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FESTAS E MARCHAS DO LYCEU PARAIBANO: VIVAS PARA A CIDADE1
Carlos Augusto de Amorim Cardoso 2
Universidade Federal da Paraíba
RESUMO
Este trabalho apresenta os resultados da pesquisa que procurou compreender o processo de construção
da vida urbana tendo como referência o calendário das festas escolares do Lyceu Paraybano nos anos
de 1913 e 1914. A investigação constou de coleta de artigos e reportagens do Jornal A União (coluna
“Melhoramentos Urbanos”), de documentos oficiais (atas, relatórios, leis, etc.) do Arquivo Histórico
do Estado. O Lyceu Parahybano, criado pela lei N.º11, de 24 de março de 1836, como escola de ensino
secundário representa um significativo avanço na educação paraibana. Deste modo o Lyceu é
partícipe, como instituição de instrução pública onde se realizavam festas e reajustamentos impostos
pela nova disciplina republicana que reivindicava uma “cidade moderna”, na difusão de ideais
nacionalistas e republicanos e na criação de uma nova mentalidade. Assim, os cânticos patrióticos
entoados em “côros infantis organisados pelas escolas publicas” e ao som da “musica marcial pelas
escolas primarias de ambos os sexos (...)” e bem como a organização das “patrióticas visitas” do
Presidente do Estado às escolas, contribuíam para a saudação dos “símbolos sagrados da nossa
nacionalidade”. Uma das maneiras que articulava a disciplinarização escolar e o espaço da cidade se
dava através das festas. Estas representavam um importante aspecto da iniciação dos educandos com a
formação para a modernidade. Para além das funções de educar e formar para a vida, as instituições
escolares desenvolveram práticas por meio das quais os educandos se aproximavam da cidade,
reinterpretando-a. É assim que eventos ou momentos como a Guerra da Cisplatina, a Revolução
Francesa, o aniversário da cidade entre outros, tornaram-se importantes festejos cívicos lembrados
pelos governantes. Exemplares singulares desse período são as marche aux flambeaux realizadas pelos
alunos nas ruas da cidade, por ocasião da reinauguração do ano letivo e nas comemorações do 14 de
julho (revolução francesa), onde se executavam a Marselheza e o Hymno Nacional. Como os objetos
existem geograficamente num dado lugar é presumível que no momento em que ele se instale ganhe
outra “certidão de idade”. As festas possibilitam uma espécie de recuperação da vontade coletiva
através da subversão dos códigos sociais, onde os participantes experimentam um conjunto de
emoções e vivências, que favorecem o sentimento de participação coletiva. Seguindo itinerários
determinados, as marchas colocavam significados no espaço da cidade e na funcionalidade capitalista,
ao mesmo tempo que produziam a ruptura e a continuidade do cotidiano: “contínuos evolutivos.” As
festa e as marchas compunham uma unidade do processo que não se assenta sobre uma base qualquer,
mas “na continuidade com que uma certa transformação provém de outra, segundo uma sucessão
ininterupta.” De outro modo, as ruas onde se localizam as escolas são justamente o lugar na cidade
onde os conflitos ganham vida e a sociedade juntamente com os novos signos expressará essa vida
moderna. As ruas na cidade da Parahyba destacavam-se por serem longas, tortuosas e acidentadas, as
chamadas “ruas-caminho”. E, sendo a rua, lugar de realizações, de manifestações das relações sociais,
das diferenças e das normatizações do cotidiano em momentos históricos diversos, tende-se a
materializar na sua forma física e na sua paisagem todas as transformações ocorridas. E é com as
mudanças políticas, econômicas e sociais que as elas deixam de ser “ruas-caminho” e passam a ser
“ruas do código de postura.” A mudança de rua-caminho à rua do código de postura deu-se por
diversas intervenções de racionalidade do espaço urbano, aliadas ao fenômeno da modernidade e que
em muito modificaram a trama física e a paisagem da cidade. Durante o período de 1910 a 1930, a
cidade da Parahyba do Norte aspira urbanizar-se, ou seja: sanear, embelezar, iluminar. Os vários
problemas que ela apresentava com a sua estrutura colonial – ruas apertadas, iluminação insuficiente e
esgotos precários – eram impeditivos ao progresso. A sua modernização está situada no mesmo
1
Trabalho parcialmente financiado pelo Cnpq.
Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba. Endereço
eletrônico: [email protected]
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processo de outras instituições sociais. As intervenções iniciam-se no final do século XIX e início do
século XX: calçamento, nivelamento e alinhamento foram as primeiras e principais preocupações com
as ruas da cidade. Alinhar as ruas, calçar a pátria de homens bons é cantar a Marselheza como
“guiadora dos exércitos da Republica proclamando a liberdade dos povos, a fraternidade universal”. E,
com o disciplinado corpo de alunos, os códigos das ruas, as vozes dos estudantes ecoando nas
marchas, o Lyceu cumpriria a tradição. A cidade toma o caminho que desperta o ensinamento da
historia moderna: a lição da moderna política dos povos adiantados, dos batedores da civilização
ocidental. A vida do Lyceu era agora a continuação, a “Phenix” da fábula “...que ressurgiu mais forte,
mais bello, melhor apparelhado, para cabal desempenho ao que se destina”. Nesse contexto, a pesquisa
buscou relacionar a implantação de instituições de ensino secundário - o Lyceu Paraibano – e as
mudanças de costumes na Parahyba do Norte, expressas em transformações nas feições da cidade. O
espaço escolar foi escolhido como palco político de valorização da classe dominante, demonstrada em
eventos
TRABALHO COMPLETO
INTRODUÇÃO
No início de janeiro do ano de 1913, o governo da Parahyba recebe a letra e a música do hino
da bandeira nacional. Os versos de Olavo Bilac são distribuídos para as escolas locais para serem
ouvidos, juntamente com o hino da independência, o da Republica e o da Parahyba e serem tocados
“em dias determinados de cada mez”. Cânticos patrióticos entoados em “côros infantis organisados
pelas escolas publicas” e ao som da “musica marcial pelas escolas primarias de ambos os sexos, em
edifícios apropriados como exercícios de canto coral e educação cívica”. O diretor da instrução
pública, Dr. Xavier Júnior, é o encarregado de agendar as “patrióticas visitas” do Presidente do Estado
Castro Pinto às escolas. Na ocasião na saudação dos “símbolos sagrados da nossa nacionalidade”
honras serão dadas “ao governo genuinamente republicano, altruisticamente emprehendedor e amigo,
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que quer fazer do povo parahybano, uma nobre força, trabalhando pacificamente pela Republica e pela
Pátria!”3
A FESTA DA PÁTRIA
Professores, alunos e governo, como se pode notar, estavam envolvidos na construção de uma
nova mentalidade. Essa nova mentalidade assume importância no espaço escolar e na construção da
cidade da Parahyba, expressa que está na função que a escola exerce como espaço pedagógico e na
influência no cotidiano das pessoas. O Lyceu Parahybano, criado pela lei N.º11, de 24 de março de
1836, como escola de ensino secundário representa um significativo avanço na educação paraibana.
Até então, executar o curso de ensino secundário somente era possível em Recife e Olinda, no vizinho
Estado de Pernambuco. A referida Lei previa uma escola de ensino secundário gratuito, constituída
pelas cadeiras de “philosofia racional, rethorica, geoghapia, historia e francez.”
O Lyceu Parahybano, topograficamente, estava estabelecido na parte alta da cidade, dividindo
o espaço com casas residenciais, igrejas e prédios públicos, como o da Escola Normal. O Lyceu
percorreu a cidade: instalou-se no Convento São Gonçalo; no andar térreo da Tesouraria da Fazenda;
no térreo do Palácio do Governo e no atual prédio da Faculdade de Direito, permanecendo até a sua
transferência em 1939 em prédio construído no Governo de Argemiro de Figueiredo, sua localização
atual. A peregrinação do Lyceu Parahybano segue uma idéia de “soerguimento moral”. Depreende-se
tal noção quando, da inauguração das aulas em abril de 1913, os meios de comunicação da época
asseveram:
“Inauguração do Lyceu Parahybano. Uma festa symptomatica do nosso soerguimento
moral. Realizou-se hontem a inauguração dos trabalhos letivos do Lyceu Parahybano, o
mais importante estabelecimento de ensino confiado à competência do provecto professor
dr. Thomaz de Aquino Mindello A inauguração do modelar instituto despertou,
principalmente na mocidade estudiosa, o mais justificável jubilo, o que é natural desde
que é ella a quem mais aproveitam as remodelações de ordem material e moral. (...) ...
após um longo interregno de esmoreciemnto, em que a principal csa educativa do Estado
jaz abandonada por mestres e discípulos, volta a vida ao seu recinto, dando ensanchas aos
mais auspiciosos vaticínios sobre o futuro que a aguarda. (...) ... só poderá resultar uma
epocha fecunda de florescimento...” (Jornal A União, Parahyba, 4 de abril de 1913).
