SUPERAÇÃO DA POBREZA
VERSÃO PRELIMINAR
Dezembro de 2014
Superação da Pobreza
SUMÁRIO
1- APRESENTAÇÃO ........................................................................................................... 6
2- INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 8
2
3- ARTIGOS ....................................................................................................................... 9
3.1. Juventude e população: desafios, aspirações e realizações
(MARCELO NERI – SAE/PR) .................................................................................. 9
3.2. Políticas de Desenvolvimento Social e seu Papel no Combate à Fome e
Pobreza: Revisitando o Passado Para Pensar a Agenda do Futuro
(PAULO JANNUZI – MDS) ................................................................................... 18
3.3. Bem estar, desigualdade e evolução da pobreza extrema por grupos
etários (1990 – 2012)
(RAFAEL OSORIO – SAE/PR) ............................................................................... 39
3.4. Evolução do bem-estar social entre as regiões brasileiras e a idéia de um
programa para resultados
(FLAVIO ATALIBA – IPECE) .................................................................................. 45
3.5. O Plano Brasil sem Miséria: Características e Resultados
(TIAGO FALCÃO E PATRÍCIA VIEIRA – MDS) ...................................................... 54
4. DEBATE EM ORDEM CRONOLÓGICA.......................................................................... 80
2
Superação da Pobreza
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES
ARTIGO 1 – MARCELO CORTES NÉRI
GRÁFICO 1 – Evolução da População Jovem de 15 a 29 anos: Mundo – 1950 a 2100..........10
GRÁFICO 2 – Evolução da Taxa de Mortalidade entre Jovens de 15 a 29 anos.....................11
FIGURA 1 – Porcentagem de Adolescentes de 15 a 17 anos que já são Mães nos Municípios
Brasileiros..............................................................................................................................11
GRÁFICO 3 – Taxa de fecundidade: mulheres entre 15 e 19 anos.........................................12
TABELA 1 – Felicidade futura 2006 a 2012: satisfação com a vida em 5 anos – 2011 a
2017.......................................................................................................................................13
TABELA 2 – Prioridade dos jovens vis-à-vis não jovens meu mundo.....................................14
GRÁFICO 4 – Evolução da porcentagem dos jovens que não frequentam a escola, nem
trabalham e não frequentam a escola e nem trabalham......................................................16
ARTIGO 2 - PAULO DE MARTINO JANNUZZI
FIGURA 1 - Programas de desenvolvimento social e o Sistema de Proteção Social..............27
GRÁFICO 1 - Evolução da extrema pobreza (monetária) por segmentos populacionais.
Brasil,
1990
e
2012...............................................................................................................................32
3
3
GRÁFICO
2
-
Evolução
da
pobreza
multidimensional.
Brasil,
2004
a
2012.......................................................................................................................................33
ARTIGO 3 - RAFAEL GUERREIRO OSÓRIO
GRÁFICO 1 – Diferença na renda média em R$ (set/out. 2012) por milésimo da
população..............................................................................................................................39
4
GRÁFICO 2
– Taxa de pobreza externa (em % - R$ 70 jun. 2011) por
ano.........................................................................................................................................40
GRÁFICO 3 – Distribuição cumulativa da renda por distribuição cumulativa da
população..............................................................................................................................41
GRÁFICO 4 – Fração das outras rendas (V1273) por centésimo da renda familiar per
capta......................................................................................................................................42
ARTIGO 4 - FLÁVIO ATALIBA
GRÁFICO 1 – Desigualdade de renda: índice de Gini.............................................................46
FIGURA 1 – Bem-estar social de Sen (1977)..........................................................................48
FIGURA 2 – Bem-estar social de Kakwani (2008)...................................................................49
TABELA 1 – Bem-estar social de Kakwani (2008)...................................................................50
TABELA 2 – Participação da renda salarial.............................................................................51
4
ARTIGO 5 - TIAGO FALCÃO E PATRÍCIA VIEIRA DA COSTA
FIGURA 1 – Os três eixos do plano Brasil sem Miséria..........................................................57
GRÁFICO 1 - Ciclo de aperfeiçoamentos no Programa Bolsa Família (2011-2014)................69
GRÁFICO 2 - Evolução das matrículas no Pronatec Brasil Sem Miséria.................................71
GRÁFICO 3 - MEIs beneficiários do Bolsa Família..................................................................73
5
GRÁFICO 4 - Microcrédito Produtivo Orientado e beneficários do Bolsa Família.................73
5
GRÁFICO 5 - Implementação de cisternas do programa Água Para Todos............................75
Superação da Pobreza
1- APRESENTAÇÃO
A criação da CNPD, pelo decreto nº 1.607, de 28 de agosto de 1995, foi influenciada pelas
Recomendações do Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e
Desenvolvimento, que ocorreu em Cairo em 1994. Passou por uma primeira reorganização
6
pelo decreto nº 4.269, de 13 de junho de 2002 e em 15 de maio de 2013, por meio do
Decreto 8.009, a CNPD passou a integrar a estrutura da Secretaria de Assuntos Estratégicos
da Presidência da República.
A CNPD vislumbra promover avanços no debate especializado e na promoção de ações de
fortalecimento da agenda de população e desenvolvimento e, tendo por base seu plano de
trabalho de 2014, propõe-se a concentrar esforços em três objetivos:

Apoiar a atuação internacional do Brasil nas Conferências Internacionais e
Regionais sobre População e Desenvolvimento;

Desenvolver, em parceria com outras instituições, um sistema de monitoramento
dos avanços do país com relação as ações e metas acordadas na Conferência do
Cairo e suas atualizações internacionais e regionais; e

