Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Lato Sensu em Relações Internacionais e Diplomáticas da América do Sul Trabalho de Conclusão de Curso Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Lato Sensu em Relações Internacionais e Diplomáticas da América do Sul Trabalho de Conclusão de Curso TRÁFICO DE PESSOAS: COMO A SITUAÇÃO É VISTA E ESTUDADA NO MOMENTO DA GLOBALIZAÇÃO, NO ÂMBITO NACIONAL E INTERNACIONAL Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Lato Sensu em Relações Internacionais e Diplomáticas da América do Sul Trabalho de Conclusão de Curso TRÁFICO DE PESSOAS: COMO A SITUAÇÃO É VISTA E ESTUDADA NO MOMENTO DA GLOBALIZAÇÃO, NO ÂMBITO Autor: Monique Carvalho Pettasse de Souza NACIONAL E INTERNACIONAL Orientador: Prof. Msc. Creomar Lima Carvalho de Souza Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Lato Sensu em Relações Internacionais e Diplomáticas da Autor: Monique Carvalho Pettasse de SouzaÉ VISTA E TRÁFICO DE PESSOAS: COMO SITUAÇÃO América do A Sul Orientador: Msc. Creomar Carvalho de Souza ESTUDADAProf. NO MOMENTO DA Lima GLOBALIZAÇÃO, NO ÂMBITO Trabalho de Conclusão de Curso NACIONAL E INTERNACIONAL Autor: Monique Carvalho Pettasse de Souza Orientador: Prof. Msc. Creomar Lima Carvalho de Souza TRÁFICO DE PESSOAS: COMO A SITUAÇÃO É VISTA E Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Autor: Monique Carvalho deeSouza ESTUDADA NO DAPettasse GLOBALIZAÇÃO, NO ÂMBITO Lato Sensu emMOMENTO Relações Internacionais Diplomáticas da Orientador: Prof.NACIONAL Msc. Creomar Lima Carvalho de Souza E INTERNACIONAL América do Sul Trabalho de Conclusão de Curso Brasília - DF de Souza Autor: Monique Carvalho Pettasse 2013 Orientador: Prof. Msc. Creomar LimaACarvalho de ÉSouza TRÁFICO DE PESSOAS: COMO SITUAÇÃO VISTA E ESTUDADA NO MOMENTO DA GLOBALIZAÇÃO, NO ÂMBITO - DF de Autor: Monique Carvalho Pettasse Souza NACIONAL E INTERNACIONAL Pró-Reitoria de Brasília Pós-Graduação e Pesquisa 2 Artigo autoria de Monique Carvalho Pettasse de Souza, intitulado “Tráfico de Pessoas: como a situação é vista e estudada no momento da globalização, no âmbito Nacional e Internacional”, apresentado como requisito parcial para obtenção de Especialista em PósGraduação Lato Sensu em Relações Internacionais e Diplomáticas da América do Sul da Universidade Católica de Brasília, em 23 de setembro de 2013, defendido e aprovado pela banca examinadora abaixo assinada. Prof. MSc. Creomar Lima Carvalho de Souza Orientador Prof.Coord Thiago Gehre Prof. MSc. Tagory Figueiredo Brasília 2013 3 MONIQUE CARVALHO PETTASSE DE SOUZA TRÁFICO DE PESSOAS: COMO A SITUAÇÃO É VISTA E ESTUDADA NO MOMENTO DA GLOBALIZAÇÃO, NO ÂMBITO NACIONAL E INTERNACIONAL Trabalho de Conclusão de Curso ao Programa de Pós-Graduação Lato Sensu em Relações Internacionais e Diplomáticas da América do Sul da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para a obtenção do certificado de Especialista. Orientador: Prof. MSc. Creomar Lima Carvalho de Souza Brasília 2013 4 TRÁFICO DE PESSOAS: COMO A SITUAÇÃO É VISTA E ESTUDADA NO MOMENTO DA GLOBALIZAÇÃO, NO ÂMBITO NACIONAL E INTERNACIONAL 1. INTRODUÇÃO Nas últimas décadas, o tráfico internacional de seres humanos, vem sendo um crime que se encontra integrado ao ambiente internacional contemporâneo e que continua em constante crescimento. Passando ater também, outras finalidades: como tráfico de crianças para adoção e exploração sexual, tráfico para remoção de órgãos e tráfico para trabalho forçado. Impulsionado por vários motivos, como, por exemplo, economia e política fragilizadas de alguns países, poucas oportunidades de trabalho, acesso restrito à educação, facilidade e rapidez nos meios de transportes internacionais, falta de policiamento nas fronteiras, dentre outros, o tráfico internacional de pessoas, problema atual, porém preocupante, vem assumindo grandes proporções, necessitando, de forma urgente, despertar um alerta não só para nossas autoridades como também para população. Dentre as vítimas estão, preferencialmente, as mulheres jovens - 48% são menores de 18 anos, que são seduzidas por ofertas atraentes de emprego no exterior com rendas altas, moradias e alimentações inclusas, são usadas, na maioria, para indústria da pornografia e à exploração sexual. Através disso, será abordado neste presente artigo, duas vertentes principais relacionadas a este crime: primeiro faremos uma trajetória histórica para adquirir a presente caracterização; para depois mostrarmos o efeito atual em que a globalização vem fornecendo ferramentas para sua execução de forma transnacional. Assim, o documento apresentado, será dividido, por questões didáticas, em tópicos que vão desde a Introdução até Considerações Finais, seja abordando o surgimento da Organização dos Estados Americanos (OEA), da definição da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, sobre o Conceito do Tráfico de Pessoas, do MERCOSUL e o Tráfico de Pessoas, e dos Desafios de Implementação a Carta de Iguaçu. Aplicados através de um estudo descritivo-analítico, que ocorreu mediante pesquisas bibliográficas, feitas por livros, artigos científicos, publicações especializadas e dados oficiais publicados na Internet. 5 Isso para mostrar que o tema move-se entre porções geográficas diversas desde os mais remotos períodos históricos, bem como que seu combate e prevenção vêm sendo cada vez mais difícil de ser aplicado. O trabalho irá se debruçar em seções, sobre o surgimento de uma Organização – a OEA; sobre o impulso propiciado pela globalização no mundo de hoje; as normas do MERCOSUL sobre a questão citada (Convenção de Palermo, Oficinas de Cooperação e Coordenação Policial do MERCOSUL), que propiciará uma explicação plausível acerca das diversas configurações apresentadas pelo tráfico de pessoas ao longo da história. Para que possamos fazer com que a situação se amenize, e também observar diferentes órgãos responsáveis pela “caça” aos aliciadores e por cuidados com as vítimas, apresentaremos alguns organismos que fazem as devidas providências em relação à segurança, seja elas INTERPOL, a Sub-Regional para América do Sul, dentre outras. A seguir, abordaremos as dificuldades e os desafios do MERCOSUL frente a esse tema e de que maneira os conduzem, seja por meio das análises de suas medidas ou por suas ações, além de esclarecer sobre os estudos dos Planos proposto pelo Brasil – sendo o I Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Brasil e o II Plano Nacional – através da análise de sua criação, de seus objetivos e de suas metas. E por fim, serão apresentadas as Considerações Finais sobre o Artigo proposto, sugerindo opções de como nossas autoridades poderão amenizar ou dissipar essa atividade criminosa mais absurda e repugnante de que se tem notícia - Tráfico de Seres Humanos. 