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JOSÉ CALASANS BRANDÃO DA SILVA: contribuição a historiografia
sergipana
GT1 - ESPAÇOS EDUCATIVOS, CURRÍCULO E FORMAÇÃO DOCENTE (SABERES E
PRÁTICAS)
Silvânia Santana Costa1*
RESUMO
O professor José Calasans Brandão da Silva atuou como docente nas instituições de ensino
sergipana de 1937 a 1947. O presente trabalho analisou a obra: Aracaju contribuição à
História da Capital de Sergipe escrita por José Calasans Brandão da Silva para concorrer à
cadeira de História do Brasil e de Sergipe no concurso para docente da Escola Normal “Rui
Barbosa”. Ao investigar a obra do professor Calasans foi fundamental dispor da perspectiva
defendida de que o indivíduo não pode ser visualizado isolado, pois suas atitudes não
estão dissociadas do homem, as práticas são reflexos do modo de ser, pensar e agir
condicionadas pelo momento histórico e a posição ocupada na estrutura social. Para dar
subsídios ao estudo, os estudos de Bourdieu (1982; 2007); Charlot (2005); Durkheim (1965),
entre outros, contribuíram para compreensão das categorias de análise.
Palavras-chave: intelectual da educação, História da Educação, Biografia.
SUMMARY
Of professor José Calasans Brandão da Silva served as faculty in institutions of higher
education Sergipe one from 1937 to 1947. This work examined the work: Aracaju
contribution to history of the Capital of Sergipe written by José Calasans Brandão da Silva to
run for Chair of the history of Brazil and Sergipe in contest for teaching of Normal School
"Rui Barbosa". When investigating the work of professor Calasans was instrumental in having
the perspective of the individual that cannot be viewed in isolation, because their attitudes are
not separated from the man, practices are reflected in the way of being, thinking and acting
conditioned by the historical moment and the position occupied in the social structure. To
give grants to study, studies of Bourdieu (1982; 2007); Charlot (2005); Durkheim (1965),
among others, contributed to understanding of the categories of analysis.
Keywords: education, intellectual education history, Biography.
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Coordenadora de Estagio dos cursos a distância da Universidade Tiradentes (UNIT/NEAD). Possui graduação
em História pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Especialização em Magistério Superior pela
Universidade Tiradentes (UNIT). É Membro do grupo de Pesquisa em História da Educação: intelectuais da
educação, instituições educacionais e práticas escolares (UFS). E também do GET (Grupo de Estudos do Tempo
Presente). Mestranda em Educação no Núcleo de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de
Sergipe. Este estudo faz parte da minha Dissertação de Mestrado em andamento sob a orientação da Profa. Dra.
Anamaria Gonçalves Bueno de Freitas E-mail: [email protected].
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Em José Calasans somam-se o professor, o historiador, o folclorista, o
amigo. Professor por vocação e idealismo por mais de 40 anos, projetou-se
pela cultura e pelas qualidades didáticas com que transmitia os
conhecimentos de História, sua especialidade. Seus ex-alunos sempre
relembram as aulas, animadas, vivas, dadas dentro das técnicas pedagógicas
mais modernas e, sobretudo, a grande compreensão humana do professor.
Qualidades essas que decorrem da formação humanística de que é possuidor,
formação que, lamentavelmente, está desaparecendo nas novas gerações,
substituídas pelo tecnocrata com sua visão limitada de mundo e de homem
(SILVA, 1992, p. 05)
É dessa forma, que Maria Thétis Nunes apresenta o professor José Calasans
Brandão da Silva na apresentação do livro: Aracaju contribuição à História da Capital de
Sergipe, escrito por ele, em 1942 para concorrer à cadeira de História do Brasil e de Sergipe
no concurso para docente da Escola Normal “Rui Barbosa”. Ele foi docente nas instituições
de ensino sergipana de 1937 a 1947, embora formado em Direito pela Faculdade da Bahia não
atuou no campo, pois afirmava que gostava de ministrar aula, de ser professor.