Aprofundar conceitualmente e analiticamente temas estratégicos relacionados à
população e desenvolvimento.
Com o objetivo de maior aprofundamento dos temas relevantes para a agenda de
população e desenvolvimento, a CNPD decidiu pela realização de reuniões plenárias, em
que são promovidas discussões aprofundadas de cada um desses temas. Os resultados das
reuniões plenárias, sobre os assuntos em questão, são apresentados na forma de série
temática, após organização e edição.
Sob o tema ‘Superação da Pobreza’, este volume foi produzido pela Secretaria de Assuntos
Estratégicos da Presidência da República (SAE/PR), com o apoio do Fundo de População das
Nações Unidas no Brasil (UNFPA). Como uma versão preliminar, é formada de artigos,
6
exposições e debates resultantes da reunião plenária ocorrida em 24 de maio de 2014, em
Brasília.
Além de cinco artigos, produzidos para nortear as apresentações feitas na referida
reunião, traz, sob a forma de discussão temática, as principais contribuições dadas pelos
participantes do evento durante os debates que se sucederam às mesas de discussão.
7
7
Superação da Pobreza
2- INTRODUÇÃO
Nenhum processo merece o nome de desenvolvimento se não leva ao fim da pobreza e à
melhoria das condições de vida dos segmentos mais vulneráveis. Todo desenvolvimento
8
precisa ser inclusivo. Nesse quesito, o Brasil da última década é exemplo para o mundo.
A continuidade do processo de eliminação da pobreza não será, porém, alcançada
simplesmente utilizando as mesmas ações e instrumentos que tanto sucesso tiveram nos
últimos dez anos. Na medida em que a pobreza é reduzida, suas composição e natureza se
alteram, requerendo que as ações públicas busquem continuamente adequar-se, para
manter a eficácia.
O objetivo das discussões apresentadas de maneira organizada neste caderno é, por um
lado, avaliar e corroborar o mérito e a eficácia das políticas públicas empregadas com tanto
sucesso no passado recente na promoção do desenvolvimento inclusivo. Por outro lado,
identificar e idealizar ou mesmo especular novas ações que precisam ser implantadas e
aquelas que estão em curso e precisam ser ajustadas às faces – sempre em transformação
– da pobreza brasileira.
8
Superação da Pobreza
3- ARTIGOS
3.1. JUVENTUDE E POPULAÇÃO: DESAFIOS, ASPIRAÇÕES E REALIZAÇÕES
Marcelo Cortes Néri1
Introdução
A juventude brasileira compreende a ordem de 50 milhões de pessoas. Essa geração não
apenas representa a maior das juventudes, mas irá também constituir-se na maior força de
trabalho que o país já teve ou terá. Fenômeno conhecido como bônus demográfico.
Mas, quais os anseios e necessidades típicos da juventude brasileira ainda não atendidos?
Quais os novos desafios e necessidades? Que tipo de desenvolvimento demanda e busca
construir a nova juventude?
As perguntas certamente são mais complexas e numerosas do que as respostas possíveis
de se desenhar neste momento, contudo, alguns ensaios podem ser evidenciados a partir
da reflexão calcada nas transformações apresentadas por este grupo populacional.
O Brasil está no pico da sua juventude, mas vai desacelerar rapidamente depois de 2022 e
então deixará de ser um país tão jovem. A partir da análise deste fenômeno alguns
aspectos podem ser ressaltados inicialmente: (1) a onda jovem; (2) felicidade futura; (3)
agenda jovem; (4) os avanços educacionais; (5) desemprego e circulação; (6) nem nem e a
educação profissional e (7) diálogos com a juventude).
1
Ministro Chefe de Estado da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República
9
9
A onda jovem
O bônus demográfico pode levar a uma série de reflexões. Os demógrafos em geral,
identificam o fenômeno como um campo de oportunidades, entretanto, outras disciplinas
de estudos tratam o tema sob outra perspectiva – pela qual se tende a crer que uma
“guerra” está sendo perdida, devido a causas violentas e externas, como os acidentes de
trânsito, os homicídios e as prisões que atingem especialmente os jovens homens solteiros.
Por outro lado, pensando nas mulheres jovens, tem-se a gravidez precoce e não desejada
como outro elemento deste cenário.
10
10
A Onda Jovem
Mortalidade
taxa de mortalidade entre jovens (0/00)
Hiato de gênero
Homens
1/6/14
Impressão do Mapa | Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013
Mulheres
Hiato de gênero em percentual da mortalidade masculina (%)
Evolução da taxa de mortalidade entre jovens de 15 a 29 anos
11
11
Mapa
Homicídios, Prisões e Acidentes de Trânsito tem a face de
1991- Percentual demulheresde15a17anosdeidadeque
um Jovem, Homem, Solteiro.
Rapazes
tiveram
filhos e não Moças
Impressão do Mapa | Atlas do Desenvolvimento1/6/14
Humano no Brasil 2013
1/6/14
Impressão do Mapa | Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013
A porcentagem de jovens que são mães precocemente (antes dos 16 anos) tem declinado
apenas de forma moderada ao longo da úl ma década e permanece elevada.
Mapa
Mapa
Porcentagem de Adolescentes de 15 a 17 anos
queresjádesão
Municípios
Brasileiros
1991- Percentual demulhe
15aMães
17
ano
de
ida
deque
201
0s
-nos
Perc
e
ntua
l demulhe
resde15a17anosdeidadeque
06/01/14
tiveramfilhos
06/01/14
06/01/14
tiveramfilhos
1991
2010
LEGENDA
Realização:
Fonte: HDI-M Atlas
LEGENDA
LEGENDA
atlasbrasil.org.br/2013/imprimir_mapa/
1/1
Realização:
Realização:
atlasbrasil.org.br/2013/imprimir_mapa/
1/1
atlasbrasil.org.br/2013/imprimir_mapa/
1/1
2000
Taxa de fecundidade
mulheres de 15 a 19 anos (por mil)
2002 2010 2011
Brasil
0,088 0,081 0,067 0,065
Norte
0,141 0,131 0,107 0,102
Nordeste
0,100 0,095 0,077 0,073
Sudeste
0,073 0,065 0,054 0,053
Sul
0,076 0,067 0,055 0,054
Centro-Oeste
0,099 0,090 0,069 0,067
0,16
0,14
0,12
0,1
A Importância do
Corte de Gênero
para Polí cas para
Juventude
0,08
0,06
0,04
2011
2010
2009
2008
2007
2006
2005
2004
2003
2002
2000
0
2001
0,02
Meta 4 – Melhorar a saúde materna.
Fonte: Obje vos de Desenvolvimento do Milênio - V Relatório Nacional de Acompanhamento.
Felicidade futura
Felicidade futura compreende basicamente a satisfação com a vida para um período de
cinco anos. O método atribui uma nota de zero a dez para satisfação dos indivíduos com
sua própria a vida, para os próximos cinco anos.
Neste ranking, o Brasil está no mesmo grupo dos Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova
Zelândia. Existe uma tendência de ciclo da vida na qual a felicidade passada, vai
aumentando. Em outras palavras, significa que ao passo que as pessoas vão envelhecendo,
as recordações e outros fatores as fazem acreditarem que a vida foi boa. Os mais jovens,
por outro lado, tendem a prospectar expectativas muito altas, que podem levar também a
possibilidade de frustração igualmente alta. Ao desagregar os dados e olhar aqueles
relacionados aos jovens, pode-se verificar, o Brasil não é só campeão mundial de felicidade,
como é heptacampeão mundial de felicidade futura. Isso demonstra que as sete vezes que
a pesquisa foi a campo, a nota que o jovem brasileiro atribuiu para a sua vida é sempre
alta.
12
12
Felicidade Futura - 2006 a 2012
Sa sfação com a Vida em 5 Anos 2011 a 17
2006
Em 2012
1
5
10
15
20
25
30
35
135
136
137
138
139
2007
rank
Brazil
iceland
new zealand
austria
sweden
switzerland
netherlands
belgium
9,29
8,37
8,39
8,62
8,03
7,47
8,44
1
17
2008
rank
9,02
1
8,75
5
8,45
10
16
9
2009
rank
9,17
7,99
8,65
8,6
8,6
1
15
Últimos Do Ranking
cambodia
5,37 123
syria
afghanistan
5,99 116
iraq
haiti
5,18 124
8,27
8,22
14
5,6
94
16
8,32
8,03
6,21
6,14
5,64
5,41
5
9,17
2011
rank
2012
rank
1
9,33
1
9,11
1
12
8,52
8,36
8,5
8
11
8,47
8,61
8,35
8,06
7,5
27
5,96
5,72
6,02
5,97
5,4
116
26
6
7
7
32
56
2010
rank
8,42
8,35
8,12
12
25
99
108
113
116
5,72
6,56
5,67
5,61
18
10
18
16
103
6
16
110
95
111
112
51
118
113
115
121
8,26
7,8
24
5,65
5,08
5,26
6,05
5,9
142
46
145
144
129
136
rank
9,21
8,69
8,58
8,47
8,36
8,26
8,13
8,05
5,35
5,33
5,3
5,27
5,08
1
5
10
15
20
25
29
33
135
136
137
138
139
O Brasil é 1º do Ranking mundial de Felicidade futura dos jovens =
País jovem
Fonte : Gallup World Poll 2011
Se os jovens brasileiros têm altas expectativas, acreditam muito neles mesmos e no
futuro, o quê eles querem? Quais são suas aspirações? No que suas aspirações diferem
dos não-jovens?
Agenda jovem
Conforme levantamento da SAE a partir dos dados de uma pesquisa realizada pelo Ipea em
maio de 2013, com mais de dez mil pessoas numa amostra representativa do país, onde as
pessoas puderam escolherem entre dezesseis temas quais são as principais prioridades,
com base no modelo da pesquisa Meu Mundo (My World) das Nações Unidas, verificou-se
que 85,2% dos brasileiros com idade entre 15 a 29 anos elencaram educação, seguida de
serviços de saúde (82,7%) como suas principais prioridades ao pensar em uma agenda de
juventude. Para os adultos a prioridade é invertida. Primeiro saúde (86,6%) seguida de
educação (80,5%). Na pesquisa mundial feita pela internet pelas Nações Unidas, esta
ordem de prioridades se conforma como a dos jovens brasileiros.
13
13
Prioridades dos Jovens vis-à-vis Não Jovens
Meu Mundo
Posição
Prioridade (escolha das 6 principais)
Jovens (%)
Não jovens (%)
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
Educação de qualidade
Melhoria dos serviços de saúde
Acesso a alimentos de qualidade
Governo honesto e atuante
Proteção contra o crime e a violência
Melhores oportunidades de trabalho
Melhoria nos transportes e estradas
Apoio às pessoas que não podem trabalhar
Acesso à água potável e ao saneamento
Proteção a florestas, rios e oceanos
Acesso à energia em sua casa
85,20
82,70
70,10
63,50
49,00
46,90
40,90
35,10
27,40
20,10
19,90
80,50
86,60
76,10
65,70
52,30
43,90
37,90
38,00
28,60
19,20
19,10
12
Eliminação do preconceito e da discriminação
19,50
15,90
13
14
15
16
Igualdade entre homens e mulheres
Liberdades polí cas
Acesso ao telefone e à internet
Combater as mudanças climá cas
11,70
10,50
10,00
7,30
12,50
8,20
8,30
7,10
Fonte: SAE/PR a par r dos dados Sips/Ipea.
As prioridades dos jovens não são tão diferentes das dos não-jovens. A maior diferença é
educação de qualidade (4,7% mais naqueles entre 15 e 29 anos vis a vis aqueles com mais
de 30 anos); melhores oportunidades de trabalho (3 pontos percentuais a mais); liberdades
políticas (2,4 pontos percentuais a mais). Como ponto de atenção ou de distinção entre as
gerações conforme o estudo está a prioridade de eliminação do preconceito e da
discriminação (3,6 pontos percentuais a mais); melhoria nos transportes e estradas (3
pontos percentuais a mais); acesso a telefone e internet (1,8 pontos percentuais. mais) e
proteção a florestas, rios e oceanos (0,9 pontos percentuais mais).
Educação
Apesar de a educação ser prioridade para ambos os grupos, o Brasil apresenta há anos,
dados extremamente ruins em relação aos outros países conforme o Programme for
International Student Assessment (Pisa), que é uma iniciativa internacional de avaliação
14
14
comparada, aplicada a estudantes na faixa dos 15 anos, idade em que se pressupõe o
término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países2.
Como exemplo, pode-se ressaltar a proficiência em matemática. Em 2003, o Brasil foi o
último colocado neste quesito no ranking do Pisa. Entretanto, entre 2003 e 2012 foi o que
mais avançou. O Brasil ultrapassou quatro ou cinco países nesse período, apesar de ainda
permanecer entre aqueles que apresentam piores resultados.
Mesmo não satisfatório, é possível identificar um movimento de melhora na educação
brasileira a partir dos dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Este
movimento de melhora é facilmente identificado nas séries iniciais. O avanço inclusive está
acima da Meta 1, do Objetivo 2 de Desenvolvimento do Milênio (Garantir que, até 2015,
todas as crianças, de ambos os sexos, terminem um ciclo completo de ensino básico). Nas
séries finais do ensino fundamental existe um avanço mais tímido, que indica que no limiar
da juventude existe uma dificuldade maior de alcançar melhores resultados.
Desemprego e circulação
A pobreza tem diminuído para todos os grupos e os jovens não estão entre aqueles que
apresentam piores resultados. As crianças são os mais pobres e os idosos são os menos
pobres. A juventude é a fase de transição. Os jovens estão no meio desta distribuição.
Entretanto, mesmo não sendo os mais pobres, são os mais desempregados e desemprego
é uma certa medida de frustração. A taxa de desemprego de jovens de até 25 anos é três
vezes a dos adultos e mais elevada hoje que há duas décadas, mas em queda desde 2005.
Esta taxa de certo modo faz sentido porque este grupo está entrando no mercado, está
experimentando, o primeiro emprego em muitos casos. O problema está no fato de talvez
este primeiro emprego ser o último. Ou seja, os jovens estão em movimento. Agora a
questão é: até que ponto? Esse movimento é uma coisa totalmente indesejável ou não.
Observando a taxa de rotatividade no emprego que para os jovens com idade entre 18 e 24
anos é de 77%, frente aos 28% para a população com idade entre 30 e 64 anos. O tempo
2
BRASIL. Mnistério da Educação. Inep. Fonte: http://portal.inep.gov.br/pisa-programainternacional-de-avaliacao-de-alunos acessado em: 03/07/2014.
15
15
médio no emprego também é menor para os mais jovens, dois anos. Para o segundo grupo
é de seis anos. Isso obviamente tem dois lados. Os jovens pedem com mais frequência para
se desligar (34%) frente aos 26% dos adultos. Ou seja, existe uma ação voluntária, o jovem
não está necessariamente sendo demitido.
Jovens que não trabalham nem estudam
Certamente este é um ponto de pauta importante ao discutir juventude hoje. A
porcentagem dos jovens de 18 a 21 anos que nem trabalha, nem estuda, nem procura
trabalho é elevada e tem crescido. Os movimentos são distintos entre as faixas que
compõem a juventude. Para aqueles com idade entre 15 e 17 anos há um decréscimo
nítido, assim como para aqueles com idade entre 25 e 29 anos, desde 1990 até hoje.
Entretendo, para aqueles com idade entre 18 e 24 anos, apesar da taxa se apresentar
estável, existe um leve aumento e para os que têm entre 18 e 21 anos, a taxa aumentou
significativamente.
A porcentagem dos jovens de 18 a 21 anos que nem trabalha,
nem estuda, nem procura trabalho é elevada e tem crescido
Evolução da porcentagem de jovens que não frequentam a escola,
não trabalham e nem frequentam a escola e nem trabalham
30
15
15 a 17
anos
29
14
28
13
12
25 a 29
anos
26
11
25
10
18 a 24
anos
24
9
23
8
22
7
18 a 21
anos
21
20
1990
1992
1994
1996
6
1998
2000
Fonte: SAE/PR com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD).
2002
2004
2006
2008
2010
2012
5
2014
Porcentagem (%)
Porcentagem (%)
27
16
16
Se não estão trabalhando, nem estudando, o que esses jovens estão fazendo? Muitas
coisas, inclusive fazendo cursos técnicos e profissionalizando. Existe uma onda jovem na
educação técnica e profissionalizante. O pico está para aqueles com 15 anos de idade, mas,
dos 15 aos 19 anos, essa onda é forte. Sobre o perfil do jovem que estão no ensino técnico
e profissionalizante pode-se afirmar que o jovem de classe C, faz mais cursos técnicos do
que os de classe A, B, D e E.
Diálogos com a juventude
Por fim, é importante escutar os jovens e isso pode se dar por meio de pesquisas
domiciliares, mais abertas que possam compreender melhor a demanda deste seguimento.
Em pesquisa realizada há alguns anos, os jovens de 15 a 17 anos, apontavam como
principal motivo por não estar na escola regular, a falta de interesse. Para não estar nos
cursos técnicos o principal motivo é falta de interesse ou falta de recursos. A partir disso,
pode-se dizer que o principal desafio é a demanda e não necessariamente a oferta. Ou
seja, esta reflexão pode orientar as políticas e programas direcionadas para este
seguimento.
17
17
3.2. POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL E SEU PAPEL NO COMBATE À
FOME E POBREZA: REVISITANDO O PASSADO PARA PENSAR A AGENDA DO
FUTURO3
Paulo De Martino Jannuzzi 4
Introdução
A agenda das políticas públicas corresponde ao conjunto de assuntos e problemas que os
gestores públicos e a comunidade política entendem como mais relevantes em dado
momento histórico. O reconhecimento de uma questão social como problema de governo
ou Estado não é um processo simples e imediato, que responde automaticamente à
importância que a imprensa, um grupo social ou instituição conferem à questão, ou ainda
às estatísticas disponíveis, por mais reveladoras que sejam da gravidade da questão,
quando comparada a outros países ou a outros momentos do passado. Não é a vontade de
uma liderança política, um pesquisador acadêmico, um governante eleito ou agência
multilateral, com conhecimento empírico consistente da realidade ou visão ousada, que
garante imediatamente a incorporação da questão social advogada na agenda formal de
governo (JANN; WEGRICH, 2007).
Um problema social se transforma em questão pública quando existe a convicção de que
ele precisa ser dominado política e administrativamente. Se parece haver solução técnica
viável e factível para determinada questão social, essa entra mais facilmente na agenda.
Afinal, a estrutura do setor público, pelos mecanismos institucionais existentes e
operantes, é um ambiente que 'digere' inovações a seu próprio tempo e estilo (FREY,
2000).
O momento político ou histórico também condiciona a formação da agenda. Um
governante recém-eleito tem maior margem de manobra para colocar novos temas na
3
Este texto é uma versão modificada e ampliada de JANNUZZI (2014).
Professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no projeto
“Informação estatística e sistemas de monitoramento e avaliação de políticas e programas sociais no
Brasil e América Latina”. Atualmente é secretário de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério
de Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
4
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agenda político-institucional no início de seu governo, sobretudo pelo seu diferencial de
votos em relação aos adversários. Sua capacidade de influenciar a agenda é tão maior
quando maior for a preservação ou o aumento de seu capital político ao longo dos anos
seguintes à sua eleição.
Além dos governantes eleitos, os parlamentares e outros atores políticos são elementos
catalisadores desse processo. Eles são diversos e possuem características distintas:
políticos e burocratas; empresários; trabalhadores/sindicatos; servidores públicos; e os
meios de comunicação. Grandes empresários, individualmente ou por meio de lobbies
(grupos de pressão), encaminham suas demandas e pressionam os atores públicos, nas
decisões governamentais, em favor de seus interesses. Também os agentes internacionais,
tais como as agências multilaterais das Nações Unidas e suas Conferências e Cúpulas
Mundiais, constituem outro ator político de grande importância5. Além desses, os meios de
comunicação são outros agentes relevantes no processo, pois dispõem de recursos para
influenciar a opinião pública na formação das demandas. Enfim, as organizações políticas –
partidos, sindicatos, grupos de interesse, agências multilaterais e imprensa – são
fundamentais para que as demandas entrem na agenda política do governo e para que, lá
presentes, possam se transformar em ações e programas concretos.
De fato, é a interação de diferentes atores ao longo dos últimos 60 anos que tem colocado
gradativamente a questão da pobreza, indigência e exclusão social na agenda de políticas
públicas no Brasil. Estas temáticas já vinham sendo investigadas nas universidades e
centros de pesquisa e figuravam como objeto de levantamento estatístico 30 anos antes.
Porém, foi a partir da crise e da estagnação econômica da chamada 'década perdida' – e
5
O combate à fome e à pobreza é talvez um dos compromissos mais reiterados nos documentos e
declarações resultantes das diversas Conferências Mundiais promovidas pelas agências das Nações
Unidas nos últimos 20 anos. Na Declaração dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, firmada
em 2000 por centenas de chefes de Estado, figura como primeiro e certamente mais destacado
compromisso – desdobramento da ênfase conferida pela Declaração e Programa de Ação da Cúpula
Mundial sobre Desenvolvimento Social, de Copenhague em 1995 – a necessidade de “políticas e
estratégias nacionais orientadas para a redução considerável da pobreza em geral, no mais curto
espaço de tempo possível, e para a redução das desigualdades e erradicação da pobreza absoluta
num prazo que será fixado por cada país atendendo ao seu próprio contexto”. Tal compromisso
seria novamente reiterado, um ano depois, na Declaração de Roma sobre a Segurança Alimentar
Mundial e Plano de Ação da Cúpula Mundial da Alimentação. Vale registrar que, antes mesmo das
Conferências de Conhague e de Roma, na Conferência Internacional de População e
Desenvolvimento (CIPD), realizada em 1994 no Cairo, a pobreza já recebera reconhecimento
explícito como questão a ser enfrentada em qualquer estratégia de promoção de crescimento
econômico, população e desenvolvimento sustentável.
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seus efeitos sobre o empobrecimento de diversos segmentos populacionais – que as
questões relacionadas mais diretamente à pobreza passaram a compor com maior
frequência e em maior profundidade a literatura acadêmica e a agenda política, disputando
a centralidade do debate sobre distribuição de renda e iniquidades na constituição do
mercado de trabalho urbano – temáticas privilegiadas no contexto do aumento
generalizado e desigual da renda e do crescimento acelerado da população urbana no
'milagre econômico'.
Embora o conjunto de Políticas e programas sociais estruturado a partir da promulgação da
Constituição de 1988 já viesse desde antes indiretamente atuando no sentido de combater
a fome e pobreza – tanto por meio da ampliação do escopo e escala dos benefícios da
Previdência Social quanto pelas ações nas áreas de saúde, nutrição e merenda escolar -, e,
ainda, apesar de que a emergência do 'Comunidade Solidária' já revelasse a aproximação
dessa temática social na agenda federal no final dos anos 1990, não parece incorreto
afirmar que é a partir de 2003 que há uma priorização efetiva da questão da fome, miséria
e pobreza na agenda de políticas públicas no país. Não obstante essa seja, ainda, uma
questão em disputa política, para o que o curto distanciamento histórico não contribui
para análises mais consensuais e menos 'apaixonadas', é partir de então que a temática do
combate à fome e pobreza assumiu maior proeminência nas prioridades do governo
federal, pelas evidências concretas em termos de definição de compromissos de governo,
institucionalidades e recursos técnicos – os três elementos básicos de viabilização exitosa
de uma Política Pública na perspectiva de MATUS (2006).
De fato, a análise do volume de recursos aportados para essa agenda, os desenhos
programáticos para seu equacionamento, os esforços de articulação intersetorial e de
implementação de arranjos federativos para sua operação, assim como a criação
emblemática da Estratégia Fome Zero, do programa Bolsa Família, do Ministério de
Desenvolvimento Social e Combate à Fome e, mais recentemente, do Plano Brasil Sem
Miséria,
são
evidências
reveladoras
da
centralidade,
investimento,
escala
e
operacionalidade efetiva constituída para a agenda de mitigação da pobreza nos últimos
doze anos.
Fazer o registro histórico, ainda que incipiente, da criação dessas políticas e programas de
desenvolvimento social, de seus efeitos sobre a redução da pobreza e sobre outros
aspectos da realidade sociodemográfica brasileira, é o objetivo desse texto. Ao revisitar o
20
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passado, reconstituindo os elementos centrais da estratégia multissetorial e federativa de
programas de enfrentamento da pobreza, espera-se trazer subsídios para a reflexão acerca
dos novos desafios que se apresentam para superação da pobreza no país nos próximos
anos.
A fome e a pobreza na agenda das políticas públicas no Brasil: das ações fragmentadas de
nutrição e segurança alimentar ao Programa Bolsa Família
Até o final do século passado, a pobreza era objeto de intervenção difusa pelo Estado
brasileiro. Entendida como sinônimo de fome, as primeiras iniciativas do governo federal
destinadas a tratar da questão datam dos anos 1940, quando foram criadas as primeiras
ações de provimento direto ou subsidiado do alimento aos trabalhadores urbanos. Nos
estados já havia se iniciado, pelo menos 20 anos antes, o fornecimento de merenda aos
alunos de escolas públicas, sendo que o governo federal auxiliava com a distribuição de