2. A ORIGEM DA ORGANIZAÇÃO E SEUS DIREITOS Quando falamos sobre a ONU (Organização das Nações Unidas)1 e sobre os Direitos Humanos, não podemos esquecer-nos de destacar a OEA (Organização dos Estados 1 É um órgão que age como identidade própria, adota decisões de efeitos jurídicos variáveis, exerce amplas funções diplomáticas, possuem privilégios e imunidades, esposa inúmeras reclamações internacionais, conclui e registra acordos e tratados, estabelece outros órgãos internacionais, enfim, participa ativamente na formulação dos princípios e normas do direito internacional (TRINDADE, 2003) 6 Americanos). Que se trata de uma organização internacional governamental, que foi criada por um tratado internacional, pertencente ao direito internacional, por meio do artigo 52 da Carta das Nações Unidas, e que possui sua sede na cidade de Washington, nos Estados Unidos. Tem como membros 21 Estados fundadores, que participaram da elaboração, adoção e posterior ratificação da Carta, em 1948, sendo elas: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, República Dominicana, Equador, El Salvador, Estados Unidos, Guatemala, Haiti, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. Que após diversas outras discussões, incorporaram entre 1967 e 1990 mais 14 Estados: Antígua e Barbuda, Bahamas, Barbados, Belize, Canadá, Dominica, Granada, Guiana, Jamaica, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Sant Kitts e Nevis, Suriname e Trinidad e Tobago, totalizando hoje 35 Estados. Tendo em vista as diversas línguas faladas nos Estados membros, são idiomas oficiais o espanhol, o português, o inglês e o francês, idiomas estes originais da Carta, dos tratados interamericanos e da documentação oficial dos direitos dos seus órgãos. Possui seu organograma formado da seguinte maneira: a) Assembleia Geral (órgão supremo); b) Reunião de Consulta do Ministro das Relações Exteriores (órgão convocado em casos excepcionais); c) Conselhos (órgãos de representação governamental); d) Comissão Jurídica Interamericana; e) Comissão Interamericana de Direitos Humanos; f) Secretária-Geral (órgão central); g) Conferências Especializadas; e h) Organismos Especializados. Sua organização, como princípios, proclama os direitos fundamentais do ser humano, sem fazer distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo, sempre direcionado ao direito internacional.(ARRIGHI, 2004, p. 29-37). Segundo Trindade, a organização foi criada para tratar de certas questões “por meio de resoluções, dada a persistente dificuldade verificada na ratificação de tratados” (2003, p. 103). Essas resoluções sendo nada mais do que tratados recomendatórios do ponto de vista jurídico. De acordo com alguns conflitos que ocorrera na República Dominicana (1965-1966), e entre Honduras e El Salvador em 1969, foi necessário institui uma Comissão, que surgiu durante o desenvolvimento da OEA, e que ficou conhecida como Comissão Interamericana de 7 Direitos Humanos. Com a função de acordo com o artigo 106 da Carta da OEA: “de promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e de servir como órgão consultivo da Organização em tal matéria” (ARRIGHI, 2004, p. 52). Passando a ser então “dotada de base convencional, com um mandato não apenas de promoção, mas também de controle e supervisão da proteção dos direitos humanos” (TRINDADE, 2003, p. 107); fortalecendo como status jurídicos. Assim estabelecendo, em 1978, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, formando a Comissão (que são compostas por sete membros, todos Estados integrantes da OEA; que de acordo com a Assembleia Geral, são eleitos por quatro anos, podendo ocorrer uma reeleição uma única vez) e prevendo junto o estabelecimento de uma Corte Interamericana de Direitos Humanos. Que continuaria aplicando normas que vinham regendo com Estados que não fossem partes da Convenção e agora aplacaria aos Estados-Partes pertinentes da Convenção. Com o alcance do Sistema Interamericano, que fez com que houvesse o progresso do direito internacional, e transformasse a realidade negativa de antes. Desde o início, se havia estabelecido que os direitos humanos fossem uma obrigação essencial do Estado. Porém, com o passar dos anos de história da humanidade, o desrespeito aos direitos humanos se tornou uma forma muito abrangente, com isso se decidiu que segundo Arrighi,“a proteção dos direitos do ser humano deixaria de ser competência exclusiva de cada Estado e passaria a ser responsabilidade compartilhada internacionalmente” (2004, p. 110). A definição desta norma ficou decidida na Quinta Reunião de Consulta de Ministros das Relações Exteriores, que ocorreu na cidade de Santiago, no Chile, no ano de 1959. Mas que somente em 1967 se incorporou à Carta da OEA, através do Protocolo de Reformas de Buenos Aires, se tornando o artigo 106. Sendo assim, para que um caso seja apresentado até a Corte, é necessário que esteja de acordo com os requisitos estabelecidos: seja na descrição dos fatos; nas violações alegadas e respectivas vítimas; e que na indicação do Estado responsável e na descrição das gestões já tenha esgotado todos os recursos internos previstos a ação internacional ou que seja impossível de fazê-lo. Seguindo a todos esses pedidos, a denúncia segue para ser analisada e estudada por completo. A partir dessas definições podemos fazer um estudo profundo sobre o tema proposto. 8 3. CONCEITO DO TRÁFICO DE PESSOAS Definido e estabelecido as seguintes normas internacionais, podemos definir o que seria o conceito / definição do tráfico de pessoas. Para isso faremos uso da Organização dos Estados Americanos (OEA), da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (já apresentadas anteriormente), das Convenções das Nações Unidas e de literaturas correlatas para definir o tema. Existe uma definição convencional para este tema? De acordo com a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de pessoas, chamado de Convenção de Palermo, que aconteceu entre os dias 12 e 15 de dezembro de 2000, na Itália, que veio com o objetivo de promover a cooperação, junto com a promoção e o combate a Delinquência Organizada Transnacional, definiu-se como: “O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou a entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos” (decreto n. 5017 de 12 de março de 2004, em seu artigo 3º, alínea a). Com esta citação, podemos dizer que a definição do tráfico de pessoas, de acordo como é dito pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), está diretamente entendida como a aquisição de pessoas por meios impróprios seja através da força ou por fraude, sempre com o objetivo de exploração, não escolhendo classes sociais (pobre ou rico), nem raça ou qualquer outra religião. 