Inicialmente, refletir sobre a formação educacional do professor José Calasans nos
ajudará a compreender alguns aspectos pela paixão da docência em detrimento do Direito. A
formação desenvolve no indivíduo competências, por meio de conteúdos que são
condicionadas pelo contexto histórico e pelo tipo de formação.
Destarte, o indivíduo é educado a partir de práticas e situações que permitem
mobilizar as competências apreendidas. Sendo assim, é importante verificar: quais as
competências desenvolvidas em Calasans no seu período de formação inicial? Quais os
professores que inspiraram sua forma de pensar? Que livros ele leu durante o período de
formação? O que representou a leitura dessas obras para o agir profissional?
Ao analisar esses questionamentos partimos da idéia de homem pela qual o sujeito
“é o substrato do social, porém esse mesmo social se impõe sobre ele porque o precede e o
sucede e porque é do social, de suas tendências e necessidades que ele extrai sua natureza e
suas formas de ser e fazer” (TURA, 2001, p. 42).
Isso ocorre porque, os adultos através da educação, estabelecem um conjunto de
normas e ações pela qual desenvolve no indivíduo ainda não organizado para a vida social.
Assim, a educação é um fenômeno social e obedece às exigências do contexto histórico no
qual está inserida. Em todas as sociedades ela é construída a partir de uma simbologia do
homem ideal que se pretende formar.
Uma das instituições educacionais responsáveis pela formação do homem é a
escola. O sistema institucionalizado de ensino é o responsável por incorporar o programa de
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pensamento e de ação de uma determinada sociedade sendo encarregado pela difusão da sua
cultura.
Deste modo, “os esquemas que organizam o pensamento de uma época somente
se tornam inteiramente compreensíveis se forem referidos ao sistema escolar, o único capaz
de consagrá-los e constituí-los, pelo exercício, como hábitos de pensamentos comuns a toda
uma geração” (BOURDIEU, 2005, p. 208). A educação “institucionalizada, tem objetivos
próprios e funções sociais bem definidas, o que inclui controlar e limitar o desenvolvimento
humano, assim como decidir sobre as coisas mais imediatas como a seleção de conteúdos para
o ensino” (TURA, 2001, p. 52).
Dentro dessas perspectivas, a análise do contexto educacional ocupado José
Calasans Brandão da Silva desde a infância até a vida adulta permite compreender os
questionamentos anteriores. No contexto de formação escolar inicial, os estudos primários
foram realizados no Colégio Nossa Senhora da Conceição, uma escola particular, bem localizada
no centro de Aracaju, situada próximo do Palácio do Governo e da Assembléia Legislativa.
Na época, apenas os filhos da elite estudavam em escola privada, Calasans era
proveniente de família prestigiada na sociedade sergipana. Ele era filho de Irineu Ferreira da
Silva, parente do General José Calazans nomeado em 1892 e posteriormente em 20 de
outubro de 1930 para ocupar o governo de Sergipe. Já a mãe, Noeme Brandão da Silva era
natural de Estância, proveniente de família abastarda, filha de Benjamim Francisco, retratista
famoso e da professora Maria Filonila da Silveira. Seu tio Josafá da Silveira Brandão era
médico, professor e diretor do Atheneu Sergipense.
No Colégio Nossa Senhora da Conceição, sua professora primária, Maria da Glória
Chaves ou “Dona Glorinha” como era conhecida pelos alunos, ministrava suas aulas tomando
por base os compêndios, os conteúdos eram passados de forma criteriosa, sem desviar do que
estava posto, não ocorria o acréscimo de outras informações, limitava-se ao que estava no
material instrucional. Na hora do lanche, as guloseimas podiam ser compradas na escola ou
trazidas de casa, era o único momento de realizar as brincadeiras.