leite em pó. Em que pesem o mérito dessas iniciativas e os esforços de Josué de Castro –
com repercussão internacional, como conselheiro da FAO – na promoção da agenda de
combate à desnutrição no Brasil, o fato é que, até os anos 1970, a ação federal foi menos
incisiva do que o exigia a gravidade do problema, tal como documentado no seu livro
Geografia da fome, publicado em 1946. Durante a maior parte do século XX, a atuação
governamental esteve centrada em políticas de abastecimento, formação e regulação de
estoques e preços de alimentos, coordenadas pelo Ministério da Agricultura, as quais
certamente foram importantes na perspectiva de soberania alimentar do país.
O crescimento populacional intenso no período, sobretudo em direção aos centros
urbanos, começou a expor a realidade da insegurança alimentar de contingentes
significativos da população, em especial das crianças. Assim, na década de 1970, iniciaramse diversos programas federais de assistência alimentar, alguns dos principais coordenados
pelo Ministério da Saúde, como o Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (TAKAGI,
2006). Dessa iniciativa desdobraram-se vários outros programas, existentes até hoje, como
o Programa Nacional de Alimentação Escolar e o Programa de Alimentação ao Trabalhador.
Também é do final da década de 1970 a estruturação de outros programas de menor
alcance, mas voltados ao combate à fome junto a públicos mais específicos, como
gestantes, nutrizes e recém-nascidos, no caso da suplementação alimentar, e comunidades
de baixa renda do Nordeste, atendidas por meio de cestas básicas de alimentos e/ou rede
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de comercialização com preços subsidiados. Vale observar que as cestas básicas
permaneceram como estratégia de acesso ao alimento com maior ou menor ênfase
durante as duas décadas seguintes.
Ao longo dos anos 1980, com a redemocratização do país e a emergência de lideranças
políticas mais sensíveis às problemáticas sociais, os programas então existentes ganharam
escala e, ainda, foram estruturadas outras iniciativas de assistência alimentar, como o
Programa Nacional de Leite para Crianças Carentes, em 1986 (PELIANO, 2010). Pulverizadas
em 12 programas diferentes, as iniciativas de provimento de acesso ao alimentos do
governo federal alcançaram quase 50 milhões de pessoas na época, mas com baixa
efetividade na mitigação do problema da desnutrição e fome.
A instabilidade econômica da 'década perdida', com altos níveis de inflação, inclusive de
alimentos básicos, desabastecimento de produtos em supermercados, baixo crescimento
do emprego e perda salarial, não impediu, paradoxalmente, que o primeiro governo eleito
pós-redemocratização, no início dos anos 1990, viesse a desmobilizar recursos e os
programas então existentes para abastecimento e garantia de acesso à alimentação. Com o
agravamento da situação de insegurança alimentar, a sociedade civil e agentes políticos
mobilizaram-se para pressionar por uma ação governamental mais robusta e efetiva de
combate à fome. Com novo presidente em 1993, de fato, a problemática da fome
começava a entrar na agenda das políticas sociais no Brasil com maior força. Foram
emblemáticas, nesse sentido, a criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional, em 1993, e a estruturação do Plano de Combate à Fome e Miséria.
Lamentavelmente, tal plano, embora baseado em um diagnóstico então inédito e
detalhado da fome no país – Mapa da Fome – e desenhado para atuar nas múltiplas
determinações do fenômeno, por meio de um conjunto amplo de ações em vários
Ministérios, não conseguiu dispor de estrutura de coordenação para implementá-lo no
curto período em que esteve vigente.
O diagnóstico e parte do desenho desse plano foram usados para formatar o Plano
Comunidade Solidária – e depois o Comunidade Ativa – que, inspirado no programa
mexicano 'Progresa', organizou e articulou as ações federais de combate à fome e miséria
entre 1994 e 2002, sob coordenação próxima da Presidência da República. Ao articular
ações emergenciais e pontuais de assistência alimentar com programas sociais nas áreas de
educação, moradia, vacinação, saúde da família e desenvolvimento rural, o Comunidade
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Solidária constituiu-se em um avanço conceitual e programático no enfrentamento da
pobreza. As restrições orçamentárias, a falta de uma estrutura mais robusta de
implementação das ações, fortemente dependente de organizações sociais, os problemas
de articulação intersetorial e federativa e a cobertura do Plano, restrita a pouco mais de
1.300 municípios (20% do total de municípios do país), limitaram os alcances da estratégia.
Paralelamente aos esforços do governo federal na área, em meados da década de 1990,
alguns municípios de grande porte – não cobertos, portanto, pelo Comunidade Solidária,
mas com recursos orçamentários para investir em política social – começaram a estruturar
programas de transferência de renda, vinculados a outras iniciativas no campo da
assistência social e educação. Inspirado no êxito potencial dessas experiências no combate
à fome e miséria, o governo federal iniciou, em 2001, sua replicação em escala nacional,
com a criação do Bolsa-Escola, administrado pelo Ministério da Educação, voltado à
transferência de recursos às famílias com crianças nas escolas. Com a decisão de
descontinuar os programas de distribuição direta de alimentos – cestas básicas e leite –o
governo federal criou, nesse mesmo período, o Bolsa-Alimentação, coordenado pelo
Ministério da Saúde, destinado às famílias com gestantes e crianças desnutridas, assim
identificadas durante atendimento básico à saúde.
Refletindo a importância com que a fome e a miséria vinham sendo tratadas na mídia, no
debate acadêmico, na discussão política e nas campanhas eleitorais na década de 1990, o
Congresso Nacional passou a tramitar, em 1999, um projeto de Lei Complementar para
criação do Fundo de Combate à Pobreza, destinado a “viabilizar a todos os brasileiros o
acesso a níveis dignos de subsistência e seus recursos serão aplicados em ações
suplementares de nutrição, habitação, saúde, educação, reforço de renda familiar e outros
programas de interesse social, voltados para a melhoria da qualidade de vida” (Lei
Complementar n. 111, de 06 de julho de 2001). Embora os recursos do Fundo estivessem
destinados a ações voltadas à população de mais baixa renda, não se configurando como
uma proposta de assegurar direito universal às ações financiadas pelo mesmo, há um claro
reconhecimento de que o combate à pobreza transcenderia à mitigação da fome, mas
envolveria também ações em outros domínios da política social.
A criação das políticas e programas de desenvolvimento social
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Ainda que o curto distanciamento histórico e o calor da disputa política do presente não
recomendem tal assertiva, não parece incorreto afirmar que, a partir de 2003, há uma
priorização da questão da fome, miséria e pobreza na agenda de políticas públicas no país.
Se é fato que, como apresentado anteriormente, tal problemática foi sendo reconhecida na
esfera pública como crescentemente complexa, requerendo estratégias de mitigação e
combate mais abrangentes e multissetoriais, é a partir de 2003 que ela passa a ocupar a
centralidade não apenas da agenda de governo, mas também da agenda de Estado.6 Tal
priorização, atestada inicialmente pelo comprometimento público do então presidente e
pelo perfil e militância acadêmica da equipe técnica que passou a formular e coordenar as
ações na área, revela-se pelo volume de recursos que a área passou a receber nos anos
seguintes. Dessa priorização política acabaram sendo desdobradas duas estratégias de
ação, com matriz originária no diagnóstico e desenho de intervenção delineado nas
propostas do Instituto Cidadania, em 2001: a estratégia Fome Zero e a estruturação do
Programa Bolsa Família.
O Fome Zero propunha-se a atacar o problema da insegurança alimentar por meio de um
conjunto de ações articuladas (TAKAGI, 2010): introdução do Cartão Alimentação, voltado à
complementação da renda familiar para compra de alimentos; ações direcionadas para
compra da produção de alimentos de agricultores familiares e distribuição para escolas,
entidades assistenciais, banco de alimentos e restaurantes populares, o que ficou
conhecido como PAA – Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar; ações
de provimento do acesso à água no semiárido nordestino, por meio da construção de
cisternas; e ações de fortalecimento e indução de programas municipais de segurança
alimentar, com o financiamento de equipamentos para instalação de restaurantes
populares, cozinhas comunitárias, bancos de alimentos e promoção de varejões e incentivo
à agricultura urbana. Reconhecendo as dificuldades específicas de determinados grupos
populacionais ao acesso ao alimento, o Fome Zero também previa a distribuição de
alimentos em caráter emergencial para as famílias atingidas por secas e enchentes e novos
assentados da reforma agrária, assim como o fornecimento de leite e nutrientes básicos,
como ferro e vitaminas, para as crianças inscritas nas redes públicas de serviços de saúde e
de assistência social. De forma inovadora na agenda governamental, o Fome Zero também
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A questão social passa a ser um “public issue” – assunto do Estado. Ver Howlett e Ramesh (2003).
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trazia a necessidade de estruturação de programas de educação alimentar e educação para
o consumo, com efeitos preventivos para o combate tanto à desnutrição quanto à
obesidade.
O Programa Bolsa Família foi instituído em 2003 com o propósito de integrar, em um único
programa, as ações de transferência de renda então existentes no governo federal, como o
Bolsa-Escola, Bolsa Alimentação e Auxílio-Gás, instituídos no governo anterior e, depois, o
Cartão Alimentação, criado na estratégia do Fome Zero. O programa previa a concessão de
algumas modalidades de benefícios monetários a famílias em situação de pobreza e
extrema pobreza, em função do nível de renda e do número de crianças e adolescentes na
família. O programa incorporou dois anos mais tarde o Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil, que previa também repasse de recursos às famílias que tivessem,
indevidamente, crianças inseridas em atividades produtivas (BICHIR, 2010).
Seguindo o desenho das primeiras experiências, o programa previu o cumprimento de
contrapartidas – condicionalidades – das famílias, como a frequência escolar das crianças e
adolescentes e cuidados básicos de saúde da criança e gestante. Se tais contrapartidas
eram consideradas com reserva por parte de alguns analistas e gestores públicos – afinal,
educação e saúde eram direitos sociais conquistados, não uma obrigação, ou dever a ser
cumprido somente por famílias pobres –, elas induziram o poder público a construir
equipamentos e estruturar serviços onde a oferta era mais precária, como na zona rural, no
semiárido nordestino e região amazônica. Com uma regularidade que passou a ser de cada
dois anos, os beneficiários precisariam atualizar seus dados – inclusive de rendimentos – no
Cadastro Único de Programas Sociais, quando a condição de beneficiário seria reavaliada.
Complementarmente,
introduziram-se
ações
específicas
de
acompanhamento
socioassistencial de famílias com crianças e adolescentes em situação de descumprimento
das condicionalidades, expostas a outras situações de vulnerabilidade, além de iniciativas
de oferta de cursos de qualificação profissional e inclusão produtiva nos estados e
municípios. Não parece, pois, pouco plausível atribuir papel importante ao Programa na
expansão e estruturação de equipes da Estratégia Saúde da Família e de Centros de
Referência da Assistência Social pelo país, bem como na construção de escolas nas áreas
mais pobres.
A proposição do Programa Bolsa Família como solução programática para enfrentamento
da pobreza também tem sido entendida, por alguns autores, como desdobramento da
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25
estruturação do nosso Sistema de Seguridade Social, quase cem anos depois de criado,
com as primeiras proteções dirigidas aos funcionários públicos e membros das Forças
Armadas, como registram Schwarzer e Santana (2013). A criação do seguro contra
acidentes de trabalho foi outro marco importante da estruturação de tal sistema nos anos
1920, logo seguido da criação da previdência contributiva de segmento de trabalhadores
urbanos mais organizados com as Caixas de Previdência (KERSTERNESTKY, 2011). Ao longo
do século XX, a Seguridade Social se estruturou com a incorporação dos setores formais e
urbanos e, mais tardiamente, nos anos 1970, os trabalhadores rurais, cujos patrões
recolhessem uma parcela do valor da produção (ROCHA, 2013). A Constituição de 1988 deu
passos importantes na direção de construção de um sistema previdenciário e assistencial
de caráter universal e protetor contra a pobreza (pela definição de piso básico atrelado ao
salário mínimo), mas as principais inovações nesse sentido vieram com a promulgação de
Lei Orgânica de Assistência Social em 1993.
Ao final dos anos 1990, dada a natureza restritiva então vigente para acesso aos benefícios
e auxílios previdenciários, voltados aos trabalhadores com contrato regular de trabalho,
era necessário que se criasse uma estratégia específica de garantia de renda para
autônomos e trabalhadores informais. Seguindo a evolução histórica nos países mais
desenvolvidos, depois de criados o seguro social e a aposentadoria, era inevitável que se
instituísse a renda mínima como mais uma etapa civilizatória rumo ao Estado do Bem-Estar
Social (KERSTERNESTKY, 2011). As primeiras iniciativas de proteção social não contributiva
a segmentos mais vulneráveis, de famílias de trabalhadores informais, não cobertos pelo
seguro-desemprego ou qualquer outro benefício previdenciário (auxílio-saúde, etc), se
estruturaram em localidades de médio/grande porte, em regiões economicamente
dinâmicas, como Campinas, Ribeirão Preto e Brasília. Em 2001, tais experiências são
“federalizadas” sob o Programa Bolsa Escola.
A partir desse breve e certamente incompleto retrospecto histórico, pode-se propor uma
definição preliminar das políticas de desenvolvimento social como um conjunto de políticas
integradas às demais políticas sociais – de cunho redistributivo, emancipatório e
compensatório – voltadas a populações vulneráveis por diferentes aspectos, tais como
fome, insegurança alimentar, insuficiência de renda, trabalho irregular e falta de
oportunidades de geração de renda, violência, etc.
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Tais políticas e programas representam inovações programáticas nos campos de
transferência de renda, assistência social, segurança alimentar e nutricional e inclusão
produtiva, que procuram superar a estratégia fragmentada de ações direcionadas a
públicos vulneráveis em saúde e nutrição e de acesso ao alimento pela distribuição de
cestas básicas, que operaram nos anos 1980, e complementar o Sistema de Seguridade
Social, até então estruturado sob a ótica contributiva. Estas políticas buscam superar os
desafios da articulação interssetorial e federativa, operando por meio de arranjos com
papéis e responsabilidades pactuadas entre União, estados e municípios, com apoio de
entidades socioassistenciais (JACCOUD 2013).
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Figura 1: Programas de desenvolvimento social e o Sistema de Proteção Social
Educação
Desenvolvimento
Agrário
Saúde
Trabalho
Igualdade
Racial
Políticas
Previdência
para
Mulheres
Direitos
Humanos
O Plano Brasil Sem Miséria tem ampliado ainda mais o escopo dessa estratégia de combate
à pobreza com a execução de mais de uma centena de ações setoriais em vários
ministérios e com articulação federativa com estados e municípios. Partindo de um
diagnóstico de pobreza multidimensional, a pobreza se revela por vários aspectos além da
insuficiência de renda. Segundo a Idea de pobreza multifacetada os pobres compõem-se
de muitos grupos diferentes: da população de rua ao agricultor familiar desassistido; e
estruturado em três eixos de intervenção – Garantia
Inclusão Produtiva.
de Renda, Acesso a Serviços e
O Plano organiza-se como uma estratégia multissetorial, com ações desenhadas para
mitigar
carências sociais específicas de segmentos populacionais mais vulneráveis e
garantir-lhes acesso às políticas sociais estruturantes do nosso Sistema de Proteção
Social. Nessa estratégia, não só o PBF vem passando por inovações importantes, como
também o conjunto de outros programas do Ministério de Desenvolvimento Social e
demais pastas sociais.
As políticas de desenvolvimento social e seus efeitos sócio-demográficos
Os efeitos dessas políticas sobre a realidade social brasileira é tema ainda a ser mais
explorado na pesquisa acadêmica, agora que começam a adquirir maturidade de
implementação, dispor de maior regularidade de registros estatísticos e também por serem
mais bem documentadas e conhecidas. No caso do Programa Bolsa Família, já há um
conjunto mais sistematizado de evidências sobre seus efeitos, como revelado em
publicação recente (CAMPELLO e NERI, 2013).
Contudo, é importante registrar que o programa não teria impacto com a intensidade e o
espraiamento pelo território alcançados, sobretudo nas áreas mais pobres, se não
estivesse articulado com outras políticas sociais, operadas pelo MDS e outros ministérios.
Afinal, o combate à pobreza no Brasil também beneficiou-se da continuidade da
estruturação do Sistema de Proteção Social, no sentido preconizado pela Constituição de
1988. O combate à pobreza foi favorecido pelo aumento do gasto em políticas sociais nas
áreas de educação, saúde, trabalho, habitação, previdência social e desenvolvimento
social, que passou de 13% do Produto Interno Bruto, nos anos 1980, para quase 25%,
somados os recursos do governo federal, dos estados e municípios (CASTRO, 2011). Entre
1995 e 2009, o gasto federal social per capita teria duplicado, em valores reais, passando
de cerca de R$ 1.400,00 para R$ 2.800 (CASTRO et al., 2011).
Se a Previdência Social não estivesse concedendo benefícios de ao menos um salário
mínimo para mais de 26 milhões de famílias, entre aquelas de ex-trabalhadores urbanos
contribuintes e ex-trabalhadores rurais não contribuintes (quase 9 milhões); se a
Assistência Social não estivesse concedendo o Benefício de Prestação Continuada a quase 4
milhões de idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, a dimensão do público-alvo
das políticas de desenvolvimento social seria muito maior. Há ainda o seguro-desemprego,
as parcelas anuais do Programa de Integração Social e outros auxílios previdenciários que
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contribuem para mitigação das situações conjunturais de pobreza de trabalhadores com
contrato regular de trabalho.
Nas simulações do impacto das aposentadorias e pensões sobre a extrema pobreza,
Rofman et al (2013) apresentam dados que mostram revelam que, na ausência dessas
transferências a extrema pobreza sairia de 3,5% para mais de 37% no país, segundo
estudos comparados com outros países em 2006. Nessa linha, Schwarzer e Santana (2013)
trazem evidências do papel na queda dos níveis de pobreza no país pela ampliação da
cobertura dos benefícios previdenciários, especialmente de grupos mais vulneráveis, e pela
vinculação do valor das transferências ao salário mínimo.
Vale observar que essa estratégia de política social, conjugada com as políticas de
valorização real do salário mínimo, de qualificação profissional massiva pelo Pronatec –
presente em 3,8 mil municípios brasileiros - e de ampliação do acesso ao crédito, em
ambiente de baixa inflação, mostrou-se essencial para criação de um círculo virtuoso de
crescimento, com contínua geração de emprego formal e ampliação da renda.
Os efeitos do Programa Bolsa Família sobre a pobreza e extrema pobreza tem sido mais
estudados nos últimos anos. Estudo do Ipea publicado em 2011 trouxe evidências acerca
dos efeitos do Programa Bolsa Família na redução da pobreza e desigualdade, ao
apresentar a série histórica de indicadores de 1995 a 2009, com base na Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios do IBGE. Tal série histórica mostra nítida e constante tendência
de queda da pobreza, da desigualdade e da intensidade da pobreza (distância relativa à
linha de 70 reais) após 2003 (OSÓRIO; SOARES; SOUZA, 2011).
Vale registrar que os efeitos do Programa Bolsa Família e das políticas de desenvolvimento
social na redução da pobreza e desigualdade já tinham sido apontados no Relatório de
Acompanhamento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, publicado em 2010,
documento de repercussão significativa no meio técnico-político no país (BRASIL, 2010). A
análise apresentada no relatório atribui ao programa forte contribuição para a redução da
extrema pobreza no país ao longo dos anos 2000. Medida pela linha de pobreza
internacional do Banco Mundial – de 1,25 dólar per capita por dia, valor ajustado pela
paridade do poder de compra –, a pobreza extrema teria caído de 14% em 2001 para 4,7 %
em 2009, momento em que o Programa se estrutura e se processa sua expansão de
cobertura pela população de mais baixa renda no país.
Pesquisa de Avaliação de Impacto do Bolsa Família, desenhada para captar efeitos
atribuíveis especificamente ao Programa e realizada pelo International Food Policy
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29
Research Institute, demonstra que o Bolsa Família contribuiu para a diminuição do trabalho
infantil em todos os grupos etários, entre 2005 e 2009. Para crianças e jovens de 11 a 15
anos, houve redução de 7,8% para 6,3%, neste período, mas o maior decréscimo ocorreu
para o grupo de 16 e 17 anos: de 22,9% para 15,7%. No Nordeste, o Programa teria
proporcionado aumento significativo na frequência escolar das crianças beneficiárias, o
que pode também ter contribuído para redução do trabalho infantil (BRASIL, 2012).
Monografia agraciada em primeiro lugar pelo Prêmio Qualidade do Gasto Público da
Secretaria de Orçamento Federal de 2012 revela que famílias beneficiárias do Programa
Bolsa Família possuem gasto com alimentação superior à média de famílias não
beneficiárias com rendimentos equivalentes. Usando dados da Pesquisa de Orçamentos
Familiares de 2008/2009, do IBGE, o trabalho mostra que as famílias atendidas pelo
Programa gastam mais do que outras com consumo de grãos e cereais, aves e ovos, carnes,
panificados, legumes, óleos e bebidas não alcoólicas. O Programa auxilia, portanto, na
melhora do status nutricional de crianças e adolescentes, sobretudo no Norte e Nordeste,
onde o impacto do programa é 31,4% maior do que para o total do Brasil (BAPTISTELLA,
2012).
Em estudo publicado recentemente em uma das mais renomadas revistas científicas
internacionais na área da saúde, Lancet, evidenciam-se efeitos significativos do Programa
Bolsa Família, entre 2004 e 2009, na redução da taxa de mortalidade de crianças menores
de cinco anos (17%) e por causas associadas com a pobreza: desnutrição (65%); diarreia
(53%); e infecções respiratórias (20%). Esses resultados são estimados comparando-se
municípios de alta cobertura consolidada do PBF (aqueles com mais de 32% de famílias
participando do Programa e com 100% de cobertura das famílias público-alvo do Programa
por pelo menos quatro anos), com municípios de baixa cobertura (menos de 17% de
famílias incluídas no PBF) (RASELLA et al., 2013).
Estudo similar, publicado no American Journal of Public Health, analisa os efeitos
combinados do acesso ao Programa Saúde da Família (PSF) e da cobertura do Programa
Bolsa Família (PBF) sobre a mortalidade infantil pós-natal (a que ocorre entre 28 e 364 dias
de vida), utilizando um painel de municípios e cobrindo o período 1998-2010. Os resultados
mostram que o efeito do PSF sobre a redução da mortalidade infantil cresce à medida que
aumenta a cobertura do PBF no município, sendo a região Nordeste a mais beneficiada
pelos efeitos dos dois programas juntos. Da mesma forma, conforme amplia-se a cobertura
do PBF, cresce o efeito do PSF sobre o número de visitas de acompanhamento pré-natal,
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30
mostrando que, para uma mesma cobertura de serviço de assistência básica de saúde da
