ambiente da inovação brasileira Julho/Agosto/Setembro 2009 no 57 • Ano XV Compromisso com a mudança Depois da campanha pela qualidade, setor produtivo elege a inovação como grande tema estratégico da atualidade. Para competir na economia do conhecimento, empresas brasileiras devem protagonizar movimento pela inovação no país. Cooperativismo Negócios que transformam a realidade social dos empreendedores Oportunidade Setor de energia demanda soluções inovadoras e garante espaço para MPEs Índice ambiente da inovação brasileira Julho/Agosto/Setembro 2009 • n o 57 • Ano XV 28 ISSN 1980-3842 A revista Locus é uma publicação da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores A indústria mobilizada Como ocorreu com a qualidade no início dos anos 90, a inovação surge como necessidade cada vez mais latente no setor industrial. De olho na competitividade, empresas de todos os portes tentam integrar o conceito ao cotidiano, na forma de novos produtos e processos. Conselho editorial Carlos Américo Pacheco, Gina Paladino, Mauricio Guedes, Maurício Mendonça, Jorge Audy e Josealdo Tonholo (presidente interino) Coordenação editorial Débora Horn Márcio Caetano Colaboração Adriane Alice Pereira, Bruno Moreschi, Caroline Mazzonetto, Cora Dias, Eduardo Kormives, João Werner Grando, Júlia Pithann e Maykon Oliveira. Jornalista responsável Débora Horn – MTb/SC 02714 JP Direção de arte Luiz Acácio de Souza Edição de arte João Henrique Moço Revisão Sérgio Ribeiro Foto da capa Shutterstock 6 10 16 22 25 Presidente Guilherme Ary Plonski Diretoria Francilene Procópio Garcia, Gisa Bassalo, Josealdo Tonholo, Silvestre Labiak Junior e Paulo Gonzalez Superintendência Sheila Oliveira Pires Coordenação de Comunicação e Marketing Márcio Caetano Setúbal Alves Endereço SCN, quadra 1, bloco C, Ed. Brasília Trade Center, salas 209/211 Brasília / DF – CEP 70711-902 Contatos (61) 3202-1555 E-mail: [email protected] Website: www.anprotec.org.br Anúncios: (61) 3202-1555 [email protected] Produção Patrocínio 36 38 40 44 46 Apoio Impressão Gráfica Brasil Uberlândia Tiragem 5.000 exemplares c a p a 48 50 E n t re v i s t a Jean Guinet, economista diretor de Ciência, Tecnologia e Indústria da OCDE, revela como a inovação pode ajudar o mundo a retomar o crescimento. E m m o v i me n t o A reintegração social por meio do empreendedorismo, a ampliação da Incubadora de Santa Rita do Sapucaí (MG), os planos para o Parque Tecnológico da Bahia, a programação do Seminário Nacional e do Fórum Global e muitas boas notícias vindas de empresas graduadas e incubadas. As novidades do movimento estão aqui. Ne g ó c i o s Empreendimentos abrigados em incubadoras sociais demonstram a força da união entre pessoas dispostas a crescer e a superar todo tipo de obstáculo. I n v es t i me n t o Agências regionais de fomento ampliam capilaridade das ações de apoio à área de Ciência, Tecnologia e Inovação, concedendo crédito a micro e pequenas empresas de diversos estados brasileiros. O p o r t u n i d a de Ao investir pesado na área de energia, a Vale indica um mercado em expansão e repleto de demandas, que atrai cada vez mais empreendedores. I n t er n a c i o n a l Por meio de encontros periódicos entre especialistas, Brasil e Estados Unidos trocam experiências na área de empreendedorismo inovador. Saiba quais são os principais temas discutidos no Laboratório de Aprendizagem em Inovação. S u c ess o O acaso e a vocação inovadora marcam a trajetória da BioLogicus, empresa residente no Instituto de Tecnologia de Pernambuco (ITEP) que se tornou destaque no setor de biotecnologia. Ges t ã o Descubra como o marketing pode contribuir para adiantar demandas e desenvolver produtos que atendam as reais necessidades do público-alvo. E d u c a ç ã o Sob nova regulamentação, mestrado profissional promete aproximar programas de pós-graduação do cotidiano das empresas. Cr i a t i v i d a de Em meio a peças surpreendentes, a Oficina Brennand, em Recife, dá lições de arte e de empreendedorismo. C u lt u r a Exposições para comemorar o Ano da França no Brasil, um livro sobre o pensar criativo e outras dicas de entretenimento. O p i n i ã o Mauricio Guedes: o maior de todos os desafios será fazer com que o esforço do présal se transforme em algo sustentável, que sirva às gerações futuras. carta ao leitor A o tratar dos diversos temas que envolvem o empreendedorismo inovador, Locus sempre buscou demonstrar a importância de empresários, gestores públicos e pesquisadores tentarem aplicar o conceito de inovação no cotidiano. Como resultado desse esforço, teremos novos produtos, sólidos programas de fomento à área de Ciência e Tecnologia e, principalmente, geração de conhecimento. Nesse cenário, apesar de indispensável, o entusiasmo do governo e da academia só faz diferença quando o terceiro agente, o setor produtivo, também se engaja. Na reportagem de capa desta edição, Locus traz uma grande análise do esforço da indústria brasileira – e também da ausência dele – para inovar. Grandes empresas, como a 3M, revelam de que forma a inovação se insere no dia a dia e como as boas ideias são cultivadas. O resultado não é instantâneo. Mas a espera vale a pena e se resume em uma palavra mágica: competitividade. A matéria também mostra que, enquanto as gigantes se debatem em busca de métodos eficientes para inovar, muitas micro e pequenas empresas já nascem com a inovação no DNA. Boa parte delas passou pelo movimento ou ainda está em incubadoras e parques tecnológicos. Além de empreendimentos inovadores, muitas incubadoras abrigam um modelo especial de negócios, baseado na solidariedade e na ajuda mútua: o cooperativismo. Na seção Negócios desta edição, Locus conta uma série de boas e animadoras histórias, com personagens que se uniram para enfrentar dificuldades e buscar uma vida melhor. Apoiados por incubadoras, eles conseguiram criar e profissionalizar negócios capazes de transformar sua realidade social. Transformação também é palavra- chave na BioLogicus, case apresentado na seção Sucesso desta edição. Focada na produção de probióticos, a empresa que nasceu da iniciativa de dois pesquisadores, em 2004, não para de crescer. Na matéria, os empreendedores Djalma Marques e Fátima Fonseca relatam os primeiros desafios, que incluíram o ceticismo do mercado e das instituições de pesquisa em relação a seus projetos. Ao ingressar na incubadora do Instituto de Tecnologia de Pernambuco (ITEP), a BioLogicus deu o primeiro passo para se transformar em referência em sua área de atuação. Nessa história cheia de surpresas, a participação no reality experience Empreender é Show, promovido pela Anprotec em 2007, foi fundamental ao crescimento da empresa. Esses são alguns destaques desta edição, que traz ainda reportagens sobre agências regionais de fomento, mestrado profissional e oportunidades na área de energia, entre outras. Vale lembrar que nossas matérias são resultado do trabalho de uma equipe de jornalistas, que conta sempre com a colaboração dos membros do Conselho Editorial na busca pelas melhores pautas e fontes. Até esta edição, o time de conselheiros tinha entre seus titulares a economista Helena Lastres, que agora deixa o Conselho para se dedicar a outros compromissos. Nosso sincero agradecimento a Helena pelo companheirismo e por compartilhar com os leitores de Locus todo seu conhecimento. Boa leitura! C onselho E ditorial Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 5 6 Foto: Caroline Mazzonetto Colaboração: Kênia Hernandes/FIESP Entrevista J oão Werner G rando Inovar para crescer A inovação pode guiar o mundo para fora do buraco da crise, e para isso não é preciso recorrer a fórmulas mágicas, alerta Jean Guinet, economista diretor de Ciência, Tecnologia e Indústria da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Especialista no assunto, ele aposta na inovação como ferramenta para os países recuperarem a produtividade e assim retomarem o crescimento. Na receita, nada além dos ingredientes básicos: estabilidade macroeconômica e ambiente de competição entre as empresas. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 Recuperado esse cenário, Guinet indica que o governo deve cumprir seu papel de suporte à inovação, com políticas públicas e infraestrutura, além de dividir os riscos inerentes ao processo de inovação, com incentivos e financiamentos subsidiados. Mas, deixa claro: “Os maiores atores nesse processo são as empresas”. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida por Guinet à Locus durante o 3° Congresso Brasileiro de Inovação na Indústria, em agosto, em São Paulo. Locus: Uma vez superada a crise econômica atual, a inovação pode ser um dos principais caminhos para os países se recuperarem e buscarem a sustentabilidade? Guinet: Na OCDE, estamos nos concentrando bastante nas consequências desta crise e na maneira de sair dela. A inovação deve ser um dos pilares da estratégia para sair da crise, por muitas razões. Crises, como os chineses falam, trazem perigo, mas também oportunidades. Se queremos nos afastar do perigo e nos aproximar da oportunidade, o melhor caminho é a inovação. Também é preciso ficar claro que mesmo antes da crise nós já tínhamos sinais de que a forma como o mundo estava crescendo não era sustentável. Por diferentes razões, entre elas os aspectos ambientais, o encarecimento das matérias-primas, todas essas indicações de estresse do modelo de desenvolvimento, que precisava ser repensado. Antes da crise também notávamos uma desaceleração na produtividade na maioria dos países da OCDE. Portanto, como acreditamos que a inovação é uma forma de melhorar a performance da produção, ela já despontava, mesmo antes da crise, como algo extremamente necessário. Locus: Qual a importância da inovação para o desenvolvimento de um país? Guinet: Quando fazemos o que os economistas chamam de decomposição do crescimento, um cálculo que busca medir o efeito de diferentes fontes no avanço econômico, percebemos que cada vez mais a inovação age sobre o potencial de crescimento. Portanto, tanto de um ponto de vista puramente econômico quanto também social, o crescimento depende da inovação, seja de novos produtos, serviços ou formas de atender necessidades básicas. A China é um caso interessante porque há alguns anos eles perceberam que o crescimento do país dependeria cada vez mais da inovação. Há duas décadas, as empresas chinesas usavam máquinas comuns e apostavam no uso intensivo de sua mão de obra barata. Mas esse modelo estava perto de se esgotar e, por isso, eles escolheram uma estratégia ambiciosa. Miraram no avanço tecnológico, fazendo da inovação seu principal motor do desenvolvimento econômico e social. Isso fica muito claro Mesmo antes da crise nós já tínhamos sinais de que a forma como o mundo estava crescendo não era sustentável na economia e nas políticas de desenvolvimento da inovação na China, especialmente quando você analisa um simples indicador, o de investimento em P&D, que cresceu cerca de 20% ao ano nos últimos 20 anos. Isso significa que a capacidade de P&D cresceu aproximadamente o dobro da expansão econômica do país, que também foi bastante expressiva. Locus: A inovação demanda investimentos em novos conhecimentos, nova ciência, nova informação. Como convencer empresas a fazerem investimento no que é desconhecido? Guinet: Em países de economia avançada ou que estão crescendo, como o Brasil, existem políticas de apoio à pesquisa e à inovação baseadas nesse raciocínio. Inerentemente, o processo de inovação carrega risco. De alguma forma esse risco tem de ser compartilhado. No caso das parcerias público-privadas ele é claramente compartilhado, assim como as receitas resultantes da inovação. Mas para os investimentos puramente privados o que pode ser feito é compensar esse risco, como, por exemplo, com incentivos à P&D, financiamentos, custos subsidiados. Outro risco é o da apropriação da inovação. Mesmo criando a inovação você não terá certeza de que todos os Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 7 Entrevista benefícios dela serão seus, alguns irão para outros, outras companhias. Tudo isso é levado em conta na hora de fazer o investimento. Além dos mecanismos de proteção governamental há a área financeira, que criou mecanismo como o venture-capital, que ajudou a dar segurança a esses investimentos. O fato é que sem mecanismos de segurança haverá queda nos investimentos. Locus: A OCDE acredita que para encorajar a inovação um país precisa dispor de estabilidade política. Como países emergentes, como o Brasil, podem oferecer essas condições? Guinet: Antes de promover inovação por meio de estruturas especializadas, como parques tecnológicos ou incubadoras, o primeiro passo é se assegurar de que não se está inibindo aquilo que quer promover. Nós nos referimos a um conjunto de políticas que não são diretamente para inovação, mas que têm grande influência sobre a inovação – e geralmente influência negativa. Nós temos uma check list sobre elas. São, principalmente, condições que desencorajam investimentos, como hiperinflação, instabilidade macroeconômica. Também é importante garantir competição entre as Inerentemente, o processo de inovação carrega risco. De alguma forma esse risco tem de ser compartilhado empresas. Não que em situações de monopólio não haja inovação, mas em geral o desempenho inovador é muito menor que nas condições de competição. Há empresas inovadoras em praticamente qualquer ambiente. A diferença está no número de empresas inovadoras. O Brasil passou por dificuldades macroeconômicas, que de fato foram deteriorantes para o desenvolvimento desse novo seg- 8 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 mento da economia, mas agora isso está superado. E é por isso que inovação deve estar na agenda de todos os governos. Não é uma questão de especialistas. É importante que todos os líderes acreditem e tenham responsabilidade sobre isso. Locus: A inovação também demanda pessoas capacitadas. Quais as habilidades necessárias a quem lida com inovação? Guinet: Empresas inovadoras precisam de pessoas com certo nível de habilidades. Inovação é uma combinação de elementos e quanto mais as pessoas tiverem esses elementos em mente maiores são as chances de combiná-los. É preciso conhecimento, referências, experiência. Nós podemos descrever organizações inovadoras como organizações ideais, que concedem espaço e tempo a seus funcionários e que entendem quando ocorrem falhas. Na realidade, porém, isso não ocorre assim. O risco da inovação é sempre um risco para o inovador, mesmo em uma empresa em que, digamos, a inovação está no DNA. Isso é um processo de aprendizado, individual e coletivo, sobre os benefícios da inovação. Logo se percebe que inovação não pode ser feita de maneira fácil, sem expressivos investimentos, sem elevar os níveis de educação. Locus: Qual o papel o Estado e o da iniciativa privada na criação de um sistema nacional de inovação? É possível, por exemplo, que a indústria brasileira lidere um esforço nesse sentido? Guinet: O principal responsável pela maioria das atividades de inovação e os maiores atores nesse processo são as empresas. Por outro lado, há setores e áreas específicas que precisam da atenção do poder público, que deve agir com suporte para os negócios. Os governos também devem agir com políticas específicas, como a de infraestrutura – o que eu chamo de plataforma de inovação, como incubadoras e parques científicos. Essas estruturas, às ve- zes, podem ser financiadas pela iniciativa privada, mas há boas razões para que o poder público tome conta disso. Além disso, ambos os lados têm a responsabilidade de compartilhar os riscos da inovação. Algumas formas de fazer isso seria reduzir o custo dos investimentos para a inovação, usando diferentes mecanismos; fazer parcerias público-privadas, ajustar marcos regulatórios para as empresas se conectarem a universidades e institutos de pesquisa, vários tipos de ação. Na OCDE, acreditamos que os governos têm o papel, principalmente, de dar suporte às empresas, pois elas não podem ficar sozinhas nem conseguem fazer tudo sozinhas. Locus: Qual a importância e o papel de estruturas como parques científicos e incubadoras para um sistema nacional de inovação? Guinet: Não há dúvidas de que quando eles são bem planejados, gerenciados e localizados, eles são muito úteis. Parece óbvio, mas eu digo isso porque eles não funcionam simplesmente como uma mágica. Em alguns casos, iniciativas como essas não foram bem