9 E para isso considera-se o Tráfico, tal como se define no Protocolo, estruturado por três elementos básicos: Ação de captação, os meios utilizados, tais como a ameaça, uso da força ou outras formas de coação e o fim de exploração (NINA, Carlos, p. 19, 2010).2 3.1 UMA ABORDAGEM HISTÓRICA DO TEMA Quando falamos em Tráfico de pessoas, devemos primeiramente retomar ao que seria o ponto de partida da história do mundo. Para isso, de acordo com Ary Carneiro o tráfico de seres humanos é uma prática muito antiga, existindo desde a Antiguidade Clássica, passando pela Grécia e, posteriormente em Roma, onde obtinha prisioneiros de guerra para serem utilizados como escravos. Mais tarde, no período renascentista, por volta dos séculos XIV ao XVII, o tráfico ganhou feição de prática comercial (2009, p. 22). Em relação ao Brasil, podemos estabelecer que a prática ocorreu origem durante o período colonial (1500 a 1822), onde o tráfico negreiro – a trazida de escravos para o país – fizesse surgir à exploração laboral por meio da escravidão, seja de homens, mulheres ou crianças. Como dito anteriormente, a prática da exploração do ser humano com o intuito de ser explorada para uso doméstico, para trabalho infantil, exploração sexual ou até mesmo para a retirada de órgãos, vem ocorrendo desde os tempos do período de colonização, onde pessoas eram exploradas para fazer trabalhos que muitas vezes não eram de conhecimento inicial e sem chance de reverter à situação vivida. Tanto que se dava com muito destaque – com o uso das mulheres – o uso delas para a parte doméstica, seja no plantio, nas “Casas Grandes” para a cozinha dos mesmos, arrumação da casa, cuidados com os filhos dos donos de terra e principalmente para o uso sexual. 2 Imagem de referência em anexo no final do artigo. 10 Como cita Emilia Viotti, o “intercâmbio sexual entre senhor e a escrava deu margem a que se fixassem preferências por certos vícios e anomalias sexuais (masoquismo – sadismo), estimuladas pela situação que a escravidão criara” (p.16, 1998). Por se encontrar em péssimas condições, muitos desses escravizados durante anos, ou aceitavam essa triste realidade e se rendiam a exploração, morriam de desgosto ou eram assassinados ou se suicidavam por não aceitar a maneira como viviam. Até que, durante o processo final de colonização é possível ver que talvez a situação pudesse tomar outros rumos através da citação de Emília Viotti: A pressão estrangeira também se fizera sentir. A Inglaterra condicionava o reconhecimento da independência do Brasil à cessação do tráfico. A 23 de novembro de 1826, foi concluído um tratado entre a Inglaterra e o Império, pelo qual este se comprometia a restringir o tráfico e a suprimi-lo em março de 1830. Em 7 de novembro de 1831, foi ele interdito, impondo-se aos traficantes severas penalidades, ao mesmo tempo em que se consideravam libertos os negros que, a partir de então, entrassem no país. Mas as fazendas de café multiplicavam-se e exigiam cada vez mais negros. A lei permaneceu letra morta. A sociedade pactuou com a manutenção do tráfico e da senzala, a fraude acobertava-se. Foi necessário ainda esperar mais de meio século para que o regime da escravidão fosse extinto no Brasil (p. 20-21, 1998). Com o desenvolvimento do capitalismo, a relação com os novos meios de produção e a vinda de muitos europeus ao país, tornou-se impossível à manutenção dos quadros rígidos de exploração do sistema colonial tradicional no Brasil. Com isso, em 4 de setembro de 1850, o Parlamento do Império do Brasil, por dados de Carlos Nina, nos diz que: “Foi promulgada a lei nº581 que definitivamente proibiu o tráfico de escravos para o país e previa a apreensão dos escravos trazidos para o Brasil, mesmo que já desembarcados, o sequestro das embarcações e de outros bens pertencentes aos traficantes, julgamento rápido dos traficantes por juízes especiais, e liberdade para os africanos que foram objeto do tráfico” (p. 69, 2010). Assim, a fiscalização se tornou mais profunda, prendendo todos os responsáveis por esta prática e libertando aqueles que não mereciam o devido tratamento. Só então, em 13 de maio de 1888, a chamada Lei Áurea aconteceu, por decorrência não só de pressões externas (nesse caso a Inglaterra – dito anteriormente), mas também por 11 pressões internas. E também, devido às constantes fugas dos negros, a recusa do Exército em capturá-los e devolvê-los aos seus donos de terra (decreto de 6 de novembro de 1866 ) e principalmente por causa da concorrência da mão de obra dos imigrantes que estavam mais barata e abundante (pois os imigrantes fugiam da II Revolução Industrial e da unificação da Itália e da Alemanha – referência de Carlos Nina, Escravidão Ontem e Hoje, p. 86). Mas, será possível observar adiante que essa lei não extinguiu totalmente a forma do tráfico de pessoas e “sim passou de uma forma clássica para alternativas diversas sem solução de continuidade” (Lengellé-Tardy, p.13, 2002). 3.2 ABORDAGEM CONTEMPORÂNEA DO TRÁFICO DE PESSOAS Conforme passado o período do pós-Segunda Guerra Mundial, é possível caracterizar que a história sobre o tema passou por um vácuo de esforços, na qual diversos outros problemas, assuntos de low politics, e a Guerra Fria fizessem com que encobrisse a história, e se tornasse em virtude disso, como o papel secundário, deixando as questões sobre os direitos humanos em segundo plano. E somente retornando durante as diversas Convenções já mencionadas e passando pelo impulso do período de Globalização3. O tráfico hoje, em pleno século XXI, tornou-se uma prática mais organizada, formado por diversos grupos de delinquência organizada transnacional – tanto em âmbito nacional como internacional, afetando a ordem internacional. Como pontilha Doezema, em relação às discussões e definições acerca do tráfico de pessoas, “Que trataram exclusivamente do comércio global do sexo, resultaram na Convenção das Nações Unidas sobre a Supressão do Tráfico de Pessoas e a Exploração da prostituição dos outros, em 1949. Esta apresentou um viés de reprimir 3 Um processo de aprofundamento da integração econômica, social, cultural, política, que teria sido impulsionada pelo barateamento dos meios de transporte e comunicação dos países do mundo no final do século XX e início do século XXI. Um fenômeno gerado pela necessidade da dinâmica do capitalismo de formar uma aldeia global que permita maiores mercados para os países centrais (desenvolvidos) cujos mercados internos já estão saturados. É o que destaca Samuel P. Huntington. 