Durante os primeiros anos da República, a cidade da Parahyba conserva sua fisionomia rural
(MAIA, 2000). O espaço urbano da capital paraibana irá adquirir o aspecto moderno com as obras do
reformista de tradição liberal, Camilo de Holanda, que governou de 1916 a 1920, dando continuidade
às obras progressistas e reformadoras principiadas no Governo de João Machado (1908-1912) e de
Castro Pinto (1912-1916). Tais reformas propiciam à capital uma nova paisagem urbana, uma reforma
urbana que pressupõe a “reforma das instituições sociais da época: cadeia, hospício dos alienados,
hospitais, polícia urbana e instrução” (MONARCHA, 1999).
Sobre a questão da instrução na sua relação com a urbanização e modernização do espaço
urbano, Monarcha (1999) afirma que nas reformas efetuadas em São Paulo uma concepção
organizativa do espaço urbano, engendrada por uma política de urbanização consciente e explícita,
envolvia a preparação das bases do esgotamento sanitário (água e esgotos), transporte de pessoas e
mercadorias, iluminação, segurança pública, comunicação, reformas das instituições sociais e
políticas públicas entre outras. O projeto para o espaço urbano implicava no estabelecimento de
concepções higiênico-sanitaristas que vigoravam no país desde final do século XIX.
O olhar médico e os discursos de ordem pregavam a higienização dos costumes, em sintonia
com os traços de modernidade que ganhava a cidade. Na cidade da Parahyba, a institucionalização do
Serviço de Hygiene Pública em 1911, figurava com uma estratégia para sanear a cidade. (SÁ, 1999).
Os códigos sanitários são estabelecidos, normas e intervenções compõem um leque de ações e
3
Jornal A União 17 de Janeiro de 1913. “EDUCAÇÃO CÍVICA. O HYMNO DA BANDEIRA NACIONAL
NA FORÇA PUBLICA E NAS ESCOLAS PRIMARIAS DO ESTADO. PELA REPUBLICA, PELA
PATRIA!”
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prescrições que tentam fundar uma nova ordem urbana, em correspondência estreita com os novos
tempos, impondo uma nova ordem moral e novos códigos de conduta (ROCHA, 2003).
Tido como uma das mais belas e antigas tradições de cultura da Parahyba, o Lyceu se
adaptará às necessidades de caráter prático quanto à instrução profissional e, em atenção ao
desenvolvimento intelectual da época, cria o curso de Comércio, para habilitar os moços que não
fossem ocupar cargos públicos.
O Lyceu Parahybano atravessou algumas fases de decadência absoluta devido a sua
desorganização4. Por muitas vezes ficaram desertas suas salas e corredores e o instituto chegou a ser
considerado como repartição inútil dos negócios públicos, pois não satisfazia às exigências do ensino.
Porém sob a direção de Lindolpho Correia, Eugênio Toscano, Thomaz Mindello e outros o instituto
passa por uma nova fase, como atesta a nota do jornal A União:
“(...) o antigo casarão deserto, abandonado e triste, cheio de trevas onde pareciam soluçar
as almas d’aquelles que outr’ora aqui vieram e brilharam para a pátria e mocidade, hoje
abre-se á luz de todas as claridades, povoam-se os bancos e as aulas e o grito vivo e
sonoro da rapaziada conta em seus corredores estas alegrias que sabemos sentir, mas,
nunca exprimir”. (ASCENDINO, C. 78º anniversario da fundação do Lyceu Parahybano.
Jornal A União, 26 de março de 1914).