executadas. Portanto, fazer investimentos exagerados nesse tipo de infraestrutura é um erro. Também há problemas com a criação de competições entre essas estruturas. Cada universidade, região ou município acaba querendo criar essa instituição “mágica”, da qual acreditam que emergirá o desenvolvimento. Mas não há dúvida de que são muito úteis. Hoje há experiência internacional sobre como planejá-los, onde estabelecê-los, formas de gerenciá-los. Por isso, é possível evitar erros em sua estruturação, como parques tecnológicos que degeneram para loteamentos ou que estão junto a universidades mas acabam se tornando apenas parques de negócios. É preciso gerenciar com cuidado e evitar esses riscos. Acima de tudo, são instituições que fazem parte de uma economia regional e devem ser vistas e geridas dessa maneira. A maioria dos países emergentes está investindo nesses parques. Na China, é inacreditável o número de parques científicos e incubadoras que foram criados recentemente. O Brasil passou por dificuldades macroeconômicas, que de fato foram deteriorantes para o desenvolvimento desse novo segmento da economia, mas agora isso está superado. Locus: Quais as características das políticas públicas de inovação em países que alcançaram elevado crescimento econômico nos últimos anos? Pode citar alguns exemplos? Guinet: Os Estados Unidos são bastante estudados e conhecidos. Nós sabemos que eles desenvolveram um poderoso modelo de inovação e tiveram sucesso em mobilizar universidades e institutos públicos de pesquisa em prol do desenvolvimento econômico. Eles também têm tido muito sucesso, especialmente nas últimas duas décadas, desenvolvendo o modelo de inovação empreendedora, com startups, venture-capital. Tudo isso ocorreu graças aos mecanismos do mercado e de competição juntamente com a atuação de atores públicos ou de fora do mercado. Há vários outros exemplos. A Finlândia é muito interessante atualmente. Eles viveram um grande sucesso em políticas de inovação e também uma grande crise. Eles usaram a inovação para sair da crise que enfrentaram durante os anos 90. Tiveram queda de 10% do PIB e 20% de desemprego e de repente conseguiram reunir forças para traçar um novo modelo de desenvolvimento, evidentemente baseado na inovação. Para isso, usaram, é claro, ingredientes básicos, como investimento em educação de alto nível e também interessantes parcerias público-privadas. Eles foram um dos primeiros países a fazer essas parcerias continuamente e sistematicamente, assim como o Brasil pretende fazer. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 9 E M M O V I M E N TO Empreendedorismo para reintegração social Mais espaço para inovar O polo tecnológico de Santa Rita do Sapucaí (MG), conhecido como Vale da Eletrônica, ganhará mais espaço para incubação de empresas. Incorporado ao Condomínio Municipal de Empresas Ruy Brandão, em Santa Rita do Sapucaí, o novo empreendimento terá dois mil metros quadrados e será custeado pelo governo do estado de Minas e pela prefeitura. No local funcionarão também a Incubadora de Empresas Sinhá Moreira e a Secretaria Municipal de Ciência, Tecnologia, Indústria e Comércio. A obra custará R$ 3,6 milhões e será entregue no segundo semestre de 2010. A contrapartida do governo de Minas será de R$ 2,5 milhões. Segundo o secretário-adjunto da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino, Evaldo Vilela, a parceria do estado nas ações voltadas para as incubadoras é fundamental para o avanço do empreendedorismo e da inovação. “Santa Rita do Sapucaí tem potencial enorme, temos que aumentar ainda mais o número de incubadoras e, consequentemente, o número de empresas incubadas”, afirma. O Vale da Eletrônica possui 140 empresas do setor eletroeletrônico, que formam um Arranjo Produtivo Local (APL). 10 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 shutterstock Tornar-se referência na elaboração de políticas públicas do sistema penitenciário. Esse é o objetivo do projeto Incubadora de Empreendedorismo para Egressos (IEE), que busca contribuir para a reintegração social de egressos do sistema penitenciário do estado do Rio de Janeiro, por meio do incentivo ao empreendedorismo. Atualmente estão em desenvolvimento 80 novos empreendimentos, ainda em fase de préincubação. Em três anos de atividade, a IEE selou parcerias com a Ashoka – instituição de empreendedorismo social –, a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado do Rio de Janeiro e a Fundação Getulio Vargas (FGV), que tem contribuído para o enquadramento das empresas da IEE no Simples. Além do Rio de Janeiro, o projeto realizou ações em São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso, Bahia e Santa Catarina. Empresa da Incubadora de Empresas da Coppe/ UFRJ recebe Prêmio Bitec A Ambidados, que presta serviços de processamento e análise de dados meteoceanográficos e batimétricos, recebeu o segundo lugar do Prêmio Bitec de apoio às micro e pequenas empresas (MPEs), promovido pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan). O projeto “Monitoramento Ambiental Meteoceanográfico”, desenvolvido pela aluna Talita Soares Lucena, mostrou como a empresa incubada da Coppe/UFRJ incentiva a transferência de conhecimento universitário para MPEs. A premiação ocorreu no dia 3 de setembro, na sede da Firjan. Incubadora Softex Campinas recebe novas empresas Expectativa na Bahia Em fase de implantação, o Parque TecnoBahia será o principal instrumento do governo da Bahia para atrair pesquisa de ponta para o estado e induzir o surgimento de empreendimentos inovadores. O parque abrigará um consórcio de pesquisas universitárias, incubadoras e empresas de base tecnológica, além de servir como um centro de convergência do sistema estadual de inovação, envolvendo governo, entidades de pesquisa e empresas privadas. As obras foram iniciadas em agosto de 2008, pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação. O Tecnocentro, principal estrutura predial do parque, já foi licitado por R$ 34 milhões. A previsão é que o parque inicie as atividades em julho de 2010, quando todas as obras devem ser finalizadas. A construção do parque segue os preceitos de sustentabilidade, utilizando materiais ecologicamente corretos. O sistema viário, por exemplo, terá piso intertravado, que tem maior aderência em relação ao asfalto, é menos poluente e mais permeável do que os pisos tradicionais – o que possibilita maior absorção da água da chuva. Já a rede de energia elétrica terá postes de madeira provenientes de áreas de reflorestamento e as ciclovias e trilhas ecológicas serão estruturadas com baba-decupim, liga que substitui o cimento. divulgação divulgação Com capacidade para 10 empresas residentes, a Incubadora Softex Campinas recebeu quatro novos empreendimentos neste ano. Por meio de um edital de fluxo contínuo, os projetos apresentados são avaliados e aprovados por uma banca composta por cinco pessoas, entre técnicos, especialistas da área e representantes do Sebrae/SP, entidade parceira da incubadora de empreendimentos da área de Tecnologia da Informação e Comunicação. A CiteSpace, incubada desde janeiro, desenvolve um portal na internet, chamado “Innovation Space”, que permite aos usuários encontrar informações técnicas para o desenvolvimento de produtos e serviços inovadores dentro de suas empresas. A Flextom, que ingressou na incubadora no mesmo período, trabalha com automação residencial. A Sofist, que oferece serviços de outsourcing, consultoria e treinamento em testes de software, era pré-incubada na Softex e tornou-se incubada em junho. No mês seguinte foi a vez da MobWise, que presta serviços para dispositivos portáteis, principalmente celulares, smartphones e PDAs. Atualmente, a Softex possui nove empresas residentes e está avaliando mais quatro projetos, dois residentes e dois não residentes. Este é o ano em que a incubadora está recebendo mais propostas. “O fato de atendermos a incubadas não residentes permite que aceitemos um maior número de empresas”, explica Cidinha Freitas Navas, responsável pela seleção de novos empreendimentos. Incubadora de Campinas abriga nove empresas e avalia mais projetos Projeto do Parque Tecnológico da Bahia Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 11 E M M O V I M E N TO A Cryopraxis, empresa instalada no Polo BioRio, firmou acordo com a americana CryoCell International para desenvolver pesquisas sobre as células-tronco presentes no fluido menstrual. Segundo os pesquisadores, essas células podem ser úteis ao tratamento de diversas doenças. A parceria entre as empresas permitirá o desenvolvimento de uma técnica para facilitar a identificação e o tratamento da endometriose, doença que atinge até 15% das mulheres em idade fértil. A Cryopraxis utilizará uma tecnologia CryoCell nos Estados Unidos. Conforme o acordo, a empresa brasileira conduz as pesquisas e torna-se coproprietária dos resultados obtidos. A nova técnica deve diagnosticar previamente a doença que causa deformação interna do útero, dor pélvica intensa e infertilidade – estima-se que no Brasil cerca de 10 milhões de mulheres sofram de endometriose. O diagnóstico precoce representa um grande avanço, já que, na maioria das vezes, o diagnóstico é obtido apenas sete ou 10 anos após o início dos sintomas, quando o tratamento tende a ser mais difícil. Com a nova técnica, os médicos também poderão traçar prognósticos mais precisos sobre as chances de uma paciente contrair a doença. A endometriose é normalmente diagnosticada por procedimentos laparoscópicos dolorosos e invasivos. divulgação Empresa aposta na pesquisa com células-tronco Pesquisas devem gerar técnica para tratamento da endometriose “Milhões de mulheres devem se beneficiar da coleta do fluido menstrual, técnica não invasiva das célulastronco, em lugar dos métodos convencionais, dolorosos e trabalhosos”, adianta Mercedes Walton, presidente da CryoCell. A parceria internacional é o primeiro passo para o desenvolvimento também de terapias celulares úteis ao tratamento de doenças degenerativas (Parkinson, Alzheimer, esclerose múltipla etc.) e de disfunções como a incontinência urinária feminina. A Cryopraxis foi classificada pela publicação americana Business Week em 2009 como líder global em tecnologias em medicina regenerativa. Outplan faz parceria com RBS A Outplan, empresa graduada do Centro de Laboração de Tecnologias Avançadas (Celta), acaba de firmar parceria com o Grupo RBS, o maior conglomerado de comunicação da região Sul, para comercialização do “Futebolcard” — um sistema pioneiro na venda online de ingressos para partidas de futebol e acesso aos estádios que utiliza o cartão de crédito. O Grupo RBS vai atuar na venda de ingressos online e on-site (bilheterias) para nove grandes clubes de futebol brasileiros — Palmeiras, São Paulo, Botafogo, Santos, Figueirense, Ponte Preta, Avaí, Guaratinguetá e Bahia. 12 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 Micro, pequenas e médias empresas que faturam até R$ 60 milhões por ano podem financiar a contratação de serviços de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) com o Cartão Bndes. Com crédito rotativo e pré-aprovado no valor de até R$ 500 mil por banco emissor (Banco do Brasil, Bradesco e Caixa Econômica Federal) e sem a necessidade de apresentação de projeto, os empresários poderão contratar junto às Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs), por exemplo, serviços de prototipagem, design, ergonomia e resposta técnica de alta complexidade, bem como a aquisição de tecnologia e avaliação da qualidade de produto e processo de software. Além disso, o cartão pode financiar as contrapartidas exigidas das MPEs em programas executados pela Finep, como o Sibratec, o Progex e o Prumo, voltados a projetos de inovação e extensão tecnológica em cooperação com ICTs. A iniciativa atenderá, ainda, a demanda por crédito das empresas que necessitam de financiamento de baixo valor para investir em inovação. Criado em 2003, o Cartão Bndes oferece uma linha de crédito rotativo e pré-aprovado, com taxa de juros que beira 1% ao mês e pagamento em até 48 prestações mensais fixas, sem cobrança de tarifa ou anuidade. As transações são realizadas pela internet, através do Portal de Operações do Cartão Bndes (www.cartaobndes.gov.br). Até o momento, foram emitidos 203 mil cartões, somando mais de R$ 7,2 bilhões em limite de crédito pré-aprovado para investimentos. Em 2008, o banco viabilizou 63 mil transações, que representaram R$ 934 milhões em negócios, com crescimento superior a 60% em relação ao ano anterior. Para aprender em casa Reconhecido como pioneiro na criação de metodologias de ensino para incentivar o empreendedorismo, Fernando Dolabela – autor de O segredo de Luísa, com mais de 200 mil livros vendidos no Brasil – dedicou seu último livro, Quero construir minha história, aos pais de empreendedores. “Eu já escrevi para alunos e professores de todas as idades. Mas nenhum livro meu era dirigido aos pais, que são mais importantes do que a escola na formação empreendedora”, explica Dolabela. Baseado em uma pesquisa acadêmica realizada com 1.309 empreendedores e empregados de 11 países, Dolabela usa a ficção para ilustrar como a família pode influenciar a atitude empreendedora dos filhos. “O livro explica o que é o potencial empreendedor e como estimulá-lo. Normalmente a família e a escola o inibem”, afirma o autor. Como em O segredo de Luísa e A ponte mágica, o novo livro traz uma história que conduz o leitor. Desta vez, a narrativa conta a trajetória engenheiro Rodrigo, sua mulher, Rita, e o filho André, de 8 anos, que demonstra enorme talento criativo e potencial empreendedor. As ideias do menino, porém, não são bem acolhidas pelos pais, que sonham em ver o filho desenvolver uma carreira estável de médico, engenheiro ou advogado. Tudo muda a partir de um revés no trabalho do pai, que faz a família rever conceitos. divulgação Cartão Bndes financia investimentos em inovação divulgaç ão Livro de Dolabela alerta os pais sobre a importância do empreendedorismo Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 13 E M M O V I M E N TO De 26 a 30 de outubro deste ano, Florianópolis (SC) será sede do XIX Seminário Nacional de Parques Tecnológicos e Incubadoras de Empresas e também do 3º Fórum Global de Inovação e Empreendedorismo. Ocorrendo pela primeira vez de forma paralela, os eventos reunirão representantes de órgãos governamentais e de entidades de apoio ao empreendedorismo, gestores de incubadoras e parques tecnológicos, empresários e pesquisadores. Sob o tema central “Inovação e empreendedorismo para o desenvolvimento”, o Seminário e o Fórum discutirão eixos estruturantes de uma agenda de desenvolvimento sustentável. Além de discutir políticas e estratégias para o empreendedorismo inovador no Brasil, os participantes poderão realizar diversas atividades de capacitação. No Seminário estão previstos dois treinamentos – estratégias de cooperação internacional e valoração da tecnologia – e dois workshops paralelos. Um desses workshops ensinará aos gestores de incubadoras como preparar a instituição para ser um Centro de Referência para apoio a Novos Negócios (Cerne). A programação inclui, ainda, sete sessões plenárias e quatro sessões técnicas paralelas, que tratarão dos principais temas relacionados ao movimento de empreendedorismo inovador. O Fórum Global intensifica a capacitação, ofere- divulgação Florianópolis sedia Seminário Nacional e Global Fórum Último Seminário ocorreu em Aracaju (SE) cendo oito treinamentos paralelos, que tratarão de marketing a financiamento para micro e pequenas empresas, passando por processos de incubação. Nas nove sessões plenárias, discussões sobre economias emergentes e modelos sustentáveis de incubadoras e parques tecnológicos. Neste ano, os responsáveis locais pela organização dos eventos são a Rede Catarinense de Entidades Promotoras de Empreendimentos Tecnológicos (Recepet) e a Fundação Certi (Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras). Os realizadores do evento são Anprotec, Sebrae, Ministério da Ciência e Tecnologia e infoDev/ Banco Mundial. A programação completa pode ser conferida no site www.seminarionacional.com.br. Conselheiro da Anprotec é eleito presidente da IASP para a América Latina No dia 23 de setembro, o conselheiro e ex-presidente da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), José Eduardo Fiates, foi escolhido presidente da Associação Internacional de Parques Científicos – International Association of Science Parks (IASP) para a América Latina. A eleição ocorreu em assembleia da entidade, realizada em Monterrey, no México. “Como em ocasiões anteriores, ao assumir essa responsabilidade, coloco-me a serviço da Anprotec, membros da IASP, Relapi, entre outras entidades, e espero que esse espaço venha a ser muito útil para o sucesso de nossas iniciativas e propósitos”, afirmou Fiates. 