, apesar das diversas pesquisas nesta área. Considera-se que a influência de vários fatores, com predomínio da disfunção epitelial, que causaria alteração da barreira hemato-urinária, permitindo que pequenas moléculas e íons (em particular o potássio) contidos na urina se difundissem para o interstício da parede vesical. Os íons difundidos induziriam a despolarização dos nervos sensitivos da bexiga, produzindo os sintomas. Outras teorias incluem a inflamatória, vasculogênica e deficiência da camada de GAG que reveste o urotélio. Os tratos genital e urinário baixo feminino possuem origem embriológica comum, resultando do seio urogenital. Ambos são sensíveis aos efeitos dos hormônios esteróides sexuais femininos. Os hormônios sexuais possuem uma maior influencia no trato urinário baixo feminino no decorrer da vida adulta, com muitas flutuações em seus níveis levando a modificação: macroscópicas, histológicas e funcionais (PINGGERA, 2005). Várias evidências experimentais demonstram que os hormônios sexuais femininos podem modular o remodelamento da MEC, através da atividade das metaloproteinases da matriz e o turnover de proteoglicanos em geral (VERMA; HANSCH, 2007), ambos in vivo (CABRAL; SAMPAIO; CARDOSO, 2003) e in vitro 4 (TANAKA et al, 1997). Consequentemente, a soma e composição dos metabólitos urinários de proteoglicanos, que consiste principalmente de cadeias de GAG livres, são também influenciadas. Estudos comprovaram influências hormonais no sistema genital feminino, como MAROCLO et al (2005) verificaram que a excreção de GAG urinário em mulheres jovens possuía um padrão bifásico, sendo maior na primeira metade do ciclo menstrual, ao passo que encontraram uma elevação na concentração urinária de GAG em mulheres na pós-menopausa que foram submetidas à TRH (BROLLO et al, 2006). Estes achados também estão de acordo com a alta densidade dos receptores de hormônios sexuais no trato urinário (BATRA; IOSIF, 1987). Anticoncepcionais orais hormonais (ACHO) são um dos métodos mais amplamente usados de prevenção de gravidez. Estas drogas consistem de análogos sintéticos de hormônios sexuais femininos, e formulações combinadas atuais usadas contendo tipicamente baixas doses de estrogênio e de progesterona (PRACTICE COMMITTEE, 2008). Diversos estudos têm demonstrado que, além de prevenir gravidez, os ACHO proporcionam benefícios à saúde que incluem: redução de risco de câncer de endométrio, ovário, e colorretal e o manejo de desordens menstruais (PRACTICE COMMITTEE, 2008); decréscimo de incidência de gravidez ectópica e doença trofoblástica gestacional, auxílio na regressão de cistos ovarianos funcionais e menor incidência de cirurgia, menor morbidade e mortalidades ligadas ao ciclo gravídico-puerperal, diminuição de perda óssea, bem como, lentificam a média do turn over ósseo em mulheres jovens (ZITTERMANN, 2000). São utilizados ainda, para indicações não contraceptivas, incluindo acne, hirsutismo, síndrome prémenstrual, endometriose, dismenorréia e síndrome dos ovários policísticos (LEGRO et al, 2008). Muitos adolescentes estão sexualmente ativos em idades mais precoces que no passado, antes de serem hábeis cognitivamente para desenvolver um comportamento sexual responsável. Durante os anos após a menarca, ocorrem diversas irregularidades menstruais, tais como spotting, sangramento intermenstrual, e amenorréia. Estes problemas afetam quase 75% das adolescentes (SLAP, 2003; HEINZ, 2006). Entretanto, dismenorréia é a queixa mais freqüente (DEMIR; STEFFENS, 2003). Ainda sintomas em pele e cabelo relacionados ao androgênio resultantes de desequilíbrio hormonal, são problemas usuais. Embora tais problemas sejam cosméticos, eles levam a desordem emocionais e psicológicas 5 sérias afetando a auto-imagem. ACHO proporcionam eficácia na prevenção de gravidez e oferecem diversos benefícios não contraceptivos (SABATINIA et al, 2007). Os ACHO evitam a ovulação pela inibição do pico de secreção de gonadotrofinas, exercendo seu principal efeito sobre os centros hipofisários e hipotalâmicos (Gráfico 1). Além disso, atuam em outros sítios do processo reprodutor; colo uterino, endométrio, tubas uterinas e ovários. No colo uterino promovem alterações físico-químicas do muco, tornando-o espesso e hostil, dificultando a espermomigração. No endométrio diminuem a produção glandular de glicogênio, de tal forma que o blastocisto dispõe de menor quantidade de material energético para sobreviver na cavidade uterina. Nas tubas modificam a contratilidade em grau que depende da estrogenicidade. No ovário, alteram a resposta às gonadotrofinas