TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL
RESOLUÇÃO N? 22.228
CONSULTA N* 1.221 - CLASSE 5* - DISTRITO FEDERAL (Brasília).
Relator originário: Ministro Carlos Ayres Britto.
Redator para a resolução: Ministro Marco Aurélio.
Consulente: Magno Pereira Malta, senador.
Advogado: Dr. Herbert Leite Duarte.
INELEGIBILIDADE - NORMAS - NATUREZA.
As normas que versam sobre a inelegibilidade são de
natureza estrita, não cabendo interpretá-las a ponto de
apanhar situações jurídicas nelas não contidas.
CÔNSUL HONORÁRIO DE PAÍS ESTRANGEIRO DESINCOMPATIBILIDADE PARA CANDIDATAR-SE
A CARGO ELETIVO - DESNECESSIDADE.
>rdem jurídica em vigor não impõe a
desínfcompatibilização de cônsul honorário de país
estrangeiro para candidatar-se a cargo eletivo.
Resolvem o i ministros do Tribunal Superior Eleitoral,
por maioria, (vencidos o Reljator e os Ministros José Delgado e Caputo
Bastos,
responder
à
consulta
no
sentido
da desnecessidade
de
desincompatityilização, nos termos do voto do Ministro Marco Aurélio.
Sala de Sessões do Tribunal Superior Eleitoral.
Brasília, G de junho de 2006.
PRESIDENTE E REDATOR
PARA A RESOLUÇÃO
Ctan^L221/DF.
2
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO CARLOS AYRES BRITTO: Senhor
Presidente, trata-se de consulta formulada pelo Senador Magno Pereira
Malta, vazada nos seguintes termos:
•(.«)
1. Cidadãos Brasileiros, desempenhando no Brasil o Cango
de Cônsul Honorário de País Estrangeiro necessita de
desincompatibilizar-se para se candidatar a Cargo eletivo de
Governador ou não?
II. Caso afirmativo - o que se admite apenas para argumentar qual seria seu prazo de desincompatibilizaçâo?
( . . . ) " •
2. O relator originário, eminente Ministro Marco Aurélio,
determinou o encaminhamento do processo à Assessoria Especial da
Presidência (AESP) (fl. 12), que emitiu o parecer de fls. 15-18, sugerindo o
"seu conhecimento, por preencher os pressupostos de admissibilidade
nesta Corte, dando-se resposta negativa quanto à necessidade de
desincompatibilizaçâo de cônsul honorário para fins de candidatura ao
cargo de governador''.
3. Prossigo no retrospecto da questão para dizer que, em
19.5.2006, os autos me vieram conclusos, por redistribuição, tendo em vista
a assunção do Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio na Presidência desta Corte
(fl. 21).
É o relatório.
G
3
Ctan2 1.221/DF.
VOTO (vencido)
O SENHOR MINISTRO CARLOS AYRES BRITTO (relator):
Senhor Presidente,
4. Inicialmente, é de se considerar legitimado o senador da
República para formular consulta sobre matéria eleitoral, por se tratar de
autoridade com jurisdição federal (art. 23, inciso XII, do Código Eleitoral),
conforme já decidiu este Tribunal (Consulta n e 1.163/DF, rei. Min. Marco
Aurélio). Também de se notar que a consulta é versada em tese, como
ordena o mesmo dispositivo legal, razão pela qual é de ser conhecida.
5. Como bem ressaltado na zelosa manifestação da AESP,
da lavra da Doutora Maria Goretti dos S. Queiroz da Silva, com a
concordância da Doutora Eveline Caputo Bastos Serra, assessora-chefe, o
caso é de verificação da incidência, ou não, das exigências de
desincompatibilização para concorrer a pleito eleitoral, tendo como norte a
igualdade que deve existir entre os competidores e a vedação de uso da
máquina administrativa estatal em benefício de candidato.
6. De fato, é para o atingimento de tais fins que a
Constituição-cidadã impõe o afastamento de ocupantes de cargos públicos.
É o que se extrai do art. 14, § 6* dado que, para concorrer a outros cargos,
o presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito
Federal e os prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis
meses antes do pleito. Mais ainda, determina a Constituição que lei
complementar estabeleça outros casos de inelegibilidade e os prazos de
sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa e a moralidade
para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do cajfOidato,
assim como a normalidade e legitimidade das eleições contra a irjfluémcia
do poder económico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego
na administração direta ou indireta.
\
l
4
Ctan2 1.221/DF.
7.
