XLIII CONGRESSO DA SOBER
“Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial”
Economia Solidária e Marketing no Cooperativismo de Reforma
Agrária: um estudo com Educandos do ITERRA
Cristiane Betanho
Doutoranda em Engenharia de Produção da UFSCar
Pesquisadora do GEPES – Grupo de Extensão e Pesquisa em Economia Solidária
Alameda dos Crisântemos 80 bl A apto. 24 – CEP 13566-550 – São Carlos (SP)
[email protected]
Farid Eid
Depto. de Engenharia de Produção da UFSCar
Coordenador do GEPES – Grupo de Extensão e Pesquisa em Economia Solidária
R. Sebastião Ferraz Caldas 125 apto.13 – CEP 13562-010 – São Carlos (SP)
[email protected]
Rosaura M. C. Oliveira
Pesquisadora do GEPES – Grupo de Extensão e Pesquisa em Economia Solidária
R. Sebastião Ferraz Caldas 125 apto.13 – CEP 13562-010 – São Carlos (SP)
[email protected]
Área Temática: Agricultura Familiar
Forma de Apresentação: com presença de debatedor
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“Instituições, Eficiência, Gestão e Contratos no Sistema Agroindustrial”
Economia Solidária e Marketing no Cooperativismo de Reforma
Agrária: um estudo com Educandos do ITERRA
Resumo
Este artigo integra uma pesquisa financiada pelo CNPq. Trata-se de uma pesquisa-ação,
com intervenção social, em parceria entre um grupo de pesquisadores da UFSCar,
técnicos da CONCRAB/MST e educadores do ITERRA, cujo objetivo é buscar meios para
a implementação de estratégias para o desenvolvimento dos Empreendimentos
Econômicos Solidários oriundos da cooperação entre agricultores familiares, assentados
da reforma agrária. Educandos do Curso Técnico em Administração de Cooperativas
receberam capacitação teórica e prática sobre marketing. Por meio de trabalhos práticos
e exposições teóricas sobre competitividade, análise do ambiente e o desenvolvimento da
sensibilidade para o que pode ser demandado, em que quantidade, a que preço e nível de
qualidade, os educandos apreenderam os conceitos de marketing, avaliaram sua
efetividade e adaptaram-nos ao contexto da economia solidária. Os educandos concluíram
que os conceitos poderiam ser utilizados na construção de ofertas competitivas de
produtos da Reforma Agrária, e avaliaram que seria necessário que tais conceitos fossem
adaptados ao contexto da economia solidária.
PALAVRAS-CHAVE: Economia Solidária, Reforma Agrária, Marketing
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Economia Solidária e Marketing no Cooperativismo de Reforma
Agrária: um estudo com Educandos do ITERRA1
1. INTRODUÇÃO
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em seus vinte anos de
existência, tem buscado gradativamente legitimar suas ações perante a sociedade. Sua luta
não se restringe à defesa de uma distribuição de riqueza mais justa, mas ao combate à fome
e à miséria. Na sua luta pela terra e pela viabilização da vida no campo, os agricultores já
assentados organizam-se em cooperativas e associações que visam ao fortalecimento
conjunto de suas posições, buscando dignidade e qualidade de vida para assentados e
auxiliar aos que ainda não alcançaram essa condição.A luta não se restringe à posse de
terra; para o MST é preciso torná-la produtiva, sem, no entanto, reproduzir o paradigma
capitalista da geração de excedente de capital a qualquer custo.
Atualmente, boa parte da produção dos assentados da reforma agrária estudados é escoada
via “atravessador”, o que reduz o fruto da comercialização dos produtos – geralmente
matérias-primas e produtos in natura com baixo valor agregado percebido. Para Carvalho
(2002), a valorização da vida, a proteção à saúde e ao meio ambiente, a luta contra o
capital monopolista e pela alteração do atual modelo econômico, devem ser valores
utilizados para a construção de Comunidades de Resistência e Superação. Tais valores
também podem ser utilizados para distinguir a natureza da oferta dos produtos da pequena
agricultura familiar, da oferta das propriedades capitalistas, que produzem a custos mais
baixos, conseguem maior produtividade e possuem melhor poder de barganha sobre os
compradores. Como afirma Eid (2002), é imperativo fazer o contraponto com o
pensamento liberal que traduz a viabilidade somente do ponto de vista econômicofinanceiro, através da relação custo/benefício.
O consumo solidário, definido por Mance (2003) como aquele praticado em função “não
apenas do próprio bem-viver pessoal, mas também do bem-viver coletivo, em favor dos
trabalhadores que produziram aquele bem ou serviço e da manutenção do equilíbrio dos
ecossistemas”, pode absorver parte da produção dos empreendimentos econômicos
solidários; porém, inserir-se no mercado e construir mecanismos para gradualmente
competir na economia capitalista parece ser inevitável para a viabilização da produção da
propriedade rural advinda da reforma agrária, seja ela coletiva ou individual. A construção
da viabilidade deve trabalhar com o planejamento da demanda para curto, médio e longo
prazos e passa necessariamente pela articulação nos e com os movimentos sociais em nível
local, regional, nacional e internacional (EID, 2002).
Este trabalho busca avaliar, juntamente com educandos do ITERRA (Instituto Técnico de
Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária), a utilização do conceito e de ferramentas de
marketing para auxiliar na inserção dos produtos da reforma agrária no mercado. Por meio
de trabalhos práticos e exposições teóricas sobre competitividade, análise do ambiente e o
desenvolvimento da sensibilidade para o que pode ser demandado, em que quantidade, a
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Artigo elaborado a partir de resultados da pesquisa DINÂMICA ORGANIZACIONAL E PRODUTIVA EM
COOPERATIVAS DE REFORMA AGRÁRIA: diagnóstico, implementação de estratégias para o
desenvolvimento e perspectivas, desenvolvida nos anos 2002-2004, em parceria entre o Grupo de Extensão e
Pesquisa em Economia Solidária (GEPES) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e a
Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil Ltda. (CONCRAB), financiada pelo
MCT/CNPq/COAGR.