O Lyceu Parahybano representava não só uma importante esfera de transmissão de
conhecimento, mas também um espaço de difusão de ideais nacionalistas e republicanas. Idéias que
foram se materializando no interior das escolas e no cotidiano da sala de aula. Eram atribuídas ao
Lyceu funções como educar e formar o homem para a vida, mostra as necessidades do seu tempo, as
exigências de sua época e do seu meio, ensinar a vencer e dominar.
Uma das maneiras que articulava a disciplinarização, presente na escola, e o espaço da cidade
se dava através das festas. Estas representavam um importante aspecto da iniciação dos educandos
com a formação para a modernidade.
Para além das funções de educar e formar o homem para a vida, as instituições escolares
desenvolveram práticas por meio das quais os educandos se aproximavam da cidade, reinterpretandoa. É assim que eventos ou momentos como a Guerra da Cisplatina, a Revolução Francesa, o
aniversário da cidade entre outros, tornam-se importantes festejos cívicos lembrados pelos
governantes: “a inspirada lembrança do exmo. sr. dr. Castro Pinto, Presidente do Estado, de fazer
commemorar as nossas ephemerides nacionaes pela infância e juventude das escolas, incutindo,
assim, na memória da mocidade intuito culto do civismo.... (...)”.5
Tais práticas são ensaios de identificações que não são rígidas nem imutáveis; são
identificações em curso, resultados transitórios, vir-a-ser de diversidades social e cultural que se
revelam nas tensões entre o novo e velho, o próximo e o distante, a identidade e a experiência do
outro. É nas cidades - entendida como o lugar da vivência e da busca de novos sentidos da vida - que
se constróem as identidades e as diferenças.
Exemplar singular desse período é a grande marcha pelas ruas da cidade por ocasião da
inuaguração do ano letivo de 1913:
“Em continuação as demonstrações de regosijo pela installação das lides escolares do corrente
anno, no Lyceu, realizou-se hontem féerica marche aux flambeaux, a qual sahindo da sede
deste estabelecimento, ás 6 ½ horas da tarde, pjassou pelas principaes ruas desta capital. O
itinerário foi o seguinte: ruas Duque de Caxias, General Osório, Barão da Passagem, Maciel
Pinheiro, Barão do Triumpho, Visconde de Pelotas, Travessa do Jardim, do lado desta folha,
recolhendo-se em seguida. Em todo o trajecto reinou a melhor ordem, nada tendo occorido
para empannar a alacridade dessa manifestação tão própria a índole da mocidade, pelas
expançoes naturaes que despertou no animo de todos que se lhe associaram de coração, que
foram quasi todos os alumnos do Lyceu Parahybano. (...) A marche foi puxada pela banda de
4
O início da belle èpoque paraibana não logrou os êxitos esperados pelas suas elites. O Lyceu, ficou
abandonado desde o final do século XIX até praticamente a década de 1910.
5
Jornal A União, 25 de Maio de 1913.
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musica da Força Policial do Estado, ouvindo-se, em todo o trajecto, a cada momento, vivas
estrepitosos ao exm. Dr. Castro Pinto, ao dr. Thomaz Mindello, etc., os quaes eram
enthusiasticamente correspondidos. Recolhida a marche aux flambeaux, a banda da Força
Policial fez retreta no Lyceu, tocando escolhidas peças de seu variado e selecto repertorio.
Interna e externamente, o Lyceu Parahybano apresentava profusa illuminação electrica, que
dava magnífico aspecto, tanto a sua fachada como ás paredes interiores, brilhando todas de
asseio e limpeza em as suas pinturas recentes. Durante toda a noite, o Lyceu, franqueado de
par em par ao ingresso publico, foi visitado por consideravel numero de pessoas de todas as
classes sociaes, cujos nomes é-nos impossível publicar. (...) O Lyceu manteve-se aberto até ás
9 horas da noite, tendo permanecido em o mesmo, desde 5 horas, o sr. dr. Thomaz Mindello,
seu director” (Inauguração do Lyceu Parahybano - Uma festa symptomatica do nosso
soerguimento moral. In: Jornal A União, 4 de Abril de 1913).
Tais eventos e ações traduzem em idéias e não apenas em fatos, uma inovação caracterizada
pelo aporte, no tempo e no espaço, de um dado que nele renova um modo de fazer, de organizar ou de
entender a realidade. Assim, o espaço da cidade deriva das mudanças e das relações que mantém com
os eventos, assegurando à ele o encargo de testemunhar a realização da história.