12 o ato de prostituição, solidificando ainda mais a vinculação dessa espécie de tráfico com a prostituição e os preceitos advindos do discurso abolicionista. Salientando-se que até a adoção do Protocolo de Palermo de 2000, os preceitos abolicionistas que criminalizavam a prática da prostituição, permaneceram em voga, tendo em visa que a Convenção de 1949, apesar de sua inexpressividade, era o único tratado que abordava essa questão de forma plausível” (2002, p. 24). Sendo assim, foi necessária a existência de um instrumento de lei que tratasse da natureza de pessoas vulneráveis, que pudesse prevenir, reprimir e combater a forma como se vinha tratando mulheres, homens e crianças (menores de 18 anos), sabendo da inexistência de um instrumento universal que tratasse dessas questões. No entanto, durante o desenvolvimento do processo de criação da Declaração das Nações Unidas, foi definido que cada Estado Parte adotaria suas medidas legislativas, isto é, definiria o que seria ou não aplicado para cada delito ocorrido: “- inciso 2a: com sustentação aos conceitos básicos do ordenamento jurídico, a tentativa de comissão de um delito tipificado; - inciso 2 b: a participação como cúmplice na comissão de algum delito; - inciso 2c: e a organização ou direção de outras pessoas para a comissão de um delito”. (Artigo 5, do anexo II do Protocolo para prevenir, reprimir e sancionar o tratamento de pessoas, especialmente mulheres e crianças, complementando a Convenção das Nações Unidas contra a Delinquência Organizada Transnacional, p. 43, 2000). Através das medidas recomendativas da Declaração, adotadas a cada Estado, também foi estabelecido que os mesmos fossem responsáveis por proteger a privacidade e a identidade das vítimas que sofreram ou que sofressem o tráfico, prevendo sempre o sigilo dos atos judiciais de cada caso (Artigo 6 do anexo II), e também de aplicar medidas destinadas a recuperação física, psicológica e social de cada vítima sofrida, seja arranjando moradias específicas, assessorando a respeito dos seus direitos, assistência para qualquer emergência e dando a oportunidade de uma nova vida (dando emprego, educação). Isso sempre garantindo a segurança de todos. Para que isso ocorresse, era importante que os Estados estivessem sempre em cooperação entre si para que assim houvesse um intercâmbio de informações que muitas vezes ajudassem no combate ou na busca de vítimas ou aliciadores. Fosse através do controle fronteiriço por mar, por terra ou até mesmo por ar. 13 4. INTERNALIZAÇÃO DA CONVENÇÃO Depois da Declaração4 já vigorada, foi necessário que houvesse ações para a promoção de práticas e políticas que ajudassem no combate à prevenção. Pois o Estado que aceitasse a Convenção, neste caso o Brasil, poderia estabelecer-se da seguinte forma: - Havendo vigilância em portos, aeroportos e estradas federais; - Vigilância também em rede de computadores ou outras tecnologias; - Programas de investigação, seja pela Polícia Federal, ou de outros órgãos envolvidos; - Capacitação de todas as autoridades competentes, que estivessem envolvidas nas ações contra o combate ou na captura; - Aumento na assistência financeira a órgãos especializados, seja para compra de materiais, pagamento de pessoal, pois só assim estariam bem equipados para qualquer que fosse a eventualidade que pudessem enfrentar; - A celebração de alguns acordos, sendo bilaterais ou multilaterais, que ajudariam em determinados aspectos de combate. Retornando ao que foi dito, para que ocorram todas essas medidas, é preciso sim à cooperação de todos os que venham participar desta operação e sempre de acordo com o que foi estabelecido no Protocolo das Nações Unidas e na Convenção das Nações Unidas Contra a Delinquência Organizada Transnacional.5 (esta, sempre conectado com os chamados hard crimes: tráfico de drogas e o contrabando de armas de fogo). É importante que os atores internalizando os processos da Declaração das Nações Unidas, farão com que o processo de desenvolvimento flua de uma forma mais suave. Por exemplo, a forma com que o protocolo pode ser encontrado: em árabe, chino, espanhol, francês, inglês e em russo (no próprio site das Nações Unidas). Assim será acessível discutir a 4 Em relação à definição do Tráfico juntamente a Declaração das Nações Unidas, considera-se como pressuposto essencial para a ocorrência do referido crime, que seja comprovada ameaça, coerção, fraude, abuso de autoridade ou de situação de vulnerabilidade, bem como a oferta de vantagens para a obtenção do consentimento da vítima (ARY CARNEIRO, 2009, p. 59) 5 A partir do Protocolo de Palermo, serviu para apresentar como as migrações internacionais, o crime organizado, a globalização, as novas formas de escravidão, entre outros, aglutinassem a permear os contornos contemporâneos do crime do tráfico de pessoas. Ressaltando que o Brasil só ratificou a Convenção de Palermo e seus protocolos adicionais, em março de 2004. (ARY CARNEIRO, 2009, p. 44). 14 forma como será abordada e atualizada cada vez que o processo se modifique e todos possam ficar cientes de qualquer que seja a alteração feita durante cada encontro. 