interferindo com o ciclo dos receptores. No entanto, a produção de esteróides não é abolida de modo completo. Diante da semelhança de sintomas entre dor pélvica crônica, infecção do trato urinário, cistite intersticial, urolitíase e tumores, bem como, as relações possíveis existentes entre GAG e a fisiopatologia destes eventos, estudos clínicos e experimentais poderão contribuir em diagnósticos ou terapêuticas relativas a afecções do sistema urogenital. Contudo, não há ainda nenhum dado sobre concentração e composição urinária de GAG em mulheres usuárias de terapia com anticoncepcionais orais hormonais. No presente estudo, analisou-se o GAG urinário isolado de mulheres jovens que estavam usando regularmente três tipos distintos de ACHO. Os valores de excreção obtidos foram então comparados com os de mulheres jovens de mesma idade que não utilizavam esses medicamentos. 6 OBJETIVO: Caracterizar através de métodos bioquímicos o perfil de excreção dos glicosaminoglicanos urinários durante uso de contraceptivo oral hormonal em mulheres jovens. 7 MATERIAIS E METÓDOS: Este estudo foi aprovado pelo Comitê local de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Hospital Universitário Pedro Ernesto. AMOSTRAS DE URINA: As amostras de urina foram doadas voluntariamente por vinte e cinco estudantes de graduação em medicina e pós-graduação, saudáveis, com idade variando até trinta anos, que estavam utilizando os anticoncepcionais orais hormonais regularmente por pelo menos três meses antes de iniciar a pesquisa. Elas foram distribuídas em 3 grupos de acordo com uso dos ACHO: Yasmin® (0,030 mg etinilestradiol + 3,0 mg drosperinona), n=9, idade (média ± SD) 24,6 ± 1,0 anos; Diane 35® (0,035 mg etinilestradiol + 2,0 mg acetato de ciproterona), n=9, idade 23,4 ± 2,0 anos; e Femiane® (0,020 mg etinilestradiol + 0,075 mg gestodeno), n=7, idade 23,9 ± 1,8 anos. Todos os ACHO foram produzidos pelo Laboratório Bayer Schering (São Paulo, Brasil), e foram ingeridos pelas pacientes de acordo com regime prescrito pelo fabricante. Amostras urinárias controle foram doadas por 10 estudantes de medicina saudáveis não usuárias de ACHO e idade entre 19 to 21 anos. A cada voluntária foram fornecidos: carta de apresentação à pesquisa e carta de solicitação de amostras de urina, bem como, questionário estruturado para autopreenchimento cujos dados visavam fornecer dados do histórico de saúde da mesma e oferecido consentimento livre e esclarecido. Três amostras de urina foram coletadas diariamente no meio da primeira metade do ciclo menstrual (dias 6, 7, 8) e três amostras no meio da segunda metade (dias 20, 21, 22). Estes dias do ciclo correspondem aos valores mais altos e mais baixos de excreção de GAG respectivamente (MAROCLO et al, 2005). As amostras de urina foram coletadas pela manhã, em seguida armazenadas a -20º C sem acréscimo de conservantes e foram mantidas congeladas até serem analisadas. Todas foram selecionadas com base nos critérios de exclusão de história de litíase urinária e renal, índice de massa corporal fora da faixa entre 20 e 25, presença de infecção urinária antes e durante o período do estudo, diabetes 8 mellitus ou outras doenças metabólicas, hipertensão arterial, gestação prévia ou atual e resultados anormais no teste fita reagente (Tabela 1). Tabela 1. Critérios de exclusão para o recrutamento de mulheres voluntárias para o estudo: _______________________________________________ História de litíase urinária e renal Índice de massa corporal fora da faixa entre 20 e 25 Presença de infecção urinária antes e durante o estudo Diabetes mellitus ou outras doenças metabólicas Hipertensão arterial Gestação prévia ou atual Resultados anormais no teste fita reagente _____________________________________________________ ISOLAMENTO DE GAG URINÁRIO TOTAL DAS AMOSTRAS DE URINA O GAG total foi isolado separadamente de cada amostra de urina diária de acordo com o protocolo descrito previamente por (MAROCLO et al, 2005). Em resumo, as amostras de urina foram descongeladas no laboratório, filtradas em filtro de papel e suas densidades serão ajustadas para < 1.020 através da adição de água destilada. Cloreto de cetilpiridinium foi adicionado à urina numa concentração final a 0,1%, e após 24 horas em temperatura ambiente, o precipitado foi coletado por centrifugação (3.000 rotações/minuto, 30 min). O precipitado foi então dissolvido em 2MNacl, e a cadeia de GAG foi precipitada pela adição de três volumes de etanol absoluto. Após 24 horas a -20°C, a mistura foi centrifugada (3.000 rotações / minuto, 30 min) e o precipitado foi lavado com séries de soluções de etanol. 