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que preço e nível de qualidade, os educandos apreenderam os conceitos de marketing,
avaliaram sua efetividade e adaptaram-nos ao contexto da economia solidária. O resultado
dessa intervenção foi utilizado para desenvolver uma nova identidade visual para as
conservas de frutas produzidas na planta piloto do ITERRA, que resultou em 30% de
aumento de vendas imediatas dos produtos com novas embalagens.
2. IMPORTÂNCIA PARA UMA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL
Entende-se por Economia Solidária, segundo Singer (1999), o conjunto de experiências
coletivas de trabalho, produção, comercialização e crédito organizadas por princípios
solidários, espalhadas por diversas regiões do país e que aparecem sob diversas formas:
cooperativas e associações de produtores, empresas autogestionárias, bancos comunitários,
“clubes de trocas”, “bancos do povo” e diversas organizações populares, urbanas e rurais.
Para o mesmo autor, as especificidades que distinguem um empreendimento solidário de
um pautado pelas regras da corrente econômica hegemônica são o estímulo à solidariedade
entre os membros via autogestão e a reintegração de trabalhadores expurgados do mercado
de trabalho (SINGER, 2003).
Provavelmente, a difusão da economia solidária no contexto brasileiro deu-se em função
da quebra das forças produtivas nacionais, quando da abrupta abertura dos mercados
internos, gerando níveis alarmantes de desemprego. Nas cidades, empresas modernizadas
fecharam milhões de postos de trabalho, enquanto que no campo, a mecanização do
processo de produção e a dependência de insumos químicos redundaram na falência
crescente e acelerada da pequena propriedade rural e da agricultura familiar, resultando na
exacerbação do êxodo rural, talvez sem precedentes na história da agricultura brasileira.
Em diversas regiões do país, alguma com maior intensidade, vem se desenvolvendo,
principalmente nos últimos quinze anos, experiências de geração de trabalho e renda, de
forma solidária e associativa. Iniciativas isoladas deram lugar a uma realidade que se
expande e se dinamiza, motivando a ação de entidades de classe e de políticas públicas no
campo popular, orientadas para uma economia alternativa concreta que está em processo
de gestação.
Em diversas regiões do país, alguma com maior intensidade, vem se desenvolvendo,
principalmente nos últimos quinze anos, experiências de geração de trabalho e renda, de
forma solidária e associativa. Iniciativas isoladas deram lugar a uma realidade que se
expande e se dinamiza, motivando a ação de entidades de classe e de políticas públicas no
campo popular, orientadas para uma economia alternativa concreta que está em processo
de gestação.
Gaiger et al. (1999), ao analisarem a viabilidade e as perspectivas da Economia Solidária
no estado do Rio Grande do Sul mostraram que, se antes, as experiências de geração de
trabalho e renda eram consideradas pelos pesquisadores como circunstanciais e efêmeras,
de difícil registro, a partir da década de 90, aumenta ano a ano o interesse por investigações
científicas sobre iniciativas solidárias, algumas com mais de dez anos de atividade
contínua. Isso não quer dizer que dissoluções não ocorram, mas o que se observa de novo,
é a busca pela sobrevivência e mesmo o crescimento de algumas, procurando garantir,
simultaneamente, o equilíbrio entre o econômico e o social. É nesse sentido que uma nova
interpretação sobre experiências solidárias e programas de apoio considera que, para
sobreviverem e crescerem, tenderiam a evoluir para ações propositivas, destacando-se o
desenvolvimento de novas formas de organização da produção e do trabalho, com reflexos
diretos no campo das políticas públicas e da organização da sociedade.
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Para Wautier (2003), a economia solidária possui caráter profundamente político e articulase sobre quatro eixos: o comércio eqüitativo, as finanças solidárias, intercâmbios nãomonetários e as iniciativas locais. Assim, busca-se um equilíbrio entre a dimensão social e
a econômica, visando encontrar alternativas para os momentos de crise do que o repasse à
sociedade de seus custos, como se observa nas empresas capitalistas (SINGER, 2003).
Os empreendimentos econômicos solidários são definidos por Gaiger et al. (1999) como
sendo organizações coletivas de trabalhadores voltados para a geração de trabalho e renda,
regidos, idealmente, por princípios de autogestão, democracia, participação, igualitarismo,
cooperação no trabalho, auto-sustentação, desenvolvimento humano e responsabilidade
social. Para viabilizar a expansão da economia solidária, uma série de desafios são
enfrentados, desde a criação de novas políticas e instituições públicas e populares voltadas
à representação e apoio, à incubação de empreendimentos econômicos solidários, ao
acompanhamento permanente das demandas de formação, crédito, tecnologia, mercado,
gestão e outras (SINGER, 1999).
3. O COOPERATIVISMO DE REFORMA AGRÁRIA E A ECONOMIA
SOLIDÁRIA
O MST pode ser definido como uma empresa social pelo caráter de seus empreendimentos
econômicos solidários (Pasquetti, 1998). De fato, observamos em nossa pesquisa e como
docentes em Cursos Técnicos e de Especialização em Administração de Cooperativas, que
as atividades sociais e econômicas, onde existem, estão voltadas, em suas esferas de poder,
para a construção de um modelo de gestão democrático e participativo.
Uma das modalidades clássicas de organização solidária é a cooperativa. Essa forma
associativa, que prevê a propriedade conjunta dos meios de produção e o
compartilhamento do processo decisório, tem sido a mais utilizada pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na luta pela terra e viabilização da vida no campo.