Cumprindo
o
desiderato
constitucional,
a
Lei
5
Complementar n 64, de 18 de maio de 1990, estabeleceu várias hipóteses
de inelegibilidade pelo não-afastamento oportuno de ocupantes de certos
cargos e funções públicas e até mesmo privadas, tudo a configurar o
instituto jurídico da desincompatibilização.
8. Pois bem, nos termos da consulta, vê-se que a hipótese
é
de
exigência
de
desincompatibilização
de
cidadão
brasileiro
desempenhando, no Brasil, cargo de cônsul honorário de país estrangeiro.
Sendo certo que, de acordo com o parecer da Assessoria Especial, "tanto o
cônsul funcionário de carreira como o cônsul honorário defendem os
interesses do país que os nomeou, conduzindo-se de acordo com as
determinações
teçais
emanadas
peio
Estado
nomeante"
(fl.
16),
"a representação consular de um pais, por óbvio, somente a este este
vinculada" (f\. 17). Isto para concluir com os seguintes dizeres:
"(.-.) exigir desincompatibilização de cargo cujo exercício, por sua
natureza, não redunda em desequilíbrio de oportunidades entre
candidatos, seria incorrer em desvio de finalidade do instituto da
desincompatibilização, pois, in casu, a toda evidência, não se
vislumbra a eventualidade de uso da máquina administrativa
estatal brasileira em favor de candidato.
(...)" (A-18).
9. Bem vistas as coisas, é certo que nem a Constituição
nem a Lei Complementar n 5 64/90 prevêem a inelegibilidade pelo
não-afastamento, até certo prazo anterior às eleições, do brasileiro
ocupante do cargo de cônsul honorário de país estrangeiro. É verdade
também que não há, quanto à hipótese, o risco de uso indevido da máquina
administrativa estatal brasileira em benefício de candidato -
gerando
desigualdade na concorrência e ilegitimidade do processo eleitdral,\>ara
não falar em improbidade administrativa - , vez que o ocupante dolcargade
cônsul honorário de país estrangeiro não está vinculado a nenhum ente tia
administração pública brasileira.
\
\
5
Ctan*1.221/DF.
10. A despeito disso, é do meu pensar que a controvérsia
comporta análise por um outro ângulo, consistente em saber até que ponto
país estrangeiro pode influenciar o processo eleitoral brasileiro, tirando
proveito dos vínculos de identidade afetiva e cultural com os seus cônsules
honorários. Quero dizer: admitir que o ocupante de tal cargo, sem se
desincompatibilizar do exercício de sua função de representante consular
de país alienígena, possa candidatar-se a cargo público nacional em
eleições gerais já não é se expor ao risco de vir o aparato institucional
externo ser mobilizado em prol dos seus agentes honoríficos?
11. Penso que sim, até porque a Magna Carta Federal,
embora haja assegurado liberdade de criação, fusão, incorporação e
extinção de partidos políticos (art. 14, § 3^, inciso V, da CF), impôs que,
nessa organização partidária livre, fosse resguardadas, entre outros
importantíssimos valores, a soberania nacional (art. 17, capuí). Isso de
parelha com a proibição de recebimento de recursos financeiros de
entidade ou de governo estrangeiros, ou de subordinação a estes (art. 17,
inciso II).
12. Não se está, aqui, antecipando a certeza do uso da
estrutura do consulado do país estrangeiro para favorecer seu cônsul
honorário eventualmente candidato a cargo eletivo no Brasil. Mas se trata
de uma potencialidade de interferência que nos parece partilhar da natureza
daquelas que subjazem às incompatibilidades versadas na Constituição
Federal e na Lei Complementar n 2 64/90.
13. Respondida a primeira parte da consulta, resta-me
analisar a segunda: qual seria então o prazo de desincompatibilização do
brasileiro ocupante de cargo de cônsul honorário de pais estrangeiro,
cuidando-se da disputa do cargo de governador?
r\
14. Bem, como não há explícita previsão legal para p tema,
penso francamente válido o recurso à analogia. Mais precisamentéL tenno
como imperiosa a incidência da alínea / do inciso II do art. 1- aa Lei
6
Ctan*1.221/DF.
Complementar n e 64/90. Dispositivo esse especificamente versante sobre o
prazo de desincompatibilização para se concorrer a cargo de governador
quando o pretendente fizer parte de categoria dos "servidores públicos,
estatutários ou não, dos órgãos ou entidades da administração direta ou
indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e dos
Territórios, inclusive das fundações mantidas pelo Poder Público''. Caso
típico, então, de aplicabilidade do aforismo latino do ubi eadem ratio, ibi
eadem iegis dispositío, a se traduzir na conhecida fórmula: "onde existe a
mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de direito".