9 O precipitado final, que consistia em GAG urinários totais, foi secado a 60º, dissolvido em água destilada, e conservado a -20 º C até novas análises. O rendimento deste método foi superior a 95% como determinado pela adição das quantidades conhecidas de padrão de GAG nas amostras de urina. ANÁLISE DOS GLICOSAMINOGLICANOS (GAG) A concentração urinária de GAG total nas amostras urinárias foi quantificada pela dosagem do ácido hexurônico através do método do carbazol (TAYLOR; BUCHANAN-SMITH, 1992) utilizando a glucoronolactona (Sigma, St. Louis, Missouri, EUA) como padrão. A concentração urinária de GAG total foi expressa em µg de ácido hexurônico por miligrama de creatinina urinária (µg HexUA / mg creatinina). A proporção das diferentes espécies de GAG sulfatados (heparan sulfato, condroitin sulfato e dermatan sulfato) foi determinada por eletroforese em gel de agarose 0,5% em tampão 50 mM 1,3 diaminopropano (Merck, Darmstadt, Alemanha), pH 9, da preparação total GAG associado com degradação específica com condroitin-liases (Sigma, St Louis, Missouri, EUA), como descrito em detalhes em outra parte (CARDOSO; MOURAO, 1994). Placas de gel foram digitalizadas em scanner de mesa e bandas de GAG em imagens digitais foram quantificadas usando o software Image J versão 1.41 (NIH, Bethesda, Maryland, EUA). A proporção de cada espécie de GAG foi expresso como percentual total de GAG sulfatado. OUTRAS ANÁLISES As amostras de urina também foram testadas com fita reagente (Multistix 10G, Bayer, Tarrytown, Nova York, EUA) para leucócitos, eritrócitos, pH, densidade, proteínas totais, e glicose. Creatinina urinária foi determinada por um ensaio enzimático automatizado (Sera-Pack, Bayer, Tarrytown, Nova York, EUA). 10 ESTATÍSTICA Cada uma das amostras de urina diária foi analisada separadamente, e o valor de média da concentração de GAG foi então calculado por primeira (dias 6, 7, 8) e segunda (dias 20, 21, 22) metades do ciclo menstrual. Um valor de média para o ciclo total foi também calculado usando os resultados individuais das duas metades. Procedimentos estatísticos seguindo SOKAL e ROHLF (1995). Resultados de cada parâmetro bioquímico foram analisados pela one-way ANOVA seguido pelo método de Bonferroni para comparação pareada. Valores de GAG urinário da primeira e segunda metades do ciclo menstrual foram analisados pelo teste-t pareado. Todos os resultados foram considerados com médias ± seus desvios padrões (SD), e significância estatística foi considerada quando p < 0,05. 11 RESULTADOS A excreção urinária de GAG total em mulheres jovens não usuárias de ACHO possui um padrão bifásico, onde valores mais altos são encontrados na primeira metade do ciclo menstrual quando comparados com a segunda metade (MAROCLO et al, 2005). Contudo, em mulheres jovens usuárias dos grupos de ACHO (0,030 mg etinilestradiol + 3,0 mg drosperinona, (n = 9); 0,035 mg etinilestradiol + 2,0 mg acetato de ciproterona (n = 9) e 0,020 mg etinilestradiol + 0,075 mg gestodeno (n = 7); não houve diferença significativa entre as duas metades do ciclo menstrual. A Tabela 2 mostra que os valores de excreção urinária de GAG total na primeira e segunda metades do ciclo menstrual em usuárias dos grupos de ACHO estudados foram muitos similares. Em função disto, uma média de valor de excreção foi calculada para todo ciclo menstrual de cada grupo, estes resultados foram comparados com aqueles das mulheres não usuárias de ACHO. Como demonstrado na Tabela 3, a média de excreção urinária de GAG tende a ser maior em mulheres usuárias de ACHO, o que é confirmado pelo fato de que os três grupos de ACHO em conjunto são diferentes do grupo controle (p < 0,01). Entretanto, a comparação individual dos grupos de ACHO, indicou que somente o grupo etinilestradiol + acetato de ciproterona, foi significativamente diferente (p < 0.005), com valores de excreção de GAG mais de duas vezes superiores aos valores das mulheres não usuárias de ACHO. Os GAG sulfatados detectados em todas as amostras foram heparan sulfato (HS), dermatan sulfato (DS), e condroitin sulfato (CS). A análise quantitativa dos valores destas espécies de GAG em cada um dos grupos de ACHO, entre a primeira e segunda metades do ciclo menstrual não diferiram entre a primeira e segunda metades do ciclo menstrual. Estes 2 valores de cada metade foram combinados do mesmo modo como foi realizado nos cálculos de GAG total. Em contraste com os resultados encontrados de GAG urinário total, as proporções das espécies de GAG sulfatados foram muito similares entre as usuárias dos