Prémio PLUG APRITEL * SPAM Comunicações electrónicas não solicitadas Vasco Arzich da Gama [email protected] Outubro 2008 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas Índice Sumário ............................................................................................................................................. 3 Porque é que o Spam é um problema? ....................................................................................... 3 As vantagens do Spam ................................................................................................................... 4 A lut a cont ra o Spam ...................................................................................................................... 5 i) Normas Sociais ........................................................................................................................ 5 ii) Auto Regulação ....................................................................................................................... 5 iii) Tecnologia ............................................................................................................................... 6 iv) Legislação ............................................................................................................................... 6 a) A proibição tot al do Spam ................................................................................................ 6 b) O sistema opt out ............................................................................................................... 7 c) O sistema opt in .................................................................................................................. 8 CONCLUSÃO .................................................................................................................................. 12 BI BLIOGRAFIA ............................................................................................................................... 13 2 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas Sumário A possibilidade de enviar mensagens electr ónicas, de f orma quase instantânea e com um custo extremamente reduzido, trouxe muitas vantagens e benefícios para os produt ores de bens, prestadores de serviços e para os comerciantes em geral. Mas também criou diversos problemas, para os quais tem sido difícil e complexo encontrar soluções. Ao envio de mensagen s publicitárias em massa pela internet sem o consentimento dos seus destinatários dá-se o nome de SP AM. Esta expressão, cuja origem é pouco relevant e para o tema dest e trabalho e muito menos para a sua solução, é sinónimo de perturbação da normal comunicação via internet entre os vários int erlocut ores. O objectivo dest e trabalho não é, naturalmente, resolver o problema do spam, mas chamar a atenção para um problema, cuja gravidade é inversamente proporcional à forma como é encarado e tratado pelos int ernautas e identificar as diversas fragilidades que a nossa lei revela no tratamento dest e t ema. Porque é que o Spam é um problema? O spam cor responde actualmente ao envio de milhões de mensagens electrónicas pela internet, cujo destinatário não solicit ou nem consentiu, mas que terá inevitavelmente que suportar, recepcionando-as na sua caixa de correio electrónico, para logo de seguida as eliminar. Em 2001 o spam correspondia a apenas 7% do tráfego mundial, em 2002 cresceu para 29% e em 2003 p ara 54%. Act ualmente estima-se que o spam ocupe mais de 90% 1 do tráfego de correio electrónico a nível mundial. O spam perturba a gestão do dia-a-dia dos seus destinat ários e constitui uma verdadeira invasão de privacidade. Estes recebem no seu computador milhares de mensagens que são muitas vezes enganosas ou fr audulent as, anunciando produtos e soluções milagrosas ou contendo mensagens com vírus ou com conteúdo violento, racist a ou pornográf ico. Apesar de já ser considerado ilegal por força da legislação nacional e comunitária relativa à publicidade enganosa, este t ipo de spam é mais grave nas situações em que o próprio conteúdo da mensagem é especialmente lesivo para o destinatário. 