Como os objetos existem geograficamente num dado lugar é presumível que no momento em
que ele se instale, ganhe outra “certidão de idade”. As festas possibilitam uma espécie de recuperação
da vontade coletiva através da subversão dos códigos sociais, onde os participantes experimentam um
conjunto de emoções, de vivências, que favorecem o sentimento de participar de um corpo coletivo.
Transformando e estruturando o espaço da cidade na funcionalidade capitalista, a festa produz a
ruptura e a continuidade do cotidiano na mesma ocasião: “contínuos evolutivos.” Nesta reflexão
podemos encontrar como a festa é uma unidade do processo que não se assenta sobre uma base
qualquer, mas “na continuidade com que uma certa transformação provém de outra, segundo uma
sucessão ininterupta.” (ELIAS, 1998).
Nas festas existe uma forma de expressão, uma linguagem, uma memória e uma mensagem,
fazendo com que a mesma seja um lugar simbólico, cerimonial, que separa o que deve ser esquecido
daquilo que deve ser resgatado como símbolo.
Cria-se, assim, uma nova possibilidade de reestabelecer, construir ou reafirmar os laços de
afinidade, de memória e de identidade; uma ação possuidora de uma função simbólico-política
profundamente marcada pelas dificuldades da introdução dos valores da modernidade.
Podemos ver manifestações de festas escolares até nos dias atuais. Nascimento (2004), ao
passar em revista os 80 anos de ensino agrícola em Sergipe, nos convida a pensar as formas de
produção do lúdico e a festa como uma produção social que cria identidade entre os participantes. Do
dia do ex-aluno às solenidades de colação de grau, passando por festas juninas e competições
esportivas, o Aprendizado Agrícola Benjamin Constant homenageava com fixação de retratos nos
salões de honra da escola patronos como o próprio Benjamin Constant e Getúlio Vargas por ocasião
das comemorações do cinqüentenário da proclamação da República. Segundo este autor, “naquela
oportunidade a mensagem apresentada ao Aprendizado por uma comissão foi um incentivo ao
sentimento de auto estima da instituição”. Reproduzimos a passagem:
“Nesta casa há organização, trabalho, higiene, instrução, ordem e cristandade. Logo,
honra e probidade, patriotismo, dever, liberdade e justiça. Aqui, o Brasil se prepara e se
nutre porque a sua juventude encontra pão para o espírito e para o corpo; pão moral, pão
intelectual e pão material – pão que não amarga porque é adulçorado por vitudes cristãs”
(Nascimento, 2004; 233).
Um outro registro feito ao valor da festa no processo educativo é feito por Carvalho (1998),
ao analisar a Ata da 69ª sessão do Conselho Diretor da Associação Brasileira de Educação (ABE) de
maio de 1928, onde nos confere a ênfase ao valor educativo das festas, ao deparar-se com uma
instrução do Diretor da Instrução Pública do Ceará, Lourenço Filho:
“ ‘As simples comemorações, as festas só “valem” ’; determinava na qualidade de Diretor da
Instrução Pública do Ceará em instruções aos professores, ‘pelo caráter educativo de que se
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revistam, isto é, pela influência que possam ter sobre a alma infantil, antes de tudo, e pela
influência que possam ter sobre o meio social em que funcionar a escola’. Educando ‘pela
representação ou evocação de fatos dignos de ser imitados’, as festas forneciam às crianças
‘oportunidade para gravar, indelevelmente, muitas lições proveitosas.’ Nelas, a criança
começaria a ‘sentir o efeito da sanção social sobre os seus atos, pelos aplausos ou sinais de
enfado e de crítica que percebe: sente que há um público, um conjunto de pessoas que louvam
ou reprovam.’ Em muitos casos, as festas poderiam ‘ter também uma influência direta sobre o
espírito dos pais pois.’ Quando isso não ocorresse, as festas teriam pelo menos influência
indireta sobre eles, ‘elevando a escola e o papel do professor.’ ” (CARVALHO, 1998: 178-9).