diferentes tipos de ACHO. Todavia, quando comparadas com valores de mulheres sem tratamento, os 3 grupos de ACHO produziram diferenças marcantes na composição de GAG sulfatados, com 12 diminuição de aproximadamente 50% no HS (p < 0,02), e DS (p < 0,02), e um aumento de cerca de 100% no CS (p < 0,004) (Tabela 4). Tabela 2. Excreção de glicosaminoglicanos urinários totais na primeira e segunda metades do ciclo menstrual em mulheres usuárias de anticoncepcionais orais hormonais (ACHO). Etinilestradiol + drosperinona Etinilestradiol + acetato de ciproterona Etinilestradiol + gestodeno 9 9 7 Primeira metade do ciclo 0,776 ± 0,551 0,833 ± 0,419 0,634 ± 0,202 Segunda metade do ciclo 0,797 ± 0,602 1,075 ± 0,588 0,565 ± 0,324 Número de indivíduos Concentração de GAG total urinário foi determinada como µg de ácido hexurônico por mg de creatinina, e os números são médias ± SD (desvio padrão). Valores da primeira metade são média de concentrações nos dias 6, 7 e 8, enquanto aqueles da segunda metade são média dos dias 20, 21, e 22 do ciclo menstrual. O teste-t pareado para cada ACHO mostrou que não há diferença significativa entre valores de excreção para primeira e segunda metades do ciclo menstrual. 13 Tabela 3. Média de excreção de glicosaminoglicanos urinários totais durante o ciclo menstrual em mulheres usuárias e não usuárias de anticoncepcionais orais hormonais (ACHO). Número de indivíduos Não usuária de ACHO Etinilestradiol + drosperinona Etinilestradiol + acetato de ciproterona Etinilestradiol + gestodeno 10 9 9 7 0,754 ± 0,491 0,954 ± 0,420(*) 0,599 ± 0,204 Média de 0,412 ± 0,167 excreção, ciclo total Concentração de GAG urinário total foi determinada como µg de ácido hexurônico por mg de creatinina, e os números são médias ± SD (desvio padrão). A média de excreção para o ciclo menstrual total foi determinada pelo primeiro cálculo, para cada paciente, a média das concentrações na primeira e segunda metades do ciclo. A média foi então calculada para o grupo. As 4 médias foram significativamente diferentes (one-way ANOVA, p < 0,025). (*) Significativamente diferente do grupo não usuário de ACHO (Teste de Bonferroni, p < 0.005). Uma série abrangendo os três grupos de ACHO é diferente significativamente do grupo não usuária de ACHO (teste F, p < 0,01). 14 Tabela 4. Proporções de glicosaminoglicanos sulfatados em amostras de urina de mulheres usuárias e não usuárias de anticoncepcionais orais hormonais (ACHO). Não usuária de Etinilestradiol + Etinilestradiol + Etinilestradiol + ACHO drosperinona acetato de gestodeno ciproterona Número de indivíduos 10 9 9 7 HS 57,97 ± 13,46 30,17 ± 11,41 33,48 ± 17,50 30,54 ± 7,06 DS 9,79 ± 3,37 4,61 ± 2,53 4,53 ± 1,54 4,81 ± 2,0 CS 32,18 ± 11,80 66,61 ± 12,65 66,34 ± 20,76 64,65 ± 7,46 Proporções de heparan sulfato (HS), dermatan sulfato (DS), e condroitin sulfato (CS) foram indicadas como percentual de GAG sulfatado, e os números são médias ± SD. A média de concentração de todo ciclo menstrual foi determinada pelo primeiro cálculo, para cada paciente, a média das concentrações na primeira e segunda metades do ciclo. A média foi então calculada para o grupo. A proporção de cada espécie de GAG foi significativamente diferente entre os grupos (one-way ANOVA, p < 0.001). Comparação combinada usando método de Bonferroni mostrou que HS, DS, e CS nos grupos de anticoncepcionais orais hormonais são significativamente diferentes do grupo que não utilizava estes medicamentos (p<0,02, p<0,02, e p<0,004, respectivamente). 15 GRÁFICO 1. Níveis séricos (em mUI / mℓ) dos hormônios folículo estimulante (FSH) e luteinizante (LH) durante o ciclo menstrual, COM e SEM anticoncepcional oral hormonal (ACHO). Figura A – Níveis séricos (em mUI / mℓ) dos hormônios folículo estimulante (FSH) e luteinizante (LH) durante o ciclo menstrual SEM anticoncepcional oral hormonal. Figura B – Níveis séricos (em mUI / mℓ) dos hormônios folículo estimulante (FSH) e luteinizante (LH) durante o ciclo menstrual COM anticoncepcional oral hormonal. (Fonte: Physiology of Reproduction. Mosby, 1971). 