15. Isto posto, respondo à consulta nos seguintes termos:
a) cidadão brasileiro ocupante do cargo de cônsul honojáró de país
estrangeiro no Brasil tem que se desincompatibilizar para candidatar-se a
cargo eletivo; b) o prazo para tal desincompatibilização é cie trás meses
anteriores ao pleito.
16. É como voto.
\
J
\
1
7
C t a n ^ l .221/DF.
VOTO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (Presidente):
Vou pedir vénia ao relator para divergir, com base na premissa do voto que
proferi há pouco.
As regras de inelegibilidade não podem ser interpretadas de
forma extensiva, a ponto de apanhar situações não contempladas e perdoe-me Sua Excelência - presumindo-se não o que normalmente
ocorre, mas o excepcional, no caso, a influência, que, considerada a
pessoa do candidato, poderá ser exercida pela nação estrangeira, até
mesmo mediante o empréstimo ou a dação de recursos. Se isto ocorrer, ai
sim, a glosa será em outra etapa.
Por isso, peço vénia ao relator para responder que não há a
necessidade do afastamento.
VOTO
O
SENHOR
MINISTRO
CEZAR
PELUSO:
Senhor
Presidente, também peço vénia ao eminente relator. De um lado, esse
ponto de vista, com o devido respeito, é excessivamente estrito, e, de outro,
excessivamente expansivo. É excessivamente estrito, porque uma venera
honorífica não cria vínculo de subordinação com o governo estrangeiro nem
faz presumir percepção de recursos desse governo; tampouco me parece
que laço de afetividade seja suficiente para caracterizar hipótese de
inelegibilidade, pois existe independentemente dos títulos honoríficos. Eu,
por exemplo, gosto muito dos meus descendentes italianos, e nem por isso
me sinto incomodado. É extremamente expansivo, por outro lado, porque a
regra do art. 17 da Constituição Federal diz respeito aos partidos pplítioos,
não propriamente a candidatos como tais.
Acompanho a divergência, com o devido respeito.
\
\
\
rt
8
Ctan* 1.221 /DF.
VOTO
O SENHOR MINISTRO CÉSAR ASFOR ROCHA: Senhor
Presidente, também peço vênia ao eminente relator para acompanhar a
divergência. Não vejo, data vénia, como aplicar o disposto no inciso II do
art. 17 da Constituição Federal à situação em análise.
VOTO (vencido)
O
SENHOR
MINISTRO
JOSÉ
DELGADO:
Senhor
Presidente, vou pedir vênia à divergência para acompanhar o Ministro
Carlos Ayres Britto. Penso que S. Exa. extraiu da ConstrMcão Federal
princípios que estão implícitos para resguardar a igualdade da participação
do pleito.
1
\
9
Ctan^1.221/DF.
VOTO (vencido)
(sem revisão do orador)
O
SENHOR
MINISTRO
CAPUTO
BASTOS:
Senhor
Presidente, também peço licença à divergência para acompanhar o
eminente relator, aplicando no caso a mesma simetria que aplicamos na
consulta a que respondemos com relação aos diplomatas de carreira
brasileira.
De maneira que também peço licença para acompanhar
Sua Excelência.
VOTO
O SENHOR
MINISTRO GERARDO GRO&SlX Senhor
Presidente, peço vénia ao relator para acompanhar a divergência.
\
10
CtartM.221/DF.
EXTRATODAATA
Cta n^ 1.221/DF. Relator originário: Ministro Carlos Ayres
Brítto. Redator para a resolução: Ministro Marco Aurélio. Consulente: Magno
Pereira Malta, Senador (Adv.: Dr. Herbert Leite Duarte).
Decisão: O Tribunal, por maioria, respondeu à consulta no
sentido da desnecessidade de desincompatibilizaçáo, na forma do voto do
Ministro Marco Aurélio (Presidente). Vencidos os Ministros Relator, José
Delgado e Caputo Bastos.
Presidência do Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio. Presentes
os Srs. Ministros Cezar Peluso, Carlos Ayres Brítto, César Asfor Rocha,
José Delgado, Caputo Bastos, Gerardo Grossi e o Dr. António Fernando
Souza, procurador-geral eleitoral.
SESSÃO DE 6.6
CERTIDÃO DE PUBLICAÇÃO
Certifico a pnlriicaçáo desta resolução no D i á r i o
da Justiça d e Êâ-OfLtítfL**
Eu»
/accb
&n^JÉ>
UM.MJLL—•
l a v r e i a presente c e r t i d ã o *
Download

RESOLUÇÃO N? 22.228 CONSULTA N* 1.221