23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental
II-391 - INFLUÊCIA DA UMIDADE E DA ESPESSURA DA CAMADA DE LODO
SOBRE A DISTRIBUIÇÃO VERTICAL DA TEMPERATURA
Eduardo Pedroza da Cunha Lima(1)
Químico Industrial pela Universidade Estadual da Paraíba. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente
pela Universidade Federal da Paraíba. Pesquisador bolsista DTI do Programa de Saneamento Básico
(PROSAB).
Adrianus C. van Haandel
Professor do Departamento de Engenharia Civil do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Federal
de Campina Grande.
Paula Frassinetti Cavalcanti Catunda
Professora do Departamento de Engenharia Civil do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Federal
de Campina Grande.
Pericles Rezende Barros
Professor do Departamento de Engenharia Elétrica do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade
Federal de Campina Grande.
Aretho de Oliveira Barbosa
Graduando de Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Campina Grande.
Endereço(1): Rua José Maria Tavares de Melo, 43 – Jardim Luna – João Pessoa - PB - CEP: 58034-220 - Tel:
(83) 9971-0102 - e-mail: [email protected]
RESUMO
Um dos fatores mais importantes a serem considerados no projeto de um leito de secagem e higienização de
lodo consiste em conhecer como ocorre a distribuição vertical da temperatura no material. A distribuição de
calor no lodo influencia os processos de evaporação da água e de inativação ou destruição de patogênicos,
pois as temperaturas elevadas promovem a desnaturação protéica e a inativação de enzimas fundamentais ao
metabolismo desses organismos. A utilização de coberturas transparentes em leitos de secagem favorece a
retenção de calor e conseqüentemente promove o aumento da temperatura do lodo. Entretanto a camada
inferior do lodo apresenta-se como a região mais promissora de não ocorrer higienização, pois não está
exposta ao sol e possui menores temperaturas. Os altos gradientes de temperatura no perfil vertical da camada
de lodo evidenciam a propriedade termofísica deste material de não conduzir bem o calor. Entretanto à medida
que ocorre a evaporação da água, se reduzem a capacidade térmica do sistema e a distância entre as camadas
extremas do lodo. Conseqüentemente baseando-se na primeira lei da calorimetria e na lei de Fourier de
condutividade, o lodo apresentará maior facilidade de aquecimento e distribuição de calor quando submetidos
aos mesmos valores diários de radiação solar. Neste aspecto, verifica-se que a distribuição da temperatura do
lodo relaciona-se com a umidade do material. Portanto, torna-se fundamental estudar a influência da umidade
e da espessura da camada de lodo sobre o aquecimento e a distribuição de calor pelo perfil vertical do
material.
PALAVRAS-CHAVE: Temperatura das camadas do lodo, higienização, PROSAB.
INTRODUÇÃO
Uma das alternativas para o destino do lodo proveniente de estações de tratamento de esgoto é a aplicação
deste material como adubo agrícola. Entretanto para esse fim são fundamentais os processos de higienização e
secagem.
A higienização do lodo poderá ser realizada com o auxílio da energia solar. O sol apresenta raios ultravioletas
com ação bactericida e poderá ser fonte de calor para o tratamento térmico do lodo.
Os maiores riscos potenciais de utilização de lodo de esgoto na agricultura estão relacionados com a densidade
de ovos de helmintos. As temperaturas mais apropriadas para a eliminação de ovos de helmintos, que resistem
bem à dessecação em leitos de secagem, são acima de 50°C (ANDREOLI, et al., 2001). De acordo com a EPA
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(1995) a relação tempo de exposição e temperatura para a destruição de Ascaris ssp é de 60 minutos a 55°C ou
7 minutos a 60°C.
Mesmo em regiões tropicais onde a radiação solar incidente atinge picos de 1kW/m² dificilmente será possível
que o lodo em leitos convencionais alcance por todo o seu volume temperaturas suficientes para higienização;
talvez apenas a camada seca e superior do lodo seja higienizada. Ainda que seja realizado o revolvimento do
lodo provavelmente a higienização só ocorrerá após longo período sob altas condições de radiação solar.
Dessa forma torna-se necessário buscar alternativas de acréscimo ou retenção de calor para acelerar o
processo de higienização.
Uma das formas de promover aumento da temperatura em leitos de secagem consiste em utilizar coberturas
transparentes. A cobertura transparente permite o aquecimento do lodo (corpo negro) e retarda as perdas de
calor para o ambiente.
Para avaliar a potencialidade da utilização de coberturas transparentes em leitos de secagem no processo de
higienização do lodo é fundamental conhecer a distribuição vertical da temperatura pelo material. Essa
distribuição de temperatura relaciona-se com as propriedades termofísicas do lodo, principalmente com a
condutividade térmica e o calor específico.