16 16 DISCUSSÃO Os resultados deste estudo mostram que os ACHO afetam de várias formas a concentração e a composição de GAG na urina. Ao contrário do que ocorre em mulheres não usuárias destes hormônios, foi observado que a concentração de GAG na urina esteve aumentada e sua excreção foi quase constante por todo o ciclo menstrual. As proporções de GAG sulfatados também foram notavelmente alteradas. Anticoncepcionais orais combinados inibem a ovulação, principalmente através da supressão dos níveis séricos de FSH e LH durante o ciclo menstrual. ACHO combinados são constituídos por diferentes análogos sintéticos de estrogênio e a progesterona. Além disto, a progesterona pode ter atividade antiandrogênica (PRACTICE COMMITTEE, 2008). Todos estes hormônios, ou análogos hormonais, podem modular a síntese e a degradação de proteoglicanos de diferentes formas. Além disso, devido à alta concentração de receptores hormonais sexuais no trato urinário (BATRA; IOSIF, 1987), metabólitos de proteoglicanos na urina são particularmente afetados. Entretanto, a interpretação dos efeitos dos ACHO na excreção urinária dos GAG depende de uma variedade de eventos endócrinos complexos. ACHO têm sido utilizados como terapia de reposição hormonal em especial em estados hipoestrogênicos, devido ao seu conteúdo estrogênico (CHEN et al, 1999). Desta maneira, em mulheres saudáveis, essa adição aos níveis de estrogênio circulante poderia compensar a variação normal deste hormônio durante o ciclo menstrual, de tal forma que a diferença na excreção de GAG entre a primeira e a segunda metades do ciclo ficaria menos pronunciada, como indicam os resultados. Em condições normais, a filtração renal de GAG é pequena, e a maioria das cadeias excretadas é derivada do turnover normal de proteoglicanos que ocorre localmente no glomérulo e ao longo do trato urinário (LEE et al, 2003). Os efeitos do estrogênio no metabolismo de proteoglicanos incluem inibição da síntese de moléculas da matriz extracelular pelas células mesenquimais (BARCHIESI et al, 2002), e uma regulação da expressão de enzimas degradativas de proteoglicanos / GAG (XU et al, 2007). Em conjunto, estes efeitos podem aumentar a degradação de proteoglicanos e a produção de metabólitos. Portanto, a ação destes efeitos no trato urinário são 17 compatíveis, pelo menos em parte, com o aumento da excreção de GAG nas usuárias de ACHO. Em estudo com ratas ooforectomizadas, DEUS et al (2003) observaram que a concentração de GAG total na parede da bexiga foi menor em 40% e as proporções de GAG sulfatados foram diferentes. O tratamento dos animais com um estrogênio ou uma progesterona teve pequeno ou nenhum efeito nestas alterações. Entretanto, quando os dois hormônios foram combinados, a concentração e composição de GAG da parede vesical foi completamente restabelecida. Estes achados sugerem que hormônios combinados agem sinergicamente promovendo uma elevada síntese de proteoglicanos na parede da bexiga. Como o protocolo de tratamento naquela investigação simula os ACHO combinados, pode-se especular que estes medicamentos levam a um aumento de acúmulo de proteoglicanos na parede vesical. Além disso, em humanos há uma forte marcação imunohistoquímica para o condritin sulfato na parede vesical, especialmente no urotélio (SLOBODOV et al, 2004). Na medida em que turnover de proteoglicano urinário é a principal fonte de GAG urinário (LEE et al, 2003), estes achados proporcionam evidência adicional para nossos resultados mostrando um aumento da excreção de GAG e pode explicar a elevação do condroitin sulfato nas amostras de urina de usuárias de ACHO. A modulação do turnover de proteoglicanos por FSH e LH é geralmente relacionada com a ovulação, incluindo aumento da expressão do proteoglicano de condroitin sulfato versican no corpo lúteo (RICHARDS, 2005) e degradação de sulfato de heparan por heparanases durante ruptura folicular (KLIPPER et al, 2009). Adicionalmente, uma das progesteronas utilizadas em ACHO, a drosperinona, é conhecida por ter efeitos antiandrogênicos (PRACTICE COMMITTEE, 2008). Em útero de ratos, o androgênio leva à pronunciadas mudanças nas proporções de GAG (JI et al, 2008). Entretanto, os efeitos do FSH, LH e androgênios no trato urinário são pouco conhecidos. Ainda, devido aos seus vários efeitos nos proteoglicanos ovariano e uterino, os níveis suprimidos destes hormônios nas mulheres em uso de ACHO podem ter um impacto no turnover de proteoglicanos e podem estar implicados em mudanças no GAG urinário como descrito. As causas freqüentes de dor pélvica em mulheres incluem endometriose e cistite intersticial (ORTIZ, 2008). A fisiopatologia da endometriose possui uma clara influência hormonal, e dados clínicos recentes mostram que ACHO são eficazes no 18 tratamento da dor pélvica associada a esta patologia (HARADA et al, 2008). Embora não esteja esclarecido, a dor pélvica ligada à cistite intersticial parece estar relacionada a um defeito na camada urotelial na qual os componentes de GAG podem ser alterados (SLOBODOV et al, 2004; HAUSER et al, 2008). Consequentemente, compostos urinários infiltrariam a parede