família, a maior cobertura do PBF acarreta maior número de visitas ao pré-natal (GUANAIS,
2013)..
Pesquisa de Avaliação de Impacto do Programa Bolsa Família, realizada pelo International
Food Policy Research Institute, apontou que o peso ao nascer das crianças de mães
beneficiárias do Bolsa Família é superior ao das crianças de mães não beneficiárias (3,26 kg
e 3.22 kg, respectivamente). Tal fato decorreria da constatação de que, em 2009, as
grávidas beneficiárias do Programa apresentaram 1,6 visita de pré-natal a mais do que as
não beneficiárias. Entre 2005 e 2009, o número de gestantes beneficiárias do PBF que não
receberam cuidados pré-natais caiu de 19% para 5%, queda significativamente maior do
que a observada entre as não beneficiárias (BRASIL, 2012).
A pesquisa mostrou, ainda, que a proporção dos filhos de beneficiárias do Programa que
eram amamentados de maneira exclusiva, pelo menos durante os seis primeiros meses de
vida, era oito pontos percentuais maior do que a dos filhos de não beneficiárias (61% e
53%, respectivamente). Certamente isso teria contribuído, no período estudado, para a
redução da prevalência de desnutrição crônica na população em geral e diminuição mais
significativa da desnutrição aguda entre os beneficiários. Observou-se, também, um efeito
positivo do programa sobre o esquema vacinal, especialmente quando se consideram os
índices de vacinação DTP e contra poliomielite, popularmente conhecida como paralisia
infantil.
Livro publicado recentemente, intitulado Vozes do Bolsa Família – autonomia, dinheiro e
cidadania, elaborado por pesquisadores da Universidade de Campinas com base em
entrevistas qualitativas com mulheres beneficiárias do Programa, constatou que o PBF
produz impactos sociais nas vidas dessas pessoas, incomparáveis aos proporcionados por
outros tipos de auxílio, como, por exemplo, vales de troca por produtos ou cestas básicas.
Segundo os autores, esses efeitos decorrem do fato de o benefício ser em dinheiro, o que
implica liberdade e responsabilidade quanto ao uso, aprendizado de planejamento de
gastos e ganhos de dignidade (REGO; PINZANNI, 2013). A avaliação de impacto do Bolsa
Família, conduzida pelo International Food Policy Research Institute, chega a resultados
semelhantes a respeito do empoderamento da mulher na tomada de decisões no espaço
doméstico, como no uso de contraceptivos.
Tais estudos corroboram pesquisa anterior que, por meio de análise qualitativa, mostrou
que as mulheres titulares do benefício do BF têm ganhos na relação de gênero à medida
31
31
que se tornam mais independentes dos maridos financeiramente, passando a ter maior
poder de barganha no que tange à alocação de recursos no domicílio e aumentando o nível
de interação social.
Para finalizar essa seção, dentre tantos indicadores e gráficos que poderiam ser mostrados,
dois selecionados nesse texto, retirados de Jannuzi et al (2014), procuram sumarizar os
avanços sociais nas últimas décadas: a redução da extrema pobreza monetária dentre os
diversos públicos das políticas e a diminuição da pobreza em uma perspectiva
multidimensional. Dados do último Relatório de Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
mostram que a extrema pobreza, referida como a parcela da população vivendo com
menos de 70 reais per capita (em valores de junho de 2011), caiu de 13,4% em 1990 para
3,6% em 2012, tendência essa que se observa em todos os segmentos populacionais
analisados (por sexo, raça/cor, faixa etária, escolaridade, região, situação de residência).
Entre os analfabetos, a pobreza extrema teria caído de quase 30% para 8% no período;
evolução semelhante ao observado entre os residentes na zona rural e no Nordeste. Entre
os negros, a pobreza extrema passou de 20% para 5% entre 1990 e 2012; entre crianças, de
0 a 6 anos, de 20% para 6% (Gráfico 1).
Gráfico 1: Evolução da extrema pobreza (monetária) por segmentos populacionais. Brasil, 1990 e
2012.
35,0
30,0
25,0
20,0
15,0
10,0
5,0
0,0
2012
Brasil
Masc.
Fem.
Brancos
Negros
0 a 6 anos
7 a 14 anos
15 a 19 anos
20 a 29 anos
30 a 44 anos
45 a 64 anos
65 ou mais anos
Analfabeto
Menos que a…
4ª série
Fundamental
Médio
Superior
Rural
Urbano
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro-Oeste
1990
Fonte: Relatório de Objetivos de Desenvolvimento do Milênio/IPEA
32
32
Gráfico 2: Evolução da pobreza multidimensional. Brasil, 2004 a 2012.
PNAD 2004
12%
PNAD 2009
10,0%
PNAD 2011
10%
PNAD 2012
8,1%
8%
6,8%
6,3%
6%
4,2%
4%
33
3,1%
2,6%2,4%
33
1,6%
0,7%0,6%0,5%
2%
0%
IPM de 20% a 33% (exclusive)
IPM de 33% a 50% (exclusive)
IPM com 50% ou mais
Pobreza
Pobreza Severa
Fonte: Relatório de Desenvolvimento Humano/PNUD e microdados PNAD/IBGE
Dados do último Relatório de Desenvolvimento Humano do PNUD7 mostram que a pobreza
considerada como privação de direitos sociais básicos ou de acesso a bens e serviços, como
os considerados na computação no Indicador de Pobreza Multidimensional – escolaridade,
frequência escolar, mortalidade infantil, eletricidade, água, moradia e ativos- também
apresentou queda sistemática e significativa nos anos 2000, passando de 5,8% para 3,1%
entre 2004 e 2012. Entre os severamente pobres nessa perspectiva, a queda teria sido de
1,6% para 0,5% (Gráfico 2).
Tal tendência deixa claro que a estratégia adotada desde os anos 2000 de superação à
pobreza no país não só envolveu ações importantes de transferência de renda como
também de provimento de acesso dos diversos grupos vulneráveis já mencionados aos
programas e serviços de educação, saúde, habitação e infraestrutura urbana.
7
Vide relatório em www.pnud.org.br
À guisa de conclusão: a necessidade de continuar aprimorando as tecnologias de desenho e
gestão de programas sociais
Este texto procurou apresentar uma síntese do processo histórico de construção da agenda
de políticas de combate à fome e pobreza na esfera federal no Brasil, da década de 1940
aos anos 2000, bem como uma análise dos efeitos dessas políticas e programas em
aspectos sociodemográficos.
Como se pode depreender deste breve relato histórico, a incorporação das políticas de
combate à fome e pobreza na agenda do Estado brasileiro, em especial nos anos 2000,
resulta, por um lado, do gradativo convencimento pela sociedade e meio político da
gravidade da questão no país e do seu equacionamento e, por outro, da disputa política
quanto à centralidade das políticas dirigidas para seu equacionamento, em meio ao
reconhecimento de sua complexidade enquanto fenômeno social e do desenho de
estratégias para sua mitigação.
A continuidade dos avanços proporcionados pela estratégia multissetorial de combate à
pobreza adotada pelo Brasil certamente requer o aprofundamento dos diagnósticos sobre
a natureza multifacetada dos públicos mais vulneráveis, de suas necessidades e suas
características e a sofisticação das estratégias de monitoramento e avaliação dos
programas e ações voltados aos mesmos. Mais do que construir indicadores
multidimensionais, o Ministério de Desenvolvimento Social tem investido produção de um
conjunto amplo de indicadores multitemáticos, produzidos a partir do Cadastro Único de
Programas Sociais e da sua integração com registros de programas e sistemas de
informação de outros ministérios e a partir realização de pesquisas de campo.
O Cadastro Único, em sua sétima versão desde que foi criado, permite o registro de
informações detalhadas sobre as características da moradia, atributos demográficos,
escolaridade e trabalho de mais de 75 milhões de pessoas, com atualização de 75% das
famílias a cada ano. Tem módulos de informação específicos para os distintos grupos
populacionais vulneráveis já mencionados como os indígenas, quilombolas, população em
situação de rua. Diversos parceiros do Plano Brasil Sem Miséria, nos três níveis de governo,
tem realizado análises e extrações dessa base cadastral para identificar e localizar públicosalvo de suas ações e programas nas três áreas de atuação do Plano, seja na transferência
34
34
complementar de renda ao Bolsa Família que vários estados e municípios estão
implementando, como também no provimento de acesso a serviços sociais e nos projetos
de Inclusão Produtiva.
O cruzamento dessas informações com os registros de programas e ações do Plano Brasil
Sem Miséria e de outros Ministérios, como os da Qualificação Profissional do Pronatec, o
do Microempreendedor Individual, o de Fomento ao Agricultor Familiar, as bases de
Intermediação de Mão de Obra, CAGED e RAIS do Ministério do Trabalho tem permitido
não apenas monitorar o alcance quantitativo das iniciativas do Plano junto à população
meta do Plano, como conhecer qual estratégia de Inclusão Produtiva melhor se adequa
melhor aos diferentes perfis de vulnerabilidade da população pobre e contextos regionais
do país.
Ademais desses instrumentos, o Ministério conta com pesquisas de avaliação e estudos
avaliativos- mais de 60 desde 2011- de seus programas e ações do Plano, valendo-se das
mais variadas metodologias quantitativas e qualitativas. Cursos de formação no uso dessas
informações e instrumentos estão sendo oferecidos por todo o Brasil para técnicos e
gestores municipais, por meio de universidades pré-qualificadas, em parceria com os
governos estaduais8.
Essa tecnologia de desenho, gestão e produção de informações sobre os programas de
Desenvolvimento Social e Combate à Fome tem sido fundamental ao longo dos últimos
anos na adequação dos desenhos dos programas às múltiplas facetas da pobreza no país,
assim como na estratégia de identificação e focalização dos mesmos. Tal esforço recebeu,
inclusive, reconhecimento nacional como a conquista do Prêmio de Inovação em Gestão
Pública conferido ao MDS em 2013 e o reconhecimento internacional do Banco Mundial,
do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, entre outros9. O Relatório de
8
No Cadernos de Estudos Desenvolvimento Social em Debate n.16 pode-se ter acesso a uma ficha
síntese desse conjunto de pesquisas. Os artigos dos números 17 e 18 da publicação Cadernos de
Estudos Desenvolvimento Social em Debate ilustram o potencial do uso integrado do Cadastro
Único com outras fontes para elaboração de estudos avaliativos dos programas do MDS e Plano
Brasil Sem Miséria. No Portal www.mds.gov.br/sagi pode-se acessar sumários executivos e
microdados das mesmas, além de Estudos Técnicos SAGI e o material didático autoinstrucional
desenvolvido no Ciclo de Formação em Diagnóstico, Monitoramento e Avaliação de Programas
Sociais para formação de técnicos e gestores das Políticas do MDS nas três esferas de governo .
9
Vide ENAP. Ações premiadas no 18º Concurso de Inovação na Gestão Pública Federal. Brasília,
ENAP, 2014 (www.enap.gov.br).
35
35
Desenvolvimento Humano 2013 traz diversas referências à estratégia brasileira de combate
à pobreza, reconhecendo que o sucesso do esforço deve-se à articulação de programas de
proteção social (Bolsa Família, benefício de Prestação Continuada, benefícios da
Previdência Social), políticas universais de educação e saúde e decisões econômicas de
fortalecimento do mercado interno (política de valorização do salário mínimo, redução dos
juros etc), em meio à crise internacional iniciada em 2008.
Espera-se que o uso mais intensivo dos indicadores multitemáticos e do conjunto de
informações disponibilizado pelo Ministério permita que gestores e técnicos nos estados e
municípios aprimorem a gestão dos programas em operação e proporem novas ações,
desenhadas conforme as vulnerabilidades da população pobre encontradas no território e
ajustadas às características e potencialidades ali existentes. Além de multidimensional, a
pobreza é multifacetada, requerendo abordagem multissetorial para sua superação, como
tem sido a experiência brasileira.
36
36
Referências
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37
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38
38
3.3. BEM ESTAR, DESIGUALDADE E EVOLUÇÃO DA POBREZA EXTREMA POR GRUPOS
ETÁRIOS (1990 – 2012)
Rafael Guerreiro Osório10
A face da pobreza está mudando nos últimos anos. Este movimento deverá levar o país a
repensar suas políticas. A caracterização deste fenômeno pode ser feita a partir da leitura
dos dados sobre renda. O gráfico 1 apresenta a diferença entre as rendas médias dos
milésimos nas últimas duas décadas. Nota-se que, na década de 1990 (linha roxa do gráfico
a seguir), houve aumento da renda ao longo da sua distribuição, mas de pouca monta. No
período que vai de 2002 a 2012, contudo, mais de 60% da população apresentou ganhos
superiores a 200 reais.
10
Assessor da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal
39
39
Em termos absolutos, como no gráfico 1, os milésimos mais ricos apresentaram maior
elevação de sua renda média. Em termos relativos, porém, esses ganhos têm uma
estrutura diferente. Eles decrescem à medida que se ruma aos milésimos superiores, pois
a base é a renda que o grupo já tinha e que já era grande. Assim, o crescimento da renda
dos milésimos mais ricos é proporcionalmente menor. Ou seja, todos ganharam renda, os
mais ricos ganharam mais, mas o crescimento relativo da renda dos mais pobres foi maior.
Desta forma, aumentou o bem-estar agregado e, inequivocamente, a desigualdade caiu,
segundo qualquer medida de desigualdade bem comportada que se escolha.
Passando à taxa de pobreza extrema do Brasil, apresentado no gráfico 2, verifica-se sua
redução acentuada de 1993 para 1995, por conta da estabilização macroeconômica;
depois, a taxa permanece estável, apresenta alguma redução em 2001 e 2002, mas volta
ao nível da segunda metade da década de 1990 em 2003. A partir de então, a taxa de
pobreza extrema tem caído aceleradamente. O ritmo se arrefeceu por conta da crise de
2008-9, mas foi retomado no último biênio.
Por faixa etária, nota-se que a taxa de pobreza extrema das crianças tem sido sempre
superior à média nacional, contudo, houve convergência no período recente. Na primeira
40
40
metade da década de 1990 a taxa de pobreza extrema dos idosos cai rapidamente,
principalmente até 1993, em tendência distinta da dos demais grupos etários. Este
movimento tem conexão inequívoca com o que aconteceu em termos de política social no
período, em particular, a expansão da previdência rural. Depois, os idosos e seus grupos
domésticos são muito beneficiados pela valorização real do salário mínimo, que é o valor
da renda da aposentadoria ou pensão de grande parte deles. Atualmente, pode-se
considerar erradicada a pobreza extrema entre os idosos no Brasil.
Ao observar o período mais recente, conclui-se que a pobreza começa a cair mais
rapidamente. A elevação da transferência média per capita do Bolsa Família em reais ao
longo dos anos foi reduzindo a pobreza. Uma série de outros fatores também contribui
para este movimento, como aumento de empregos, formalização no mercado de trabalho.
Na PNAD, a variável que capta o Bolsa Família também capta outros rendimentos. A
expansão das transferências e sua focalização nos mais pobres é de tal ordem que aumenta
substantivamente o valor médio da variável, à medida que seu perfil distributivo muda
completamente, como indicado pelo seu coeficiente de concentração, que ao diminuir de
valor passa a contribuir para reduzir a desigualdade, ao invés de aumentá-la, como se pode
observar no gráfico 3.
41
41
Ao pensar em uma linha do tempo, pode-se dizer que a composição da renda daqueles que
vivem em extrema pobreza vem se alterando. No início, existia a influência da renda do
trabalho formal e pouca renda de transferência. Ao fim do período, quase toda a renda
desse segmento é proveniente de trabalho informal ou de transferências. As
transferências, captadas na PNAD pela variável outros rendimentos, respondem agora por
uma parcela substantiva da renda dos mais pobres, como se pode ver no gráfico 4 (sem
correções ou imputações).
42
42
Ao passo que isso pode ser um avanço, também é um desafio. As transferências passam a
ter um papel muito importante no combate e na prevenção da pobreza extrema. E embora
se fale muito hoje em inclusão produtiva (qualificação profissional), o grande avanço em
relação a isso foi na década passada. Têm-se hoje trabalhadores informais, pessoas que
não são facilmente treinadas e empregadas.
A maior parte das pessoas que viviam a pobreza de forma crônica hoje a superam, ou a
tem bastante aliviada, graças ao Bolsa Família. Assim, a fração da pobreza de circulação,
temporária, deve estar aumentando. Será que o desenho do Bolsa Família clássico é ideal
para combater essa nova configuração da pobreza?
Para enfrentar o problema será preciso repensar a pobreza, rever a conhecida abordagem
tradicional. Será preciso superar essa visão tradicional, porque, em alguma medida, a maior
parte das pessoas que vivem em pobreza crônica no Brasil já estão atingidas por algum
programa social e a tendência é que cada vez mais se tenha dentro dessa pobreza extrema
esse resíduo caracterizado aqui como pobreza de circulação. Ou seja, as pessoas que hoje
estão na pobreza, não são as pessoas que eram necessariamente pobres no mês passado e
sim, as pessoas que no mês passado certamente tinham grande vulnerabilidade à pobreza.
Portanto, será preciso mudar o enfoque, compreender e passar a considerar a ideia de
pobreza dinâmica e trabalhar com um programa que tenha o conceito de cobertura
ampliada onde não serão beneficiárias apenas as pessoas que são pobres hoje, mas
também as com grande probabilidade de se tornarem pobres amanhã.
De certo modo, o Bolsa Família, já opera desta forma. Desde 2009, existe no programa uma
regra de permanência na qual as pessoas ficam por pelo menos dois anos, a não ser que
nesse período, a renda delas flutue para cima de um teto de meio salário mínimo. Se
consideramos que a renda declarada varia no tempo, mas é um bom preditor da
vulnerabilidade, vê-se que o Bolsa Família está operando com uma lógica preventiva,
faltando apenas explicitar no discurso oficial que sua transferência também é para os
vulneráveis à pobreza. Porém, essa mudança de discurso envolve uma mudança de
mentalidade, que é muito complicada porque a opinião pública, e mesmo os agentes da
política social estão presos a uma visão estática da pobreza, difícil de ser superada.
Mas, por exemplo, se fizermos a pergunta: qual é a única forma de garantir que ninguém
no Brasil, em momento algum, por exemplo, no próximo ano, venha cruzar para baixo, a
linha de pobreza de R$ 70 reais? O aspecto dinâmico da pobreza emerge claramente. Só
existe um jeito de garantir isso. Pagando, para todo brasileiro, R$ 70 reais por mês.
Ao fazer isso se resolve o problema. Se cada um dos 201 milhões de brasileiros, em junho
de 2013, estivessem dentro de um programa de transferência universal recebendo R$ 70
reais por mês, ninguém desceria para baixo da linha de R$ 70 reais/mês. Mas, isso custaria
189 bilhões de reais, 25% de todo o nosso gasto social em 2013, e esse valor só não é
43
43
maior do que o orçamento da previdência social, mas é superior ao da saúde e de todas as
outras áreas. Portanto a renda universal ainda não é viável.
Não sendo viável a renda mínima universal, o que se pode fazer para minimizar a
probabilidade de termos pessoas abaixo da linha de pobreza extrema, em qualquer
momento? A resposta é adotar o conceito de cobertura ampliada, para prevenir a pobreza
extrema mediante a seleção de beneficiários não com base na situação corrente de
pobreza, mas na vulnerabilidade à pobreza. Como as pessoas com maior vulnerabilidade à
pobreza são aquelas que, por definição, tem maior chance de serem os pobres de hoje e de
amanhã, um programa que cobrisse toda a população cuja probabilidade de se tornar
pobre fosse superior a 0,5, por exemplo, conseguiria minimizar bastante a pobreza
residual. É com essa lógica que devemos operar se quisermos alcançar a erradicação da
pobreza extrema, o que equivale a mantê-la em níveis residuais aceitáveis – só teremos
então, na pobreza extrema, indivíduos cuja vulnerabilidade era baixa, e que tem maior
chance de dela sair por seus próprios meios.
44
44
3.4. EVOLUÇÃO DO BEM-ESTAR SOCIAL ENTRE AS REGIÕES BRASILEIRAS E A IDÉIA DE UM
PROGRAMA PARA RESULTADOS
Flávio Ataliba11
Introdução
A discussão a seguir tem com objetivo contribuir com um olhar para os desdobramentos
regionais das políticas recentes de combate à pobreza e desigualdade no Brasil, com foco
no Nordeste. Ou seja, é importante ter uma visão regionalizada da questão da superação
da pobreza no Brasil. Um primeiro tema a ser abordado será a avaliação de bem-estar
social entre regiões brasileiras, partindo da convicção que toda política econômica deve ter
como desdobramento uma avaliação criteriosa da evolução do bem-estar dos indivíduos
beneficiados. Outro aspecto que será brevemente abordado são ações do governo do
Estado do Ceará, que recentemente, em acordo com o Banco Mundial, vem implantando
um Programa Para Resultados (PforR). Trata-se de um desenho de financiamento do Banco
Mundial baseado em indicadores e metas; na medida em que se atingem as metas
baseadas nos indicadores, o governo recebe recursos. A intenção é de se assegurar que o
que o governo se comprometeu no seu PPA realmente será executado. Finalmente,
detalhamentos desse programa serão apresentados para que isso possa servir de
inspiração para outros estados, principalmente estados mais pobres.
Bem-estar social
No período de 1995 a 2002, o sudeste teve um crescimento médio da renda familiar per
capita anual de 1,54% enquanto no nordeste esse crescimento foi maior, de 3,13%.
Entretanto, esse crescimento foi mais forte a partir de 2003 em todas as regiões do país. O
que nós observamos, de certa forma, é uma inflexão do crescimento dessa renda. No
nordeste, isso acontece de forma mais intensa. A outra comparação é analisar a evolução
da renda do nordeste, em relação ao Brasil e ao sudeste. Então, podemos perceber que o
nordeste vem ganhando participação, em termos de evolução da renda familiar per capita,
11
Diretor Geral do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE)
45
45
tanto quando comparado ao sudeste como com o próprio país. Esse resultado já daria uma
mensagem inicial. Se você pensar no bem-estar econômico baseado na renda
simplesmente, poderíamos intuir que o nordeste, em termos de bem-estar, estaria tendo
um ganho superior à média nacional e a região sudeste.
Entretanto, nessa discussão é importante que se inclua outras medidas, além da questão
da renda. A renda certamente não representa uma medida suficiente de bem-estar. Outras
variáveis precisam ser levadas em conta nessa discussão. Uma importante contribuição
seria examinar, por exemplo, o que está acontecendo com o comportamento da
desigualdade. Sabemos que quando a desigualdade cai, a renda pode estar sendo
distribuída para as camadas mais pobres da população. Então, uma medida de bem-estar
interessante seria incluir, nessa discussão, o comportamento de alguma medida de
desigualdade.
62,9% 62,8%
62,0%
61,3%
60,6% 60,7% 60,7% 60,6%
61,5%
61,1%
60,7%
59,7% 59,5%
60,0% 60,1%
58,4% 58,4%
59,5%
57,4%
58,9%
57,1%
56,5%
56,9% 57,0%
57,1%
56,3%
56,7%
56,8%
56,1%
1995 a 2012 (a.a.)
2003 a 2012 (a.a.)
Sudeste: -0,72%
Sudeste: -1,16%
Brasil:
Brasil:
Nordeste: -0,65%
1995
1996
1997
1998
55,1% 54,9%
56,0%
54,6% 54,7%
-0,76%
56,5% 56,6%
57,8% 57,5%
54,9%
54,0%
54,6%
53,4% 53,2%
52,5%
51,6%
51,1%
50,2%
-1,12%
50,5%
Nordeste: -0,92%
1999
2001
2002
Sudeste
2003
2004
Brasil
2005
2006
2007
2008
2009
2011
2012
Nordeste
No caso em questão, nós estamos utilizando o índice de GINI. Podemos observar que, de
1995 a 2002, há uma queda da desigualdade considerando o período como um todo, mas
essa queda é mais acentuada ainda a partir de 2003. Mas quando comparamos essa
redução entre as regiões, observamos que ela acontece de forma mais lenta na região
nordeste. Então, pode ser que o nordeste tenha mais dificuldade de reduzir desigualdade
do que a média nacional ou do que a região sudeste propriamente disso. Uma questão
46
46
importante a se analisar seria: por que a desigualdade cai mais lentamente nesse região?
Podemos ter diversas interpretações dessa questão, mas o ponto central é que, havendo
uma redução mais lenta da desigualdade, pode ser que o novo conceito de bem-estar,
incluindo, nesse caso a desigualdade, não seja tão importante no nordeste, comparado
com as outras regiões.
Outra evidência importante apresenta-se ao avaliarmos o crescimento da renda entre os
decis da população. Considerando essa evidência, verifica-se que, em todos os extratos de
renda, percebe-se um aumento de renda na região nordeste superior à média nacional e à