De acordo com Eid e Pimentel (2000), o cooperativismo, para assentados do MST, é
entendido como um dos caminhos para a emancipação humana. Busca-se o
desenvolvimento organizacional, através da motivação coletiva para o trabalho voluntário
e remunerado. Há compromisso e disciplina pessoal de seus membros com o cumprimento
dos objetivos sociais. Na definição das estratégias de crescimento econômico, a busca
pelas sobras líquidas não é a referência principal mas, principalmente, o desenvolvimento
do ser humano, através do resgate e ampliação da dignidade e da cidadania. Geralmente, a
propriedade é coletiva e deve beneficiar a todos os associados e envolvidos.
Com vinte anos de atividades, o MST encontra-se organizado em 23 estados, em 600
assentamentos com cerca de 150 mil famílias. Nesse período, o movimento destacou-se
pelas atividades articuladas de cinco setores. O Setor de Educação desenvolve pedagogia
própria para escolas do campo em cerca de mil escolas públicas de assentamentos, com 75
mil crianças e 2800 professores da rede municipal e estadual. Quanto ao Setor de
Comunicação, coordena as atividades do Jornal Sem Terra e acompanha a formação de
repórteres populares, programas de rádio e rádio comunitária em assentamentos,
divulgação de informações, notícias na página da Internet e via e-mail para diversas
organizações e grupos de apoio em nível nacional e internacional. O Setor de Direitos
Humanos articula uma rede nacional com 60 advogados que trabalham de forma
voluntária, em processos que envolvem prisões, assassinatos e outras questões relacionadas
com a defesa da Reforma Agrária. O Setor de Relações Internacionais coordena as
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atividades internacionais, principalmente em fóruns como a Via Camponesa que agrega 80
organizações camponesas dos cinco continentes.
O Setor de Produção, foco deste trabalho, conta com cerca de 400 associações de
produção, comercialização e serviços, 49 cooperativas de produção agropecuária (2300
famílias), 32 cooperativas de prestação de serviços (11 mil sócios), duas cooperativas
regionais de comercialização, duas cooperativas de crédito (seis mil sócios) e 96
agroindústrias processadoras de frutas, leite, grãos, café, carnes, doces e cana-de-açúcar. O
SCA atua em cerca de 700 municípios brasileiros (EID & PIMENTEL, 2000).
4. IMPORTÂNCIA DO MARKETING NA INSERÇÃO DOS PRODUTOS DE
AGRICULTORES FAMILIARES DA REFORMA AGRÁRIA NO MERCADO
Um olhar retrospectivo para a economia brasileira demonstra que idéias, conceitos e
técnicas de marketing sempre encontraram melhor ressonância, e foram implantadas com
maior sucesso, em organizações que atuavam em ambientes competitivos de negócios.
Porém, a partir de 1990, com o processo de abertura da economia, todas as áreas de
negócio foram forçadas a adotar uma perspectiva voltada para o consumidor, ao invés da
mentalidade de distribuição em voga na época. O mercados consumidores estavam
mudando, e era necessário fornecer valor competitivo. Na busca por resultados
significativos, as ferramentas de marketing foram adaptadas para todas as áreas de negócio,
a fim de que informações sobre os clientes pudessem orientar as organizações para sua
conquista e manutenção.
Morgan (1996) salienta que a pujança da disciplina marketing é demonstrada no desejo
constante de se rever e questionar seu domínio. Para o autor, em função das mudanças de
visão quanto às implicações do marketing, as definições foram tão abundantes quanto as
críticas que atraíram. Para Kotler (2000), o conceito de marketing pode assumir um caráter
gerencial ou social. Pode ser definido gerencialmente como a “ciência da escolha de
mercados-alvo, e da captação, manutenção e fidelização de clientes por meio da criação,
entrega e comunicação de um valor superior para o cliente”.
A definição social de Kotler (2000) é por ele denominada como “orientação de marketing
societal”. Para Morgan (1996), a filosofia do marketing societal tem suas origens no
questionamento da legitimidade e aceitação da filosofia de marketing. Essa definição prevê
que a busca pelo mercado deve ser realizada de tal forma que preserve ou melhore o bemestar do consumidor e da sociedade, indicando que as empresas devem desenvolver
condições sociais e éticas em suas práticas de marketing, equilibrando critérios
freqüentemente conflitantes entre os lucros da empresa, a satisfação dos desejos dos
consumidores e o interesse público. Semenik e Bamossy (1995) afirmam que as empresas
estão aceitando seu papel na preservação e não degradação do meio ambiente. Assim, as
atividades de criação de ofertas para o mercado devem levar em consideração não apenas a
satisfação do cliente no tempo presente, mas a relação com a sociedade e o ambiente no
futuro.
Para Richers (1994), as atividades de marketing facilitam o fluxo de produtos dos
produtores para os clientes, o que pode ter profundas implicações sociais. Sistemas de
marketing eficientes podem levar ao aumento do comércio e do desenvolvimento
econômico, o que aumenta a base tributária do país. Esses benefícios podem ser
rapidamente traduzidos em sistemas de educação e saúde melhores, indo muito além dos
objetivos básicos de suprir os clientes com o que querem, quando querem e por um preço
que queiram pagar por isso.
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Esses valores (bem-estar social e preservação ambiental) têm sido utilizados como um
forte fator de posicionamento para empresas dos mais variados setores econômicos,
visando a ocupar uma posição competitiva distinta e significativa na mente dos
consumidores. Vários autores, como Kotler (2000), Toledo e Amigo (1999) e Semenik e
Bamossi (1995) afirmam que a criação desse valor, em um contexto adequado de
custo/benefício, é o grande desafio a superar para alavancar o desempenho.