Deste modo, “a ação pedagógica primária (primeira educação) vai estar na
origem de um habitus primário, atributo de um grupo ou de uma classe, que
se revelará o princípio de percepção e de avaliação de toda experiência
posterior, mesmo que seja realizada em condições muito diferentes. Vivendo
em um contexto social determinado, cada indivíduo se vê dotado – com o
passar das experiências da primeira infância e da juventude marcadas pelos
gostos e pelo estilo de vida familiar – de um habitusespecifico que, em
último caso, dará conta da maneira como ele assimilará, na forma de
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asirações e de modos de agir, todas suas experiências posteriores”.
(HAECHT, 2008, p.27)
Após concluir os estudos na Escola de “Dona Glorinha”, José Calasans ingressou
em 1929, no Ateneu Pedro II, este nome perdurou de 03 de dezembro de 1925 até 16 de
fevereiro de 1930. Em 1942, por força da Reforma Capanema, teve a denominação de Colégio
Estadual de Sergipe, pelo Decreto nº 32, de 06 de maio.
O Atheneu Sergipense preparava tanto para o ingresso ao Ensino Superior como
para o magistério. Desde o século XIX que o Atheneu constitui-se no berço da
intelectualidade sergipana. Assim,
o Atheneu Sergipense caracterizou-se por ser um instituto oficial de ensino,
localizado na capital sergipense – Aracaju -, possuir alunos externos, contar
na sua administração com as figuras do diretor e professores para as
diferentes matérias, e congregar, concomitantemente, por certo período, dois
tipos de ensino: os estudos secundários, preparando os seus egressos para os
cursos superiores ou os habilitando profissionalmente os candidatos ao
magistério público (ALVES, 2005, p. 24).
A unidade educativa era considerada a principal instituição de ensino secundário
de Sergipe, pois consagrava importantes nomes do campo educacional, político e histórico da
sociedade sergipana. Essa ascensão individual de determinadas pessoas contribui para
legitimar o processo educacional que prega a igualdade de oportunidade para todos. Uma vez
que, o crédito concedido à idéia da mobilidade social “encontra sua forma realizada na
ideologia escolar da escola libertadora” (BOURDIEU E PASSERON, 1982, p. 176).
Havia no início do período republicano a preocupação com a formação de
professores, pois o grande número de analfabeto decorrente da falta de instrução para todos,
era um mal que deveria ser sanado por meio da constituição de uma escola democrática e de
uma formação adequada para os docentes. A educação era vista como “um instrumento para a
organização harmoniosa da sociedade, tendo como objetivo a promoção do bem comum”.
(FONSECA, 2009, p. 15).
A escola seria o difusor de idéias que embute no indivíduo através da
escolarização os interesses de uma determinada fração da sociedade, servindo de instrumento
de reprodução e transformação do habitus inculcado no âmbito familiar, constituindo assim o
princípio de estruturação das experiências subseqüentes. Ela atua como centro formador de
atitudes, valores e diretrizes sociais inserindo por longos anos de permanência na instituição o
pensamento vigente como ideal comum.
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Apesar de o discurso governamental elucidar que o Atheneu Pedro II era uma
contribuição para o ingresso de todos na faculdade de Medicina, Direito e Engenharia. O
ensino secundário em Sergipe era elitista, mesmo com a implantação do colégio, o ingresso
ficou restrito a poucos. Em um país no qual o grau de analfabetismo era enorme, as
instituições de ensino não davam conta da demanda, então como passar no exame de
admissão? Quais os subsídios teóricos adquiridos no primário que permitiriam esse ingresso?
Quais as condições ofertadas pelo Estado para isso?
Os menos privilegiados ingressavam nos estabelecimentos de Ensino Secundário
com o auxilio de proteção. No entanto, para “ter acesso à escolaridade, e particularmente aos
seus níveis superiores, implicava uma batalha árdua, excepcionalmente vencida pelas
camadas menos favorecidas, à custa de humilhações e sujeições de toda natureza” (XAVIER,
2008, p. 101). Destarte, apenas uma pequena parcela da sociedade sergipana tinha acesso ao
nível superior, visto que este era bastante dispendioso e requeria da família um grande
investimento. O ingresso no curso superior era prioridade e representava o progresso e o
crescimento individual, sendo a instrução um privilégio para poucos.