região sudeste. Ademais, como a curva tem uma descendência bem mais forte no início da
distribuição da população pela renda, isso mostra que essa dinâmica é mais forte no início
da distribuição. Baseado nessa evidência, construímos as medidas pobreza monetária: a
proporção de pobres, a intensidade da pobreza e sua severidade. Comparando todas as
regiões, pode-se verificar que, para qualquer medida de pobreza utilizada, há uma redução
significativa nessas regiões e no país.
Ademais, se olharmos, por exemplo, a proporção de pobres constata-se que no nordeste,
apesar da renda ter crescido mais rápido, a proporção de pobres cai de forma mais lenta
quando comparada ao sudeste e Brasil. Então, um ponto central nessa discussão é que a
desigualdade é uma variável chave na análise de bem-estar. O nível inicial de desigualdade
e a velocidade de sua queda tem uma importância fundamental no impacto de toda a
política de crescimento da renda na redução da pobreza.
Assim, mostra-se importante levar em conta, em qualquer política de combate a pobreza, a
queda acelerada da desigualdade de renda, que acompanha o processo de crescimento
econômico. Isso é um tema central quando se leva em consideração o nordeste. Qualquer
política que venha na direção de reduzir de forma acelerada a desigualdade, certamente
vai potencializar o impacto da expansão da renda na redução da pobreza. Um candidato
natural para avaliação de bem-estar que está presente na literatura é o índice de SEN, já
que ele incorpora no seu cálculo além da renda média, a desigualdade. No seu cálculo
temos também um parâmetro de aversão à desigualdade, ou seja, o quanto a sociedade é
adversa à desigualdade.
47
47
Bem-Estar Social,
Coeficiente de Aversão
à Desigualdade
W = m (1 - aG )
Renda Média
Índice de Gini
48
48
No nosso cálculo, nós consideramos que esse parâmetro é igual a unidade, o que significa
que existe uma aversão completa a concentração de renda. Por esse indicador, percebe-se
que o nordeste estaria ganhando bem-estar com mais velocidade do que o Brasil e do que
o sudeste, isso ocorrendo principalmente pelo componente renda. Como se viu, dado que
a desigualdade cai mais devagar no nordeste, é razoável intuir que quem está puxando o
ganho de bem-estar, seria a evolução da renda. Entretanto, é importante se frisar que o
índice de GINI não permite avaliar o que está ocorrendo com todas as camadas da
distribuição de renda. A desigualdade pode está diminuindo porque as pessoas mais ricas
estão perdendo participação na renda total. Então, nós não sabemos o qual o
comportamento das faixas de renda ao longo de toda distribuição. Dessa forma, seria
oportuno buscar outra maneira de medir o nível de bem-estar entre as regiões. O trabalho
de Kakwani e Son (2008) é uma forma alternativa e interessante de pensar nessas
questões, utilizando o conceito de crescimento inclusivo.
A par r do grau de privação dos indivíduos pobres, que pode ser expresso por,
z
q = ò P( x) f ( x)dx
0
determina-se a Taxa de Crescimento do Equivalente-Pobreza (em inglês, PEGR - Poverty
Equivalente Growth Rate), como:
g * = (d / h )g
49
onde:
d =h +z
representa a soma entre a elas cidade renda-pobreza e a
elas cidade desigualdade-pobreza.
Nossa intenção então é medir a intensidade de crescimento inclusivo no país e nas regiões
e compará-las. Nesse caso, a formulação é um pouco mais complexa, e ela se baseia numa
medida de privação dos indivíduos mais pobres. Então, a análise vai considerar, na
avaliação de bem-estar, o que está acontecendo com as pessoas mais pobres daquela
distribuição. Sabe-se que a pobreza pode se reduzir por dois motivos: expansão da renda e
redução da desigualdade. Caso a renda aumente em todas as camadas da população,
aquelas pessoas que tiveram um crescimento o suficiente para passar da linha de pobreza,
certamente vão sair dessa condição.
Noutro caso, mantendo-se a renda constante, mas se a desigualdade diminuir, isso pode
significar que as camadas mais ricas da população estão proporcionalmente reduzindo sua
participação na renda total, o que pode implicar num aumento da renda dos mais pobres
diminuindo assim algum indicador de pobreza. Então, os dois componentes juntos são
importantes e podem agir na redução simultânea da pobreza. Podemos ter uma redução
de pobreza tanto pelo impacto do aumento da renda quanto pelo impacto da redução da
desigualdade. Então o que essa expressão nos diz? O Gama nessa expressão é a renda
verdadeira, ou seja, é o que aconteceu naquele período, e é ponderado por um
componente, o Neta, que dá o impacto na redução da pobreza da expansão da renda. O
outro componente da formula nos dá o impacto na redução da pobreza, na expansão da
49
renda e também da redução da desigualdade. Ou seja, ele expressa a elasticidade dos dois
efeitos. Então, na verdade, estamos utilizando um coeficiente que nos diz o seguinte: qual
seria o impacto na redução da pobreza se tivéssemos mantido o efeito da desigualdade
constante? Ou seja, qual a renda hipotética que se deveria ter para reduzir pobreza, dado
que a desigualdade permaneceu a mesma? Isso constrói a ideia de taxa de crescimento
equivalente-pobreza.
50
50
Taxas Anuais de Crescimento, 2003 a 2012
Local
Gini
RENDA
PEGR
(PEGR – RENDA)
FGT (0)
FGT (1)
FGT (2)
FGT (0)
FGT (1)
FGT (2)
Sudeste
-1,16%
4,08%
7,64%
9,47%
11,83%
3,57%
5,39%
7,76%
Brasil
-1,12%
4,51%
7,72%
8,57%
9,63%
3,20%
4,05%
5,12%
Nordeste
-0,92%
6,25%
8,19%
8,62%
9,17%
1,94%
2,37%
2,92%
Na verdade, o que estamos fazendo são exercícios contra-factuais, mantenho a curva de
Lorenz estável no período inicial e aumentando a renda, e depois mantenho a renda
constante e modificando a curva de Lorenz. Então, utilizando essa metodologia, de
crescimento inclusivo, podemos verificar o que aconteceu com a evolução do bem-estar
social. Olhando as evidências e utilizando esse indicador, verifica-se que essa medida de
bem-estar foi mais intensa no nordeste, com 8,19% contra 7,64% no sudeste. Ou seja,
interpretando esse resultado, significa que eu precisaria de muito mais renda no nordeste
para atingir os mesmos objetivos comparados à região sudeste. Assim, a despeito de nós
termos aumento de renda nas duas regiões, a redução de desigualdade no Nordeste
provocou uma redução na pobreza com menor velocidade quando comparada ao sudeste,
ou seja, a região sudeste apresenta um crescimento mais inclusivo nesse período. Ademais,
esse indicador ajuda a entender o que está acontecendo com toda a distribuição de renda
nas regiões analisadas.
Esse resultado chama a atenção para uma questão central: por que os ganhos de renda no
nordeste, apesar de serem mais intensos, não permitem um crescimento inclusive com
mais intensidade que o sudeste? A resposta em parte estaria no comportamento do
mercado de trabalho entre as duas regiões. Seria importante analisar entre outras coisas o
comportamento do salário, produtividade e escolaridade nessas regiões. Não exploraremos
esse tema aqui mas as evidências nos diz que de 2003 a 2012 a renda do trabalho no
nordeste perdeu participação na renda total nos 5 primeiros quintis de renda. Claro que
nessa região houve muito influencia das transferências e programas sociais na composição
da renda.
Par cipação (%) do Rendimento de Todos os Trabalhos por Décimos da População
Ano de 2003
Ano de 2012
(2003 - 2012) %
BR
NE
SE
BR
NE
SE
BR
NE
SE
1 (10% mais pobres)
75,7%
68,0%
77,1%
56,9%
30,8%
70,8%
-24,9%
-54,7% -8,1%
2
80,3%
78,5%
82,5%
72,4%
60,6%
77,8%
-9,9%
-22,7% -5,7%
3
80,2%
77,6%
81,1%
72,3%
68,8%
83,0%
-9,8%
-11,3% 2,3%
4
77,5%
79,4%
82,1%
77,3%
68,0%
84,5%
-0,3%
-14,4% 3,0%
5
79,1%
74,8%
72,2%
80,3%
65,1%
66,1%
1,5%
-13,0% -8,4%
6
71,1%
69,1%
80,2%
63,0%
73,2%
80,0%
-11,4%
5,9%
-0,2%
7
78,6%
71,0%
78,5%
79,1%
65,3%
79,3%
0,6%
-8,0%
1,0%
8
78,8%
67,3%
76,2%
79,3%
53,3%
78,2%
0,5%
-20,8% 2,6%
9
76,9%
67,7%
75,5%
78,3%
74,0%
78,0%
1,7%
9,2%
3,4%
10 (10% mais ricos)
75,8%
74,2%
75,4%
78,5%
77,0%
78,1%
3,5%
3,7%
3,5%
Todas as Famílias
76,7%
72,3%
76,5%
77,0%
70,9%
78,0%
0,5%
-2,0%
2,0%
51
51
O quadro demonstra que a renda de todos os trabalhos perdeu participação ao comparar
2003 com 2012. Cabe destacar que no nordeste existe uma influência das transferências
de renda e de programas sociais. Mas, isso não acontece com tanta força na região sudeste
e para o Brasil como um todo. Este é um bom quadro para reflexão, especialmente, porque
também mostra uma queda de 20% da renda do trabalho para aqueles que estão na linha
8, entre 2003 e 2012 na região nordeste.
Programa para resultados (PforR)
Outro tema que vou abordar rapidamente nessa exposição e que tem haver com ações que
visam o combate a pobreza é uma experiência recente de empréstimo do governo do
Ceará com o Banco Mundial, conhecida como Programa para Resultados. É a primeira
experiência no mundo em relação a estados federativos ou entidades subnacionais. Não
existe, inclusive, na América Latina em termos de países, nenhum programa com essa
característica. No caso do Ceará, o título do programa foi batizado como um Programa de
Crescimento Econômico, com Redução de Desigualdade e Sustentabilidade Ambiental. É
uma forma de se incentivar ou construir um desenho de mecanismo para o setor público,
para que ele cumpra o que se programou no Plano Plurianual (PPA). Nesse programa nós
nos fixamos, em quatro grandes áreas: gestão pública; redução da pobreza com assistência
a família; crescimento econômico com capacitação profissional e sustentabilidade
ambiental.
Como funciona esse programa? Em termos bem gerais, o Banco Mundial empresta um
recurso e o desembolso é condicionado ao atingimento das metas acordadas, baseado em
indicadores. No caso em questão, o valor desse empréstimo é de 350 milhões de dólares
que devem ser utilizados nessas áreas. Mais do que o dinheiro em si, é a contribuição
metodológica que ele gera para o comportamento do governo e isso é extremamente
importante para criar a cultura da gestão para resultado no setor público. O ineditismo
desse programa é porque as metas são construídas a partir de ações no PPA, e não
indicadores específicos de uma secretaria. Por exemplo, a meta de redução da pobreza é
algo que envolve várias secretarias, o que promove a articulação entre elas. Como exemplo
de um programa podemos citar a questão dos egressos das escolas profissionalizantes. O
estado do Ceará construiu e vem construindo mais de 100 escolas profissionalizantes de
tempo integral. Então, uma questão importante é saber o destino dos alunos que vão
52
52
concluindo o curso, se realmente eles estão sendo absorvidos pelo setor privado e em que
área ou se estão sendo treinados na direção correta que o mercado precisa. Nesse caso
seria necessário construir um cadastro para monitorar o que está acontecendo com esse
público. Outro exemplo que podemos citar é no combate a pobreza, que tem basicamente
como foco à assistência a família. É construir uma meta para um número específico de
famílias cujas crianças estão sendo assistida pelos programas de governo com esse foco.
Penso que esse modelo de gestão que está se iniciando no Ceará pode produzir
importantes resultados na gestão pública e servir de modelo para outros estados
brasileiros no tocante a desenvolver políticas focadas com grande impacto principalmente
na redução da pobreza e ai acelerar a queda desses indicadores que vem sendo
observados.
53
53
3.5. O PLANO BRASIL SEM MISÉRIA: CARACTERÍSTICAS E RESULTADOS12
Tiago Falcão13 e Patrícia Vieira Da Costa14
Parte I – Elementos da Concepção e da Conformação do Plano
Antecedentes
A pobreza está presente no Brasil desde que ele começou a se configurar como nação,
ainda no período colonial. Séculos de escravidão, seguidos por décadas de industrialização
rápida e intensa, com urbanização desordenada e concentração de renda, forjaram no
Brasil uma dívida social das mais expressivas de que se tem notícia.
Somente a partir de 1930 começam a surgir as primeiras políticas sociais para lidar com
esse passivo. Eram, no entanto, construções clientelistas ou focadas no mundo do trabalho
formal e urbano, deixando de fora quem mais precisava delas: a imensa maioria de pobres,
que à época ainda vivia no campo.
Aos poucos, o país avançou no desenho de políticas públicas mais inclusivas, especialmente
após a Constituição de 1988. Essas políticas foram, contudo, desenvolvidas de forma
fragmentada e pulverizada entre as diversas áreas da atuação governamental, tais como
saúde, educação, assistência social e trabalho.
No que diz respeito à construção de uma rede de proteção social, a política estava voltada
às pessoas incapacitadas para o trabalho por conta de idade avançada ou deficiência.
Assim, ela orbitava a pobreza, mas ainda sem tê-la exatamente como foco. Isso mudou
com a chegada do Programa Bolsa Família, que atende a população produtiva em idade
ativa, transferindo renda às famílias pobres, especialmente àquelas com crianças.
12
Este artigo contou, ainda, com a colaboração de Bruno Teixeira, Emanuelle Oliveira, Isabel Costa,
Janine Melo, Luciana Oliveira, Luiz Muller, Marcelo Cabral, Marina Farias, Rafael Mafra e Raphaella
Bandeira, bem como com a revisão de Marina Farias, todos da equipe do Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
13
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
14
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
54
54
A criação do Bolsa Família fez parte de uma reorientação que, na última década, colocou as
políticas sociais no centro da estratégia brasileira de desenvolvimento, com importantes
reflexos em vários indicadores sociais. Entre 2001 e 2012, a expectativa de vida ao nascer
aumentou 4,2 anos, a taxa de mortalidade infantil caiu 50%, a mortalidade materna recuou
23%, a taxa de frequência à escola chegou a 98,3% no ensino fundamental e a taxa de
analfabetismo diminuiu 32%15.
O combate à pobreza foi assumido como prioridade de governo. Contrariando a tradição e
o senso comum, os rendimentos que cresceram em ritmo mais acelerado entre 2001 e
2012 foram os dos domicílios do primeiro quintil – ou seja, os 20% mais pobres16
Progressos como esses permitiram à atual gestão federal colocar ao governo e à sociedade
um grande desafio: a superação da extrema pobreza em todo o território nacional até o
final de 2014 com o Plano Brasil sem Miséria, cujos resultados já são sentidos em todo o
país. O maior deles foi ter retirado 22 milhões de pessoas da extrema pobreza. Foi o fim da
miséria, do ponto de vista da renda, no universo do Bolsa Família. E ao mesmo tempo foi só
um começo, porque o Plano tem diversas outras frentes de atuação para melhorar a vida
dos brasileiros mais pobres.
Público-alvo
O Plano Brasil Sem Miséria (BSM) foi criado em junho de 2011 com o objetivo de superar a
extrema pobreza em todo o país. O público prioritário são os brasileiros que ainda estavam
em situação de extrema pobreza, ou seja, com renda mensal inferior a R$ 70, quando do
lançamento do Plano.
15
Sistema de Informação sobre Mortalidade/Ministério da Saúde (SIM/MS) para mortalidade
materna e infantil; Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios/Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (PNAD/IBGE – Dados Harmonizados: Brasil sem Norte Rural) para as demais informações.
Ver estes e outros resultados em “Indicadores de Desenvolvimento Brasileiro”.
16
Idem.
55
55
Box 1: A linha de extrema pobreza
A definição da linha de extrema pobreza utilizada no âmbito do Brasil Sem Miséria levou
em conta a linha administrativa usada pelo Programa Bolsa Família. E está em harmonia
com aquela utilizada pelo Banco Mundial, de US$ 1,25 por pessoa por dia pela Paridade do
Poder de Compra (PPP), o que facilita a comparação internacional dos resultados obtidos
no Plano. Essa linha é, inclusive, o parâmetro das Nações Unidas para aferição do
cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM).
A partir de junho de 2014, para manter a sintonia em relação ao parâmetro do Banco
Mundial, a linha de extrema pobreza adotada pelo Plano e a linha de extrema pobreza do
Programa Bolsa Família foram reajustadas para R$ 77 reais mensais per capita.
56
Além do público prioritário, o Plano BSM atende também outras pessoas registradas no
Cadastro Único para Programas Sociais, cuja baixa renda as torna vulneráveis à pobreza
extrema. Além disso, o Plano dá atenção especial, em todos os seus eixos (ver abaixo
informações sobre os três eixos do Brasil sem Miséria), a crianças, jovens, mulheres,
negros, população em situação de rua, catadores de material reciclável, indígenas, povos e
comunidades tradicionais e outros grupos em situação de vulnerabilidade social.
Uma abordagem multidimensional: os três eixos
Embora a renda seja uma variável fundamental nessa discussão, a extrema pobreza se
manifesta de múltiplas formas. Além da insuficiência de renda, há insegurança alimentar e
nutricional, baixa escolaridade, pouca qualificação profissional, fragilidade de inserção no
mundo do trabalho, acesso precário à água, à energia elétrica, à saúde e à moradia; entre
outras privações. Superar a extrema pobreza requer, portanto, a ação intersetorial do
Estado.
É por isso que o Brasil sem Miséria, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social
e Combate à Fome (MDS), envolve ao todo 22 ministérios, além de bancos públicos, outros
órgãos e entidades, estados, municípios, setor privado e terceiro setor. Juntos, esses
parceiros desenvolvem as cerca de 100 ações que compõem o Plano, distribuídas em três
grandes eixos de atuação.
56
57
57
O primeiro desses eixos é o de garantia de renda, relativo às transferências monetárias
para alívio imediato da situação de extrema pobreza, complementando a renda das
famílias. O segundo é o eixo de inclusão produtiva (urbana e rural), com oferta de
oportunidades de qualificação profissional, ocupação e renda ao público-alvo do Plano,
com estratégias específicas para o campo e a cidade. O terceiro é o eixo de acesso a
serviços, para provimento, ampliação e aprimoramento de serviços públicos, de modo a
melhorar as condições de vida do público-alvo do Plano, promovendo sua cidadania e
rompendo o ciclo intergeracional de reprodução da pobreza.
Assim, o Brasil Sem Miséria aborda o fenômeno multidimensional da pobreza de uma
maneira integral, abarcando ações, programas e políticas que ajudam as famílias a superar
toda uma gama de insuficiências e fragilidades que as mantinham na miséria, e a sair dessa
condição.
Box 2: Ministérios participantes
Além do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), participam do
Plano Brasil Sem Miséria a Casa Civil e a Secretaria Geral da Presidência da República; e os
Ministérios da Fazenda; do Planejamento, Orçamento e Gestão; do Desenvolvimento
Agrário; da Educação; da Saúde; das Cidades; do Trabalho e Emprego; da Integração
Nacional; do Meio Ambiente; de Minas e Energia; da Previdência Social; da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento; do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; da Pesca e
Aquicultura; e as Secretarias das áreas de Relações Institucionais, Direitos Humanos,
Políticas para Mulheres, Igualdade Racial e Assuntos Estratégicos.
O Cadastro Único e a busca ativa
Para que a escala nacional e o caráter intersetorial e intergovernamental do Plano Brasil
Sem Miséria (BSM) não sejam um obstáculo ao sucesso das ações, é necessário o apoio de
ferramentas e redes como o Cadastro Único para Programas Sociais, que reúne essas três
características, e a rede do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que reúne a
primeira e a última delas.
Talvez o elemento mais central para a concepção e a implementação do Plano BSM seja o
Cadastro Único, ferramenta essencial para soluções integradas de combate à pobreza. O
Cadastro Único é a única fonte que traz informações detalhadas sobre as famílias mais
pobres em todo o país. Ele permite que o poder público saiba quem são os membros
dessas famílias, onde moram, quais as características dos seus domicílios, sua idade,
escolaridade e informações sobre trabalho e renda, entre outras.
A partir de sua identificação no Cadastro, esses brasileiros têm acesso a vários dos
programas que fazem parte do Plano Brasil Sem Miséria e que utilizam as informações
cadastrais no momento da seleção de seus beneficiários.
Assim, o Cadastro Único permite ao poder público identificar as famílias mais vulneráveis
para então transferir-lhes renda, matricular seus integrantes em cursos profissionalizantes,
oferecer-lhes serviços de assistência técnica e extensão rural, dar-lhes acesso à água ou a
tarifas reduzidas de energia elétrica, entre muitas outras oportunidades.
O Cadastro Único é coordenado pelo MDS e operado pela rede SUAS em todos os
municípios do Brasil, com o apoio dos estados, e perpassa quase todas as ações que fazem
parte do Brasil sem Miséria. No início do Plano, havia cerca de 22 milhões de famílias de
baixa renda registradas no Cadastro Único17, o que correspondia a aproximadamente 75
milhões de pessoas, incluindo a maior parte da população extremamente pobre do país.
Contudo, em que pese o esforço de inclusão da população de baixa renda no Cadastro,
persistia um percentual de exclusão. Muitas das pessoas que ainda não faziam parte do
Cadastro viviam em áreas isoladas, ou nos bolsões de pobreza dos grandes centros
17
Quando o Plano completou três anos, havia 23,2 milhões de famílias cadastradas.
58
58
urbanos, ou em outras áreas nas quais é difícil o acesso aos programas e serviços
oferecidos pelo poder público.
Tais famílias dificilmente teriam as informações ou os meios para buscar esses programas e
serviços, e por isso o Estado não pode esperar que elas tomem a iniciativa de buscar os
seus direitos e as oportunidades à sua disposição. O poder público é que precisa ir aonde a
extrema pobreza está. Essa inversão representa uma importante mudança de paradigma
de gestão pública.
E é justamente para ir aonde seu público-alvo está que o BSM desenvolve ações
conhecidas como busca ativa, cuja meta é encontrar e cadastrar todas as famílias
extremamente pobres ainda não localizadas e incluí-las no Programa Bolsa Família.
Para apoiar os municípios na estratégia de busca ativa, o Brasil sem Miséria criou as
equipes volantes da assistência social e aumentou os repasses de recursos do Governo
Federal para as prefeituras desenvolverem ações ligadas à gestão do Cadastro Único e do
Bolsa Família (mais informações sobre a busca ativa na Parte II deste documento).
Características das ações
Tendo em vista que a pobreza é um fenômeno multidimensional, que se manifesta de
diferentes maneiras em cada região e localidade de todo o país, o Plano Brasil sem Miséria
precisava de ações intersetoriais, articuladas e integradas, desenvolvidas de forma
pactuada entre União, estados e municípios.
Nesse sentido, o Programa Bolsa Família foi paradigmático para a concepção do Plano
BSM. Em primeiro lugar, por articular ações de diversas áreas – especialmente saúde,
educação e assistência social, em razão do acompanhamento de condicionalidades previsto
para as famílias do Programa. Um exemplo são as transferências do Bolsa Família a
gestantes, uma iniciativa do Plano Brasil sem Miséria que requer a atuação da rede de
saúde informando a realização dos exames pré-natais para viabilizar o pagamento do
benefício (mais informações sobre intersetorialidade do Bolsa Família no item sobre
eficiência em gestão).
Em segundo lugar, o Bolsa Família é estruturante por funcionar numa perspectiva de
gestão compartilhada entre os entes federados. Além disso, foram a expansão e o
59
59
fortalecimento do Programa que proporcionaram o desenvolvimento do Cadastro Único
para Programas Sociais, um dos elementos fundamentais do Brasil sem Miséria.
Tudo isso conformava uma plataforma importante, mas para fazer frente ao desafio de
superar a extrema pobreza era preciso ir além. Não só articulando e integrando dezenas de
outros esforços com impactos importantes em termos de redução da pobreza, mas que
estavam dispersos entre as diversas áreas da atuação governamental, como também
atuando de maneira concertada entre União, estados e municípios. Era necessário, ainda, o
empenho redobrado da administração central em simplificar o desenho e a implementação
dos programas nos quais a gestão é compartilhada entre os entes federados, de modo a
facilitar sua atuação.
Assim, para retirar milhões de pessoas da extrema pobreza, num esforço que abrange todo
o território nacional, em um prazo relativamente curto, o Plano BSM buscou ações cujas
principais características são:

Foco no público extremamente pobre;

Grande escala, de modo a atingir um contingente significativo de população;

Perspectiva nacional (ainda que com destaques regionais), de maneira a alcançar
os extremamente pobres em todo o país; e

Estrutura que permita execução ágil, de modo a garantir a tempestividade
requerida, dado o prazo de duração do Plano (até o final de 2014).
Por fim, mas não menos importante, foi preciso levar em conta algumas especificidades da
população mais vulnerável. Para além da insuficiência de renda, a baixa escolaridade, as
longas jornadas de trabalho e o acesso restrito a informações são alguns dos obstáculos
que limitam o acesso desse público às oportunidades que o país oferece. O atendimento a
essas pessoas requer cuidados e atenção diferenciados, tendo em vista tais características,
de modo a evitar que elas sejam afastadas ao invés de incluídas nos serviços de que mais
necessitam, caso eles não estejam adaptados à sua realidade (mais informações sobre a
adaptação de iniciativas ao público-alvo na Parte II, onde são comentadas estratégias
emblemáticas do BSM).
60
60
Mescla de iniciativas novas e pré-existentes
O Plano Brasil Sem Miséria (BSM) inclui diversas políticas já existentes e consolidadas,
influenciando-as de acordo com a ótica da extrema pobreza. Ele amplia, renova e articula
iniciativas que vinham apresentando resultados expressivos no combate à pobreza, como é
o caso do Programa Bolsa Família, do Programa Mais Educação e do Programa de Aquisição
de Alimentos.
Mas também foram concebidas iniciativas originais, desenhas especialmente para compor
o Plano, nas áreas onde ainda havia espaço para inovação. Abaixo, as principais delas.
No eixo de garantia de renda:

Benefício Variável à Gestante;

Benefício Variável Nutriz;

Benefício para Superação da Extrema Pobreza.
No eixo de inclusão Produtiva:

Pronatec Brasil sem Miséria;

Acessuas Trabalho;

Bolsa Verde;

Fomento às Atividades Produtivas Rurais.
No eixo de acesso a serviços:

Ação Brasil Carinhoso;

Equipes volantes da assistência social;

Lanchas para equipes volantes da assistência social.
Coordenação
A Secretaria Extraordinária para Superação da Extrema Pobreza (Sesep) é a estrutura do
MDS responsável pelas atividades de gestão, avaliação e monitoramento do Brasil sem
Miséria. Por se configurar como uma instância de coordenação, a Sesep desempenha suas
tarefas em forte articulação com os diversos parceiros do Plano. Isso ocorre em salas de
situação temáticas, com reuniões periódicas das quais participam representantes dos
61
61
diversos órgãos do Governo Federal e outros atores envolvidos no Plano. Como
mencionado anteriormente, participam do Brasil sem Miséria, além de órgãos da
administração direta do Governo Federal, outros órgãos e entidades, bancos públicos,
estados, municípios, setor privado e terceiro setor. A atuação concertada de tantos atores
é tarefa complexa.
Se, por um lado, a parceria com os ministros, governadores e prefeitos foi construída a
partir da constatação, em âmbito nacional, amplamente reafirmada pela Presidente da
República, de que o combate à pobreza extrema é fundamental para a construção do país
mais justo – e é tarefa de todos –, por outro lado a parceria no nível técnico vem sendo
“costurada” dia após dia, nas salas de situação e no contato com os estados, os municípios
e os movimentos sociais. Um diálogo horizontal em que a busca por soluções se dá por
meio do debate sobre as opções colocadas e não por imposição da instância de
coordenação do Plano.
Box 3: Salas de situação
As salas de situação – cada uma relativa a uma área, e composta por uma equipe
intersetorial diferente – são estruturas de monitoramento e acompanhamento que
viabilizam a gestão e o tratamento das informações que subsidiam as decisões tomadas no
Plano Brasil Sem Miséria. São instâncias de caráter gerencial e informacional que permitem
a avaliação detalhada das ações, com o levantamento de restrições, atrasos, possíveis
riscos e resultados atingidos. A periodicidade de suas reuniões pode ser mensal ou
bimestral, dependendo da ação.
O monitoramento gerencial das ações do Brasil Sem Miséria obedece ao seguinte fluxo: os
ministérios setoriais coletam e organizam as informações acerca das ações sob sua
supervisão no Plano (sejam elas executadas diretamente por suas equipes ou não) e
avaliam sua consistência, para então consolidá-las e transmiti-las ao MDS e aos demais
ministérios nas salas de situação.
Por se tratar de uma instância de coordenação, que não executa ações finalísticas, a Sesep
trabalha com uma equipe relativamente pequena. Nos dois primeiros anos do Plano,
contava com cerca de 30 funcionários. Recentemente a equipe foi ampliada para 52
servidores.
62
62
Articulação federativa
Todos os estados brasileiros aderiram ao Plano Brasil Sem Miséria (BSM), por meio de
pactuação voluntária. A Presidente Dilma Rousseff e a Ministra Tereza Campello foram às
cinco regiões do país lançar pactos regionais para a superação da extrema pobreza,
assinados por todos os governadores e as governadoras.
Muitos estados deram um passo além e lançaram planos próprios de combate à miséria18,
potencializando ações que envolvem o Governo Federal e lançando ou fortalecendo ações
estaduais. Várias unidades da federação, que tinham espaço fiscal para tanto, passaram a
pagar complementações aos valores transferidos pelo Programa Bolsa Família19. Com isso,
o esforço para superar a extrema pobreza ganhou componentes com desenhos adaptados
às formas com que a pobreza se manifesta em cada parte do Brasil, num movimento
coordenado sem precedentes em termos de federalismo social.
Além de manter contatos bilaterais constantes com os estados, o Brasil sem Miséria
promoveu, em 2012 e em 2013, dois grandes encontros com todos os seus interlocutores
estaduais, no intuito de compartilhar e discutir as soluções, encontradas em cada unidade
da federação, para superar a extrema pobreza.
A partir de 2013, com início das novas administrações municipais, o Brasil sem Miséria
aproximou-se ainda mais das prefeituras, lançando materiais online e impressos para
mostrar aos gestores municipais, de maneira simples e direta, como implantar, operar ou
aprimorar os principais programas que fazem parte do Plano, disponibilizando-os ou
tornando-os mais acessíveis à sua população. Foi lançado também o sítio “Brasil sem
Miséria no seu município” (www.brasilsemmiseria.gov.br/municipios), com relatórios
18
Acre, Amapá, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas
Gerais, Paraíba, Paraná, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia,
Santa Catarina, São Paulo, Sergipe, Tocantins.
19
Onze estados implantaram complementação das transferências do Programa Bolsa Família: Acre,
Amapá, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul,
Rondônia, Santa Catarina e São Paulo. No caso do Acre, a pactuação era anterior ao Brasil sem
Miséria; as demais complementações foram pactuadas ou repactuadas na vigência do Plano.
Atualmente, sete estados têm pactuações ativas: Distrito Federal, Espírito Santo, Mato Grosso,
Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. As demais deixaram de ter efeito com a
criação de um novo benefício do Bolsa Família, que fecha o hiato de extrema pobreza, detalhado na
Parte II, no capítulo sobre o ciclo de aperfeiçoamentos no Bolsa Família.
63
63
atualizados bimestralmente, contendo informações customizadas para cada uma das
cidades brasileiras sobre o atual estágio das ações do Brasil sem Miséria em seu território.
Vários eventos com prefeitos(as) e secretários(as) municipais em todo o país tiveram a
participação de equipes do MDS empenhadas em apresentar, com o apoio dos materiais e
relatórios mencionados acima, a estratégia do Brasil sem Miséria e seus principais
programas. O resultado é que muitos municípios também lançaram seus planos locais de
superação da extrema pobreza e de cuidados na primeira infância, inspirados no modelo
do Brasil sem Miséria e da Ação Brasil Carinhoso, iniciativa do Plano voltada ao
desenvolvimento infantil (mais detalhes sobre a Ação Brasil Carinhoso adiante).
64
64
Transparência e participação social
O Plano Brasil Sem Miséria (BSM) faz divulgações periódicas de dados sobre a evolução
quantitativa e qualitativa das ações que o compõem, a partir de informações declaradas
pelos órgãos executores do Plano.
Para facilitar a prestação de contas e o acompanhamento pelos setores público e privado e
pela sociedade civil, os documentos estão disponíveis na internet, no endereço
http://www.brasilsemmiseria.gov.br. Atualmente, há três instâncias de prestação de
contas no modelo de divulgação de resultados do Plano:

Dados nacionais, publicados semestralmente na aba “Caderno de Resultados”;

Dados por estado, com atualização bimestral na aba “Brasil sem Miséria no seu
Estado”;