Os conceitos de marketing podem focar os níveis estratégico e operacional. O marketing
estratégico analisa constantemente os mercados de referência (ou mercados-alvos) da
empresa, identificando produtos e segmentos de mercados atuais e potenciais onde a
mesma poderia atuar, considerando fatores como a atratividade dos diferentes segmentos
ou nichos de mercado, o ciclo de vida dos diferentes produtos, as vantagens concorrenciais
da empresa no longo prazo. O segundo conceito, o marketing operacional, ao contrário do
estratégico, enfatiza as atividades de curto prazo, orientadas para o atendimento e a
manutenção dos mercados atuais, através dos elementos do mix de marketing (produto,
praça ou canais de distribuição, preço e promoção ou composto promocional) mais
adequados aos objetivos da empresa. Ele se ocupa também dos orçamentos de marketing
adequados às atividades comerciais da empresa.
Uma das formas de aumentar a precisão do marketing dentro de uma organização é
segmentar o mercado, identificando grupos com preferências, poder de compra, hábitos de
consumo ou localização geográfica semelhantes. Para Kotler (2000), com a segmentação, a
organização pode criar produtos a preços apropriados e oferecê-los através de canais de
distribuição e comunicação mais adequados, além de enfrentar menor concorrência.
Produto, preço, distribuição e comunicação são as variáveis mercadológicas que a empresa
utiliza para concretizar uma oferta para o mercado. Na linguagem da área, são
denominados os “4P’s” ou “mix de marketing”.
Para Silva (2001), o marketing dentro do contexto do agribusiness utiliza basicamente os
mesmos conceitos aplicados a outros setores produtivos, porém deve considerar algumas
particularidades das firmas agroalimentares, como: a) natureza dos produtos
(perecibilidade, sazonalidade); b) características da demanda (bens de consumo corrente,
produtos em ascensão ou estabilizados ou em declínio, sazonalidade); c) comportamento
do consumidor (dimensão psicológica: preocupação com a saúde, etc.); d) dispersão do
setor de produção agropecuária; e) concentração do setor de distribuição; f) importância
das cooperativas no negócio de transformação de produtos de origem agropecuária.
5. O CONCEITO DE COMPETITIVIDAADE E O COOPERATIVISMO DE
REFORMA AGRÁRIA
Apesar de ser um tema de destaque nos meios acadêmicos e governamentais, não existe
consenso sobre o que significa competitividade. Ferraz et al. (1995) sintetizam a discussão,
classificando os conceitos existentes em duas famílias: a primeira vê a competitividade
como o desempenho da empresa, indústria ou nação em conquistar e manter market share,
enquanto que a segunda família relaciona competitividade à eficiência que se pode obter na
equação insumos/produtos finais. Para os autores, ambas as famílias de conceitos
apresentam o problema da estaticidade. Assim, propõem que competitividade é “a
capacidade da empresa de formular e implementar estratégias concorrenciais, que lhes
permitam ampliar ou conservar, de forma duradoura, uma posição defensável no mercado”,
agregando a análise do processo de concorrência e do ambiente ao estudo da
competitividade (FERRAZ et al., 1995:3).
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Segundo Hooley et al. (2001), para que uma empresa possa definir uma posição
competitiva defensável, deve conhecer a fundo o mercado e predispor-se a aprender sobre
ele de forma contínua, dada a sua capacidade de mutação. Para os autores, o ambiente de
marketing pode ser dividido em macroambiente (cenário social, político e econômico mais
amplo) e ambiente competitivo (empresa, concorrentes imediatos e clientes). A
manutenção da competitividade depende da criação e renovação das vantagens
competitivas, onde cada produtor se esforçaria em obter peculiaridades que o distingam
favoravelmente da concorrência (Lastres e Cassiolato, 1995, citado por PIGATTO, 2001).
Porter (1986) desenvolveu o modelo das cinco forças competitivas para operacionalizar a
análise do que Hooley denominou ambiente competitivo. Para Porter, uma empresa deve
constantemente monitorar a rivalidade entre os concorrentes da indústria, a ameaça de
produtos substitutos e de entrada de novos concorrentes, e o poder de barganha dos clientes
e fornecedores. O conhecimento da indústria propicia subsídios para a obtenção de uma
vantagem competitiva – a diferença entre o valor que a empresa é capaz de criar para seus
compradores e o custo de criação desses valores (PORTER, 1990).
Porter e Hooley et al. citam nas entrelinhas as competências básicas que uma empresa deve
ter para criar e manter sua posição competitiva. Ferraz et al. (1995) propõem um modelo
de análise dinâmica dos fatores determinantes da competitividade, classificando-os em três
grupos. O primeiro, denominado “fatores empresariais”, diz respeito às competências
básicas da organização em termos de desenvolver e acumular capacidades em recursos
humanos, inovação, gestão e produção. Os “fatores estruturais” correspondem
aproximadamente à análise da indústria desenvolvida por Porter (1986), abrangendo a
análise do mercado, a configuração da indústria e as políticas públicas em termos de
incentivos e regulação da concorrência. Por fim, o terceiro grupo congrega os “fatores
sistêmicos”, que mais que o macroambiente sugerido por Hooley et al. (2001),
correspondem à análise da infra-estrutura disponível para a produção e para pesquisa,
aspectos ligados à educação, sistema trabalhista e securitário, e as políticas de
relacionamento internacional.