1 Estudo sobre segurança e medidas anti-spam, ENISA, Setembro 2007, www.icp.pt 3 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas Para o consumidor o spam não passa de lixo informático, que aumenta o tráfego da rede, ocupa espaço na sua caixa de correio e no seu computador, reduz a velocidade do tráfego, provoca perturbações no normal funcionamento das comunicações electrónicas e gera enormes custos com a gestão e eliminação dessas mensagens. Nos locais de trabalho os funcionários são obrigados a limpar sistematicamente as suas caixas de correio electrónico, o que se repercute de forma negativa na sua produt ividade. Por sua vez, as empresas são obrigadas a gastar recursos humanos e financeiros para solucionar o pr oblema, dotando os seus sistemas inf ormáticos de mecanismos e filtros anti-spam. Os ISP (Internet Service Providers) vêem-se obrigados a aumentar a largura de banda e o espaço nas caixas de correio elect rónico, para poder em manter a mesma velocidade de acesso e o mesmo nível de serviço, o que gera custos extraordinários que são inevitavelmente repercut idos nos consumidores. Um estudo de 2002 revelava que os cust os de trat ament o do spam nesse ano ascenderam a 8.900 milhões de dólares só nos EUA. Na Europa, de acordo com o Comissário Europeu responsável pelo pelouro Empresa e Sociedade de Informação, Erkki Liikanen, a perda de produtividade nas empresas da União Europeia foi estimada em cerca de 2.500 milhões de euros em 2002. 2 Em termos globais, os consumidores têm a percepção de que a maioria dos comerciantes presentes na internet é responsável pelo envio de spam, reduzindo assim de forma drástica a sua confiança no comércio electrónico. Aliás, este é muitas vezes apont ado como um dos principais obstáculos ao desenvolvimento do comércio electrónico. Aqueles que de forma legítima pretendem difundir os seus produtos através de mensagens publicit árias na inter net, deparam-se com a desconf iança dos consumidores e com o bloqueio das suas mensagens, pelos filtros anti-spam utilizados pelos consumidores e pelos servidores de correio electrónico. As vantagens do Spam O recurso ao envio de mensagens publicit árias pela internet é, de f acto, um meio muito ef icaz de publicitar produtos e serviços. Estas mensagens atingem em segundos milhões de destinatários, com um custo quase nulo, utilizando um suporte dinâmico, que possibilita a utilização de imagens e sons, altamente apelativo para o consumidor. 2 “União Europeia lança ofensiva contra o spam” in www.anacom.pt - Arquivo 2003. 4 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas O spam const itui assim uma grande font e de rendimento: para os produtores de bens e prestadores de serviços, porque alargam de forma extraordinária o seu âmbito de acção e, especialmente, para quem difunde as mensagens, porque é um trabalho altamente rentável e praticamente sem custos operacionais. Esta é a principal razão para que os spammers procurem por todos os meios possíveis iludir os sistemas de segurança e filtros anti-spam, para conseguirem distribuir as suas mensagens: mascaram o seu remetente, adoptam outros endereços e por vezes associam-se a criadores de vírus informáticos, par a mais facilmente atingirem os seus obje ctivos. A l uta contra o Spam i) Normas Sociais A criação de regras sociais de ut ilização da internet entre os cibernautas const itui a primeir a linha de defesa anti-spam, desencorajando o recurso a práticas comerciais que envolvam spam. No ent anto, a sua violação desencadeia reacções aleat órias e por vezes injustas. A consequência normal para a violação destas regras é a expulsão das list as de discussão e o bloqueamento do endereço de e- mail do spammer. Mas muitas vezes o endereço bloqueado é apenas fictício (spoofing), e esse endereço poderá até pertencer a outra pessoa sem qualquer responsabilidade no envio de spam. A ausência de uma autoridade superior que adeque as reacções à gravidade da violação das r egras e a falta de coercibilidade das sanções impossibilitam que as regras sociais constituam uma reacção eficaz contr a o spam. ii) Auto Regulação A auto-r egulação traduz-se no est abeleciment o de códigos e regras de conduta entre os diversos intervenientes da actividade publicitária na internet, não sendo no entanto uma solução muito atractiva. Por um lado, não há qualquer contrapartida em aderir a tais regras de conduta e, por outro, sendo um sistema de adesão voluntária não abrange todos aqueles que não tenham aderido aos códigos de conduta. A auto-r egulação funciona apenas entre as empresas que pretendam cultivar uma boa imagem perante o público, pelo que haverá sempre outr as empresas que não se importam de suport ar o lado negativo associado ao spam. 5 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas De qualquer forma, a aut o-regulação poderá constituir uma mais-valia, no sentido em que poderá originar uma concertação