A participação de alunos do Lyceu, e também das alunas da Escola Normal, em festas cívicas
era uma rotina, mesmo diante de chuvas abundantes. Juntamente com autoridades do Estado,
hasteavam bandeiras nos edifícios escolares, executavam músicas e formavam corais:
“Em comemoração ao 14 de julho realizaram-se nesta capital imponentes festejos cívicos, em
que executaram a Marselheza e o Hymno Nacional. À 1 hora da tarde, estando o Theatrto
literalmente lotado, (...) um numero extraordinário de creanças de varias aulas públicas d`esta
Capital, subiu o panno de bôcca. No palco, ladeado pelos srs. Senador Cunha Pedroza, dr.
Xavier Junior, Director da Instrucção Pública e dr. Eugenio Jacques, professor de francez
pratico na Escola Normal, o exmo. sr. Presidente do Estado declarou aberta a sessão solenne
commemorativa do grandioso feito histórico que marcou na França uma nova era de luzes para
a humanidade. Antes, porem, de aberta a sessão, formando em concerto de mais de duzentas
vozes, alumnos e alumnas do Lyceu Parahybano e da Escola Normal entoaram vibrantemente
o Hymno da Parahyba. (...) Em seguida foram cantados, com absoluta perfeição, o Hymno
Nacional e a Marselheza, nos seus versos rútilos e communicativamente patrióticos” (Jornal A
União, 16 de julho de 1913).
Viver as luzes da modernidade, erguer vivas á mocidade estudiosa, à Parahyba, à Republica e
à França era o testemunho das intencionalidades de “dispertar o enthusiasmo a nobre fibra patriótica
que o elevou á admiração da historia.” A realidade das administrações da província e da cidade da
Parahyba era prenhe de festas cívicas, de inaugurações de retratos entre outras. O espírito progressista
esteve presente desde a administração de João Machado (1908-1912) quando iniciaram-se as
primeiras remodelações na cidade da Parahyba do Norte. Teve continuidade nos administradores
seguintes: Camillo de Hollanda (1916-1920) e Sólon de Lucena (1920-1924). Ambos propiciaram
uma nova paisagem urbana, que se destaca através das primeiras implementações de porte: serviço de
abastecimento de água; iluminação elétrica; substituição dos bondes puxados a burro, pelos bondes
elétricos; realização de inúmeras obras pública; melhorias dos espaços públicos; prolongamento,
alargamento e iluminação das ruas; entre outros, dar-se início ao saneamento da cidade, essas
mudanças que gradativamente davam um novo ritmo ao cotidiano da cidade.
Também nesse período que se intensificam as noções de higienismo, esses novos espaços
visam melhorias na estrutura da cidade, tem a função de embelezá-la, dotando-a de um aspecto
moderno, como iluminação, ventilação e higiene adequada às funções a que são destinados como é o
caso da construção do prédio da Escola Normal6, que foi projetado para o devido fim, a de Instituição
Escolar, como também reformas em vários prédios públicos, com a reforma do prédio do Lyceu
Parahybano.7.
Dentro das discussões sobre a importância da instrução pública como via de acesso para a
modernidade, o Lyceu Parahybano, reproduz os pensamentos republicanos, apoiados pelas idéias
positivistas, pois aparece como uma das principais instituições escolar que serve como referência para
a evolução do ensino e dos ideais nacionalistas. Corresponde, desde seu inicio, à expectativa pública.
Mas a República desorganizou completamente suas salas, corredores, aulas e os seus exames ficaram
desacreditados.
A gestão de Castro Pinto (1912-1916) apesar de ter sido a administração que menos investiu
no processo de modernização da cidade da Parahyba do Norte, se empenhou para reverter o caos que
6
7
Cf. Cardoso (2003) e Cardoso e Kulesza (2004)
Ver Jornal A União, 16 de julho de 1913.