Dados municipalizados, com atualização bimestral na aba “Brasil sem Miséria no
seu Município”.
Além de ter acesso a essas informações, a sociedade civil é convidada periodicamente a
participar de rodadas de diálogo com o Governo Federal sobre os resultados e os rumos do
Plano. Esses eventos são organizados em conjunto pelo MDS e pela Secretaria Geral da
Presidência da República. Desde 2011, já foram realizadas quatro grandes rodadas de
diálogo. Os encontros ocorrem no Palácio do Planalto, com a presença de ministros das
pastas que atuam no Brasil sem Miséria e de representantes de centenas de entidades da
sociedade civil, das mais variadas áreas de atuação e de todas as partes do país, tendo em
vista a intersetorialidade e a abrangência nacional do Plano.
Essas atividades de divulgação, controle e participação social do Brasil Sem Miséria não
substituem aquelas já existentes e consolidadas nos diversos ministérios responsáveis
pelas ações que compõem o Plano. Funcionam para a discussão do Brasil Sem Miséria
enquanto um amplo esforço coordenado nacional em torno de um objetivo comum, sem
que se prescinda dos mecanismos já estabelecidos no âmbito de cada iniciativa ou
instituição participante.
Recursos financeiros
Em 2014, o valor total das ações apontadas no Orçamento Geral da União (OGU) como
Brasil sem Miséria é de R$ 33,4 bilhões. Mas nem todas as ações que fazem parte do Plano
Brasil sem Miséria estão assim identificadas no OGU. Isso se deve ao fato de que, por seu
caráter universal, elas já alcançam o público em extrema pobreza, tendo ou não um
componente desenhado especificamente para esse segmento da população.
É o caso das ações de saúde e educação, que possuem sua própria estrutura de repasse aos
entes federados responsáveis pela execução das políticas. A construção, reforma ou
ampliação de Unidades Básicas de Saúde (UBS) é um exemplo: faz parte do Plano por
priorizar a expansão em áreas com grande concentração de extrema pobreza, mas não
consta do Orçamento como tal porque não está restrita a elas. Outro exemplo é o
Programa Mais Educação, que oferece educação em período integral em escolas de todo o
país, priorizando em sua expansão escolas com maioria de alunos do Programa Bolsa
Família, sem contudo limitar-se a essas escolas.
Por outro lado, há programas que constam do Orçamento como sendo parte do Brasil sem
Miséria, ainda que nem todo o seu público seja o de extrema pobreza. É o caso do Bolsa
Família, que atende famílias pobres e extremamente pobres. A marcação como Brasil sem
Miséria justifica-se pela volatilidade da renda do público-alvo do programa, que
frequentemente transita entre as situações de pobreza e extrema pobreza.
No que diz respeito ao BSM enquanto instância de coordenação, ou seja, às atividades da
Sesep, os recursos empregados são muito limitados, porque a Secretaria é uma estrutura
enxuta e não é unidade executora de políticas finalísticas.
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Eficiência em gestão
O Plano Brasil Sem Miséria (BSM) aproveita as sinergias entre as ações dos diversos atores
envolvidos. Atuando de maneira otimizada, fortalecida, conjunta, todos os participantes do
Plano veem aumentar a eficiência, a eficácia e a efetividade do trabalho que realizam.
Dentre os vários exemplos de uso eficiente de recursos no Brasil sem Miséria, destacam-se
três casos emblemáticos.
O uso do cartão magnético do Bolsa Família é um deles. Ao invés de emitir um novo cartão
para pagar aos agricultores familiares os recursos do Fomento às Atividades Produtivas
Rurais, outro para pagar o Bolsa Verde, um para pagar as complementações que alguns
estados e municípios fazem ao Bolsa Família, entre outros tipos de transferência, optou-se,
dentro do Plano, por concentrar os pagamentos num cartão só. Trata-se do cartão do Bolsa
Família, compartilhado entre União, estados e municípios, e entre programas diferentes.
Isso economiza os custos de emissão de novos cartões; reduz as taxas cobradas dos
executores dos programas pelos bancos a cada depósito feito e tornou desnecessária a
criação de um sistema de pagamentos exclusivo para gerenciar os benefícios de novos
programas. Além disso, o fato de lidar com um só cartão magnético facilita sobremaneira a
vida das famílias.
A utilização do Cadastro Único também confere eficiência ao Plano, por concentrar num só
instrumento atividades de registro, diagnóstico e seleção de público para uma série de
iniciativas, como o Bolsa Família, os serviços de assistência técnica e extensão rural, os de
Fomento, a construção de cisternas, a matrícula no Pronatec Brasil sem Miséria, entre
outros. O custo para desenvolver e manter sistemas de informação diferentes para cada
um desses programas seria altíssimo em termos financeiros, e talvez ainda maior em
termos de perda de oportunidades de articulação e de sinergia entre as ações.
Por fim, o uso de fundos já existentes para transferências de volumes expressivos de
recursos financeiros, repassados de maneira simples e rápida pelo Governo Federal para
potencializar a atuação dos municípios, também configura utilização eficiente de recursos.
Não só pela pré-existência dos mecanismos, mas também pela simplicidade dos
procedimentos, que dispensam a preparação, assinatura, gestão e acompanhamento de
convênios ou outras formas de transferir recursos entre entes federativos.
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É o que acontece, por exemplo, com os recursos do Acessuas Trabalho, destinados a apoiar
os municípios em ações de inclusão produtiva, transferidos pelo Governo Federal via Fundo
Nacional de Assistência Social (FNAS). E também com os recursos suplementares relativos a
vagas ocupadas por crianças do Bolsa Família nas creches das redes municipais de
educação infantil, transferidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE) com procedimentos simplificados de adesão e prestação de contas. Situação similar
já ocorria antes do BSM com as transferências para escolas em tempo integral no Programa
Mais Educação e com os repasses para fortalecer a gestão estadual e municipal do
Cadastro Único e do Bolsa Família.
67
Parte II - Estratégias emblemáticas e seus principais resultados
Garantia de renda – Ciclo de aperfeiçoamentos no Bolsa Família
As oportunidades de inovação em programas de sucesso tendem a ser muito reduzidas.
Este era o caso do Programa Bolsa Família. No entanto, mesmo tendo produzido ótimos
resultados e obtido reconhecimento tanto nacional quanto internacional, o Bolsa Família
precisou ser repensado para fazer frente às metas e aos prazos estabelecidos no Plano
Brasil Sem Miséria (BSM).
Duas questões essenciais foram colocadas. Em primeiro lugar, era necessário reconhecer a
existência de beneficiários do Bolsa Família que, mesmo recebendo as transferências
monetárias do Programa, permaneciam em extrema pobreza. Os valores recebidos,
somados à renda original das famílias, ainda eram insuficientes para essas famílias
ultrapassassem a linha estabelecida pelo Plano. Em segundo lugar, era preciso fazer ajustes
em termos da cobertura do Programa e de seus erros de exclusão.
A resposta ao primeiro desafio começou a ser dada a partir da medida que estreou o BSM,
em 2011: um reajuste dos benefícios do Programa Bolsa Família que favoreceu
especialmente as famílias com crianças e adolescentes.
Essa decisão baseou-se em diagnóstico que mostrava que essa era a faixa etária de maior
incidência de pobreza extrema na época do lançamento do Plano, quando 40% da
população miserável tinha menos de 14 anos. Os benefícios destinados a crianças e
67
adolescentes de até 15 anos tiveram reajuste de 45,5% em 2011; no caso dos jovens de 16
e 17 anos, o aumento também foi considerável, de 15,2%.
Ainda naquele ano, o Brasil Sem Miséria ampliou de três para cinco o número de benefícios
destinados a crianças e adolescentes que cada família pode receber, gerando 1,3 milhão de
novos benefícios na faixa de zero a 15 anos. Além disso, teve início o pagamento de
benefícios para famílias com gestantes ou com bebês em fase de amamentação.
A principal inovação do BSM na atenção às crianças, contudo, veio em 2012, com o
lançamento da Ação Brasil Carinhoso (mais informações sobre a Ação Brasil Carinhoso
adiante, no capítulo sobre primeira infância). A estratégia foi desenhada para retirar da
miséria todas as famílias beneficiárias do Bolsa Família com filhos na primeira infância20,
fase crucial do desenvolvimento humano.
Para enfrentar esse desafio, o Bolsa Família teve que, de certa forma, se reinventar. Após
anos trabalhando com valores fixos, lançou o benefício de superação da extrema pobreza,
que varia de acordo com a severidade da pobreza de cada família21, modificando a lógica
de cálculo de benefícios do Programa. Isso permitiu amplificar os efeitos do Bolsa Família
ao menor custo possível.
O novo benefício, um dos pilares da Ação Brasil Carinhoso, era pago às famílias com
crianças de até seis anos. Deu tão certo que, posteriormente, foi estendido às famílias com
crianças de até 15 anos. Com isso, a diferença entre as crianças e adolescentes as demais
faixas etárias, em termos de incidência de extrema pobreza deixou de existir.
No início de 2013, o benefício de superação da extrema pobreza passou a ser pago a todas
as famílias do Bolsa Família que ainda não haviam superado essa condição. Essa medida
concluiu a primeira etapa de um ciclo de aperfeiçoamentos no Bolsa Família, cujo resultado
foi ter retirado 22 milhões de pessoas da extrema pobreza desde o início do BSM. E marcou
o fim da miséria, do ponto de vista da renda, no universo de beneficiários do Programa
Bolsa Família.
Para viabilizar essa primeira parte do ciclo de aperfeiçoamentos no Bolsa Família, houve
forte aumento no orçamento de benefícios do Programa (que saltou de R$ 15 bilhões em
20 Aqui entendida como o período que vai de zero a 6 anos de idade.
21
O novo benefício fecha o hiato de extrema pobreza.
68
68
2010 para R$ 24 bilhões em 2013). O benefício médio, no mesmo período, passou de R$ 95
para R$ 152, alcançando R$ 216 para as famílias que recebem o benefício de superação da
extrema pobreza.
Mas os aprimoramentos no Bolsa Família não pararam por aí. Em 2014, os benefícios do
programa tiveram um reajuste de 10%, acompanhando o reajuste da linha de extrema
pobreza do Brasil sem Miséria e das linhas de pobreza e extrema pobreza do Bolsa Família
(como mencionado na Parte I, no capítulo sobre público-alvo).
Gráfico 1: Ciclo de aperfeiçoamentos no Programa Bolsa Família (2011-2014)
69
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Em relação ao desafio de melhoria da cobertura do Programa e de redução dos erros de
exclusão, destaca-se o aumento da estimativa de atendimento do Bolsa Família de 12,9
milhões de famílias beneficiárias no início do Plano para 14,1 milhões no começo de 2014.
Isso foi possível a partir do esforço de busca ativa, compartilhado pelos governos federal,
estaduais e municipais. A busca ativa trouxe mais de um milhão de famílias extremamente
pobres para o Cadastro Único e o Bolsa Família desde o lançamento do Brasil sem Miséria.
Esse esforço, descrito na Parte I deste documento, modifica a forma de atuação do poder
público, que, de forma inovadora, passa a buscar os pobres para incluí-los em uma série de
programas que vão melhorar suas vidas. Incluindo o Pronatec Brasil sem Miséria, descrito
logo abaixo.
A estratégia de inclusão produtiva urbana
Os brasileiros pobres em idade adulta são, em sua grande maioria, economicamente ativos.
Contudo, sua inserção no mundo do trabalho tende a ser precária, com renda baixa e
instável. Em larga medida, isso se deve ao fato de não terem tido acesso à educação e
auma boa qualificação profissional. A estratégia de inclusão produtiva do Brasil sem
Miséria trouxe novas perspectivas a esse público.
O carro-chefe da estratégia em áreas urbanas é o Programa Nacional de Acesso ao Ensino
Técnico e Emprego (conhecido, em sua vertente voltada às pessoas de baixa renda, como
Pronatec Brasil sem Miséria), que oferece cursos gratuitos de qualidade reconhecida pelo
Ministério da Educação (responsável pelo Programa) e pelo mercado. Os cursos são
ministrados por entidades do “Sistema S”22 ou por escolas que fazem parte das redes
públicas federal e estaduais de ensino profissional, técnico e tecnológico. Os cursos têm
duração mínima de 160 horas e há mais de 400 modalidades, incluindo operador de
computador, recepcionista, auxiliar administrativo, eletricista e pedreiro.
Tentativas anteriores de conferir escala à qualificação profissional, incorporando também a
população mais pobre, não prosperaram em razão das especificidades desse grupo, que
requer políticas desenhadas sob medida. Falta de acesso a informações, baixa
escolaridade, jornada de trabalho de várias horas ao dia e longas distâncias a percorrer até
a escola são alguns dos obstáculos que, somados à baixa renda, dificultam a participação
desse público. Buscando contornar tais entraves, o Governo Federal, além de cobrir os
custos dos cursos, paga o material didático, transporte e lanche.
Entretanto, ainda havia dois grandes desafios. Primeiro, a dificuldade de divulgar os cursos
e de sensibilizar o público quanto à importância de sua qualificação. Muitos sequer se viam
como destinatários da política. A entrada da rede de assistência social na estratégia mudou
essa situação. A experiência no atendimento a famílias vulneráveis, a abrangência nacional
22
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
(Senac), Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat) e Serviço Nacional de
Aprendizagem Rural (Senar).
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70
e a capilaridade dessa rede fazem dela o parceiro ideal para levar as informações sobre o
Pronatec BSM até o público de baixa renda e para encaminhá-lo aos cursos e aos serviços
de intermediação de mão de obra.
Outro desafio era o de adaptar os cursos ao público. O material didático foi revisto e o
início das novas turmas passou a ser precedido de um período de acolhimento, planejado
para recepcionar as pessoas mais pobres. Ao contrário de iniciativas anteriores, agora, a
maior parte dos alunos (43%) estuda em período noturno, de modo a conciliar trabalho e
estudo – o que também requereu a adaptação das instituições que ministram os cursos. Os
pré-requisitos de escolaridade foram reavaliados, pois muitas modalidades exigiam nível de
escolaridade incompatível com o público do BSM. Hoje, 62% das matrículas são para cursos
que exigem apenas o ensino fundamental incompleto.
A quantidade de vagas e os cursos oferecidos em cada cidade que adere ao Pronatec BSM
são negociados entre o poder público, as escolas, os trabalhadores e o empresariado. A
decisão leva em consideração a vocação econômica local e os déficits de mão de obra da
região, aumentando as chances de contratação dos formados. Em pouco mais de dois anos,
o Pronatec BSM já teve mais de um milhão de matrículas – quase 70% feitas por mulheres.
E o Programa não ficou restrito às capitais e às grandes cidades: atualmente, 3.479
municípios de todos os portes têm oferta de cursos.
Gráfico 2: Evolução das matrículas no Pronatec Brasil Sem Miséria
71
71
As ações de intermediação, fundamentais para a inserção no mercado de trabalho, são
executadas por uma rede coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com
apoio da rede de assistência social. Não menos importante é a parceria com as empresas
responsáveis por grandes obras de infraestrutura, para qualificar e contratar o público da
região dos empreendimentos, reduzindo a migração de trabalhadores e mitigando
problemas sociais decorrentes dessas movimentações.
Box 4: Acessuas Trabalho
O Programa Nacional de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho (Acessuas Trabalho)
transfere recursos do Governo Federal aos municípios para o desenvolvimento de ações
que contribuam para a integração dos usuários da assistência social no mundo do trabalho.
O Programa desenvolve um conjunto de ações de articulação com a política de trabalho,
emprego e renda e realiza articulação, mobilização e encaminhamento para acesso a
oportunidades e políticas afetas ao trabalho e emprego, incluindo os cursos do Pronatec
Brasil Sem Miséria, as ações de intermediação de mão de obra (que aproximam potenciais
trabalhadores e empregadores) e de economia solidária.
A qualificação do Pronatec também melhora a inserção produtiva dos empreendedores.
Em novembro de 2013, mais de 360 mil beneficiários do Programa Bolsa Família já haviam
se registrado como microempreendedores individuais, de maneira simplificada e a custo
reduzido, passando a contar com os benefícios previdenciários e as demais vantagens da
formalização. Esses empreendedores também podem participar do programa de
assistência técnica e gerencial coordenado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e
Pequenas Empresas (Sebrae).
Para estruturar e expandir os negócios, eles têm acesso ao microcrédito produtivo
orientado do Programa Crescer, com taxa de juros reduzida de 60% para apenas 5% ao
ano, e taxa de abertura de crédito diminuída de 3% para 1%. Já foram feitas 2,8 milhões de
operações com beneficiários do Bolsa Família.
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Gráfico 3: MEIs beneficiários do Bolsa Família
73
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Gráfico 4: Microcrédito Produtivo Orientado e beneficários do Bolsa Família
A estratégia de inclusão produtiva rural
No campo, o Brasil sem Miséria articulou de forma inédita as informações do Cadastro
Único e os programas oferecidos aos agricultores familiares, numa perspectiva sistêmica
que leva ao público do Plano acesso ao “pacote completo” de inclusão produtiva rural:
assistência técnica especializada, recursos de fomento para investir nas propriedades, água
e energia elétrica, além de apoio à comercialização da produção por meio de compras
públicas e privadas.
Para aprimorar o processo produtivo, as famílias têm acompanhamento individualizado e
continuado de técnicos agrícolas, que compartilham formas de aumentar a produção, a
qualidade e o valor dos produtos. Até abril de 2014, já haviam sido contratados serviços
para atender 286 mil famílias no semiárido.
Como essas famílias não dispõem de meios para investir em suas terras, recebem 2,4 mil
reais em recursos não reembolsáveis para usar na implantação do projeto produtivo
construído em conjunto com os técnicos agrícolas. 73 mil famílias já estão sendo
beneficiadas com esses recursos. Além disso, são distribuídos insumos e sementes para
aumentar a qualidade da produção.
Unindo assistência técnica e recursos para investir, as famílias conseguem produzir mais,
melhorando sua alimentação e gerando excedentes com qualidade para serem vendidos.
Um dos canais de comercialização é o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que
compra a produção de agricultores familiares sem precisar de licitação.
Box 5: Programa Bolsa Verde
Caso as famílias inseridas no Cadastro desenvolvam atividades sustentáveis em áreas
socioambientais prioritárias, elas podem receber as transferências monetárias do
Programa Bolsa Verde, uma inovação do Plano Brasil sem Miséria. Coordenado pelo
Ministério do Meio Ambiente, o Bolsa Verde promove o aumento de renda dessas
populações, ao mesmo tempo em que incentiva a conservação dos ecossistemas.
Cada uma das quase 60 mil famílias beneficiadas até abril de 2014 recebe, pelo cartão do
Programa Bolsa Família, depósitos trimestrais de R$ 300, por um período de até dois anos.
Para tanto, as famílias se comprometem a manter a vegetação e fazer uso sustentável dos
recursos naturais das áreas onde vivem.
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O Brasil Sem Miséria (BSM) acelerou muito a entrega de resultados de várias iniciativas,
graças a melhorias de eficiência na gestão de esforços como o da implementação de
cisternas do programa Água Para Todos. Entre 2003 e 2010, a média anual de cisternas
entregues era de 47 mil. Com pouco mais de dois anos e meio de Plano, em abril de 2014,
já haviam sido entregues 579 mil cisternas, aumentando a média anual em mais de três
vezes. O monitoramento intensivo realizado pela “sala de situação de água” foi essencial
para alcançar esses resultados.
Além do acesso à água, o BSM também promove o acesso à energia elétrica, por meio do
programa Luz para Todos. Mais de 240 mil famílias do Cadastro Único e 177 mil do Bolsa
Família foram atendidas com ligações de energia elétrica desde o início do Plano.
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Gráfico 5: Implementação de cisternas do programa Água Para Todos
Acesso a serviços
O Brasil Sem Miséria (BSM) tem como meta levar os serviços públicos – especialmente os
de saúde, educação e assistência social – às pessoas e localidades mais pobres do país.
Além de garantir o acesso, o objetivo é expandir a oferta e melhorar a qualidade dos
serviços prestados à população que mais precisa.
Na assistência social, tanto os centros de atendimento quanto os serviços oferecidos estão
sendo ampliados em todo o território nacional. Entre as novidades estão a criação de
equipes volantes e o início da distribuição de lanchas para atendimento remoto na
Amazônia e no Pantanal, ajudando o poder público a chegar aonde a pobreza está.
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Na saúde, a expansão da rede e dos serviços de atenção básica nos locais com maior
incidência de pobreza é um dos principais desafios, no qual o Brasil Sem Miséria vem
avançando muito. E o papel dos Agentes Comunitários de Saúde e das Equipes de Saúde da
Família está sendo fundamental.
Na educação, forma mais definitiva de superação da pobreza, a Ação Brasil Carinhoso (mais
informações no Box 6 abaixo) dá o estímulo financeiro aos municípios para que eles
aumentem a quantidade de vagas ocupadas por crianças do Bolsa Família em creches.
Esses recursos adicionais melhoram a qualidade dos serviços prestados às crianças.
Para o ensino fundamental, o Brasil Sem Miséria amplia a oferta de educação em tempo
integral nas escolas públicas onde a maioria dos alunos é beneficiária do Programa Bolsa
Família, por meio do Programa Mais Educação.
Tudo isso, somado à condicionalidade de educação do Bolsa Família – o acompanhamento
da frequência escolar de 16 milhões de estudantes do Programa, que apresentam evasão
menor e desempenho equiparado a média dos estudantes do ensino público brasileiro –
conduz as crianças e os adolescentes mais pobres do Brasil a romper o ciclo de reprodução
da pobreza entre gerações.
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Box 6: Primeira Infância
A concentração da miséria entre as crianças era uma das faces mais cruéis da desigualdade
no país, por tratar-se de um público especialmente vulnerável e em fase crítica de
desenvolvimento físico, intelectual e emocional. Daí a prioridade do Plano Brasil sem
Miséria à infância e à adolescência, manifestada em várias medidas, especialmente no
lançamento da Ação Brasil Carinhoso.
A vertente de renda do Brasil Carinhoso foi detalhada anteriormente, no capítulo sobre o
ciclo de aperfeiçoamentos no Bolsa Família. Ela retirou da miséria as famílias do Programa
que tinham em sua composição crianças nessa faixa etária. .A medida funcionou tão bem
que acabou sendo estendida a todas as famílias do Bolsa que ainda viviam na extrema
pobreza. Mas a Ação Brasil Carinhoso também tem importantes iniciativas nas áreas de
saúde e educação.
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Para prevenir e tratar alguns dos problemas de saúde que mais prejudicam o
desenvolvimento das crianças na primeira infância, o Brasil Carinhoso tem estratégias de
suplementação de vitamina A (3,5 milhões de crianças atendidas) e sulfato ferroso (1,2
milhão de frascos distribuídos), além de distribuir medicação gratuita contra asma.
Na área da educação, o Carinhoso estimula os municípios a aumentar a quantidade de
vagas e melhorar a qualidade do atendimento para as crianças do Bolsa Família nas
creches, por meio de suplementação, em 50%, dos recursos transferidos pelo governo às
prefeituras a cada vaga ocupada por criança do Bolsa Família. O atendimento das crianças
de zero a 3 anos do Bolsa Família em creches aumentou de 11% em 2012 para 17% em
2014.
O pacote do Brasil Carinhoso inclui ainda um aumento de 66% no valor repassado para
alimentação escolar nas creches (mais 298 milhões repassados desde maio de 2012,
beneficiando quase 6 milhões de crianças) e a extensão do Programa Saúde na Escola para
creches e pré-escolas.
Conclusão
Dentre os muitos fatores que contribuem para o sucesso do Plano Brasil Sem Miséria, cabe
destaque à forte vontade política no nível dos chefes dos poderes executivos federal,
estaduais, distrital e municipais. O compromisso de superar a extrema pobreza, por meio
da estratégia de desenvolvimento inclusivo, foi legitimado pela população no resultado das
eleições, de modo a tornar prioridade de governo um dos objetivos fundamentais
declarados na Constituição de 1988, o de “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir
as desigualdades sociais e regionais”. Por outro lado, a articulação intersetorial e federativa
sem precedentes, em nível técnico, conduzida de maneira horizontal e não imposta,
também tem sido fundamental para a o êxito do Plano.
Outro fator crítico de sucesso foi a pré-existência de políticas e mecanismos que vinham
dando resultados significativos na redução da pobreza, e que com o Brasil sem Miséria
passaram a atuar de forma mais ampla, fortalecida, articulada e sinérgica. Entre eles, o
Cadastro Único para Programas Sociais, o Programa Bolsa Família, a rede SUAS, o Programa