Outro elemento fundamental para refletir sobre o acesso dos alunos ao Atheneu
Pedro II era o regime de seleção. Os exames eram rigorosos e obedeciam a um cronograma
que deveriam ser vistoriados pelo inspetor federal a fim de garantir a legitimidade das provas.
Até o final dos anos 50, as instituições de ensino secundário conheceram
uma estabilidade muito grande fundada na eliminação precoce e brutal (no
momento da entrada em sixième) das crianças oriundas de famílias
culturalmente desfavorecidas. A seleção com base social que se operava,
assim, era amplamente aceita pelas crianças vítimas de tal seleção e pelas
famílias, uma vez que ela parecia apoiar-se exclusivamente nos dons e
méritos dos eleitos, e uma vez que aqueles que a Escola rejeitava ficavam
convencidos (especialmente pela Escola) de que eram eles que não queria a
Escola (BOURDIEU, 2007, 219)
A rigidez para o ingresso ao estabelecimento era voltada tanto para o corpo
docente, como para o discente, estes poderiam ser de outros estabelecimentos de ensino.
Assim, “Nada é mais adequado que o exame para inspirar a todos o reconhecimento da
legitimidade dos veredictos escolares e das hierarquias sociais que eles legitimam”
(BOURDIEU E PASSERON, 1982, p. 171).
O colégio também possuía prestígio, por ser constituído por uma equipe de
professores de renome, ser catedrático na instituição significava a inserção no circuito
intelectual sergipano, era uma forma de entrada no campo, no qual se concretizava
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prontamente a legitimação do status de intelectual. Dessa forma, “um sistema de ensino deve,
para preencher sua função social de legitimação da cultura dominante, obter o reconhecimento
da legitimidade de sua ação, ao menos sob a forma de reconhecimento da autoridade dos
mestres encarregados de inculcar essa cultura” (BOURDIEU E PASSERON, 1982, p.135).
Alguns professores contribuíram para a formação intelectual de José Calasans,
para ilustrar elencamos alguns e suas respectivas disciplinas:
Professor
Artur Fortes
Luis José da Costa Filho
Clodomir de Souza e Silva
Felte Bezerra
Maria Rita Gomes Andrade
José Augusto da R. Lima
José Rollemberg Leite
Disciplina
História Universal
História do Brasil
Português
Geografia, Cosmografia e Geofísica
Literatura
Psicologia e Latim
Física
Destes, Artur Fortes, Clodomir Silva, Luis José da Costa Filho, considerados pelo
próprio Calasans como fonte inspiradora de sua carreira. Diante disso, podemos afirmar que o
professor exerce um poder no alunado, podendo influir positivamente ou negativamente.
Analisando pela ótica de Durkheim, o docente tem um grau de importância enorme na
formação dos indivíduos, ele o define como “um transmissor de saberes – oriundos das
ciências físicas e biológicas, da história, dos conhecimentos literários e estéticos, das crenças
e costumes – valorizados e essenciais à continuidade societária” (TURA, 2001, p. 51).
Isso ocorre através da ação pedagógica, pela qual, o docente contribui para a
reprodução de um capital cultural exposto como padrão social a ser seguido. Através da
influência de uma ação contínua e sistematizada, o professor reproduz a mensagem
consagrada por uma determinada estrutura social, inculcando o arbitrário cultural através de
instrumentos que garantem a conservação e legitimação da cultura dominante. O processo
ocorre de forma sutil, ocultando o real sentido que se encontra associada ao capital cultural.
Essa violência simbólica é refletida nas diferentes ações pedagógicas exercida na formação
social. (HAECHT, 2008)
Analisando o histórico escolar da turma de 1932, referente à quinta série, as
disciplinas que José Calasans obteve maior média foi História do Brasil, Cosmografia e
Filosofia. Depois Latim e História Natural, em Física e Química suas notas foram as menores.
Mesmo assim, estava entre os quatro alunos com maior média geral.