entre os diversos for necedores de acesso à internet. Estes poderão cooper ar, por exemplo, no sentido de incluir cláusulas nos contratos que celebram com os seus client es, que obriguem os seus clientes a não se servirem dos endereços disponibilizados para a prática de spam, assim como cláusulas de responsabilidade que imponham sanções para quem violar tais obrigações. iii) Tecnologia O spam pode também ser combatido a at ravés de programas informáticos que funcionam como filt ros de correio electrónico. Estes programas bloqueiam as mensagens oriundas dos servidores permeáveis ao spam. No ent anto, est e sistema não é 100% eficaz. Em primeiro lugar, por que os spammers têm um poder económico suficientemente forte para competir na procura de soluções, que consigam de alguma f orma iludir estes progr amas com sucesso. Na verdade, o spam est á muitas vezes associado à pirat aria informática. Em segundo lugar, não diminui o custo das empresas de comprar e actualizar estes programas, nem o trabalho dos utilizadores que têm de os programar. Por outr o lado, estes programas não contribuem para a transparência do mercado no correio electrónico, uma vez que os critérios utilizados para f iltrar as mensagens de cariz comercial não são claros, podendo assim bloquear mensagens de produtos ou serviços concorrentes 3 ou até bloquear mensagens desejadas ou consentidas pelos destinatários. iv) Legisl ação a) A proibição tot al do Spam Há autores que def endem que a proibição total do spam ser ia inconstitucional, na medida em t al constituiria uma violação dos direitos fundamentais, nomeadamente das liberdades de expressão e inf ormação (art. 37º CRP), liberdade de criação cultural (art. 42º CRP) e liberdade da livr e iniciativa económica (art. 61º CRP). 4 3 “A distribuição de mensagens de correio electrónico indesejadas (SPAM)”, Luís Menezes Leitão, in Direito da Sociedade da Informação, Coimbra Editora, vol. IV, pág. 198 e ss. 4 Luís Menezes Leitão, ob. cit. pág. 208 6 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas Mas esta argumentação vai ainda mais longe, defendendo de que a regulamentação jurídica do spam poderá contender com o disposto no art. 34º da CRP, nos termos do qual “é proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvo os casos previstos na lei em mat éria de processo criminal. ” 5 Há, por outro lado, autores que defendem que tais princípios “não podem prevalecer sobre o direito à privacidade ou à reserva da vida privada” 6. Isto é, perante um conflito de direitos deverão prevalecer estes últ imos. Os direitos fundamentais possuem determinados limites 7 imanentes , que constituem verdadeiras front eiras no que concerne ao seu exercício. O mesmo é dizer que os preceit os constitucionais que consagram direitos fundamentais não pr otegem qualquer forma de exercício desses direit os. Estes limites advêm quer da Constituição, quer da própria natur eza do direito. Perante uma sit uação concr eta, per guntamo-nos se determinado direito contempla ou não uma determinada forma de exercício. Isto é, ser á que um direito fundamental ao ser exercido de uma deter minada forma, continua a merecer a mesma protecção constitucional? No caso concret o do spam, será que o exercício da liberdade de expr essão, de criação cultural e da livre iniciativa económica admite o envio de milhões de mensagens publicitárias, que provocam o constante congestionamento do tráfego da internet e originam cust os incalculáveis para terceiros? A resposta a esta pergunta só pode ser negativa. Contrariament e ao que defendem alguns autores, não se trata aqui de conflitos ou colisão de direit os, porque não estamos perant e a prot ecção simult ânea de valores constitucionais. O que sucede é que os direitos f undamentais que se referiram simplesment e não contemplam aquela forma de exercício. O mesmo é dizer que o envio de spam não se enquadra na forma de exercício daqueles dir eit os, pelo que a sua pura e simples proibição não seria inconstitucional. b) O sist ema opt out O sistema de opt out consiste em admitir o envio de mensagens publicitár ias não desejadas, desde que o destinat ário não tenha manifestado a vontade de não receber tais mensagens. 