14 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 High-Tech Agenda A BrasilOzônio, empresa graduada pelo Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec) de São Paulo (SP), lança a Autoclave Ozônio que esteriliza todo e qualquer instrumento cirúrgico. Para descontaminar o material, o processo, inédito no Brasil, utiliza o ozônio – gás produzido a partir do oxigênio presente no ar –, que não prejudica o meio ambiente e tem alto poder germicida contra bactérias, vírus e fungos. Outra vantagem é o baixo consumo de energia elétrica: o produto consome 10 vezes menos do que um esterilizador convencional. Saiba mais: www.brasilozonio.com.br divulgação Ozônio contra germes Outubro 5ª Inovatec – Feira de Inovação Tecnológica Com o tema “Integração para a Inovação – Empresas, ICTs e Governos”, o evento divulgará mecanismos e instrumentos para fomentar e induzir a inovação e o empreendedorismo, além de apresentar vários cases de inovação em produtos e processos. Quando: 6 a 9 de outubro Onde: Belo Horizonte (MG) Informações: www.semanaglobal.org.br Na Lei Novembro Produzido pela Ambplan Engenharia Ambiental e Segurança do Trabalho, residente na Incubadora de Empresas Barão de Mauá (SP), o Amblegis é um software que faz todo o gerenciamento e adequação de legislações de meio ambiente, saúde e segurança do trabalho que são aplicáveis a cada indústria, de acordo com seu ramo de atividade. Além de garantir o cumprimento da legislação, o programa é ideal para o pleno atendimento das normas ISO 14001 e OHSAS 18001. Saiba mais: www.ambplan.com.br Semana Global do Empreendedorismo Com o objetivo de despertar a atitude empreendedora nas pessoas, o evento, que no ano passado ficou conhecido pelo bordão “Bota pra fazer”, acontecerá simultaneamente em 90 países. Durante sete dias ocorrerão palestras, workshops, jogos, feiras e outras iniciativas em todo o Brasil. Quando: 16 a 22 de novembro Onde: em todo o país Informações: www.semanaglobal.org.br A Sandbox, residente no MIDI Tecnológico, de Florianópolis (SC), lança o Tangu, que permite a criação de um evento com todas as informações necessárias, como nome, data, local e período. Com o Tangu é possível customizar o formulário de inscrição e as formas de pagamento em uma plataforma amigável, que permite a criação e organização com maior agilidade. Saiba mais: www.sandbox.com.br shutterstock Evento seguro 3º Congresso da Rede Brasileira de Tecnologia de Biodiesel A terceira edição do congresso prevê a realização de palestras envolvendo os principais temas trabalhados na Rede: agricultura, armazenamento, caracterização e controle da qualidade, coprodutos e produção do combustível. Também serão realizados debates por meio de mesas-redondas, com a participação de expoentes nacionais do setor, bem como a apresentação de trabalhos científicos e a exposição de produtos e serviços. Quando: 9 e 10 de novembro Onde: Brasília (DF) Informações: www.congressorbtb.com.br Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 15 e g ó c i o s FOTOS: DIVULGAÇÃO N Integrantes da Delícias do Rio: unidas para enfrentar desafios em comum A cooperação que transforma Em todos os cantos do Brasil, são cada vez mais comuns os grupos de pessoas que se unem para desenvolver negócios capazes de alterar a realidade social B runo M oreschi 16 L úcia Maria do Espírito Santo fala ao telefone como alguém que tem pressa para vencer os compromissos de um dia cheio. Desde 2007, sua rotina transformouse: de uma dona de casa deprimida, ao ver o filho com câncer, para alguém que, com a ajuda de outras mães em situação semelhante, decidiu mudar a realidade nada animadora. São 9 horas da manhã de uma sexta-feira e Lúcia faz questão de contar três coisas que julga importantes para classificar sua personalidade: acordou às quatro e meia da manhã; não terá feriado, o 7 de Setembro, e, principalmente, que não reclama jamais da rotina agitada. “Fico feliz...”, comenta quando descobre que fala para uma revista sobre empreendedorismo. “Sou isso mesmo. Mas uma empreendedora diferente. Que não visa apenas o lucro, mas Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 sim o efeito social de minhas investidas. Dá mais orgulho do que ficar rica, sabia?”, garante. Com a ajuda da Casa de Apoio à Criança com Câncer Santa Teresa, que cede um espaço para o projeto e ajuda médica, no bairro carioca do Estácio, Lúcia aliou-se a outras 22 mães para criarem a Delícias do Rio. A cooperativa pode até ser pequena, mas com menos de dois anos de existência já oferece um variado cardápio. Entre as opções, salgados quentes e frios, biscoitos, tortas, bolos, doces simples, caramelizados, tudo sob encomenda, congelado ou pronto para comer, além de um serviço completo de bufê. Lúcia não é a coordenadora-chefe da Delícias do Rio – experimente intitulá-la assim para ver como ela fica furiosa. Isso porque a pequena associação não possui nenhuma hierarquia rígida que faz com que um membro se sinta mais poderoso que outro. Quando Lúcia reuniu pela primeira vez outras mães que também tinham seus filhos em tratamento para os mais diversos tipos de câncer, a cooperativa nasceu com menos de 10 integrantes. Já na primeira reunião, notou que todas tinham algo em comum: eram mulheres que viviam quase que exclusivamente para seu filhos, cada uma por si, no isolamento característico que tal situação produz. Além de solitárias, as mães, todas bastante pobres, estavam com dificuldade em arcar com o tratamento e a alimentação, muitas vezes tão diferenciada quanto cara, de suas crianças. Em 2008, a Delícias do Rio estava ficando cada vez mais apertada. As mães quase nunca podiam se reunir no mesmo período do dia, pois não havia utensílios domésticos, tampouco espaço físico suficiente. A notícia que faria o negócio crescer veio da Holanda, mais precisamente do banco ABN AMRO. Alguns funcionários da instituição financeira ficaram sabendo do projeto pela internet e decidiram fazer uma doação conjunta de R$ 11 mil. “Todas as mães se reuniram e discutimos as prioridades, o que realmente precisávamos e não tínhamos. E, claro, o que seria possível fazer com essa adicional no orçamento”, conta Maria mostrando uma linguagem já típica de quem se tornou uma legítima empreendedora. Após as conversas, as decisões: o grupo de mães decidiu alugar um salão para servir de sede para a Delícias do Rio. Além disso, compraram os utensílios que faltavam para o aumento da produção e deram início a uma especialização a todas da equipe para aprenderem a fazer bombons e cestas de café da manhã. Assim que o caixa estiver mais reforçado, elas pretendem diversificar os negócios, vendendo também artesanato. Cadeia forte O Rio de Janeiro também é palco de outro exemplo de empreendedorismo social. Desde 1997, alguns pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) que apresentavam problemas mentais melhoraram consideravelmente a qualidade de suas vidas. O número de internações diminuiu, assim como a dependência de remédios controlados. Tudo graças a um projeto influenciado pelo pensamento do psiquiatra italiano Franco Basagla. Ele defendia que mais importante do que internar pessoas com problemas mentais em manicômios era criar para eles oportunidades de trabalho e renda, dando-lhes um novo sentido à vida. Seguindo esse preceito, nasceu a cooperativa Praia Vermelha, localizada no hospital Philippe Pinel, no bairro da Urca. Atualmente, 17 pessoas fazem parte do projeto, mas há perspectivas que esse número aumente ainda mais neste ano. O grupo produz bombons, bolos, biscoitos, salgados e embalagens. Há, porém, um diferencial que faz com que as guloseimas da Praia Cooperada da Delícias do Rio: satisfação por produzir e crescer em conjunto Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 17 N e g ó c i o s Inez Maria da Silva, a terapeuta ocupacional da cooperativa, explica que nada ali é exigido, tudo precisa ser flexível de acordo com a pessoa. “Nosso principal objetivo é resgatar a cidadania dos participantes por meio do trabalho digno. A atividade é uma forma de tratamento que, por acaso, é rentável”, explica. Durante os trabalhos, os pacientes recebem terapia gratuita, almoço e passagens de ônibus, metrô e trem. Regularmente, suas famílias são convidadas a participar de reuniões e discutir o andamento do tratamento, bem como opinar sobre o projeto social. Ajuda essencial A concretização tanto da Delícias do Rio quanto da Praia Vermelha só foi possível graças à ajuda da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP), ligada ao Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O ITCP nasceu há 12 anos com o objetivo de ser um centro de tecnologia capaz de gerar, por meio de incubadoras, empreendedorismo na área social. Hoje é uma das referências nacionais para alterDIVULGAÇÃO Vermelha sejam procuradas por muitos consumidores do campus Praia Vermelha, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – sucesso garantido nos muitos seminários promovidos na instituição de ensino. Uma das principais matérias-primas dos produtos é a castanha-do-pará, vinda de reservas extrativistas do Acre. A ideia veio de uma das cooperadas, que descobriu as reservas acreanas por acaso, ao visitar parentes na região. Após a sugestão, a cooperativa firmou parcerias com diversas associações do Acre que realizam projetos sociais ligados à economia sustentável, tendo como premissa o respeito à Floresta Amazônica. O sucesso das parcerias serve como uma dica valiosa para quem deseja desenvolver negócios na área social: aliarse a outras entidades do terceiro setor permite o crescimento mútuo. O dinheiro arrecadado com as vendas da Praia Vermelha é dividido entre um fundo social, para ajudar quem mais precisa, uma reserva para o capital de giro da cooperativa e a parte restante é distribuída entre quem faz e vende. Alguns deles produzem em casa, outros na própria cooperativa. O critério para o paciente participar é possuir entre 23 e 66 anos, não ter crises recentes e estado de saúde apto para o trabalho. Produção na Praia Vermelha: parte da matéria-prima vem de projetos sociais desenvolvidos no Acre 18 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 Sob medida É possível destacar uma característica das associações bem-sucedidas que visam a melhora de qualidade de vida de seus participantes. Todas são pensadas de dentro para fora, ou seja, de acordo com as necessidades e a capacidade de cada asso- DIVULGAÇÃO nativas de geração de trabalho, renda e cidadania entre grupos em situação de vulnerabilidade social e econômica. Nesse variado grupo, destacam-se trabalhadores desempregados ou subempregados, pessoas que estão saindo do mercado formal e ingressando no informal, usuários do sistema de saúde mental e grupos de catadores de lixo. Os recursos financeiros da ITCP vêm da própria universidade aliados a aportes financeiros de órgãos governamentais, agências de fomentos, ONGs e doações de empresas privadas e pessoas físicas. Anualmente, suas contas são auditadas pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e pelo Tribunal de Contas da União. Pioneira no Brasil ao articular o conhecimento produzido na universidade às iniciativas populares, a ITCP comprova que a união, por si só, não basta. “As pessoas unidas fazendo as mesmas coisas muitas vezes só representam mais custos. A diferença está em unir, mas também criar algum diferencial tecnológico inovador”, afirma Gonçalo Guimarães, um dos responsáveis pela ITCP. Atuante há anos no setor de cooperativas sociais, Gonçalo não cansa de repetir que de nada adianta criar novas linhas de fomento para esse tipo de negócio. “Não existe a necessidade de criar uma nova Secretaria só para as cooperativas sociais no Ministério da Ciência e Tecnologia, por exemplo. Isso só iria criar mais burocracia. O que realmente precisamos é permitir que elas tenham acesso às linhas de crédito e outras facilidades que já existem para as empresas maiores. Simples assim”, diz. ciado. É o caso da associação Entre Nós de São Sebastião, incubada no Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Universidade de Brasília (CDT/UnB) e localizada na cidade-satélite que dá nome ao grupo. Maria das Graças Mota, de 50 anos, é a costureira da associação que produz e vende bordados, crochê, bijuterias, pinturas e artesanato em papel machê. Mas nem todas as outras seis participantes gostam do ofício ou têm habilidade na máquina de costura. “Não iria adiantar eu ou qualquer outra pessoa colocá-las em uma função que elas não se sintam confiantes”, avalia. Por isso, antes mesmo da criação do grupo, em fevereiro de 2005, as mulheres reuniramse e cada uma apontou suas habilidades. Hoje, a Entre Nós de São Sebastião possui participantes especializadas em costura, pintura e artesanato. Os produtos são vendidos na própria cidade de São Sebastião, mas frequentemente vão para feiras especializadas em roupas na capital federal, em São Paulo e em Salvador. A associação vai tão bem que Maria das Graças, por exemplo, pôde largar a profissão de faxineira para se dedicar à produção de roupas, atividade que lhe agrada mais. É bem verdade que, em outros casos, a necessidade fala mais alto que a habilidade. Em Cuiabá, os moradores da Baixada Cuiabana sempre enfrentaram diversos problemas. Um dos mais graves era o período da piracema, entre março e outubro, que Cooperativa de reciclagem residente na ITCP: incubadora ajuda pessoas em situação vulnerável Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 19 N e g ó c i o financeiro e desorganização, as causas do fracasso de diversas cooperativas e associações de pessoas de baixa renda no país. Mas a dedicação de pesquisadores da UFMT fez com que a Coorimbatá não virasse apenas estatística negativa. “Havia desconfiança de todos os lados. Os ribeirinhos não acreditavam que queríamos ajudá-los sem exploração. E muitos acadêmicos achavam que ajudar a comunidade local seria apenas uma excentricidade”, afirma Priante. Hoje, porém, a Coorimbatá possui 36 cooperados que atuam principalmente no processamento de frutas regionais na forma de passas e doces, além da produção de húmus de minhoca feito a partir dos resíduos sólidos do processamento de frutas e de frigoríficos da região. Outros 50 cooperados trabalham exclusivamente no processamento da carne de jacaré, vinda de abates na cidade de Poconé. Graças a essa última atividade, em tempos de piracema o frigorífico continua em funcionamento, transformando a carne exótica em um alimento saudável para a merenda das escolas da região. proíbe os pescadores de retirar peixes dos rios. Além disso, os moradores da região possuíam um baixo nível escolar e profissional e nenhuma tradição em empreendimentos coletivos. Era comum entre os agricultores e pescadores a crença de que, para evitar problemas, seria melhor cada um cuidar da sua própria vida e não atrapalhar o vizinho. Até que um grupo de pescadores e pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) resolveu mudar esse cenário. Com ajuda da Petrobras, criaram em 1997 a Cooperativa de Pescadores e Artesãos de Pai André e Bonsucesso (Coorimbatá). Não à toa o nome é um trocadilho com um peixe muito abundante no Rio Cuiabá, o curimbatá. Quando a associação foi criada esse peixe era pouco valorizado e muitos evitavam o consumo. A primeira ideia da Coorimbatá foi montar um frigorífico para processar o curimbatá na forma de linguiça e hambúrguer. O lucro foi direto para o bolso dos pescadores e ribeirinhos das comunidades de Pai André e Bonsucesso, localizadas em Várzea Grande. A comunidade percebeu que a ideia de “cada um por si” poderia ser substituída por algo como “a união faz a força”. O professor aposentado da UFMT Nicolau Priante Filho foi um dos idealizadores da associação. Ele lembra que a cooperativa sofreu até 1999 com problemas como a falta de apoio No setor privado DIVULGAÇÃO Equipe da Coorimbatá, que encontrou apoio na Arca Multiincubadora, da UFMT s 20 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 Ainda é minoria, mas já existem exemplos de empresas que identificaram nichos de mercado