No caso brasileiro, a abertura da economia a partir da década de 90 acabou por tornar
premente para a indústria nacional o incremento da capacidade de produção e inovação,
com vistas a atender a um mercado maior que o nacional. Segundo Bell e Pavitt (1993), os
países em desenvolvimento acumularam, nas últimas décadas, crescimento da capacidade
de produção industrial e melhoraram a presença nos mercados internacionais,
principalmente com produtos oriundos de empresas “dominadas por sua cadeia de
suprimentos” e “intensivas em escala”, utilizando conhecimentos e tecnologias de firmas
que são “fornecedoras especializadas”. O crescimento variou, segundo os autores, em
termos de firmas, indústrias e países. No caso brasileiro, apesar do crescimento dos anos
50, não houve desenvolvimento de ofertas de maior poder agregado ou de tecnologias de
ponta, dificultando a manutenção da competitividade face às mudanças técnicas do restante
do mundo.
Para Coutinho e Ferraz (1995), a superação da fragilidade do sistema empresarial brasileiro
é um desafio fundamental, tendo em vista que o atual cenário de rápidas transformações
pode levar ao aprofundamento do abismo que separa a estrutura competitiva do país dos
demais, com reflexos indesejáveis de agravamentos das disparidades sociais e regionais.
Para vencê-lo, é imprescindível que a internacionalização da inovação técnica e a
capacitação sejam vistas como atividades empresariais permanentes e estruturadas.
Ferraz et al. (1995) afirmam que as formas possíveis de competição combinam níveis
diferentes de preço, qualidade, serviços, vendas e diferenciação da oferta. Assim, avaliar
competitividade requer estudar as vantagens competitivas, geralmente vinculadas às
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especificações do produto, processo de produção, vendas, gestão, escalas de produção,
tamanhos dos mercados, relações com fornecedores e usuários, condicionantes da política
econômica, financiamentos, infra-estrutura disponível e aspectos legais.
A partir da análise deste item em conjunto com os anteriores, pode-se perceber que a
totalidade dos empreendimentos de produção agropecuária e agroindústrias dos
agricultores familiares ligados ao MST pertencem ao grupo denominado por Ferraz et al.
(1995) como “indústrias tradicionais”, que correspondem ao grupo “dominado pela cadeia
de suprimentos” de Bell e Pavitt (1993). Na análise de Coutinho e Ferraz (1995), são
empreendimentos que pertencem a um setor com deficiências competitivas, posto que “sua
produção é voltada apenas para o mercado interno que, se por suas dimensões apresenta a
principal vantagem competitiva do país, pela redução de poder aquisitivo, crescente
desigualdade social e alijamento do mercado de parcelas significativas da população, não
tem representado estímulo à competitividade” (COUTINHO E FERRAZ, 1995:258).
No entanto, o setor se torna atraente para os empreendimentos econômicos solidários da
reforma agrária, tendo em vista que a forte segmentação representa oportunidades para
atender a espaços mais delimitados de mercado, que valorizam referências culturais, selos
alternativos, produtos ecológicos e artesanais e outros. Tais atributos possibilitam fugir da
guerra de preços, impossível de ser ganha pela estrutura produtiva e ideológica desses
empreendimentos. Como afirma Lisboa (2003:191), “a economia solidária é a afirmação
da possibilidade de uma economia jogada com regras em que todos ganhem através de uma
simbiose entre cooperação/competição”. Essa oportunidade pode ser aproveitada em
espaços de mercado situados dentro e fora do país.
6. O ITERRA E A INSERÇÃO DOS PRODUTOS NO MERCADO
O Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária (ITERRA) localiza-se
na cidade de Veranópolis (RS). Dentre outras atividades, desenvolve cursos de capacitação
de nível secundário, como o Técnico em Administração de Cooperativas, Técnico em
Saúde, Técnico em Comunicação Popular, Magistério e o curso superior de Pedagogia.
Todos os cursos são modulares, sendo realizados em etapas presenciais e etapas
denominadas tempo-comunidade, nas quais os educandos devem aplicar os conceitos
discutidos no tempo-escola e realimentar o processo de construção de um novo modo de
produção e de vida solidários. Além da educação formal, o ITERRA possui uma planta
piloto para a fabricação de conservas de frutas e legumes, a fim de desenvolver técnicas de
produção e princípios de boas práticas de manufatura para treinamento de cooperados para
agroindústrias ligadas ao MST no Brasil.
A execução do projeto de pesquisa “Dinâmica organizacional e produtiva em cooperativas
de Reforma Agrária: diagnóstico, implementação de estratégias para o desenvolvimento e
perspectivas”, financiado pelo CNPq, possibilitou o contato com o ITERRA e originou o
convite para a realização de uma etapa de 27 horas/aula relacionadas ao assunto Economia
e Mercado, cujo objetivo seria a transmissão de conceitos ligados à administração
mercadológica para uma turma de formandos. O trabalho desenvolvido com os vinte
educandos da Turma Carlos Marighela resultou no convite para o acompanhamento de
quatro etapas de 30 horas/aula dessa disciplina para a turma Antonio Conselheiro, com 39
educandos, que atualmente já participou de três etapas da disciplina.
O conteúdo do programa desenvolve os principais conceitos de marketing, a análise
do ambiente e as estratégias de segmentação e posicionamento que derivam da
análise do consumidor para a construção do composto mercadológico – produto,
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preço, promoção e praça, ou “4P’s”. Por fim, os educandos desenvolvem o
composto de marketing para uma oferta escolhida pela turma.
Duas atividades práticas são realizadas durante os módulos: a pesquisa de mercado
e a análise sensorial. O objetivo de ambas as atividades era repassar uma ferramenta
de formatação de uma oferta para um mercado-alvo. Através da comparação entre
os atributos de produtos concorrentes e produtos fabricados dentro do ITERRA, os
educandos construíram uma oferta concreta em termos de Produto, Preço,
Promoção e Praça.