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Ao concluir seus estudos secundários, foi prestar vestibular na Faculdade de
Direito da Bahia. Era comum o direcionamento dos jovens sergipanos de boa renda para dar
continuidade aos estudos fora do Estado. De julho de 1932 e janeiro de 1933, antes de
participar do processo seletivo, fez o curso preparatório na própria instituição do Portão da
Piedade. As provas de seleção aconteceram em 14 de fevereiro de 1933 e, de 90 candidatos
inscritos, foram aprovados setenta e três, dentre eles, José Calasans.
O jovem Calasans, na época de estudante na Bahia fez parte da Associação
Universitária e da Ação Integralista Brasileira, foi nomeado em 1933, como membro da
comissão de Imprensa da Bahia. Nos anos seguintes foi designado para coordenar a Seção
Universitária de Estudos, nomeado chefe da divisão de Coordenação e convocado pela
secretaria Provincial de Educação Moral e Cívica para participar de uma reunião, na qual foi
encarregado do cargo de chefe da Terceira Secção do Departamento Technico Provincial.
No mesmo ano, quando cursava a 3º série concorreu na chapa para bibliotecário
no centro acadêmico Ruy Barbosa. Também representou a Bahia na 1° Congresso Jurídico
que reuniu vários universitários. No ano de 1937 assumiu o cargo de diretor provincial dos
serviços eleitorais e Políticos da SPCSE. Além do curso de Direito, na Bahia, José Calasans
esteve envolvido em vários setores que proporcionaram projeção e difusão de ideários
comungados com vários setores sociais.
Quanto às leituras exigidas no curso de Direito como: Planiol, Duguit, picard,
Clóvis Bevilaqua, Carlos Maximiliano, Carvalho Mendonça não foram lidos com entusiasmo.
Durante seus estudos dedicou-se as leituras de caráter histórico, folclórico e sociológico,
como as obras de Joaquim Nabuco, Oliveira Vianna, Alberto Torres, Manoel Bonfim,
Gilberto Freire, Caio Prado Junior, Sérgio Buarque de Holanda. “A ciência de Beviláqua não
o empolgava” (NOBREGA, 2006, p. 266).
Em 1937 retorna a Sergipe com o título de Bacharel em Direito, no entanto
pretendeu apenas ser professor de história enveredando pela pesquisa histórica e folclórica.
Nesse contexto, o professor Calasans passou a atuar em instituições de ensino de Sergipe, no
Departamento de Ensino e em diversos órgãos como o IHGS, o Serviço de Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional.
Analisando o percurso educacional desde o primário até o superior notamos que a
história fez parte de seu percurso acadêmico, os professores, as leituras despertaram o
interesse de Calasans para a história e o folclore. O que tinha realmente desejo em fazer,
segundo seu amigo Omer Mont‟Alegre era “um concurso para professor de história do Brasil
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em qualquer estabelecimento. Para isso, estudava com pertinácia a complicada história do
povo brasileiro” (NOBREGA, 2006, p. 269).
É, porém, no ano de 1942 que o professor José Calasans prestou concurso para
ocupar a cadeira de História do Brasil e de Sergipe da Escola Normal “Rui Barbosa” com a
tese sobre a capital sergipana, intitulada: Aracaju: contribuição à História da capital de
Sergipe. Em dezembro defendeu sob o olhar atento da banca examinadora composta pelos
professores: Dr. Gonçalo Rollemberg Leite, José Augusto da Rocha Leite e Artur Fortes,
desses dois foram seus professores no Atheneu Pedro II.
Depois de compreender o porquê da paixão pela docência em detrimento do
Direito, poderemos nos deter a analisar a obra inscrita por José Calasans, partindo de algumas
reflexões: Como perceber a pesquisa sobre livro? Os professores e as leituras realizadas
durante sua trajetória educacional servirão de inspiração para a narrativa histórica? Quais
temáticas foram abordadas na obra? Qual a importância da tese para a historiografia?