Saúde da Família, o Programa Mais Educação, o Programa Água para Todos e o Programa
de Aquisição de Alimentos, para citar apenas alguns deles.
Esses e outros aspectos do Plano Brasil Sem Miséria, mencionados ao longo deste
documento, permitiram que 22 milhões de brasileiros superassem a extrema pobreza.
Somados àqueles que já haviam saído da miséria anteriormente com o apoio do Programa
Bolsa Família, são nada menos que 36 milhões de pessoas que deixaram essa condição.
Mas o Plano Brasil sem Miséria, com sua abordagem multidimensional da pobreza, vai
muito além, com ações para ampliar oportunidades de qualificação profissional, ocupação
e renda e para melhorar as condições de vida, promovendo a cidadania e rompendo o ciclo
intergeracional de reprodução da pobreza.
Tudo isso não são acontecimentos triviais. São transformações que estão mudando a vida
de dezenas de milhões de pessoas e a “cara” do Brasil. E só foram possíveis graças a uma
série de decisões inteligentes e corajosas de gestão pública, que modificaram o
funcionamento de várias ações, programas e políticas voltados à redução da pobreza.
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Referências Bibliográficas
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http://189.28.128.178/sage/sistemas/apresentacoes/arquivos/indicadores_de_desenvolvi
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FALCÃO, T. COSTA, P. Brasil Sem Miséria: background and Design Features of Poverty
Eradication Strategy. Revista Poverty in Focus, editada pelo International Policy Centre for
Inclusive Growth-PNUD, Brasília, Distrito Federal, nº 25, p. 28-30, 2014. Disponível em:
http://www.ipc-undp.org/pub/IPCPovertyInFocus25.pdf
SERVIÇO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS (SEBRAE). Portal do empreendedor.
Disponível em: <http://www.portaldoempreendedor.gov.br/mei-microempreendedorindividual>.
79
79
Superação da Pobreza
4. DEBATE EM ORDEM CRONOLÓGICA
►
Richarlls Martins (CNS):
Declarou que gostou da apresentação e da discussão sobre os conceitos de
multidimensionalidade e vulnerabilidade à pobreza. Para ele, os dois conceitos permitem
uma discussão mais ampla e integral, porque permitem trabalhar com a perspectiva de
interseccionalidade de gênero, raça, geração, orientação sexual, entre outras.
Considerando que as temáticas das políticas de reprodução, especialmente aquelas
relacionadas aos direitos sexuais e reprodutivos - assuntos fundamentais para o processo
de estruturação da agenda de população e desenvolvimento, afirmou que sentiu falta nas
apresentações e da correlação das taxas de fecundidade e das ações para a superação da
pobreza e, solicitou a mesa que falasse mais sobre o assunto. Também perguntou se a
perspectiva de enfrentamento da pobreza tem relação direta com a redução da
desigualdade social e, se sim, como isto tem se dado. Perguntou também sobre o papel do
mercado de trabalho na redução da pobreza.
►
Evandro José Morello (CNPS):
Comentou que a redução da pobreza no Brasil se deve muito a melhoria dos quadros
técnicos. Concordou com a fala de Paulo de Martino Jannuzzi e acrescentou que a grande
sabedoria desse governo tem sido abrir espaço e ouvir, de fato, a sociedade, porque ela
tem muito a contribuir, inclusive na proposição de políticas. Também ressaltou que existe
uma convergência de diversas áreas e políticas públicas com foco na superação da pobreza
e nas desigualdades presentes no Brasil. Como exemplo, citou a política de Previdência
Social, o Microempreendedor Individual e diversas outras iniciativas direcionados, por
exemplo, às donas de casa e aos trabalhadores rurais, entre outros. Sobre população e
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desenvolvimento, fez algumas reflexões sobre a vida daqueles que vivem no campo.
Considerando as dimensões demográficas, as realidades regionais e a distância dessa
população. Dialogando com a fala
de MARCELO NERI sobre os jovens, mostrou-se
preocupado com a realidade atual de migração de jovens, que saem das áreas rurais para
as urbanas e que segundo ele, são majoritariamente jovens pobres. Para ele, as políticas
não estão dando as respostas esperadas. Ainda dialogando a partir da fala de MARCELO
NERI disse ser surpreendente que o acesso ao alimento de qualidade esteja entre as
principais preocupações dos jovens. Há que se perguntar quem produz o alimento, pois nos
últimos oito anos 2,1 milhões de pessoas saíram do campo, das quais 1,3 milhões eram
jovens. É necessário repensar esse movimento, inclusive a partir da perspectiva da
sucessão. O campo precisa ser visto como um espaço de oportunidades, de
desenvolvimeto com qualidade de vida, de trabalho e de condições dignas de vida. Os
passos dados são significativos, mas são incipientes para tal. Ademais, cabe questionar qual
a juventude que está na extrema pobreza, já que a juventude, em geral, está na média da
extrema pobreza.
►
Elisa Guaraná De Castro (SNJ):
A juventude conhecida como os “Nem Nem” (jovens que nem estudam e nem trabalham)
ou ainda como os “Sem Sem” (sem acesso a algumas políticas) é formada em sua maioria
por mulheres, negros, aqueles que estão no norte e no nordeste do país e pelos que vivem
no campo. São os jovens que estão na extrema pobreza, que não acessam o mercado de
trabalho, estão em trabalhos precários, informais e com maiores índices de danos a saúde,
com difícil acesso a alguns programas e políticas públicas. ). Se a população que o MDS
persegue é a população jovem, então será importante focar nesse grupo populacional para
que os programas, inclusive o Bolsa Família, os alcance. Há também os desafios colocados
para juventude do campo e sobre os dados da Pesquisa Nacional sobre Perfil e Opinião dos
Jovens Brasileiros 2013, que demonstra que existe um sentimento de forte mobilidade. Os
jovens entendem que vivem melhor hoje do que seus pais viviam, que têm mais acesso à
educação. Mas, esses jovens de hoje querem mais: querem melhor educação e mais
acesso, trabalho em melhores condições e menos violência.
81
81
►
Fernanda Teixeira Reis (SDH):
Concordou com as observações apontadas por ELISA GUARANÁ DE CASTRO e EVANDRO
JOSÉ MORELLO e acrescentou que, para além dos recortes tradicionais que estão sendo
feitos (por regionais e por faixa etária), seria importante considerar a população LGBT,
pessoas com deficiência, população de rua, população ribeirinha, os afrodescendentes, que
a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) não considera. Respondendo as
questões apontadas pelo Paulo de Martino Januzzi, durante sua apresentação, ela
(Fernanda) destacou que um aspecto explicativo para o fator da evolução da educação e da
queda no trabalho infantil é o Bolsa Família, porque o programa tem a frequência escolar e
o enfrentamento ao trabalho infantil como fatores essenciais para sua execução. Também
concordou com a ação do MDS ao optar pela busca ativa usada pelo Plano Brasil Sem
Miséria.
►
Margareth Arilha (NEPO/UNICAMP):
A apresentação sobre homens jovens solteiros e também sobre a gravidez na adolescência,
onde se frisou a relevância das questões de gênero para as políticas de juventude, não
trouxe elementos que pudessem efetivamente aprofundar a discussão. Sobre este aspecto
específico afirmou que sabemos que os fenômenos, quando analisados na sua
complexidade, podem ajudar-nos a compreendê-los melhor, complexizá-los e encontrar
melhores respostas, de acordo com o contorno da qualidade do problema. Gostou da
inclusão do tema, porque é necessário pensar na configuração dos problemas produtivos e
reprodutivos voltados para a população masculina, sobretudo, para a população jovem.
Mesmo pouco visível, o assunto quando abordado, em muitos casos, ainda vem sendo
discutido de forma deslocada, onde de um lado estão os homens jovens solteiros
irresponsáveis e que estão envolvidos no universo das drogas, álcool e etc., versus as
mulheres que se reproduzem, como se não houvesse um casamento das problemáticas e
conflitos que merecessem de uma análise mais conjunta, pensando sexualidade e
reprodução. A expansão dos níveis de escolaridade das mulheres se mostram importantes
tanto para analisar o fenômeno do ponto de vista das mulheres quanto da exclusão da
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população masculina. Quem são as mulheres que estão ascendendo? São as jovens e mais
pobres?
►
Vera Soares (SPM):
Concordou com a fala Margareth Arilha sobre a necessidade de trazer dados desagregados
por sexo, uma vez que estes contribuem para a análise dos resultados e também para a
compreensão acerca de que conjunto de outras políticas serão necessárias para enfrentar
o problema. Na década de 1990, um enorme volume de discussão foi estabelecido em
relação à redução da pobreza e que de certo modo, levaram a um consenso de quem eram
os pobres. A entrada nos anos 2000, não foi uma entrada com políticas robustas, mas com
um diagnóstico de quem são os pobres. Naquele momento era sabido quem acessava o
microcrédito, nos bancos do povo: eram as mulheres. Prosseguiu perguntando quem são,
agora, essas quase três milhões de pessoas. E, pensando no Brasil Sem Miséria, disse sair
do debate acreditando que as mulheres deram um salto enorme no acesso ao trabalho e
educação e, portanto, separar os dados permitirá entender a extensão do que foi feito, o
impacto das políticas públicas e possíveis soluções.
►
Paulo Jannuzzi (MDS):
Em resposta a parte do debate, decidiu por enfatizar nesta fala final aspectos já
mencionados antes, como os dez anos do MDS, os três anos do Plano Brasil sem Miséria,
que segundo ele só reforçam a importância de que se vive em um país da coordenação das
políticas e da necessidade de aumentar a capacidade de gestão e implementação de
políticas públicas. Afirmou que o Bolsa Família tem um impacto certamente importante nos
vários públicos que alcança, seja pela transferência de renda direta, ou seja pelo fato de
obrigar o poder público a oferecer escolas onde antes não existia entre outros serviços,
como exemplo as escolas no semiárido e ampliação de políticas de atenção à saúde. Para
finalizar afirmou que nossas políticas articuladas provocam resultados interessantes. Mas,
quando se fala de pobreza e vulnerabilidade não se fala exclusivamente de pessoas de
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baixa renda. A solução programática para o quilombola sair da sua condição de
vulnerabilidade é muito diferente daquela para a população desempregada no meio
urbano. Pobreza é uma categoria que, do ponto de vista analítico, perdeu um pouco sua
capacidade de explicação e análise. Alguns grupos só poderão sair da sua condição de
vulnerabilidade com ações específicas e incrementais. O desafio não é mudar
completamente as políticas, mas as estratégias devem ser multifacetadas.
►
Ricardo Paes De Barros (SAE/PR e Presidente da CNPD):
Concordou com a fala Paulo Jannuzzi e afirmou que mesmo não participando diretamente
das ações do Brasil sem Miséria, mas, por ter tido a oportunidade de conhecer programas
similares de vários outros países, é possível demonstrar objetivamente o que foi feito a
partir da experiência do Brasil Sem Miséria é algo muito acima dos melhores padrões
mundiais e perguntou: como passar essa mensagem para o Brasil?
►
Tereza De Lamare (MS):
Concordou com Paulo Jannuzzi ao fazer observação sobre a categoria de análise “pobreza”
e afirmou que é exatamente neste contexto que a juventude pode ser observada, porque
outras questões estão colocadas para este grupo, para além da transferência de renda,
como por exemplo, a geração de oportunidades, escolaridade, sexualidade, entre outros
assuntos. Comentou que por diversas vezes, o RICARDO PAES DE BARROS falou sobre
processo de transição demográfica brasileira e, que o país vive o auge de população jovem
e que este estado permanecerá por mais algum tempo e que, portanto, questões
importantes, como a geração de oportunidades e emprego são fecundidade, fundamentais
para o debate. Especificamente sobre
saúde declarou que os serviços precisam
compreender esse processo que esta acontecendo no Brasil, porque ao se analisar os
dados epidemiológicos da população jovem, pode-se verificar que estão muito
relacionados com os determinantes sociais das condições de saúde, como a falta de acesso.
Para finalizar, disse que outro aspecto que a preocupa muito é a violência, pois esta é uma
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agenda que ainda não ganhou força, o que é inadmissível tendo em vista que são quase 20
mil jovens mortos a cada ano. Este é, portanto, mais um dos fatores a inserir dentre
aqueles multifacetados mencionados por Paulo Jannuzzi.
►
Tereza Cristina Silva Cotta (MPOG):
Concordando com a ideia do Ricado Paes De Barros, de que o fenômeno de que os
extremamente pobres têm características que já foram alteradas, inclusive por conta das
ações que já foram executadas para este grupo. Considerando também que as
necessidades de se mover da categoria analítica de pobreza, para a categoria de
vulnerabilidade, disparou a pergunta: como operar em uma categoria analítica que é
probabilística? Especificamente sobre o programa Brasil Sem Miséria chamou a atenção
que o programa hoje pode ser mais entendido como uma estratégia complexa, que pode
colocar em cena uma armadilha da dimensionalidade. Somado a isso, destacou que ao
incluir o conceito de vulnerabilidade, mais uma dimensão está sendo inserida e perguntou:
Como fazer isso?
►
Ricardo Paes De Barros (SAE/PR e Presidente da CNPD):
Em resposta a pergunta da Tereza Cristina Silva Cotta, disse que serão necessários dados
longitudinais sobre pessoas e, para isso, o Cadastro Único, por exemplo, vai ter de acelerar
sua velocidade de atualização e a PNAD Contínua terá de permitir que se sigam famílias ao
longo do tempo a fim verificar a mobilidade delas.
►
Ângela Maria Da Silva Gomes (CNPIR):
Parabenizou a mesa pelo conteúdo trazido, especialmente, porque para ela o Brasil de
algum tempo atrás tinha total abandono com a população que vive em extrema pobreza.
Entretanto, destacou que no momento atual será necessário, por parte do Brasil, ariscar
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um pouco mais. Do ponto de vista da pesquisa, concordando com Elisa Guaraná De Castro,
o país precisa qualificar mais essa população, porque os pobres no Brasil são negros e,
portanto, a pesquisa precisa informar isso. Sobre o conceito de vulnerabilidade versus o de
pobreza, destacou que aí a rotatividade do racismo no país não deve deixar de ser
considerada, afinal, pode-se até ter um amenização do racismo como marketing, por meio
do qual se passa a falsa imagem de um país com igualdade racial. Porém, na prática as
estruturas do racismo sempre voltam a atuar. Enquanto política pública, a ação focal é
necessária, mas, ainda existe uma tendência de tratar a questão da política focal como se
fosse tratar de um conjunto de atores, e não é isso. Sobre este aspecto, e dado que a partir
deste raciocínio estão sendo desenhadas e implementadas políticas para a maioria,
questionou sobre quais critérios foram ou estão sendo criados para avaliar o crescimento
do racismo institucional. Isso, segundo ela demonstra a necessidade de indicadores que
quantifiquem o racismo institucional enquanto potencializador da pobreza. Dialogando a
partir da fala do Flávio Ataliba, ela fez uma relação entre geográfica territorial e a geografia
étnico-racial e afirmou, que se a política não considera os parâmetros impeditivos para se
ter acesso à educação e saúde em condições de igualdade, teremos uma subclasse de
extremíssima pobreza, porque o racismo vai escalonar isso. Portanto, é preciso construir
parâmetros e critérios que digam como e por que a segregação sócio-espacial do nordeste
se diferencia entre negros e brancos. Finalizou dizendo que existem parâmetros já
conhecidos, posto que em alguns lugares já se trabalhou com o racismo institucional.
►
Tiago Falcão (MDS):
Ressaltou que o apresentado não é totalidade do Plano Brasil Sem Miséria, nem de todos
os seus resultados e que geralmente ao apresentar o plano e seus resultados, abre-se cada
um dos dados com recorte para mulheres, jovens, negros para demonstrar como essas
políticas chegam de forma diferenciadas para cada um dos públicos/grupos.
Comprometeu-se em enviar as apresentações detalhadas, especialmente com o impacto
do programa para mulheres, negros jovens e crianças. Sobre a discussão rural versus
urbana, destacou que ainda é necessário trabalhar as políticas a partir deste recorte.
Reforçou a importância do Cadastro Único, como o melhor instrumento para se obter
informações de populações indígenas, ribeirinhas, ciganas, quilombolas, entre outras,
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apesar de não trazer a totalidade de informações sobre os grupos citados. Entretanto,
também citou que o problema discutido é complexo e que soluções complexas e bem
pensadas serão necessárias para superá-lo. Comentou também o avanço da discussão de
políticas públicas conjuntas apesar das limitações, inclusive de cunho orçamentários que
em muitos casos se transformam em barreiras para a execução de algumas ações. Sobre
este aspecto citou ação a ser desenvolvida com o Ministério da Educação, mas, que em
alguns pontos mostrou-se ineficaz porque o recurso não poderia ser utilizado com
necessidades básicas de creches, como por exemplo, para a compra de fraldas e cadeiras
para o transporte de crianças. Para finalizar afirmou que não se pode naturalizar os
resultados alcançados, especialmente, porque o processo de desenvolvimento e
crescimento, depende de ações coordenadas e específicas, em escala e customizadas.
►
Claudio Dutra Crespo (IBGE):
Fez um resgate desde a primeira fala do dia, que apontavam para uma mudança que vem
ocorrendo nos últimos dez, vinte anos vem ocorrendo e que demanda revisões. Destacou
especificamente as falas de Paulo Jannuzzi e Tereza Cristina Silva Cotta e afirmou que um
caminho será o da descentralização dessas formulações e que para isso, cada vez mais será
necessário ter a inserção dos municípios, não como executores de uma ação planejada de
modo centralizado e, sim na elaboração, porque o município é capaz de ter mais
conhecimento sobre as características de suas populações. Como exemplo, citou que no
Censo 2010, o quesito raça/cor foi incluído de forma universal, mas foi pouco explorado
como informação e possibilidade de cruzamento capazes de chegar a algumas respostas,
para observar os territórios e outras variáveis como saneamento ou mesmo mortalidade.
Dialogando com a apresentação do Flávio Ataliba, ressaltou que a passagem do programa
Bolsa Família e outros incentivos produtivos que estão sendo colocados no nordeste, têm
contribuições diferenciais, em relação a outras regiões. Finalizou dizendo que algumas
informações precisam ser observadas do ponto de vista relativo e absoluto e neste caso,
encontra-se a população rural. Sobre a população jovem alertou que a questão deve ser
vista com mais atenção, especialmente porque os dados do Sistema de Informação sobre
Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc), ambos do
Sistema Único de Saúde (SUS), demonstraram que em 2011, que no horizonte, a
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fecundidade tem reduzido, mas, devido ao “retardo da maternidade”, especialmente por
parte das mulheres da região sudeste do país, ou pela melhora da coleta de dados, a onda
jovem pode durar mais tempo do que se esperava.
►
Claudio Dutra Crespo (IBGE):
Sobre os Sinasc, ao se falar sobre a mudança na coleta da informação, o que levou a essa
alteração significativa nos dados, inclusive questionados pela imprensa, Dutra Crespo
esclareceu que os dados também têm apresentado mesmo cenário a partir do Sistema de
Registro Civil.
►
Ricardo Paes De Barros (SAE/PR e Presidente da CNPD):
Em resposta ao Claudio Dutra Crespo comentou que o Ceará não é só um exemplo do
crédito produtivo orientado, mas, também de um estado com sistema de estatística muito
bom, inclusive com coleta primária de dados. Sugeriu que na próxima reunião, onde se
falará de “sistemas”, a CNPD deveria trazer alguns desses centros regionais.
►
Cássio Turra (ABEP):
Exclamou que depois de muitas horas de elogios aos programas do governo, mesmo
achando isso válido, especialmente porque os fatos são inegáveis, muitos dos indicadores
apresentados estão captando muito além de políticas públicas conjunturais, do período
2001-2012 e que, portanto, deve-se ter um pouco mais de visão crítica e separar melhor os
feitos, antes de dizer que tudo é consequência de política pública do período apontado.
Para ele, este olhar mais crítico, inclusive com efeitos de composição dos dados
estatísticos, pode prospectar o que está por vir.
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►
Ricardo Paes De Barros (SAE/PR e Presidente da CNPD):
Em resposta a fala do Cássio Turra, esclareceu que é importante isolar o impacto de cada
uma dessas “maravilhas” que estão sendo colocadas em andamento, inclusive para saber a
real contribuição de cada uma e para defendê-las no futuro.
►
Flávio Ataliba (IPECE):
Em considerações finais ressaltou dois aspectos do debate: (1) que a partir de todos os
dados apresentados existe uma tendência nos últimos anos, de redução da pobreza e
desigualdade no país, entretanto mostrou-se preocupado com a velocidade de queda que
tem se demonstrado cada vez menor e para o enfretamento deste fenômeno afirmou que
será preciso desenhar tecnologias sociais mais consistentes e capazes de olhar para
diversos grupos da população para se ter uma ação mais focada; (2) ressaltou que por mais
que o governo federal tenha feito um esforço brilhante, os estados e municípios têm papel
essencial neste processo e, por isso, um sistema de monitoramento torna-se cada vez mais
fundamental, inclusive para ampliar o diálogo com os municípios e romper com a cultura
da má gestão pública do município. Finalizou informando que as políticas sociais têm
rebatimentos distintos em cada uma das regiões do país. Há diferença entre as dimensões
do que ocorre em uma e em outra região do país, e essa diferença precisa ser incorporada
na agenda das políticas sociais do país, bem como nas pesquisas. Estes são pontos que
ainda precisam melhorar.
►
Rafael Osório (SAE/PR):
Concordou com o comentário feito pelo Cássio Turra, sobre uma análise mais críticados
resultados e ressaltou que a transferência de renda do Bolsa Família não é a única causa de
redução de pobreza extrema, porque percebe-se uma correlação forte, principalmente no
período mais recente, porque a composição da renda das pessoas que se encontram na
pobreza residual, começa a ser predominantemente da transferência, mas que não
significa que seja só isso. Ressaltou também que em termos de pesquisa fala-se de pessoas
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no anonimato e que, portanto, os 3 ou 4% nunca são as mesmas pessoas. “Nós
costumamos dizer que saíram x pessoas da extrema pobreza. Mas, este é o saldo líquido, a
gente não sabe dizer quantas entraram, devido a limitação de nossos dados”. Em resposta
a Tereza de Lamare, acredita que hoje é possível operacionalizar um critério de
vulnerabilidade à pobreza para operar programas sociais e citou como exemplo um estudo
feito pelo Ricardo Paes de Barros, sobre a definição da classe média que trouxe o corte
pela probabilidade dessa população vir a ser pobre no futuro. Sobre o comentário da Vera
Soares em relação às faces da pobreza, concordou que deve se olhar para os vários
aspectos de reprodução da pobreza, mas, que se deve tomar cuidado quando se fala em
transferência de renda, para não se ter expectativas muito infladas em relação a
transferência de renda, porque o único resultado líquido que se espera desta ação é
aumentar a renda do beneficiário. Para sedimentar sua afirmação informou que o Bolsa
Família começou com um desenho para o atendimento de mães extremamente pobres
com até três filhos dentro da faixa de idade indicada. Entretanto, percebeu-se que este
desenho de benefício era ruim para combater a pobreza, porque parte significativa da
população em condição de pobreza e extrema pobreza estava ficando de fora do
programa, o que provocou mudanças no mesmo. Essas mudanças significam levar em
conta que a pobreza tem muitas faces, que estão todas relacionadas - não são somente
mulheres negras que precisam de atenção, ou seja, o perfil mais recorrente não esgota
todas as possibilidades.
►
Cássio Turra (ABEP):
Apresentou moção verbal de apoio ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
focada especialmente na questão do fluxo de recursos para garantir a regularidade das
pesquisas. Perguntou aos presentes se todos apoiam a ideia para que se faça isso partindo
da sociedade civil e das associações científicas presentes.
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►
Claudio Dutra Crespo (IBGE):
Declarou que um apoio desta natureza é sempre bem-vindo e destacou que existem
grandes questões hoje colocadas no IBGE e que entre elas estão a necessidade de
autorização de concursos públicos e a garantia de orçamento para as pesquisas e frisou
que não é só uma questão de ter o dinheiro. É ter o dinheiro no momento certo e que a
moção vindo nesta direção de garantir que este recurso esteja na LOA é fundamental.
►
Ricardo Paes De Barros (SAE/PR e Presidente da CNPD):
Sugeriu que o Cássio Turra veja como encaminhar a demanda e que na próxima reunião da
CNPD se reserve um tempo para retomar o assunto e discutir o IBGE, o Datasus entre
outros sistemas relevantes a partir de uma perspectiva para os próximos dez anos.
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SUPERAÇÃO DA POBREZA - População e Desenvolvimento