Ao final do período de instrução e construção de conhecimentos, os educandos da
Turma Carlos Marighela foram instados a analisar se os conceitos de marketing
poderiam ser utilizados na construção de ofertas de produtos da Reforma Agrária, e
avaliar se esses conceitos necessitariam de adaptações ao contexto da economia
solidária. A turma Antônio Conselheiro passa por avaliações modulares, tendo
trabalhado os conceitos de marketing, pesquisa de mercado, composto de marketing
e planejamento. Alguns resultados serão mencionados em seu tempo.
7. METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO
Quanto ao método clássico, esta pesquisa pode ser classificada como um estudo de caso,
tendo em vista que a falta de amplitude oriunda da análise de uma única experiência não
permite extrapolar os dados para o universo dos cooperados da Reforma Agrária. Yin
(2001) afirma que os estudos de caso, como os experimentos, são generalizáveis a
proposições teóricas, e não a populações ou universos, e que o objetivo do pesquisador que
se utiliza do método do caso é expandir e generalizar teorias (generalização analítica), e
não enumerar freqüências (generalização estatística).
Quanto a abordagem, trata-se de uma pesquisa-ação, tendo em vista que a discussão dos
conceitos e a sua aplicação aos empreendimentos de Reforma Agrária junto aos educandos
do ITERRA procurou interpretar particularidades dos comportamentos e atitudes dos
indivíduos. El Andaloussi (2004) salienta que essa démarche possibilita abordar
fenômenos da sociedade em sua complexidade, permitindo ainda a intervenção do
pesquisador dentro de uma problemática social, onde os interessados tornam-se atores e,
participando do desenvolvimento da ação, contribuem para produzir novos saberes.
De acordo com Oliveira (2001), as pesquisas que se utilizam de dados qualitativos
possuem a facilidade de poder descrever a complexidade de uma determinada hipótese ou
problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos
dinâmicos experimentados por grupos sociais e apresentar contribuições no processo de
mudança, criação ou formação de opiniões de determinado grupo.
Esta investigação foi construída com dois vetores de percepções dos educandos: o que
entendiam por marketing antes do módulo Economia e Mercado e, após a socialização dos
conceitos, como entendiam o marketing e se havia possibilidade de utilizar seus conceitos
e ferramentas para a viabilização dos produtos da Reforma Agrária; e verificar a retenção
dos conceitos aprendidos, através da aplicação dos conceitos a um caso concreto de
produto da Reforma Agrária.
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8. O MARKETING NO COOPERATIVISMO DE REFORMA AGRÁRIA
No início das atividades com as Turmas Carlos Marighela e Antônio Conselheiro, após um
nivelamento de expectativas, os conceitos elementares de administração mercadológica
foram passados. Os alunos perceberam que o conceito tradicional de marketing não era
adequado para o contexto da Reforma Agrária. Pelas características de empreendimento
solidário e ambientalmente sustentável, o conceito mais adequado era o de marketing
societal, como proposto por Kotler (2000).
O trabalho prático de ambas as turmas foi iniciado após explanações sobre a pesquisa de
mercado e sua importância em um universo de consumo em constantes mudanças de
percepção. Sua primeira etapa foi desenvolvida nos supermercados da cidade por meio de
pesquisa explotarória que visou conhecer, dentro de pontos de venda selecionados, as
características de alguns produtos em termos de embalagens, quantidade acondicionada,
variações, disposição nas gôndolas, quantidade de concorrentes, preço e percepção de valor
em relação a “preço/qualidade aparente”. Para selecionar os produtos que seriam
pesquisados, levou-se em consideração o critério de estarem as cooperativas já os
produzindo ou pensando em produzi-los, a fim de que o trabalho fosse o mais prático
possível.
Dessa pesquisa exploratória, desenvolveu-se o processo de construção da oferta física em
termos de “4P’s”. Na Turma Carlos Marighela, um dos produtos pesquisados foi
selecionado para a realização de uma degustação comparativa entre uma marca comercial e
o produto fabricado no ITERRA. Intencionalmente foi selecionada uma geléia sabor
morango, tendo em vista ser esse um dos produtos de maior saída dentre os produzidos
pela planta piloto.
Os aspectos avaliados em ambos os produtos foram “cor”, “odor”, “sabor” e “textura”. A
avaliação sensorial foi realizada de forma “aberta”: os respondentes avaliaram os produtos
em suas próprias embalagens e declinaram suas opiniões em público. Os resultados da
análise dos 20 educandos quanto a preferência nesses itens encontram-se na Tabela 1.
Aspectos
Concorrente
ITERRA
Odor
01
19
Cor
17
03
Sabor
03
17
Textura
01
19
Tabela 1 – Resultados da análise sensorial da geléia Iterra versus
concorrente, realizada pela Turma Carlos Marighela.
Os educandos perceberam o produto ITERRA como superior ao concorrente em termos de
sabor, odor e textura; no entanto, a cor do produto da concorrência lembrava a coloração
de morangos frescos, o que o tornava mais atrativo visualmente. Da mesma forma, sua
embalagem e o formato de seu rótulo davam a aparência de produto mais nobre e com
presença de pedaços de morango, o que não se confirmou durante a análise.
A análise sensorial realizada em sala de aula acabou por deflagrar um processo de
comparação entre os produtos ITERRA e concorrentes. Aproveitando a oportunidade de
apresentar mais uma metodologia para análise sensorial, procedeu-se a uma segunda
avaliação, desta vez “cega” (os respondentes não tinham indicação de procedência das
amostras analisadas). O produto escolhido foi o segundo mais vendido no ITERRA – o
pêssego em calda. Os aspectos analisados foram “textura da fruta”, “textura da calda”,
“sabor”, “doçura”, “aroma”, “aparência” e “cor”. Novamente o produto ITERRA mostrou11
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se superior ao concorrente, somente perdendo no quesito “doçura” e empatando
tecnicamente no que tange a “textura da fruta”. Ambos os aspectos estão relacionados a
idade do fruto.