5 “Publicidade domiciliária não desejada”, Paulo Mota Pinto, citado apud Luís Menezes Leitão, ob. cit. pág. 208 “Spam e Mail Bomb – Subsídios para uma perspectiva criminal”, F. Bruto da Costa, R. Bravo, Quid Iuris, Lisboa, 2005, pág. 23 7 “Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976”, José Carlos Vieira de Andrade, Almedina, 1987, pag. 215 e ss. 6 7 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas Nos EUA onde este sistema foi adoptado, o spam é regulado pelo Can-Spam Act 2003, que consagr a, assim, o “right to spam”. Para efeitos criminais, apenas o envio superior a 100 mensagens no período de 24 horas, 1000 pelo período de 30 dias, ou 10000 mensagens no período de 1 ano, são consideradas spam ilícito. Além disso, apenas as autoridades federais e estaduais e os f ornecedores de acesso à int ernet tem legit imidade para instaurar acções de responsabilidade civil contra os spammers, impedindo assim que o simples cidadão reaja contra o spam. Este sistema apresenta diversas fragilidades. Em primeiro lugar, porque obriga o destinatário a ter uma atit ude activa de declarar que não quer receber mensagens. Ou seja, o destinatário tem que de responder ao spammer, utilizando algum link incluído na mensagem ou enviando um e-mail, manifestando a vont ade de não receber tais mensagens, eliminar a mensagem recebida e, por último, se tiver essa possibilidade, bloquear o endereço do remetent e. Em segundo lugar, este sistema tem um efeito perverso: muitas vezes o spammer não sabe se o e- mail p ara onde enviou a men sagem está ou não act ivo. Mas a resposta do destinatár io de que não quer receber spam dá-lhe precisament e essa inf ormação, isto é, de que aquele endereço é válido e está activo. A vulnerabilidade deste sistema reside pr ecisamente no facto de se basear no pressuposto de que o destinatário, pretendendo opor-se à recepção de spam, o vai fazer. No entant o, est e é inundado diariamente por centenas de mensagens publicit árias que não deseja, e vê-se impossibilitado de uma a uma manifestar a vontade de não as r eceber. Além disso, os spammers dificult am essa taref a através de links falsos ou pop-ups. c) O sistema opt in Na ordem jurídica portuguesa, embora não isento de críticas relativamente à sua eventual inconstitucionalidade, 8 vigora o Decr eto-Lei n.º 7/2004 de 7 de Janeiro, decorrente da transposição para a ordem jurídica portuguesa da Directiva 2000/31/CE de 8 de Junho e do art. 13º da Direct iva 2002/58/CE de 12 de Julho, relat iva ao tratamento de dados pessoais e à protecção da privacidade no sector das comunicações electrónicas. Em especial no que diz respeito ao spam, este Decreto-Lei veio consagrar entre nós o sistema de opt in. O n.º 1 do art. 22º deste Decreto- Lei estabelece que: 8 “Nota sobre as eventuais inconstitucionalidades do Decreto-Lei n.º 7/2004 de 07 de Janeiro”, Manuel Lopes Rocha , in www.oa.pt 8 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas “O envio de mensagens par a f ins de marketing directo, cuja recepção seja independente de intervenção do destinat ário, nomeadamente por via de aparelhos de chamada aut omática, aparelhos de telecópia ou por correio electr ónico, carece de consentiment o prévio do destinatário”. A adopção de um sistema que parte da necessidade de consentimento prévio do destinatário, permite à part ida est abelecer um quadro legal mais simples e mais fácil de implementar e de fazer cumprir. No entanto, como veremos, não é isso que sucede no sistema jurídico português. A regra deste sistema é a da pr oibição do envio de mensagens não desejadas para fins de marketing directo. E esta regra aplica-se quer às mensagens enviadas por correio electrónico, quer às enviadas por fax, sms ou mms. Embora ao longo de todo o art. 13º da Directiva 2002/58/CE de 12 de Julho se refira, numa tradução literal, comunicações não solicitadas para fins de “comercialização directa”, o nosso legislador optou por manter a expressão marketing directo, mas apenas no n.º 1 do art. 22º. Quanto aos restant es números deste artigo e contrariando a Directiva, optou por utilizar o conceit o “comunicações publicit árias” como se fosse indif erent e usar uma ou outra expr essão. Em rigor o conceito de marketing directo é mais restrito do que o de publicidade. Na verdade, só cabem no conceito de marketing directo as mensagens enviadas para promover um bem ou serviço, com o f im último de celebrar um contrato com o destinatário concr eto dessa mensagem. A mensagem não tem necessariamente de constituir uma propost a contrat ual, mas há-de, pelo menos de forma aproximada, constituir um convite a contratar. 9 Da conju gação do disposto nos n. º 6, 7 e 8 em contraposição com o disposto no n.