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encontrara o Lyceu, colocando a sua frente o lente Sr. Dr. Thomas Mindello. Uma das primeiras
medidas tomadas pelo então diretor do Lyceu junto com Castro Pinto foi respeitar as antigas tradições
da cultura da Parahyba, e manter o Lyceu como casa de ensino secundário, adaptando-o às
necessidades de instrução profissional, inclusive com o curso de Commercio, e reformando o seu
edifício, que se encontrava em total abandono.8
Em 1913 o Lyceu foi regulamentado pelo decreto n°570 de 16 de novembro, que aprova o
novo regimento interno que segue o modelo do Collegio Pedro II no Rio de Janeiro. Esse novo
regulamento vem satisfazer as exigências do ensino moderno. Em reportagem publicada no jornal a
União de 26 de março de 1914, descreve-se a fase difícil por qual passou o velho estabelecimento de
ensino secundário e a nova aspiração que o novo regulamento trás para o Lyceu e a mocidade que ali
busca o ensino e cívico e moral:
“Do antigo casarão deserto, abandoonado e triste, cheio de trevas onde pareciam soluçar
almas daquelles que outr’ora aqui vieram e brilharam para a pátria e mocidade, hoje abrese a luz de todas as claridades, povoam-se os bancos e as aulas e o grito vivo e sonoro da
rapaziada, canta em seus corredores esta alegria que sabemos sentir, mas nunca exprimir”
(Jornal A União, 26 de março de 1914).
Em relação a esse novo ar de modernidade e progresso que respira o Lyceu Parahybano pode
ser observado o aumento da freqüência escolar, que do precário número de matriculas de 18 alunos,
subiu para um resplandecente número de 200. Na reforma por que passou o Lyceu em 1913, no
governo de Castro Pinto foi importante, do ponto de vista material, moral e intelectual, a organização
do curso de Commercio de acordo com as idéias mais adiantadas da época. Disse dessa nova fase o
Sr. Dr. Thomas Mindello afimava:
“Que o período de hoje seja largo, brilhante e que esta promissira aura não se apague na
desilusão dolorosa dos ideais traídos. Possa o futuro confirmar ao ver as inscripções
votivas: esta é uma casa que a sabedoria para si edificou e que a deusa da sabedoria
jamais permita se afastasse da rota a que se consagrara.” (Jornal A União, 3 de abril de
1913).
A administração de Thomas Mindello resultou no “renascimento” do Lyceu Parahybano.
Carneiro Leão fala desse renascimento, e do ensino ali agora oferecido, em materia publicada no
Jornal A União:
“É nesta especie de estudo que se forma definitivamente a elaboração desta nacionalidade
promissora, sahidos da escola premáreas onde apenas aprenderam a lêr e estudar, os
moços vão fazer o seu espírito, familiarizando-o com o mundo pella geographya, pella
historia; inegrando-o com a natureza pellas sciencias naturaes, pella physica, pella
chymica, disciplinando-o pellas, mathemáticas, pella lógica, e dilatando-a pella litteratura
e pellas artes” (Jornal A União, 9 de abril de 1913).
As implementações modernas na Cidade da Parahyba do Norte são movidas por um desejo de
uma elite que pertencia a uma cultura de tradição rural. Entretanto, esta mesmo elite rural – não sem
conflito entre ela - dá início a uma série de alterações no espaço urbano, na tentativa de modificar a
imagem da cidade: “havia uma necessidade de superar o desequilíbrio entre desenvolvimento material
e desenvolvimento moral e intelectual”.(MONARCHA, 1999, p.57).
CONCLUSÃO
Durante o período de 1910 a 1930, a Parahyba aspira urbanizar-se, ou seja: sanear, embelezar,
iluminar. Os vários problemas que a cidade apresentava com a sua estrutura colonial – ruas apertadas,
iluminação insuficiente e esgotos precários – eram impeditivos aos ao progresso. A modernização da
8
Ver jornal A União, 16 de outubro de 1912.
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cidade está situada no mesmo processo da modernização de outras instituições sociais: “a reforma
urbana pressupõe a reforma das instituições sociais da época: cadeia, hospício dos alienados,
hospitais, polícia urbana e instrução” (MONARCHA, 1999, p.37).
Urbanizar era a palavra de ordem, que significava embelezar, iluminar e sanear. Como afirma
Monarcha (1999): “produz-se, então, uma política de intervenção urbana e social com o objetivo de
emancipar a cidade e seus moradores do julgo da natureza” (MONARCHA, 1999: 64). Urbanizar
implica inserir os signos de uma cultura urbana. A dominação do privado pelo público, que concebe à
cidade a designação de lugar público, privilegia a rua que passa a ser discutida e pensada como reduto
de mobilidade de pessoas, veículos e mercadorias. A rua que tinha um aspecto colonial necessitava
acompanhar o processo de modernização, pois a mesma começava a dividir espaço com signos
modernos, como os postes para iluminação da cidade, o alargamento de ruas para a passagem de
carroças e de automóveis (meio de transporte que aos poucos ia aparecendo na dinâmica da
sociedade). Devido ao progresso, eram necessários novos requisitos para a rua tornar-se viável no
novo mundo urbano. Isto será uma das justificativas para as mudanças no plano urbanístico da cidade.