Considerando que concomitante ao processo de aquecimento do lodo ocorre também à evaporação da água,
pode-se afirma que a distribuição de calor pelo material é influenciada pelo processo de secagem. A secagem
reduz a capacidade térmica do sistema e a altura da camada de lodo, facilitando o aquecimento e a distribuição
de calor.
Dessa forma a presente pesquisa investiga, em leitos de secagem com cobertura transparente, a influência da
umidade e da altura da camada de lodo na distribuição vertical da temperatura.
MATERIAIS E MÉTODOS
Foram construídos modelos de leitos de secagem cobertos com vidro com o fundo e paredes laterais de
poliestireno para isolação térmica. Usaram-se dois tipos de leito de secagem, aplicando-se diferentes cargas de
lodo anaeróbio percolado (80% de umidade), 7, 14, 21, 28 e 35 kgSTS/m2 (valores em termos de massa seca).
As cargas aplicadas promoveram inicialmente camadas de lodo com 4, 8, 12, 16 e 20 cm de espessura. Todos
os leitos possuíam coberturas de vidro 4 mm dispostas com inclinação de 200.
O primeiro tipo de leito era totalmente fechado e, portanto não havia renovação do ar contido entre o lodo e a
cobertura (Figura 1), conseqüentemente promovendo maior retenção de calor e umidade do ar. Diferentemente
a configuração do segundo tipo de leito permitia uma convecção natural do ar (Figura 1), possibilitando a
redução da umidade relativa do ar, mas apresentando uma menor retenção de calor.
Convecção Natural
Figura 1: Configuração dos leitos de secagem com cobertura de vidro.
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Com a utilização de um Sistema Eletrônico de Aquisição de Dados de temperatura e radiação solar (SEAD)
foi possível conhecer a distribuição diária da radiação global e as temperaturas da camada superior e inferior
do lodo nos leitos de secagem. O SEAD foi desenvolvido pelo departamento de engenharia elétrica da UFCG
para a realização desta pesquisa, permitindo a obtenção on-line de informações de temperatura e radiação
global a cada 5 minutos.
As pequenas dimensões dos leitos permitiram a determinação da taxa de evaporação de água pela pesagem
diária, o que por sua vez possibilitou conhecer a redução da umidade do lodo no decorrer do tempo. Na Figura
2, há uma ilustração dos leitos de secagem utilizados no experimento.
Figura 2: Ilustração dos leitos de secagem utilizados no experimento.
RESULTADOS
As Tabelas 1 e 2 apresentam o resumo das informações obtidas durante o experimento realizado com os leitos
com convecção natural do ar e sem convecção. Neste período a radiação diária média foi de 250 W/m² com
picos superiores a 1 Kw/ m2.
Tabela 1: Dados experimentais obtidos nos leitos sem convecção.
7
Carga aplicada (kg/m²)
14
21
28
35
Espessura inicial da camada de lodo (cm)
4
8
12
16
20
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo quando a
umidade estava em 78%.
60
41
38
33
30
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo quando a
umidade estava em 60%.
75
68
51
43
38
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo quando a
umidade estava em 40%.
75
70
62
49
43
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo quando a
umidade estava em 20%.
75
70
65
57
49
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo quando a
umidade estava em 10%.
75
70
68
65
55
Tempo para alcançar temperatura mínima de higienização 55°C
(dia).
1
20
32
47
65
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Tabela 2. Dados experimentais obtidos no leito com convecção natural.
Carga aplicada (kg/m²)
7
21
35
Espessura da inicial da camada de lodo (cm)
4
12
20
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo(umidade do lodo 80%).
26
30
26
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo (umidade do lodo 60%).
51
33
28
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo (umidade do lodo 40%).
55
35
29
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo (umidade do lodo 20%).
58
37
32
Temperatura (°C) máxima da camada inferior do lodo (umidade do lodo 10%).
65
38
35
Tempo para alcançar temperatura mínima de higienização 55°C (dia).
20
-
-
Verifica-se nas Tabelas 1 e 2 que apenas os leitos com coberturas de vidro sem renovação do ar alcançaram
para todas as cargas pesquisadas temperaturas superiores a 55°C na camada inferior do lodo, a região mais
propícia de não ocorrer higienização.
O fato dos leitos com convecção natural não proporcionarem ao lodo temperaturas em patamares suficientes
para a higienização, deve-se às perdas de calor ocorridas quando há a renovação do ar. Se por um lado à
remoção da umidade relativa do ar interno do leito, por convecção natural, acelera o processo de secagem, esta
prejudica a higienização do lodo.