Durante as aulas expositivas, foram clarificados os conceitos dos “4 P’s”. Ao final da
explanação teórica sobre cada um deles, os educandos da Turma Carlos Marighela eram
instados a retornar à análise da geléia e ratificar ou retificar as decisões tomadas quando do
seu lançamento, propondo melhorias para o composto de marketing do produto. O Quadro
1 sintetiza as impressões dos educandos quanto aos aspectos do mix de marketing para a
geléia de morango do ITERRA.
Produto
Dar maior
visibilidade ao
produto;
Melhorar a cor;
Usar lacre;
Melhorar
rótulo: formato,
desenho da
fruta, expor que
o produto não
contém
conservantes
Preço
- Deve ser o mais
baixo possível
para possibilitar
o acesso ao
produto das
classes menos
favorecidas;
- Deve ser
coerente com o
público-alvo
(quem pode
pagar mais, deve
fazê-lo)
Promoção
Praça
- Desenvolver as
- Usar as mídias
lojas do MST
do MST e de
(canal
simpatizantes;
exclusivo);
- Desenvolver
- Aumentar a
panfletos junto
distribuição para
com o doce;
outros pontos;
- Participar de
festas temáticas, - Desenvolver o
mercado
feiras e eventos;
institucional
- Estreitar laços
(hotéis, creches,
com a
hospitais,
comunidade e
escolas)
com a imprensa
- Melhorar a
- Fazer cadastro
entrega porta-ade clientes para
porta
comunicação um
a um
Quadro 1 – Revisão dos “4P’s” da geléia do ITERRA após a análise sensorial pela
Turma Carlos Marighela.
O trabalho com os educandos da Turma Antônio Conselheiro já passou por três etapas,
sendo a primeira relativa à importância dos conceitos econômicos que norteiam a relação
com os mercados, e uma noção de marketing e técnicas de pesquisa, que foram
desenvolvidas em campo, como a Turma Carlos Marighela. A segunda etapa resgatou os
resultados das pesquisas, aprofundou o conceito de marketing e trabalhou o composto
mercadológico em termos teóricos mais aprofundados, o que possibilitou a realização em
sala de uma análise das estratégias atuais utilizadas pelas associações e cooperativas de
produção do MST. O resultado dessa discussão está sintetizado no quadro 2.
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Produto
Preço
Promoção
Praça
- Boa parte da
- O atual objetivo - Os esforços da
A maior parte
produção é
comunicação não
é sobrevivência,
in natura
escoada via
estão integrados
em função de
- Falta de
“atravessador”
com o setor de
“deficiências
padronização de
- Necessidade de
produção
para competir”
cor, peso,
conjugar esforços
(produtos, canais - O setor de
formulação e
com as lojas do
produção não
de distribuição,
tamanho
MST e de
está integrado
comunicação,
- Muitas vezes,
simpatizantes
(fornecimento de
comparação com
falta matéria(intercoopematérias-primas
a concorrência)
prima
ração)
e insumos)
- Falta de
cuidados com
embalagem e
rotulagem
Quadro 2 – Avaliação das estratégias gerais para os “4P’s” utilizadas atualmente
pelas associações e cooperativas de produção do MST, na visão da Turma
Antônio Conselheiro
-
Magee apud Svensson (2001) afirma que a seleção de um canal de marketing apropriado é
de vital importância para a eficácia subjacente do conceito do marketing, em função do
imperativo de atender simultaneamente às necessidades de clientes e consumidores.
Svensson afirma que as companhias bem-sucedidas buscam superar ambas as
necessidades, tendo como ponto de partida da elaboração do canal de marketing não o
cliente, mas o cliente do cliente. Assim, as organizações devem melhorar suas vantagens
competitivas por meio do ajuste de suas atividades para os valores dos consumidores, o
que vem ao encontro das colocações dos educandos da turma Antônio Conselheiro – a
superação da comercialização via atravessadores, que não valorizam condizentemente as
ofertas dos assentamentos, com a busca por consumidores ligados ao posicionamento dos
produtos da reforma agrária. Na terceira etapa do curso Economia e Mercado, foram
trabalhados os conceitos e ferramentas de planejamento de marketing, com vistas ao
desenvolvimento de uma visão estratégica de mercado que possibilite a superação de
problemas como esse.
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As expectativas iniciais da turma Carlos Marighella sobre marketing podem ser agrupadas
como relacionadas a apreender “conceitos”, “conhecimento do mercado” e das “estratégias
de competição” para intervir na realidade dos assentamentos de Reforma Agrária, trazendo
viabilidade para as agroindústrias e visibilidade para os produtos. Morgan (1996) afirma
que existem argumentos formidáveis para sugerir que as organizações devem reconhecer o
potencial do marketing e, desse modo, procurar modos de colocá-lo em prática com os
devidos ajustes necessários à organização, com vias a realizar os objetivos dos clientes e da
organização. No entanto, para as turmas, não se deve esquecer o foco desse marketing: os
valores éticos e sociais, que norteiam a construção de uma nova relação com o mercado,
aproveitando nichos de mercado, como o consumo solidário, e segmentos com grande
potencial, como o de produtos agroecológicos.
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Os aspectos de posicionamento a serem utilizados na comunicação, segundo os alunos da
Turma Carlos Marighela, devem ser ligados a argumentos como “qualidade”, “orgânico”,
“saúde”, “respeito ao meio ambiente”, “política e economicamente correto”, “solidário”,
“leva o homem de volta para o campo”. Portanto, na terminologia de Ferraz et al. (1995),
os produtos da reforma agrária devem competir em “especificações do produto”, “processo
de produção”, “vendas” e “relação com fornecedores e usuários”.