5. MERCOSUL E O TRÁFICO DE PESSOAS Através dos conceitos, convenções e outras medidas adotadas para discutir sobre o tema tráfico de pessoas, é possível saber se existe uma norma que se aplique somente aos países do MERCOSUL? É necessário que tenhamos ciência que anteriormente, antes da formação do MERCOSUL, todos os países membros viviam em desavenças. Que somente após a Guerra do Paraguai (1864-1870) foi que aconteceu a aliança da Argentina com o Brasil e Uruguai, e mais tarde o Paraguai. Graças a esta integração, o MERCOSUL foi capaz de se reunir e tratar de diversos temas relacionados uns com os outros, que nesse caso que estamos estudando, seria o tráfico. Para isso, foi necessário realizar uma Oficina que pudesse abrir um espaço de discussão entre países do MERCOSUL, Regiões e Estados sobre como combater esta prática. Assim, em abril de 2008, foi realizada na Tríplice Fronteira, na cidade de Foz do Iguaçu, com a participação da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, além dos adidos policiais da Espanha, Portugal e Reino Unido, a Primeira Oficina de Cooperação e Coordenação Policial no MERCOSUL para o Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Com estudos produzidos, por órgãos policiais e de segurança, entidades governamentais e órgãos internacionais, foi possível constatar que hoje a prática do tráfico de seres humanos vem sendo uma das infrações mais lucrativas após o tráfico de drogas. Pois como segundo Rodrigo Pena, se trata de um “comércio na qual se beneficia de lucros bilionários na exploração de uma mão-de-obra vulnerável como fator de produção na clássica dinâmica oferta e demanda” (p. 19, 2008). A OIT (Organização Internacional do Trabalho) no ano 2012 analisou um relatório na qual prevê o aumento de 12,9% em 2012 para 13,6% em 2018 no índice de desemprego da população da América Latina – principalmente entre os jovens de 19 a 25 anos – isso se deve às condições com que os jovens chegam ao mercado de trabalho, muitas vezes despreparados e sem nenhuma instrução. Abaixo podemos ver os dados desta análise: 15 Indíce de Desemprego na América Latina 14 13,5 Indíce de Desemprego América Latina 13 12,5 2012 2018 Deslumbrados com as facilidades das propostas que os aliciadores apresentam, as potenciais vítimas julgam ser essa a forma mais acessível, rápida e certa, criando um imaginário que faz vislumbrar uma nova vida cheia de oportunidades, tornando-as suscetíveis ao engano por traficantes bem treinados. 5.1 AÇÃO PRÁTICA DO MERCOSUL COM A FINALIDADE DE INTERNALIZAR A CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS Com a origem desta Oficina, fez também com que a integração regional do Cone Sul se harmonizasse e que fosse tratada de uma forma oportuna de sensibilização e de promoção ao diálogo entre as forças de segurança. Com isso, dividiram-se as normas em quatro passos lógicos fundamentais: - “A primeira como Base de Conhecimento, indica que não é possível cooperar sem que haja conhecimento prévio das estruturas de cada instituição envolvida, do arcabouço (sobretudo legislativo e judiciário) que norteia as operações dessas mesmas instituições (para isso é necessário um questionário), além de um conhecimento dos fluxos existentes e não existentes entre elas. Pois só assim, as informações serão sistematizadas para serem usadas como ferramentas no decorrer dos trabalhos da oficina” (p. 24, 2008). - A segunda, denominada Diálogo, “não está desconectada da etapa de acumulação de conhecimento, que é contínua, constantemente reavaliada, amadurecida e disseminada para todos os participantes presentes. Mas pode, também, ser denominada como fase intermediária entre a preparação e o produto final da oficina, isto é, um conjunto de proposições de como 16 preencher as lacunas que previnem uma melhor cooperação policial no Cone Sul no combate ao tráfico de pessoas” (p. 24-25, 2008). - No terceiro passo, intitulado Proposições, foi concretizada a Carta de Foz do Iguaçu, que é uma Carta onde se “sistematizou a identificação dos maiores desafios impostos à cooperação policial no MERCOSUL e as recomendações de como esses desafios poderiam ser contornados do ponto de vista das próprias forças envolvidas no dia-a-dia da realidade do tráfico de pessoas” (p. 25, 2008). - Como último passo, conhecido como Divulgação, serve para mostrar “a existência da cartilha, onde fala não só das proposições, como também sobre a experiência exitosa e inovadora que representou a oficina (em Foz do Iguaçu). Este material servirá de consulta e referência para os policiais, pelos „policymakers‟ do MERCOSUL e pelo grande público que forma o corpo cidadão de nossa nação” (p. 25-26, 2008). Porém, a utilização não é feita através de um bem comum, isso é, todos os países membros do MERCOSUL realizam suas finalidades de resolução de acordo com seu sistema de segurança pública, de forma distinta e relativamente isolada uma das outras, dificultando em relação ao avanço com que o crime organizado internacional vai crescendo. Conforme dissertação da citação de Rodrigo Penna, os direitos e a segurança devem ser desenvolvidas através de reflexões e estratégicas coordenadas entre si, por meio da compreensão a que se diferem. 5.1.1 A Carta será aplicada? Depois da formação da Carta de Iguaçu6, é preciso saber como usá-la e para isso veremos cada ponto importante a ser utilizada. No entanto, fica a dúvida: como será a forma mais correta de usá-la? Haja vista que em cada país do MERCOSUL, as funções de cada setor de segurança se diferem. Exemplo: A Argentina tem cinco órgãos responsáveis pela segurança (Polícia Federal Argentina, 6 Ao contrário da Convenção das Nações Unidas, onde pune quem desobedece, a Carta de Iguaçu, se trata somente de uma declaração de boas intenções. 17 Gendarmería Nacional, Prefectura Naval Argentina, Polícia de Seguridadad Aeroportuaria e Policiais Provinciais e Territoriais)7, o Brasil tem cinco (Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Ferroviária Federal, as Polícias Civis e Militares e o Corpos de Bombeiros Militares)8, o Paraguai tem um só órgão responsável (Polícia Nacional) 9, e o Uruguai também só conta com um único órgão (Polícia Nacional)10. A fim de minimizar essa dificuldade, existe como instrumento de auxílio, uma Organização que estabelece este equilíbrio, conhecida como a INTERPOL (Organização Internacional de Polícia Criminal – O.I.P.C), que foi criada com o objetivo principal de ser “o serviço único de comunicação policial em escala mundial” para o combate e prevenção da delinquência internacional, seja em coleta de dados, serviços, análise de informação policial, cooperação policial transfronteiriça e apoio em geral em diferentes missões. Para a área do MERCOSUL, o setor responsável ficou sendo a Oficina Sub-Regional para América do Sul. “áreas de trabalho delituais, analisar informações criminais; apoiar em investigações sobre fugitivos, delitos econômicos e financeiros, em delinquência organizada e narcotráfico... em segurança pública e terrorismo... em tráficos de seres humanos e pornografia infantil, e em delitos contra o meio ambiente” (p.37, 2008); além de dar apoio seja operacional ou administrativo junto a INTERPOL e de dar cursos de formação aos Países Membros do MERCOSUL. Com a operação conjunta entre os dois Órgãos, será sim possível utilizar as normas da Carta de Iguaçu de forma consciente e organizada. Mas para isso, é será necessário muita cooperação e apoio entre os Países Membros do MERCOSUL para que se possa conseguir, pouco a pouco, combater o tráfico humano. 