Inicialmente refletiremos sobre a pesquisa sobre livros, ela se constitui em um
campo de estudo recente, principalmente os didáticos, e vem alcançando espaço maior na
História da Educação. Vários estudos estão centrados em outros campos de análise do espaço
educacional. O campo é um espaço de lutas pelo reconhecimento social, pela legitimidade. As
lutas travadas nesse espaço contribuem para a discussão competitiva, para o diálogo crítico
que favorece a acumulação e o controle do saber, garantindo reputação e prestígio,
ocasionando a acumulação do capital simbólico e do capital fundado no conhecimento e no
reconhecimento.
Outro fator que favoreceu a inserção de várias temática foram os estudiosos dos
Annales que possibilitaram aos historiadores, novos métodos, novas questões e novas fontes.
Dentre esse universo de diversos objetos de estudos, no campo da História da Educação,
encontra-se a história da história do livro.
Darnton (2010) discute a história do livro e apresenta como a temática foi
ganhando expressão a partir da sua inserção pelo estudioso no leque de abordagem da história
socioeconômica, embora já tenha iniciado desde a cultura renascentista. Freitas (2006)
apresenta como um grupo de pesquisadores brasileiros alargaram as perspectivas das
pesquisas sobre a temática contemplando outras dimensões de análises abrindo caminhos
“para a especialização dos estudos sobre a história do ensino de história”.
Contudo, os historiadores do livro não dão conta de analisar todo o conjunto de
elementos envolvidos: autores, editores, gráficos, distribuidores, livreiros, leitores. Assim,
como a pesquisa encaminha para outras dimensões, “ao revelar esses circuitos, os
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historiadores podem mostrar que os livros não apenas relatam a história; eles fazem a
história” (DARNTON, 2010, p. 219)
Destarte, não se tem a pretensão nesse trabalho de analisar todos os aspectos da
obra, nos deteremos aos conteúdos selecionados e abordados pelo autor, a fim de verificar se
os professores e as leituras realizadas durante sua trajetória educacional serviram de
inspiração para a narrativa histórica.
A obra Aracaju: contribuição à História da capital de Sergipe foi escrita por
José Calasans Brandão da Silva para prestar o concurso para a Escola Normal “Rui Barbosa”
em 1942. A obra está inserida numa coletânea de textos intitulada: Aracaju e outros temas
sergipanos: Esparsos de José Calasans Brandão da Silva. Nesse estão as obras: Introdução ao
estudo da historiografia sergipana; Aracaju – contribuição à história da capital de Sergipe e
Temas da província.
Inicia trazendo uma citação de Gilberto Freire com a definição de província e
provinciano. Como foi discutido anteriormente no processo de formação intelectual, ele foi
um dos autores lidos por Calasans e que inspirou a escrita da história. Dois livros de História
marcaram o destino de José Calasans: o de Joaquim Nabuco e o de Gilberto Freire. Em
entrevista concedida a Calumby (1993/1994) declarou que fora influenciado por Casa
Grande e Senzala. “Quando eu voltei pra Sergipe, diplomado em 37, pensando em ser só
professor. Eu imaginava escrever um livro (sic)... não passou de artigo que A formação
Sergipana com o título: Currais e engenhos de Sergipe”.
A obra está estruturada em temáticas, para cada, ele apresenta um sumário
elucidativo do que vai abordar. Na escrita do texto, o conteúdo está diluído sem a
fragmentação apresentada no sumário. O método empregado na construção da narrativa
histórica é o diferencial entre o discurso literário. Para Chartier (2009, p. 24) “a ficção é um
“discurso que „informa‟ do real, mas não pretende representá-lo nem abonar-se nele”,
enquanto a história pretende dar uma representação adequada à realidade que foi e já não é”.
A construção a seguir da tabela tem o propósito de deixar evidente a estruturação
da obra.