As avaliações após o término do módulo único da turma Carlos Marighela foram positivas
quanto a apreensão de um conteúdo básico sobre marketing. De um extremo a outro, as
visões vão desde uma visão de marketing operacional (operacionalização do mix) até a
visão estratégica do marketing enquanto canalizador do esforço estratégico da organização.
Alguns educandos citaram em seus relatos que suas barreiras quanto ao assunto tinham
sido derrubadas, reconhecendo poder ser o marketing uma ferramenta gerencial de grande
importância para a viabilização da competitividade de produtos e agroindústrias da
Reforma Agrária no Brasil, que devem utilizar principalmente as vantagens em qualidade e
diferenciação para a elaboração de suas estratégias competitivas.
De fato, o trabalho com os educandos da turma Carlos Marighella acabou por deflagrar um
processo de criação de uma nova identidade visual para os produtos do ITERRA, buscando
valorizar a beleza dos produtos e alguns aspectos de competitividade, como a produção
agroecólogica, ausência de conservantes e o fato dos produtos serem oriundos do trabalho
de agricultores familiares, assentados no processo de reforma agrária. Segundo a gerência
de produção e comercial da Terra e Frutos, agroindústria do ITERRA, as vendas dos
produtos aumentaram 30% após a implantação da nova identidade visual, em relação às
vendas dos produtos com as embalagens e rótulos antigos.
Igualmente, apreender os conceitos de marketing pode auxiliar na participação de
mercados fora do Brasil. Atualmente, a planta piloto do ITERRA está desenvolvendo
protótipos de produtos para atender a redes de consumo solidário na Espanha e outros
países da Comunidade Econômica Européia. Para Magalhães (2001), estudos de mercado e
planos de negócio contribuem para a inserção dos produtores solidários nos mercados em
condições econômicas mais favoráveis. Políticas de mercado devem priorizar a criação de
sistemas de informação e implementar políticas de marketing para adequar produtos às
necessidades da demanda. Assim, as ferramentas de análise de mercado, sintetizadas no
planejamento estratégico, devidamente adaptadas ao contexto dos empreendimentos da
economia solidária, podem ser de grande ajuda na viabilização econômica desses
empreendimentos, a fim de que realmente se constituam numa alternativa ao emprego e ao
subemprego.
O apoio governamental a Reforma Agrária, efetivo e em grande escala, possibilitará a
disponibilização de recursos para a implantação de novas agroindústrias e revitalização das
existentes, que enfrentam enormes dificuldades de sobrevivência, e a implementação de
práticas mais profissionalizadas de relacionamento com o mercado atual, bem como o
acesso a outros mercados potenciais, como o estatal e o externo. Além disso, é
fundamental a assistência e a formação integrada e contínua em três dimensões – técnica,
administrativa e política. Por meio do ITERRA e outras escolas ligadas ao MST, os
“fatores empresariais” de Ferraz et al. (1995) são estimulados. Os educandos recebem
treinamento e educação para transformar-se em “novos homens e mulheres”,
comprometidos com uma nova matriz tecnológica – a agroecologia –, e com uma relação
mais ética e justa a sociedade.
De fato, pessoas hábeis a analisar os fatores estruturais e sistêmicos, com vistas a buscar
oportunidades e neutralizar ameaças para os produtos da reforma agrária, visando não
apenas a presença no mercado capitalista, mas, conforme Lisboa (2003), demonstrar que
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há outras forças econômicas além da hegemônica, que buscam construir a possibilidade de
uma maior democratização da economia e, portanto, da sociedade, alicerçadas num
controle genuinamente social sobre os meios de produção, realizado por indivíduos
cooperativamente associados.
No entanto, sem planejamento adequado, esses esforços poderão ser vãos. Daí a
importância da sensibilização dos assentados em conceitos de competitividade e
planejamento estratégico e de marketing. A última fase da disciplina Economia e Mercado
para a turma Antonio Conselheiro desenvolverá, a partir de informações sobre
concorrentes, consumidores e oportunidades de mercado, coletadas pelos educandos
durante o tempo-comunidade, a elaboração de um plano de marketing para cada
cooperativa ou associação representada por eles, com vistas a um futuro acompanhamento
da aplicação prática dos mesmos e avaliar os resultados práticos da aplicação dos
conhecimentos de marketing pela reforma agrária.
Porém só isso não basta. É fundamental a assistência técnica relacionada à formação
integrada e continuidade em três dimensões – técnica, administrativa e política. De fato, a
lógica da Economia Solidária é oposta à lógica do mercado globalizado. Este, em sua
perseguição pelo lucro máximo, separa-se de questões que não sejam econômicas.
Tradicionalmente a globalização e seus impactos sobre o setor agrário é interpretada como
um processo de padronização de políticas de fazenda, aumentando-se a expansão das
fronteiras agrícolas, medidas uniformes de proteção ambiental, aumento da
competitividade e da produção e comercialização de alimentos com controle cada vez
maior, por firmas transnacionais, sobre a cadeia produtiva.
No entanto, segundo McMichael apud Levi (2000:2), longe de conduzir à homogeneidade,
a globalização pode oferecer a oportunidade de repensar a diversidade local e pode ajudar
comunidades locais a encontrarem novos espaços no mercado em uma economia global
nova ou resistir às pressões globais. Nem os valores clássicos nem os princípios podem
prover meios suficientemente resistentes à ameaça do paradigma neoliberal. Isso implica ir
além da doutrina convencional sobre cooperativismo e de recorrer à variedade de formas
sociais, culturais e que a comunidade espera que sejam adotadas pelas cooperativas,
principalmente as rurais (LEVI:13).
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