7 Imagem das referências e funções em anexo no final do artigo Imagem das referências e funções em anexo no final do artigo 9 Idem 10 Idem 8 18 6. DESAFIOS DE IMPLEMENTAÇÃO DA CARTA Por meio das Oficinas, Convenções e Normas, podemos ver como vem sendo formuladas políticas que abordem cada vez mais o tema do tráfico de seres humanos. Mas para isso, devemos ter total conhecimento dos desafios que o MERCOSUL enfrenta em relação a este tema e quais as medidas ou ações que devem ser tomadas para se chegar a um fim devido. No âmbito do MERCOSUL há um tema na qual podemos destacar que pode ser considerado como um desafio – a dificuldade de desenvolver a harmonização da legislação entre os países membros. Cada um possui suas significativas particularidades e complexidades que faz com que se dificulte uma boa interação entre eles. Se houvesse um projeto por parte dos estudiosos agindo sobre isso, imagina-se que seria necessário mais ou menos uma década para ser formulado. Porque envolveria os maiores especialistas da aérea penal, internacional e constitucional. Necessitando analisar, criteriosamente, cada legislação dos países para saber o que se poderia reutilizar e o que se descartaria. Pois só assim haveria uma comunicação direta entre si e uma legislação que seria considerada como instrumento internacional, desta forma procurando-se evitar a existência de lacunas, onde as organizações criminosas pudessem se aproveitar e utilizarem para fugir da repressão e da lei. 19 Podemos visualizar o quadro dos tratados internacionais que o MERCOSUL enfrenta: Análise da dissertação Cooperação e Coordenação Policial no MERCOSUL e Chile para o Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – fonte de Márcia Anita Sprandel e Rodrigo Penna, p.63,2009. Outro desafio a ser destacado seria a dificuldade do recebimento de denúncias (porque a maioria das vítimas não de declara como tal e muitas vezes se recusa a depor, por medo de serem maltratadas ou por estarem ilegais no local), a pouca ou quase escassez de visibilidade do tema e do preconceito social (pois muitas pensam que possam ser ridicularizadas pela sociedade). Além disso, a dificuldade da língua, principalmente a língua portuguesa com o espanhol e o guarani (dialeto no Paraguai), faz com que a comunicação com os outros países fique bem restrita, atrapalhando qualquer investigação necessária. Outro óbice é a difícil tarefa de reunir documentação necessária entre os membros, pois as autoridades competentes responsáveis se diferem entre si, por exemplo: no Brasil, quem é responsável pela investigação é o delegado. Nos outros países do MERCOSUL, fica a critério dos fiscais do Ministério Público. Isso quando não “bate de frente” com as vias diplomáticas, meio de acesso bem mais restrito, prejudicando principalmente na agilidade das buscas entre países. Como já apontado, faz-se necessária que seja feita uma harmonização das legislações, de forma abrangente onde se possam abordar todas as suas dimensões, tanto no tema da exploração sexual, no trabalho forçado e também na remoção de órgãos. E que não se trabalhe 20 nos demais temas de formas distintas, pois o tráfico humano está totalmente interligado a esses três temas. 6.1 MEDIDAS E AÇÕES – I PLANO NACIONAL DE ENFRENTAMENTO AO TRÁFICO DE PESSOAS NO BRASIL Conhecido os diferentes desafios que o Brasil vem enfrentando junto ao MERCOSUL, foi necessária a formulação de uma lei nacional que tratasse do assunto e estipulasse diretrizes e ações a serem seguidas. Como assinala Oliveira, a relevância deste assunto que: Foi à primeira vez na história do país em que o movimento pela erradicação do trabalho escravo, aqueles preocupados com a situação dos migrantes brasileiros em situação irregular no exterior, o movimento contra a violência sexual de crianças e adolescentes, e o movimento feminista se uniram para pensar juntos sobre o tráfico de pessoas em suas diferentes modalidades e interfaces temáticas, e definir para seu enfrentamento (2007, p. 114). Com isso, surgiu no Brasil em 08 de janeiro de 2008 o I Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Brasil (PNETP), instituído pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva e pelo Ministro da Justiça, Jose Eduardo Cardoso, sendo delegado a um Grupo de Trabalho Interministerial (envolvendo Ministério da Saúde, da Educação, da Justiça, do Turismo, das Relações Internacionais e da Cultura) e a Órgãos Públicos Federais. Podemos tomar conhecimento do objetivo desse Plano por meio do Decreto nº 6.347 que define: “Prevenir e reprimir o tráfico de pessoas; responsabilizar os seus autores; e garantir atenção às vítimas, nos termos da legislação em vigor; dos instrumentos internacionais de direitos humanos e também da integração de diversos órgãos governamentais, sociedade civil e organismos internacionais. Documento redigido pelo Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo em 2008” (Barbara Campos, Cidália Sant´t Ana e Marina Oliveira, p. 98, 2008). Além de traçar três diretrizes: - Eixo Estratégico 1 – prevenção do tráfico de pessoas. 21 - Eixo Estratégico 2 – atenção às Vítimas (neste caso, está relacionado com as vítimas tanto aquelas que seguiram para fora do Brasil – brasileiras – quanto as que vieram traficadas para o nosso país – estrangeiras). - Eixo Estratégico 3 – Repressão ao Tráfico de Pessoas e Responsabilização de seus Autores. Este Plano teve a duração de dois anos e trouxe diversas recomendações para a construção do II Plano. 