º 1 resulta que para o envio de mensagens não solicitadas, que não t enham como objectivo o marketing directo, é lícito, excepto se o destinatário se opuser ao seu envio. Podemos questionar, por isso, se na Eur opa e, em particular, em Portugal, vigorará um verdadeiro sistema de opt in. Se todas as mensagens de marketing directo são for mas de publicidade, nem todas as mensagens publicit árias podem ser caract erizadas como marketing directo. E nem sempre é fácil distinguir umas das outras. Damos aqui o seguinte exemplo: ----- Original Message ----From: "Manuel Aguilar" <[email protected] > Sent: Thursday, Sept ember 15, 2005 5:43 AM Subject: O tal extra que te falei Oi Rui, t udo bem contigo? 9 “Lei do comércio electrónico anotada”, Coimbra Editora, 2005, pág. 86 9 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas Olha, já comecei a ganhar dinheiro com aquela actividade que te falei, que conheci na Internet em www.trabalhe-em-casa.com/ lifestyle. No primeiro mês, a partir de casa e em muit o part-time, consegui mais de 700 Euros extra mas o potencial é enorme e dá para tirar muit o mais. Telefona-me para a gente falar sobre isso, eles precisam de mais gente em todo o país, talvez queiras aproveit ar também. Um grande abraço para ti e um beijinho à Carla. Manuel Aguilar Simulando tratar-se de uma comunicação privada (o remetent e e o destinatário não se conhecem), est a mensagem tem apenas como objectivo divulgar a página de internet indicada, recrutando pessoas para executarem um determinado t rabalho. É sem dúvida uma mensagem publicitár ia, mas será market ing directo? Se a r esposta f or afirmativa, então a mensagem carece de consentiment o prévio do dest inatário, caso contr ário apenas será ilí cita se f or enviada depois do seu destinatário se ter oposto à sua recepção. Mas a que destinatário nos estamos a refer ir? É que, na verdade, o “Rui” para quem foi enviada esta mensagem não é o titular do endereço electrónico para quem foi enviada a mensagem. Cert ament e com o intuito de posteriorment e se poder afirmar que a mensagem foi enviada por engano. É por isso, bast ante criticável a diferença de tratamento dada ao envio de mensagens para fins de marketing directo e ao envio de mensagens publicitárias, na medida em que os problemas provocados por uma mensagem a propor a aquisição de um time sharing, ou a promover um abaixo-assinado, ou uma que solicite o reenvio de uma carta-corrente, são precisamente os mesmos. Uma outra dificuldade da nossa lei prende-se com o facto de a proibição do art. 22º n.º 1 se restringir ao envio de mensagens para fins de marketing directo a pessoas singulares. No que diz r espeito ao envio de mensagens a pessoas colectivas vigora o sistema opt out. A diferença de tratamento é também discutível. Actuando sob o pretexto de as mensagens serem enviadas para um endereço de uma pessoa colectiva, o spammer poderá inundar a caixa de correio de um funcionário de uma empresa, antes sequer de est e poder reagir. Mesmo quando é enviada para um endereço de uma pessoa colectiva, essa mensagem irá ser recepcionada pelo destinatário, como se de um particular se tratasse, mantendo-se os mesmos problemas referidos anteriormente. Em f ace da necessidade de proteger os mesmos valores e da dificuldade de lidar com dois sistemas diferentes, consoante se trate de pessoas colectivas ou singulares seria preferível adoptar também para as pessoas colect ivas o sistema opt in. O envio de mensagens publicitárias não solicitadas (e não apenas as de marketing directo) é, porém, admit ido quando estas for em enviadas pelo fornecedor de 10 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas um serviço ou produto aos clientes, com quem já tenha previament e celebrado transacções, se a esse cliente t iver sido expressamente oferecido a possibilidade de recusar a recepção deste tipo de mensagens e não implicar para o dest inatário nenhum custo adicional (art. 22º n.º 3). Além disso, é t ambém proibido ocult ar ou dissimular a identidade do remetente de mensagens de market ing directo (art. 22.º n.º 5). As entidades que promoverem o envio de comunicações publicitárias não solicitadas, cuja recepção seja independent e da intervenção do destinatário, são obrigadas a mant er uma lista actualizada das pessoas que manif estaram a vontade de não receber este tipo de comunicações (art. 22º n.º 7), sendo proibido o envio de comunicações publicit árias às pessoas que constem dessas listas. O DL n.º 7/2004 de 7 de Janeiro atribui ao ICP – ANACOM as f unções de supervisão central com atribuições em todos os domínios regulados por este diploma, opção est a que também não está isenta de críticas. 