Como esperado pode-se observar que à medida que a umidade do lodo se reduz mais altos são os valores de
temperatura alcançados na extremidade inferior da camada.
A utilização de coberturas transparentes em leitos de secagem promove vantagens na retenção de calor, no
entanto o tempo para que ocorra a higienização é relativamente longo, pois este se relaciona com a velocidade
do processo de secagem. A Tabela 1 apresenta uma relação da umidade, espessura da camada de lodo é a
temperatura atingida em leitos cobertos sem renovação do ar. Verifica-se, por exemplo, que para umidades de
40% o lodo alcança temperaturas acima de 55°C quando se aplica uma camada com espessura inicial menor
que 12 cm.
Medindo a temperatura da camada superficial do lodo em leitos com renovação do ar verifica-se valores acima
de 55°C , no entanto mostra-se na Tabela 2 que a extremidade oposta da camada de lodo dificilmente
ultrapassa 35°C, exceto camadas muito pequenas menores que 5cm de altura. Esse gradiente de temperatura
no lodo revela que este material não é um excelente condutor de calor.
Outra evidência do caráter mal condutor de calor do lodo pode ser observada no gráfico da Figura 3. Neste
pode-se notar que apenas no início da noite a camada inferior do lodo alcançou o seu valor máximo de
temperatura. Interessante é que o pico de temperatura no extremo inferior da camada não ocorreu no momento
de maior radiação solar. A Figura 4 mostra o comportamento típico da radiação solar global obtida durante o
experimento
O calor recebido pela camada inferior do lodo foi proveniente do calor acumulado pela camada superior
durante todo o dia, sendo assim consta-se a importância da cobertura de vidro em reduzir as perdas de calor
para o ambiente. Os gráficos da Figura 3 mostram que em um determinado instante a extremidade inferior do
lodo atingiu temperaturas maiores que a da superfície.
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LEITO COM COBERTURA SEM RENOVAÇÃO DO AR (12cm)
60
LEITO COM COBERTURA E SEM RENOVAÇÃO DO AR (16cm)
Extremidade inferior (12cm)
60
Extremidade inferior (16cm)
Extremidade superior (2cm)
Extremidade superior (2cm)
50
Atmosfera
Atmosfera
Temperatura (°C)
Temperatura (°C)
50
40
30
20
10
40
30
20
10
0
2:00
4:00
6:00
0
2:00
8:00 10:00 12:00 14:00 16:00 18:00 20:00 22:00 0:00
4:00
6:00
8:00
Tempo (hh:mm)
10:00
12:00
14:00
16:00
18:00 20:00
22:00
0:0
Tempo (hh:mm)
Figura 3: Distribuição da temperatura da camada superior e inferior do lodo de leitos cobertos sem
convecção.
Radiação global
1200
Média diária: 223 W/m²
Média 6:00 as 18:00: 432 W/m²
1000
Radiaçãao (W/m²)
Máximo: 1113 W/m²
800
Mínimo: 11 W/m²
Horário do pico máximo: 12:26
600
400
200
0
00:00
03:00
06:00
09:00
12:00
15:00
18:00
21:00
00:00
Tempo (hh:mm)
Figura 4: Distribuição diária da radiação global de um dia típico do período de realização do
experimento.
CONCLUSÕES
A utilização de coberturas transparentes em leitos de secagem com renovação do ar não
promovem no lodo temperaturas suficientes para ocorrer a higienização.
A velocidade do processo de higienização térmica em leitos cobertos está relacionada com a
velocidade do processo de secagem.
Em leitos de secagem cobertos a higienização térmica poderá ocorrer em apenas um dia de sol
(radiação diária média 250 W/m²) dependendo da umidade do lodo e da espessura da camada
inicial. Por exemplo, ocorrerá para camadas menores que 20 cm quando a umidade for 10%, para
camadas menores que 16 cm quando a umidade for 20% e para camadas menores que 12 cm para
umidades de 40%.
AGRADECIMENTOS
A investigação experimental foi possível graças ao apoio financeiro da FINEP e do CNPq no âmbito do
PROSAB (Edital 4, tema 4).
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1.
ANDREOLI, C. V.; FERREIRA, A. C.; CHERUBINI, C.; TELES, C. R.; CARNEIRO, C.;
FERNANDES, F. Resíduos sólidos do saneamento: processamento reciclagem e disposição final. IN:
Higienização de Lodo. PROSAB. ABES. Curitiba, PR. (2001).
2.
ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY. Health effects of land application of municipal
sludge. (EPA,n.1-85/015). Washington, DC. (1985).
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melhoria da qualidade da gua tratada e aumento da capacidade de