nas diversas carências sociais existentes no Brasil. É o caso da Adunare Arquitetura Sustentável, residente na Incubadora Raiar, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). A empresa se dedica à arquitetura sustentável, com foco em eficiência energética. No escritório da Adunare foi desenvolvido o projeto de arquitetura do primeiro prédio público do Brasil destinado à moradia popular, o Residencial Utopia e Luta. O prédio pertencia ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), localizado no centro de Porto Alegre, e será destinado à moradia de 42 famílias com renda média de três salários mínimos. A Adunare desenvolveu o projeto arquitetônico de reforma e foi responsável pela fiscalização das obras. A empresa este- FOTOS: DIVULGAÇÃO ve envolvida no projeto desde o começo das obras, em fevereiro de 2008. De acordo com a arquiteta e diretora, Clívia Espinosa, toda a obra foi pensada de acordo com as necessidades dos moradores. As salas da edificação foram transformadas em 42 apartamentos ou quitinetes, com tamanho médio que varia de 25 a 30 metros quadrados. O prédio conta com lavanderia coletiva, coleta seletiva de lixo, horta comunitária, teatro de arena, cozinha coletiva e espaço para uso coletivo de internet. Todo o projeto foi desenvolvido visando a economia e a sustentabilidade. Os moradores terão 20 anos para pagar seu novo lar, que custará cerca de R$ 25 mil. A opção por esse nicho de mercado ainda é uma exceção entre a maioria das empresas privadas, mas, se depender dos exemplos bem-sucedidos das associações que se espalham Brasil afora, a mudança desse cenário será apenas uma questão de tempo. Cooperados na Coorimbatá cuidam da distribuição da carne de jacaré, uma das principais fontes de renda Para saber mais: Casa de Apoio à Criança com Câncer Santa Teresa (Caccst) Rua Santos Rodrigues, 60, Estácio – Rio de Janeiro (RJ) Telefone: (21) 2502-8343 www.caccst.org.br Cooperativa Praia Vermelha Rua Venceslau Brás, 65, Urca – Rio de Janeiro (RJ) Telefone: (21) 2542-3049 – ramais: 2199/2115 www.cooperativismopopular.ufrj.br Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP) Cidade Universitária, Ilha do Fundão, Praça Jorge Machado Moreira – Rio de Janeiro (RJ) Caixa Postal 68012 Telefone: (21) 2598-9240 www.itcp.coppe.ufrj.br Associação Entre Nós de São Sebastião Rua 12, casa 50, Vila Nova – São Sebastião (DF) Telefone: (61) 3335-1002 [email protected] Cooperativa de Pescadores e Artesãos de Pai André e Bonsucesso (Coorimbatá) www.coorimbata.com.br Adunare Arquitetura Sustentável Telefone: (51) 3286-7948 www.pucrs.br/agt/raiar Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 21 i nv e s t i m e n t o Uma rede de incentivos Agências regionais de desenvolvimento fortalecem sistema de fomento à inovação e ampliam abrangência do financiamento a micro e pequenas empresas J úlia P itthan oncentrado, de difícil acesso e escasso são alguns dos adjetivos que costumam caracterizar programas de fomento à pesquisa e à criação de empreendimentos inovadores. Considerado um gargalo no desenvolvimento local, o financiamento dessas atividades tem se tornado um nicho de atuação de agências regionais. Por meio de órgãos de fomento próprios, os estados brasileiros arranjam novas maneiras de conceder crédito a iniciativas locais, garantindo a geração de emprego e renda. Atualmente, são 13 agências de fomento no Brasil ligadas à Associação Brasileira das Instituições Financeiras de Desenvolvimento (ABDE). Entre os veteranos, está o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), de 1962. O Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes), de 1967, e o Banco de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina (Badesc), de 1973, completam a lista das instituições mais antigas. Entre as mais novas, estão a Agência de Fomento de Alagoas (AFAL) e DIVULGAÇÃO Lançamento da Agência de Fomento de Alagoas: busca por parceiros internacionais C 22 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 a Agência de Fomento do Estado de São Paulo (Nossa Caixa Desenvolvimento), que começaram a operar neste ano. Com as recentes adesões, o patrimônio total das agências atingirá cerca de R$ 3 bilhões. A estimativa é que as instituições possam alavancar juntas, no país, R$ 22 bilhões. A grande maioria das agências, no entanto, surgiu no final dos anos 1990. Mas, independentemente da data de fundação, o objetivo das entidades sempre foi fortalecer as economias regionais e trabalhar para diversificar o setor produtivo. Iniciativa capixaba No Espírito Santo, o Bandes foi criado para diversificar um estado que dependia fortemente da economia do café. Assim, o nome do banco ficou ligado à atração de indústrias para o estado e associado ao financiamento de grandes empresas. No começo dos anos 2000, foi alterada a política de atuação do Bandes, que passou a focar no fortalecimento de micro e pequenas empresas. O programa Nossocrédito, do Bandes, emprestou, somente em 2009, R$ 17 milhões a empresas com renda bruta inferior a R$ 240 mil por ano. Os juros ficam na faixa de 1% ao mês. Para o presidente da instituição, João Guerino Balestrassi, as linhas para pequenos em- Impulso regional Programas nacionais de fomento também ganham capilaridade com a ajuda de agências regionais. É o caso do Programa Juro Zero, da Finep, que na Bahia é coordenado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) e tem se destacado no incentivo a empreendimentos de base tecnológica. As linhas de crédito atendem empresas com faturamento anual entre R$ 333 mil e R$ 10 milhões. Os empréstimos são concedidos com um valor de até 30% do faturamento da empresa, com limite de R$ 900 mil. Dos R$ 20 milhões garantidos pela Fapesb, já foram investidos R$ 3,2 milhões, restando ainda R$ 16,8 milhões para o financiamento. A Medical System, com sede em Salvador, foi uma das empresas beneficiadas pelo programa. Ao todo, R$ 250 mil foram financiados para a instalação de um laboratório de calibração e metrologia de equipamentos eletromédicos de suporte, utilizados por hospitais e clínicas em terapias críticas. Os recursos vêm sendo aplicados há um ano e meio, e o projeto de montagem do laboratório está em fase de conclusão. O dinheiro foi usado para a compra de equipa- DIVULGAÇÃO preendimentos são uma forma de conter o êxodo do interior do estado e atender uma das principais metas definidas no planejamento estratégico da entidade: a interiorização do desenvolvimento econômico. “O programa Nossocrédito tem muita capilaridade. Temos postos de atendimento em 78 municípios do estado”, explica. Entre as iniciativas voltadas à inovação, a TecVitória é um dos principais projetos financiados com recursos do Bandes. Criada em dezembro de 1995, é uma incubadora de empresas ligadas ao setor de tecnologia da informação. O Bandes faz parte do Conselho de Administração da TecVitória e atua como instituição financiadora das iniciativas ligadas à incubadora. mentos, consultoria e contratação de mão de obra, além de capacitação para o uso das novas máquinas. A Medical System quer agora obter certificação do Inmetro e se credenciar como certificadora de calibração. No Rio Grande do Sul, um projeto de desenvolvimento de energias renováveis a partir da casca do arroz, elaborado pela Geradora de Energia Elétrica Alegrete (GEEA), já recebeu R$ 27,2 milhões a partir da Agência de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul (CaixaRS). A parcela mais recente dos recursos – de R$ 8,6 milhões – foi liberada no começo deste ano, em parceria com a Secretaria de Desenvolvimento e dos Assuntos Internacionais (Sedai). O projeto da GEEA faz parte do Programa RS Energia para Investidores, que quer tornar o estado gaúcho um novo polo de energias renováveis. Nesse projeto, a intenção é inovar na produção de sílica para uso industrial a partir do resíduo da casca do arroz, que representa 22% da massa de um grão. Os investimentos em agronegócio estão na base dos interesses da CaixaRS, que também está atenta a projetos de prefeituras, de setores industriais, do comércio, de serviços, de infraestrutura e de microcrédito produtivo. A agência de fomento opera com ativos totais de R$ 1,42 bilhão. Desse total, 1,1 bilhão representa ativos de crédito produtivo. A carteira de clientes é Balestrassi, do Bandes: agências ajudam a descentralizar o desenvolvimento Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 23 i nv e s t i m e n t o representada por cerca de 15 mil projetos de micro, pequeno, médio e grande portes já apoiados. Só nos primeiros sete meses do ano, a CaixaRS já liberou R$ 320 milhões. Até o final de 2009, o valor deve ultrapassar R$ 400 milhões. Novo cenário FOTOS: DIVULGAÇÃO Hartmann e a sede da CaixaRS: R$ 1,1 bilhão para crédito Se as agências de fomento já tinham certa agilidade na liberação de crédito, uma resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) de junho deste ano veio aumentar as possibilidades das instituições. As novas regras permitem, por exemplo, a utilização de recursos de organismos nacionais e internacionais de desenvolvimento, a participação acionária minoritária em instituições não financeiras, desde que não sejam controladas por unidades da federação, operações de câmbio e arrendamento mercantil (mediante consulta prévia ao Banco Central), bem como financiamentos a empreendimentos de natureza profissional – inclusive a pessoas físicas. Para o presidente da CaixaRS, Carlos Rodolfo Hartmann, a decisão do CMN é mais um passo importante na consolidação da função institucional dos agentes 24 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 financeiros de fomento através dos estados, que atuam em consonância com as políticas de desenvolvimento estaduais e como agentes credenciados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes). A nova regra, que permite que as instituições internacionais colaborem com as agências de fomento estaduais, deve ajudar a desenvolver projetos inovadores em Alagoas. De acordo com o presidente da AFAL, Marden Soares, a Agência Espanhola de Cooperação para o Desenvolvimento (Aecid), o Banco Interamericano para o Desenvolvimento (BID) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) estão sendo procurados para fortalecer a base financeira da instituição. Lançada este ano, a AFAL dispõe de R$ 6 milhões em capital, além de US$ 3,5 milhões em recursos captados junto aos organismos internacionais para ofertas de financiamento. O montante é considerado escasso até por Marden. “Realmente, R$ 6 milhões de capital é muito pouco. Ainda mais se comparados com a média nacional, que gira em torno de R$ 140 milhões. Entretanto, contamos com a possibilidade de atuar mediante repasses, principalmente via Bndes, e com instrumentos criativos, como, por exemplo, financiamento de fornecedores de compras governamentais”, avalia. Apesar das dificuldades iniciais, Marden acredita que a agência vai desempenhar um papel importante no desenvolvimento regional. “Organizando as forças sociais em torno de arranjos produtivos, cooperativas e associações de microempreendedores, a AFAL fortalecerá cadeias produtivas e oferecerá financiamento adequado às reais necessidades das populações não atendidas de forma natural pelos bancos”, sinaliza. SHUTERSTOCK o p o r t u n i d a d e Energia em expansão Novas fontes e formas de utilização dos recursos energéticos estimulam surgimento de negócios em diversas áreas de atuação C om sete usinas hidrelétricas de grande porte em operação, uma em construção, outra em fase de licenciamento ambiental prévio e quatro Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) em funcionamento, a Vale responde por quase 4,5% de toda a energia elétrica gerada no Brasil e é a maior investidora privada do país nesse setor. No ano passado, a empresa estreou com atitude de protagonista no mercado de energias renováveis. Em associação com o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes) lançou a Vale Soluções em Energia (VSE). Focada em processos de geração ambientalmente sustentáveis e no uso de fontes energéticas renováveis, a VSE pode ser considerada o símbolo do crescimento desse mercado no Brasil. A empresa propõe criar um inédito programa de desenvolvimento de soluções para a área de energia. Para isso, implantou um Centro de Tecno- logia no Parque Tecnológico de São José dos Campos, interior de São Paulo. O programa de desenvolvimento prevê cerca de R$ 420 milhões em investimento pelos próximos quatro anos. Além disso, projeta o desenvolvimento de atividades nas áreas de gaseificação de carvão térmico e de biomassa. Também estão previstas pesquisas para a produção de turbinas a gás e motores pesados multicombustíveis, enfatizando a aplicação de novos processos e a combinação dessas tecnologias para a autogeração de energia limpa, de forma sustentável. A driane A lice Pereira MPEs mobilizadas O mercado de soluções para energia também garante espaço para as pequenas empresas. Residente na Incubadora de Empresas da Coppe/UFRJ, a Recriar Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 25 DIVULGAÇÃO/RECRIAR Raposo, da Recriar: empresa voltou serviços de consultoria para o mercado de energia Tecnologias e Engenharia está se preparando para conquistar o mercado com consultorias especializadas em qualidade de energia elétrica, eficiência energética e fontes renováveis. “O mundo inteiro fala em energia. É um mercado em grande expansão e ainda com muito pouca gente atuando”, avalia Isidoro Raposo, um dos três sócios da empresa. Atualmente, a Recriar tem três produtos em sua linha de desenvolvimento, sendo dois voltados para a melhoria da qualidade de energia e um para o aproveitamento de energias renováveis. O Statcom (Compensador Estático de Reativos) é voltado para aplicações na correção em tempo real do fator de potência e regulação da tensão, e o UPQC (Condicionador Universal de Qualidade de Energia), que tem funcionalidade adicional de filtragem ativa de tensões harmônicas e compensação de afundamentos na tensão. Para a área de energias renováveis a empresa desenvolve o SIGE (Sistema Inteligente de Geração de Energia), que consiste em conversores eletrônicos para operar em conjunto com geração por fontes alternativas, como eólica e solar, adequando essa energia para alimentação de cargas isoladas ou a integração da geração com a rede elétrica existente. A empresa, que é 26 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 SHUTERSTOCK o p o r t u n i d a d e uma spin-off do Laboratório de Eletrônica de Potência e Média Tensão (LEMT) da Coppe/UFRJ, está pesquisando atualmente dois novos produtos. Para subsidiar esse processo de desenvolvimento, a empresa conquistou recursos da Subvenção Econômica e Pappe Subvenção, da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), e do programa Pesquisador na Empresa, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Recursos de programas de fomento também estimulam o crescimento de outra pequena empresa que atua na área de energia. A EcoEnergia Gestão Energética, residente na Incubadora do Instituto Tecnológico de Pernambuco (Incubatep), desenvolve e comercializa soluções em eficiência energética para redução do desperdício de energia elétrica. “Estamos sentindo os esforços do Brasil em apoiar soluções inovadoras em eficiência energética e energias alternativas. Vários são os editais públicos de apoio a fomento de micro e pequenas empresas que possuem como áreas prioritárias energia”, avalia Rodrigo Reis, diretor de pesquisa, desenvolvimento e inovação DIVULGAÇÃO/ECOENERGIA da EcoEnergia. Recentemente, a empresa aprovou dois projetos no Pappe Subvenção, sendo a segunda empresa que mais captou recursos financeiros. “Isso permitiu a contratação de profissionais qualificados para estruturação da equipe de P&D, hoje composta por dois doutores consultores, três mestrandos, um graduado e cinco graduandos”, diz o diretor da empresa. Em maio de 2009, a EcoEnergia também aprovou um projeto Bitec (Programa de Iniciação Científica e Tecnológica para Micro e Pequenas Empresas) junto ao CNPq/IEL e foi uma das aprovadas na primeira fase do Programa Primeira Empresa Inovadora – Prime, da Finep. Sócios da EcoEnergia: equipe de P&D foi estruturada com recursos de editais O mercado para soluções em energia possui como característica a formação de cadeias de empresas com atuações, produtos e serviços complementares. A própria Vale Soluções em Energia comprova esse aspecto com a instalação do seu Centro de