vesical e causariam reações inflamatórias e / ou estimulação nervosa que justificaria a maioria das manifestações clínicas da cistite intersticial (PARSONS, 2007; HAUSER et al, 2008). Um dos principais tratamentos para esta doença é, de fato, a administração oral ou tópica de GAG ou compostos similares ao GAG, os quais presumivelmente, restauram a camada urotelial (PARSONS, 2007). Interessantemente, existem evidências, embora limitadas a poucos pacientes, que ACHO melhoram os sintomas em mulheres acometidas por cistite intersticial (LENTZ et al, 2002), um achado que, novamente, está de acordo com nossos resultados. Sabe-se que uma concentração aumentada de GAG urinário protege o trato urinário contra infecção (STABELLINI et al, 1999). Por outro lado, o uso de ACHO pode ser um fator de risco para infecção urinária em mulheres jovens (FINER; LANDAU, 2004). Este dado não está de acordo com os resultados deste trabalho que mostram uma excreção de GAG aumentada em mulheres usuárias destas medicações. Uma explicação possível é que o uso de ACHO está também associado a outras mudanças no trato urinário, tais como alteração do epitélio e baixo fluxo sanguíneo, que favorecem a infecção (PINGGERA, 2005). Outra desordem que pode ser prevenida pelo aumento da excreção urinária de GAG é a litíase urinária (BOEVÉ et al, 1994; GOHEL; SHUM; TAM, 2007). Embora nenhuma correlação tenha sido realizada até então entre uso de ACHO e a incidência de cálculo no trato urinário, tendo em vista os resultados deste experimento, há um potencial deste benefício com uso destas medicações. Os efeitos protetores dos GAG discutidos acima são principalmente devido às interações específicas entre estes poliânions e outras moléculas ou superfície celular. A afinidade desta interação pode variar dependendo das características estruturais das cadeias de GAG, tais como carga e densidade (CARDOSO; MOURÃO, 1994). Tipicamente, a taxa de densidade do HS é menor, enquanto que CS é maior (CARDOSO; MOURÃO, 1994). De acordo com os resultados deste trabalho, em mulheres usuárias destes ACHO, a concentração urinária de HS é menor, enquanto que a do CS é próxima do 19 dobro. Consequentemente, estas alterações juntamente com o aumento de GAG total, indicam que o uso de ACHO aumenta o efeito protetor do GAG urinário. Apesar da significância estatística dos achados deste experimento, um estudo dos efeitos dos ACHO nos GAG urinários se beneficiaria de uma amostra maior de doadoras de urina. Isto poderia mostrar, por exemplo, que a excreção urinária de GAG total é significativamente maior em usuárias de outros ACHO, em adição àquelas mostrados no presente estudo. Neste trabalho, investigou-se uma forma de apresentação farmacológica e as formulações de ACHO mais comumente usadas. Entretanto, na perspectiva de potenciais vantagens do aumento da excreção de GAG urinário, valeria a pena determinar se outras apresentações, como o transdérmico, vaginal, implante, e injetável, influenciam na excreção de GAG. Neste experimento, verificou-se que ACHO combinado, um método contraceptivo largamente usado, possui benefícios adicionais à saúde por alterar a excreção urinária de GAG. Contudo, conhecimentos mais precisos sobre estes efeitos no metabolismo de proteoglicanos requerem experimentos nos quais os hormônios sejam testados separadamente. Em conclusão, este estudo verificou que o uso de ACHO combinado aumenta a quantidade e modifica a composição de GAG urinário. Estas moléculas têm efeito protetor contra desordens do trato urinário tais como urolitíase e cistite intersticial e este padrão alterado de excreção de GAG urinário deve, portanto, aumentar seus benefícios. 20 CONCLUSÔES Os valores de excreção urinária de GAG total na primeira e segunda metades do ciclo menstrual de mulheres jovens usuárias de anticoncepcional oral hormonal são similares. A excreção urinária de GAG total é maior nas usuárias de anticoncepcional oral hormonal em relação às não usuárias. As proporções das espécies de GAG excretadas na urina de mulheres que utilizam anticoncepcional oral hormonal estão alteradas em relação às mulheres não usuárias. Há um aumento na excreção de condroitin sulfato e uma diminuição do heparan sulfato e dermatan sulfato. 