6.2 O II PLANO DE ENFRENTAMENTO AO TRÁFICO DE PESSOAS NO BRASIL O II Plano desenvolveu-se no ano de 2012, mas só entrou em vigor em 26 de fevereiro de 2013, dessa vez com a duração de quatro anos (2013-2016)11. A demora pela implementação deste II Plano, deu-se por motivo de período de consulta pública e da validação de 17 Ministérios. Onde este: “[...] material recolhido na etapa de consulta pública deu origem ao documento base para o II Plano... e que foi levado ao II Encontro Nacional de Rede de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, realizado em novembro de 2011, em Recife – Pernambuco; onde estiveram presentes diversos segmentos do governo e da sociedade civil para destacar as prioridades do II Plano” (Guia ETP, p.98, 2012). Neste novo Plano, surgiu como uma das metas aumentar mais de dez postos de atendimento em cidades de fronteiras (além das 13 já existentes) e em locais de grande circulação seja em portos, aeroportos e rodoviária, além da capacitação de 400 agentes para operar nos postos restantes, tendo tudo isso, um investimento de R$ 5,9 milhões de reais (reportagem G1.globo, com acesso em 01 de março de 2013). Seguem-se seus objetivos: 11 Imagem das referências e funções em anexo no final do artigo 22 I - ampliar e aperfeiçoar a atuação de instâncias e órgãos envolvidos no enfrentamento ao trafico de pessoas, na prevenção e repressão do crime, na responsabilização dos autores, na atenção às vítimas e na proteção de seus direitos; II - fomentar e fortalecer a cooperação entre órgãos públicos, organizações da sociedade civil e organismos internacionais no Brasil e no exterior, envolvidos no enfrentamento ao tráfico; III - reduzir as situações de vulnerabilidade ao tráfico, consideradas as identidades e especialidades dos grupos sociais; IV - capacitar profissionais, instituições e organizações envolvidas com o enfrentamento ao tráfico de pessoas; V - produzir e disseminar informações sobre o tráfico e as ações para seu enfrentamento; VI - sensibilizar e mobilizar a sociedade para prevenir a ocorrência, os riscos e os impactos do tráfico. (Decreto da Presidência da República, publicada no dia 05 de fevereiro de 2013 no Diário Oficial da União). Com o novo Plano, o governo garante que 100% das pessoas que forem identificadas no exterior, e sendo tituladas como “traficadas” (pessoas que concordam em serem assistidas por Organizações não governamentais e internacionais - Guia ETP, p.25, 2012), terá toda a sua situação monitorada, seus direitos de proteção legal assegurados, um atendimento jurídico e uma reparação civil por danos morais e materiais garantidos por direito. Para que tudo isso seja exequível, é fundamental que haja uma alteração ao Código Penal Brasileiro12. Pois segundo o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo: “o código só específica como crime de tráfico de pessoas aquele praticado para fins de exploração sexual”. E também é o que podemos ver, segundo Ary Carneiro, que: 12 Código Penal Brasileiro, em seu artigo 231, mesmo após a alteração realizada no ano de 2005 (onde foi modificado e apresentou dois aspectos eivados de inovação; um deles sendo a inclusão de outros possíveis sujeitos passivos para o tráfico de pessoas, que não apenas o de mulheres, e o outro de haver a modificação sobre a denominação de Tráfico Internacional de Pessoas) visando se adequar às diretrizes do Protocolo de Palermo, na qual refere-se apenas à questão da exploração sexual. 23 A legislação brasileira, de forma inaceitável, negligenciou tais recomendações e adotou uma redação descompassada com a nova configuração da prática de se traficar pessoas propagadas no mencionado tratado. Desta reforma do Código Penal pouco acrescentou no tocante a reprimir o tráfico de pessoas no Brasil, haja vista que se mostrou anacrônica e inconsistente, deixando a posição do judiciário em descompasso com os esforços internos de combate ao tráfico de pessoas em outras esferas (2009, p. 107). Porque na verdade o tema como vem sendo explorado ao longo deste Artigo, não abrange somente esta questão da exploração para meios sexuais. Para que seja caracterizado como crime é necessário que exista uma ação, um meio a ser seguido e um fim. É o que menciona o Protocolo de Palermo, diferente do que é usado nas investigações dos processos brasileiros, onde se diz que na Política Nacional de Enfrentamento, pelo Artigo 7º: “o consentimento dado pela vítima é irrelevante para configuração de processos”. Isso significa dizer que não necessariamente se precisa de uma ação, meio e fim para que seja investigado cada processo. Há também, como uma das ações feitas pelo governo brasileiro, onde na qual o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) formulou em 2004, a Portaria nº540, que diz: “[...] que existirá uma „lista suja‟, na qual cadastrarão os nomes de empregadores, pessoas físicas ou jurídicas que exploram o trabalho escravo e o tráfico de pessoas. Para que assim, todos tenham ciência de quem esta contratando. Se no período de dois anos na lista, não houver reincidência do crime e pendências trabalhistas, o nome é retirado do cadastro; ou da „lista suja‟ na qual estava” (NINA, Carlos, p. 140, 2010). Em linhas gerais, é importante ter cuidado como analisar cada caso. Pois como o governo brasileiro ainda não se prontificou em estabelecer uma só lei, deve ser analisado e solucionado, separadamente, cada ação que ocorra. Para cada uma, existe uma lei específica que ainda não segue caracterizada somente como tráfico de pessoas. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após a análise do tema - Tráfico de Pessoas – é possível dizer que o MERCOSUL ainda se encontra longe de se posicionar sobre essa questão social que acontecem nos países 24 membros. Deixando para que o Governo Federal Brasileiro - neste caso o país com a qual trabalhamos neste artigo – atue isoladamente, fazendo com que o avanço desse crime seja cada vez maior e que se torne uma forma econômica elaborada, abusiva e exploratória. Isso porque, como diz o autor Carlos Vieira Nina: “a escravidão / exploração se tornou inicialmente uma economia antiquada, que ressurgiu e que se desenvolveu nos países de civilização capitalista” (p. 23, 2010). Que a partir do Protocolo de Palermo, toda essa gama de temas, como o desenho contemporâneo das migrações internacionais, o crime organizado, a globalização (é sem dúvida, a grande facilitadora da atuação das redes criminosas internacionais, que traficam seres humanos, em escala global), novas formas de escravidão, entre outras, aglutinaram-se para permear os contornos contemporâneos do crime de tráfico de pessoas. E que no decorrer da pesquisa, podemos analisar a origem das Organizações (OEA e Comissão Interamericana de Direitos Humanos), depois entrar no conceito de tráfico, através de idéias e convenções. Posteriormente, analisar seu surgimento no Brasil (com a escravidão negreira), suas formas de ações e combate instituídos no país durante toda a sua história e no MERCOSUL, quais as leis e decretos que as