TEMÁTICAS
A POLÍTICA DE INÁCIO BARBOSA
SUMÁRIO
I – A política da Conciliação
Ministério Paraná;
II – Inácio Joaquim Barbosa
Recepção dos liberais;
Opinião do Barão de Maroim;
Pacificação dos espíritos;
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POLÍTICA AÇUCAREIRA
SANTO ANTÔNIO DO ARACAJU
AS CAUSAS DA MUDANÇA
A MUDANÇA
Comentários da “União Liberal”;
Atitude de Inácio Barbosa;
Tranquilidade pública;
Segurança individual e da propriedade.
Sergipe era o açúcar;
Defesa da produção canavieira;
Aspectos gerais e locais do problema;
Atraso industrial e encarecimento de braços;
Trapicheiros da Bahia e falta de comércio com
estrangeiros;
O regulamento de fevereiro de 1845;
Resultados obtidos;
Companhia do Vapor a Reboque;
Organização;
Barra da Cotinguiba.
Etimologia da palavra Aracaju;
Cajueiros dos papagaios;
Sugestão de Clodomir Silva;
A primitiva cidade de Cristóvão de Barros;
Mudanças;
Aldeia de Aracaju;
Legislação;
Engenho e olaria;
Limites;
A situação do povoado em fins de 1854.
Velhas e novas opiniões;
Felisbelo Freire e Manuel dos Passos;
Enoque Santiago e Clodomir Silva;
Ambiente brasileiro na década de 1850;
Conciliação e progresso;
As cidades brasileiras do século XIX;
Povoações coloniais;
As capitais das Províncias;
Causas geográficas e econômicas;
A posição da Cotinguiba;
Barra dos Coqueiros e Aracaju.
Primeiras providências;
Alfândegas e mesa de rendas;
Agência de Correio;
Subdelegacia Policial;
Viagem ao “Brejo”;
Reunião do “Unha de Gato”;
Informações de Travassos;
Convocação extraordinária da Assembléia;
Protestos da Câmara Municipal de S. Cristóvão;
Porque Inácio Barbosa preferiu Aracaju;
Debates na Assembléia;
A posição do Vigário Barroso;
A Resolução nº 413;
Atitude dos sancristovenses;
Versos populares;
João Bebe-Água.
Paisagem; casas de palha e de telha;
Desrespeito às posturas municipais;
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A NOVA CIDADE
Conclusões
Notas
Bibliografia
Os primeiros edificadores;
Concessão dos terrenos da marinha;
Opinião do engenheiro Pirro;
Prédios públicos;
Santo Antônio e Olaria;
Aterros;
Luta contra a água;
Água de S. Cristóvão;
Impaludismo;
Causas e remédios;
Impaludismo e tifo;
Retirada de Inácio Barbosa;
Fim da primeira fase.
Apresenta os pontos centrais da obra: a mudança
da capital sergipana; os fatores internos e
externos; o aspecto econômico e geográfico
Explicativa e informativa
Calmon (1935); Nabuco (1936); Castro (1937);
Silva (1920); Freire (1891); Soares (1938);
Varnhagen (s/d); Ribeiro (1936); Travassos
(1866); Holanda (1936); Pinto (1938); Freyre
(1940); Carvalho (1933); Teles (1903); Peixoto
(1931);
Cartas; jornais; relatórios; anuários; revista do
IHGS; Leis; Coleção; conferências; Álbuns;
Livro de Atas;
A tese Aracaju: contribuição à História da capital de Sergipe defendida por
José Calasans aborda os motivos da mudança da capital de São Cristóvão para Aracaju, uma
questão bastante discutida por vários historiadores apresentado na sua análise histórica. Ela é
importante para a historiografia sergipana, pois apresenta uma versão nova acerca do
ocorrido. Com isso, desconstrói o que foi dito por historiadores consagrados no período.
Comungamos com a idéia de Weber ao afirmar que “o conhecimento histórico-cultural seria
apenas uma das formas de representar a realidade”. (CARVALHO, 2005, p. 61).