21 APÊNDICE A. FICHA CADASTRAL INDIVIDUAL (QUESTIONÁRIO). NOME: CÓDIGO: TELEFONE: CELULAR: RESIDÊNCIA: E-MAIL: ANTICONCEPCIONAL EM USO: DATA DA ÚLTIMA MENSTRUAÇÃO: IDADE: COR: ( ) BRANCA ( ) NEGRA PESO: ALTURA: ( ) PARDA IMC: ESTADO CIVIL: ( )SOLTEIRA ( )CASADA ( )SEPARADA JUDICIALMENTE ( )VIVE MARITALMENTE ESCOLARIDADE: ( ) SUPERIOR ( ) MÉDIO ( ) PRIMÁRIO QUANTO TEMPO USA ACO: ( )até 1 MÊS ( )1 a 3 MESES ( ) 3 a 6 MESES ( ) > 1 ANO QUANTO TEMPO USA ESTE ACHO: PROBLEMAS GINECOLÓGICOS PRÉVIOS: ( ) SIM ( ) NÃO QUAL(IS)? DATA: CIRURGIAS PRÉVIAS: ( ) SIM ( ) NÃO QUAL(IS): USO DE MEDICAÇÃO CONCOMITANTE:( ) SIM ( ) NÃO NOMES: TEMPO DE USO: PROBLEMA RENAL PRÉVIO: ( ) SIM ( ) NÃO QUAL (IS): LITÍASE RENAL: ( ) SIM ( ) NÃO HÁBITO ALIMENTAR: ( ) VEGETARIANO RESTRITO ( ) NORMAL COM PROTEÍNA ANIMAL 22 APÊNDICE B. CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO. Unidade de Pesquisa do Sistema Urogenital. Departamento de Anatomia. Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ. CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Prezada Sra., Como é de seu conhecimento, Sra irá fazer parte como voluntária de uma pesquisa científica. Nós fazemos parte de uma equipe reconhecida internacionalmente no meio médico-científico, e estamos no momento realizando um estudo sobre a excreção de certas substâncias que ocorrem normalmente na urina. Entre os diversos aspectos que estão sendo abordados nesse estudo, inclui-se a análise de amostras de urina obtidas durante o ciclo menstrual em usuárias de contraceptivo hormonal oral. Gostaríamos de solicitar, portanto, que a Sra. tenha a gentileza de nos doar algumas amostras de sua urina, que serão colhidas por você mesma e em sua própria casa, durante 01 (um) ciclo menstrual , conforme instruções em anexo. As amostras de urina serão submetidas ainda a testes de elementos anormais e sedimento e dosagem da creatinina urinária. É importante deixar claro que, caso Sra. decida fazer a doação, os resultados de nossos estudos, assim como os resultados destes exames estarão disponíveis para o seu conhecimento. Eu, ______________________________________________________ (NOME COMPLETO EM LETRA DE IMPRENSA) declaro estar ciente do que foi exposto acima e autorizo a utilização, para fins científicos, das amostras de urina que estou doando. _____________________________________________ Rio de Janeiro, (ASSINATURA: VOLUNTÁRIA) / / _____________________________________________ Rio de Janeiro, (ASSINATURA: PESQUISADOR) / / _____________________________________________ Rio de Janeiro, (ASSINATURA: TESTEMUNHA) / / 23 APÊNDICE C. CARTA DE APRESENTAÇÃO AO PROJETO DE PESQUISA. CARTA DE APRESENTAÇÃO AO PROJETO DE PESQUISA Prezada colega, Primeiramente, gostaria de expressar meus agradecimentos por você ter se prontificado a colaborar com nosso projeto de pesquisa. No entanto, para que você possa realmente participar desse estudo, você não pode estar atualmente com nenhuma das seguintes características: (a) infecção urinária diagnosticada por médico; (b) diabetes; (c) litíase renal; e (d) grávida e) deixar de ser usuária de anticoncepcional oral hormonal. Se você apresenta uma ou mais dessas características, não escreva nada sobre esta folha de papel e devolva-a à pesquisadora que apresentou o projeto. Como já foi explicado, esse projeto de pesquisa tem por objetivo caraterizar o padrão de excreção urinária de um metabólito do tecido conjuntivo. Esse metabólito advem de uma glicoproteína que tem efeito protetor sobre o epitélio da bexiga, e os resultados desse estudo permitirão uma melhor compreensão de uma doença chamada cistite intersticial, a qual incide muito mais em mulheres do que em homens. Esse estudo faz parte do projeto de tese de mestrado da Dra. Mary Juciane Galvão Zamboni, que é ginecologista do Hospital Alcides Carneiro e minha orientanda no Programa de Pós-Graduação em Fisiopatologia e Ciências Cirúrgicas do Centro Biomédico, UERJ. Nós já realizamos um trabalho dentro dessa linha de pesquisa, que teve a participação voluntária de alunas da UERJ, e que resultou na publicação do seguinte artigo: Maroclo MVO, Pereira SD, Sampaio FJB, Cardoso LEM. Urinary glycosaminoglycan excretion during the menstrual cycle in normal young women. Journal of Urology 2005; 173: 1789-1792 A sua participação no presente projeto se limita, inicialmente, a responder a um simples questionário que se encontra no verso desta página. É fundamental, no entanto, que as respostas sejam exatas e você esteja segura delas. Não há necessidade de você responder e devolver de imediato o questionário, e caso haja dúvidas com relação a certas perguntas, você pode entrar contato com a Dra. Mary nos seguintes locais: Hospital Alcides Carneiro, Serviço de Ginecologia : terças, quartas e sextas (8:00 às 12:00), e sextas (13:00 às 16:00). Laboratório do Prof. Luiz E.M. Cardoso, Departamento de Anatomia, Centro Biomédico, térreo (ramal 6117): quartas (15:00 às 