Tecnologia no Parque Tecnológico de São José dos Campos. “São José dos Campos tem a maior concentração de mão de obra e fornecedores especializados em alta tecnologia. Temos convênios e sinergias com várias instituições, inclusive no parque tecnológico”, afirma James Pessoa, diretor-presidente da VSE. A empresa possui acordos de cooperação tecnológica já estabelecidos com a Escola de Engenharia de São Carlos/USP, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), Instituto de Estudos Avançados (IEAV) e outras instituições. Para o Parque de São José dos Campos, a VSE representa uma nova área na qual a instituição se tornará referência. “Temos a expectativa que esse empreendimento consolide o parque como desenvolvedor de tecnologias para energia”, diz Marco Antonio Raupp, diretor geral do Parque Tecnológico de São José dos Campos. Outro objetivo da administração do parque é atrair pequenas e médias empresas com atuação na área de energia para o local com a instalação da VSE. “Vamos inaugurar no final deste ano um condomínio com capacidade de instalar até 50 empresas de pequeno e médio portes. Muitas devem procurar o espaço diante da chegada da Vale”, projeta Raupp. DIVULGAÇÃO/VSE Ambiente de cooperação Operações da VSE: empresa deve atrair MPEs ao Parque Tecnológico de São José dos Campos Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 27 s p e c i a l SHUTERSTOCK e Compromisso com a mudança Indústria se mobiliza para vencer o desafio do qual dependerá a inserção do Brasil na nova economia: a inovação C aroline M azzonetto e C ora D ias 28 S uperar o descompasso em relação aos países desenvolvidos. Essa pode ser a premissa de muitas campanhas focadas na ampliação da competitividade brasileira, criando um ambiente favorável aos negócios. Mas, em meio a tantas demandas sujeitas ao desempenho do Estado, como reformas estruturais e melhoria da educação, uma se destaca por depender prioritariamente do setor privado: a inovação. Se há alguns anos inovar representava uma tendência sem muita importância estratégica, agora é uma necessidade cada vez mais latente. Nesse cenário, empresários, gestores públicos e pesquisadores tentam integrar o conceito ao cotidiano, na forma de novos produtos, programas de fomento ou geração de conhecimento. Embora todos os agentes sejam importantes, o histórico da inovação no Brasil revela que o entusiasmo de governos e academia faz Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 pouca diferença quando não repercute no setor privado. De acordo com a última Pesquisa de Inovação Tecnológica realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Pintec/ IBGE), 33,4% das empresas industriais brasileiras fizeram algum tipo de inovação em produtos ou processos entre 2003 e 2005. Em países mais desenvolvidos, como Espanha e Itália, esse índice é de 34,7% e 36,3%, respectivamente. Pode parecer animador, mas o conceito de ações inovadoras adotado pelo IBGE inclui práticas que são novas apenas para as próprias empresas e não necessariamente para o mercado. Se reduzirmos o recorte, apenas 9,7% das empresas nacionais consideradas inovadoras lançaram novos produtos ou processos no mercado. No caso das espanholas, esse índice chega a 20,9%, enquanto nas italianas se aproxima de 31,1%. Investimento pesado Os números da 3M mostram que o modelo deu certo. A empresa está presente em 60 países e faturou, em 2008, US$ 25,3 bilhões ao redor do mundo. Nos últimos cinco anos, US$ 6,6 bilhões foram direcionados para Pesquisa e Desenvolvimento – investimentos que resultam em inovações não só no desenvolvimento de produtos, mas também em gestão dos negócios, recursos humanos e processos produtivos. “Como dizemos internamente, a inovação está no DNA da empresa”, acrescenta Espeleta. No Brasil, a 3M inaugurou recentemente um laboratório para o desenvolvimento local de tecnologias com foco corporativo. Em Sumaré, interior de São Paulo, pesquisadores da empresa estão trabalhando, desde junho do ano passado, em projetos globais que interessam a toda a corporação. O foco do laboratório brasileiro está no desenvolvimento de tecnologias e produtos sustentáveis. Segundo a multinacional, o país foi escolhido graças às características do mercado e às diversidades geográfica, climática e de recursos naturais. Para Espeleta, as empresas brasileiras ainda têm muito que aprender sobre inovação. “Falta o entendimento do que é a inovação e por isso elas não conseguem definir claramente a cultura e o modelo a ser implementado em suas orga- Produtos da 3M: nos últimos cinco anos empresa destinou US$ 6,6 bilhões para P&D Monteiro, da CNI: inovação deve estar no centro da política industrial CAROLINE MAZZONETTO A divergência nos números mostra o quanto a inovação pode variar de objetivo, forma e aplicação. Entre os principais agentes, estão as micro e pequenas empresas de base tecnológica, muitas vezes saídas de incubadoras, com foco no desenvolvimento de soluções feitas sob medida para grandes indústrias. Há ainda as empresas que inovam para aperfeiçoar processos produtivos, mas não fazem da prática uma prioridade. Nesse sentido, também sem ações sistemáticas para a inovação, estão as empresas que têm na criatividade da gestão ou infraestrutura um importante diferencial competitivo, sem que isso necessariamente se reflita no mix de produtos. Para completar o elenco, existe ainda uma outra categoria, completamente ligada à capacidade de introduzir a inovação no mercado e torná-la parte do cotidiano do consumidor. São as indústrias inovadoras por essência, nascidas com foco em novos produtos e soluções, que desenvolvem desde a pesquisa até o produto final. São empresas cientes de que a sobrevivência depende da inovação e não de políticas públicas, cenário mundial favorável ou conceitos da moda. Presentes em casas e escritórios do mundo todo, as soluções da 3M – como o PostIt e a fita Durex – tornaram a empresa norte-americana um exemplo de inovação genuína. “A 3M tem na inovação, desde os primórdios, um de seus principais pilares. É o modelo de negócios adotado pela empresa”, explica o diretor de pesquisa e desenvolvimento da multinacional no Brasil, Antônio Carlos Espeleta. divulgação Diferentes atores Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 29 e s p e c i a l nizações”, comenta. Apesar disso, ele acredita que o panorama vem mudando na última década, puxado por fatores conjunturais como a estabilização da economia, a conquista pelo Brasil de credibilidade no cenário internacional e o aumento da qualidade dos produtos brasileiros. Além disso, completa, muitas companhias foram incorporadas por multinacionais e se contaminaram com o conceito de inovação aplicado em outros países, segundo o qual é preciso pensar em evolução de processos e produtos como um diferencial competitivo embasado na inovação e não apenas na eficácia produtiva. Larga escala CAROLINE MAZZONETTO Industriais se reuniram no evento promovido pela CNI para debater inovação Envolver governo e sociedade, generalizando a visão estratégica da inovação, é o que buscam hoje os líderes industriais brasileiros. A perspectiva de retomar o crescimento econômico interrompido pela crise mundial e o novo cenário de competição que se desenha fez com que o empresariado brasileiro passasse a perseguir com mais vigor as metas para aumentar o investimento em inovação. No 3° Congresso Brasileiro de Inovação na Indústria, realizado no último dia 19 de agosto, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) reuniu lideranças políticas e empresariais para debater e lançar um manifesto, 30 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 assinado por representantes de diversos segmentos do setor secundário. No documento, o compromisso do setor em investir em estratégias inovativas. “Inovação é uma atividade coletiva, em que a empresa é o ator principal, mas que depende de boa infraestrutura, sólidas instituições de pesquisa e boas universidades”, afirma o manifesto. Não é a primeira vez que a classe empresarial se une em prol de uma causa comum. Um movimento semelhante ocorreu em meados dos anos 1990, com as campanhas que buscavam qualidade e produtividade no setor industrial. “O que a CNI procura neste momento é reproduzir o entusiasmo, o mesmo comprometimento com a causa da inovação”, afirmou o presidente da entidade, Armando Monteiro, em discurso durante o evento. O manifesto traz metas ousadas. Uma delas a de duplicar, nos próximos quatro anos, o número de empresas brasileiras inovadoras. “A inovação, em qualquer país, é fruto de uma forte parceria entre governo e setor privado. Passos importantes foram dados ao posicionar a inovação no centro da política industrial”, conclui o presidente da CNI. Esforço conjunto Embora tenha chamado para si a responsabilidade por transformar o Brasil em um celeiro de inovações, a indústria espera que o sistema brasileiro de inovação corresponda a suas expectativas. Diante da plateia formada por grandes empresários, o Ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, reconheceu que apesar de o país estar consolidan- nômica e financeira – o que permite investir mais e melhor no desenvolvimento nacional. Se o governo aprovar, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do Ministério da Ciência e Tecnologia, vai disponibilizar ao setor de inovação R$ 2,7 milhões já em 2010. divulgação do sua política de C&T, os entraves burocráticos ainda são grandes, mas as perspectivas são boas. Segundo o ministro, até 2010 o Sistema Brasileiro de Tecnologia (Sibratec) deve estar completo, para formar redes de entidades e centros de pesquisa públicos e privados, bem como núcleos de universidades aptos a cooperar com o setor produtivo, em um esquema semelhante ao aplicado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Promessas para reverter o baixo índice de inovação no Brasil não faltam, tanto no setor público quanto no privado. Segundo o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes), Luciano Coutinho, hoje a economia brasileira admite que o país tenha estratégias de longo prazo nas políticas monetária, eco- Produtos da Brasilata: empresa envolve funcionários no processo de inovação Novas cabeças A injeção de capital e um punhado de boas intenções, entretanto, não serão suficientes para alterar o panorama da inovação no Brasil. Será necessário também mudar a mentalidade das pessoas. “Todo mundo acredita que, para acon- Tamanho não é documento divulgação divulgação reconhece a importância de A inovação é o que aproxima desenvolver projetos dentro dos o Laboratório Cristália, com 37 laboratórios de universidades: anos de experiência, da empresa “Laboratórios trabalham para de farmoquímicos graduada desenvolver, para servir a em 2005 pelo Centro Incubador população, não adianta ter isso em de Empresas Tecnológicas de documento, paper. Tem que virar São Paulo, a Alpha BR. Embora produto”, conclui Pacheco. tenham portes diferentes, Com a mesma intenção ambos utilizam pesquisa, de aplicar o conhecimento desenvolvimento e inovação Laboratório Cristália: 37 anos de atuação calcada em P&D resultaram gerado pela universidade, a (PD&I) para diferenciar seus em um mix de 250 produtos Alpha BR, quando foi criada em produtos, que possuem um alto 2002, pretendia desenvolver valor agregado. O Cristália tem um mix de tecnologias ainda não dominadas pelos laboratórios nacionais. 250 produtos, principalmente “No entanto, durante o curso anestésicos, dos quais a do plano de negócios da nossa maioria foi desenvolvida empresa percebemos que pelo departamento de PD&I da empresa. “A inovação além da tecnologia podíamos está presente no laboratório comercializar o produto, que principalmente nos produtos, teria uma baixa demanda física e um alto valor agregado”, explica não apenas em moléculas Alpha BR, incubada no Cietec: foco William Carnicelli, sócio do novas, mas fórmulas novas de no desenvolvimento de produtos laboratório. A empresa, que neste administrar a mesma molécula, de alto valor agregado ano já dobrou o faturamento de embalagens e até na forma de se administrar a empresa”, conta Ogari de Castro Pacheco, 2008, está num período de expansão, de aumento da presidente e um dos fundadores da companhia. Parceiro capacidade de produção. A meta de lançar um novo de instituições de pesquisa do país todo, o Cristália produto a cada ano continua. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 31 s p e c i a divulgação e Álvares, da Brasilata: mais importante que infraestrutura, são pessoas dispostas a inovar tecer, a inovação precisa de cientistas, dinheiro e laboratório. É importante, mas não essencial. O que precisa é ter um meio inovador interno: pessoas preocupadas em inovar, criar, modificar as coisas”, contrapõe Antônio Carlos Teixeira Álvares, CEO da Brasilata Embalagens Metálicas. A indústria paulista, com unidades em Estrela (RS) e Rio Verde (GO), produz latas de aço, especialmente para tintas, e conquistou o Prêmio Finep de Inovação Tecnológica 2008 na categoria Grande Empresa. O principal mérito da Brasilata é justamente ajudar a construir essa nova mentalidade, envolvendo todos os funcionários no processo de inovação. Por meio do Projeto Simplificação – criado há 22 anos a partir do modelo de manufatura enxuta da japonesa Toyota – a empresa oferece um canal para que colaboradores sugiram melhorias em gestão, processos, produtos e uso de insumos, entre outras práticas do dia a dia da indústria. As ideias podem ser aprovadas ou não. A cada semestre, a Brasilata promove uma confraternização na qual as melhores sugestões recebem prêmios simbólicos. Durante o “apagão”, em 2001, propostas para reduzir o consumo de energia fizeram a empresa economizar 35%. Não há contrapartida financeira e nenhum funcionário divulgação Fábrica da Artecola: sistema de gestão de ideias gerou 106 novos produtos no primeiro semestre deste ano l 32 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 é obrigado a participar. Ainda assim, em 2008, o Projeto Simplificação recebeu 135 mil ideias. De ponta a ponta Assim como o envolvimento dos colaboradores, a atenção às influências do próprio mercado também pode levar à adoção de estratégias inovadoras. Observar insights da concorrência, levar a sério as demandas dos clientes e buscar soluções em fontes diferentes são atitudes que podem ajudar a manter uma empresa no caminho da inovação. A Artecola Indústrias Químicas, empresa gaúcha com plantas na Argentina, no Chile, no Peru, na Colômbia e no México, aposta na criatividade e na interação dos funcionários com os clientes para prospectar novas soluções. “Nosso posicionamento é o de sermos diferenciados pela customização de produtos e a proximidade com os clientes em cada uma das regiões e mercados que trabalhamos propicia muito mais a inovação”, explica Eduardo Kunst, presidente executivo do Grupo Artecola. Como na Brasilata, a Artecola tem um sistema de gestão de ideias instituído. Até junho, 350 sugestões de colaboradores haviam sido postas em prática. A meta para 2009 é que esse sistema gere uma economia de R$ 1,8 milhão. Quanto ao lançamento de soluções no mercado, o objetivo da empresa é chegar ao final do ano com 157 novos produtos – até junho, já foram 106. Anualmente, a Artecola investe 3% da receita líquida em inovação – o que equivale, em 2009, a cerca de R$ 10 milhões. A indústria possui laboratórios de pesquisa e desenvolvimento em todas as plantas, no Brasil e no exterior. “Temos equipes dedica- Cooperação Um exemplo de relacionamento saudável e duradouro entre academia e mercado foi consolidado no Sul do país, entre a Embraco e a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Quando foi criada, em 1971, a Embraco era o resultado da associação entre as fabricantes de refrigeradores Consul, Springer e Prosdócimo. Os primeiros produtos da indústria eram compressores, fabricados a partir do licenciamento de uma tecnologia dinamarquesa. Na década de 1980, porém, os sócios se deram conta que para sobreviver no mercado era preciso ter domínio tecnológico. Em 1982, a Embraco buscou pesquisadores do Centro Tecnológico da UFSC, com o objetivo de desenvolver uma tecnologia própria. Cinco anos depois chegava ao mercado o primeiro compressor com 100% de tecno- logia brasileira. Atualmente a empresa tem uma estrutura formal de inovação com mais de 400 funcionários, distribuídos em cerca de 40 laboratórios de pesquisa e desenvolvimento. As parcerias com a UFSC, no entanto, seguem sólidas. “Temos uma rede de conhecimento com cerca de 600 parceiros. É bastante grande, mas os principais estão no Brasil, e mais especificamente na UFSC”, explica Guilherme Lima, gestor de Relações Institucionais em Pesquisa e Desenvolvimento da Embraco. divulgação das exclusivamente ao desenvolvimento de produtos e outras parcialmente. A área comercial, de apoio técnico aos clientes, também se envolve”, complementa Kunst. Os dois principais laboratórios estão no Brasil, em Campo Bom (RS) e Diadema (SP). Outra fonte de inovação para a empresa são as parcerias com universidades e centros de pesquisa. Atualmente, há dois projetos em andamento com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), um com a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e outro com o Centro Universitário Feevale, na cidade gaúcha de Novo Hamburgo. “Essa é uma área que devemos ampliar, pois estamos cada vez mais atentos aos conceitos de inovação aberta”, assegura Kunst. A prática, também conhecida como open innovation, caracteriza parcerias feitas entre empresas ou entre empresas e instituições de pesquisa. No Brasil, o segundo caso é o mais comum – a associação do conhecimento produzido nas universidades e centros de pesquisa com a aplicabilidade oferecida pelas indústrias inovadoras. Laboratório da Embraco: parceria com universidades e 400 funcionários voltados à inovação Pequenas inovadoras A cooperação com o setor produtivo amplia o importante papel desempenhado por universidades e centros de pesquisa no sistema de inovação brasileiro. Além de oferecerem soluções para empresas já estabelecidas, essas instituições tornaram-se fundamentais no fomento a empreendimentos inovadores ao implantarem incubadoras e parques tecnológicos, que favorecem o surgimento de micro e pequenas empresas calcadas em pesquisa e desenvolvimento. O clássico motivo que leva um universitário, mestrando ou doutorando a tornarse um empreendedor é a posse de uma ideia inovadora. À incubadora cabe ajudar o futuro empresário a viabilizar o negócio, transformando essa ideia em um empreendimento de verdade. Foi assim que, em 2005, alguns alunos de Engenharia do Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel), de Santa Rita do Sapucaí (MG), criaram a Nib Tec Inovações. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 33 e s p e c i a divulgação Gouvêa, da Nib Tec: apesar de inovador, primeiro produto lançado pela empresa não tinha mercado 34 l A empresa desenvolve e fabrica equipamentos para segurança eletrônica e identificação por radiofrequência – RFID. Aos 26 anos de idade, o diretor da empresa, Bruno Mecchi Gouvêa, lembra que o início da Nib Tec foi marcado por uma grande decepção. “Lançamos um produto que, apesar de inovador, não tinha demanda no mercado”, explica. O produto era uma pulseira para identificação de recém-nascidos em maternidades. Com tecnologia inovadora, era capaz de evitar trocas e até roubo de bebês. Premiada pelo caráter inovador, a pulseirinha da Nib Tec não teve apelo comercial, pois os custos inviabilizavam a implantação. Orientados pela incubadora, os empreendedores da Nib Tec aprenderam com o erro. Antes de começar a investir no segundo produto, realizaram uma extensa pesquisa de mercado. “Desenvolvemos um sistema de controle de acesso para o primeiro cliente e, só depois, o produto foi aperfeiçoado para ser distribuído no canal de vendas”, explica Gouvêa. Atualmente a empresa faz parte do Grupo Giga, composto pela Nib Tec e outras duas empresas, também de base tecnológica. Com 60 funcionários, o grupo já possui um faturamento acima de R$ 5 milhões. Buscar validação no mercado também foi a estratégia usada pela I.Systems, empresa incubada no Núcelo Softex Campinas. Com a ideia de desenvolver um sistema de controle inteligente para processos fabris e equipamentos, os sócios entraram em contato com um gerente de fábrica da Coca-Cola, que achou o projeto interessante e apoiou a iniciativa. A certeza de que a inovação seria bem-sucedida no mercado fez a ideia sair do papel. Assim iniciava o trabalho de transformar o projeto em produto, para depois criar uma empresa a fim de comercializá-lo. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 Outros caminhos Após um ano de incubação, a I.Systems já atua fortemente nas vendas. A empresa tem um contrato para aplicação dos controles inteligentes nas fábricas brasileiras da Rockwel e está desenvolvendo a tecnologia para aplicá-la nas multinacionais B&R e Bosch. “Procuramos a Bosch, eles se interessaram e mandaram gratuitamente toda a plataforma de desenvolvimento para realizarmos o trabalho de importar tecnologia para o equipamento deles”, explica Igor Santiago, CEO da empresa. A tecnologia que baseia todas as operações da I.Systems nasceu da união de dois mestrados, mas a forte ligação com o meio acadêmico não é requisito para criar um negócio inovador. Exemplo disso é a SK Bombas, de Limoeiro do Norte (CE). Tradicional fabricante de bombas centrífugas, a empresa Bombas King atuava no mercado nacional há 48 anos. Em 2002, por demanda de projetistas e fabricantes de usinas de biodiesel, a empresa iniciou o fornecimento de bombas centrífugas, adaptadas de sua linha seriada, para bombear fluidos como óleo vegetal, álcool, ácido sulfúrico e o próprio biodiesel. Por se tratar de um mercado novo e devido à inconstância das características físico-químicas dos fluidos, as bombas fornecidas alternavam o desempenho constantemente. Com a produção em andamento, os engenheiros da empresa não podiam simplesmente parar tudo e procurar alguma solução para o impasse. Foi então que surgiu a proposta de criar uma empresa incubada, de modo a abrigar um departamento de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos para a Bombas King. Residente no Centro de Tecnologia do Ceará, a nova empresa, SK Bombas, buscou formas de subvencionar seus projetos. Com propostas aprovadas pelo CNPq e pelo programa Pappe da Finep, atualmente a incubada conta com uma equipe de 23 pesquisadores e 28 colaboradores no setor divulgação operacional. A iniciativa permitiu que a fabricante desse um salto no seu mix de produtos, atendendo aos mercados de carcinicultura (camarões em cativeiro) e de sistemas de abastecimento público. Com diversos parceiros, como centros de pesquisa e universidades do Ceará, a SK Bombas está trabalhando em três novos projetos. Um deles em parceria com a Trump Eletronics, empresa alemã de geradores de ozônio. “Estamos aguardando a oportunidade para pleitear os recursos necessários que são imprescindíveis ao desenvolvimento de cada um dos projetos”, conclui Fernando Castro Alves, diretor de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da empresa. Seja com ou sem apoio governamental e parcerias com universidades, a inovação no Brasil, em grandes ou pequenas indústrias, já não assusta ninguém. Bombas produzidas pela SK: novas demandas originaram segmento inovador De portas abertas divulgação Repetida como mantra em implementar a parte de comercialização de eventos sobre inovação, a ideia de tecnologias, que é difícil de fazer, contatar que os diferenciais resultantes de empresas que tiverem interesse. Isso já era práticas inovadoras podem garantir feito antes, mas em escala menor”, explica competitividade às indústrias ainda está o diretor executivo da Inova Unicamp, longe de ser completamente difundida Roberto Lotufo. A importância da agência no Brasil. Embora o país participe com pode ser mensurada pelo desempenho da 2% do PIB mundial, somente 0,2% das universidade no cenário brasileiro: estimapatentes registradas internacionalmente se que 15% de toda pesquisa nacional saia Lotufo, da Inova saem daqui. Uma causa provável dessa da Unicamp. Unicamp: capacidade da deficiência são as falhas na comunicação Em 2008, a Inova assinou contratos que academia de interagir com empresas é limitada entre empresas e centros de pesquisa, trarão à instituição o aporte de cerca de R$ institutos tecnológicos e universidades. 8 milhões. Além disso, os licenciamentos de O manifesto lançado por empresários no 3º tecnologia feitos desde 2003 já renderam em torno de R$ Congresso Brasileiro de Inovação na Indústria retoma 900 mil em royalties. “Na hora que as empresas procuram esse problema: “Temos feito progresso na pesquisa parcerias, as universidades estão abertas. O relacionamento acadêmica, mas nossos centros de excelência é difícil em qualquer lugar do mundo, mas é um mito ainda são poucos. E precisamos fortalecer a relação dizer que no Brasil as empresas inovam pouco porque as universidade-empresa”. Para ajudar nesse processo, universidades não ajudam”, assinala Lotufo. a Lei de Inovação, de 2004, deu às universidades O professor cita como prova dessa abertura da brasileiras a oportunidade de criar núcleos de academia para as indústrias o fato de que talvez o inovação – instrumentos responsáveis por otimizar maior case de interação entre universidade e empresa o relacionamento com as indústrias, cuidar da do mundo está aqui. “É difícil encontrar alguma propriedade intelectual e facilitar a entrada no mercado universidade que não tenha parceria com a Petrobras”, da tecnologia produzida nas universidades. acrescenta. Para ele, o que os industriais precisam ter A Unicamp foi pioneira na criação de uma agência em mente – e que pode ser erroneamente confundido de inovação, ainda antes do advento da Lei, em 2003. com ineficiência – é que a capacidade da academia de Até o final do ano passado, a Inova Unicamp já havia interagir com empresas é limitada. “A universidade não articulado mais de 240 convênios de transferência de é um lugar para prestar serviço, não tem como atender tecnologia e de desenvolvimento cooperativo entre a se todas as empresas quiserem fazer projetos médios. universidade, empresas e o setor público. “A Inova veio Ela não foi feita para isso”, explica. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 35 i n t e r n a c i o n a l Para aprender e ensinar Brasil e Estados Unidos se aproximam para trocar experiências sobre empreendedorismo inovador e discutir temas essenciais ao desenvolvimento sustentável N o último dia 20 de agosto, uma delegação norte-americana desembarcou em solo carioca para participar de mais uma edição do Laboratório de Aprendizagem em Inovação, um encontro que discutiu maneiras viáveis de transformar boas ideias em empreendimentos inovadores. Diferentes de tantos outros eventos multilaterais que logo caem no esquecimento, as reuniões, que ocorreram na SHUTERSTOCK B runo M oreschi 36 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 sede da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e no Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), não parecem iniciativas isoladas. Desde o início do ano, representantes do Brasil e dos Estados Unidos encontram-se na ânsia de concretizar negócios inovadores e, dessa maneira, promover o crescimento econômico e a geração de empregos nos dois países. Os temas dos encontros, que são realizados alternadamente nos dois países, variam. As reuniões em Porto Alegre (22 e 23 de abril) e em Chicago (12 e 13 de maio) trataram de investimentos e políticas de infraestrutura para fortalecer a capacidade de pesquisa. Já em São Paulo (13 e 14 de julho) e no Vale do Silício (5 a 7 de agosto), as discussões tinham como foco as formas de transformar essas pesquisas em negócios. Na reunião de agosto, no Rio de Janeiro, seguida de outra em Denver, entre 9 e 11 de setembro, o assunto foi o desenvolvimento da força de trabalho para projetos inovadores. Em comum, todos os encontros avançaram no debate sobre incubadoras de empresas, eficiência energética e tecnologias limpas. A ideia de reunir representantes do Brasil e dos Estados Unidos em uma mesma sala para discutir inovação partiu da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), em conjunto com o Movimento Brasil Competitivo (MBC) e o Conselho de Competitividade dos Estados Unidos (CoC). “Os dois países discutem ações bilaterais que vão desde a pesquisa até a realização de um negócio empreendedor”, resume o presidente da ABDI, Reginaldo Arcuri. As conclusões a que chegaram os participantes dos seis laboratórios serão relatadas em um documento único, repleto de recomendações para os setores público e privado. Essa lista de sugestões servirá como base para as discussões da 2a Conferência sobre Inovação Brasil-EUA, que a ABDI, o MBC e o CoC organizarão na Universidade de Georgetown, em Washington, no mês de abril de 2010. A prova de que os encontros não se limitaram ao falatório é que nem bem terminaram e um resultado concreto já começou a tomar forma. Na reunião de Porto Alegre, ABDI e MBC assinaram um acordo de cooperação técnica para desenvolvimento de um programa similar ao International Computer Sciences Institute (ICSI). Nos Estados Unidos, essa associação sem fins lucrativos é uma referência nos estudos avançados de redes de computadores, bioinformática e inteligência artificial. Criado em 1988 na Universidade de Berkeley, o ICSI recebe pesquisadores do mundo inteiro e seus diretores são pesos pesados da tecnologia de ponta. Um deles, por exemplo, é Scott Shenker, vencedor de dois dos maiores prêmios de tecnologia do mundo, o Sigcomm Award e o IEEE Internet Award. Sem as reuniões com os norte-americanos neste ano, dificilmente a criação de um ICSI verde e amarelo seria cogitada no Brasil. Segundo os organizadores do Laboratório, inúmeros são os exemplos norte-americanos que podem ser replicados por aqui. “Os Estados Unidos têm a cultura de inovação consolidada e precisamos aprender a fazer com que esse tema entre em nossa agenda”, afirma Claudio Gastal, presidente do MBC. Não é novidade que os Estados Unidos estão à frente do Brasil em relação à inovação. Segundo Gastal, o medo de falhar entre as empresas brasileiras ainda é muito grande, reflexo da ausência de uma cultura inovadora no país. DIVULGAÇÃO/ABDI Ações efetivas “O principal fator de incentivo ao empreendedorismo está na sala de aula. Os Estados Unidos possuem essa cultura de implementar o empreendedorismo na grade curricular de escolas e universidades, além de possuírem cursos específicos sobre isso em diversas instituições de ensino”, completa. Encontro realizado em São Paulo, no mês de julho, discutiu formas de transformar pesquisas em negócios Brasil professor Mas os Estados Unidos, esse país indiscutivelmente empreendedor e inovador, têm algo a aprender com o Brasil? Gastal acredita que sim. “Como temos visto nos encontros e pela nossa própria vivência, o brasileiro possui o empreendedorismo no seu DNA. O problema é que muitos não levam suas ideias adiante justamente por carecerem de incentivo e pela ausência de uma cultura empreendedora. Temos muita criatividade, inteligência, além da característica de tirarmos leite de pedra e jogo de cintura.” O presidente norte-americano Barack Obama não cansa de repetir sua vontade de promover uma economia “mais verde”. Atualmente, o que mais chama a atenção dos Estados Unidos e de outros países no Brasil é justamente sua busca por alternativas de energia, como o biodiesel. A liderança nesse processo, bem como a capacidade de empreender e inovar em ambientes desfavoráveis, permitiu que o Brasil deixasse de ser apenas um aluno na sala de aula global. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 37 s u c e s s o Empreendedorismo em família Empresa pernambucana desponta na área de biotecnologia e comprova que pesquisas acadêmicas podem se transformar em excelentes negócios Eduardo K ormives fotos: divulgação Djalma Marques e Fátima Fonseca: dedicação à pesquisa U m negócio familiar. Assim poderia ser caracterizada a BioLogicus, empresa incubada no Instituto de Tecnologia de Pernambuco (ITEP), em Recife. E mesmo esse detalhe, o fato de ter se desenvolvido em família, pode soar inovador para um empreendimento de ponta na área de biotecnologia, que desenvolve alimentos funcionais probióticos, cosméticos e cremes dermatológicos. A trajetória pouco convencional da BioLogicus confunde-se com o trabalho de pesquisa na área de probióticos do casal Djalma Marques, dermatologista PhD em medicina preventiva, e Fátima Fonseca, engenheira química com doutorado em tecnologia de alimentos, ambos adeptos da medicina natural. Antônimo de antibiótico, o termo probiótico vem do grego e significa pró-vida. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define probióticos como “organismos vivos que, quando administrados 38 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 em quantidades adequadas, conferem benefício à saúde do hospedeiro”. Esses microorganismos podem ser utilizados na formulação de alimentos industrializados, como leites fermentados ou iogurtes, para atuar no equilíbrio bacteriano intestinal, no controle do colesterol e na redução do risco de câncer, entre outros benefícios. Os iogurtes e leites fermentados no mercado não contêm mais do que dois tipos de probióticos. A BioLogicus conseguiu isolar mais de 70 espécies e as colocou em matrizes, tornando-as estáveis por tempo indeterminado. Djalma explica que a ideia é, num futuro próximo, oferecer para o mundo esse banco de microorganismos. Por acaso O contato com probióticos começou em 1997, quando Djalma e Fátima seguiram para a Espanha a fim de cursar doutorado – ele na universidade de Barcelona e ela na de Cádiz. Teve início por acidente, quando Fátima, que pesquisava leveduras, sofreu uma queimadura no laboratório. “Ela não tinha o que usar na hora. Pegou espuma de levedura de vinho e colocou em cima da queimadura. Para surpresa dela, a cicatrização foi rápida e não deixou absolutamente nenhuma marca ou bolha”, lembra Djalma. A pomada que cura queimaduras de terceiro grau em apenas 48 dias, sem deixar marcas, viria a se transformar em um dos primeiros produtos da BioLogicus. Na mesma época, o dermatologista descobriu pela internet os grãos de kéfir, microorganismos encontrados na região do Cáucaso, Rússia, com os quais se produzem bebidas funcionais fermentadas ricas em nutrientes, bacilos e leveduras que regulam o funcionamento renal e hepático. A BioLogicus é a única empresa brasileira que produz o kéfir real de leite de vaca, búfala, soja e frutas. As bebidas a partir de frutas e probióticos são resultado de suas pesquisas pioneiras. A empresa pernambucana descobriu uma maneira de fazer com que os bacilos e as leveduras do kéfir fermentassem em frutas, reproduzindo-as nos sucos de uva e de abacaxi. Além disso, isolou as enzimas produzidas pelos microorganismos do kéfir para confeccionar biocosméticos. A BioLogicus tem uma linha de cremes antiidade e antiacne, sabonetes argilofitobióticos que atuam na prevenção e no rejuvenescimento da pele, xampus antiqueda, óleos de banho e perfumes. Desafios superados De volta ao Brasil em 2001, Djalma e Fátima buscaram uma forma de transformar as pesquisas em produtos. Djalma lembra, bem-humorado, que eles foram vistos com certa desconfiança, e seu trabalho rotulado de “meio hippie”. Além do preconceito dentro do mundo acadêmico, as empresas interessadas não pareciam dispostas a oferecer mais do que bolsas de pesquisa em troca do produto final. A saída foi fundar a BioLogicus em 2004, tendo como funcionários estudantes da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). A empresa se tornaria incubada do ITEP dois anos mais tarde. Mas a visibilidade necessária para fazer deslanchar o negócio viria de uma maneira bastante original: a participação no reality experience Empreender é Show, promovido pela Anprotec em 2007. Única representante das regiões Norte e Nordeste, a BioLogicus foi selecionada entre mais de 50 inscritos para participar do programa. E fez bonito. Nos seis meses de competição, venceu duas das cinco missões propostas e acabou em terceiro lugar. A exposição na mídia ajudou a fechar negócios que mudaram os rumos do empreendimento. “O programa abriu negociações interessantíssimas. Ainda hoje, há o contato de gente que nos chega por causa do reality”, conta Djalma. Hoje a BioLogicus está na lista das 20 empresas nacionais de biotecnologia que recebem incentivos de pesquisa de diversas instituições de fomento. Neste ano, a empresa foi contemplada em diferentes editais, que, somados, reforçarão o caixa em cerca de R$ 700 mil. Além disso, a BioLogicus conseguiu R$ 1,5 milhão no edital de Subvenção Econômica da Finep para o apoio ao desenvolvimento de dermocosméticos. A empresa, que nasceu com três pesquisadores, já conta com uma equipe de 19 pessoas. E os planos não param por aí. A BioLogicus abriu negociação com um fundo de capital-semente com possibilidade de receber um aporte de R$ 3 milhões. É o investimento necessário para industrializar a tecnologia desenvolvida em Pernambuco e levá-la além das farmácias homeopáticas e redes de produtos naturais locais. Bom para a BioLogicus, melhor ainda para os consumidores. Equipe da BioLogicus: empresa conquistou cerca de R$ 2,2 milhões em recursos de editais somente neste ano Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 39 Ã O Shutterstock GEST Marketing certeiro Ações voltadas à venda de produtos e serviços devem fortalecer a imagem da empresa e ampliar o relacionamento com clientes D ébora H orn e C ora D ias 40 P ara grande parte das empresas inovadoras, sair do laboratório e ir ao mercado para lançar produtos sem precedentes representa um enorme desafio. Afinal, as estratégias traçadas para este momento definem se todo o esforço de concepção e desenvolvimento valeu a pena. Baseado nessa premissa, o conceito de marketing evoluiu e sua compreensão se tornou fator fundamental a qualquer empresa que busque a sustentabilidade. Segundo o consultor de marketing do Sebrae/SP, Wlamir Bello, o planejamento das ações de marketing começa pelo conhecimento dos principais diferenciais Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 competitivos do produto. “Hoje os clientes têm uma gama enorme de opções para praticamente todos os produtos e serviços. É preciso gerar algo novo, com vantagem clara, mensurável, em relação ao que já existe”, explica. Para isso, é fundamental conhecer o mercado em que se pretende atuar e, principalmente, as necessidades reais do cliente. “Quando se mostra ao cliente as vantagens de determinado produto ou serviço, o preço deixa de ser o fator preponderante na escolha, ou seja, ele se dispõe a, se preciso, pagar mais caro por algo diferenciado”, afirma. Nesse processo, o gestor de marketing da do software. A combinação de baixos custos de produção e um novo perfil de consumidores resultou em um aumento significativo no patrimônio da empresa. Divulgação deve, primeiro, entender as políticas de comercialização vigentes no mercado em que busca se inserir. Isso inclui conhecer profundamente o que os concorrentes oferecem e de que forma suas mensagens chegam aos consumidores. “É preciso atender as necessidades do público-alvo e ir além do óbvio, se colocando no lugar do cliente”, explica Bello. Boa parte do sucesso do Wii, videogame da japonesa Nintendo, vem da simples compreensão de que ficar se mexendo é mais divertido que ficar sentado e que quando se mexem as pessoas interagem mais naturalmente com quem está ao seu redor do que quando estão sentadas. Usar os braços para controlar uma raquete de tênis ou uma luva de box é mais interessante do que apenas mexer os polegares. Apesar do público-alvo do Wii ter maior poder aquisitivo que os consumidores tradicionais de videogame, sua maior vantagem em termos financeiros é que, diferentemente dos fanáticos por jogos eletrônicos mais jovens, esses consumidores não exigem desempenho máximo em termos de velocidade, gráficos e outros componentes. Esse fator permitiu que a Nintendo tornasse o hardware muito mais lucrativo que o de seus concorrentes, habituados a vender seus equipamentos a preço de custo e lucrar apenas com a ven- Sinalizadores Bello, do Sebrae/ SP: se colocar no lugar do cliente ajuda a empresa a ir além do óbvio Segundo Bello, o preço é um sinalizador do mercado em que o produto pretende circular. “Dependendo do produto, oferecer o menor preço pode ser uma estratégia perigosa, pois em determinados mercados o custo mais elevado é visto como um valor importante de diferenciação”, conclui. Da mesma forma, a distribuição do produto e sua abrangência são determinadas pelo conhecimento prévio de cada mercado potencial. A coleta de informações sobre o perfil do cliente permitirá à empresa definir com mais segurança quando e onde seu produto estará disponível. Nessa etapa, especificidades regionais devem ser analisadas com afinco. “Às vezes, os produtos são competitivos em uma determinada região do país, mas não em outras”, afirma Bello. 4Ps x 4Cs O composto de marketing, também chamado 4Ps, traz um conjunto de aspectos que devem ser considerados pelas empresas na hora de elaborar uma estratégia de venda de produtos. Do outro lado, há as necessidades do cliente, que deram origem ao composto chamado 4Cs. Segundo o Sebrae, prosperam as empresas que conseguem atender às necessidades dos clientes de modo econômico e conveniente, a partir de uma comunicação efetiva. 4Ps 4Cs Produto Cliente (solução para o cliente) Preço Custo (para o cliente) Praça (pontos de venda) Conveniência Promoção Comunicação Fonte: Sebrae Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 41 Ã O Shutterstock GEST Com Wii, Nintendo agradou aos que não gostavam de ficar parados para jogar videogame Após compreender todas as reais necessidades dos clientes potenciais, chega a hora de divulgar o produto. “A empresa precisa ser descoberta, ou seja, comunicar ao mercado que existe e que é inovadora”, explica Bello. Segundo o consultor, uma das estratégias mais eficientes nesse sentido é a mídia espontânea, gerada a partir da divulgação realizada por uma assessoria de imprensa. “A divulgação gera demanda. Por isso, o investimento necessário às ações de marketing deve compor o pre- ço final do produto. A empresa deve encarar esse investimento como um custo fixo”, aconselha o consultor. Para Armando Leite Ferreira, autor do livro Marketing para Pequenas Empresas Inovadoras, a forma de comunicação mais adequada varia de acordo com o públicoalvo. Dependendo do setor, a divulgação do produto em feiras e seminários pode ser muito eficiente. “Mas o mais importante é que, ainda antes de concluir o projeto, o empresário saia à rua e pergunte aos clientes potenciais se o produto atende a suas necessidades”, afirma. Nesse momento, alerta Ferreira, o gestor de marketing não pode acreditar piamente nas respostas. “O comum é que as pessoas digam que o produto é bom, por educação. Cabe à empresa perguntar: você realmente compraria? Quando e por quanto?”, explica. Iniciar o relacionamento com o cliente ainda na fase de concepção do produto pode ajudar a antecipar a demanda. “A proximidade com o usuário permite desenvolver um produto realmente focado nas necessidades do cliente, que atende a suas expectativas, evitando o desperdício de tempo e de recursos por parte da empresa”, afirma Ferreira. Na rede Com o advento da internet, as oportunidades de marketing passaram a ser ilimitadas. Saber utilizar a rede como um instrumento eficiente para venda de produtos e fortalecimento de marcas tem sido o grande desafio das empresas inovadoras. A divisão do marketing Marketing Estratégico - engloba funções que precedem a produção e a venda do produto. Inclui o estudo de mercado, a escolha do público-alvo, a concepção do produto, a fixação do preço, a escolha dos canais de distribuição e a elaboração de uma estratégia de comunicação e produção. Marketing Operacional - trata das operações de marketing posteriores à produção, como a criação e o desenvolvimento de campanhas de publicidade e promoção, a ação dos vendedores e do marketing direto, a distribuição dos produtos, o merchandising e os serviços pós-venda. Fonte: Sebrae 42 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 “O fato de ser uma comunicação em duas vias, com resposta imediata do públicoalvo, é o grande diferencial dessa técnica de marketing”, explica Guilherme Delorenzo, publicitário e diretor de novos negócios da Riot, agência publicitária de São Paulo que utiliza o marketing viral para levar a marca ao consumidor, de forma que haja uma troca de experiência. A ideia de utilizar a internet como ferramenta surgiu da percepção de que a web proporciona um ambiente favorável à interação empresa/consumidor, que outras mídias não ofereciam. “Há inúmeras formas de se fazer esse trabalho, porque há inúmeras ferramentas, inúmeros fóruns, inúmeros agentes: blogueiros, twitteiros, flickeiros, orkuteiros, youtubeiros e outros mais”, afirma Delorenzo. Os formatos de comunicação variam de acordo com os veículos utilizados e com os propósitos da empresa, que vão desde divulgar uma informação, um lançamento, um produto ou um serviço, até criar um canal para desenvolvimento de uma ideia associada a uma marca. Isso pode ser feito, por exemplo, por meio de comentários (pagos) de blogueiros sobre produtos, produção de conteúdos em fóruns de discussão e links patrocinados em comunidades de mídias sociais. Foi o caso da ação promocional realizada por meio do aplicativo Buddypoke, do Orkut, para divulgar o filme Wolverine, lançado em abril deste ano. A partir dessa ação, o avatar (espécie de boneco virtual) do usuário do Orkut pode receber alterações que o deixam mais parecido com o personagem Wolverine. Nesse mercado há, ainda, serviços de monitoramento que podem ajudar organizações a identificar o que se fala sobre a marca na rede, possibilitando que a empresa descubra pontos fracos e fortes do negócio. Para Delorenzo, ainda há receio por parte dos empreendedores em colocar sua marca nas mídias sociais. “Fazemos um trabalho de ‘evangelização’ dos nossos clientes quanto à importância e às formas de se posicionar na rede, estabelecendo conversas com o seu públicoalvo”, conta. O Twitter, servidor para microblogging, no qual o usuário tem que se expressar em apenas 140 caracteres por post, está se tornando cada vez mais comercial, pois os consumidores utilizam a ferramenta para dizer tudo o que pensam sobre o que consomem. “Nessa ferramenta as pessoas agem pelo impulso, pela emoção, ‘pensam alto’. Imagine o poder de disseminação de coisas negativas a seu respeito se você comete algum deslize. É imprescindível estar atento e bem posicionado”, explica Delorenzo. Marketing inovador O manual de Oslo, desenvolvido pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em parceria com a Eurosat, é a principal fonte internacional de diretrizes para coleta e uso de dados sobre atividades inovadoras da indústria. Em sua terceira edição, lançada em 2005, o Manual traz duas novas formas de inovações: de marketing e organizacional. Esses novos modelos ampliam o conjunto de inovações tratadas pelo Manual em relação à edição anterior, que abordava apenas as inovações de produtos e de processos. Uma inovação na área, segundo o Manual, “é a implementação de um novo método de marketing com mudanças significativas na concepção do produto ou em sua embalagem, no posicionamento do produto, em sua promoção ou na fixação de preços”. Segundo o Manual, o que caracteriza a inovação de marketing é a implementação de um método que ainda não tenha sido utilizado pela empresa para divulgar seus produtos. Esse novo método pode ser desenvolvido ou importado de outras organizações. Inovações de marketing compreendem, ainda, mudanças substanciais no design do produto, como uma mudança significativa no estilo de uma linha de móveis para ampliar seu apelo, por exemplo. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 43 d u c a ç ã o SHUTERSTOCK e Um novo perfil de mestre Capes altera regulamentação de mestrados profissionais e permite novas formas de avaliação de cursos e alunos. Critérios para contratação de professores também mudam M aykon O liveira 44 F ormar 45 mil mestres e 16 mil doutores por ano até 2010. Essa era a meta do Plano Nacional de Pós-Graduação, lançado em 2005 pelo Ministério da Educação (MEC). Elaborada com base em cenários distintos, que incluíam investimentos e ações estratégicas que acabaram não se concretizando, a meta ainda está longe de ser alcançada. Segundo a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), atualmente são formados cerca de 30 mil mestres e 10 mil doutores por ano. A busca por reduzir o déficit tem gerado algumas mudanças nas regras que regem a pós-graduação no Brasil. Uma das mais recentes mexeu em uma polêmica antiga: a regulamentação do mestrado profissional. O ensino superior brasileiro permite duas modalidades de mestrado: a acadêmica e a profissional. A primeira é voltada aos alu- Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 nos que desejam seguir carreira científica ou atuar como professores universitários. Nesse caso, o enfoque do curso é mais teórico, com disciplinas abrangentes e a busca de profundo conhecimento no tema sobre o qual se pretende dissertar. No mestrado profissional, a premissa e os objetivos são outros. De ênfase mais mercadológica, a modalidade é direcionada a um público formado por profissionais que procuram ampliar conhecimentos e habilidades práticas em sua área de atuação. Seu crescimento também era meta do Plano Nacional de Pós-Graduação 2005-2010, visto pelo MEC como um instrumento de aproximação entre universidades e empresas, que resultaria em inovação tecnológica. Apesar dos objetivos distintos, as duas modalidades seguiam regras idênticas até o último dia 22 de junho, quando o Minis- mo algum tipo de produção artística, de acordo com a natureza da área e a finalidade do curso. A avaliação dos cursos do mestrado profissional, alvo de críticas por causa do viés acadêmico, também irá mudar. A partir de agora, a Capes adotará novos critérios, levando em conta as especificidades do ensino, o que pode elevar as notas desses cursos. Um dos objetivos é é atrair instituições que tenham boas especializações, transformando-as em mestrados profissionais. O que muda O Brasil hoje contabiliza 218 cursos de mestrado profissional. Na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) existe um exemplo pioneiro no Departamento de Engenharia Mecânica, que já ministrou três cursos na modalidade. “Eles foram criados para atender uma demanda específica de determinadas empresas, oferecendo uma carteira diferenciada no que se refere às disciplinas e ao foco”, afirma o coordenador do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica da UFSC, Eduardo Alberto Fancello. Ele explica que a criação de cursos de mestrado profissional é sazonal e resulta de uma parceria com empresas do setor industrial, como a Fiat e a WEG, que buscam uma maior qualificação dos seus empregados. “Essa modalidade ocupou um espaço que estava vago no atendimento às empresas”, ressalta. Embora ainda vista com alguma desconfiança no meio acadêmico, a nova regulamentação publicada pelo MEC pode servir para estreitar os laços entre empresas e instituições de pesquisas. Mesmo assim, o panorama do ensino superior no Brasil revela que a formação de mestres e doutores representa a ponta de um problema social ainda mais preocupante: de cada mil pessoas que ingressam no Ensino Básico, apenas três chegam ao nível superior. A Portaria Normativa No 7 estabeleceu mudanças no credenciamento, na implantação e na avaliação dos cursos de mestrado profissional, além de ampliar a variedade de formatos nos trabalhos de conclusão (TCCs) da modalidade. Agora, a análise de propostas de cursos será feita pela Capes utilizando fichas de avaliação específicas, diferentes das utilizadas para o mestrado acadêmico. Outra alteração significativa ocorrerá no quadro docente. Para ministrar aulas na modalidade profissional, poderão ser admitidos professores que não tenham mestrado ou doutorado, mas com expertise reconhecida na área de ensino – hoje, em um mestrado acadêmico, todos os professores precisam ser doutores. Conforme a Capes, a permissão não exime o corpo docente do mestrado profissional de comprovar alta qualificação por meio de produção científica. Também serão mais variadas as formas de apresentação do trabalho de conclusão de curso do mestrado profissional. No lugar da tradicional dissertação, exigida na modalidade acadêmica, o mestrando poderá apresentar artigo, estudo de caso, patente de um produto ou protótipo, projetos, desenvolvimento de aplicativos e até mes- divulgação /Capes tério da Educação (MEC) publicou portaria com uma regulamentação específica para o mestrado profissional. Segundo o diretor de Avaliação da Capes, Lívio Amaral, a regulamentação foi modernizada conforme as diretrizes do Plano Nacional de Pós-Graduação. “O mestrado profissional existe desde o final dos anos 90. Porém, o instrumento que o disciplinava era bastante sucinto. A nova portaria coloca objetivos e condições para esse tipo de curso de modo bastante explícito. Portanto, serve de orientação para o sistema de pós-graduação brasileiro no seu todo”, afirma. Amaral, da Capes: nova regulamentação modernizou sistema de pós-graduação Foco específico Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 45 c r i a t i v i d a d e Misto de arte e negócio Como um artista afoito em mostrar e vender suas obras transformou um engenho abandonado em galeria de arte e atração turística de Pernambuco M uito se ouve histórias de empreendedores bem-sucedidos. Seus protagonistas são quase sempre empresários e o enredo se passa no mundo corporativo. Todavia, exemplos de boas estratégias de negócios existem em qualquer área. As artes plásticas é uma delas. Visitar a Oficina Brennand, em Recife, é se deparar com um empreendimento que deu certo. Nas agências de viagens, dificilmente será possível encontrar um pacote turístico para visitar o local, exclusivamente. “Quem viaja para Pernambuco está interessado em praia, sol e água fresca”, conta a funcionária de uma empresa de turismo local. A máxima pode até ser verdadeira, mas os mais curiosos garantem que vale a pena dedicar algumas horas para o passeio alternativo. E dão a dica: com qualquer taxista de Recife, basta combinar com ante- cedência de um dia a ida e a volta à Oficina Brennand – o valor da corrida, com o motorista esperando seu passeio terminar, fica em torno de R$ 80. Na entrada, somos recebidos por um conjunto de quatro esculturas de saltimbancos chamado Os Comediantes. O terreno de 3,5 hectares é cercado por um pedaço preservado da Mata Atlântica e pelo Rio Capibaribe. Até o início do século XX, aquele solo massapê era local para o Engenho Santos Cosme e Damião, no bairro histórico de Várzea. Quando herdou as terras do pai, o artista plástico Francisco Brennand começou em 1971 um projeto de revitalização do espaço. Seu objetivo era construir um lugar agradável, misto de opção turística e ateliê onde pudesse produzir e vender suas obras com a tranquilidade que sempre prezou na vida. Para FOTOS: Marinez Teixeira B runo M oreschi Oficina Brennand, em Recife: lugar para produzir e vender obras 46 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 Espaço ideal A arte de Brennand é assumidamente mística. Com longa barba branca e olhar atento, ele parece um ermitão, misto de Papai Noel com o mago Gandalf, do filme O Senhor dos Anéis. Seu discurso pode assustar aqueles que não acreditam em tanto poder transcendental. No livro Testamento I: o oráculo contrariado, publicado em 2005, Brennand explica suas duas obsessões artísticas: “Ovos e aves são recorrentes no meu trabalho e têm acompanhado todo o percurso de minha obra cerâmica. Definem a presença do ovo primordial, da forma primitiva, o ovo cósmico: o começo da vida. Sabe-se que em sepulcros pré-históricos russos e suecos encontram-se ovos de argila, depositados como emblemas da imortalidade. As coisas são eternas porque se reproduzem.” Em seguida, faz a ressalva de que não pertence a nenhuma religião: “Não me atrevo a qualquer espécie de subterfúgio religioso (...) Temos por vocação o desejo de complicar os motivos de uma escolha, achando sempre haver por trás de tudo um sentido que nos escapa.” Goste-se ou não das estátuas, pinturas e do falatório de Brennand, é inegável que ele conseguiu criar um espaço ideal para mostrar sua arte. Entrar na Oficina Brennand é se deparar com uma espécie de representação física de uma mente que não teme negar suas influências – por mais clichês que possam parecer. O local é também o retrato de um empreendimento de sucesso. A Oficina Brennand recebe, em média, 2,5 mil pessoas por mês. Em período de férias escolares, o público ultrapassa os 5 mil. Há dois tipos de peças vendidos no local. Um deles são esculturas e painéis que levam a assinatura de Brennand. Os preços variam bastante: entre R$ 3 mil e R$ 90 mil. Mas há também peças bem mais simples que se encontram na pequena loja de lembranças. Entre vários objetos, fruteiras, jarros, pratos, camafeus e abajures custam de R$ 45 a R$ 2,7 mil. Para completar esse misto artístico e comercial, como bom empreendedor que busca vender seus produtos, Brennand faz questão de colocar no site da Oficina as imagens de todas as peças que produz. Vale a pena conferir: www.brennand.com.br Helder Ferrer isso, convidou o paisagista brasileiro Burle Marx, autor, entre muitos outros mundo afora, dos jardins do Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, e do Parque do Ibirapuera, em São Paulo, para repensar toda a disposição do gramado. Junto com as curvas de Marx, estão várias esculturas de Brennand – entre elas, uma jocosa serpente marinha em argila vitrificada queimada em alta temperatura que parece mergulhar num dos canteiros. Em outro canto, há um espaço para refeições rápidas e venda de peças assinadas por Brennand. Mais à frente, um anfiteatro que lembra uma sala de banho romana, um espaço dedicado à realização de eventos – com 128 lugares – e um salão com suas principais esculturas, além de painéis feitos de argila e pintados com tintas preparadas no local. No centro da Oficina Brennand, a atração que o artista julga a mais importante: um templo com cúpula oval azul que representa algo chamado por ele de “ovo primordial”, um suposto símbolo da imortalidade. O artista e suas obras: arte assumidamente mística Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 47 CULTURA r u n o M o r e s c h i B A França no Brasil Diversos eventos relacionados à cultura francesa ocorrem em território brasileiro ao longo de 2009, o Ano da França no Brasil. Uma ótima exposicão de fotógrafos franceses contemporâneos esteve em Porto Alegre, as pinturas de Fernand Léger foram expostas em São Paulo e uma mostra do estilista Yves Saint Laurent ocorreu no Rio de Janeiro. Mas, desde o início do ano, já era sabido quais seriam as duas grandes atrações dentre os cerca de 600 projetos culturais que viriam ao Brasil: uma exposição do pintor francês Henri Matisse (1869-1954) e outra do russo Marc Chagall, que pintou alguns de seus importantes quadros em Paris. Suor discreto E X POSIÇ Ã O Matisse Hoje. Pinacoteca do Estado de São Paulo (Praça da Luz, 2, São Paulo - SP), telefone: 11 - 33241000). De 5/9 a 1/11. R$ 6. Grátis aos sábados. Matisse foi um obstinado pela cor. Nas cerca de 80 obras expostas em São Paulo, os visitantes irão se deparar com os quadros de um artista que aparentemente pintava com alegria e de forma espontânea. Ledo engano. A composição de suas telas mais importantes é fruto de uma mente obstinada que passava horas a fio em seu ateliê, buscando a maneira mais pertinente de esconder suas dificuldades. Para Matisse, o esforço era tema pessoal, que não necessariamente precisa ficar evidente aos olhos dos outros. 48 Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 Aberto ao mundo E X POSIÇ Ã O O Mundo Mágico de Marc Chagall – O Sonho e a Vida. Casa Fiat de Cultura (Rua Jornalista Djalma de Andrade, 1.250 - Nova Lima - MG), telefone: 31 - 32898900. De 4/8 a 4/10. Grátis. Se Matisse foi o pintor racional que se escondia em vestes de um artista passional, o russo Chagall foi aquele que soube absorver as influências ao seu redor – do construtivismo russo às vanguardas europeias que fervilhavam na capital francesa. Mas o trunfo de Chagall foi justamente observar o que se produzia. O mundo fantasioso retratado, como a tela com noivos que pairam no céu, é sua marca pessoal inconfundível e pode ser conferido nas 275 gravuras, duas esculturas e 26 pinturas em exposição. l e i t u r a O Artíficie, de Richard Sennett Editora Record, 2009, 360 páginas. O professor da London School of Economics e da Universidade de Nova Iorque Richard Sennett discorre nessa obra sobre o valor do fazer. Sua tese principal é de que o mundo contemporâneo esqueceu que produzir as coisas é também uma forma de pensar. Não se trata em negar as facilidades do mundo contemporâneo, mas de não esquecer que a humanidade sempre caminhou através do pensar criativo. Para ele, o fazer depende não só da máquina, mas do cérebro humano – o único capaz de subjetivamente constatar o resultado final das coisas. Um trecho instigante: “A educação moderna evita aprendizado repetitivo (...) desse modo impede que as crianças tenham a experiência de estudar a própria prática e modulá-la de dentro para fora. (p. 49). Veja Gran Torino, de Clint Eastwood. Im p e r a t i v o O diretor e ator norteamericano interpreta um homem durão que, com a ajuda de um jovem vizinho, aos poucos percebe a importância de aprender com o outro. Em DVD. Ouça 50 Years of Island Records. Uma homenagem ao selo musical criado pelo produtor Chris Blackwell, que ajudou a lançar bandas como U2. Em CD. Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 49 o p i n i ã o Independência ou sorte? Divulgação A Mauricio Guedes* *Mauricio Guedes é diretor da Incubadora de Empresas da Coppe/UFRJ e do Parque Tecnológico da UFRJ e vice-presidente da International Association of Science Parks (IASP). 50 onda de ufanismo com as gigantescas reservas de petróleo descobertas na camada pré-sal cruzou o oceano. Em Portugal, o presidente da GALP Energia, Manuel Ferreira, declarou no mês passado a independência energética do país. Segundo ele, a empresa portuguesa detém, nos cinco blocos do pré-sal brasileiro em que tem participação, reservas que supririam por 15 anos toda a demanda de combustíveis da antiga corte. As estimativas mais conservadoras anunciam que as reservas brasileiras de petróleo irão triplicar, chegando a 50 bilhões de barris. Fala-se até em 100 bilhões de barris. Somente nos campos de Tupi e Iara, as reservas são de 8 a 12 bilhões de barris. Mas os desafios que o país terá que enfrentar são também gigantescos, a começar pelo necessário acordo político para a distribuição de royalties e participações especiais entre estados e municípios. Esse é um debate obviamente fundamental, em que todas as partes têm razão, e caberá ao Congresso a busca de uma solução constitucional, justa e duradoura. Toda essa riqueza está, porém, a mais de 300 quilômetros da costa, a 2 mil metros de profundidade no mar e começa a ser encontrada após 3 mil metros de perfuração. A produção só deverá atingir um nível significativo em 2017 e as demandas por novas tecnologias são as mais variadas e desafiadoras. Milhares de técnicos e pesquisadores estão sendo mobilizados para o esforço de inovação necessário à caracterização de reservatórios, perfuração na camada de sal, produção de risers com mais de 2 mil me- Locus • Julho/Agosto/Setembro 2009 tros, concepção das unidades f lutuantes, logística para a operação a 300 quilômetros de distância da costa e para o armazenamento e transporte de gás, entre tantas outras áreas. Os investimentos feitos nos últimos anos em PD&I no setor já são significativos. Somente a Petrobras investiu no período 2006-2008, por meio do Cenpes, R$ 560 milhões na infraestrutura experimental das universidades e institutos de pesquisa brasileiros. Mas serão necessários investimentos muito superiores para buscar as soluções de que precisamos e, para isso, já estão sendo convocadas universidades e empresas de todos os portes e de muitas partes do mundo. Está certíssimo o governo quando inclui a ciência e tecnologia entre as áreas a serem privilegiadas. O país precisa dar o salto da inovação, transformando a nossa capacidade em ciência e tecnologia em fator de geração de riqueza. O maior de todos os desafios será fazer com que esse esforço do pré-sal se transforme em algo sustentável, que sirva às gerações que vierem depois de esgotadas – ou desvalorizadas pelo surgimento de fontes mais limpas de energia – as nossas reservas de petróleo. Já mostramos muita competência tecnológica, acumulamos recordes mundiais na produção de petróleo em águas profundas e descobrimos as reservas do pré-sal. Mas devemos cuidar para que este golpe de sorte – afinal, não fomos nós, brasileiros, que colocamos esse óleo no nosso quintal há cerca de 120 milhões de anos – se transforme em independência para as gerações futuras. ambiente da inovação brasileira Julho/Agosto/Setembro 2009 no 57 • Ano XV Compromisso com a mudança Depois da campanha pela qualidade, setor produtivo elege a inovação como grande tema estratégico da atualidade. Para competir na economia do conhecimento, empresas brasileiras devem protagonizar movimento pela inovação no país. Cooperativismo Negócios que transformam a realidade social dos empreendedores Oportunidade Setor de energia demanda soluções inovadoras e garante espaço para MPEs