10 No âmbito deste diploma, o ICP- ANACOM t em como funções a elaboração de regulamentos, a emissão de instruções, a fiscalização do cumprimento do dispost o deste decreto-lei, o incentivo à elaboração e divulgação de códigos de conduta e a informação do público em geral. Cabe ainda ao ICP-ANACOM a supervisão da resolução pr ovisória de litígios, relativamente à event ual ilicitude dos conteúdos que são disponibilizad os em rede. Como deverá proceder o particular que receba uma mensagem de correio electrónico não solicit ada? Note-se que além do carácter ilí cito do spam à luz deste Decreto-Lei, uma única mensagem publicitária não solicitada poderá preencher vários tipos de ilícito: violação da protecção de dados pessoais, danos patrimoniais no computador se a mensagem contiver vírus, publicidade enganosa, etc. A competência atribuída pelo Decr eto-Lei 7/2004 ao ICP-ANACOM não afasta a compet ência especialmente atribuída por lei a outras autoridades administrativas, como a Comissão Nacional de Protecção de Dados, a Alta Autoridade para a Comunicação Social ou a Direcção Geral do Consumidor, sempre que sejam e ssas as ent idades sectorialmente competentes para a apreciação das matérias em causa. 11 Alguns Estados disponibiliza m endereços de correio electrónico dedicados, para onde os consumidores podem reenviar as mensagens de spam. É uma forma rápida e simples de o part icular se queixar e de reagir contra o spam. Este método permite de uma f orma mais eficaz combat er o spam, dado que reforça a coercibilidade da legislação, transmitindo aos consumidores uma maior 10 11 Manuel Lopes Rocha, ob. cit. Lei do Comércio Electrónico Anotada, Coimbra Editora 2005, pág. 162 11 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas confiança nas aut oridades e fornecendo simultaneamente dados estatísticos sobre o spam. Em Portugal, quem quiser reagir contra uma mensagem de spam poderá preencher um f ormulário electrónico específico disponível na página da int ernet do ICPANACOM. No entanto, para o particular poderá não ser muit o f ácil iniciar este procedimento. Desde logo porque se o spammer ocultou ou dissimulou o seu endereço, o particular terá sérias dificuldades em ident ificá-lo. As dificuldades aumentam se a mensagem tiver como origem outro Estado Membr o, ou um país onde tenha sido adopt ado o sistema de opt out. CONCLUSÃO Embora já ha ja propo st as no sent ido de resolver os problemas decorrentes da prática de spam, ainda não foi possível chegar a uma solução definitiva. Um primeiro passo, por exemplo, para a luta contra o spam é encontr ar uma solução técnica que impossibilite a dissimulação do endereço de correio electrónico. Assim, qualquer que seja a solução legislat iva adoptada, o spammer sabe que poderá ser facilmente identificado. Mas a forma mais eficaz de combater o spam é através da conjugação de diversos factores: uma legislação anti-spam ef icaz nos diversos países, harmonizando os sistemas adoptados; a cooperação internacional aos mais diversos níveis ( legislativo, técnico, social, etc.); o estabelecimento de normas de auto-r egulação e códigos de conduta entre os diversos operadores do mercado; a descoberta de soluções técnicas que permitam identificar a origem do spam e f iltrar de f orma cada vez mais eficaz as mensagens não solicitadas; informar, educar e consciencializar as pessoas para os problemas do spam. Em r esumo, o spam tem de ser encarado como um problema global, cujo combate dever á ser feito em diversas frentes. Not e-se que apesar da “boa vont ade legislativa”, ainda há muito a fazer. Por exemplo, o facto de a lei restringir o sistema opt in às mensagens para f ins de marketing directo ou o de estabelecer o sistema de opt out quando o destinatário é uma pessoa colectiva constitui um verdadeiro inibidor de eficácia desta lei, pelo que só podemos concluir que a solução para este problema ainda está longe de t er um fim. 12 Spam – Comunicações electrónicas não solicitadas BIBLIOGR AFI A Alexandre L. Dias Pereira, Comércio electrónico na sociedade da inf ormação: da segur ança técnica à confiança jurídica, Almedina, 1999 Celso António Serra, Publicidade Ilícita e Abusiva na Inter net, in “Direito da Sociedade da Informação”, Volume IV, Coimbra Edit ora, 2003 Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, sobre as comunicações comerciais não solicitadas, ou “spam” Estudo sobre segur ança e medidas anti-spam, ENISA, Set embro 2007, www.icp.pt Evangelos Moustakas, C. 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