18:00). Gostaria de deixar claro que os questionários serão manuseados e analisados exclusivamente por mim e as pessoas acima citadas, e a identificação com seu nome e outros dados pessoais servirá apenas para que, eventualmente, possamos entrar em contato com você em uma fase mais posterior do estudo (ver abaixo). O questionário respondido deverá então ser devolvido conforme combinado. Você pode também devolvê-lo diretamente a mim, em meu laboratório, situado no Departamento de Anatomia, Centro Biomédico (térreo). A colheita da urina poderá ser feita na própria residência da participante, e a doação dessas amostras encerra a participação das alunas nesse estudo. Atenciosamente, 24 APÊNDICE D. SOLICITAÇÃO DE AMOSTRAS DE URINA PARA PROJETO DE PESQUISA. SOLICITAÇÃO DE AMOSTRAS DE URINA PARA PROJETO DE PESQUISA Prezada colega, O seu questionário foi recebido. Como já foi mencionado na carta de apresentação do projeto, nós agora solicitamos que você colha, em sua própria residência, um total de seis amostras diárias de urina, caso você esteja fazendo uso de anticoncepcional oral hormonal. Essas amostras deverão ser colhidas nos dias 6, 7, 8, 20, 21, e 22 do ciclo menstrual, considerando-se como dia de número 1 o primeiro dia de sangramento. A fim de facilitar o seu controle durante a colheita, nós incluímos abaixo uma tabela em que o ciclo menstrual está numerado do dia 1 ao 22. Para utilizá-la, nós sugerimos que você aguarde que o próximo ciclo menstrual se inicie. Basta então você colocar a data (dia/mês) do primeiro dia de sangramento abaixo do dia 1 do ciclo, e depois preencher todos os demais espaços para datas. Você saberá assim em que dias deverá colher as amostras. Para a colheita das amostras de urina, a Dra. Mary, entregará a você um kit contendo seis garrafas de 500 ml marcadas com os números 6, 7, 8, 20, 21, e 22. O kit também contém um funil, que você utilizará para colher a urina diretamente para dentro da garrafa. Cada amostra consistirá sempre da primeira urina da manhã, a qual deverá ser colhida após assepsia (higiene) local, um procedimento de rotina para exames laboratoriais. Despreze então o primeiro jato e colha a urina em garrafa marcada com o número correspondente ao dia do ciclo. O volume de urina deve ser o máximo possível, embora não haja necessidade de se passar da metade da garrafa. A amostra de urina deve ser logo em seguida congelada, e após a colheita das seis amostras, as garrafas devem ser entregues em meu laboratório na UERJ (Departamento de Anatomia, Centro Biomédico, térreo), ou Mary, juntamente com o presente formulário preenchido. Pedimos que você entregue as amostras no início da manhã, pois é importante que as urinas permaneçam sempre em temperatura baixa. Se você mora longe da UERJ, é aconselhável isolar mais as garrafas durante o transporte, como por exemplo, com vários sacos de plástico. Você pode também, caso seja mais conveniente, trazer as garrafas em grupos de três. Serão feitas as seguintes análises em suas amostras de urina: (a) EAS (exame de urina de rotina); (b) potássio; (c) creatinina; e (d) metabólito de glicoproteína do tecido conjuntivo. Os resultados dessas análises estarão a sua disposição em nosso laboratório, e caso algum exame esteja muito alterado, você será prontamente informada. No entanto, devido à natureza desse projeto, nós não podemos garantir que esses exames serão feitos imediatamente após a entrega das amostras de urina. Lembramos que, assim como no preenchimento do questionário, é fundamental que você siga as instruções acima com exatidão e rigor. Por fim, e mais uma vez, agradecemos sua valiosa colaboração na realização desse projeto. Atenciosamente, 25 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRAMS P., CARDOZO L., FALL M., al e. The standardization of terminology of lower urinary tract function: report from the Standardization Subcommittee of the International Continence Society American Journal of Obstetrics and Gynecology. 2002;187:116-26. ALBERTS B. Extracellular matrix. 3rd ed. New York: Garland Publishing Inc. 1994. BARCHIESI F., JACKSON E.K., GILLESPIE D.G., al e. Methoxyestradiols mediate estradiol-induced antimitogenesis in human aortic SMCs. Hypertension. 2002;39:874. BATRA S., IOSIF L.S. Progesterone receptors in the famale lower urinary tract. Journal of Urology. 1987;138:1301-4. BISHOP J.R., SCHUKSZ M., ESKO J.D. Heparan sulphate proteoglycans fine-tune mammalian physiology. Nature 2007;446:1030-7. BOEVÉ E.R., CAO L.C., VERKOELEN C.F., ROMIJN J.C., de BRUIJN W.C., F.H. S. 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