Diante disso, a reconstrução histórica de José Calasans apresentou que os motivos
para a mudança da capital foram externos e internos. Os primeiros correspondem ao contexto
histórico nacional, destacando a questão econômica, o período de conciliação, o tipo de
cidade exigido a partir da nova configuração do segundo império, priorizando o discurso
urbanístico corrente na época, a localização estratégica das cidades que careciam de porto
para escoar a produção. Quanto aos fatores internos, está ligado aos motivos regionais, nos
quais prevaleceram os aspectos econômicos e geográficos. A região da produção açucareira
era economicamente mais relevante daí a necessidade de transferir a capital de um local tanto
econômico como geográfico sem importância para o desenvolvimento da província.
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Além do discurso central sobre as causas da transferência da capital para Aracaju,
o autor descreve as condições de moradia, as enfermidades, o processo de urbanização da
nova capital. Para a constatação da narrativa histórica, conferindo-a o atributo científico, o
autor utilizou um conjunto de fontes para a reconstrução do passado e para comprovação da
sua tese apresentando argumentos embasados em documentos.
A seguir, elencamos os documentos utilizados pelo professor José Calasans que
lhe deu subsídios para interpretação da mudança da capital sobre os aspectos discutidos na
tese. O quadro foi construído para mostrar que além da pesquisa bibliográfica o autor utilizou
também a pesquisa documental.
Jornais
Revistas
Relatórios
Cartas
Discursos
Legislação
Livro de Atas
Fontes
Correio Sergipense; A União Liberal; Correio de Aracaju; Folha da
Manhã;
Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe;
Franco (L.A.P);
Inácio Joaquim Barbosa – apresentado a Assembléia Legislativa
Provincial;
Barão de Maroim a Leandro Bezerra Monteiro;
Inácio Joaquim Barbosa a Leandro Bezerra Monteiro
Inácio Joaquim Barbosa
Compilação das Leis Provinciais de Sergipe;
Assembléia Legislativa Provincial;
Como afirma Marrou (1975, p. 68) “o engenho do historiador não se manifestará
somente na arte de descobrir os documentos. Não basta saber onde e como os encontrar, é
preciso também, e, sobretudo, saber que documentos procurar”. Portanto, é preciso se
apropriar de modo que as perguntas sejam respondidas, isso será efetivado por meio da crítica
ao documento.
O que podemos perceber é que os objetos, as pessoas, as situações, enfim tudo
que se é observável, não possui sentido próprio, o significado é constituido a partir das
interelações, que de certo modo aparece única a todos. No entanto, para Weber
(CARVALHO, 2005) ao interpretar os fatos históricos, o pesquisador não pode se utilizar de
um método universal, ele deve levar em consideração as diversas visões de mundo, valores e
expectativas da sociedade para compreensão dos acontecimentos históricos.
Diante disso, o processo de interpretação dos fenômenos concedendo-lhes
significado e explicações auxilia a encontrar as respostas para a consciência história a partir
da tradição que tem junto ao sujeito seu lugar histórico. Para se chegar ao significado
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histórico do fenômeno, o historiador interpreta os textos naquilo que dizem e testemunham
dando significado as suas constatações. A experiência humana no mundo é a base de toda
reflexão situada em um dado contexto. Portanto, as ciências humanas traz uma contribuição
significativa a medida que amplia as possibilidades de reflexão.
Partindo do princípio de que a reflexão deve estar embasada teoricamente,
verificando a bibliografia consultada para a escrita da obra, constatamos que foram utilizados
autores do folclore, da cultura, da história e da sociologia, dentre eles, os lidos no percurso
acadêmico e também professores que contribuíram para sua formação intelectual e
profissional. Diante disso, ao analisar a obra constatou-se que recebeu influência tanto das
leituras realizadas como dos professores.
No entanto, várias questões podem ser suscitadas para pesquisa posterior: Quais
os elementos novos que fizeram a obra ser destaque? Porque ela se tornou referência para os
pesquisadores? Qual a contribuição do professor José Calasans para o Atheneu Pedro II? Ela
utilizou em suas aulas, o trabalho que defendeu? Como a imprensa recebeu a obra? Esses são
questionamentos que poderão ser respondidos em outra pesquisa.
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