O destaque à rua na cidade histórica, propiciada pela grande marche aux flambeaux,
percorrendo as principais ruas da capital (Duque de Caxias, General Osório, Barão da Passagem,
Maciel Pinheiro, Barão do Triumpho, Visconde de Pelotas, Travessa do Jardim), se dá porque
identificamos a estruturação do espaço para a circulação. As ruas, nesse período foram alargadas,
iluminadas, havendo ainda a linha do bonde para transporte das pessoas, implementações dos
requisitos da modernidade.
Ainda na análise da imagem da cidade, identificamos outros elementos incorporados pelo
viver público, como o jardim localizado diante do Lyceu e da Escola Normal. O jardim era de uso da
elite paraibana. Contudo, o sentido de público era restrito, não englobava o todo, o povo, o que se
evidenciava pelas grades de ferro que cercava e limitava o acesso à praça. O coreto, introduzido a
partir dos ideais de progresso, era utilizado para apresentações culturais para a tradicional elite
paraibana.
A introdução dos grupos escolares, a exemplo do Tomáz Mindelo (que foi instituído através
do decreto lei n. 778 de 19 de julho de 1916), era uma das partes do projeto de implementações
modernas. Representava um dos mecanismos de ilustração do poder das oligarquias paraibanas:
“As escolas públicas passaram a ser utilizadas como veículo de propaganda política para
o grande público, também servindo para marcar o poder das oligarquias, cujos nomes
seriam sempre lembrados uma vez que os prédios escolares, principalmente os grupos
escolares, eram prédios suntuosos e marcaram a nova feição urbana que estava em pleno
processo de mudança e serviram, por conseguinte, para embelezar a cidade e trazer o ar
da modernidade”.(PINHEIRO, 2001: 124).
As ruas onde se localizam as escolas são justamente o lugar na cidade onde os conflitos
ganham vida. Nela, na rua, a sociedade juntamente com os novos signos expressará essa vida
moderna. As ruas na cidade da Parahyba, em sua origem, destacavam-se por serem longas, tortuosas e
acidentadas, as chamadas “ruas-caminho”. E, sendo a rua, lugar de realizações, de manifestações das
relações sociais, das diferenças e das normatizações do cotidiano em momentos históricos diversos,
tende-se a materializar na sua forma física e na sua paisagem todas as transformações ocorridas. E é
com as mudanças políticas, econômicas e sociais que as ruas deixam de ser “ruas-caminho” e passam
a ser “ruas do código de postura.” A mudança de rua-caminho à rua do código de postura deu-se por
diversas intervenções de racionalidade do espaço urbano, aliadas ao fenômeno da modernidade e que
em muito modificaram a trama física e a paisagem da cidade.
Na cidade da Parahyba do Norte estas intervenções iniciam-se no final do século XIX e início
do século XX: calçamento, nivelamento e alinhamento foram as primeiras e principais preocupações
com as ruas da cidade. Alinhar as ruas, calçar a pátria de homens bons é cantar a Marselheza como
“guiadora dos exércitos da Republica proclamando a liberdade dos povos, a fraternidade universal”. E,
com o disciplinado corpo de alunos, os códigos das ruas, as vozes dos estudantes ecoando nas
marchas, o Lyceu cumpre a tradição de um estabelecimento de ensino. A cidade da Parahyba toma o
caminho que desperta o ensinamento da historia moderna: a lição da moderna política dos povos
adiantados, dos batedores da civilização ocidental. A vida do Lyceu era agora a continuação a
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“Phenix” da fábula “...que ressurgiu mais forte, mais bello, melhor apparelhado, para cabal
desempenho ao que se destina”. (...) Agora, a mocidade sedenta de instrucção, não tem mais
necessidade de emigrar para outros Estados para mendigar o pão do espírito, esse pábulo sacrosanto
que se chama instrucção, que se denomina sciencia” (Jornal A União, 4 de abril de 1913).
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