justificam e quais os desafios que poderiam ser enfrentados, tanto no Brasil como nos países membros (Argentina, Uruguai e Paraguai). O trabalho serviu para mostrar então, como este tema sempre esteve presente na sociedade brasileira e no mundo e de como muitos aspectos existem para sua conscientização e para seu combate. Mas que, infelizmente, ainda é muito difícil falarmos de sua extinção. Há também que citar que durante a formulação dos Planos Nacionais de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Brasil I e II, foi definida uma matriz dos elementos do crime de tráfico de pessoas que ficou definido da seguinte forma: o ato como será escolhido às vítimas (seja dando alojamento, transporte, ou recrutando); os meios com que garantirão o silêncio das vítimas (através de ameaças, do uso da força, do abuso de autoridades, ou até do rapto de familiares) e qual será a finalidade da pessoa traficada (para exploração sexual, trabalho forçado ou extração de órgãos). Concluindo, esta pesquisa ajudou para mostrar estudos que foram realizados para aprofundar os conhecimentos sobre o assunto e ampliar a contribuição à sociedade brasileira, através de maiores esclarecimentos e informações dos meandros deste crime. Que a partir de agora, cidadãos esclarecidos e cientes dos perigos que podem conter uma despretensiosa oferta para viver no exterior são possíveis formas de se evitar o engano e, consequentemente, de não ser a próxima vítima do tráfico de pessoas. 25 Porque através desta análise feita, é possível ver por Thalita Ary Carneiro que o tema pode trazer Contribuição para as Relações Internacionais, em virtude da escassez de pesquisa que vinculam o tráfico de pessoas a esta área de estudo, tendo em vista que a maior parte das pesquisas já desenvolvidas em universidades brasileiras prioriza discussões direcionadas às esferas jurídicas e das Ciências Sociais. Assim trata-se de um tema muito fértil para o campo do conhecimento relativo às Relações Internacionais, englobando discussões na seara da proteção internacional dos direitos humanos, migrações internacionais, cooperação internacional e globalização (2009, p. 19). Pelo exposto, podemos por fim concluir que, o tráfico é considerado nada mais do que uma violação aos direitos humanos, seja no direito à vida, a liberdade e ao direito de não ser submetido à escravidão em nenhuma das suas formas. Por sua vez a adoção de uma abordagem Global que tenha em conta o combate em prol da diminuição do subdesenvolvimento, da pobreza, das desigualdades econômicas, a falta de educação, o êxodo rural, o comportamento sexual responsável dos adultos, certamente contribuirá, em muito, para podermos diminuir a grave ameaça que nos circunda. É necessário que se faça uma reformulação das ações de combate ao tráfico em âmbito regional para que a situação seja melhor enfrentada. 26 REFERENCIAS BIBLIGRÁFICAS ARY CARNEIRO, Thalita. O tráfico de pessoas em três dimensões: evolução, globalização e a rota Brasil-Europa. Brasília, 2009. ARRIGHI, Jean Michel. OEA: Organização dos Estados Americanos. Barueri - São Paulo, 2004, v. 4. Blog do Ministério da Justiça. Decreto cria comitê e coordenação tripartite para gestão ao Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Brasília. Disponível em: <http://blog.justica.gov.br/inicio/tag/politica-nacional-de-enfrentamento-ao-trafico-depessoas/> Acesso em: 01 mar 13. COSTA, Emília Viotti. Da senzala à Colônia. São Paulo, Fundação Editora da UNESP, 1998. DOEZEMA, Jo. Loose Women or Lost Women? The Re-Emermerge of the Myth of “White Slavery” in Contemporary Discourses of “Trafficking”. Gender Issue, nº 18 (1), p. 23-50, 2000. LENGELLÉ-TARDY, Maurice. La Esclavitud Moderna. Editora Bellaterra, Barcelona, 2002. MENDES, Priscilla. Reportagem: Cardozo pede agilidade a projeto que endurece crime de tráfico de pessoas. Brasília. Disponível em: <http://g1.globo.com/politica/noticia/2013/02/cardozo-pede-agilidade-projeto-que-endurececrime-de-trafico-de-pessoas.html> Acesso em: 26 fev 2013. MENEZES, Alfredo da Mota; PENNA FILHO, Pio. Integração Regional: Blocos Econômicos nas Relações Internacionais. Rio de Janeiro, Editora Campus, 2006. NAÇÕES UNIDAS. Guia de Convenção das Nações Unidas Contra a Delinquência Organizada Transnacional e seus Protocolos. Nova York, 2004. NINA, Carlos Homero Vieira. Escravidão ontem e hoje: aspectos jurídicos e econômicos. Brasília, 2010. 27 OLIVEIRA, Lucia Lippi. O Brasil dos imigrantes. Rio de Janeiro, Editora Jorge Zahar. 2002. OLIVEIRA, Maria. Iniciativa Global contra o Tráfico de Pessoas: o desafio de mobilizar a sociedade para o tema, sem simplificar o debate. In: LEAL, Maria Lúcia; LEAL, Maria de Fátima Pinto; LIBRÓRIO, Renata Maria Coimbra (Org). Tráfico de pessoas e violência sexual. Brasília: Violes/Unb, 2007. PITTS, Natasha. Reportagem: II Plano de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas está na iminência de ser aprovado, assegura diretora do Departamento de Justiça. São Paulo. Disponível em: <http://www.memorial.org.br/2012/09/vii-encontro-internacional-sobre- migracao-e-trafico-de-pessoas-na-america-latina/> Acesso em: 01 mar 13. Reportagem: Governo anuncia novo Plano de combate ao tráfico de pessoas. Disponível em: <http://g1.globo.com/politica/noticia/2013/02/governo-anuncia-plano-de-combate-ao- trafico-de-pessoas.html> Acesso em: 01 mar 2013. SPRANDEL, Márcia Anita; PENNA, Rodrigo. Cooperação e Coordenação Policial no MERCOSUL e Chile para o Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Brasília, 2009. TERESI, Verônica Maria. Guia de Referência para a Rede de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Brasil. Ministério da Justiça, Secretaria Nacional de Justiça, Brasília, 2012. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Direito das Organizações Internacionais. Belo Horizonte. Del Rey, 2003. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de direito internacional de direitos humanos. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1997, v. 1. UNODC (United Nations Office on Drugs and Crime/ Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes). Texto: UNODC sobre tráfico de pessoas e contrabando de imigrante. Disponível em:<http://www.unodc.org/unodc/en/human trafficking/index.html?ref=menuside> Acesso em: 24 fev 2013. VAZ, Alcides Costa. Cooperação, Integração e Processo Negociador: a construção do MERCOSUL. Brasília, IBRI, 2002. 28 ANEXOS Imagem 1 29 Imagem 2 30 Imagem 3 31 Imagem 4 32 Imagem 5